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A ciência como profissão: médicos, bacharéis mo uma tese de doutorado defendida na Uni-
e cientistas no Brasil (1895-1935). Dominichi versidade Federal do Rio de Janeiro, realizada
Miranda de Sá. Rio de Janeiro: Editora em parte na École des Hautes Études en
Fiocruz, 2006, 216 p. Sciences Sociales de Paris, demonstra, no nosso
presente, também certas influências institu-
Márcia Regina Barros da Silva cionais no pensamento da autora, como o
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, destaque dos médicos em detrimento de outros
Brasil profissionais, para compor o corpus de sua dis-
<mbarros.cehfi@epm.br>
cussão.
O livro de Dominichi Miranda de Sá aborda um Há a meu ver duas grandes virtudes no for-
tema de grande constância no debate acadêmi- mato de análise adotado neste estudo. Primeiro
co brasileiro: a participação do intelectual no a opção por construir uma unidade a partir de
cenário público do país. Sua análise se concen- determinados discursos escolhidos como fundo
tra na tentativa de desvendar as transformações para sua análise, no lugar de eleger um corpo
pelas quais uma gama variável de homens, documental único. Essa decisão sublinha as
amalgamados pelo ideal comum de conhecimen- próprias incongruências e contradições de um
to enciclopédico, se modificava e se encaminha- período de intensas transformações na história
va para a especialização profissional. brasileira. Não parece ter sido objetivo da auto-
As pistas que a autora vai recolhendo, para ra apresentar dados e fatos estanques e unívo-
construir o panorama dessa mudança, vão cos como balizas para o entendimento das con-
sendo entrelaçadas de forma a identificar as cepções que conformavam as categorias em es-
exigências sociais envolvidas no processo de tudo, que podem ser batizadas genericamente
distinção entre profissionais das ciências e de bacharelescas e científicas. Seu desejo foi
letrados. No seu entender, estas transformações conversar, por um lado, com tais retóricos sobre
estariam, sobretudo, baseadas na idéia de subs- sua visão de um mundo em vias de desapareci-
tituição em que a linguagem adotada por uma mento, para os quais estava fora de questão
cultura da retórica e do excesso vai sendo sola- aceitar a extinção passivamente. Há mesmo uma
pada por outra fala, a da ciência, podendo ser leve simpatia por essas figuras de época, cujo
representada principalmente, mas não exclusi- viés destacado pela autora pode ser identifica-
vamente, pelo discurso médico. do no trecho a seguir:
Nesse percurso vão surgindo dados que nos
informam sobre o momento de profundas trans- “Sem estilo definido e ignorando gêneros
formações que alterava o modo como a socie- dos discursos, a retórica só podia ser
dade brasileira se via e se projetava no conjun- definida pelo efeito irresistível que causa-
to das nações entendidas como civilizadas. O va quando do seu emprego pelo letrado –
período estudado se concentra no momento de a admiração pela grandeza do ornamento,
instalação da República, hora da explosão de por idéias apreciadas como se fossem
instituições de vários matizes, que vão da ativi- sabores. Era por intermédio dessa figura
dade científica à produção literária. Nesse uni- de linguagem, o ornamento, que o audi-
verso institucional, a autora elenca as insti- tório sentia-se como que transportado,
tuições que considera principais para esse estu- pelos ritmos e sons das palavras, do
do – Academia Brasileira de Letras, Museu Na- desconhecido para o conhecido, desco-
cional, Revista do Brasil, Instituto Oswaldo brindo novas perspectivas de saber e de
Cruz. Sua escolha não foi examinar espa- conhecimento sempre imprevistas” (p. 53).
ços institucionais em si, nem biografias de
personagens particulares, mas sim verificar Por outro lado, os cientistas, na busca pela
como o estilo adotado por diferentes figuras de profissionalização de suas atividades, também
destaque, como Roquette Pinto ou Carlos não foram vistos como um grupo fechado em
Chagas, entre outros agentes, informa sobre as especialidades ou escolas, mas sim como
opções dos homens cultos daquela sociedade, partícipes de um período em que nas próprias
sobretudo a carioca, aqui entendida em um sen- palavras da autora: “Com efeito, mais do que
tido universal. O texto, inicialmente escrito co- uma profissão, a ciência representava uma

