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História

da Filosofia Medieval Ernesto Perini Santos


2019/1


Sobre o ente e a essência, Tomás de Aquino
Guia de leitura
Prólogo
1. O ente e a essência são as coisas concebidas primeiro; sobre elas, deve-se
esclarecer : (a) o que significa ‘ente’ e o que significa ‘essência’, (b) como estão
em diversas coisas e (c) como se relacionam com intenções segundas (lógicas),
como gênero, espécie e diferença.
2. Deve-se passar do significado do ente ao significado da essência, do mais
simples ao mais complexo.
A primeira tese diz respeito ao que à ordem de conhecimento: a tese aviceniana
exposta por TA diz que concebemos primeiro o que é mais geral, i.e., o conceito de
ser, e passamos gradualmente ao que é mais específico. TA coloca a discussão
acerca de conceitos gerais da metafísica no quadro de intenções segundas proposto
por Porfírio. O argumento de DEE irá o tempo todo passar de considerações acerca
da natureza da existência e da essência a considerações acerca do que estes termos
significam, sem que seja sempre claro se TA mantém a diferença entre estes dois
tipos de questão.

Capítulo I

3. O ser se diz de dois modos, (a) um modo segundo qual se divide em dez
categorias e (b) outro que corresponde à verdade de proposições. Por (b), o ser
se diz de negações e privações, mas não por (a). São seres no sentido (a) apenas
o que “põe algo na realidade” (melhor do que “na coisa”). A discussão de DEE se
dará em torno de (a).
O argumento para esta escolha parece ser o seguinte: (i) o sentido (b) inclui
proposições privativas e negações; (ii) nestes dois casos, nada parece ser dito
existir realmente; (iii) logo, se quisermos oferecer uma teoria do real a partir de
(b), deveríamos restringir do sentido (b) apenas para proposições afirmativas, que
no entanto não constituem a totalidade das proposições verdadeiras, ou dizer que
proposições negativas e privativas postulam a existência de algo, o que não parece
tampouco adequado; (v) logo, (b) não oferece uma base para a teoria do real. Este
problema não se coloca para (a). Do lado positivo, podemos observar que as
categorias oferecem uma base positiva (e não negativa ou privativa) para a
construção de uma teoria do real, evitando portanto este problema.
A solução adotada corresponde ao lugar tradicional de debates ontológicos, o nível
sub-proposicional – assim é a discussão acerca de universais, ou acerca da
individuação. Do ponto de vista a história da filosofia medieval, estes problemas
são os que se colocam a partir da Isagoge de Porfírio, que, ao tratar de predicáveis,
situa-se no nível de (a).
4. O termo ‘essência’ deriva portanto de ‘ser’ no sentido (a), pois o que não é não
tem essência. O ser dito deste modo divide-se em dez gêneros, deve portanto ser
comum, a essência, que deriva de ser, deve ser comum aos dez gêneros.
Há uma clara oscilação entre falar sobre o mundo e sobre a linguagem, ou pelo
menos um desvio que não parece ser necessário. Em todo caso, uma vez corrigido
este ponto, TA tira a seguinte conclusão: como o ser se divide em dez categorias (a

