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Esta revista contempla uma coletânea de artigos elaborados durante pesquisa, com o
tema referente as favelas brasileiras. A análise extensiva realizada por meio dos artigos
vai desde a origem da primeira favela, até a situação atual em que as favelas se
encontram.
Neste conteúdo, também há detalhamentos sobre a forma como as favelas foram
construídas, sua estrutura conceitual e em quais tipos de estruturas de construção deve-
se atuar primeiro.
Caroline Paula
Lainy Montalvão
Lucas Lopes
Nycole Rebello
Maria Rodrigues
Thaina Oliveira
Veronica Esteves
Alunos da Universidade
Cidade de São Paulo, do
curso de Arquitetura e
Urbanismo.
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A ORIGEM DA FAVELA: DA Palavras-chave: Favela; Urbanismo;
GUERRA À SOBREVIVÊNCIA Urbanização social.
Abstract
SILVA, Caroline This article considers an analysis of the
Paula da origin of the favela, and for that, it goes
Estudante de through everything, since the origin to the
Arquitetura, pela aesthetics, which, although always
Universidade disorganized, is extremely organic. The
Cidade de São beginning of the favelas is derived from
Paulo. the series of tasks by a lower social
class, and as motives that lose the
favelas today, date the time of the
abolition of slavery and its former slaves
that favor the creation and construction of
Resumo favelas. The years go by and the winners
Este artigo contempla uma análise da of the War of Canudos return from Bahia
origem da favela, e para tal, passa-se por and the beats like dwellings no longer
todos os pontos, desde a origem da present the name of the favela, and from
favela até a estética, que embora sempre this the effective beginning of the favela.
desorganizada, é extremamente With a contextual analysis, of both origin
orgânica. O início das favelas se dá por and aesthetic from favelas, it is proposed
meio das dificuldades encontradas por to a more well defined position about the
uma classe social mais baixa, e as theme favela in different situations such
motivações que perduram nas favelas as the role of architecture inside the
atualmente datam da época da abolição favela.
da escravatura e seus ex-escravos que Keywords: Favela; Urbanismo;
auxiliaram a criação e construção das Urbanização social.
favelas. Os anos passam e os soldados
vencedores da Guerra dos Canudos Etimologia
retornam da Bahia e batizam as Devido ao êxodo rural, e como
habitações já presentes no morro com o consequência da má distribuição de
nome de favela, e a partir disso se obtém renda e do déficit habitacional que existe
o início efetivo da favela. no Brasil, habitações improvisadas sem
Com a análise contextual, tanto da infraestrutura e saneamento básico,
origem, quanto da atual estética das constituídas majoritariamente de
favelas, propõe se ao final uma posição madeiras, constituem o que se chama
mais definida sobre o quesito favela em “Favela”.
diversas situações, como ao papel da A palavra “favela” origina-se da árvore
arquitetura dentro da favela. Cnidoscolus Quercifolius da família das
Euphorbiaceas, a mesma família da
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Favela: Uma análise extensiva
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A relação entre a palavra “favela” e o
conjunto habitacional de casebres
precisa que o contexto da época seja
explicado, que teve origem na Bahia
durante o período da Guerra de Canudos
em 1897.
Com motivações econômico-sociais e
antirrepublicanas, considerando que a
república recém-instaurada era tida
como anticristã, onde a eleição de um
governo diminui o poder da igreja sobre Canhão Krupp, com calibre de 60mm, apelidado
o povo, a guerra teve o seu último de “A Matadeira”.
episódio na quarta expedição do exército
brasileiro no morro chamado de “Morro Com seu direito em mãos e uma casa
da Favela”, com seu nome derivado da própria, os soldados retornam ao Porto
abundância de árvores faveleiras no do Rio de Janeiro e vão diretamente ao
local. ministério do exército, ao final da Av.
As três primeiras expedições do exército Presidente Vargas, que fica a sombra do
contra os sertanejos culminaram em Morro da Providência.
derrota, e mesmo assim a guerra Ao retornar, constatam que o prêmio de
continuou. Os soldados convocados vitória era fictício e a promessa nunca foi
tinham como promessa do exército concretizada, o que leva os soldados a
brasileiro uma casa própria na vitória subirem o morro de granito que possui
desta guerra. milhões de anos de existência.
Isso leva a quarta expedição do exército Sem moradia, após guerra, e com o
brasileiro contra os sertanejos do arraial, soldo atrasado, os soldados são levados
o exército brasileiro colocou o canhão a improvisar suas moradias, e com as
chamado de “A Matadeira” no morro e caixas de madeira dos canhões Krupp
mirou na igreja de Canudos, no ataque que foram levados à guerra, improvisam
final que arrasou o arraial evangélico casas de madeira pelo morro para morar
liderado por Antônio Conselheiro. em conjunto com as vivandeiras,
mulheres que os acompanharam tanto
na Guerra de Canudos, quanto no
retorno ao Rio, e os auxiliaram
preparando e aquecendo seus
alimentos, como cuidando em situações
de enfermidade.
Ao subir o Morro da Providência, com a
mesma cruz que foi retirada da Igreja de
Canudos, construíram um campanário e
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Favela: Uma análise extensiva
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em alguns casos até por cima do
córrego, se tornando o local onde são
despejados os dejetos humanos e são
utilizados como esgotos domésticos.
Devido ao ambiente nocivo à saúde, a
intervenção em favelas que
acompanham os córregos significa a
remoção de suas famílias do local.
Favela Heliópolis
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Favela: Uma análise extensiva
Referências Bibliográficas
ZYLBEBERG, SONIA. Morro da
Providência - Memórias da Favela. Rio
de Janeiro, Editora Prefeitura do Rio de
Janeiro, 1988.
GOULART, JOSÉ ALÍPIO. Favelas do
Distrito Federal. Rio de Janeiro, Editora
IBGE, 1957.
ROCHA, OSWALDO PORTO. A era das
demolições. Rio de Janeiro, Editora Sec.
Municipal de Cultura do RJ, 1995.
BACKHAUSER, EVERALDO.
Habitações Populares. Rio de Janeiro,
Editora Imprensa Nacional, 1906.
BUENO, EDUARDO. Brasil: Uma
História. Rio de Janeiro, Editora Leya,
2013.
LESBAUPIN, HENRI MICHEL. Sobre
Favelas. Disponível em:
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GEOGRAFIA URBANA E O This article seeks to highlight how the
CAPITALISMO: RELAÇÃO inherent inequalities of capitalist
development have enabled the structural
CENTRO E PERIFERIA
heterogeneity of society, dividing them
on the basis of socially constructed
OLIVEIRA,
criteria, generating a disproportionate
Thaina Fernanda
division of the benefits accumulated
C.L. de
among the social classes, where a
Estudante de
favored minority is at the top and the less
Arquitetura, pela
fortunate, are closer to the base.
Universidade
Proposing a reflection, on the whole
Cidade de São
development process and its
Paulo.
consequences on the basis of
urbanization and capitalism, which did
Resumo not take place with the same proportion
O presente artigo procura destacar como and degree of growth, thus promoting an
as desigualdades inerentes do unequal development and large social
desenvolvimento capitalista, conflicts.
possibilitaram a heterogeneidade Keywords: Urban geography,
estrutural da sociedade, dividindo-as urbanization, industrialization,
com base em critérios socialmente capitalism, uneven development, center
construídos, gerando uma divisão and suburb.
desproporcional dos benefícios Introdução
acumulados entre as classes sociais, A fixação do homem a terra possibilitou
onde uma minoria favorecida encontra- a criação de grupos homogêneos e
se no topo e os menos favorecidos, autossuficientes, originando uma
encontram-se mais próximos da base. sociedade de classes, que proporcionou
Propondo uma reflexão, sobre todo a classe dominante, a possibilidade de
processo de desenvolvimento e suas ampliar territorialmente seu domínio. Foi
consequências com base na nesta época que ocorreu um intenso
urbanização e capitalismo, que não se intercâmbio entre vilas e pequenas
realizaram com a mesma proporção e cidades.
grau de crescimento, promovendo Mesmo que o processo de aglomeração
assim, um desenvolvimento desigual e não tenha sido simultâneo em todos os
grandes conflitos sociais. lugares, a apropriação rápida e definitiva
Palavras-chave: Geografia Urbana, que o capital fez do solo urbano, com
Urbanização, Industrialização, todas as consequências daí decorrentes
Capitalismo, Desenvolvimento desigual, para a distribuição dos espaços entre as
Centro e Periferia classes sociais, foi decisiva para
Abstract
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Favela: Uma análise extensiva
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Favela: Uma análise extensiva
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marxismo oportunidade de ampliar a 1930 por Leon Trotsky [1879-1940] em
teoria marxista dentro da esfera “A História da Revolução Russa”
geográfica para que possa ser (TROTSKY, 1977).
