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Anais do IX Fórum de Pesquisa em Arte.

Curitiba: ArtEmbap, 2013.

ARTES APLICADAS: CENOGRAFIA E FIGURINO


NA PROBLEMÁTICA DO CINEMA FANTÁSTICO NACIONAL

Me. Leonardo Mèrcher1


lmercher@uol.com.br

Esp. Ana Casagrande2

Resumo
O presente artigo aborda três variáveis na produção do cinema fantástico brasileiro: o
figurino e a cenografia no cinema de fantasia; a escassez do cinema de fantasia no
cinema nacional; e a relação entre artes aplicadas e as artes digitais. Com o advento
do tridimensional nas artes digitais aplicadas, nas últimas décadas do século XX, o
custo da cenografia e do figurino elevou-se dentro da estrutura de produção
cinematográfica nacional. Nesse contexto, em uma análise das produções e
distribuições financiadas pela Embrafilme (1969-1990) – empresa estatal para apoio e
desenvolvimento do cinema brasileiro –, pode-se identificar uma baixa produção do
gênero fantasia e um maior financiamento público à estética do realismo social,
advindo com o Cinema Novo e dominante até os dias atuais no cinema nacional.
Nesse processo, examina-se a atual produção da cenografia e do figurino ao gênero
fantasia, sobretudo na problemática das artes aplicadas diante do realismo digital.
Conclui-se que a baixa produção do gênero fantasia no cinema nacional, devido tanto
pelo realismo social como pelo custo de produção elevado – típico da cenografia e do
figurino do gênero fantasia – acabou por trazer menor desenvolvimento às artes
aplicadas, consumindo-se a oferta estrangeira e seu realismo visual.

Palavras-Chave: Cenografia; Figurino; Cinema; Artes Aplicadas.

Abstract
This article discusses three variables in the production of Brazilian fantastic cinema:
the costumes and set design in film fantasy; scarcity of film fantasy in the national
cinema, and the relationship between applied arts and digital arts. After the advent of
the three-dimensionality applied to the digital arts, during the last decades of XX
century, the cost of scenography and costumes rose up in national film production. An
analysis of productions and distributions funded by Embrafilme (1969-1990) – State
enterprise support and development for Brazilian cinema – we identified a low
production of the fantasy genre and, at the same time, a greater public funding to the
aesthetics of social realism, as in the Cinema Novo, which still dominates the national
cinema. In this process, we examine the current production of scenography and
costumes related to the fantasy genre, especially problems regarding the applied arts
in a context of a growing digital realism. We conclude that the low production of the
fantasy genre in the film industry, due to both: social realism and the production’s high
cost – typical of the fantasy genre’s set design and costumes making – ultimately
brought a lower development to the applied arts, and a greater consuming of foreign
offer and its visual realism.

Keywords: Scenography; Costumes; Cinema; Applied Arts.

1
Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná. Especialista em Comunicação, Cultura
e Arte pela PUCPR. Bacharel em Relações Internacionais e Licenciado em Artes.
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Especialista em História Social da Arte pela PUCPR e em Young Education pela Anglocontinental,
Bournemouth, Reino Unido. Licenciada em Letras pela Universidade Federal Fluminense.
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INTRODUÇÃO

A cenografia e o figurino são partes essenciais no resultado final de uma


produção cinematográfica. Desde o cinema mudo até os atuais blockbusters3, essas
duas artes se mostram funcionais às diversas narrativas cinematográficas em suas
obras finais, indo do drama à comédia, do épico ao futurista ou do realismo social à
fantasia. Percebidas como artes aplicadas, ou seja, produzidas para compor uma obra
maior – o filme – e desenvolvidas pelo trabalho de diversos artistas, tanto a cenografia
como o figurino requerem uma estrutura de produção paralela à direção cênica ou
dramática.
Enquanto atores e personagens dão vida às narrativas de um roteiro, com seus
desempenhos cênicos e os de seus diretores, a cenografia e o figurino – produzidos
por costureiros, estilistas, escultores, modeladores, arquitetos, maquiadores,
marceneiros, iluministas e técnicos diversos – são responsáveis por ambientar toda a
história, intercedendo na relação visual entre o espectador e a obra. Enquanto o
figurino consiste na ambientação das personagens, mediante a elaboração de
vestuário e acessórios, a cenografia ambienta o todo, do tempo em que se narra a
história – presente, passado ou futuro – até o próprio espaço – urbano, residencial,
selvagem, mítico e outros.
O figurino contribui para a construção do status de cada personagem. Por
exemplo, o uso de plásticos, vidros e outros materiais translúcidos podem compor
figurinos pomposos, imitando joalherias e trabalhos manuais enriquecidos, dando a
quem os vestir status ligados à riqueza, alteza ou magia. Dentro de um contexto maior,
o figurino – composto por vestimentas, maquiagem e acessórios – pode até mesmo
enganar o espectador quanto à verdadeira identidade e intenções da personagem. Os
tons do figurino, por exemplo, conseguem trabalhar com referenciais comuns a cada
sociedade, como cores escuras que se relacionam à vilania e tons claros ao bem.
Entretanto, a busca por prender a atenção do espectador levou o cinema a se
afastar, muitas vezes, desse imaginário coletivo e seus arquétipos ou estereótipos
como das cores, para não cair na obviedade das personagens. Para tanto, o trabalho
do figurino soma-se ao do ator e ao da direção, compondo uma identidade à
personagem, exigindo-se todo um trabalho de negação visual ao óbvio. De um modo
geral, o figurino complementa visualmente o status da personagem e também indica
suas intenções em cena. A produção da cenografia e do figurino, de um modo geral,
desenvolveu-se a partir da linguagem tradicional do teatro até início do século XX.

