Вы находитесь на странице: 1из 9

A montagem de correspondências em obras de Kieslowski e

Tarkovsky

The editing of correspondences in works of Kieslowski and


Tarkovsky

Aline Lisboa

Resumo

A montagem de correspondências apresenta, dentre seus principais aspectos, a


supervalorização do estilo e da forma em detrimento do conteúdo. O objetivo do trabalho é
compreender como se dá o processo de construção aberta desse tipo de montagem, traçando
um paralelo entre suas características e A dupla vida de Veronique (1990) de Kieslowski e O
espelho (1975) de Tarkovsky, examinando como se opera a relação entre os planos, o princípio
de transmissão e a composição poética destas películas.

Palavras-chave: Estética; Kieslowski; Montagem; Tarkovsky.

Abstract

The editing of correspondences presents, among its main aspects, the overvaluation of style
and form over content. The objective of this work is to comprehend how the process of open
construction of this kind of editing takes place, making a parallel between its characteristics and
The Double Life Of Veronique (1990) by Kieslowski and The Mirror (1975) by Tarkovsky,
examining the relation among the plans, the principle of transmission and the poetic
composition of these films.

Keywords: Aesthetics; Kieslowski; Editing; Tarkovsky.

A Montagem de Correspondências: Implicações Estéticas

O sistema de montagem por correspondências apresenta, dentre seus principais

aspectos, a supervalorização do estilo e da forma em detrimento do conteúdo. Neste tipo de

montagem a narração e a demonstração dão lugar à sensorialidade, ocorrendo transformações

de ordem formal, rítmica e temporal. É uma espécie de montagem que utiliza muito pouco do

recurso narrativo, de modo a não possuir, de fato, um fio condutor que apresente linearidade

exata. Aqui a sensação é preponderante em relação ao ser representado.

Percebe-se a colagem e não a planificação, como procedimento estético dominante da

montagem por correspondências, baseando-se em um princípio de fragmentação e

restauração, longe de conduzir o olhar e estabelecer uma continuidade. A colagem provoca a


construção de hipóteses do espectador e suscita reaproximações entre unidades esparsas no
1
filme, tornando-se imprevisível, constituindo a relação entre os planos através de ecos .

A relação entre os planos aqui se dá através desses ecos, construindo repetições,

semelhanças, reposições em consequência da formação de rimas, estas como similaridades

aproximativas, que, por vezes, tornam-se distantes e causam sensações que afloram os

sentidos do espectador (XAVIER, 2012). Como exemplo, podemos citar um dos nossos objetos

de análise A dupla vida de Veronique (1990), filme do diretor polonês Krzysztof Kieslowski, que

se utiliza de recorrências e situações de equivalência, projetando sensações que tendem a se

manifestar em momentos esparsos; como o fato de Veronika e Veronique possuírem aptidão

de canto; ou ainda sobre a semelhança física entre as duas mulheres.

Utilizando um princípio de transmissão, que mais sugere do que significa ou conta uma

história, a montagem por correspondências funciona como experiência estética sensível e

associa elementos longínquos que intencionam expressar a mesma sensação, organizando-se

diante de um sistema ambíguo de rimas e correspondências.

Ainda em A dupla vida de Veronique (1990) podemos perceber a montagem

funcionando como efeito estético sensível, a partir do momento em que são dispostas duas

trajetórias aparentemente díspares, mas que na verdade convergem diante de uma ligação

misteriosa entre as duas personagens, Veronique e Veronika, interpretadas por Irene Jacob,

existindo uma separação de até mais de uma hora entre as duas partes do filme.

A estética da montagem por correspondências apresenta o ritmo e a rima como

elementos característicos em sua estrutura relacionada à forma e ao tempo, como afirma Amiel

(2007, p. 114), “as escansões transformam a duração, e os ecos modelam-na de outra forma”.

Os cortes não proporcionam saltos temporais, ao invés disso desagregam os fragmentos,

possibilitando situações de contradição ou repetições, ir e vir, sem, no entanto, seguir

cronologicamente uma linearidade. Percebemos isso de forma latente em O espelho (1975),

filme do diretor russo Andrei Tarkovsky, nosso segundo objeto desta pesquisa, que traz uma

análise existencial do ser humano, mesclando ficção científica, poesia e filosofia. Através do

uso de flashbacks e forte ambiguidade, esta última considerada uma característica marcante

1
Efeito visual ou sonoro que lembra outro, criando efeitos sensíveis que desembocam em rimas (AMIEL,
2007).
da estética por correspondências. O filme exige do espectador a formulação de hipóteses

acerca do que se apresenta na tela, antes do desfecho final.

