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Edição nº2
Os conteúdos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis no seu todo, não se responsabiliza por esses conteúdos nem por ações que advenham dos mesmos. As opiniões,
bem como os comentários, emitidas pelos autores são também de total responsabilidade dos mesmos, sendo que as opiniões e
comentários não representam a opinião da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis ou de sua diretoria
colegiada. A reprodução total ou parcial de artigos está autorizada, desde que a referência completa para o artigo ou seção
pertencente a este jornal digital seja citada e leis de direitos autorais e conexos sejam cumpridas.
EDITORIAL
A segunda edição do Boletim Técnico do BDEP apresenta aos leitores uma visão particular sobre o mercado de E&P na
América do Sul. O autor é o especialista em mercado e economia de petróleo Luis Eduardo Duque Dutra, também o atual
assessor de diretoria da ANP.
Este artigo foi publicado em outubro de 2012 e além de uma análise técnica e econômica, apresenta um amplo panorama
histórico e político das atividades e decisões que hoje, como é possível observarmos, definiram o atual cenário das nações sul
americanas envolvidas no mercado E&P. Os grandes choques mundiais do petróleo e o fenômeno “Maldição da Abundância”,
por exemplo, são citados e explicados pelo autor, além de identificar a fuga de capitais e a lenta redemocratização como
contribuintes para a remota produção da região por quase duas décadas. Países da América Central e do Caribe são citados
em alguns momentos, porém somente em razão das estatísticas da BP Statistical Review, fonte das informações, os incluírem
nas pesquisas.
O foco do estudo é exclusivamente o petróleo, não sendo abordado o gás natural, cuja importância foi crescente na região e
que é um reconhecido instrumento de integração regional. O objetivo do autor foi avaliar as perspectivas de reprodução
ampliada do capital nas atividades de E&P. Em seguida ele analisa a evolução da produção, do consumo e das reservas de
petróleo nas últimas quatro décadas. O que representa o desafio do desenvolvimento do óleo não convencional, as
oportunidades para operadores independentes e para o capital local são temas que também foram abordados ao longo do
artigo.
A proposta do BDEP é fomentar contribuir com a indústria especializada, a sociedade acadêmica e os profissionais do setor
onshore e offshore. Essa publicação reflete a preocupação do Banco em registrar os estudos técnicos sobre exploração,
regulação e produção de petróleo e gás natural produzidos pelos profissionais da Agência Nacional do Petróleo.
Os Editores
O petróleo na América do Sul
*Gráfico 1: Produção de petróleo na América do Sul e Central em produzidos em média por dia, em 1981, o volume foi um milhão
relação à produção mundial, em percentagem (1971, 1981, 1991, menor. Durante a década seguinte, a produção da América do Sul e
2001, 2011) Central tratou de recuperar a perda anterior; em 1981, a produção
voltou a 4,7 milhões de barris por dia. Assim, foram vinte anos sem
progresso no que diz respeito à produção de petróleo na região.
9,29
10,00
8,99 8,33 O contexto político e sua evolução devem ser considerados. A
7,28 despeito da disparidade e de sua distinta velocidade, natural se
8,00
lembrado o número de países envolvidos (na América do Sul são 12
6,26 e na América Central são mais 20 nações, incluindo 13 caribenhas),
6,00
constata-se um percurso comum na construção da democracia em
substituição às ditaduras militares. A falência das políticas públicas,
4,00
a espiral inflacionária e a crise da dívida foram decisivas para a
2,00 contestação política dos antigos regimes de exceção. Em
sequência, em particular no subcontinente sul-americano,
0,00 parecendo que por contágio, uma a uma, as diferentes nações
foram definindo os marcos para a lenta redemocratização e a volta
dos coronéis e generais à caserna.