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utilização do vocabulário de Porfírio, mais uma vez, não deve esconder a tese
aristotélica), e como a palavra ‘essência’ deriva da palavra ‘ser’, ela deve ser
aplicada ser aplicado de maneira sinonímica (e não como um parônimo) às dez
categorias. Esta formulação tem alguma ambigüidade, já que ela não é
diretamente a afirmação da sinonímia de ‘ser’, mas de uma palavra que deriva de
‘ser’.
5/6. A categoria que constitui o que é a coisa (sua essência) é o que é significado
pela definição que diz o que é a coisa (quid est res). Por esta razão, essência
também é chamada quididade, em função da pergunta para qual é uma resposta.
Outros nomes são ‘forma’ e ‘natureza’.
Dois pontos cruciais deste parágrafo: (i) a essência é o que responde à pergunta ‘o
que é?’, (ii) e esta resposta é dada pela definição.
7. O ser se diz de maneira absoluta das substâncias e de maneira secundária dos
acidentes, logo a essência está de maneira primária nas substâncias e de maneira
secundária, nos acidentes.
Tensão com 4, que reencontra dois elementos aristotélicos, a irredutibilidade das
categorias entre si e a assimetria entre as categorias, que é organizada em torno
da categoria de substância. A assimetria no ser se transfere assim para a
assimetria na essência. Acidentes existem de maneira secundária porque existem
apenas na medida em que existem em substâncias.
8. As substâncias dividem-se ainda em simples e compostas; ambas têm essência,
mas, de maneira mais “verdadeira e nobre”, as mais simples, porque são causas
das compostas.
Diferentemente da assimetria apontada em 7, que recorre unicamente à mecânica
da predicação, esta assimetria recorre a um outro tipo de consideração, a ordem
causal. Este movimento remete a uma estratégia mais neo-platônica do que
aristotélica.
9. Devemos partir das essências das substâncias compostas, já as substâncias
simples nos são mais ocultas.
A ordem de conhecimento não é realmente importante, nem de fato implicada
(note-se que há uma inversão entre o prólogo e este parágrafo, na relação mais
simples/ponto de partida do conhecimento).

Capítulo II

10/11. Nas substâncias compostas, existe forma e matéria, como no homem há a
alma e o corpo. A essência no entanto não é nenhum destes elementos tomados
separadamente. A matéria sozinha não é a essência, porque a matéria não é
princípio de conhecimento nem aquilo em virtude do que a coisa é o que é.
Estes curtos parágrafos identificam dois papéis conexos da essência,
epistemológico e metafísico, e excluem que a matéria seja a essência das
substâncias compostas: (i) conhecer algo é apreender sua essência, e conhecer
algo não é aprender sua matéria, logo a matéria não é a essência; (ii) a essência é
aquilo em virtude do que a coisa pertence a um tipo de determinado, a matéria não
é aquilo em virtude do que a coisa pertence a um tipo determinado, logo a matéria
não é essência. As premissas dos argumentos não são de fato defendidas; TA as
julga evidentes, assim como a conclusão que elas ajudam a estabelecer.
12. A forma não pode tampouco ser sozinha a essência da substância composta,
porque a essência é o que significado pela definição e na definição das

