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Boletim Técnico do BDEP

Edição nº2

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Os conteúdos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis no seu todo, não se responsabiliza por esses conteúdos nem por ações que advenham dos mesmos. As opiniões,
bem como os comentários, emitidas pelos autores são também de total responsabilidade dos mesmos, sendo que as opiniões e
comentários não representam a opinião da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis ou de sua diretoria
colegiada. A reprodução total ou parcial de artigos está autorizada, desde que a referência completa para o artigo ou seção
pertencente a este jornal digital seja citada e leis de direitos autorais e conexos sejam cumpridas.
EDITORIAL
A segunda edição do Boletim Técnico do BDEP apresenta aos leitores uma visão particular sobre o mercado de E&P na
América do Sul. O autor é o especialista em mercado e economia de petróleo Luis Eduardo Duque Dutra, também o atual
assessor de diretoria da ANP.

Este artigo foi publicado em outubro de 2012 e além de uma análise técnica e econômica, apresenta um amplo panorama
histórico e político das atividades e decisões que hoje, como é possível observarmos, definiram o atual cenário das nações sul
americanas envolvidas no mercado E&P. Os grandes choques mundiais do petróleo e o fenômeno “Maldição da Abundância”,
por exemplo, são citados e explicados pelo autor, além de identificar a fuga de capitais e a lenta redemocratização como
contribuintes para a remota produção da região por quase duas décadas. Países da América Central e do Caribe são citados
em alguns momentos, porém somente em razão das estatísticas da BP Statistical Review, fonte das informações, os incluírem
nas pesquisas.

O foco do estudo é exclusivamente o petróleo, não sendo abordado o gás natural, cuja importância foi crescente na região e
que é um reconhecido instrumento de integração regional. O objetivo do autor foi avaliar as perspectivas de reprodução
ampliada do capital nas atividades de E&P. Em seguida ele analisa a evolução da produção, do consumo e das reservas de
petróleo nas últimas quatro décadas. O que representa o desafio do desenvolvimento do óleo não convencional, as
oportunidades para operadores independentes e para o capital local são temas que também foram abordados ao longo do
artigo.

A proposta do BDEP é fomentar contribuir com a indústria especializada, a sociedade acadêmica e os profissionais do setor
onshore e offshore. Essa publicação reflete a preocupação do Banco em registrar os estudos técnicos sobre exploração,
regulação e produção de petróleo e gás natural produzidos pelos profissionais da Agência Nacional do Petróleo.

Desejamos uma boa leitura!

Os Editores
O petróleo na América do Sul

O petróleo na América do Sul,


para não repetir a História.
A primeira metade do século XXI abre uma oportunidade única para
a América do Sul se inserir definitivamente na indústria petrolífera
mundial. A maldição da abundância é um fenômeno recorrente ao
longo dos últimos cinco séculos na América do Sul. Contudo,
durante o século passado, a vocação petrolífera da região só se
confirmou na Venezuela. Após o segundo choque do petróleo, no
subcontinente, a lenta redemocratização, a fuga de capitais e quase
duas décadas perdidas não inibiram o crescimento da produção, do
consumo e das reservas de petróleo. Uma franca melhora ocorreu
na última década, com a completa reversão das expectativas e dos
resultados.

Surgiram novos países no cenário regional e a Venezuela não é


mais o único foco. A América do Sul aumentou sua participação na
indústria mundial do petróleo e, ao final da última década, destacou-
se pelo incremento do potencial exploratório com a incorporação de
reservas não convencionais: petróleo pesado da Venezuela,
ultraprofundo no Brasil e de folhelho na Argentina. Cerca de um
quinto das reservas provadas mundiais está localizado no
subcontinente.

No setor petrolífero, a reconstrução dos instrumentos de


intervenção do Estado foi lenta. A abertura ao exterior exigiu a
modernização das estatais, como foi o caso da Ecopetrol e da
Petrobras, e a constituição de agências reguladoras. Sucessivas
rodadas de licitações de blocos exploratórios, durante a década
passada, transformaram a estrutura dos mercados nacionais,
trouxeram novos capitais e mais competição, gerando uma nova
dinâmica de crescimento e uma onda de investimentos.

Trata-se de um novo espaço econômico, geograficamente contínuo


e politicamente em consolidação, onde se destacam a Argentina, o
Brasil, o Chile, a Colômbia, o Equador e o Peru, além da Venezuela,
e onde o capital petrolífero encontra as condições apropriadas para
se multiplicar. Na América do Sul, existem oportunidades para o
grande capital no que diz respeito ao aproveitamento do potencial
petrolífero não convencional e também existem oportunidades para
as operadoras independentes e para o capital local desenvolver
jazidas menores, num sem fim de bacias sedimentares, ainda
desconhecidas em sua geologia.