1971 1981 1991 2001 2011
Se a recessão econômica e o estágio de transição política não eram
*Fonte: BP Statistical View favoráveis, menor ainda era a disposição para investir. Após 1982,
os preços do petróleo iniciaram um movimento de baixa que atingiu
seu mínimo só no final da década seguinte. De quase 40 dólares por
Na tabela a seguir estão discriminados os principais produtores da barril, os preços caíram para apenas 12 dólares por barril em julho
região e o volume produzido em cinco momentos diferentes, de de 1999. Na captação de recursos, as grandes petroleiras deixaram
forma a se poder acompanhar a evolução nos últimos quarenta de ser as preferidas e passaram a competir com as empresas da
anos. A soma da produção de petróleo dos países sul e centro- nova economia: informática, comunicações e biomédica, que
americanos chegou a cair durante a década de 1970, mas, nos registravam muito melhor desempenho nas bolsas.
últimos trinta anos, voltou a se recuperar de forma que, em 2011, ela
alcançou 7,4 milhões de barris por dia; quase o dobro da produção Na reposição das reservas, variável estratégica para uma petroleira,
em 1981 (3,7 milhões de barris por dia). Na região, naturalmente, o a situação não era melhor. Ela se fazia a custos crescentes, com o
peso da Venezuela era e ainda é muito grande, embora esteja desenvolvimento de jazidas cada vez mais profundas e em regiões
diminuindo ao longo do tempo. No último ano, no maior país cada vez mais remotas. Para piorar, o acesso às reservas mais
produtor da região, o volume médio de petróleo escoado dos poços baratas se tornou cada vez mais difícil, em razão da competição
(2,7 milhões de barris por dia) foi menor que há dez anos (3,1 com as petroleiras estatais, que assumiam gradualmente um papel
milhões de barris por dia) e bem menor do que há quarenta anos (3,6 preponderante. Entre programas de corte de custos, de demissão
milhões de barris por dia). O decréscimo da produção Venezuela voluntária e de desinvestimento, a partir da década de 1990, quando
acabou por contaminar o desempenho da região. buscou novas províncias, o grande capital petroleiro deu
preferência às vastas áreas na Ásia, abertas depois do fim da União
*Tabela 1: Produção de petróleo na América do Sul e Central, por das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
países selecionados e produção mundial, em milhões de barris por
dia (1971, 1981, 1991, 2001, 2011) Até o final da década de 1990, à exceção da Venezuela e de alguns
poucos países relativamente pequenos (como Trinidad e Tobago e
PAÍS / ANO 1971 1981 1991 2001 2011 Equador), o restante da América do Sul e Central estava à margem
do mercado internacional do petróleo. A região não despertava
Brasil 175 220 643 1.337 2.193 muito interesse. O que explica, em parte, a queda da produção
durante a década de 1970 e a lenta recuperação a partir da década
Colômbia 224 140 430 627 930 seguinte. Como foi visto, a outra parte da explicação reside nas
condições macroeconômicas negativas e no estágio de transição
Equador 4 213 307 416 509 política em curso com a redemocratização. De qualquer forma, o
subcontinente estava fora do portfólio do capital petrolífero e para-
Peru 64 194 116 98 153 petrolífero. Ademais, à exceção sempre da Venezuela, nenhum
outro país dispunha de algum papel preponderante na geopolítica
Trinidad & 129 189 149 135 136 internacional da energia.
Tobago
Venezuela 3.615 2.163 2.501 3.142 2.720 *Tabela 2: Produção de petróleo na América do Sul e Central, por
países selecionados e produção mundial, em milhões de barris por
Outros Am. do 80 87 77 137 134 dia (1971, 1981, 1991, 2001, 2011)
Sul & Central
Total América do 4.723 3.725 4.749 6.722 7.381 PAÍS / ANO 1971 1981 1991 2001 2011
Sul & Central
Este cenário pouco favorável na região como um todo, tem um principalmente durante a década de 1970. A Colômbia deslanchou a
interessante contraponto, se considerado um subconjunto partir de meados da década de 1980 e o Peru voltou a crescer na
determinado de países. Se forem selecionados apenas os quatro última década.
primeiros países discriminados na tabela anterior e que estão na
Tabela II, o desempenho é muito melhor, com um significativo Uma leitura mais detida da tabela anterior destaca o ganho de
aumento da produção. velocidade recentemente. O ritmo de crescimento da produção de
petróleo nos quatro países, durante a última década, é um claro
Brasil, Colômbia, Equador e Peru tiveram um desempenho notável indício das mudanças em curso. No período em análise, ocorreu a
no decorrer das últimas quatro décadas. A produção dos quatro expansão da fronteira da produção para novas áreas, o que trouxe,
países somada foi multiplicada por mais de oito entre 1971 e 2011. É naturalmente, novos atores ao mercado internacional do petróleo. O
interessante observar que o crescimento se fez, em cada um, a seu inédito papel destes países corresponde ao aumento da
ritmo. participação destes na produção regional e na produção
O Brasil cresceu sempre, o Equador, quase sempre, mas, internacional.