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Termo inglês utilizado pelo mercado cinematográfico para se referir a filmes que alcançam um alto
faturamento em suas salas de exibição e, consequentemente possuem grande aceitação pelo público.
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Todavia, à medida que a arte cinematográfica absorvia o desenvolvimento técnico,


consolidavam-se novas formas de lidar com essas duas artes aplicadas.
Como construir o não-construído? Essa seria a função da cenografia e do
figurino nos filmes fantásticos. Atualmente, a necessidade de materializar a
imaginação humana trouxe, cada vez mais, ferramentas digitais para compor o
trabalho das artes aplicadas. A incorporação de ferramentas digitais na produção
cinematográfica contemporânea exige um repensar da instrumentalização dessas
duas artes, sobretudo em suas relações com o tridimensional digital no cinema
fantástico. O cinema fantástico – ou seja, filmes que buscam romper, de alguma
forma, com a realidade – é dividido em três gêneros: ficção científica; terror; e fantasia.
O gênero fantasia, dentro da produção cinematográfica, ocorreu como um
desdobramento do teatro que, por sua vez, desdobrava-se da literatura fantástica, cujo
discurso buscou tornar críveis mundos, personagens e situações que fugiam da atual
percepção da realidade. A fantasia trilhou um caminho próprio em relação aos demais
gêneros na história do cinema e, enquanto o gênero ficção científica (ou sci-fi) buscou
não perder sua relação com a realidade, justificando suas narrativas através do
desenvolvimento tecnológico a partir da atual realidade, a fantasia procurou romper
alguns laços com o possível e trazer a materialização do imaginável, como seres e
mundos não pertencentes ou não submetidos totalmente à realidade humana.
Já o gênero de horror (ou terror) se distingue da fantasia por ter narrativas
estritamente macabras, ligadas aos sentimentos de medo, perda e ansiedade. A
fantasia é marcada pela existência de quebra no naturalmente real, como com o uso
de magias, e possibilita desde o entretenimento até a reflexão de temas e desafios
individuais e sociais contemporâneos à obra. As ao gênero da fantasia no cinema
fantástico vão do folclore, mitologias e culturas orais até obras literárias. Isso faz com
que a fantasia, muitas vezes, absorva e invada os demais gêneros fantásticos – terror
e ficção –, quando se busca maior alcance de públicos nos circuitos comerciais.
Mesmo assim, quase sempre há um predomínio de um dos três gêneros. A fantasia
pode ligar-se a diversos temas, problemáticas, bem como transitar por narrativas
cômicas ou dramáticas.
Todavia, o gênero demonstrou-se em maior número no circuito comercial
ligado às narrativas de aventura, ou seja, narrativas em que se desdobram buscas
pelas personagens principais. Podem-se destacar nessa relação filmes como O
Mágico de Oz (The Wizard of Oz, Victor Fleming, 1939), História sem fim (Neverending
Story, Wolfgang Petersen, 1984) e a animação japonesa O castelo animado (Hauru no
Ugoku Shiro, Hayao Miyazaki, 2004). Tradicionalmente nessas obras as personagens