A primeira metade do século 21 abre uma oportunidade única para a


região se inserir definitivamente na indústria petrolífera mundial. O da atuação dos reguladores na América do Sul. Ele não é reservado
grau de amadurecimento institucional, o potencial em reservas e a e não faz uso de informações protegidas pela propriedade
disposição dos investidores externos se conjugam, mas não intelectual.
bastam. O desafio financeiro e tecnológico do aproveitamento do
petróleo não convencional é proporcional ao desafio de regular o A vocação petrolífera da América do Sul é quase tão antiga quanto à
setor, promover o desenvolvimento industrial local e fazer bom uso indústria. Na Venezuela e na Colômbia, a produção remonta às
da renda extraordinária apropriada pelo Estado. primeiras décadas do século 20, assim como na Argentina, onde o
gás natural acabou por assumir uma pioneira e notável participação
O foco do estudo é exclusivamente o petróleo, não sendo abordado na matriz energética a partir de meados do século passado. A
o gás natural, cuja importância foi crescente na região e que é um despeito desta vocação histórica e de numerosas bacias
reconhecido instrumento de integração regional. A região tratada é a sedimentares ainda pouco conhecidas, o subcontinente
América do Sul, mas, em razão da fonte das informações terem sido permaneceu relativamente à margem do mercado internacional na
a BP Statistical Review, também estão incluídas as nações que segunda metade do século passado.
formam a América Central e o Caribe; o que não impede (como será
visto) de identificar os principais países da América do Sul. O Na produção mundial, a participação da região não é expressiva e
comércio intrarregional não foi abordado e será objeto de estudo manteve-se relativamente estável, como pode ser visto pelo gráfico
próximo. O objetivo foi avaliar as perspectivas de reprodução 1. Nos últimos quarenta anos, ela esteve em torno de 9%. Na
ampliada do capital nas atividades de E & P. Em sequência, é verdade, chegou a cair fortemente, para depois recuperar-se,
analisada a evolução da produção, do consumo e das reservas nas ficando abaixo do que representava em 1971 (9,29% versus 8,83%)
últimas quatro décadas. A natureza que representa o desafio do no ano passado; se forem consideradas as informações publicadas
desenvolvimento do óleo não convencional, as oportunidades para pela BP Statistical Review. Esta acanhada participação não condiz
os operadores independentes e para o capital local são objetos das com a vocação extrativa da América do Sul, nem com as
três seções finais. perspectivas que se abriram a partir do início do século 21 com o
rápido crescimento econômico verificado na região e, muito menos,
Este estudo foi feito para subsidiar a iniciativa da ANP, contida na condiz com o seu potencial petrolífero em termos de reservas como
Proposta de Ação nº 26/2012, de buscar uma harmonização maior será visto adiante.

3 Boletim Técnico do BDEP nº2


Luis Eduardo Duque Dutra

*Gráfico 1: Produção de petróleo na América do Sul e Central em produzidos em média por dia, em 1981, o volume foi um milhão
relação à produção mundial, em percentagem (1971, 1981, 1991, menor. Durante a década seguinte, a produção da América do Sul e
2001, 2011) Central tratou de recuperar a perda anterior; em 1981, a produção
voltou a 4,7 milhões de barris por dia. Assim, foram vinte anos sem
progresso no que diz respeito à produção de petróleo na região.
9,29
10,00
8,99 8,33 O contexto político e sua evolução devem ser considerados. A
7,28 despeito da disparidade e de sua distinta velocidade, natural se
8,00
lembrado o número de países envolvidos (na América do Sul são 12
6,26 e na América Central são mais 20 nações, incluindo 13 caribenhas),
6,00
constata-se um percurso comum na construção da democracia em
substituição às ditaduras militares. A falência das políticas públicas,
4,00
a espiral inflacionária e a crise da dívida foram decisivas para a
2,00 contestação política dos antigos regimes de exceção. Em
sequência, em particular no subcontinente sul-americano,
0,00 parecendo que por contágio, uma a uma, as diferentes nações
foram definindo os marcos para a lenta redemocratização e a volta
dos coronéis e generais à caserna.
1971 1981 1991 2001 2011
Se a recessão econômica e o estágio de transição política não eram
*Fonte: BP Statistical View favoráveis, menor ainda era a disposição para investir. Após 1982,
os preços do petróleo iniciaram um movimento de baixa que atingiu
seu mínimo só no final da década seguinte. De quase 40 dólares por
Na tabela a seguir estão discriminados os principais produtores da barril, os preços caíram para apenas 12 dólares por barril em julho
região e o volume produzido em cinco momentos diferentes, de de 1999. Na captação de recursos, as grandes petroleiras deixaram
forma a se poder acompanhar a evolução nos últimos quarenta de ser as preferidas e passaram a competir com as empresas da
anos. A soma da produção de petróleo dos países sul e centro- nova economia: informática, comunicações e biomédica, que
americanos chegou a cair durante a década de 1970, mas, nos registravam muito melhor desempenho nas bolsas.
últimos trinta anos, voltou a se recuperar de forma que, em 2011, ela
alcançou 7,4 milhões de barris por dia; quase o dobro da produção Na reposição das reservas, variável estratégica para uma petroleira,
em 1981 (3,7 milhões de barris por dia). Na região, naturalmente, o a situação não era melhor. Ela se fazia a custos crescentes, com o
peso da Venezuela era e ainda é muito grande, embora esteja desenvolvimento de jazidas cada vez mais profundas e em regiões
diminuindo ao longo do tempo. No último ano, no maior país cada vez mais remotas. Para piorar, o acesso às reservas mais
produtor da região, o volume médio de petróleo escoado dos poços baratas se tornou cada vez mais difícil, em razão da competição
(2,7 milhões de barris por dia) foi menor que há dez anos (3,1 com as petroleiras estatais, que assumiam gradualmente um papel
milhões de barris por dia) e bem menor do que há quarenta anos (3,6 preponderante. Entre programas de corte de custos, de demissão
milhões de barris por dia). O decréscimo da produção Venezuela voluntária e de desinvestimento, a partir da década de 1990, quando
acabou por contaminar o desempenho da região. buscou novas províncias, o grande capital petroleiro deu
preferência às vastas áreas na Ásia, abertas depois do fim da União
*Tabela 1: Produção de petróleo na América do Sul e Central, por das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
países selecionados e produção mundial, em milhões de barris por
dia (1971, 1981, 1991, 2001, 2011) Até o final da década de 1990, à exceção da Venezuela e de alguns
poucos países relativamente pequenos (como Trinidad e Tobago e
PAÍS / ANO 1971 1981 1991 2001 2011 Equador), o restante da América do Sul e Central estava à margem
do mercado internacional do petróleo. A região não despertava
Brasil 175 220 643 1.337 2.193 muito interesse. O que explica, em parte, a queda da produção
durante a década de 1970 e a lenta recuperação a partir da década
Colômbia 224 140 430 627 930 seguinte. Como foi visto, a outra parte da explicação reside nas
condições macroeconômicas negativas e no estágio de transição
Equador 4 213 307 416 509 política em curso com a redemocratização. De qualquer forma, o
subcontinente estava fora do portfólio do capital petrolífero e para-
Peru 64 194 116 98 153 petrolífero. Ademais, à exceção sempre da Venezuela, nenhum
outro país dispunha de algum papel preponderante na geopolítica
Trinidad & 129 189 149 135 136 internacional da energia.
Tobago

