Академический Документы
Профессиональный Документы
Культура Документы
ao
Antigo Testamento
Stefan Kürle
Agosto/ 2014
Coordenação editorial: Depto. Desenvolvimento Institucional
Professor autor: Dr. Stefan Kürle
Coordenadoria de Ensino a Distância: Gedeon J. Lidório Jr
Projeto Gráfico:Mauro S. R. Teixeira
Capa: Mauro S. R. Teixeira
Revisão: Éder Wilton Gustavo Felix Calado
Designer Instrucional: Wilhan José Gomes
Impressão: ARTGRAF - Ind. Gráfica e Editora
03
04 Introdução ao Antigo Testamento
Introdução ao Antigo Testamento
Unidade - 01
O Antigo Testamento como Cânon
Introdução
Duas páginas do Codex Sinaiticus - o AT em grego. É um texto que os primeiros cristãos liam.
Observe: O texto é sem divisões entre as palavras e usa só maiúsculas.
05
Objetivos
Para pensar...
Que papel desempenha o AT na sua comunidade? Em
quantos domingos há uma leitura desta parte da Bíblia? Qual
porcentagem dos sermões foi baseada no AT durante os últimos
12 meses? Por que isso acontece? – qual é sua interpretação?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
A Bíblia tem um papel decisivo para a fé cristã. Ela é testemunha
de Deus em suas ações no mundo. A pergunta com que muitas religiões
se ocupam é: “Como conhecer a deus?” Algumas filosofias e religiões
acham que o seu deus pode ser reconhecido pelo pensamento humano,
pela nossa interpretação do mundo, ou experiências paranormais.
Outra máxima vale para a religião cristã: o Deus cristão quer ser
reconhecido como aquele que já se revelou para os homens. Isso
07
o AT (como símbolo da grande paralisação eclesiástica) no monte de
escória da história (HARNACK, 1924, p. 217).
A desvalorização do AT frequentemente andava e anda junto com
a desvalorização do povo judaico. O antijudaísmo cristão contribuiu
com o antissemitismo moderno. A igreja entendeu como um novo
Israel herdando o status do antigo povo de Deus que consequentemente
deserdou. O AT, por consequência,
era a escritura sagrada de uma religião
estranha e sem graça.
Por isso, não podemos esquecer
o seguinte: Jesus era judeu, Paulo
também. O que é chamado no
cristianismo de “Antigo Testamento”
era a Bíblia que ambos possuíam. As
escrituras judaicas determinavam
seus pensamentos e conversas. Além
disso, os textos do Novo Testamento não podem ser entendidos sem
o AT. Eles frequentemente reiteram os conceitos, imagens, metáforas,
fundamentos, histórias e teologia do AT. Só pense sobre esse nome
“Jesus Cristo” ou “Messias”!
Podemos chamar a Bíblia cristã de uma “edição ampliada” do
AT. Queremos dizer que nessa “nova edição” há novas escrituras
(biografias, livros históricos, cartas...) que foram tomando o título
de sagradas escrituras. Isso tem algumas implicações para a nossa
concepção e para o nome do AT.
Para pensar...
Que nome você usaria para o AT – se você fosse decidir?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
Então, podemos deduzir que as ações de Deus anteriormente
são da “velha aliança/antigo testamento”? Especialmente 2Co 3,6
(evidentemente) põe uma relação desigual entre a velha e nova aliança.
Mas isso não é correto no que tange a relação entre AT e NT. E com o
anuncio do novo testamento já no AT, em Jr 31, precisamos distinguir
bem esses conceitos de aliança. Entretanto, em 2Co 3,14 lemos: “Mas
os seus sentidos se endureceram; porque até hoje, quando fazem a
leitura da antiga aliança, o mesmo véu permanece, não lhes sendo
revelado que, em Cristo, é removido”. Aqui, onde se lê “antiga aliança,”
refere-se, obviamente, a um livro. O que nos leva a concluir, por um
lado, em um comentário sobre o AT no NT que o AT é antiquado. Por
outro lado, isso obviamente não é verdade para todo o AT. Contudo,
aqui encontramos essa tensão entre a continuidade e descontinuidade
ao descrever a relação entre os dois testamentos (livros).