*Gráfico 2: Produção de petróleo do Brasil, Colômbia, Equador e *Gráfico 3: Produção de petróleo do Brasil, Colômbia, Equador e
Peru em relação à produção na América do Sul e Central, em Peru em relação à produção mundial, em percentagem (1971,
percentagem (1971, 1981, 1991, 2001, 2011) 1981, 1991, 2001, 2011)
60,00 5,50
51,27 4,53
5,00
50,00 4,50
36,86 4,00
40,00
3,50 3,31
31,50 3,00
30,00
2,50 2,29
20,59 2,00
20,00
1,50 1,29
10,00 9,89 1,00 0,92
0,50
0,00 0,00
1971 1981 1991 2001 2011 1971 1981 1991 2001 2011
Dentro da região, os quatro países assumiram uma importância (4,5% versus 2,1%); num claro indicador do processo de
crescente na produção total. A participação mais que quintuplica no industrialização ainda em andamento nesta parte do planeta.
período em análise, como pode ser observado pelo gráfico 2. De
marginais, em 1971, juntos, respondiam por menos de 10% da *Tabela 3: Consumo de petróleo na América do Sul e Central e
produção de óleo bruto, eles passam a responder por mais da produção mundial, em milhões de barris por dia (1971, 1981, 1991,
metade desta produção, quarenta anos depois. A evolução da 2001, 2011)
participação dos mesmos quatro países na produção mundial
também é digna de menção. Ela mais que quadruplica, saindo de PAÍS / ANO 1971 1981 1991 2001 2011
menos de 1% em 1971, para alcançar 4,5%, no ano passado.
Argentina 479 457 425 425 609
Evidentemente, a despeito do crescimento sustentado, Brasil,
Colômbia, Equador e Peru ainda são marginais no cenário Brasil 582 1.124 1.488 2.030 2.653
internacional, mesmo se considerados em conjunto. A aceleração
da produção recente, contudo, indica que esses países passaram a Chile 108 108 146 227 327
atrair as atenções do capital petroleiro e para-petroleiro e que o
cenário desfavorável, predominante nas últimas três décadas do Colômbia 121 161 211 227 253
século passado se desfez ao longo da primeira década do século
21. Isoladamente, nos quatro países, e fora o off-shore nas costas Equador 24 69 103 137 226
do Brasil, a produção ainda não dispõe de escala, mas, com certeza,
vistos em conjunto, após o desenvolvimento recente, já é possível a Peru 96 136 111 146 203
definição de estratégias de ampliação do capital num portfólio
articulado de ativos sob uma clara base regional. Portanto, as Trinidad & 42 32 24 26 34
perspectivas para o crescimento da produção na próxima década Tobago
são muito melhores do que as vigentes até o final do século Venezuela 211 435 402 622 832
passado.