Venezuela 3.615 2.163 2.501 3.142 2.720 *Tabela 2: Produção de petróleo na América do Sul e Central, por
países selecionados e produção mundial, em milhões de barris por
Outros Am. do 80 87 77 137 134 dia (1971, 1981, 1991, 2001, 2011)
Sul & Central
Total América do 4.723 3.725 4.749 6.722 7.381 PAÍS / ANO 1971 1981 1991 2001 2011
Sul & Central

Brasil 175 220 643 1.337 2.193


*Fonte: Elaboração própria a partir de dados da BP Statistical Review.

Colômbia 224 140 430 627 930


As décadas de 1970 e 1980 foram particularmente difíceis para
quase todos os países da região. Os únicos que apresentaram um
Equador 4 213 307 416 509
crescimento considerável da produção de óleo bruto foram os três
primeiros listados na tabela acima: Brasil, Colômbia e Equador. Os
choques petrolíferos sinalizaram o esgotamento da ampliação do Peru 64 194 116 98 153
capital verificada após o fim da Segunda Guerra Mundial e a crise da
dívida, na década seguinte, ao racionar o financiamento externo, Sub-total 467 767 1496 2.478 3.784
dificultou a retomada do crescimento. A produção do petróleo foi
fortemente afetada pela deterioração das condições Total World 50.839 59.533 65.190 74.767 83.576
macroeconômicas. No decorrer da década de 1970, a queda da
produção da região foi expressiva: em 1971 eram 4,7 milhões barris *Fonte: Elaboração própria a partir de dados da BP Statistical Review.

Boletim Técnico do BDEP nº2 4


O petróleo na América do Sul

Este cenário pouco favorável na região como um todo, tem um principalmente durante a década de 1970. A Colômbia deslanchou a
interessante contraponto, se considerado um subconjunto partir de meados da década de 1980 e o Peru voltou a crescer na
determinado de países. Se forem selecionados apenas os quatro última década.
primeiros países discriminados na tabela anterior e que estão na
Tabela II, o desempenho é muito melhor, com um significativo Uma leitura mais detida da tabela anterior destaca o ganho de
aumento da produção. velocidade recentemente. O ritmo de crescimento da produção de
petróleo nos quatro países, durante a última década, é um claro
Brasil, Colômbia, Equador e Peru tiveram um desempenho notável indício das mudanças em curso. No período em análise, ocorreu a
no decorrer das últimas quatro décadas. A produção dos quatro expansão da fronteira da produção para novas áreas, o que trouxe,
países somada foi multiplicada por mais de oito entre 1971 e 2011. É naturalmente, novos atores ao mercado internacional do petróleo. O
interessante observar que o crescimento se fez, em cada um, a seu inédito papel destes países corresponde ao aumento da
ritmo. participação destes na produção regional e na produção
O Brasil cresceu sempre, o Equador, quase sempre, mas, internacional.

*Gráfico 2: Produção de petróleo do Brasil, Colômbia, Equador e *Gráfico 3: Produção de petróleo do Brasil, Colômbia, Equador e
Peru em relação à produção na América do Sul e Central, em Peru em relação à produção mundial, em percentagem (1971,
percentagem (1971, 1981, 1991, 2001, 2011) 1981, 1991, 2001, 2011)

60,00 5,50
51,27 4,53
5,00
50,00 4,50
36,86 4,00
40,00
3,50 3,31
31,50 3,00
30,00
2,50 2,29
20,59 2,00
20,00
1,50 1,29
10,00 9,89 1,00 0,92
0,50
0,00 0,00
1971 1981 1991 2001 2011 1971 1981 1991 2001 2011

*Fonte: Elaboração própria a partir de dados da BP Statistical Review.

Dentro da região, os quatro países assumiram uma importância (4,5% versus 2,1%); num claro indicador do processo de
crescente na produção total. A participação mais que quintuplica no industrialização ainda em andamento nesta parte do planeta.
período em análise, como pode ser observado pelo gráfico 2. De
marginais, em 1971, juntos, respondiam por menos de 10% da *Tabela 3: Consumo de petróleo na América do Sul e Central e
produção de óleo bruto, eles passam a responder por mais da produção mundial, em milhões de barris por dia (1971, 1981, 1991,
metade desta produção, quarenta anos depois. A evolução da 2001, 2011)
participação dos mesmos quatro países na produção mundial
também é digna de menção. Ela mais que quadruplica, saindo de PAÍS / ANO 1971 1981 1991 2001 2011
menos de 1% em 1971, para alcançar 4,5%, no ano passado.
Argentina 479 457 425 425 609
Evidentemente, a despeito do crescimento sustentado, Brasil,
Colômbia, Equador e Peru ainda são marginais no cenário Brasil 582 1.124 1.488 2.030 2.653
internacional, mesmo se considerados em conjunto. A aceleração
da produção recente, contudo, indica que esses países passaram a Chile 108 108 146 227 327
atrair as atenções do capital petroleiro e para-petroleiro e que o
cenário desfavorável, predominante nas últimas três décadas do Colômbia 121 161 211 227 253
século passado se desfez ao longo da primeira década do século
21. Isoladamente, nos quatro países, e fora o off-shore nas costas Equador 24 69 103 137 226
do Brasil, a produção ainda não dispõe de escala, mas, com certeza,
vistos em conjunto, após o desenvolvimento recente, já é possível a Peru 96 136 111 146 203
definição de estratégias de ampliação do capital num portfólio
articulado de ativos sob uma clara base regional. Portanto, as Trinidad & 42 32 24 26 34
perspectivas para o crescimento da produção na próxima década Tobago
são muito melhores do que as vigentes até o final do século Venezuela 211 435 402 622 832
passado.
Demais A. do
563 771 798 1.104 1.104
A análise da evolução do consumo de petróleo corrobora o S. & C
sentimento de que, a partir do início da década passada, a América Total A. do
2.225 3.294 3.709 4.945 6.241
do Sul e Central experimentaram uma importante aceleração da S. & C
atividade econômica, que trouxe consigo a expansão da indústria do
Total Mundo 47.941 59.405 66.799 77.245 88.034
petróleo e a abertura de oportunidades de investimento cada vez
mais interessantes para o capital externo. A tabela 3 contém as
*Fonte: Elaboração própria a partir de Total A. do Total
informações sobre o consumo da região e de seus principais países dados da BP Statistical Review. Crescimento S. & C Mundo
nos mesmos períodos observados anteriormente. O crescimento da Anual
demanda por óleo foi sustentado durante todo o intervalo e, na 4,5% 2,1%
média anual, ele foi duas vezes superior ao constatado no mundo