Em linhas formais, reside uma não proposição de significações, muito menos de

continuidade narrativa. Através das correspondências são feitas sugestões, que estimulam a

percepção do espectador diante dos fluxos de imagens:

Porque é sensível e inteligente, esta montagem transporta, na sua


forma, o mundo que reorganiza. E poder-se-ia dizer que ao solicitar
ao espectador a possibilidade de retrocessos, de recordações ou de
sensações deslocadas, ordena, imobiliza, uma construção, no
entanto, recebida a priori como móvel. (AMIEL, 2007, p.116-117).

A relação espaço-temporal na montagem por correspondências se pronuncia de forma

subjetiva, já que remete à percepção do instante e não à duração, de acordo com a ruptura ou

o comprimento. Há uma espécie de percepção acronológica, não permitindoao espectador

fazer distinção do tempo, da época, provocando um mergulho no fluxo visual da unidade

fílmica. Como acontece em O espelho (1975), em que presente e passado se fundem em

instantes próximos, durante a montagem, sem que haja uma diferenciação temporal. Neste

sentido, as articulações visuais e sonoras, coexistem de forma diferenciada, sem no entanto

estabelecer a qual momento pertence aquela situação.

A partir dessa breve enunciação dos principais aspectos da montagem em questão, é

possível agora observar como os elementos discutidos se apresentam em nossos objetos de

análise: A dupla vida de Veronique (1990) e O espelho (1975), demonstrando como se dá o

processo de construção aberta desse tipo de montagem, traçando um paralelo entre suas

características e as obras indicadas.

O duplo em A dupla vida de Veronique

Em A dupla vida de Veronique, Kieslowski nos remete ao tema da duplicidade, aqui

tratado como antagônico e semelhante, concomitantemente. Em um dado momento, não fica

claro se estamos observando Veronika ou Veronique, afinal o diretor, de forma proposital, nos

causa certa confusão entre uma e outra, nos primeiros minutos da película, até que alguns

fatos vão se desenrolando e começamos a perceber quem é uma e quem é a outra.

Isso demonstra certa descontinuidade na articulação entre os planos, pois não segue

precisamente uma relação lógica e contextual, como os outros dois sistemas de montagem,
2 3
narrativa e discursiva . Esta é uma característica própria da montagem de correspondências,

onde é possível questionar até que ponto as diferenças são maiores que as semelhanças e

vice-versa.

O filme de Kieslowski apresenta ainda uma composição aberta da montagem, que

sugere, provoca sensações e evita, necessariamente, a condução do olhar pela diegese

fílmica, ou ainda produz significados através do conflito entre as imagens. Trata-se, neste caso,

de ir além da soma de conteúdos entre os planos, já que a intenção é justamente investir nos

fluxos transversais, fragmentar o tempo e a ação das personagens e permitir que a

sensibilidade ocupe os espaços, fazendo com que o espectador possa fruir diante de

composições poéticas da linguagem audiovisual.

A cena de Veronika encontrando Veronique apresenta a intenção de Kieslowski em ir

revelando aos poucos elementos característicos de cada personagem para que possamos

começar a identificar quem é quem na construção fílmica. Aqui, apenas uma se dá conta da

existência da outra. Somente no desfecho da película é revelada a Veronique a existência de

Veronika, algum tempo após sua morte.

Figura 01 – Frames da passagem de Veronika encontrando Veronique

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=EecLJK4eI4Y

2
A estética da montagem narrativa tem como premissa estabelecer articulações entre os planos, a fim de
narrar uma história. Configura-se como dominante na perspectiva cinematográfica da atualidade.
3
Método de montagem que tem como característica dominante criar um dialogismo entre elementos
discursivos e visuais, a fim de produzir o sentido do filme.
Há a predominância da montagem por correspondências, mas o traço narrativo

também está presente em A dupla vida de Veronique; onde encontramos, muitas vezes,

articulações entre os planos ao invés de ecos formais. Além disso, a planificação se faz

presente enquanto procedimento estético, mas é através da colagem que são estabelecidas as

relações de continuidade e descontinuidade entre os planos. A escansão entre as cenas –

ruptura e reposição – dita o ritmo do filme, que neste caso se mostra um pouco mais lento,

aflorando sensações diante da composição imagética apresentada por elementos de ordem

técnica, como a fotografia e direção de arte.