compreendida e aprofundada, Para Karl Marx, a luta de classes é o
demarcando o que é o capitalismo, meio pelo qual a história progride. A
devido a fatores acidentais e casuais do classe que dispõe dos meios de
desenvolvimento geográfico. A produção material dispõe igualmente
descrição dos territórios e sua dos meios de produção intelectual, de tal
diferenciação faz parte dos objetivos que modo que o pensamento daqueles a
a geografia se coloca desde os quem são recusados os meios de
primórdios. O modo de produção do produção intelectual está submetido
espaço geográfico sob o capitalismo se igualmente à classe dominante.
dá fundamentalmente como produção de A teoria do desenvolvimento desigual
desigualdades e, por conseguinte, do não só se dirige a geografia, como
desequilíbrio, gerado pelas contradições também as questões políticas. O
estruturais desse modo de produção, movimento do capital entre as escalas
constituída no arranjo urbano, que gera a igualização e a diferenciação dos
compõe sua própria lógica de níveis e condições de produção. A
funcionamento. David Harvey ressalta: imobilização do capital produtivo em sua
"(…) O desenvolvimento da economia de forma material não é nem menos
espaço do capitalismo está cercado de necessária do que a circulação do capital
tendências contrapostas e como valor. Possibilitando ver o
contraditórias. As barreiras espaciais e desenvolvimento desigual do capitalismo
as distinções regionais precisam ser como expressão geográfica da
derrubadas. Mas os meios para atingir contradição fundamental entre o valor de
esses objetivos envolvem a produção de uso e o valor de troca. A noção de
novas diferenciações geográficas que economia está assentada sobre a
criam novas barreiras espaciais a serem organização da produção material, o que
superadas. A organização geográfica do explicaria o uso do conceito, mesmo
capitalismo internaliza as contradições para sociedades nas quais não há
dentro da forma de valor. É isso que quer predominância do mercado. Quanto
dizer o conceito do inevitável maiores as disparidades
desenvolvimento desigual do socioeconômicas entre as classes
capitalismo. (HARVEY, 2013, p. 528)." sociais, maiores são as diferenças nas
As análises da realidade a partir da moradias, nos serviços públicos e na
verificação do desenvolvimento desigual qualidade de vida.
do capitalismo são atribuídas de As cidades têm na sua estrutura as
sobremaneira ao marxismo, desde Marx, marcas de uma organização política,
Engels e Lenin. Mas só é nominada e econômica e social. O Estado não é mais
defendida como lei geral da história em do que a forma de organização que os
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Favela: Uma análise extensiva
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trabalhadores, indo direto para as mãos contrário dos Estados Unidos, as áreas
dos proprietários do empreendimento. periféricas das cidades não são
Como existem poucos proprietários que habitadas pela classe média afluente,
recebem a mais-valia e muitos mas predominantemente por pessoas
trabalhadores assalariados que pobres, uma vez que o padrão de
repartem o restante da renda distribuição espacial da população de
proveniente da produção, forma-se a diferentes grupos de renda no Brasil e na
desigualdade social capitalista, na qual América Latina é invertido, com os
poucos dispõem de muito dinheiro e grupos mais ricos ocupando o núcleo.
muitos dispõem de pouco. Essa pequena A dinâmica das grandes aglomerações
elite privilegiada, proprietária dos meios diferencia-se do que ocorria nas formas
de produção, foi chamada de burguesia, antigas.
e a grande massa de trabalhadores que “Em São Paulo, periferia tem um
compõem a mão-de-obra foi chamada de significado específico. Reflete a visão
proletariado, sendo que, ao longo dos dual que o senso comum atribui ao
anos, com a complexificação das espaço urbano. Geograficamente
relações sociais, outras classes foram significa as franjas da cidade. Para a
surgindo. sociologia urbana, o local onde moram
No livro Capitalismo e Urbanização, os pobres, em contraposição à parte
Maria Sposito ressalta que a própria central da cidade, estruturada e
origem da estrutura de classes é acabada. Existem exceções, é claro,
controversa, isto é, ela tanto poderia ter empreendimentos imobiliários de luxo
surgido a partir da diferenciação interna que também podem ser encontrados nos
da comunidade, que estaria se limites da cidade, assim como cortiços
constituindo em urbana, quanto da nas áreas centrais – porém jamais
dominação do urbano sobre o não seriam identificados como ‘periferia’”
urbano. E que o crescimento (Mautner, 1999, p. 253).
populacional urbano e a A grande questão é que, desde as
superconcentração de capital nacional e construções das civilizações durante o
internacional nas metrópoles para a período neolítico, quando as sociedades
criação da infraestrutura necessária à passaram a viver dos excedentes que
reprodução capitalista, promoveu um produziam, as diferenças sociais
aumento crescente da população não começaram a surgir. O problema, nesse
empregada que se "aloja" e não "habita" caso, é a intensificação da pobreza e da
nos maiores centros urbanos falta de equidade nas condições
oferecidas para que os diferentes
Centro e periferia indivíduos possam produzir suas
No Brasil o termo periferia carrega um próprias condições de sobrevivência.
significado pejorativo, uma vez que O teórico Jean-Jacques Rosseau
representa um território de pobreza. Ao afirmava que a desigualdade é um
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Favela: Uma análise extensiva
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da cidade, fazendo com que os O processo de urbanização elaborado ao
moradores com menor poder aquisitivo longo dos anos, causou um processo de
procurem moradias com valores segregação, levando uma quantidade
acessíveis, porém, em áreas distantes e cada vez maior de famílias a deixar as
desprovidas de infraestrutura. Esse áreas mais centrais da cidade e se
processo está relacionado a dinâmica dirigirem à periferia. Esta, desprovida de
das cidades, elas crescem e não uma infraestrutura adequada e distante
agregam todos os moradores de forma da vida produtiva da cidade, faz com que
semelhante, sua expansão causa a a vida destas se torne muito difícil. Essa
expulsão dos pobres do centro e os situação se mantém porque permite
segrega em regiões pouco lucros sempre crescentes a um pequeno
desenvolvidas. Os bairros periféricos, ou grupo: representantes do Estado,
as “periferias”, onde se encontra a maior empresários, construtoras, loteadoras,
parte da população mais pobre, estão imobiliários e demais participantes deste
localizados, comumente, mais afastados mercado, intensificando seus ganhos e
dos centros das cidades. aumentando a concentração de renda,
de forma que seja impossível uma
Considerações Finais reviravolta.
O desenvolvimento de uma nação Políticas criadas pelo Estado só
historicamente atrasada conduz, minimizam essa situação, dando aos
necessariamente, a uma combinação moradores uma falsa sensação de
original das diversidades. As inúmeras posse. Acreditam que, mesmo tendo
transformações ocorridas no capitalismo dificuldades, agora possuem um terreno
global nos últimos anos põem à prova e uma casa, mesmo que sejam distantes
todas as teorias sobre o dos serviços básicos. Parece que é de
desenvolvimento periférico capitalista, interesse do governo retirar tais pessoas
um dos motivos seria a incapacidade de do cenário político, diminuindo suas
definir quais são as novas fronteiras da reivindicações, para poder assim, se
periferia, e sobre quais novas condições concentrar em outros setores.
econômicas, sociais e políticas Os bairros pobres são vistos hoje como
poderíamos definir que uma região ou uma bomba pronta a explodir. Os níveis
pais e periférico ou central. Para de criminalidade estão cada vez maiores
acontecer a inserção de uma e a qualidade de vida cada vez pior. Eles
determinado país no mundo globalizado, necessitam de uma atenção especial do
onde a flexibilização da produção Estado com programas emergenciais
interfere de maneira perversa na que busquem minimizar os problemas
estrutura produtiva, o obriga a pensar em mais graves, e propor a elaboração de
quais seriam as vantagens competitivas projetos que permitam uma solução
necessárias para consolidar uma maior viável a essas regiões.
produtividade de suas empresas.
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Favela: Uma análise extensiva
Referências Bibliográficas
SANTOS, M. A Urbanização Brasileira. 3
ed. São Paulo: HUCITEC, 1993.
SPOSITO, Maria Encarnação.
Capitalismo e Urbanização. São Paulo:
contexto, 1988.
LOPES, Juarez Rubens Brandão.
Desenvolvimento e Mudança Social, 3
ed,. 1976
LOJKINE,Jean. O estado capitalista e a
questão Urbana.
SMITH,Neil . Desenvolvimento Desigual,
1988
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geo
grafia/urbanizacao-do-brasil-
consequencias-e-caracteristicas-das-
cidades.htm
https://www.portalsaofrancisco.com.br/geog
rafia/geografia-urbana
https://brasilescola.uol.com.br/geografia/geo
grafia-urbana.htm
https://www.todamateria.com.br/geografia-
urbana/
https://www.archdaily.com.br/br/763172/ma
pas-a-urbanizacao-no-mundo-entre-1950-e-
2030
http://educacao.globo.com/geografia/assunt
o/urbanizacao/urbanizacao-brasileira.html
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C/ONCENTRAÇÃO metropolitanas brasileiras são áreas que
COMERCIAL: RELAÇÃO pouco se investe na infraestrutura,
exceto pelos empreendimentos
CENTRO E PERIFERIA
habitacionais massificados implantados
a partir do final dos anos 1960, o que
MONTALVÃO, teria levado à constituição de espaços de
Lainy condições de vida bastante precárias.