Demais A. do
563 771 798 1.104 1.104
A análise da evolução do consumo de petróleo corrobora o S. & C
sentimento de que, a partir do início da década passada, a América Total A. do
2.225 3.294 3.709 4.945 6.241
do Sul e Central experimentaram uma importante aceleração da S. & C
atividade econômica, que trouxe consigo a expansão da indústria do
Total Mundo 47.941 59.405 66.799 77.245 88.034
petróleo e a abertura de oportunidades de investimento cada vez
mais interessantes para o capital externo. A tabela 3 contém as
*Fonte: Elaboração própria a partir de Total A. do Total
informações sobre o consumo da região e de seus principais países dados da BP Statistical Review. Crescimento S. & C Mundo
nos mesmos períodos observados anteriormente. O crescimento da Anual
demanda por óleo foi sustentado durante todo o intervalo e, na 4,5% 2,1%
média anual, ele foi duas vezes superior ao constatado no mundo
Fora a Argentina e Trinidad e Tobago, nações distintas das demais (Equador, Venezuela, Brasil e Chile) conheceram um crescimento
por terem a matriz energética assentada essencialmente no gás rápido da demanda. As taxas anuais superiores a 5%, ao longo de
natural, todos os países da região tiveram o consumo de petróleo tanto tempo, no Brasil, Chile e Equador, refletem a firme
em contínua ascensão. Além disso, entre eles, existe uma forte consolidação do petróleo na matriz energética dos três países. Na
diferença quanto ao ritmo de crescimento. O gráfico a seguir dá uma Colômbia, o crescimento se deu a um ritmo menor, uma vez que a
ideia da elevada sensibilidade do consumo de petróleo ao aumento competição com o carvão é acirrada, embora este incremento esteja
da riqueza em algumas nações do subcontinente. Dois países ainda acima da média verificada no resto do mundo e mesmo na
exportadores e dois países tradicionalmente importadores própria região.
*Gráfico 4: Média de crescimento anual do consumo de petróleo em determinados países da América do Sul e Central, em percentagem,
entre 1971 e 2011.
25,00
21,03
20,00
15,00
A despeito do forte incremento do consumo de óleo ao longo dos imediato. Em 1981, o país respondia por cerca de dois terços
quarenta últimos anos, ao se retornar à tabela anterior, é perceptível (73,2%) das reservas da América do Sul e Central. Ano passado, o
que, durante a última década, nem toda a região seguiu o mesmo volume das reservas venezuelanas correspondia a mais de nove
padrão. Ao contrário, se considerados os países que não estão décimos (91,1%) do total localizado neste subcontinente. O
discriminados e que não são nem grandes produtores de óleo, nem incremento significativo das reservas ocorreu no final da década
grandes economias, o consumo de petróleo não aumentou. Entre passada, quando as reservas conhecidas de petróleo pesado da
2001 e 2011, os países não discriminados mantiveram região do Orinoco passaram a ser incluídas entre as reservas
rigorosamente o mesmo nível de consumo: 1,1 milhão de barris por provadas. Assim, economicamente, elas são as mais custosas e
dia em média. marcam a fronteira da produção em termos de viabilidade do
aproveitamento do recurso.
Embora também tenham conhecido a retomada do crescimento
econômico e tenham sido beneficiados pela mudança favorável dos *Tabela 4: Reservas provadas de petróleo na América do Sul e
termos de trocas internacionais, decorrente da valorização dos Central e reserva mundial, em bilhões de barris (1981, 1991, 2001,
produtos agrícolas e minerais, como importadores de petróleo, 2011)
neles, o consumo do produto mostrou-se sensível ao aumento
significativo dos preços a partir de meados de 1999. De qualquer
forma, é mais um indicador de que, com reservas e produção PAÍS / ANO 1981 1991 2001 2011
crescendo em alguns países, a região dispõe de uma diversidade
suficiente para gerar numerosas oportunidades de comércio Argentina 2,2 1,7 2,9 2,5
intrarregionais.
Brasil 1,5 4,8 8,5 15,1
A evidência de que o potencial para ampliação do capital petrolífero
na região é bastante favorável está principalmente nas reservas e Colômbia 0,5 1,9 1,8 2,0
nas perspectivas de descobertas em futuro próximo. As
informações sobre o volume dessas reservas e sua evolução no Equador 0,9 1,5 4,6 6,2
tempo estão nos gráficos e tabelas a seguir, mas, vale observar que
o período escolhido é um pouco mais curto que o analisado até aqui.