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principais buscam uma solução para problemas apresentados em suas origens,


resultando em uma jornada baseada, quase sempre, em relações conflitantes entre
forças antagônicas, quase sempre o bem e o mal.
Com o advento do registro cinematográfico, novas tecnologias permitiram que
os grandes custos da repetição das peças teatrais fantásticas fossem superados com
uma única filmagem e sua quase infinita reprodução. A encenação registrada em uma
única vez era distribuída e reprisada inúmeras vezes para diversos públicos,
diminuindo custos com cenografia e figurino. Todavia, uma das maiores contribuições
do cinema às temáticas fantásticas foi a possibilidade de edição de imagens e,
posteriormente, dos sons e efeitos visuais, tornando os discursos artísticos fantásticos
mais críveis ao receptor da mensagem, no caso o espectador.
Desde os primórdios do cinema fantástico, como nos filmes do ilusionista
Georges Méliés (1861-1938) – A mansão do diabo (Le manoir du diable, 1896),
Viagem à Lua (Le Voyage dans la Lune, 1902) e As alucinações do Barão de
Munchausen (Les hallucinations du Baron de Munchausen, 1911) – até chegar aos
blockbusters contemporâneos, enriquecidos com efeitos digitais, o cinema fantástico e
o gênero fantasia desenvolveram uma indústria de produção que atende às demandas
de mercado. A relação entre a cenografia, o figurino e os efeitos digitais, durante a
segunda metade do século XX até início do século XXI, evoluiu de forma a trazer
questionamentos referentes à posição da realidade digital diante da realidade
fisicamente construída pelas artes aplicadas.

FANTASIA E O CINEMA NACIONAL

Ao longo das primeiras décadas do século XX, o neorrealismo desenvolveu-se


juntamente com as ideologias esquerdistas dos governos vigentes e, a partir dos anos
1940 e 1950, presente no cinema italiano – como em Roma, cidade aberta (Romma,
città aperta, Roberto Rossellini, 1945) – surgiu o movimento neorrealista italiano que
se utilizava do cinema para questionar os desafios sociais e econômicos, afastando-
se, o máximo possível, das linguagens ficcionais, para se aproximar das linguagens
documentais. Suas críticas à estética fascista, anteriormente vigente na Itália,
buscavam um diálogo direto com os problemas urbanos.
Nos anos 1950 e 1960 o cinema mundial voltava a valorizar o cinema autoral e
buscou novas possibilidades estéticas e narrativas. Teve, como principal vertente, a
Nova onda francesa (Nouvelle Vague, década de 1960). Contando com trabalhos de
Jean-Luc Godard, François Truffaut e Alain Resnais, a Nouvelle Vague permitiu novas
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narrativas que valorizavam o realismo do indivíduo, tanto de suas emoções menos


idealizadas, como de seus desafios sociais e políticos retratados por meio de novos
experimentos técnicos e novas formas de registro visual.
Esse movimento alcançou o Brasil e aqui, juntamente com outros movimentos,
valorizou o realismo social em detrimento do cinema de gênero. Vanguardas artísticas
brasileiras, como o neoconcretismo dos anos 1960, buscavam maior aproximação com
a população, sobretudo com aquela tida como maior prejudicada pelos modelos de
desenvolvimento que ampliavam as desigualdades e suas dificuldades
socioeconômicas. Segundo Maria de Fátima Morethy Couto (2004, p. 200), no
neoconcretismo dos anos 1960:

A eficácia comunicacional da obra volta a ser de interesse dos artistas, que se mostram
sensíveis ao fenômeno urbano, à força dos meios de comunicação de massa (cartazes,
cinema, televisão, história em quadrinhos etc.), a temas ligados ao imaginário popular
(futebol, desemprego, violência, anonimato e solidão na grande cidade,
condicionamentos urbanos) e ao poder evocativo da imagem.

A divisão na produção cinematográfica por gêneros não realistas – fantasia,


terror, ficção científica, suspense etc. – contribuiria à alienação social, bem como ao
enfraquecimento da própria obra. Em contrapartida, ao abordar temas como
desemprego, violência e demais condicionamentos urbanos, aproximaria a obra da
realidade brasileira e, com isso, valorizaria não só o discurso da própria obra como
também fortaleceria a identidade dos movimentos artísticos nacionais que se
sustentariam sobre a realidade local. No cinema, esses movimentos contribuíram com
a estética e as narrativas do Cinema Novo.
O Cinema Novo já vinha se desenvolvendo desde o final dos anos 1950,
ganhando outras influências como o neorrealismo italiano, que acabaria por fortalecer
o senso crítico e denunciativo da realidade da população brasileira na segunda
metade do século XX. A estética do realismo social passou, então, a dominar a
produção nacional, no drama ou na comédia, diminuindo gastos com cenografias e
figurinos mais oníricos, exaltando muito mais a miséria e dilemas da classe média
brasileira. Dentre os principais autores que alimentaram essa estética no país podem-
se destacar Glauber Rocha (1939-1981); Leon Hirszman (1937-1987); Rogério
Sganzerla (1946-2004); Paulo César Saraceni (1933-2012), Ruy Guerra (1931) e Cacá
Diegues (1940).
Nas décadas de 1960 e 1970, o desenvolvimento do realismo social como
estética cinematográfica ganhou espaço, não apenas na crítica interna, como na
crítica especializada internacional, que viam no período o cinema como uma
ferramenta para o desenvolvimento social. As obras produzidas sob essa estética
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ganharam reconhecimento internacional, como O pagador de promessas (Anselmo