No entanto, apesar de certa lentidão no ritmo, o filme cria associações utilizando rimas

que ora afasta, ora aproxima as personagens e situações vividas por elas. É uma forma de nos

fazer sentir a obra de outra maneira, como se a evidência de algo que estava já certo, aos

poucos desvanecesse e trouxesse outro sentido à narrativa. E essas rimas, de acordo com

Amiel (2007, p. 110): “Se os cortes podem dar o ritmo, já os ecos entre os planos podem

produzir rimas. Repetições de longe em longe, similaridades aproximativas, sensações que

abrem à memória um espaço diferente, e projetam noutros lugares sentimentos que voltam a

palpitar”. Desta forma, acreditamos em um prolongamento através do ritmo mais lento aplicado

à película e o uso de rimas para trabalhar a sensorialidade, ora aproximando, ora afastando o

destino das personagens.

Se em A dupla vida de Veronique encontramos traços narrativos ainda marcantes, na

obra de Tarkovsky a predominância é basicamente da montagem de correspondências, tanto

que em O espelho podemos observar uma não definição da temporalidade de forma proposital,

a fim de “jogar” com o tempo. Em ambos, as fragmentações provocam sensações, entretanto

na obra de Kieslowski a questão da temporalidade não é o eixo central trabalhado na

montagem, diferente de O espelho que evoca a sensorialidade através de artifícios como o uso

de flashbacks. Para além da construção da história, os dois filmes apresentam paradoxos, o

primeiro diante da duplicidade em relação às personagens; o segundo utilizando como ponto

central o tempo e as relações de ambiguidade estabelecidas pelo mesmo.

O paradoxo do tempo em O espelho


Tarkovsky (1989) defende uma postura, acerca da montagem, que difere em muitas

instâncias do cinema soviético de 1920 ou do modelo baziniano de cinema. Ele ressalta a

função da montagem como “colagem de pedaços”, em que cada um apresenta por si só uma

particularidade temporal, ainda sobre isso ele diz, “a montagem perturba o curso do tempo,

interrompe-o e, simultaneamente, devolve-lhe uma qualidade nova. A sua distorção pode ser

um meio de expressão rítmica”. A postura do cineasta reflete nada mais que a defesa das

correspondências como artifício de ruptura da visão, como forma de criar novas percepções e,

sobretudo, sensações.

Em O espelho podemos perceber a intenção do diretor em utilizar o tempo como

artifício para criar paradoxos, ambiguidades e até mesmo sinestesias através das imagens e do

som. Existe uma influência existencialista muito forte em Tarkovsky e em O espelho isso é

notado diante da mescla que ele faz entre poesia, ficção científica e filosofia. Outro recurso

bastante utilizado pelo diretor russo é o uso de flashback para constituir passagens do tempo,

exigindo do espectador a formulação de hipóteses acerca do que se apresenta na tela, antes

do desfecho final.

Em cenas que apresentam sonhos, o inconsciente da personagem e temas oníricos

encontramos o uso do flashback, acompanhado aqui de elementos diferenciadores na

fotografia, como tons de sépia e preto e branco. O uso de longos planos sequenciais também

são caraterísticas marcantes de Tarkovsky, que juntamente com os demais elementos já

citados incorpora a estética da montagem de correspondências criando assim uma abertura da

montagem, aspecto peculiar do estilo de correspondências.

Figura 02 – Uso do flashback em O espelho, a indicação do tempo através da fotografia


Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=a-2oUxYHdu8

Essa relação proposital entre tempo e espaço é utilizada por Tarkovsky para provocar

estranheza no espectador, diante da correspondência entre os planos. Justamente, neste

momento, é que vai se dar a pressão do tempo, onde “articulações visuais e sonoras permitem

exprimir uma alteridade cronológica” (AMIEL, 2007, p. 117), ou seja, o importante em O

espelho não é distinguir as épocas e situá-las de acordo com a relação entre os planos, mas

sim criar as associações necessárias entre as cenas, a fim de estimular no espectador

impressões, percepções e o reconhecimento da construção fílmica.

A montagem para Tarkovsky é muito mais que uma operação técnica, sobretudo é um

procedimento que envolve a proposta estética do filme e isso pode ser ratificado através de seu

relato acerca do trabalho de montagem em relaçao ao filme O espelho, especialmente quando

diz que houve mais de vinte versões diferentes até chegar ao resultado esperado. Para ele,

faltava coesão, coerência e lógica entre as articulações dos planos e isso afetava fortemente a

percepção da existência do tempo no filme. Para Tarkovsky: “A montagem perturba o curso do

tempo, interrompe-o e, simultaneamente, devolve-lhe uma qualidade nova. A sua distorção

pode ser um meio da sua expressão rítmica.” (AMIEL, 2007, p. 120).