Peru 0,9 0,8 1,0 1,2
As informações disponíveis sobre reservas se iniciam em 1981,
portanto, após as duas crises do petróleo. Ademais, a definição do Trinidad &
conceito de reservas e sua estimação em barris recuperáveis 0,6 0,6 1,0 0,8
Tobago
revestem-se de grandes dificuldades por agregarem à incerteza
geológica, elementos econômicos, para se determinar o volume Venezuela 19,9 62,6 77,7 296,5
provado e, assim, o petróleo viável economicamente de ser
aproveitado nas jazidas. Há de se ter cuidado ao usar essas Demais A do S. 0,8 0,6 1,4 1,1
& C.
estatísticas. A seguir, quando não qualificado, o termo reservas é
entendido pelo que a literatura especializada denomina como Total A. do 27,2 74,6 98,8 325,4
“provada”. S. & C
Com ou sem o petróleo pesado, ao qual voltaremos oportunamente, reprodução do capital petrolífero na região surge quando se leva em
no decorrer dos últimos trinta anos o desempenho da região em conta, enfim, as reservas do Orinoco. Fica também evidente que,
termos de descoberta é digno de nota; principalmente, se lembrado longe do foco do grande capital, a região confirmou finalmente sua
que ela não estava entre as prioridades de investimento do capital vocação petrolífera que remonta ao início do século passado. No
petroleiro e parapetroleiro. Sem contar o óleo pesado do Orinoco gráfico a seguir, depreendem-se do crescimento da participação da
(220 bilhões de barris), o volume de reservas quase quadruplicou; região nas reservas mundiais, o excelente resultado acumulado nas
mais exatamente, foi multiplicado por um fator de 3,88, ao saltar de últimas três décadas e todo o potencial de desenvolvimento da
27,2 bilhões de barris para 105,4 bilhões de barris entre 1981 e 2011. indústria de petróleo disponível para ser realizado na presente.
Fora da Venezuela, ao longo de todo esse período, descobriu-se
muito petróleo e em diferentes partes da América do Sul. Esta é a Antes da inclusão do petróleo pesado do Orinoco, a participação da
maior novidade, que surge a partir da última década junto com a região já tinha crescido de forma substancial. O primeiro aumento
retomada do crescimento econômico na região. das suas reservas foi feito principalmente após a crise do petróleo e
realizou-se apesar da crise da dívida e da fuga de investimentos
externos. As adições subsequentes permitiram manter as reservas
*Tabela 5: Reservas de petróleo no Brasil, Colômbia e Peru, em da América do Sul e Central com uma participação acima de 7% nas
bilhões de barris (1981, 1991, 2001 e 2011) reservas mundiais, quase o dobro do que dispunha a região à saída
do segundo choque petrolífero (3,9%).
PAÍS / ANO 1981 1991 2001 2011
Como fica claro pelo gráfico, as reservas do Orinoco são suficientes
para catapultar a região a uma posição relevante na indústria do
Brasil (*) 1,5 4,8 8,5 15,1 petróleo e na geopolítica da energia mundial. Ao somá-las às demais
reservas da região, a participação dela nas reservas totais do
planeta atinge praticamente um quinto. Se pelo menos parte deste
Colômbia (*) 0,5 1,9 1,8 2,0
petróleo pesado e das expectativas de seu aproveitamento se
realizar no curso da presente década, a América do Sul deixará de
Peru (*) 0,9 0,8 1,0 1,2 ser marginal. Além disso, não será por falta de jazidas de petróleo e
oportunidades de investimento que ela seria impedida de dar
Equador (**) 0,9 1,5 4,6 6,2 continuidade às transformações iniciadas na década passada.
}
Nos últimos trinta anos, as suas reservas saltaram de 0,9 para 6,2 Pré-sal brasileiro 20,65
20,00 e folhelho argentino
bilhões de barris, num ritmo de incremento ainda acima daquele já
observado no conjunto dos três países pré-selecionados. 19,69
15,00
Já constatada anteriormente, a emergência desses novos atores se Orinoco
adiciona à perspectiva aberta pela significativa ampliação das 10,00
reservas. A despeito do desinteresse histórico das grandes 7,80
petroleiras em produzir na região e muito antes da melhoria das 7,22 7,3
condições macroeconômicas verificadas na última década, a 5,00
expansão da fronteira exploratória foi sustentada desde o início da
década de 1980. Hoje, como resultado existe reservas abundantes 3,90
que asseguram numerosas oportunidades de investimento e 0,00
1981 1991 2001 2011
realização de lucro com o aproveitamento das novas jazidas
localizadas nos quatro cantos da América do Sul e Central.