Duarte, 1962) e Terra em transe (Glauber Rocha, 1967) – premiados como melhor
filme e melhor direção respectivamente no Festival de Cannes na França. Esse
reconhecimento externo incentivou ainda mais os investimentos e expectativas
internas à produção dessa estética.
No final dos anos 1960, a criação da empresa estatal Embrafilme (Empresa
Brasileira de Filmes Sociedade Anônima, 1969-1990), incentivou a ampliação do
circuito comercial de cinema nacional, mas também passou a apoiar a produção
realista social, criando uma espiral de dinâmicas: o apoio inicial a essa estética acabou
incentivando novas produções internas, pois, ganhando reconhecimento externo,
incentivava-se mais a manutenção dessa estética na produção e financiamento
interno.

Embrafilme: filmes distribuídos 1969-1990


2%
1% 1%
3%
Drama
Comédia
10% Ação e Suspense
Documentários
11% 49%
Fantasia
Musicais
23% Ficção Científica e Horror
Animação

Fonte: Elaboração dos autores, 2013.

A Embrafilme envolveu-se em diversas fases da produção e distribuição do


cinema nacional, inclusive apoiando inicialmente a distribuição de filmes dramáticos
que se expressavam por meio do realismo social, tais como os filmes de Glauber
Rocha: O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro (1969); Cabeças cortadas
(1970); A Idade da Terra (1980), entre outros. A estética premiada de Glauber Rocha
influenciaria uma série de novos filmes dramáticos nacionais que se
contrabalanceavam no circuito comercial com as comédias de costumes, cabendo à
fantasia pouco espaço junto à Embrafilme.

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Ao investigar o banco de dados cinematográficos da IMDb4 (Internet Movie


Database), pertencente atualmente à empresa de capital americano Amazon.com,
contabilizaram-se 329 filmes distribuídos e 232 filmes produzidos pela empresa estatal
Embrafilme (1969-1990). Dos 329 filmes distribuídos, 161 correspondem aos dramas
sociais, dramas históricos e dramas eróticos; 74 à comédia; 37 à aventura, ação,
policial e suspense; 29 são documentários; 11 são filmes fantasia; 9 musicais; 5 ficção
científica e terror; e 3 são animações. É evidente que a Embrafilme contribuiu para o
desenvolvimento do cinema nacional. Todavia, percebe-se que a soma dos gêneros
fantásticos (fantasia, ficção científica e horror) não chega a 5% na participação total de
seu capital.
Como já afirmara Newton Cannito5, houve sempre um predomínio das
comédias de comportamento e dos dramas sociais. Os filmes da Embrafilme, que são
catalogados pelo governo federal nas classificações de gênero enquadrados na
fantasia ou de teor fantasioso foram onze: Os Trapalhões na terra dos monstros
(Flávio Migliaccio, 1989); Ele, o Boto (Walter Lima Júnior, 1987); Os Trapalhões no
reino da fantasia (1985); Espelho de carne (Antônio Carlos da Fontoura, 1984); O
cavalinho azul (Eduardo Escorel, 1984); Os Trapalhões e o Mágico de Oróz (Victor
Lustosa e Dedé Santana, 1984); O Trapalhão na Arca de Noé (Del Rangel, 1983);
Uma aventura na floresta encantada (Mário Latini, 1978); Ladrão de Bagdá (Victor
Lima, 1976); O Trapalhão no planalto dos macacos (J.B. Tanko, 1976); e Simbad, o
marujo trapalhão (J.B. Tanko, 1976).
Desses onze filmes, em uma amostragem de 232 filmes, a Embrafilme
participou na produção – com financiamento público – de apenas quatro: Os
Trapalhões na terra dos monstros; O Trapalhão na Arca de Noé; Uma aventura na
floresta encantada; e Ladrão de Bagdá. Os demais 228 filmes de sua produção
priorizaram outros gêneros, sobretudo o drama. Pode-se identificar que houve maior
financiamento aos gêneros dramáticos. Para Newton Cannito (2011)6, “não temos
filmes do gênero sci-fi e fantasia. Nosso cinema é viciado em realismo. Temos ótimos
filmes reais (sejam comédias, sejam dramas), mas não passeamos nunca no reino da
fantasia”.
Nas palavras de Newton Cannito (2011), “No Brasil, resultado das ideias de
Glauber Rocha, o gênero [todo e qualquer gênero ou subdivisão em temáticas de
produção] é considerado uma ‘fórmula’ americana e fica em oposição ao cinema
autoral. O cinema autoral é sempre o filme pequeno, anti-industrial” – pode-se