Essa interpretação sobre a montagem faz com que possamos perceber as relações de

correspondências como um procedimento que corta, retalha, rompe com a continuidade do

tempo para assim provocar a abertura da montagem e criar percepções diferenciadas do que

costumamos ver na montagem narrativa e discursiva.

Encontramos a estética de correspondências de forma muito visível em cenas de O

espelho que mostram a vida da protagonista, Marússia, de trás para frente, criando ainda

conexões aleatórias entre a família espanhola que vivia naquela casa e quando uma das

personagens dialoga com Ignat, confundindo assim o espectador. O uso de metáforas também

é recorrente nesta obra de Tarkovsky, que utiliza a morte do galo como algo simbólico diante

de um país entre guerras.


O final em aberto nos deixa em dúvida sobre a idosa ser Marússia ou não. A

subjetividade toma conta do desfecho de O espelho e traz à tona mais uma vez o recurso da

pressão do tempo, causando percepções díspares entre os espectadores. Desta forma

podemos inferir que essa película é, de fato, um belo trabalho sobre o estímulo ao uso do

incosciente, através das correspondências entre os planos. A montagem aqui tem papel

fundamental nesse processo de constituição da proposta estética do filme.

Considerações finais
Uma montagem aberta, sem evidências de significações. Assim se configura a estética

por correspondências, que diferentemente da narrativa e discursiva permite ao filme uma

ampliação, extensão do horizonte a ser captado pelo espectador. Há nitidamente nesta

categoria a presença de desarticulações, afastando-se de uma linha narrativa e expressiva,

manifestando, por vezes, uma ausência causada pela ruptura brusca sem explicações, sem

enredamentos.

Filmes como A dupla vida de Veronique e O espelho ilustram bem a construção desse

tipo de montagem que trabalha a impressão e não a narração ou confrontação, como meio de

expressar os fluxos das imagens.

Para além do formalismo do cinema soviético clássico, encontramos aqui

possibilidades diferenciadas em Tarkovsky, que legitima a articulação entre os planos através

de relações sensíveis que estes podem estabelecer uns com os outros, inferindo assim novos

modos de ver e pensar sobre a estrutura fílmica criada.

Já em A dupla vida de Veronique, Kieslowski aponta a montagem como possibilidade

de revelação e não de apresentação, como encontramos de forma mais latente na discursiva e

narrativa. A montagem para este diretor equivale a um fragmento do real, que acaba

oferecendo meios à designação do sentido a ser criado, estabelecido.

Em suma, devemos aqui ficar atentos a duas particularidades da montagem por

correspondências, a fim de compreender sua construção de modo mais contundente. A

primeira no que concerne aos fluxos transversais que estão para além da sucessão ou do

encadeamento das ações cronológicas de A dupla vida de Veronique (1990) e O espelho


(1975); a segunda em relação à estrutura aberta, impregnada de subjetividade através dos

elementos que compõem visualmente as obras de Kieslowski e Tarkovsky.

Referências

AMIEL, Vincent. Estética da montagem. 1ª edição. São Paulo: Texto & Grafia, 2007.

AUMONT, Jacques. (Org.) A estética do filme. 8ª ed.Campinas, SP: Papirus, 1995.

BORDWELL, D.; THOMPSON, K. A arte do cinema: uma introdução. 1ª edição. São Paulo:
Edusp, 2013.

CRARY, Jonathan. Suspensões da percepção: atenção, espetáculo e cultura moderna.


Tradução: Tina Montenegro. São Paulo: Cosac Naify, 2013.

ECO, Umberto. Obra aberta: forma e indeterminação nas poéticas contemporâneas. São
Paulo: Perspectiva, 1976.

EINSENSTEIN, Sergei. O sentido do filme. Rio de Janeiro: Zahar, 2002.

______. A forma do filme. Rio de janeiro: Zahar, 2002.

JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. 14. ed. Campinas, SP: Papirus, 2010.

TARKOVSKY, Andrei. Le Temps Scellè. In: Cahiers du Cinéma. France, 1989.

XAVIER, Ismail. O discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. 2ª edição. São


Paulo: Paz e Terra, 2012.

Вам также может понравиться