5 Boletim Técnico do BDEP nº2


Luis Eduardo Duque Dutra

Fora a Argentina e Trinidad e Tobago, nações distintas das demais (Equador, Venezuela, Brasil e Chile) conheceram um crescimento
por terem a matriz energética assentada essencialmente no gás rápido da demanda. As taxas anuais superiores a 5%, ao longo de
natural, todos os países da região tiveram o consumo de petróleo tanto tempo, no Brasil, Chile e Equador, refletem a firme
em contínua ascensão. Além disso, entre eles, existe uma forte consolidação do petróleo na matriz energética dos três países. Na
diferença quanto ao ritmo de crescimento. O gráfico a seguir dá uma Colômbia, o crescimento se deu a um ritmo menor, uma vez que a
ideia da elevada sensibilidade do consumo de petróleo ao aumento competição com o carvão é acirrada, embora este incremento esteja
da riqueza em algumas nações do subcontinente. Dois países ainda acima da média verificada no resto do mundo e mesmo na
exportadores e dois países tradicionalmente importadores própria região.

*Gráfico 4: Média de crescimento anual do consumo de petróleo em determinados países da América do Sul e Central, em percentagem,
entre 1971 e 2011.

25,00
21,03
20,00

15,00

10,00 8,89 7,34


5,07 4,51
5,00
2,80 2,73 2,40 0,68
0,00 -0,44
Ecuador Brazil Venezuela Chile Peru Colombia Other S. Argentina Trinidad Total S.
-5,00 & & & Cent.
Cent. America Tobago America
*Fonte: Elaboração própria a partir de dados da BP Statistical Review.

A despeito do forte incremento do consumo de óleo ao longo dos imediato. Em 1981, o país respondia por cerca de dois terços
quarenta últimos anos, ao se retornar à tabela anterior, é perceptível (73,2%) das reservas da América do Sul e Central. Ano passado, o
que, durante a última década, nem toda a região seguiu o mesmo volume das reservas venezuelanas correspondia a mais de nove
padrão. Ao contrário, se considerados os países que não estão décimos (91,1%) do total localizado neste subcontinente. O
discriminados e que não são nem grandes produtores de óleo, nem incremento significativo das reservas ocorreu no final da década
grandes economias, o consumo de petróleo não aumentou. Entre passada, quando as reservas conhecidas de petróleo pesado da
2001 e 2011, os países não discriminados mantiveram região do Orinoco passaram a ser incluídas entre as reservas
rigorosamente o mesmo nível de consumo: 1,1 milhão de barris por provadas. Assim, economicamente, elas são as mais custosas e
dia em média. marcam a fronteira da produção em termos de viabilidade do
aproveitamento do recurso.
Embora também tenham conhecido a retomada do crescimento
econômico e tenham sido beneficiados pela mudança favorável dos *Tabela 4: Reservas provadas de petróleo na América do Sul e
termos de trocas internacionais, decorrente da valorização dos Central e reserva mundial, em bilhões de barris (1981, 1991, 2001,
produtos agrícolas e minerais, como importadores de petróleo, 2011)
neles, o consumo do produto mostrou-se sensível ao aumento
significativo dos preços a partir de meados de 1999. De qualquer
forma, é mais um indicador de que, com reservas e produção PAÍS / ANO 1981 1991 2001 2011
crescendo em alguns países, a região dispõe de uma diversidade
suficiente para gerar numerosas oportunidades de comércio Argentina 2,2 1,7 2,9 2,5
intrarregionais.
Brasil 1,5 4,8 8,5 15,1
A evidência de que o potencial para ampliação do capital petrolífero
na região é bastante favorável está principalmente nas reservas e Colômbia 0,5 1,9 1,8 2,0
nas perspectivas de descobertas em futuro próximo. As
informações sobre o volume dessas reservas e sua evolução no Equador 0,9 1,5 4,6 6,2
tempo estão nos gráficos e tabelas a seguir, mas, vale observar que
o período escolhido é um pouco mais curto que o analisado até aqui.
Peru 0,9 0,8 1,0 1,2
As informações disponíveis sobre reservas se iniciam em 1981,
portanto, após as duas crises do petróleo. Ademais, a definição do Trinidad &
conceito de reservas e sua estimação em barris recuperáveis 0,6 0,6 1,0 0,8
Tobago
revestem-se de grandes dificuldades por agregarem à incerteza
geológica, elementos econômicos, para se determinar o volume Venezuela 19,9 62,6 77,7 296,5
provado e, assim, o petróleo viável economicamente de ser
aproveitado nas jazidas. Há de se ter cuidado ao usar essas Demais A do S. 0,8 0,6 1,4 1,1
& C.
estatísticas. A seguir, quando não qualificado, o termo reservas é
entendido pelo que a literatura especializada denomina como Total A. do 27,2 74,6 98,8 325,4
“provada”. S. & C