4
Disponível em: <http://www.imdb.com/company/co0064075/>. Acessado em: 5 fev. 2013.
5
Disponível em: <http://cinemateca.gov.br/>. Acesso em: 5 fev. 2013.
6
Disponível em: <http://cinemateca.gov.br/>. Acesso em: 5 fev. 2013.
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perceber que o cinema de gênero, ou seja, aquele seccionado em temáticas de


produção, sob influência do realismo social, diminuía o valor do diretor que assumisse
a produção de um cinema de gênero – só produzindo comédias, terror ou outro estilo.
Todavia, como mencionado, alguns filmes foram produzidos. Desde filmes de
produção mais autônoma, como Os cosmonautas (Victor Lima, 1962), Elke Maravilha
contra o Homem Atômico (Gilvan Pereira, 1978), Fofão e a nave sem rumo (Adriano
Stuart, 1989), Acquaria (Flávia Moraes, 2004) e O homem do futuro (Cláudio Torres,
2011) até os filmes produzidos em séries pelas empresas Demuza Produções, Renato
Aragão Produções, Maurício de Sousa Produções e Xuxa Produções contribuíram,
cada qual em seu tempo e contexto social, com o cinema fantástico nacional no
circuito comercial.
Entretanto, é certo que em uma análise sobre o circuito comercial nacional,
filmes estrangeiros possuem uma relação de oferta e demanda maior, ou seja, maior
oferta e maior demanda do que na produção nacional. Sobretudo por ser a produção
nacional comercial destinada a outros gêneros, como drama, percebe-se que a
demanda interna por fantasia é atendida pela oferta estrangeira com maior grau de
realismo na representação e a não-infantilização das narrativas. O sucesso de
bilheteria de filmes como O Senhor dos Anéis (The Lord of the Rings, Peter Jackson,
2001-2003), Harry Potter (Chris Columbus, 2001), Alice no País das Maravilhas (Alice
in Wonderland, Tim Burton, 2010), entre outros, demonstra que de fato há uma
demanda pelo gênero fantasia no mercado nacional.
Dentro desse cenário, pode-se seguir por pelo menos dois caminhos
investigativos: a problemática da produção e a problemática do consumo. A do
consumo entraria em questões como gostos, expectativas da demanda e intensidade
de incentivos ao consumo, como políticas de propaganda e outros fatores e sistemas
comerciais internacionais que dificultariam uma relação direta com variáveis apenas
nacionais. Já a da produção vincula-se diretamente com a demanda mediante a oferta
interna e, portanto, é determinada pela estrutura de produção nacional, englobando as
artes aplicadas e digitais à cenografia e figurino.
De acordo com alguns cineastas, foi por causa do realismo no cinema nacional
que o espaço destinado à fantasia foi ocupado por filmes estrangeiros (CANNITO,
2011).Todavia, isso não seria uma rejeição de demanda por parte dos brasileiros, mas
uma construção de demanda reprimida por parte da indústria cinematográfica nacional
que compete com um crescente realismo de imagem – referente à realidade da
representação do fantástico e não ao realismo social – que encarece sua produção.
Como mencionado, o cenário das artes aplicadas à fantasia no Brasil, de uma forma

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geral, mostra-se relacionado a duas variáveis: baixo investimento à produção nacional


do gênero; e acomodação do mercado nacional à oferta internacional.
Ambas possuem suas raízes na desvalorização do cinema de gênero já
abordada, ou seja, na rejeição de uma especialização segmentada de produção
temática destinada ao mercado. Esses dois desafios tornam-se parte da hipótese aqui
apresentada: por ter baixo desenvolvimento, o gênero fantasia impactou de forma
negativa o segmento das artes aplicadas e digitais no cinema nacional.