Por causa disso, Erich Zenger sugere descrever o AT como
09
“Primeiro Testamento” (ZENGER, 2003). Alguns teólogos também
usam o termo “Bíblia Hebraica” ou “Tanach”, uma palavra artificial
que vem das letras iniciais das palavras hebraicas, que descrevem
o conteúdo tripartido do AT: Torá, Neviim e Ketuvim (Instrução-
Lei, Profetas e Escrituras). Essas possibilidades evitam termos que
sugerem uma depreciação do AT. Todavia, chamar essa primeira parte
da Bíblia cristã “Antigo Testamento” é uma designação tradicional que
está sempre nos lembrando de que precisamos do Novo Testamento
como continuação. Contudo, devemos estar alertas aos perigos de
uma desvalorização dos livros incluídos e também da probabilidade
de barreiras na conversação com os judeus.
Pelo menos hoje precisamos de uma forte valorização do AT.
Especialmente em nossa sociedade, na qual a fé cristã está cada vez
menos conhecida, devemos enfatizar mais a leitura do AT. Sem o AT
toda a salvação de Jesus fica “no ar”. Além disso, o AT esclarece as
perguntas fundamentais do ser humano em relação a Deus.
Uma questão: Por que as pessoas precisam da redenção por meio
de Jesus Cristo, se não sabem que Deus as criou para pertencerem
a ele, porém estão separadas Dele pelo pecado? Exatamente isso é
testemunhado pelo AT!
Os 5 Megilloth
• Festa das semanas (Schavuot) - Rute;
• Festa da páscoa (Pessach) - Cântico;
• Festa dos Tabernáculos (Sucot) - Eclesiastes;
• Festa de comemoração da destruição do templo (Tishá BeAv)
- Lamentações;
• Festa de Purim - Ester
11
A teologia do cânon
A palavra grega “cânon” significa “regra” ou “instrumento de
medir”. Com o termo “cânon do AT” determina-se a coleção encerrada
de escritos inspirados pelo Espírito Santo. Abrange aqueles escritos que
têm autoridade normativa para a igreja, isto é, que servem como regra
para a nossa fé e vida como crentes.
Podemos resumir uma interpretação teológica do cânon
(seguinte Erich Zenger):
Torá como promessa e
I Gn – Dt Revelação originária no Sinai
interpelação
II Js - 2Mc História de Israel na terra Passado
III Jó – Sr Sabedoria para a vida Presente
IV Is – Ml Profetismo Futuro
13
Neste sentido podemos também ler o NT:
Referências Bibliográficas
Introdução
Livros não caem do céu, normalmente. Textos escritos
(em vez de textos orais) têm autores, usam letras, uma certa
língua (ou mais de uma) e utilizam algum meio material para
serem preservados no tempo. Nessa unidade, refletiremos sobre
o texto do AT e a sua história.
Até que Você pudesse acessar os textos do AT através de um
belo volume impresso de papel,
com capa de couro e em uma
língua inteligível para você,
contudo, até isso ser possível
houve uma longa história de
produção, tradição e tradução.
Vamos descobrir umas das
suas etapas nessa unidade.
Você se lembra do Codex Sinaiticus (unidada 1). Essa tradução marca um passo importantíssimo
na história do texto do AT.
Objetivos
Ao final da unidade, o aluno:
1. Conhecerá parte da história da tradição do texto do AT;
2. Terá uma noção das complicações durante o processo
de tradução.