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‘visão de mundo’, um ‘paradigma’ para todas as Recordo aqui outra obra, publicada também
outras formas de manifestação intelectual” em 2006, O silêncio dos intelectuais, organi-
(p. 103). zada por Adauto Novaes, cujo objeto tem
Há uma segunda qualidade evidente no es- proximidade temática com a discussão de
tudo, de maior interesse para quem pretende Dominichi. Neste livro, Renato Janine Ribeiro
obter uma leitura mais geral dos processos de nos dá uma descrição importante da dife-
ascensão da atividade científica como ponta de rença de significados entre as figuras do in-
lança da cultura que nascia dos escombros do telectual e do cientista, mesmo reconhecendo o
Império. A noção que vai sendo desenvolvida objeto comum que os une – o conhecimento.
aos poucos, no decorrer do texto, de que a uni- Nas palavras de Ribeiro:
versidade brasileira, principalmente a Univer-
sidade de São Paulo, criada em 1934, tomada “Convirá, aqui, lembrar que o cientista é,
como o símbolo máximo de profissionalização etimologicamente, o que sabe (do verbo
da ciência nacional, não foi o ponto de partida, latino scio), ao passo que o intelectual é
mas o ponto de chegada de uma vontade geral quem vê, entende, se dá conta. Por con-
que procurou estabelecer a atividade do conhe- seguinte, intelectual e cientista não são
cimento científico como o horizonte da nova sinônimos, mas isso não significa que se
cultura da modernidade no Brasil. Entre outras distingam por seus objetos, e sim por suas
instituições apontadas pela autora como repre- atitudes. Proporemos então outra defi-
sentativas de um processo de estabelecimento nição de intelectual: ele é quem lida com a
de novos padrões culturais, estariam justa- ágora, com dar caráter público àquilo cujo
mente as citadas Academia Brasileira de Ciên- conhecimento estaria num primeiro
cias, a Associação Brasileira de Letras e a Asso- momento, fechado no ambiente acadêmi-
ciação Brasileira de Educação. Para Dominichi, co” (Ribeiro, 2006, p. 141).
a linguagem científica, clara, precisa, normati-
va e normatizada foi anteposta como o exato Pensando nos termos de um debate público
contrário da linguagem literária e pomposa da dos sábios de outrora com os especialistas cien-
cultura bacharelesca. O cientista, como agente tistas que começavam a se impor, houve o de-
desse processo modernizador, vai sendo des- senrolar do que Raymundo Faoro chamaria o
crito pela autora como aquele que consciente- ‘drama republicano’. Faoro entendia que o es-
mente constrói sua própria imagem a partir dos forço civilizatório e modernizador dos substitu-
parâmetros que determinam o grau de cientifi- tos do antigo governo escondia a tentativa de
cidade de uma dada atividade. distanciamento da realidade brasileira em nome
Alguns temas, no entanto, ficam para ser de um projeto pedagógico de ajuste cultural da
discutidos. Há, no meu modo de entender, uma sociedade em nome do futuro (Faoro, 1987).
aceitação um pouco maior do que seria É nesse sentido que podemos discutir quanto as
necessária das discussões de época na leitura promessas do discurso científico e as práticas
dos processos apontados anteriormente. Uma disseminadas de adequação social às normas e
questão pertinente, por exemplo, seria a de efeitos do conhecimento obtido pela ciência não
problematizar criticamente a idéia de que a vul- deram (e ainda não dão) significado positivo
garização científica seria apenas um “recurso por si sós. A simples difusão do conhecimento
educativo”. Além disso, entendê-la comparati- não habilita sua apropriação e uso pelas ca-
vamente como “o que hoje conhecemos como madas populares. Às vezes, pelo contrário, so-
divulgação pública dos conhecimentos científi- mente submete o público à fala competente e às
cos” (p. 91) dilui o debate sobre a divulgação vontades do poder.
científica como uma área de auto-afirmação de Independente disso, o livro de Dominichi
determinado campo científico. O fato mesmo Miranda de Sá suscita uma maior compreensão
de a autora identificar uma concentração de do período de transição da sociedade brasileira,
funções no Brasil entre aquele que divulga como parte de uma transformação mundial e
e aquele que realiza a atividade científica não somente a seu reboque. O processo de legi-
poderia servir como ponto de partida para esse timação social da atividade especializada da
questionamento. ciência, neste livro bastante bem matizado, nos

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faz compreender a importância de pensar a


atividade científica como um fator intrínseco à
história do Brasil e aos seus desdobramentos.

Referências

FAORO, Raymundo. Os donos do poder: for-


mação do patronato político brasileiro. Porto
Alegre: Globo, v. 2, p. 469, 1987.

RIBEIRO, Renato Janine. O cientista e o inte-


lectual. In: NOVAES, Adauto (Org.). O silêncio
dos intelectuais. São Paulo: Companhia das
Letras, 2006. p. 137-149.

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