ARTES APLICADAS E FERRAMENTAS DIGITAIS NO CENÁRIO CONTEMPORÂNEO

A arte digital é uma produção humana e, portanto, também constitui uma arte
aplicada na produção cinematográfica. Todavia, seu crescimento na formulação quase
que completa de ambientações à história e aos personagens retirou da cenografia e
do figurino parte de seus espaços materiais. Criaturas que eram animadas em pano e
engrenagens, hoje podem ser facilmente construídas virtualmente. Panos de fundo
que representavam florestas encantadas e cidades não-humanas também podem ser
elaborados a partir da liberdade de criação encontrada nas ferramentas digitais.
A cenografia e o figurino sempre foram fundamentais para quebrar a ligação
com a realidade, necessária no gênero de fantasia. As artes decorativas e aplicadas,
como o trabalho manual de confecção das mais diversas peças e acessórios às
personagens e à ambientação, estavam presentes desde a produção até a distribuição
final dos filmes, como na elaboração de cartazes de propaganda. Especificamente no
que tange à produção, as artes aplicadas permitiam a soma de diversas técnicas
visuais sem perder seu espaço. Até meados dos anos 1980, os filmes estrangeiros de
fantasia utilizavam-se do figurino e da cenografia como peças fundamentais à
ambientação da narrativa. Somava-se a eles diversas técnicas de artes aplicadas para
fortalecer essa quebra com a realidade.
Desde as técnicas de stop-motion em Simbad e a Princesa (The 7th Voyage of
Sinbad, Nathan Juran,1958), passando pelas películas duplas – possibilitando a
inclusão de animações em cenas reais – filmes como Uma cilada para Roger Rabbit
(Who Framed Roger Rabbit, Robert Zemeckis, 1988) e Pagemaster – O Mestre da
Fantasia (The Pagemaster, Joe Johnston, 1994), incluindo até mesmo maquinários e
engenharias, como utilizados no filme O cristal encantado (The dark crystal, Jim
Hanson, 1982), são bons exemplos das artes aplicadas na construção de um filme de
fantasia. Para esse último, composto totalmente por marionetes, fantoches e

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maquinários dirigidos pelo mesmo criador do universo ficcional de Os Muppets (The


Muppet Movie, 1979), Jim Hanson, conseguiu-se não apenas construir um cenário
material rico em detalhes, como se deu vida às próprias personagens sem o auxílio da
animação tradicional – pintura sobre matriz de repetição – ou dos atuais efeitos de
realidade virtual.
Os filmes nacionais, sobretudo os destinados ao público infantil, conseguiram
acompanhar boa parte do praticado no cenário e no figurino estrangeiro. O apoio de
capital público ou de empresas nacionais, como Tintas Suvinil e Postos Shell do Brasil
em Super Xuxa contra o Baixo-Astral (1988), contribuíram na elaboração da
cenografia desse gênero, mas não o suficiente para alimentar uma indústria de artes
aplicadas própria em escala de concorrência com a produção estrangeira. Entretanto,
a partir dos anos 1980 e, sobretudo nos anos 1990, o cinema fantástico estrangeiro
passou a investir massivamente em efeitos especiais e maquinários para dar vida às
mais diversas criaturas que, se antes eram compostas por têxteis e engrenagens,
passaram a ser criados por computação gráfica.
A distância entre as artes manufaturadas, artesanais e artísticas voltadas à
cenografia e ao figurino das artes aplicadas entre a produção nacional e a estrangeira
aumentou, sobretudo pelo desenvolvimento das ferramentas digitais que passaram a
tomar espaço no cinema fantástico norte-americano. Desde os anos 1970, empresas
como a Walt Disney Animation Studio (Walt Disney, 1923) e a Lucasfilm (George
Lucas, 1971) buscaram financiar o desenvolvimento de técnicas visuais especiais para
seus filmes. Embora o efeito especial (alteração da imagem, som e outras formas de
reestruturação da realidade material) não fosse novidade, essas empresas
contribuíram para a inserção da tecnologia nos grandes blockbusters, desde as
animações tradicionais até a realidade virtual.
A partir dos anos 1990, a introdução dos efeitos virtuais cresceu de forma
considerável com a evolução tecnológica, bem como de produtoras especialistas na
criação de realidades virtuais. A Pixar Animation Studio (Edwin Catmull, 1986), uma
das maiores empresas dedicadas às animações e à realidade virtual a conquistar
prêmios como o Oscar7 (Finding Nemo, 2004; Wall-E, 2008 e outros), é resultado de
um rompimento interno da Lucasfilm. Hoje, ambas fazem parte do capital privado da
Walt Disney Company, predominando a oferta do gênero fantasia no mercado
brasileiro. O desenvolvimento tecnológico, sobretudo o virtual, não questiona o
trabalho humano em criar artes para a cenografia e figurinos, mas problematiza a sua
relação com as artes aplicadas não-digitais quanto ao custo de produção.