Plano da unidade
Alguns fatos interessantes da caminhada do texto do AT
• Os rolos de Qumran (os papiros do Mar Morto)
• A Septuaginta (LXX)
• Os Massoretas
• A Bíblia Hebraica
15
Alguns fatos interessantes da caminhada do
texto do AT
As palavras do Antigo Testamento (tanto como as do NT) foram
escritas por homens (Jo 1,14), mas
sob o controle do Espírito Santo
(chamamos isso de a “inspiração” da
palavra de Deus). Isso significa que
o AT tem uma origem humana que
devemos conhecer a fim de poder
perceber melhor a sua mensagem.
Os passos da formação da Bíblia que
conhecemos hoje foram os seguintes:
Tabuletas de argila - Fonte: Wikimidia Commons Homens de Deus...
A Septuaginta (LXX)
A primeira coleção completa dos livros do AT foi a tradução
dos livros do AT na língua grega chamada Septuaginta, comumente
conhecida pela sigla LXX. A palavra “Septuaginta“ é latina e
significa “Setenta”, que se escreve em letras romanas: “LXX”. O nome
“Septuaginta“ vem de uma tradição antiga que diz que esta tradução
foi feita por setenta e dois homens em setenta e dois dias. Mas na
verdade este trabalho levou muito mais tempo, mais ou menos de 300
até 100 a.C.
A razão porque esta tradução foi feita é a seguinte: Houve muitos
judeus no império Romano, que viveram fora da terra de Israel e que
não aprendera a língua hebraica dos seus antepassados. Eles precisaram
17
de uma tradução de suas
Sagradas Escrituras na
língua oficial do Império
Romano que era o Grego.
A qualidade e o estilo da
tradução são bem variados
de livro para livro – do
literal à paráfrase.
A LXX teve a
seguinte ordem: Torá -
Livros Históricos - Livros
Poéticos - Apócrifos
fragmento de um pergaminho da LXX
Fonte: Wikimidia Commons
- Livros Proféticos. A
LXX era a Bíblia que os
apóstolos e a igreja primitiva liam e citavam. Por isso, algumas citações
no NT do AT parecem um pouco livres e diferentes do nosso AT, que
foi traduzido do hebraico.
Os Massoretas
As cópias mais importantes dos textos do AT que temos são as
cópias na língua hebraica, feitos por uma escola israelita de escribas
chamados Massoretas. Os Massoretas
foram homens com uma grande
tradição na arte de escrever e copiar.
Produziram cópias dos livros do AT
e ao mesmo tempo tiveram o alvo de
manter o texto original inalterado
e ileso. Durante muitos séculos, os
Massoretas mantiveram uma tradição
irrepreensível e imaculada dos textos
do AT. Porém, as cópias mais velhas
dos Massoretas que temos hoje em dia
são originárias do ano 930 d.C. São
os códices chamados Codex Aleppo e
Página dos Targumim (traduções, paráfrases e comentários em aramaico da Bíblia hebraica
Fonte: Wikimidia Commons
A Bíblia Hebraica
Ao ver o uso da LXX na igreja cristã, i.e. como os crentes
provaram com a LXX que Jesus Cristo é o Messias, os judeus decidiram
abandonar esta tradução grega e voltaram para a sua Bíblia Hebraica,
isto é, a coleção dos livros do AT na língua hebraica. Esta coleção já
tinha existido antes de Cristo (Jesus mesmo a usou, Lc 24,27 e Mt
23,34), mas foi estabelecida como Cânon Hebraico fixo somente no
ano 90 d.C. (sínodo de Jabne ou Jâmnia) em rejeição da LXX que os
Cristãos usaram. A ordem dos livros da Bíblia Hebraica foi diferente
da ordem da LXX: Lei - profetas anteriores (Livros Históricos) -
profetas posteriores - escrituras. Enquanto os Cristãos seguindo a
LXX mantiveram a ordem antiga com os profetas posteriores no fim
(os quais apontam para Cristo!), os Judeus colocaram os 5 rolos das
festas (Rute, Cant., Ecl., Lam., Ester) e os livros do tempo do cativeiro
(Daniel, Esdras, Neemias, Crônicas) no fim do seu cânon.