A certeza da existência de condições favoráveis para acelerar a *Fonte: Elaboração própria a partir da BP Statistical Review
As recentes descobertas na Argentina confirmam a boa fase da ampliou e abriu diversas novas bacias sedimentares, o que trouxe
região, com se ainda isso fosse preciso. O potencial petrolífero é para o cenário internacional novos atores, como o Equador, a
enorme. Na formação geológica Vaca Muerta, localizada na bacia Colômbia e o Brasil. Além disso, um quinto das reservas provadas
de Neuquem, uma tradicional região produtora, foram reveladas de petróleo do planeta estão na América do Sul. Na História da
jazidas que também podem acumular 10 bilhões de barris América Latina, por diversas vezes, a abundância dos recursos
recuperáveis de óleo de boa qualidade. A descoberta argentina é naturais foi uma maldição; desta feita, existe alguma chance disso
reveladora da contínua expansão da fronteira exploratória não se repetir.
decorrente do progresso tecnológico e que vem na esteira do que a
indústria conhece como Shale Oil & Gas. A revolução na matriz Em razão de serem gigantescas e não convencionais, o
energética norte-americana tem a ver com a penetração deste gás aproveitamento do petróleo recentemente descoberto na América
na década passada. Na Argentina, o efeito multiplicador na do Sul é para bem poucas petroleiras. Contudo, nos últimos trinta
economia pode ser ainda maior do que o esperado com o anos foi mencionado o surgimento de novas oportunidades
desenvolvimento das jazidas do pré-sal no Brasil. exploratórias em diferentes pontos do subcontinente fez países sem
tradição na atividade tornarem-se novos atores de peso regional. O
Em comum entre o petróleo pesado venezuelano, o óleo e o gás de principal resultado econômico é que o espaço para a reprodução do
folhelho argentino e o petróleo ultra-profundo brasileiro é o fato de capital petrolífero, seja ele grande, multinacional, independente, ou
serem não convencionais. Porque são mais caros, difíceis local, ampliou-se significativamente. Hoje, ele é muito maior e mais
tecnologicamente de serem acessados, estão na fronteira das diversificado do que aquele existente ainda na última década do
atividades da indústria. Será em torno deste hidrocaborneto que século passado. Ele não se resume mais a Venezuela. Brasil,
dependerá a inserção da América do Sul na indústria mundial do Colômbia, Equador e Peru atraíram capital na década passada e
petróleo. Nitidamente, a Venezuela não é mais única, embora, tem potencial para continuarem a fazê-lo ao longo da presente
sempre preponderante. Além disso, nos três casos, mesmo com os década.
atuais níveis de preço do barril, o desafio é imenso. Em nenhum dos
três a viabilidade econômica está assegurada. Nos três, existem E, cabe sublinhar que as novas oportunidades não atraem só o
questões técnicas não resolvidas, os ativos em operação são grande capital das petroleiras europeias e norte-americanas, ou
projetos pilotos e a sofisticação dos equipamentos será ainda o grande capital estatal asiático. A América Latina também é o
extremamente elevada. Por fim, a escala dos projetos terá de ser novo Eldorado para as petroleiras independentes e para-petroleiras
gigantesca, uma vez que muitos barris deverão ser produzidos para de médio porte. A despeito da estagnação nos países ricos nos
amortizar as despesas de capital iniciais. últimos quatro anos, da retomada do nacionalismo no continente na
última década e da escala gigantesca das descobertas feitas
Fica claro que o desafio é tanto financeiro, quanto tecnológico. A recentemente, existe um crescente espaço para o pequeno capital
América do Sul sempre careceu de poupança e são grandes as na região. Essas afirmações podem parecer ousadas, mas, não
limitações para o capital local captar financiamento no exterior. Em são, de todo, fora de propósito.