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Academy Awards (1929) é um dos principais prêmios cinematográficos dos EUA.
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Para a produção é preciso capital inicial de financiamento, seja público ou


privado, para posteriormente iniciarem-se as artes aplicadas. Entretanto, com a
infantilização do gênero fantasia no Brasil e a grande concorrência tecnológica
presente nos filmes estrangeiros, esse contexto criou um cenário pouco convidativo a
iniciativas mais autônomas ou de baixo orçamento comum em nosso mercado. O
baixo orçamento na fantasia nacional, sobretudo voltado para o público infantil,
permite crer que a cenografia e o figurino seriam completados pelo lúdico do público
infantil, em que o contar a história se tornaria mais importante do que a veracidade
visual da narrativa. Mas o desenvolvimento tecnológico dos filmes infantis estrangeiros
passou a exigir mais, não só do mercado brasileiro, como de todo o circuito
internacional.
Como mostra o comportamento do mercado estudado por Erick Felinto (2011),
o cinema fantástico e seus gêneros são produzidos para públicos jovens e adultos,
dando importância ao realismo da representação. Por mais fantasiosa que seja a
história, atualmente preza-se pela realidade da representação de criaturas que
passam a dispensar fantasias têxteis, roldanas e estruturas mecânicas para a criação
tridimensional digital. Da mesma forma, a cenografia passa a ter interferência de
tratamentos na iluminação, perspectiva e até a criação de objetos e formas,
substituindo muito da arte aplicada manualmente em estúdios ou em gravações
externas.
Filmes de fantasia cujas indicações etárias são mais restritivas – ação,
suspense e violência – ainda não encontram um mercado interno competitivo,
simplesmente por esse ter grande carência de produção nacional. Na oferta
estrangeira, pode-se ver todo um processo de refilmagem, por exemplo, de filmes do
gênero fantasia não-infantil, incentivado pela evolução das artes digitais às artes
aplicadas. Desde Fúria de Titãs (Clash of the Titans, Desmond Davis, 1981), passando
por Conan, o Bárbaro (Conan, The Barbarien, John Milius, 1982) até chegar às
readaptações contemporâneas nos anos 2000 com as obras Fúria de Titãs (Clash of
the Titans, Louis Leterrier, 2010) e Conan, o Bárbaro (Conan, The Barbarien, Marcus
Nispel, 2011), as artes aplicadas utilizadas na decoração foram sendo
complementadas até dar um importante espaço às artes virtuais.
O mercado nacional acaba por ceder à demanda reprimida interna que, por
falta de coordenação técnica e uma estrutura de produção industrial às artes
cenográficas mais oníricas, perde possibilidades de manter uma competição mínima.
Como visto na grande maioria das readaptações de obras fantásticas, nas décadas de
2000 e 2010, a necessidade por realismo na representação uniu-se ao

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desenvolvimento tecnológico para atender à demanda percebida pelo mercado. Para


Felinto (2006, p. 416), a atual produção do cinema fantástico, que visa bons resultados
no circuito comercial, persegue o realismo da representação:

Empregadas eminentemente para a produção de efeitos especiais, as tecnologias digitais


operam em Hollywood como coadjuvantes essenciais na presentificação (sic) das realidades
apresentadas nos blockbusters. Nesse sentido, o impulso que dirige tal tipo de experiência não
está muito distante da pulsão cultural responsável pelos panoramas do século XVIII ou dos
experimentos contemporâneos com aparatos de realidade virtual. Os dinossauros digitais de
Parque dos dinossauros (Steven Spielberg, 1993) devem parecer reais segundo nossos códigos
de representação cultural, mesmo que não possamos ter certeza absoluta de como um
dinossauro real se pareceria. Essa pulsão cultural é constitutiva da experiência da imagem no
Ocidente, movida continuamente por um desejo crescente de realismo.