Estudante de Interesses de produtores do setor
Arquitetura, pela privado e público do estado teriam
Universidade levado à construção de espaços
Cidade de São metropolitanos caracterizados por um
Paulo. fator decrescente de condições de vida,
inserção no mercado de trabalho e
acesso à renda do centro para as
periferias. Os espaços periféricos seriam
os mais distantes e de menor renda
A formação das populações urbanas é diferencial, ocupados pela população de
consequência de uma relação de mais baixa renda e inserida de forma
humanidade e complexidade social que mais precária no mercado de trabalho.
ainda não foram atingidas, as cidades
foram crescendo de forma desordenada Esse padrão espacial de carências e
e sem o planeamento urbano de uma segregação social representaria o
distribuição setorizada que atende as “modelo metropolitano brasileiro”. Para
necessidades da população em diversas algumas pessoas, este padrão de
áreas e extremidades de uma capital. produção dos espaços periféricos estaria
Um exemplo claro é a concentração do dentro dos espaços mais dinâmicos da
setor industrial em áreas específicas da metrópole do subdesenvolvimento
cidade, como o comércio no centro e as industrializado espaço central nos
fábricas e indústrias em metrópoles, processos de reprodução da
assim causando um deslocamento em industrialização de baixos salários. Se
grande proporção de pessoas da havia consenso com relação às
periferia ao centro em busca de trabalho, péssimas condições de vida nas
à medida que o centro da cidade se periferias e, em termos mais gerais, aos
transforma em núcleo administrativo e conteúdos concretos de cada espaço da
comercial, aumenta a valorização metrópole, os processos produtores do
desmedida dos terrenos centrais, o que espaço eram objeto de descrições
obriga a população trabalhadora a diversificadas e nem sempre
procurar moradias em áreas cada vez compatíveis. Para alguns autores, a
mais distantes do centro. ausência de intervenções públicas nos
Estudos urbanos apontam que entre os espaços periféricos seria produto de
anos de 1970 e 1980, as periferias
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Favela: Uma análise extensiva
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integração econômica, social e política
do território nacional.
Essa concentração causa prejuízo na
qualidade urbana da periferia, como
áreas verdes e mobilidade, o centro é
preferência para alterações pelas
prefeituras.
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Favela: Uma análise extensiva
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isolamento e a distância de cidade
Tiradentes também prejudica as áreas
da saúde e lazer.
As deficiências da infraestrutura física e
social descritas acima, são indicadores
expressivos do crescimento
desordenado e não planejado da área
metropolitana paulista, vendo a
complexidade e extensão dos diversos
problemas como, sistema viário, áreas
Cidade Tiradentes, zona leste SP
verdes, áreas de lazer e meios de
transporte necessários para ligar e
Já o outro exemplo, o bairro de cidade igualar as centro-periferia. Para isso
Tiradentes, localizado na zona leste da propõe soluções e uma orientação
capital paulista, onde habitação é conjunta metropolitana, o que exige
predominante fazendo com que as grande investimento, em São Paulo, há
pessoas se locomovam em uma extensas periferias distantes do centro
distância muito grande para trabalhar, e com características de empobrecimento,
sobrecarregando o transporte público, mas ao mesmo tempo, o centro
onde se utiliza o ônibus para acessar os geográfico da cidade também apresenta
demais meios de transporte, para essas características. a diferença é o
acessar serviços, muitas vezes as acesso a equipamentos públicos,
pessoas preferem ir a Mauá e Ferraz de culturais e infraestrutura urbana, que não
Vasconcelos, cidades vizinhas e mais existem nas regiões mais afastadas. Ao
próximas do que o centro de São Paulo. longo das décadas, o verdadeiro centro
O problema é que para esses locais não de São Paulo, o financeiro, ao redor do
há transporte direto. Para conseguir qual orbitam os investimentos públicos e
chegar a essas cidades os moradores privados e as vagas de emprego se
improvisaram, de forma irregular, deslocou duas vezes. Primeiro, passou
pequenas estradas por dentro da mata. da região da Praça da Sé para a Avenida
Cidade Tiradentes, apesar de ser Paulista. Depois, se estabeleceu no
um dos 10 mais populosos de São Paulo, perímetro entre a Paulista e a várzea do
ainda guarda características de cidade rio Pinheiros, entre as avenidas Faria
dormitório. Não há emprego para todo Lima, Luiz Carlos Berrini e Chucri
mundo na região. Em 2014, segundo Zaidan, e deve se estender pelas
dados da Rede Nossa São Paulo, são Nações Unidas até a Avenida Interlagos.
cerca de 6 mil postos de emprego, quase Nesse ponto, o crescimento do espaço urbano
para as áreas periféricas resulta de uma
mil a menos do que em 2013. É o distrito
necessidade “imposta” pelo próprio crescimento
com menor proporção da cidade, em especial de sua zona comercial.
população/emprego da capital paulista o Entretanto o que se tem notado em grande parte
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Favela: Uma análise extensiva
Referências Bibliográficas
Livros:
Industrialização e concentração
econômica em São Paulo.
Henrique Rattner
Cidades A urbanização da
humanidade. Kingsley Davis
Cidades e questões sociais. Dirce
Koga, Eliane Ganev e Eunice Fávero
A leste do centro. Regina Maria
Prosperi Meyer e Marta Dora Grostein
Avaliação em planejamento
urbano. Vitor Manuel Araújo de Oliveira
Sites:
www.brasildefato.com.br/node/27
076/
cbn.globoradio.globo.com
www.revistaforum.com.br
periferiaemmovimento.com.br
www.uvanet.br
www.scielo.br
25
A BAIXA IMPLEMENTAÇÃO DE Este trabalho parte da procura por
PROJETOS DE URBANIZAÇÃO referências de projeto de Urbanização de
Favelas dentro dos campos da
DE FAVELAS
arquitetura, urbanismo e desenho
urbano. Por comparação com outros
ESTEVES,
deparamo-nos com uma menor
Verônica
quantidade de conteúdo reproduzido em
Estudante de
revistas ou livros sobre o tema,
Arquitetura,
sobretudo com exemplos gráficos de
pela
projeto ou sua concretização efetiva no
Universidade
território, o que dificulta a possibilidade
Cidade de
de reflexão ou aprendizado sobre a
São Paulo.
Urbanização de Favelas.
Apesar do conhecimento acumulado e
das técnicas desenvolvidas desde os
Resumo
primeiros registros nos anos 70 no Rio
Este trabalho propõe uma reflexão sobre
de Janeiro, e do Brasil ser uma das
a baixa implantação de projetos de
referências mundiais neste tipo de
Urbanização de Favelas. Trata-se de um
intervenção, a relevância dada à
reconhecimento, mas também a
Urbanização de Favelas ainda não
apresentação de uma retrospectiva das
alcançou a centralidade no empenho
técnicas e metodologias desenvolvidas
orçamentário em gestões públicas
por técnicos, muitas vezes pioneiros no
municipais e estaduais, e em faculdades
seu campo de atuação e o impacto que
de arquitetura e urbanismo e noutros
os mesmos causaram com a sua ação.
centros de formação e pesquisa, o que
Palavras Chave: Urbanização de
foi revelado pelo conjunto dos trabalhos
Favelas, Arquitetos Militantes.
sobre o tema no último Encontro
Nacional de Planejamento Urbano (XVI
Abstract
ENANPUR, 2015).
This work proposes a reflection on the
Encontramos algumas reflexões em
low implantation of Slum Urbanization
autores ou em centros de estudo
projects. It is a recognition but also the
específicos, mas onde os trabalhos e
presentation of a retrospective of the
pesquisa versam sobretudo as políticas,
techniques and methodologies
os programas, até os parâmetros de
developed by technicians, often pioneers
intervenção, mas muito pouco é
in their field of action and the impact they
dedicado à reflexão sobre o exercício
have caused with their action.
projetual e a avaliação das práticas de
Keywords: Slum Upgrading processes,
intervenção.