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substâncias compostas não figura apenas a forma; se fosse de outro modo,
substâncias compostas e substâncias matemáticas não seriam diferentes.
Argumento: (i) a essência é o que significado pela definição; (ii) a definição das
substâncias compostas difere da definição das substâncias matemáticas; (iii) a
definição das substâncias matemáticas não inclui a matéria, mas se faz apenas
pela forma; (iv) se a essência das substâncias compostas se fizer pela forma,
devemos abandonar (ii) ou (iii); não podemos abandonar (ii) nem (iii); logo as
substâncias compostas não podem ser definidas unicamente pela forma. O
resultado de 11 e 12 é que a definição das substâncias compostas se faz pela
matéria e pela forma. Deve-se estabelecer como isto ocorre.
13. A matéria não é posta na definição como um acréscimo; esta seria a definição
de acidente, que recebe na sua definição um sujeito fora do seu gênero. A
essência da substância composta compreende portanto matéria e forma.
A matéria não pode ser acrescentada como algo externo à definição da substância
composta, porque apenas acidentes têm na sua definição um elemento que não
pertence ao definido – de fato, acidentes referem-se de maneira essencial à
substância, ao passo que substâncias não demandam a referência a outra
categoria na sua definição.
14. A essência não significa uma relação entre forma e matéria, ou algo
acrescentado à forma e à matéria; aquilo que é acrescentado a algo só pode ser
acrescentado a algo que já tem uma forma determinada.
Em parte, o argumento retoma um resultado do parágrafo anterior. Há, no
entanto, um resultado suplementar importante que pode ser apresentado de duas
formas. Inicialmente, os relata que poderiam estar numa relação determinada
deveriam já ter uma forma e uma matéria; ora, por esta proposta, deveríamos
poder identificar a forma e a matéria independentemente uma da outra, para que
pudessem ser postas em relação, o que é precisamente impossível. Uma outra
maneira de apresentar esta dependência é dizer que a forma que “sobrevém” é a
forma acidental, que faz com que algo seja de determinado modo, não que ele
passe a existir. A forma substancial, que figura na definição, faz com que algo
exista simpliciter. A matéria é potência que pode ser atualizada de uma forma ou
de outra; ao ser atualizada, ela já é atualizada como um algo determinado, i.e.,
com uma forma determinada – não existe algo que seja uma substância, mas não
seja uma substância determinada, não existe portanto algo que fosse uma matéria
atualizada que já não fosse uma matéria atualizada por uma forma substancial
determinada.
15/16. Depois de indicar a concordância desta tese com Boécio, Avicena e
Averróis, TA apresenta um argumento positivo direto: a substância composta
tem ela mesma um ser composto, como é o caso de seres que têm mais de um
princípio.
Estes dois parágrafos retomam uma estrutura argumentativa comum na filosofia
medieval, a apresentação de autoridades seguida da defesa por um argumento
racional, ou mais precisamente de uma apresentação relativamente direta da tese
a ser defendida. [sobre qualidades secundárias, ver Pasnau 2011: 459-468]
17. A matéria é o principio de individuação, logo pode parecer que se a matéria
estiver na definição, a definição será do indivíduo; não haveria portanto
definição do universal. Deve-se então distinguir a matéria assinalada, que é o
princípio de individuação, da matéria tomada no sentido absoluto.

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Argumento: (i) a matéria e a forma compõem a definição da essência composta;
(ii) a matéria é o princípio de inviduação; (iii) logo, a definição é do indivíduo e não
há definição do universal. A conclusão (iii) é inaceitável. Deve-se distinguir dois
sentido de ‘matéria’: matéria assinalada (matériaa), que é princípio de
individuação, e a matéria não assinalada (materian). As duas premissas são
reformuladas do seguinte modo: (i’) a matérian e a forma compõem a definição da
essência composta; (ii’) a matériaa é o princípio de inviduação. De (i’) e (ii’), nada
se segue. A definição contém a propriedade abstrata da materialidade [Kenny
2002:12]. Uma conseqüência interessante desta distinção é que a matériaa
entraria na definição do indivíduo se houvesse tal definição; as definições são
entanto apenas do universal.
18. A essência do indivíduo e a essência da espécie diferem apenas quanto ao
assinalado e não assinalado. De modo similar, a essência do gênero e da espécie
diferem segundo o assinalado e o não assinalado, embora num caso a designação
se faça pela matéria e, no outro, pela diferença específica.
Esta passagem apresenta uma tensão: (i) a essência é o que significado pela
definição; (ii) não há definição do indivíduo e (iii) existe a essência do indivíduo. “A
solução do problema deve ser a seguinte: enquanto toda definição corresponde a
uma essência, nem toda essência tem definição. Ou talvez deva-se colocar este
ponto do seguinte modo: diferentes essências individuais têm uma mesma
definição, a definição da espécie à qual pertencem.” [Kenny 2002: 14]. A relação
importante estabelecida está entre determinável, determinante e determinado. A
relação entre determinável e determinado cobrindo tanto gênero/espécie quanto
espécie/indivíduo é muito compatível com o quadro porfiriano.
19. A determinação do gênero à espécie não se faz no entanto por algo que não
esteja no gênero: tudo o que está na espécie está no gênero como não
determinado, pois se não fosse assim, animal não poderia ser predicado do
homem.
Há um teste pela “mecânica da predicação” que estabelece a tese visada por TA. Se
A é parte de B, não se pode dizer que B é A; ora, pode-se dizer que o homem é
animal, logo animal não é parte do homem. A hipótese que o animal seria parte do
homem refutada aqui corresponde à ideia que o que determinante da espécie em
relação ao gênero é algo que se lhe acrescenta de maneira exterior, de maneira que
o resultado teria duas partes (gênero + determinante). O determinante está no
gênero de maneira indeterminada, o gênero pode receber um determinante
preciso.
20. Corpo como gênero e corpo como parte diferem, ‘corpo’ portanto significa
coisas diferentes. Na medida em que é um tipo de substância, designa aquilo que
pode ter três dimensões – podemos chamá-lo ‘corpoe’. Se a um corpo neste
sentido puder advir uma outra caracterização (uma outra perfeição) que não se
siga do fato de ele ser um corpoe, o corpop que recebe esta outra caracterização
posterior será uma parte daquilo que recebe uma caracterização posterior. Este
é o caso do homem, cujo corpoe cai sob o gênero de substância, como uma
substância corpórea, e é composto do qual uma parte é o corpop.
Encontramos mais uma vez a distinção entre diferentes sentidos de um termo. O
argumento segue o raciocínio do parágrafo anterior: se A predica-se de B, então A
não é parte de B. Pode-se dizer que o homem é corpo, i.e., uma substância
corpórea? A resposta parece ser positiva, mas, neste caso, o corpo não pode ser
uma parte do composto que é o homem. A inconsistência pode ser resolvida pela