termos petrolíferos, fora das estatais, o domínio da tecnologia pelo
capital local, para o desenvolvimento das novas jazidas de óleo não É uma oportunidade histórica para a América do Sul assumir um
convencional, é bastante diminuto. Tecnologia e fonte de papel relevante na geopolítica energética mundial. Na América do
financiamento sempre foram duas restrições ao processo de Norte, o único país de origem ibérica foi, entre todos, o pioneiro. A
industrialização da região. descoberta dos campos na Faixa Dourada no México, durante a
década de 1910, e a descoberta das reservas sob o Lago
Em contrapartida, como foi anteriormente constado, as condições Maracaibo, em meados da década de 1920, transformaram por
de produção mudaram no decorrer da ultima década. Para os completo a indústria do petróleo. Mais tarde, México e Venezuela,
grandes países da região, os termos de troca favoráveis permitiram cada um a seu tempo, lideraram revoluções nos arranjos contratuais
acumular um saldo comercial sem precedentes. Ademais, a região que submetiam os países à espoliação das multinacionais e, assim,
voltou a atrair os investidores estrangeiros. Quanto ao petróleo, escreveram capítulos decisivos na história das insurgências da
como também foi visto, a fronteira de exploração e produção se periferia contra o capitalismo monopolista do século XX.
advindas com o aproveitamento do petróleo da formação Vaca transformações econômicas e sociais não podem ser mais
Muerta, das jazidas no pré-sal, ou do Orinoco, que lhes são favoráveis e, talvez, até sejam exageradas. De qualquer forma,
reservadas. seguindo Keynes, são elas que governam o mundo, ao fazerem o
capitalista investir. Como foi colocado anteriormente, não
Muitas jazidas a serem descobertas estão em áreas remotas, encontrando aqui, ou ali, o grande capital e as pequenas petroleiras
localizadas em terra e não em águas profundas, elas podem ser de encontrarão ao lado, no país vizinho, a oportunidade de E & P que
gás não associado, ou de petróleo não convencional, ou ainda, são procuram; bacia sedimentar não falta na América Latina.
acumulações marginais. Por faltar escala e por serem de difícil
acesso, não interessam ao grande capital, mas, como a produção Essa é a segunda grande novidade, a primeira foi a emergência dos
texana, ou canadense, demonstra, podem contribuir de maneira novos atores no cenário regional. O subcontinente sul-americano
significativa para adensar o tecido industrial do setor e gerar riqueza, passou a ser visto como um conjunto com identidade própria e
aonde ela não existia anteriormente. Contudo, em razão das códigos em franca consolidação, não só pelas grandes petroleiras e
dificuldades de acesso e do fato destas petroleiras serem menores, para petroleiras, mas também para o pequeno e médio capital que
esta oportunidade dificilmente pode ser aproveitada sem uma aqui encontra, além da estabilidade política, um potencial
política de apoio específica, sem planejamento e regulação setorial. exploratório condizente com suas pretensões e dimensão. Portanto,
a América Latina tem tudo, por um lado, para atrair o grande capital e
Como se pode concluir, as perspectivas são bastante promissoras, desenvolver a tecnologia necessária para o aproveitamento de seu
principalmente tomando por base o pífio desempenho econômico da petróleo não convencional e, por outro, para ser o Eldorado das
América do Sul nas últimas duas décadas do século XX e a franca petroleiras independentes e do capital local. E tudo isso na presente
retomada verificada na década passada. De fato, as expectativas década. Basta uma razoável articulação regional entre os países,
quanto à continuidade do crescimento e à aceleração das para não se repetirem erros históricos.
Dr. Luis Eduardo Duque Dutra atualmente ocupa o cargo de assessor da Diretoria da ANP e
é professor adjunto da Escola de Química-UFRJ. Economista, é Mestre em Planejamento
Energético pela UFRJ/COPPE, Doutor em Ciências Econômicas pela Universidade de
Paris e Pós-Doutorado com especialização em Propriedade Intelectual pela Organização
de Propriedade Intelectual, Wipo Academy e Universidade de Turim. Ocupou diversas
funções executivas entre as quais assessor da diretoria financeira do Conselho Nacional
do Petróleo, divisão de arrecadação. Na academia, foi assistente de pesquisa do Prof.
Jean Marie Chevalier no Centre de Récherche em Economie Industrielle, Universidade
Paris-Nord, professor visitante na COPPE-UFRJ - Programa de Planejamento Energético,
professor convidado da Escola de Engenharia-UFRJ - Departamento de Engenharia de
Produção, assessor da diretoria da Agência Nacional de Águas-ANA
Editor Chefe
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Editor Suplente
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Revisão e Edição
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