Total Mundo 696,5 1032,7 1267,4 1652,6


Na tabela a seguir, estão listados os países detentores das maiores
reservas de óleo da região. O peso da Venezuela, hoje, a maior
reserva do mundo, à frente da Arábia Saudita, é detectado de *Fonte: BP Statistical View

Boletim Técnico do BDEP nº2 6


O petróleo na América do Sul

Com ou sem o petróleo pesado, ao qual voltaremos oportunamente, reprodução do capital petrolífero na região surge quando se leva em
no decorrer dos últimos trinta anos o desempenho da região em conta, enfim, as reservas do Orinoco. Fica também evidente que,
termos de descoberta é digno de nota; principalmente, se lembrado longe do foco do grande capital, a região confirmou finalmente sua
que ela não estava entre as prioridades de investimento do capital vocação petrolífera que remonta ao início do século passado. No
petroleiro e parapetroleiro. Sem contar o óleo pesado do Orinoco gráfico a seguir, depreendem-se do crescimento da participação da
(220 bilhões de barris), o volume de reservas quase quadruplicou; região nas reservas mundiais, o excelente resultado acumulado nas
mais exatamente, foi multiplicado por um fator de 3,88, ao saltar de últimas três décadas e todo o potencial de desenvolvimento da
27,2 bilhões de barris para 105,4 bilhões de barris entre 1981 e 2011. indústria de petróleo disponível para ser realizado na presente.
Fora da Venezuela, ao longo de todo esse período, descobriu-se
muito petróleo e em diferentes partes da América do Sul. Esta é a Antes da inclusão do petróleo pesado do Orinoco, a participação da
maior novidade, que surge a partir da última década junto com a região já tinha crescido de forma substancial. O primeiro aumento
retomada do crescimento econômico na região. das suas reservas foi feito principalmente após a crise do petróleo e
realizou-se apesar da crise da dívida e da fuga de investimentos
externos. As adições subsequentes permitiram manter as reservas
*Tabela 5: Reservas de petróleo no Brasil, Colômbia e Peru, em da América do Sul e Central com uma participação acima de 7% nas
bilhões de barris (1981, 1991, 2001 e 2011) reservas mundiais, quase o dobro do que dispunha a região à saída
do segundo choque petrolífero (3,9%).
PAÍS / ANO 1981 1991 2001 2011
Como fica claro pelo gráfico, as reservas do Orinoco são suficientes
para catapultar a região a uma posição relevante na indústria do
Brasil (*) 1,5 4,8 8,5 15,1 petróleo e na geopolítica da energia mundial. Ao somá-las às demais
reservas da região, a participação dela nas reservas totais do
planeta atinge praticamente um quinto. Se pelo menos parte deste
Colômbia (*) 0,5 1,9 1,8 2,0
petróleo pesado e das expectativas de seu aproveitamento se
realizar no curso da presente década, a América do Sul deixará de
Peru (*) 0,9 0,8 1,0 1,2 ser marginal. Além disso, não será por falta de jazidas de petróleo e
oportunidades de investimento que ela seria impedida de dar
Equador (**) 0,9 1,5 4,6 6,2 continuidade às transformações iniciadas na década passada.

Às reservas venezuelanas de petróleo pesado, podem ser somadas


Total 2,9 7,5 11,3 18,3 as reservas descobertas abaixo da camada de sal no litoral Sudeste
do Brasil a partir de 2007. A confirmação da existência de jazidas a
(*) fator de multiplicação entre 2011 e 1981 6,3 mais de dois mil metros de lâmina d'água e mais de cinco mil metros
abaixo da superfície marinha abriu uma nova fronteira exploratória.
Esse petróleo é denominado ultra-profundo e algumas acumulações
(**) fator de multiplicação entre 2011 e 1981 6,9
detectadas são gingantes com mais de um bilhão de barris, cada
uma, passíveis de serem extraídos nas atuais condições
*Fonte: BP Statistical Review econômicas, mas, para tanto, exigem a mais moderna tecnologia.
Quanto ao desafio tecnológico, ele é tão ousado quanto viabilizar a
A emergência de novos atores e a expansão da fronteira exploratória produção do petróleo pesado do Orinoco.
podem ser bem observadas com a ajuda das informações contidas
na tabela a seguir. Sempre de dez em dez anos, nela estão as De forma bastante conservadora, é possível estimar que exista um
estimativas de reservas provadas para três países sul-americanos volume recuperável de pelo menos dez bilhões de barris no pré-sal.
pré-selecionados. Brasil, Colômbia e Peru não são tradicionais Esse volume deve ser incorporado às reservas oficiais nos próximos
produtores e exportadores de petróleo. Nunca estiveram no foco do cinco a dez anos. Somente com essa adição, as reservas brasileiras
capital petroleiro. Contudo, neles, o incremento de reservas foi quase dobram. É esta expectativa que consolida a Petrobrás como
significativo: elas saem de apenas 2,9 bilhões de barris, em 1981, líder no off-shore e que abre a possibilidade do Brasil se tornar
para 18,3 bilhões de barris, no final do ano passado. Portanto, as exportador líquido de petróleo; algo impensável dez anos atrás.
reservas somadas dos três países foram multiplicadas por nada
menos que 6,3, em três décadas.
*Gráfico 5: Reserva provada de petróleo na América do Sul e
Mas, não foram apenas os três países citados que surgiram Central em relação à reserva mundial, em percentagem (1981,
precisamente no período em análise. Existe pelo menos um outro 1991, 2001, 2011)
país que merece destaque. A inclusão do Equador no grupo anterior
acrescenta uma nação de perfil distinto. Muito rapidamente, o
Equador se tornou um exportador de petróleo, sendo um dos
25,00
membros da OPEP. Geograficamente pequeno em relação aos
outros, demonstrou-se extremamente rico em jazidas petrolíferas.