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distinção entre diferentes sentidos de ‘corpo’, como parte do homem e como gênero
do qual o homem é uma espécie. Esta solução parece-me teoricamente mais
instável do que a distinção entre diferentes sentidos de ‘matéria’. “O problema <...>
é que não é possível considerar um corpo neste sentido [i.e., corpop] como parte de
um animal. Um animal não é um cadáver mais uma alma, e TA diz claramente em
outros lugares que ele não pensa assim. Sem sua alma, o corpo de um animal não é
mais o mesmo corpo.” [Kenny 2002: 16] Uma solução em geral associada aos
franciscanos, como Duns Scotus e Ockham, consiste em postular uma pluralidade
de formas – aqui, uma que atualiza o corpo e outro que lhe dá vida. TA é no
entanto contrário à tese da pluralidade de formas.
21-22. corpoe é também um gênero do qual animal é espécie – podemos designá-
lo doravante ‘corpoe/g’. Como um gênero, corpoe/g contém implicitamente o
animal como espécie. Na medida em que animal é uma espécie de corpoe/g,
animal contém apenas a perfeição de se mover e outras perfeições posteriores
serão partes do composto, e.g., a alma sensível e alma racional no homem.
corpoe/g é o gênero do qual animal é espécie, assim como animal é um gênero do
qual homem é uma espécie. Estes parágrafos colocam o corpoe/g na árvore de
Porfírio, situando-o em relação a animal, e repetem para animal o teste da
duplicidade parte/todo aplicado anteriormente a corpo, sem que haja aqui alguma
motivação para se pensar o animal como parte daquilo de que é espécie.
23. O gênero, a diferença e a definição significam de maneira indeterminada o
todo da espécie, mas de maneiras diferentes; este é o caso de animal definido
como corpo animado. Esta diferença no modo como gênero e diferença
significam a espécie resulta no gênero e na diferença poderem ser inteligidos
separadamente, segundo Avicena.
A estratégia argumentativa de 19, da “mecânica da predicação”, estabelece que se
a espécie é definida como gênero + diferença específica (doravante, ESP = GEN +
DIF), para que tanto a definição quanto suas partes se prediquem de ESP, GEN e
DIF não podem significar parte, mas devem significar o todo. A este resultado já
estabelecido, TA acrescenta uma distinção semântica importante, que aparecerá
de mais de um modo na literatura medieval: GEN e DIF significam o mesmo, mas
remetem a aspectos diferentes do que significam; GEN remete ao que é
determinável, DIF, ao determinante. Este par conceitual que acima havia servido à
descrição da analogia GEN/ESP, DIF/materiaa, serve aqui a outro esclarecimento.
Matéria é, num quadro aristotélico, potencialidade de receber determinações; o
que recebe determinações aqui é GEN, portanto corresponde à matéria. De
maneira análoga, DIF será a forma. Este paralelo pode ser enganador pelo menos
de duas formas: (a) a associação da matéria tanto ao determinante (como
materiaa) quanto ao determinável (como matéria simpliciter) e (b) a sugestão que
GEN seja, de algum modo, sem forma. As duas dificuldades podem ser debeladas se
se pensa a partir do par mais abstrato determinável/determinante, que pode
aparecer em diferentes contextos. Vê-se assim como eliminar o problema apontado
em (a), que demanda talvez um terceiro sentido de matéria, como pura
pontecialidade, sem forma alguma, que não pode ser nem a materiaa, nem a
matérian. (b), por outro lado, resulta unicamente da matéria desempenhando um
papel mais abstrato de determinável, sem que haja realmente nenhum sentido de
‘matéria’ que corresponda a este uso. Este deslizamento do uso de ‘matéria’
aparece em mais de um contexto na filosofia medieval – o chamado “hilemorfismo
lógico” é um exemplo um pouco diferente do mesmo mecanismo – e talvez produza