Militant Architects
Introdução
26
Favela: Uma análise extensiva
27
projetos de arquitetura, ela não é, no ameaçadas por posturas que implicavam
entanto, inexistente. Quando aparecem a sua remoção e expulsão dos lugares
em revistas e livros, projetos de onde moravam ou passaram a
Urbanização de Favelas, destacam-se reconhecer e exigir o seu direito de
pelo desenho dos espaços livres ou atendimento pelos mesmos serviços que
projetos de produção habitacional o resto da cidade.
desenhados para reassentamento das
famílias removidas. Encontramos As experiências de Urbanização de
também alguma divulgação de Favelas que procurávamos seriam
concursos de arquitetura sobre o tem, aquelas que entendem a intervenção
mas que têm parca repercussão como como um exercício de reforma de um
experiência e poucos foram os que se tecido já construído. Um tecido com valor
efetivaram no território. histórico, físico, cultural e social, e que a
partir da intervenção física esse valor é
Referências, que referências? reforçado. Procuramos as experiências
Nos interessava encontrar as soluções que se aproximavam de intervenções de
implementadas no território e aquelas relação e decisão horizontal, onde o
mais realistas e próximas perante esse respeito pelos seus moradores
mesmo território. Não aquelas apareceria no processo e no produto.
amplamente publicizadas e que, ao
mesmo tempo, aparentavam um
afastamento da realidade. A ‘imersão’: a leitura a partir da
Reconhecendo a existência de um importância das particularidades
acúmulo de experiências históricas O conhecimento quase pessoal dos
desenvolvida por gestões públicas, lugares e colaboração com os seus
arquitetos e outros técnicos moradores impacta em todas as
progressistas desde os anos 70 e que se decisões de projeto e obra. Esta
vêm perpetuando e desenvolvendo até capacidade de percepção de detalhes,
aos dias de hoje, nos propusemos a muitas vezes escondidos, não deixa de
encontrar os desenhos técnicos, as sugerir uma composição entre as
ferramentas e métodos utilizados nessas experiências vividas e uma sensibilidade
experiências, para conseguirmos refletir de “olhar técnico” dos personagens
a partir delas. É importante lembrar que selecionados para entrevista.
estes técnicos e o desenvolvimento Estes técnicos privilegiam que o
destas práticas está intrinsecamente processo seja feito com grande
ligado, na sua origem, às lutas das proximidade com os territórios e as
populações mais pobres, aquelas comunidades atingidas. O arquiteto
excluídas das áreas regulares da cidade, Manoel Ribeiro chama isto de “imersão”.
para estes territórios de conflito, e que Para uma leitura adequada das
em determinado momento se viram características, o arquiteto defende a
28
Favela: Uma análise extensiva
29
para a melhoria das habitações. Ou
Milton Nakamura que em diálogo com o
escritório contratado para o projeto de
urbanização do Chafik em Mauá, o
Tereza Arquitetos, designaram uma
equipe específica para levantamento das
necessidades e propostas de
intervenção habitacional.
As leituras são também marcadas por
outras formas de olhar, dando um
destaque para as questões sociais,
como é o caso da influência da
antropologia sobre estes sujeitos. No
caso do Manoel Ribeiro no projeto da
Serrinha, ele afirma a necessidade de
conhecer profundamente não só o
espaço e suas necessidades infra
estruturais, mas acima de tudo as
Edifício onde foi implantado o escritório MTA diferentes culturas dos seus moradores.
dentro da Rocinha. Fonte: PRÓPRIA, 2016
Esse conhecimento foi determinante na
tomada de decisão sobre as propostas
Neste contexto, estes técnicos
de usos e espaços comuns, e até, em
compreendem estes territórios nas suas
decisões de aberturas de ruas e
particularidades, sem perder a noção da
conexões entre diferentes áreas da
amplitude da problemática, não só na
favela.
individualidade das características da
Em Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, em
favela, mas também o respeito pelas
colaboração com os arquitetos Vera
individualidades das edificações e das
Tângari e Jonathas Silva, eles assumem
suas famílias. Assim, a defesa pelas
a influência antropológica quando
melhorias habitacionais como parte do
procuram conhecer a favela através da
processo de intervenção em favelas é
leitura dos moradores mais velhos.
assumida por grande parte destes
Podemos admitir a influência direta da
técnicos, que procuram até incluí-las na
forma de atuação do arq. Carlos Nelson,
sua proposta. É o caso da Peabiru TCA
conhecido pessoal de Manoel Ribeiro e
que não aceitando que o término do seu
Toledo. Carlos Nelson fez a sua
trabalho de projetista está no desenho da
especialização na faculdade de
infraestrutura e espaços coletivos, tem
Antropologia da UFRJ, é conhecido
trabalhado de acordo com as Prefeituras,
inclusive pela sua autodesignação como
especialmente a Secretaria de
“Antropoteto”, um arquiteto que também
Habitação de São Bernardo do Campo,
é antropólogo (SANTOS, 1980).
no sentido de pensar kits de intervenção
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Favela: Uma análise extensiva
31
devem ser utilizados no sentido da Carlos Nelson Ferreira dos Santos, em
superação daquelas formas de atuação Brás de Pina, no Rio de Janeiro, nos
e melhor procedimento junto às anos 70, recuamos até essa experiência
comunidades e seus territórios tomando-a como parte do quadro
ocupados. montado. Aos restantes arquitetos
O próprios processos investigativos e escolhidos, chegamos através de
críticos das assessorias técnicas pesquisa bibliográfica e empírica, pela
estudadas demonstram esse espírito rede de contatos montada6 com atuação
crítico característico dos arquitetos em Urbanização de Favelas
militantes. Como metodologia de análise foi
utilizada a entrevista aos arquitetos
Os sujeitos selecionados, a análise da sua produção
Como já abordamos, a ação destes gráfica, a visita aos casos de estudo
sujeitos encontra-se pouco (sempre que possível), a revisão
sistematizada. Reconhecemos que bibliográfica realizada sobre os casos de
apesar da experiência acumulada, estudo e a recolha de outras informações
poucos destes sujeitos se dedicaram à que puderam contribuir para o
divulgação desse trabalho (pelo menos conhecimento do processo. Pedimos
de forma propagandística), e que cada um dos sujeitos tivesse
compreendemos que para a recolha presente duas experiências de
desse conhecimento precisaríamos de Urbanização de Favelas, uma mais
uma abordagem pessoal de forma a recente, outra mais antiga, selecionada
revelar o conhecimento concentrado nos por ele mesmo, para que pudéssemos
próprios sujeitos. comparar processos. Nem sempre as
Para uma leitura temporal selecionamos experiências são claras e denominadas
alguns arquitetos com mais de 15 anos como Urbanização de Favelas, ou os
de experiências em Urbanização de processos se finalizam, daí,
Favelas, mas também com trabalho apresentamos apenas uma experiência
recente. E focamos nas regiões do Rio para alguns arquitetos.
de Janeiro e São Paulo, considerando Buscamos ultrapassar as
estas como regiões concentradoras de individualidades no sentido da atuação e
grande volume de práticas, que são personificação dos sujeitos, procurando
também referência em diferentes nos discursos e material de análise,
momentos da história das intervenções pontos de contato ou semelhança e/ou
em assentamentos precários no Brasil. afastamentos, que validem ou reprovem
Considerando que este quadro de a teoria da influência de uma forma de
arquitetos militantes se inicia num marco atuação que definimos como militante na
referencial histórico, a atuação dos história da Urbanização de Favelas.
Quadra Arquitetos, mais
especificamente a atuação do arq.
32
Favela: Uma análise extensiva
33
e Pesquisa em Planejamento Urbano e
Regional, Belém.
DENALDI, Rosana (2003). Políticas de
urbanização de favelas. São Paulo,
FAUUSP (tese de doutoramento).
FERREIRA, Paulo Emílio Buarque
(2015). Urbanização de favelas:
metodologias e ação no contexto
contemporâneo (Proposta de Sessão
Livre). Belo Horizonte: XVI ENANPUR.
I URBFAVELAS (2014). Anais do I
URBFAVELAS _ Seminário Nacional
sobre Urbanização de Favelas. São
Bernardo do Campo: UFABC. Disponível
em
http://www.sisgeenco.com.br/sistema/ur
bfavelas/anais/
LEITÃO, Karina Oliveira e FERREIRA,
João Sette Whitaker (2012). Aspectos
Físicos, Urbanísticos e Arquitetônicos.
In: MAGALHÃES, F.; VILLAROSA, F.
(editores). (Org.). Urbanização de
Favelas: Lições Aprendidas no Brasil. 1
Ed. São Paulo: Fupam, V., P. 1-48.
MAGALHÃES, F., VILLAROSA, F.
(2012). Urbanização de favelas: lições
aprendidas. Banco Interamericano de
Desenvolvimento.
34
Favela: Uma análise extensiva
35
músicas nada mais do que sua
realidade.
Se um cantor aborda em suas letras
temas de violências, é porque ele vive
aquilo, é aquilo que a favela tem para
oferecer. Abordam-se temas de estupro,
é porque ele cresceu vendo esses atos,
nos noticiários ou no seu cotidiano.
Tema de desigualdade é reflexo da falta
de oportunidade que as pessoas que
37
Diversas pessoas sofrem com a falta de De acordo com o último levantamento
moradia regular e consequentemente falta feito pelo Instituto Trata Brasil, (maio
de saneamento básico. O esgoto é 2016), nas 100 maiores cidades do país
depositado em rios próximos, ou jogado em cerca de 90% dos esgotos de áreas
qualquer dentro da comunidade, o que
irregulares não são coletados e nem
propicia o aumento de doenças infecciosas.
tratados. Os serviços de água
geralmente não chegam a essas
localidades, e o estudo detectou que
nestes 100 maiores municípios parte do
abastecimento é fruto de furtos de água.