Referências Bibliográficas
Harnack, Adolf von. Marcion. Das Evangelium vom fremden Gott. Leipzig,
2a ed., 1924.
Zenger, Erich. Introdução ao Antigo Testamento. Petrópolis: Edições
Loyola, 2003.
19
Anotações
__________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• O mundo do Antigo Oriente Próximo
• Por que estudamos essa cultura e história?
• Como sabemos sobre o mundo do Antigo Oriente Próximo?
• Cronologia
• Geografia
23
Como sabemos sobre o mundo do Antigo Oriente
Próximo?
Ao começarmos a estudar sobre as culturas antigas, encontraremos
o termo “Arqueologia Bíblica”, definida como o estudo arqueológico
de Israel e da Palestina. Ela é
uma disciplina independente
e trabalha estreitamente ligada
com o Próximo Oriente.
Outros estudos se relacionam
com os da Suméria, Babilônia,
Assíria ou Egito. Para definir
arqueologia, vou citar o
seguinte: “A arqueologia é a
investigação das sociedades
Hazor (norte de Israel) - Fonte: Wikimidia Commons
humanas através do estudo de
vestígios materiais por elas deixados (artefatos). Embora a imagem do
profissional em arqueologia mais difundida seja a de seu trabalho nas
escavações, seu trabalho é muito mais complexo e extenso. Ele necessita
interpretar os vestígios materiais que encontrou, contextualizá-los e
cruzar informações com uma grande variedade de áreas, utilizando
uma abordagem interdisciplinar, de modo que encontre respostas
que possa construir conhecimento a respeito das sociedades que
estuda. Sendo que a arqueologia é imprescindível para investigar os
agrupamentos humanos ágrafos (sem escrita), ou qualquer outra
sociedade extinta, sua importância para a antropologia é imensa.
Através do estudo arqueológico, a antropologia conseguiu
informações acerca dessas sociedades, uma vez que a maioria não
pode ser observada e estudada através de técnicas etnográficas
normais, pelo fato dessas sociedades não existirem mais, nem terem
deixado vestígios escritos. Sendo que, mesmo muitos vestígios escritos
de sociedades extintas que temos hoje para estudo foram descobertos
através de escavações arqueológicas, como tábuas de argila com escrita
cuneiforme da Mesopotâmia.1
Então, o que aprendemos através dessa descrição? A arqueologia
1
Da página web http://gpveritas.org/portal/index.php?option=com_
content&view=article&id=59&Itemid=68, 14/08/09
Cronologia
Cena no Obelisco Negro de Salmanasar III (Museu Britãnico), encontrado em Nimrud menciona o nome de Jeú, rei
de Israel: “O tributo de Jeú, filho de Omri: eu recebi dele prata, ouro, uma tigela de ouro, um vaso de ouro com fundo
aguçado, copos de ouro, baldes de ouro, estanho, um bastão de um rei [e] lanças”. - Fonte: Wikimidia Commons
25
26 Introdução ao Antigo Testamento
Observe que em diferentes regiões as épocas com o mesmo
nome começam em um outro tempo. Por que é isso? Vem da
história da arqueologia. Os artefatos que os arqueologistas acharam e
interpretaram foram de épocas diferentes, mas de materiais e formas
iguais. Isso significa que as diferentes culturas se desenvolveram em
velocidades diferentes. Essas épocas veem da observação de artefatos,
isto é, de cerâmicas, muros, objetos cúlticos, objetos artesanais – coisas
que são feitas por homens.
Podemos construir outros esquemas para a divisão de épocas, ou
seja, quando temos vestígios arqueológicos que incluem textos. Com
essas informações podemos reconstruir o mundo político, social,
religioso ou cultural. Podemos observar isso em nossa tabela também:
com os dados mais recentes, quando são incluídos nomes de vários
povos que dominaram essa respectiva região. Nossa compreensão
dessas épocas aumentou bastante nos dois últimos séculos. Você pode
perceber isso no estudo dessa lista cronológica na internet, conforme
já falei acima.