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mais confusões do que esclarecimentos. Este paralelo é de resto o tema do
parágrafo seguinte. A tese aviceniana não desempenha um papel realmente
importante na linha argumentativa que se desenvolve até, mas virá a ser central no
DEE.
24. Gênero e diferença não são partes da espécie, assim como matéria e forma
não são partes de um composto; a alma e o corpo, inversamente, são partes de
um composto. A intelecção de animal e a intelecção de racional são partes da
intelecção de homem, como aparece no teste de predicação: a intelecção de
homem não é a intelecção de animal ou de racional.
As possíveis confusões do paralelo GEN/matéria, ESP/forma levam novamente ao
esclarecimento mais direto da relação: não se trata de uma relação todo/parte,
como é o caso da relação determinável/determinante em geral. O tema da
intelecção começa a ser esclarecido: embora GEN, DIF e ESP não tenham relações
mereológicas, as inteleções respectivas, que podemos designar por /GEN/, /DIF/ e
/ESP/, têm relações mereológicas. O teste predicativo dá o resultado adequado:
/ESP/ não é /GEN/. Ao se inteligir a essência do homem, uma parte da intelecção é
a intelecção de seu gênero.
25. O gênero pode significar diferentes espécies porque sua unidade (i.e., sua
universalidade) decorre da indeterminação. Isto não significa no entanto que o
gênero designe algo numericamente uno nas espécies; o gênero significa alguma
forma, mas não de maneira determinada. A unidade do gênero difere da unidade
da matéria prima: enquanto esta última é una pela remoção de toda forma, o
gênero é uno por significar uma forma comum àquilo em relação ao qual é uno.
A primeira distinção retoma o tema da distinção determinável/determinante,
distinguindo os diferentes papéis do determinante: enquanto a materiaa leva a algo
numericamente uno, DIF, que irá especificar aquilo que o GEN significa de maneira
indeterminada, não leva a algo numericamente uno. GEN significa
indeterminadamente as formas. A distinção entre GEN e matéria prima volta à
maneira pela qual GEN é comum àquilo que cai sob ele: não porque toda distinção
tenha sido removida (como a matéria prima envolve a remoção de toda forma),
mas porque as distinções são significadas de maneira indeterminada. De maneira
talvez menos vaga, pode-se pensar que GEN irá significar que uma diferença ou
outra irá levar à forma específica, e irá fazê-lo dando algo como um modelo ou tipo
de diferença que se segue a cada GEN – como animais diferem, como plantas
diferem etc. –, ao passo que a forma não fornece nenhum modelo deste tipo.
26-29. A espécie significa de maneira indeterminada os indivíduos, assim como
o gênero significa de maneira indeterminada a espécie. Pode-se no entanto
significar a natureza excluindo-se a matéria assinalada. Isto se faz pelo termo
‘humanidade’, que não se predica de Sócrates. Ao se inteligir a humanidade, não
se intelige o princípio de individuação. Pode-se visar também, de maneira
abstrata, o componente individuante do homem, como matérian.
ESP significa de maneira indeterminada todos os indivíduos, assim como GEN
significa de maneira indeterminada as ESPs, como atestado pelo teste da
predicação. O teste da predicação dá no entanto um resultado diferente para
termos abstratos: não é correto dizer ‘Sócrates é humanidade’. Isto se explica pelo
fato de ‘humanidade’ significar o homem em abstração da matériaa. Assim, numa
teoria sobre o homem, não se fala dos indivíduos, mas daquilo que é comum a
todos, e a semântica deve explicar o funcionamento deste tipo de discurso. A este
traço da linguagem corresponde um elemento da noética: há uma intelecção do