Diferente das regiões ricas das cidades,
essas áreas não possuem garantia de
regularização, a água não é tratada, o
lixo não é recolhido, existem ligações
clandestinas que podem contaminar a
água, o esgoto permanece a céu aberto
São muitos desafios que se põe à frente
do país, o saneamento básico é um dos em frentes às casas, gerando contato
maiores. De acordo com o ranking mais direto com crianças, adultos e animais
recente do Instituto Trata Brasil, mais de causando severas implicações para a
35 milhões de pessoas não contam com saúde como doenças gastrintestinais e
água tratada em casa e quase cem outras.
milhões estão excluídas do serviço de A falta de saneamento básico é causa
coleta de esgotos. direta de muitas doenças e mortes em
Com a falta de saneamento, o esgoto é todo o mundo. Os países mais pobres
depositado em lixões, rios próximos e até são os mais atingidos pela falta de
dentro da comunidade. serviços básicos, como água tratada,
esgoto encanado e destinação correta
A carência do saneamento básico atinge do lixo, o que acaba interferindo
a todos, mas é certo que os maiores diretamente na qualidade e expectativa
impactos estão nas famílias de baixa de de vida da população e no seu respectivo
renda. Se já existem dificuldades de desenvolvimento.
implantar serviços de abastecimento de Na grande maioria dos casos, os mais
água e coleta de esgoto em grandes afetados pela falta de saneamento
municípios, quando se trata de áreas básico acabam sendo as crianças, em
irregulares, os desafios são ainda geral as menores de cinco anos de
maiores, mesmo em áreas que já idade, que não sobrevivem aos quadros
existem há décadas. de diarreias fortíssimos. Em todo o
mundo, anualmente, cerca de 1,4
milhões de crianças morrem em
38
Favela: Uma análise extensiva
39
Em 2014, a OMS afirmou que cada dólar para a implantação do saneamento
investido em saneamento, se economiza básico e comprometem parte da
4,3 dólares investido em saúde global. A população a conviver frente às
informação mostra o quão atrelado estão dificuldades e desigualdades.
a saúde e o saneamento. Investir em um,
afeta os gastos do outro. 3 – Poluição dos recursos hídricos
Mesmo com a ONU declarando que o
2 – Desigualdade social acesso à água potável e ao saneamento
Em estudo realizado pelo Instituto Trata básico é um direito essencial do ser
Brasil em 2016 nos 100 maiores humano, ainda há muitas pessoas não
municípios do país, constatou que 90% sabem o que é possuir água tratada em
dos esgotos em áreas irregulares não suas residências.
são coletados nem tratados. Ademais, os
serviços de abastecimento de água não Como já discutido acima, em muitas
chegam nesses locais. Portanto, a água localidades, esgotos correm a céu aberto
que chega vem de furto através de gerando grandes preocupações quanto
ligações clandestinas. a saúde pública. Um outro fator, é a
poluição gerada pela falta de tratamento
Os impactos dessa situação são de esgoto. E isso não só na periferia,
alarmantes: esgotos correndo a céu mas também nos grandes centros devido
aberto, ligações ilegais na canalização à industrialização.
que contaminam a água e lixo sendo
jogado em locais inapropriados. Estes, Na periferia, devido à restrição do
são cenários que contribuem tanto para acesso ao saneamento, os esgotos
a proliferação de doenças quanto para a sanitários e o lixo doméstico são
desigualdade social. frequentemente jogados nos rios sem
qualquer tratamento. Em contrapartida, o
As habitações em áreas irregulares, os crescimento industrial também contribui
vazios urbanos e o rápido crescimento para a poluição hídrica visto que muitas
populacional dificultam o acesso aos empresas burlam a legislação e lançam
serviços básico. A falta de planejamento resíduos industriais nas águas sem, ou
atinge diversas camadas da população. parcialmente, algum tratamento.
Porém, estudos apontam que as classes
de baixa renda são as mais afetadas. Com isso, tem-se uma quantidade
absurda de águas poluídas. Em um
Em geral, as áreas irregulares, com estudo realizado pela ONG SOS Mata
riscos de deslizamentos e inundações, Atlântica, no ano de 2016, em 111 rios
são excluídas do planejamento, visto a brasileiros revelou que quase 24% das
dificuldade técnica para levar esse águas são de qualidade ruim ou
serviço. Dessa forma, criam-se barreiras péssima. Segundo a lei, águas nessa
40
Favela: Uma análise extensiva
situação não podem sequer receber O lixo está entre os principais problemas
tratamento para consumo humano ou nos grandes centros urbanos devido a
para irrigação de lavouras. destinação incorreta. Os lixões são
grandes depósitos a céu aberto com
Nesse contexto, tem-se outra questão: a grande probabilidade de contaminação
redução da água potável disponível. O do solo e infestação de doenças. Além
crescimento populacional demanda disso, as chuvas contribuem para o
maior quantidade de água para carregamento do lixo para às cidades e
consumo. Porém, tem ocorrido o para a contaminação da água.
contrário. Pesquisas realizadas pela
UNESCO, mostram que o consumo de 5 – Improdutividade
água aumenta numa proporção de duas Em 2014, o Instituto Trata Brasil realizou
vezes o crescimento populacional. um estudo em parceria com o Conselho
Empresarial Brasileiro para o
Dessa forma, a situação é alarmante: por Desenvolvimento Sustentável (CEBDS)
um lado tem-se a falta de saneamento e denominado “Benefícios Econômicos da
a poluição dos corpos hídricos. De outro, Expansão do Saneamento Brasileiro”.
a maior demanda por água potável. O Os resultados apontam perda de
que se sabe é que é necessário bom produtividade e renda devido à falta de
planejamento para ambos os problemas. saneamento básico.
Tanto para garantir a universalização do
saneamento, quanto para preservar a Esse estudo mostra tudo o que já foi
disponibilidade de água para o consumo tratado ao longo deste texto. O acesso
humano. ao saneamento básico melhora a saúde,
evita doenças, mortes e amplia
4 – Poluição Humana oportunidades econômicas e a
Uma das vertentes do saneamento produtividade.
básico é a limpeza urbana e o manejo
correto de resíduos sólidos. Com a Segundo a pesquisa, a renda per capita
crescente urbanização, isso nem sempre do Brasil aumentaria em 6% se todos os
ocorre em sua totalidade. brasileiros tivessem os serviços básicos.
O destino adequado para o lixo urbano é Além disso, 11% das faltas do
o aterro sanitário. O aterro contém trabalhador estão relacionadas a
estrutura para o tratamento de gases e problemas causados por falta de
chorume, incineração ou coleta seletiva. saneamento. 217 mil trabalhadores se
Mas, por tratar de grandes afastam de suas atividades anualmente
investimentos, as gestões públicas devido a problemas gastrointestinais
acabam deixando de lado essas práticas ligados à ausência de saneamento.
gerando péssimas consequências.
41
Isso afeta diretamente na economia: ao com cheiro.
ter acesso a rede de esgoto, um <https://projetocolabora.com.br/agua/um
trabalhador aumenta sua produtividade a-em-preto-e-branco-com-cheiro-do-
em 13,3% e resulta em 3,8% de ganho saneamento-nas-favelas>. Acessado
salarial por diminuição das faltas. Não em 25/05/2018.
obstante, a universalização dos serviços
básicos valoriza em média 18% o valor CAVINATTO, Vilma Maria. Saneamento
dos imóveis. básico: fonte de saúde e bem-estar.
Editora Moderna. 1995.
As crianças não ficam de fora das
estatísticas. O estudo mostra que o
saneamento também melhora o
rendimento escolar das crianças, pois
diminui as faltas devido a internações.
De acordo com a Águas Guariroba, 65%
das internações hospitalares em
crianças menores de 10 anos estão
ligadas à falta de saneamento.
Referências Bibliográficas:
42
Favela: Uma análise extensiva
43
Novos perfis se revelam e outras para os serviços públicos nas
perspectivas precisam ser avaliadas. Em comunidades.
um momento de crise, a economia “o endereço não é apenas um endereço,
desacelera, mas a vida não para. Ainda ele identifica você como um cidadão. Se
há trabalho, mão de obra e mercado a pessoa tem um endereço, ela existe e
consumidor. passa a cobrar do governo coisas como
saneamento básico e transporte”.