Uma das coisas mais interessantes para nós, como leitores da
Bíblia, referente ao assunto da cronologia, são as sincronias entre os
eventos e os personagens bíblicos e do mundo de outros povos nessa
região. E aqui entramos em um terreno muito perigoso e com muitas
brigas científicas. É bom lembrar que todas essas discussões vêm da
interpretação dos fatos arqueológicos. O fato puro não vale nada.
Apenas um fato interpretado tem valor para nós e pode ajudar na
nossa leitura da Bíblia. Achar um vestígio arqueológico é uma coisa,
mas interpretá-lo é outra coisa – e muito mais difícil.
Geografia
“Se partirmos do Golfo Pérsico e traçarmos uma meia-lua,
passando pelas nascentes dos rios Tigre e Eufrates, colocando a outra
ponta na foz do Nilo, no Egito, teremos uma região bastante fértil, onde
se desenrolaram os acontecimentos narrados na Bíblia. É a chamada
“meia-lua fértil” ou “Crescente Fértil”, dentro do qual está também a
Palestina.
Esta faixa de terra é regada por importantes rios, que
condicionavam a vida do Antigo Oriente. Foram os rios que
determinaram o estabelecimento da agricultura, da sedentarização e
27
das rotas comerciais por onde passavam as caravanas que iam desde a
Mesopotâmia até o Egito ou a Arábia”.4
“Os mesopotâmicos não se caracterizavam pela construção de
uma unidade política. Entre eles, sempre predominaram os pequenos
Estados, que tinham nas cidades seu centro político, formando as
chamadas cidades-Estados. Cada uma delas controlava seu próprio
território rural e pastoril e a própria rede de irrigação”.5
O clima deste crescente dependia muito da chuva regular. No
Egito, o Nilo inundou regularmente a planície do rio. Na Mesopotâmia
os grandes rios carregam a água que foi usada para a irrigação dos
campos para habilitar a agricultura. A falta de chuva ocasionou
consequências sérias para a população. Por isso, cresceu em todas as
partes dessa região uma preocupação com cultos da fertilidade para
assegurar o ciclo dos tempos e a chuva regular. Descobrimos muitos
textos míticos que refletem a situação geográfica e climática. Como
podemos perceber no AT, o povo de Israel sempre teve tendências
para adotar esses cultos pagãos. É sempre mais fácil para o ser humano
“fazer” alguma coisa para assegurar a sua própria vida do que confiar
em um Deus que tem tudo na sua mão.
Outro aspecto muito importante para Israel foi a sua localização.
No nordeste, ficava a Babilônia e Assíria; no sudoeste, o Egito. Esses povos
eram os grandes poderes políticos da época. Como país relativamente
fraco, Israel ficou a mercê dos caprichos dos reis da Babilônia, Assíria
e do Egito. Estes impérios também tiveram um grande interesse na
madeira que crescia na
Palestina dessa época.
Como o AT é uma
coleção profundamente
teológica faz muito
sentido olhar um pouco
o contexto religioso das
várias culturas da época
da sua formação. Assim
faremos na unidade
seguinte.
http://www.airtonjo.com/historia04.htm, 07/08/09.
4
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mesopotamia, 07/08/09.
5
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Religião no Antigo Oriente Próximo – Tendências
gerais
• Um exemplo da interação dos autores do AT com
o seu contexto – Gênesis 1
29
Religião no Antigo Oriente Próximo – Tendências
gerais1
O Antigo Oriente Próximo inclui as seguintes sub-regiões – aqui
juntos com as respectivas religiões (vale a pena descobrir um pouco
sobre cada uma região ou cultura na wikipédia):
• Mesopotâmia (Sumer, Assíria, Akkad): religião assyro-
babilônica, mitologia mesopotâmia;
• Elam;
• Antigo Egito: religião egípcia antiga;
• O Levante (Canaã, Ugarit, Ebla, Mitanni): religião Cananeia;
• Anatólia (o império hitita, Assuwa, Arzawa): mitologia hitita,
mitologia hurrita;
• Do Cáucaso e da Armênia (Urartu);
• Chipre, Creta (civilização minóica): religião minoica.