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que é próprio a uma espécie que não inclui a intelecção dos indivíduos deste
espécie. Ao se visar o componente material, individuante, das substâncias
compostas, pode-se identificar “parte material” do todo. Note-se que o vocabulário
da mereologia volta aqui, designando quer a parte material, quer a parte formal,
embora não é claro aqui que haja realmente partes de um composto. É mais
esclarecedora a observação de 29: ‘humanidade’ significa como parte, o que
permite explicar a mecânica da predicação, talvez sem o compromisso metafísico
de um composto de humanidade e materialidade. No início de 28. TA busca o
análogo do mecanismo de abstração que leva à humanidade para o princípio de
individuação, mas não há realmente um sentido de matéria entre matériaa e
matérian. Talvez o confuso 28 seja ainda um efeito dos diferentes papéis da
matéria no par determinável/determinante. A dificuldade aparece na instável
relação entre matéria e indivíduo nestes parágrafos, que Kenny expõe do seguinte
modo: “Humanidade é apenas parte de Sócrates, mas uma parte de um tipo muito
especial. Ela inclui tanto a forma quanto a matéria, mas não o que distingue um
pedaço de matéria de outro. A essência de Sócrates não é Sócrates. Esta última
conclusão traz um problema. Pode-se facilmente aceitar que a humanidade não
inclua a matéria individuante. Mas isto parece ser verdadeiro da humanidade
considerada como um universal. Se, como defende TA, existem essências
individuais, e não apenas universais, podemos perguntar o que torna a essência de
Sócrates a essência de Sócrates. Não é a mesma coisa que torna Sócrates Sócrates,
i.e., a essência deste corpo particular? Se a matéria individua Sócrates em relação
a todos os outros seres humanos, não individua sua essência, em relação à essência
de todo outro ser humano? Se a humanidade enquanto tal contém forma e alguma
a matéria de um tipo específico, certamente a humanidade de Sócrates contém
forma e esta matéria do mesmo tipo específico. Esta é uma questão para qual em
vão se buscará uma resposta.” [Kenny 2002: 20-21]. O principal resultado destes
parágrafos a identificação de um elemento universal em cada indivíduo, que não
pode dele ser predicado (daí significar “como uma parte”) e que pode ser visado
por termos abstratos. O teoria dos universais é o tema do capítulo III.