Há muito negócio a ser feito, e de Pensando em políticas públicas para as
maneira igualitária, onde é possível favelas brasileiras, a questão é trazer
oferecer serviços de qualidade e contar mais produtos e serviços para os mais
com pessoas que trabalham, ganham pobres com menos recursos. O Estado
seu dinheiro e o reinvestem como pode muito, mas não pode tudo. O que
conseguem, de acordo com aquilo que falta? Vontade política? Pensar em um
lhes é oferecido. prazo além da próxima eleição? Enxugar
o orçamento e investir nos setores
Dito isto, os desafios ainda são enormes. carentes? Além de tudo isso, é preciso
A população das favelas ainda busca a construir um diálogo que envolva
maior parte dos bens e serviços básicos diversos setores no país. A questão da
fora delas, no asfalto. A favela é famosa favela é a informalidade, mas como a
por ter habitações precárias que afetam política atua e encara essa
a saúde (em função do lixo descartado informalidade? que tipo de soluções para
de maneira inadequada, ausência de o problema social das favelas se aplica a
rede geral de escoamento sanitário, política ideológica. A primeira coisa que
ventilação inadequada, problemas de vem em mente é que é preciso integrar a
umidade e mofo) e decisões de trabalho favela, os que vivem na favela em
(que a maioria tem que deslocar muito comunidade, na metrópole como um
até seu local de trabalho) e a todo, mas como é perceptível as favelas
participação política. são autônomas, como sua própria
política de existência, temos como favela
Cada favela brasileira é diferente uma da a marginalidade social e econômica, mas
outra. Mas como pode se imaginar a a palavra marginalidade, vem da palavra
prioridade da maioria delas é a marginal que significa: à margem de; que
segurança pública nas favelas não segue o contorno.
pacificadas. A presença do tráfico de No sentido figurado: que foi excluído da
drogas e o conflito permanente têm sociedade ou prefere viver fora dela.
efeitos tão ou mais abrangentes que E no sentido pejorativo: Que não respeita
aqueles da moradia inadequada. Além leis; criminoso: sujeito marginal.
das fatalidades e do medo constante, os
episódios de violência são disruptivos Mas referimos favela como marginal
pois, tem difícil acesso a serviços
44
Favela: Uma análise extensiva
45
posição política. Via de regra, a revolta Tal arranjo institucional não conseguiu
difusa, e poucas vezes chega a controlar a ocupação das favelas, pois
cristalizar. O sentimento de estarem no médio prazo acabou estimulando a
sendo explorados é tão difuso nos multiplicação das associações de
estratos mais baixos, que a defesa não moradores, que passaram a ser
vai além da inação. Isso não significa, constituídas para criar favelas, seja
que não haja verdadeiras tempestades subdividindo as já existentes, seja
na política interna da favela, são raras as anexando novas áreas ao seu território.
favelas em que não haja sucessivas Neste processo, surgiram favelas-
crises políticas. Mas elas parecem ser loteamento, onde o acesso à moradia se
sempre fomentadas e resolvidas na deu por meio do mercado imobiliário
cúpula, e dificilmente mobilizam os informal.
demais estratos. A falta de participação
pode ser facilmente comprovada, na Não há dúvida de que, em certo sentido,
grande maioria das favelas, pela baixa a favela é de fato marginal. Ela é
percentagem de sócios das associações marginal, por exemplo, pela dificuldade
de moradores. O padrão de ocupação do de acesso a certos serviços urbanos, a
solo nas favelas – caracterizado por certos tipos de bens de consumo
moradias construídas pelos moradores e durável, a certas formas de comunicação
sem projeto de loteamento prévio – pôde de massa etc., embora sempre desfrute,
se desenvolver em boa medida porque em diversos graus, de tudo isso. Mas
determinadas ações governamentais essa abordagem é perigosa. Em primeiro
interferiram nos conflitos fundiários no lugar, porque tende a ignorar ou reduzir
sentido de consolidar as ocupações, mas a importância das íntimas vinculações
sem promover a regularização entre a favela e o sistema global. A
urbanística e fundiária dos terrenos. favela não é uma comunidade isolada:
Como será tratado no capítulo, embora o sua própria existência depende muito
arranjo institucional constituído na mais de determinadas condições
década de 1960 delegasse às estruturais da sociedade global do que
associações de moradores a função de dos mecanismos
controlar o processo de ocupação do internos desenvolvidos para mantê-la.
território, na ausência de regras e Em segundo, porque a noção de que a
direitos garantidos sobre o uso da terra, favela é uma “comunidade marginal” não
desenvolveu-se nas favelas um padrão passa de um julgamento de valor que,
de urbanização fundado nas por um lado, dá origem a uma atitude
necessidades básicas de abrigo e paternalista e assistencialista e, por
acesso a recursos fundamentais, como outro, fornece as bases “teóricas” para
água e energia elétrica. tentativas de imposição das normas e
valores dos grupos de classe média que
detêm o poder de escolha das “soluções”
46
Favela: Uma análise extensiva
adotadas por eles (e não pelos próprios de proprietários − isso para falar apenas
favelados), consideradas as mais em características socioeconômicas.
adequadas para aquele “problema social Apesar das flagrantes diferenças entre
das favelas”. Trata-se, assim, de uma os dois tipos de análise, inclusive em
visão deformada da realidade desses suas bases ideológicas, há um ponto
locais. comum entre elas, talvez o maior
responsável por suas deficiências:
O segundo tipo de análise considera o considerar a existência de um tipo único
favelado como um grupo particular de favelado. Na medida em que as
dentro de uma camada social, de modo favelas são categorizadas e definidas
que a favela é encarada de um ponto de como entidades especiais pela
vista muito mais global, como parte do sociedade global e, em consequência,
proletariado. Portanto, não há pelos seus próprios moradores, essa
propriamente, nesse caso, uma análise noção é, pelo menos parcialmente,
específica das condições das favelas, a aceitável. Se se pode falar em termos de
não ser um mínimo necessário para a “caráter nacional brasileiro”, apesar das
descoberta de palavras de ordem que notórias diferenças entre grupos e
possam atingir e polarizar toda a camada classes internos e de suas semelhanças
social, mas também essa perspectiva com grupos e classes de outros países,
apresenta sérias deformações. Primeiro talvez se pudesse falar também em um
porque, sem se constituir em um sistema “caráter do favelado”. Ou seja, se é
autônomo, autossuficiente e possível definir e identificar um brasileiro
independente, a favela apresenta um típico, o mesmo talvez pudesse
grau de especificidade que não deve ser acontecer com um morador de favela.
menosprezado. Ela possui formas de
organização que parecem ser Entretanto, apesar da validade que essa
exclusivas, recursos econômicos perspectiva possa ter para certos
próprios, que inevitavelmente afetam as estudos, no mais das vezes − e
atitudes e o comportamento político de especialmente naquelas de conteúdo
seus moradores. Segundo porque a político −, ela não faz senão deformar a
favela não é, de forma alguma, um grupo análise, uma vez que, além da variedade
dentro de um estrato social. Não de orientações que provêm dos
obstante muitos de seus moradores estímulos e influências recebidos no
poderem ser incluídos, não sem certa desempenho de papéis definidos fora
impropriedade, no que se poderia das favelas, não se pode ignorar que a
chamar de subproletariado, não se deve organização desses espaços é de uma
ignorar o fato de existirem aí em complexidade impressionante,
quantidade operários qualificados, proporcionando, assim, as bases
funcionários públicos, bancários, internas para uma nítida diferenciação
comerciários, além de um bom número social.
47
Qualquer análise do processo político organização que influenciam seus
nas favelas e das atitudes e membros de maneira semelhante. Outro
comportamentos dos favelados que se ponto a considerar em análises de
pretenda objetiva deve partir da noção conteúdo político é que a favela
de que a favela é uma organização apresenta uma forma de organização
transversal, isto é, tem uma base tipicamente capitalista, com uma
geográfica em geral bastante definida vitalidade econômica que chega a
que envolve uma extensa gama de espantar aqueles que com ela se
atividades e situações e apresenta defrontam. As alternativas disponíveis
profundas conexões com outras na favela para investimento e acúmulo
organizações e atividades, em uma de capital – em uma palavra, os recursos
extensão territorial mais ampla. É internos − são as mais diversas, indo da
necessário enfatizar as bases criação de animais à especulação
geográficas definidas das favelas, imobiliária e à produção de manufaturas.