Nossas primeiras fontes (2000 a.C.) permitem-nos ver a
mitologia mesopotâmia e egípcia. A religião grega antiga foi fortemente
influenciada pela mitologia do Antigo Oriente Próximo. Os cultos de
mistério do helenismo foram novamente influenciados pela mitologia
egípcia.
Existem amplas práticas que essas religiões muitas vezes têm em
comum:
• Rituais de purificação e santificação;
• Sacrifícios (sacrifício animal, libação, raramente – mas em
muito dos textos mitológicos – sacrifício humano);
• Politeísmo;
• Estado (e cidades-estados): religiões patrocinadas (teocracia);
• Adivinhação;
• Magia (invocações, amuletos).
31
Norte) e de todas as culturas antigas. O animismo pode ser definido
como uma “visão geral do mundo” – que existe em muitas variações
e intensidades. Vou listar alguns aspetos gerais do animismo abaixo:
• A atividade está relacionada com o invisível. Animistas
supõem que o mundo visível relaciona-se com o invisível. Uma
interação existe entre o divino e o humano, o sagrado e o profano,
o sagrado e o secular. As influências de Deus, deuses, espíritos e
antepassados afetam a vida. Os seres humanos são pensados para
ser controlados por forças espirituais, sejam eles pais ou fantasmas,
deuses ou espíritos, feitiçaria ou magia, maldições ou o mau-olhado.
Os humanos, por sua vez, pediam para apaziguar os poderes através
de sacrifícios e libações, para alcançar o poder de lidar com o mal
através do ritual e para proteger-se através de encantos e amuletos. Em
contextos animistas nenhuma distinção pode ser feita entre o natural
e o sobrenatural. “Aconteça o que acontecer no mundo físico tem no
seu espiritual as coordenadas... Tudo o que o homem fez, usa e projeta
é interpenetrado com a interação com o mundo espiritual” (Steyne,
Powerful Spirits, 1989, 39).
• A vida é interligada. Animistas acreditam que tudo na vida
está interligado. Os indivíduos estão intimamente ligados às suas
famílias, algumas das quais vivem e alguns que já passaram para o
reino espiritual (i.e. morreram). Eles também estão ligados ao mundo
espiritual: Os anseios ambivalentes de deuses e espíritos impactam
a vida. Animistas sentiam uma conexão com a natureza (as estrelas,
planetas e a lua), cujos elementos afetavam os acontecimentos
terrenos. O reino natural está tão relacionado com o reino humano
que profissionais podem augurar eventos atuais e futuros, usando as
várias técnicas mencionadas acima.
• O poder é procurado para controlar a vida. Animistas
buscam o poder de controlar os assuntos da vida cotidiana. A essência
do animismo é poder – poder do ancestral de controlar os de sua
linhagem, o poder de mau-olhado para matar um recém-nascido ou
arruinar uma safra, a energia de planetas para afetar o destino da terra,
o poder do demônio para possuir um espírito, a força da magia de
controlar os acontecimentos humanos, o poder das forças impessoais
Para pensar...
O animismo, como descrito aqui, é uma forca ou filosofia em
baixo de muitas formas de religiões (incluindo o Cristianismo!).
Observe alguns pensamentos e tradições em sua história como
cristão. Tem alguns pontos de contato com estruturas do
animismo? Eu, por minha parte, posso nomear muitas formas
do cristianismo tradicional e também moderno na Alemanha,
minha cultura maternal.
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
De forma muito generalizada, podemos resumir o animista
como uma pessoa que quer influenciar os poderes do mundo inteiro
para aumentar o seu bem em todos os aspectos. Ele tem a convicção
de pode mudar o seu destino, inclusive paga para outras pessoas que
têm um acesso melhor a esses poderes. O animista nunca se torna um
fatalista! Ele sempre busca e acha um jeito.