Capítulo III

30-31. O próximo passo é relacionar a noção de essência com o gênero, a
essência e a diferença, e em que sentido estes são universais.
O tema a ser examinado neste capítulo é a teoria dos universais: como GEN (ou
ESP, ou DIF) se predica dos singulares que caem sob ele. TA retoma o teste da
predicação para estabelecer que não se trata de uma relação mereológica. Resta
estabelecer uma teoria positiva de como estes termos que significam a essência se
predicam de muitos.
32. Um gênero não cabe à essência enquanto esta é algo separado dos singulares,
porque o que é separado não se predica dos singulares.
Esta refutação rápida da posição dos platônicos ataca sobretudo uma
representação um pouco caricatural da posição platônica, que talvez se explique
pelo fato dos textos de Platão não serem lidos, embora direção explicativa aqui não
seja simples. O argumento parece poder ser reconstruído do seguinte modo: (i) a
essência do homem é separada do homem; (ii) a essência de uma ESP é composta
de GEN e DIF; (iii) GEN, DIF e ESP se predicam de indivíduos; (iv) se x está separado
de y, então x não se predica de y. Estas teses são incompatíveis. Abandonar (ii) ou

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(iii) não parece uma opção; (iv) poderia ser abandonado, pelo exame de diferentes
modos pelos quais as coisas são separadas. TA escolhe no entanto abandonar (i),
sem analisar realmente (iv), não sem analogia com o modo como trata relações
mereológicas sempre de maneira genérica. Note-se contudo que (i) não é uma
resposta direta ao problema fundacional.
33-34. O gênero cabe à essência na medida em que o gênero significa o todo, não
a parte. A essência assim vista pode ser considerada de dois modos: de acordo
com sua noção própria, tomada de maneira absoluta, e de acordo com o ser que
nisto ou naquilo. De acordo com sua noção própria, é verdadeiro dela apenas “o
que lhe cabe enquanto tal”. Ao homem enquanto homem cabe ser animal e
racional, mas não ser preto ou branco. Ser universal não cabe à noção de homem
tomada de maneira absoluta, pois se fosse este caso, não poderia ser dito do
individuo. Não cabe tampouco à noção de homem tomada de maneira absoluta
não ser universal, pois senão não poderia ser predicada de muitos.
TA introduz aqui a distinção crucial entre a essência tomada de maneira absoluta
e a essência tomada de acordo com o ser que tem nisto ou naquilo. O teste crucial é
o seguinte: se F cabe à essência de G tomada de maneira absoluta, então toda vez
que predicar G de x, deve-se dizer que x é F. Assim, se ‘racional’ couber à essência
de homem tomada de maneira absoluta, se se disser que Sócrates é homem, deve-se
dizer que Sócrates é racional; o racional é parte da essência do homem. Desta
caracterização são excluídas, de maneira imediata, caracterizações acidentais,
como a cor: não se pode dizer que cabe à essência de homem ser branco ou preto,
porque não se segue de Sócrates ser homem que ele é branco ou preto. O resultado
mais interessante deste teste diz respeito à universalidade: pode-se dizer que
essência do homem é universal? Se for este o caso, deveríamos dizer que se Sócrates
é homem, Sócrates é universal, o que é absurdo. Ela não pode tampouco ser una,
pois senão ela seria una em Sócrates e Platão, que são no entanto numericamente
distintos. A essência é indiferente à universalidade. A universalidade não é assim
essencial à essência, mas acidental, de acordo com o ser que tem em algo
particular. Utilizando ainda uma expressão usual na filosofia contemporânea,
pertence à essência de X aquilo que pertence a X qua X. Este o inicio da exposição
por TA de uma tese aviceniana, que estabelece que há diferentes maneiras de se
considerar uma essência.
35-36. Considerada de acordo com o ser que nisto ou naquilo, a essência pode
receber diferentes predicações – sao predicações acidentais. A natureza
considerada de maneira não absoluta tem no entanto um duplo ser: de acordo
com o ser que tem nos indivíduos e de acordo com o ser que tem na alma, com
acidentes próprios a cada modo de ser. De acordo com o ser que tem nos
singulares, a natureza é múltipla. [ver nota sobre universais]

Bibliografia
Kenny, A. Aquinas on Mind. Routledge. 1993.
Kenny, A. Aquinas on Being. Oxford University Press. 2002.
Pasnau, R. Metaphysical Themes. Oxford University Press. 2011.

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