porque elas permitem uma organização
com pequeno grau de burocratização e Esses recursos internos são a base
impessoalidade. Essas características sobre a qual se cristaliza, a partir de sua
organizacionais – a transversalidade e exploração econômica, uma
as relações pessoais − parecem fazer diferenciação social bastante definida,
com que as favelas funcionem como com uma burguesia favelada
espécies de agentes refratores de certos monopolizando o acesso, o controle e a
fatores da sociedade global que manipulação dos recursos econômicos,
influenciam as atividades e os além das decisões e dos contatos
comportamentos políticos de seus políticos. Raciocinar, pelo menos em
moradores. Não é ocioso explicitar que, uma análise política, em termos de um
quando me refiro a tais atitudes e tipo único de favelado é, portanto, um
comportamentos, não quero dizer que verdadeiro absurdo, da mesma forma
eles sejam exclusivos dos favelados, que o é imaginar que a favela possa
mesmo porque não conheço quaisquer assumir, em termos de atividades
estudos comparativos entre favelas e políticas nos âmbitos estadual ou
outras organizações. Refiro-me apenas federal, uma linha de ação homogênea
aos que podem ser empiricamente .Resta ainda salientar como de suma
identificados nos moradores da favela e importância o fato de que os recursos
que provavelmente são, pelo menos em internos da favela, e em consequência
parte, condicionados por sua forma de sua própria estratificação, dependem em
organização. Não é impossível, nem grande parte de fatores externos, como
mesmo improvável, que atitudes e veremos de forma resumida mais
comportamentos semelhantes adiante. Desse modo, parece que o
manifestem-se fora das favelas, poder político da burguesia favelada no
provocados por outras formas de nível estadual e no federal − derivado
48
Favela: Uma análise extensiva
49
eleitas com votações ridículas se diversidade pulveriza a capacidade dos
comparadas com o número do corpo grupos dominantes da favela de
eleitoral potencial. A ausência de pressionar, no sentido de fazer os
renovação torna-se evidente se políticos supralocais cumprirem os
consideradas, entre outras formas, as compromissos assumidos (comparem-
eleições com chapa única, bastante se estas afirmativas com as referências,
comuns; a apresentação de chapas em feitas no final do presente artigo, à
que há apenas um mero rodízio de contraposição entre os “políticos
cargos, já que todos ou quase todos os favelados” e os “políticos de nível
candidatos exerciam mandatos no supralocal”). Figurativamente, poder-se-
período anterior; os diversos casos em ia dizer que as relações de dominação-
que o presidente é reeleito subordinação apresentam o aspecto de
indefinidamente. um verdadeiro funil de intensidade
As relações entre candidatos e favelados crescente. Por outro lado, não se deve
são em geral duais. Por vezes o mesmo ignorar que, apesar de tudo, há um
candidato tem mais de um cabo eleitoral aspecto positivo nesse estado de coisas,
ou “poleiro” em uma mesma favela. tal pelo menos nas condições atuais. É que,
situação, por um lado, torna impossível se os políticos da burguesia favelada não
que as promessas do período eleitoral tivessem o controle quase total das
sejam cobradas aos candidatos eleitos camadas inferiores, por intermédio do
pela favela como um todo, o que lhes qual funcionam como mediadores quase
facilita a saída demagógica; por outro, inevitáveis das relações entre os grupos
faz com que os políticos favelados se políticos estaduais e/ou federais e a
integrem em diferentes “panelinhas” grande massa dos favelados, a situação
supralocais − que muito pouco têm a ver seria ainda pior. Isso porque os acordos
com as favelas −, uma vez que as políticos estariam em um nível ainda
camadas inferiores não exercem a mais primitivo. Muito provavelmente, os
menor pressão contra esses acordos candidatos de nível supralocal
políticos “espúrios” ou pelo menos constituem o respectivo eleitorado por
“inautênticos”. Assim, a própria “tirania” uma mera compra de votos, em espécie
exercida pela burguesia favelada, isso é, ou por intermédio de pequenos favores
a ausência de feedback, de qualquer pessoais. Um presidente de associação,
controle das camadas inferiores sobre os com grande expressão política −
acordos com os grupos políticos segundo ele próprio, “possui” 2 mil votos
supralocais, contribuiu de maneira −, disse, por exemplo, em um desabafo,
decisiva para a dominação da própria que só apoiaria o candidato que lhe
camada social superior da favela pelos ofertasse um Impala. Outro político, de
grupos e políticos supralocais. Os expressão bem menor, procurou um
acordos são, via de regra, limitados e/ou candidato que lhe resolvesse um caso de
de caráter pessoal, e sua enorme bigamia na Justiça para “despejar”
50
Favela: Uma análise extensiva
“seus” trinta e tantos votos. Da forma ouvindo. Fazemos que eles respondam
como presentemente a política interna se a uma porção de perguntas e, muitas
articula com a supralocal, os acordos, vezes, eles se atrapalham.” Fica claro
embora extremamente desvantajosos que, nessas condições, os acordos de
para os favelados e quase sempre muito cúpula ou “conchavos” são muito mais
limitados e personalistas, assumem um tranquilos para o candidato.
caráter muito mais amplo e permanente
do que os dois exemplos citados acima. Sobre esse assunto, é interessante notar
Como será visto mais adiante, não é à que as formas de controle político
toa que se multiplicam os órgãos eleitoral vigentes fora das favelas − o
“administrativos” que atuam em favelas e personalismo carismático, as palavras
que funcionam como prolongamentos da de ordem demagógicas etc. − são
política partidária nas “entressafras” substituídas, ou pelo menos reforçadas
eleitorais. O controle político da internamente, pela influência e pelo
burguesia favelada sobre as camadas prestígio derivados de relações pessoais
inferiores é percebido de maneira mais de caráter mais ou menos íntimo (que
ou menos difusa pelos próprios também têm influência fora das favelas,
candidatos a postos estaduais e mas de modo muitíssimo menos intenso,
federais. Aparentemente, eles não ao que parece). Assim, a violenta
demonstram grande preocupação (o que exploração econômica e política é
é, aliás, muito sintomático desse temperada por uma série de atividades e
controle) com o fato de que, mesmo nos relações paralelas, desde o ensino das
contatos mais amplos com os favelados, etapas burocráticas necessárias para
as reuniões, inclusive nas grandes conseguir documentos até conselhos
favelas, raramente apresentam mais de sobre os mais variados assuntos, que
50 ou 60 pessoas, número que não é representam, até certo ponto, uma
grandemente aumentado mesmo espécie de recompensa ou contrapartida
naquelas a que são convocados todos os pela exploração sofrida. Tal fato
moradores. Além dessa aparente apresenta pelo menos duas
despreocupação, é visível que os consequências contrastantes. Em
comícios dentro das favelas são quase primeiro lugar, embora esses pequenos
inexistentes, como se a propaganda favores se constituam em um dos pilares
eleitoral por esse meio fosse do controle político da burguesia,
desnecessária, improdutiva ou mesmo favelada, eles perdem o caráter de mera
perigosa em se tratando de favelas. recompensa pelo voto do favorecido
Sobre os possíveis riscos de reuniões (como certamente aconteceria se
públicas como veículos de propaganda fossem prestados diretamente pelos
eleitoral, é sintomática a observação de políticos supralocais), uma vez que estão
um amigo: “Atualmente, nas reuniões baseados ou decorrem de relações de
com os candidatos, não ficamos mais só amizade. Sua capitalização política é, ao
51
mesmo tempo, muito mais sutil e
envolvente, e não caracteriza o provável
mercenarismo dos favores prestados.
Em segundo lugar, não há dúvida de que
esse mesmo fato é um importantíssimo
fator de resistência à conscientização. É
difícil percebermos que nosso vizinho,
com quem tomamos uma ou outra
cachaça e a quem pedimos instruções e
mesmo conselhos, nos explora política e
economicamente até a exaustão. Assim, Referências Bibliográficas
uma tomada de consciência mais ampla MONTANER, Josep Maria; MUXÍ, Zaida.
é ainda mais difícil, uma vez que esse Arquitetura e política: ensaios para
vizinho e muitas vezes amigo mundos alternativos. Editora Gustavo
monopoliza contatos, informações e Gili Ebook. 2014.
atividades cotidianas que talvez nos
despertam de nosso desinteresse e até
nos abrissem os olhos, ampliando e
aprofundando nossa visão da realidade.
52
Favela: Uma análise extensiva
VIOLÊNCIA NAS FAVELAS: O This article portrays the life slum dwellers
ALERTA CONSTANTE take, their point of view, and the
LOPES, Lucas conditions that cause violence to occur in
Estudante de the favelas.
Arquitetura, Although prejudice is rooted and time is
pela taken to reach a level where this is left
Universidade out, slum dwellers suffer from the
Cidade de São violence experienced, whether by
Paulo. disputes between police and bandits, or
even between enemy criminal factions.
Keywords: Violence; slum; drugs; drug
Resumo dealing.
A violência vivenciada na favela tem
como base a origem, tanto do ponto de Introdução
vista econômico-social quanto referente Este artigo analisa os relatos de
ao fato histórico do que ocorreu no Rio moradores de favelas sobre a violência
de Janeiro com o Bota Abaixo dos que vivenciam no cotidiano desses locais
cortiços. diante dos diferentes tipos de presença e
Este artigo retrata a vida que os ação dos bandos de criminosos e das
moradores das favelas levam, seu ponto forças policiais. Sustenta que eles
de vista e as condições que ocasionam a enquadram estas questões a partir de
violência a ocorrer nas favelas. uma preocupação constante com as
Embora o preconceito esteja enraizado e pausas na estabilidade das rotinas
se tome tempo para atingir um patamar diárias provocadas pelas frequentes
onde isso é deixado de lado, os explosões de violência. Este é o
moradores das favelas sofrem com a horizonte de atenção que organiza todo
violência vivida, seja por disputas entre o seu discurso crítico “para fora” das
policiais e bandidos, ou mesmo entre favelas, bem como suas atitudes e
facções criminosas inimigas. condutas nos locais de moradia. O texto
Palavras-Chave: Violência; Favela; retoma um pouco mais, argumentando
drogas; tráfico. que, em suas descrições e denúncias, os
moradores demonstram não lidar da
Abstract mesma maneira com todas as formas de
The violence experienced in the favela is oscilação de suas rotinas, evitando juntar
derived, both from the socio-economic os responsáveis. Assim é que, de um
point of view and referring to the lado, a violência citada durante as
historical fact of what occurred in Rio de famosas “operações” policiais e sempre
Janeiro with the “Bota Abaixo” of the presente no abuso da conduta desses
tenements, which consisted in destroying agentes aparece associada ao seu
the old center of Rio which was filled with caráter quase totalmente imprevisível.
former slaves recently set free.