}
Nos últimos trinta anos, as suas reservas saltaram de 0,9 para 6,2 Pré-sal brasileiro 20,65
20,00 e folhelho argentino
bilhões de barris, num ritmo de incremento ainda acima daquele já
observado no conjunto dos três países pré-selecionados. 19,69
15,00
Já constatada anteriormente, a emergência desses novos atores se Orinoco
adiciona à perspectiva aberta pela significativa ampliação das 10,00
reservas. A despeito do desinteresse histórico das grandes 7,80
petroleiras em produzir na região e muito antes da melhoria das 7,22 7,3
condições macroeconômicas verificadas na última década, a 5,00
expansão da fronteira exploratória foi sustentada desde o início da
década de 1980. Hoje, como resultado existe reservas abundantes 3,90
que asseguram numerosas oportunidades de investimento e 0,00
1981 1991 2001 2011
realização de lucro com o aproveitamento das novas jazidas
localizadas nos quatro cantos da América do Sul e Central.

A certeza da existência de condições favoráveis para acelerar a *Fonte: Elaboração própria a partir da BP Statistical Review

7 Boletim Técnico do BDEP nº2


Luis Eduardo Duque Dutra

As recentes descobertas na Argentina confirmam a boa fase da ampliou e abriu diversas novas bacias sedimentares, o que trouxe
região, com se ainda isso fosse preciso. O potencial petrolífero é para o cenário internacional novos atores, como o Equador, a
enorme. Na formação geológica Vaca Muerta, localizada na bacia Colômbia e o Brasil. Além disso, um quinto das reservas provadas
de Neuquem, uma tradicional região produtora, foram reveladas de petróleo do planeta estão na América do Sul. Na História da
jazidas que também podem acumular 10 bilhões de barris América Latina, por diversas vezes, a abundância dos recursos
recuperáveis de óleo de boa qualidade. A descoberta argentina é naturais foi uma maldição; desta feita, existe alguma chance disso
reveladora da contínua expansão da fronteira exploratória não se repetir.
decorrente do progresso tecnológico e que vem na esteira do que a
indústria conhece como Shale Oil & Gas. A revolução na matriz Em razão de serem gigantescas e não convencionais, o
energética norte-americana tem a ver com a penetração deste gás aproveitamento do petróleo recentemente descoberto na América
na década passada. Na Argentina, o efeito multiplicador na do Sul é para bem poucas petroleiras. Contudo, nos últimos trinta
economia pode ser ainda maior do que o esperado com o anos foi mencionado o surgimento de novas oportunidades
desenvolvimento das jazidas do pré-sal no Brasil. exploratórias em diferentes pontos do subcontinente fez países sem
tradição na atividade tornarem-se novos atores de peso regional. O
Em comum entre o petróleo pesado venezuelano, o óleo e o gás de principal resultado econômico é que o espaço para a reprodução do
folhelho argentino e o petróleo ultra-profundo brasileiro é o fato de capital petrolífero, seja ele grande, multinacional, independente, ou
serem não convencionais. Porque são mais caros, difíceis local, ampliou-se significativamente. Hoje, ele é muito maior e mais
tecnologicamente de serem acessados, estão na fronteira das diversificado do que aquele existente ainda na última década do
atividades da indústria. Será em torno deste hidrocaborneto que século passado. Ele não se resume mais a Venezuela. Brasil,
dependerá a inserção da América do Sul na indústria mundial do Colômbia, Equador e Peru atraíram capital na década passada e
petróleo. Nitidamente, a Venezuela não é mais única, embora, tem potencial para continuarem a fazê-lo ao longo da presente
sempre preponderante. Além disso, nos três casos, mesmo com os década.
atuais níveis de preço do barril, o desafio é imenso. Em nenhum dos
três a viabilidade econômica está assegurada. Nos três, existem E, cabe sublinhar que as novas oportunidades não atraem só o
questões técnicas não resolvidas, os ativos em operação são grande capital das petroleiras europeias e norte-americanas, ou
projetos pilotos e a sofisticação dos equipamentos será ainda o grande capital estatal asiático. A América Latina também é o
extremamente elevada. Por fim, a escala dos projetos terá de ser novo Eldorado para as petroleiras independentes e para-petroleiras
gigantesca, uma vez que muitos barris deverão ser produzidos para de médio porte. A despeito da estagnação nos países ricos nos
amortizar as despesas de capital iniciais. últimos quatro anos, da retomada do nacionalismo no continente na
última década e da escala gigantesca das descobertas feitas
Fica claro que o desafio é tanto financeiro, quanto tecnológico. A recentemente, existe um crescente espaço para o pequeno capital
América do Sul sempre careceu de poupança e são grandes as na região. Essas afirmações podem parecer ousadas, mas, não
limitações para o capital local captar financiamento no exterior. Em são, de todo, fora de propósito.
termos petrolíferos, fora das estatais, o domínio da tecnologia pelo
capital local, para o desenvolvimento das novas jazidas de óleo não É uma oportunidade histórica para a América do Sul assumir um
convencional, é bastante diminuto. Tecnologia e fonte de papel relevante na geopolítica energética mundial. Na América do
financiamento sempre foram duas restrições ao processo de Norte, o único país de origem ibérica foi, entre todos, o pioneiro. A
industrialização da região. descoberta dos campos na Faixa Dourada no México, durante a
década de 1910, e a descoberta das reservas sob o Lago
Em contrapartida, como foi anteriormente constado, as condições Maracaibo, em meados da década de 1920, transformaram por
de produção mudaram no decorrer da ultima década. Para os completo a indústria do petróleo. Mais tarde, México e Venezuela,
grandes países da região, os termos de troca favoráveis permitiram cada um a seu tempo, lideraram revoluções nos arranjos contratuais
acumular um saldo comercial sem precedentes. Ademais, a região que submetiam os países à espoliação das multinacionais e, assim,
voltou a atrair os investidores estrangeiros. Quanto ao petróleo, escreveram capítulos decisivos na história das insurgências da
como também foi visto, a fronteira de exploração e produção se periferia contra o capitalismo monopolista do século XX.