A representação realista nos filmes ficcionais exige custo e tecnologia que


encarecem o processo de produção. Entretanto, não pode ser vista como a única
variável. Segundo Newton Cannito (2011), a variável do custo não deveria ser
entendida como determinante para a carência desse gênero nos circuitos nacionais, já
que “nossas finalizadoras têm feito coisas ótimas em publicidade e, com mais
investimento, teríamos condições de levar os efeitos ao cinema. Pode não ser com a
última tecnologia, mas seria com a penúltima, e tenho certeza que seria suficiente para
conquistar nosso público”. Mas a coordenação dessa produção exige maior espaço e
interesse de produção pelos financiadores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As artes aplicadas à cenografia e figurino desenvolveram-se para tornar críveis


narrativas que, de alguma forma, desligavam-se da realidade humana. As artes
digitais passaram a complementar o papel tradicional do desenvolvimento artesanal à
produção em série de têxteis, maquinários, maquiagens e outros materiais para
sustentar o mercado internacional cinematográfico. No Brasil, por processos próprios,
o cinema fantástico pouco se desenvolveu, se comparado a outros gêneros como a
comédia ou o drama social. O predomínio da estética realista social, fortalecida pelo
Cinema Novo, mostrou-se predominante nos financiamentos públicos à produção e
distribuição na cinematografia brasileira, dificultando o desenvolvimento das artes
aplicadas como a cenografia e o figurino no país.
A crítica ao cinema de gênero, como consequência desse predomínio,
dificultou a diversificação da produção nacional. O gênero fantasia pouco se
desenvolveu e sua baixa produção foi destinada majoritariamente ao público infantil,

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criando um cenário de demanda reprimida. A produção da cenografia e do figurino


ainda permanece no processo manual. Trabalhando sobre têxteis, celulose e
polímeros, as artes aplicadas nacionais ainda não absorveram as possibilidades que a
arte digital pode construir, sobretudo no realismo da representação. Com isso, a
demanda atual pelo realismo da representação no cinema fantástico passou a ser
atendida, sobretudo, pela oferta estrangeira, o que dificultou ainda mais o crescimento
de uma estrutura de produção de artes aplicadas, tanto das manuais como da própria
digital. Entretanto, a oferta estrangeira não se torna um problema, pois as trocas
culturais devem ser prezadas e zeladas pelos povos, mas perde-se a chance de se
explorar as identidades, referenciais e a própria cultura nacional.
O indivíduo terá sempre uma necessidade de entrar em contato com a arte
fantástica. O rompimento proposto pelo gênero fantasia mostra-se essencial e,
diferentemente do defendido pelo realismo social, é uma demanda constantemente
presente às sociedades. Produzindo ou não cinema fantástico, se há a possibilidade
de se consumir o gênero fantasia, o indivíduo irá fazê-lo. Quando isso ocorre, perde-se
uma possibilidade narrativa da realidade local. Não se trata, todavia, de impedir a
oferta estrangeira, mas de possibilitar a oferta com um mínimo de produção nacional
que não se limite tão somente ao público infanto-juvenil. Essa infantilização da obra –
e da própria cenografia e figurino – soma-se ao encarecimento das artes aplicadas e
ao predomínio do realismo social de forma a dificultar a produção nacional do gênero
analisado e suas artes aplicadas. Como visto, a problemática de produção do gênero
fantasia acabou por trazer baixo desenvolvimento nas artes aplicadas da cenografia e
figurino fantásticos.
Ainda que permaneça espaço para as artes manufaturadas, como vestimentas
e maquiagens para os atores ou a produção de móveis e outros acessórios para o
ambiente, as artes digitais passaram a produzir muito de suas construções cênicas por
meio da realidade virtual. Atualmente, criaturas fantásticas e ambientes – sobretudo
externos – são elaborados usando-se as artes digitais. Sua criação tornou-se uma
complementariedade às artes aplicadas manuais e à direção de arte. O não
desenvolvimento de uma estrutura de produção digital não impede o crescimento do
gênero fantasia no atual cenário cinematográfico brasileiro. Entretanto, demonstra-se
que a ausência de uma oferta interna não-infantilizada da fantasia, podendo se utilizar
tanto de recursos manuais ou digitais, continuará contribuindo com o controle do
mercado pela oferta estrangeira, dificultando o desenvolvimento da fantasia e suas
artes aplicadas no cenário nacional.

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REFERÊNCIAS
CAUQUELIN, Anne. Teorias da Arte. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
CANNITO, Newton (2011). Disponível em: <http://cinemateca.gov.br/>. Acessado em:
fev. 2013.
COUTO, Maria de Fátima Morethy. Por uma vanguarda nacional. Campinas: Unicamp,
2004.
DUFOUR, Éric. O cinema de ficção científica. Lisboa: Texto & Grafia, 2012.
FELINTO, Erick. Cinema e tecnologias digitais. In: MASCARELLO, Fernando (org.).
História do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2011.
LUCENA, Alberto Jr. Arte da Animação: técnicas e estética através da história. São
Paulo, SENAC, 2011.
MASCARELLO, Fernando. História do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2011.
NERO, Cyro. Cenografia: uma breve visita. São Paulo: Claridade, 2010.

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