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De outro lado, quando se trata da questionam a participação do conjunto
violência envolvida nas práticas dos dos favelados na moralidade suprema,
traficantes, com os quais os moradores assim como a postura ética dos
são obrigados a compartilhar o mesmo moradores desses territórios. Os
território, há muitos relatos de tentativas moradores de favelas são tomados como
de redução da ocorrência do fluxo da cúmplices dos bandos de traficantes,
vida local. Isto ocorre por meio do ajuste porque a convivência com eles no
das condutas a um cálculo dos riscos mesmo território produziria
envolvidos nesta convivência forçada. aproximações de diversas ordens –
Tornando incontrolável uma pequena relações de vizinhança, parentesco,
porção da violência na localidade, econômicas, relativas à política local,
permite aderir como a parte etc. – e, assim, um tecido social
“extraordinária” das rotinas homogêneo que sustentaria uma
“insignificantes”. subcultura desviante e perigosa. Esta,
por sua vez, fundamentaria a aceitação
A origem da violência e a banalização do recurso à força, o que
Para a interpretação mais amplamente terminaria por legitimar e generalizar a
apresentada as favelas seriam o chamada “lei do tráfico”. Em
território da violência e a população que consequência, os moradores de favelas
ali reside ajudante com seus agentes, estariam recusando a “lei do país” ao
que seriam os traficantes de drogas. O optarem por um estilo de vida que
discurso público dominante apreende e negaria as normas e valores intrínsecos
explica a “violência urbana” através da à ordem institucional. Uma forte
“metáfora da guerra”. Estado dentro do conivência marcaria, portanto, as
Estado, conivência dos moradores de relações dos moradores de favelas com
favelas com os criminosos, banalização as redes criminosas sediadas nessas
da violência, etc. Esses “mitos” localidades, levando-os a buscar sua
sustentam grande parte do pacote proteção e apoio, bem como a protegê-
interpretativo que estrutura, atualmente, las da polícia.
o “problema da violência” nas favelas e o No caso específico dos jovens, mais do
horizonte das propostas e medidas para que as incertezas de uma conivência que
seu controle e redução. Entretanto, como não implica acordo, haveria proximidade,
se verá, uma análise a partir das idealização do estilo de vida dos
pesquisas mencionadas permite traficantes e aceitação ativa. Na
submetê-los à crítica. Considerando interpretação dominante, a propagação
inevitável que esta discussão permeie o dos bandos de traficantes, que parece
presente trabalho, um comentário inicial ser uma tendência real tem sido
facilitará seu entendimento. associada às proteções ao menor,
Os “mitos” acionam tópicos categoria jurídica utilizada pelo Estatuto
permanentemente maduros que da Criança e do Adolescente e por ele
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Favela: Uma análise extensiva
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foram iniciadas de forma “Nós, dentro da comunidade, já temos o
propositalmente vaga, com a pergunta conhecimento dos locais que são mais
“como é a vida nas favelas?” Mesmo perigosos, eu tento fazer com que ele
assim, houve uma unânime e quase procure não passar por aqueles lugares.”
obsessiva concentração nas referências “Você entra, vê crianças com fuzil na
ao tópico da violência policial e criminal mão, uma pistola... Para ir para minha
está quase sempre relacionada ao igreja, para ir a outros locais na
comércio de drogas nas localidades. O comunidade, eu tenho que passar pela
que, aliás, constitui evidência clara do ‘boca’ todo o dia.”
equívoco de identificar a recorrência de Os moradores não só reconhecem que
condutas violentas nas favelas com a as quadrilhas de traficantes fizeram das
banalização destas práticas pelos favelas um local de violência, como deles
moradores. Sempre ressaltando que a fazem questão de se separar. E
vida nessas localidades não pode ser ressaltam a mudança do estatuto da
reduzida à violência e ao tráfico de violência nas favelas devida ao tráfico de
drogas, o que denota o esforço por drogas, demarcando duas
separar as favelas da violência, os temporalidades e modos diversos de
moradores, sondado sobre como é viver conduta dos criminosos. Um quer ter o
em favelas, falaram de perigo, direito do outro.
insegurança, medo: “Os traficantes não querem saber se tem
“Viver na favela é viver em linha de risco criança no meio da rua, não querem
direto, é você ser alvo voluntário, um alvo saber se tem um morador na rua, eles
constante...” querem o quê? Tomar o território do
“A vida que a gente vive no cotidiano de outro. Antigamente era diferente,
violência, violência física, violência esperavam cair a noite para poder fazer
moral, violência em todos os sentidos.” essas coisas, esperavam. Hoje em dia, o
“Você manda o garoto comprar o pão e traficante senta na porta da pessoa, se
fica pedindo a Deus para ele voltar em droga na frente da pessoa sem ter
segurança. Ele só foi ali comprar um aquele respeito. No meu tempo era
pão!” proibido. Era proibido um menor ficar na
“Se derem um tiro e você sair correndo e boca de fumo, era proibido um traficante
entrar num beco, está arriscado morrer passar com arma perto de um morador.”
de uma hora para outra. Porque hoje
eles “os policiais” entram nas favelas
pelos lugares já estratégicos, eles já
ficam escondidos debaixo de uma
árvore, dentro do mato...”
“Se o meu filho sair, ele vai voltar? Só
tem doze anos, fico preocupada.”
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Favela: Uma análise extensiva
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Conclusão: sobre riscos e rotinas nas atribuída aos estereótipos e
favelas preconceitos contra os moradores (há
Para apresentar as conclusões do uma clara compreensão de que os
artigo, é necessário sintetizar alguns policiais não agem da mesma forma na
pontos analisados nos relatos dos “favela” e no “asfalto”). Mas a menção ao
moradores, buscando ao mesmo tempo preconceito constitui uma outra forma de
compreender o sentido incluído às suas crítica. Neste caso, reconhecem que a
falas. A descrição das formas de atuação polícia não é ator, mas instrumento,
da polícia nas favelas é sempre dispositivo, da construção do “problema
acompanhada de críticas intensivas. da violência” e de medidas para sua
Estas, entretanto, não se dirigem solução articuladas a partir da
propriamente à corporação (ninguém é “geometria variável”. Uma conclusão
contra a repressão policial), nem geral sobre as críticas à violência policial
tampouco aos métodos violentos em si pode ser resumida da seguinte maneira.
mesmos. As críticas são antes ao caráter Elas denunciam a violência, mas estão
indiscriminado da ação que não referidas a outro problema: a quebra das
distingue entre “gente de bem” e rotinas. É esta questão não tematizada
“marginais”. Em outras palavras, o que que organiza todo o discurso crítico e
os moradores criticam é menos a “ajusta” o ponto de vista das camadas
violência policial em si e mais a falta de sociais mais alterados e o dos
seletividade de seu objeto. Deve-se moradores de favela (bem como dos
notar que parte das críticas à atuação da demais territórios da pobreza). Estas
polícia denuncia a corrupção e a inação duas categorias: favelados e moradores
policial nos postos situados nas do “asfalto” do imaginário sobre as
Violência, crime e política: em geral na favelas, centrais na configuração da
periferia, sugerindo que a aceitação de estratificação social da cidade e seus
métodos violentos tem como limite sua conflitos, acabam se encontrando
funcionalidade como “garantia externa” naquilo que não dizem: a intensa
da ordem social local. Pode-se preocupação com o prosseguimento das
acrescentar, ainda, que a crítica não se rotinas cotidianas, vividas como
organiza a partir da denúncia das sistematicamente ameaçadas pela
ilegalidades cometidas pelos policiais violência. No caso dos moradores de
(exceto em alguns casos de mortes por favelas, o que está em questão não é a
eles provocadas, como argumentado regulação estatal/legal, a democracia
antes), mas antes como reação aos (embora este tópico apareça implícito
desajustamentos que suas práticas nas reclamações sobre as diferenças de
introduzem no fluxo das interações tratamento no “asfalto” e na “favela”),
rotineiras nos territórios favelados. A nem a restrição da violência. O problema
causa das interrupções nele produzidas criticado é, antes, o desrespeito às
pela violência policial algumas vezes é diferenças e hierarquias internas que
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Favela: Uma análise extensiva
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população da cidade, inclusive os
moradores de favela, e que acaba por
produzir demandas de uma
recomposição das rotinas pela força,
fechando assim um círculo de ferro que
reproduz indefinidamente a violência
como elemento estruturador
fundamental, sempre presente e sempre
temido, nas favelas e em toda a cidade.
Referências Bibliográficas
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ZILLI, Luís Felipe. O mundo do crime e a
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<http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?sc
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RAMOS, Sílvia. Meninos do Rio: jovens,
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