Contudo, no final do século passado, a América Latina conheceu


duas décadas perdidas; a primeira, decorrência da dívida externa e
da falência do Estado, a segunda, decorrência das reformas
neoliberais e da ausência de Políticas Públicas. Foi somente após
2002, com a mudança nos termos de troca internacionais e com a
reconstrução dos instrumentos de intervenção do Estado na
economia, que a região retoma o crescimento e volta a atrair os
investidores externos. A América Latina finalmente parece dar inicio
à recuperação do atraso acumulado frente às economias asiáticas.
Em termos de O & G, como foi visto, foi crescente a perda de
interesse na região, por parte das grandes petroleiras e
fornecedores de serviços. A contínua queda do preço do barril de
óleo, a abertura de novas regiões (antes fora do alcance das
empresas ocidentais) com o fim da União Soviética e a falta de
empenho exploratório das multinacionais do petróleo, a partir de
meados da década de 1980, colocou a América Latina à margem da
indústria, acentuando um retrocesso que tinha também
fundamentação macroeconômica e política.

Foi a partir da virada do milênio que as atenções das grandes


petroleiras se voltaram novamente para a região. Contribuíram para
isso a ascensão do preço do barril de óleo após 1999 e
particularmente após 2003, a crescente dificuldade de recompor as
reservas em outras regiões e a realização de uma série de rodadas
de licitação na Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e
Venezuela. Ao final da década passada, a estrutura do mercado nos
diferentes países era completamente diferente daquela existente
anteriormente.

Boletim Técnico do BDEP nº2 8


O petróleo na América do Sul

As dificuldades à ampliação do capital independente, do capital local


e das empresas menores de fornecimento de serviços e
equipamentos se referem menos às condições macroeconômicas e
ao potencial geológico. Ainda dependem essencialmente do
amadurecimento das instituições democráticas. A reconstrução das
políticas públicas foi lenta e, só há pouco, deu voz às minorias.
Contudo, as dificuldades com os licenciamentos ambientais e com
as comunidades nativas demonstram que faltam canais de
comunicação às empresas e meios de negociação diretos e
objetivos para solução dos conflitos.

A sociedade civil ganhou poder, liberdade de manifestação e meios


para intervir nos projetos, uma conquista democrática recente.
Porém, no lugar de orientar os projetos para seu benefício,
simplesmente, os novos meios impendem sua viabilização. De fato,
No Brasil, por exemplo, hoje, atuam cerca de sessenta petroleiras, esse imbróglio não é exclusivo da região; no Canadá e na Austrália,
sendo que trinta são empresas locais. Na Colômbia, aonde a ele é semelhante e os acidentes do poço de petróleo de Macondo e
experiência foi ainda mais exitosa na atração de capitais e na da usina nuclear de Fukushima só fizeram aumentar a reação
criação de oportunidades para o empresariado local, são mais de popular aos grandes projetos de energia. E a segurança
uma centena de petroleiras. No Peru e no Equador, os números são operacional, a saúde do trabalhador e a proteção ambiental são
bem menos expressivos, mas, apontam para a mesma tendência. É domínios, por excelência, do Estado como regulador.
notável a presença de empresas norueguesas, canadenses,
francesas e australianas, muito distantes em suas origens e
tamanho das multinacionais, ou estatais, que dominam o setor. ,

Depois do crescimento sustentado da produção e das reservas nos


últimos trinta anos, o modelo sul-americano parece consolidado. Em
quase todos os países convivem estatais e competidoras e/ou
colaboradoras, que podem ser controladas por capitais
multinacionais, ou locais. O desempenho financeiro e o crescimento
dos ativos da Petrobrás, durante a última década, e da Ecopetrol nos
últimos cinco anos, surgem como exemplo. Elas substituem as
referências históricas, como Pedevesa e Pemex, e indicam os
benefícios da abertura controlada do mercado, onde as estatais se
mantêm protagonistas, mas, passam a atuar junto e em competição
com outros capitais.

Na maioria dos países, a estatal não compete diretamente com o


capital privado local e com operadoras independentes. Os
respectivos mercados não se confundem e o menor capital tem
alguma vantagem em certos nichos de produção. A oportunidade é o
aprendizado tácito, o conhecimento da região, do solo e subsolo, tão
decisivo para o sucesso dos esforços exploratórios e para o Contudo, esses não são os únicos obstáculos à ampliação do capital
desenvolvimento de reservas pequenas e marginais. A vantagem- petrolífero na América do Sul. Grande parte das bacias
custo da operadora regional está no peso reduzido das despesas sedimentares do subcontinente ainda está inacessível e é
irrecuperáveis, na experiência em torno de certas condições desconhecida em sua geologia. Por buscarem petróleo em regiões
geológicas e geográficas particulares, na menor aversão ao risco e, remotas e distantes, as atividades de E & P frequentemente estão
em muitos casos, da ausência de pressões de curto prazo para sob a ameaça de conflitos armados internos e de grupos de pressão
realização de lucro em benefício dos acionistas. locais, ou ainda podem estar sendo executadas à proximidade do
narcotráfico. A ausência do Estado, onde operam as petroleiras
Observe-se também que, embora na Bolívia, Venezuela e (grandes ou pequenas), demonstra o quanto ainda resta a fazer em
Argentina, os governos tenham posições políticas mais radicais, o matéria de reconstrução republicana na região.
espaço do capital independente e do empresariado local não
diminuiu e, ao contrário, tende a aumentar; na medida em que as Em todo caso, é indiscutível que existe um espaço cada vez mais
grandes multinacionais se mostrem avessas ao risco político. Além consolidado e orgânico, que envolve os países sul-americanos.
disso, na Argentina, o capital privado no setor é tão antigo quanto o Existe uma identidade cultural em formação e uma evolução
norte-americano, ou o europeu. De origem venezuelana são conjunta em direção à plena democracia, com mais participação
algumas das empresas que atuam nos países vizinhos, tanto como popular. A transição dos regimes de exceção para um regime de
operadoras, quanto como fornecedores de serviço. Na Bolívia, ao direito foi concluída e, faz quase uma década, governos de
contrário das interpretações da mídia, são claros os sinais de que o esquerda têm oportunidade de colocar em prática políticas sociais,
governo quer atrair o capital externo. Além disso, o capital asiático enquanto reconstroem os instrumentos de planejamento e
mostra disposição para ocupar o espaço desdenhado pelas grandes regulação do Estado nos setores produtivos estratégicos. Também é
petroleiras da Europa e dos EEUU. nítida a retomada com força, nos últimos vinte anos, da vontade de
integração regional, como demonstra a criação do MERCOSUL e da
Exatamente quanto à percepção política do capital, a tomar pelo Unasul, a reformulação do Pacto Andino e de muitas outras
investimento externo na última década, ela é bastante favorável em iniciativas.
relação às oportunidades de ampliação dos negócios. As
idiossincrasias de um ou outro país parecem compensadas por Em meio a este significativo avanço político, que revela o grau de
certa coerência e consistência entre as partes; que evoluem de amadurecimento institucional a que se chegou, existe um espaço
forma mais ou menos articulada e semelhante, como bem mostra a geográfico contínuo, que se constrói economicamente em torno da
experiência da ANP brasileira, da ANH colombiana e da Osynerg atividade exploratória e de produção de petróleo. Atente-se para o
peruana. A construção simultânea de instituições democráticas, fato de que ele não é exclusivamente um domínio para as muito
pondo fim a décadas de levantes e ditaduras militares, é outro sinal grandes petroleiras. À margem deste processo de abertura para o
de maturidade institucional comum à comunidade de nações sul- grande capital, desde o começo da década passada, organiza-se
americanas. um mercado cujas oportunidades vão muito além daquelas

9 Boletim Técnico do BDEP nº2


Luis Eduardo Duque Dutra

advindas com o aproveitamento do petróleo da formação Vaca transformações econômicas e sociais não podem ser mais
Muerta, das jazidas no pré-sal, ou do Orinoco, que lhes são favoráveis e, talvez, até sejam exageradas. De qualquer forma,
reservadas. seguindo Keynes, são elas que governam o mundo, ao fazerem o
capitalista investir. Como foi colocado anteriormente, não
Muitas jazidas a serem descobertas estão em áreas remotas, encontrando aqui, ou ali, o grande capital e as pequenas petroleiras
localizadas em terra e não em águas profundas, elas podem ser de encontrarão ao lado, no país vizinho, a oportunidade de E & P que
gás não associado, ou de petróleo não convencional, ou ainda, são procuram; bacia sedimentar não falta na América Latina.
acumulações marginais. Por faltar escala e por serem de difícil
acesso, não interessam ao grande capital, mas, como a produção Essa é a segunda grande novidade, a primeira foi a emergência dos
texana, ou canadense, demonstra, podem contribuir de maneira novos atores no cenário regional. O subcontinente sul-americano
significativa para adensar o tecido industrial do setor e gerar riqueza, passou a ser visto como um conjunto com identidade própria e
aonde ela não existia anteriormente. Contudo, em razão das códigos em franca consolidação, não só pelas grandes petroleiras e
dificuldades de acesso e do fato destas petroleiras serem menores, para petroleiras, mas também para o pequeno e médio capital que
esta oportunidade dificilmente pode ser aproveitada sem uma aqui encontra, além da estabilidade política, um potencial
política de apoio específica, sem planejamento e regulação setorial. exploratório condizente com suas pretensões e dimensão. Portanto,
a América Latina tem tudo, por um lado, para atrair o grande capital e
Como se pode concluir, as perspectivas são bastante promissoras, desenvolver a tecnologia necessária para o aproveitamento de seu
principalmente tomando por base o pífio desempenho econômico da petróleo não convencional e, por outro, para ser o Eldorado das
América do Sul nas últimas duas décadas do século XX e a franca petroleiras independentes e do capital local. E tudo isso na presente
retomada verificada na década passada. De fato, as expectativas década. Basta uma razoável articulação regional entre os países,
quanto à continuidade do crescimento e à aceleração das para não se repetirem erros históricos.

Boletim Técnico do BDEP nº2 10


Autor

Dr. Luis Eduardo Duque Dutra atualmente ocupa o cargo de assessor da Diretoria da ANP e
é professor adjunto da Escola de Química-UFRJ. Economista, é Mestre em Planejamento
Energético pela UFRJ/COPPE, Doutor em Ciências Econômicas pela Universidade de
Paris e Pós-Doutorado com especialização em Propriedade Intelectual pela Organização
de Propriedade Intelectual, Wipo Academy e Universidade de Turim. Ocupou diversas
funções executivas entre as quais assessor da diretoria financeira do Conselho Nacional
do Petróleo, divisão de arrecadação. Na academia, foi assistente de pesquisa do Prof.
Jean Marie Chevalier no Centre de Récherche em Economie Industrielle, Universidade
Paris-Nord, professor visitante na COPPE-UFRJ - Programa de Planejamento Energético,
professor convidado da Escola de Engenharia-UFRJ - Departamento de Engenharia de
Produção, assessor da diretoria da Agência Nacional de Águas-ANA

Editor Chefe

Sergio Henrique Sousa Almeida | Dr.

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Editor Suplente

Claudio Jorge Martins de Souza | Msc.

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Revisão e Edição

Bruna Vaz Mattos

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Diagramação e Projeto Gráfico

Saymon César Barbosa Lopes da Silva


BOLETIM TÉCNICO DO BDEP
Edição nº 2

Ministério de Minas e Energia - MME - Ministro: Edison Lobão

Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP


Ministério de
Minas e Energia
Superintendência de Dados Técnicos (SDT)
Av. Rio Branco, 65 - 18º andar - Centro - Rio de Janeiro - Brasil
Tel.: (21) 2112-8503 Fax: (21) 2112-8509

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