33
É óbvio que o AT foi escrito em um contexto animista. O animismo
da antiguidade veio em várias formas e expressões. Sua expressão
religiosa são os vários cultos que podemos estudar como as religiões
de Sumer, Babilônia, Assíria, Hitita, Ebla, Ugarit, Fenícia, Canaã, Egito,
etc. Sabendo deste contexto, podemos observar muitos textos bíblicos
que criticam certas formas de espiritualidade e pensamentos religiosos
ligados a uma estrutura mental do animismo que adentraram ao povo
de Israel. Os israelitas ofereceram nas alturas, pagaram adivinhadores,
adoraram deuses canaanitas (e.g. Baal, Astarte), fizeram um boi para
representar Deus, porque o animismo é uma forma de pensamento
sobre o mundo. Obviamente, o animismo está ligado com a nossa
mesma humanidade, ou seja, estes textos ainda são muito atuais hoje.
Só precisamos nos lembrar que não devemos ler o AT com os óculos
do iluminismo. O mundo do AT não conhece uma separação entre
espiritual e material e muitas das outras distinções que fazemos tão
facilmente com nossa mente bem imersa na filosofia do iluminismo.
Foi a minha intenção escrever mais sobre a história e cultura de
vários países – como Assíria, Babilônia ou Egito, mas falta espaço e
talvez paciência de sua parte para ler. Talvez você possa usar a Wikipédia
para descobrir alguns fatos interessantes sobre essas culturas. Também
seria bom você ler alguns textos desses tempos, só para se imergir mais
no contexto do antigo Israel.
35
um navio para a sua família, amigos
e animais para escapar. A inundação
foi realmente catastrófica, acabando
com todas as criaturas e assustando
até os deuses por sua ferocidade. Mas
Atrahasis e sua equipe sobreviveram.
O barco finalmente desembarcou
em uma montanha e os de dentro
desembarcaram. Piedoso, Atrahasis
ofereceu um sacrifício tão logo que
desembarcou. Imediatamente os
deuses rodearam o sacrifício ansiosos
por experimentarem a oferenda. Eles estavam com muita fome!
Destruir a humanidade em uma enchente significou que os sacrifícios
pararam, logo os deuses também não tinham nada para comer.
Chegando ao sacrifício um pouco tarde, Enlil, o deus mais
poderoso, ficou chocado e com raiva ao encontrar alguns seres humanos.
Ele se acalmou quando os outros deuses explicavam que a culpa foi de
Ea. Enlil concedeu vida eterna a Atrahasis, o único homem a alcançar
este objetivo. No entanto, para impedir que a explosão demográfica
ficasse novamente fora de controle, Enlil e Nintu redesenharam
a humanidade um pouco. A partir de agora, algumas mulheres
sofreriam de infertilidade, os bebês muitas vezes seriam natimortos
ou morreriam muito jovens, e ainda outras mulheres entrariam em
ordens religiosas e nunca mais teriam filhos. Finalmente, parece que a
partir de então, a morte passou a vir a todos em idade avançada: Até
agora as pessoas morriam apenas de doenças ou se fossem mortas por
alguém.
Existe mais um texto do mesmo período da epopeia de Atrahasis,
é a história suméria da inundação. Este texto também relata sobre
a criação do homem e culmina com a história do grande dilúvio.
Infelizmente, muitas partes da história suméria estão perdidas, mas
a versão reconstruída mostra paralelos com Gênesis 1-9 bastantes
surpreendentes.
Paralelos entre a história da inundação suméria e a de Gênesis
1-9:
37
homem – a evolução biológica, a evolução sociológica e econômica.
Estes “textos” falam bastante sobre valores e visões da humanidade em
geral e bem específico quando pensamos sobre assuntos da ética ou da
moralidade.
O Deus da Bíblia quer que alinhemos nossa interpretação da
humanidade ao texto bíblico e vivamos um sonho, que ele tem sobre
nossa comunidade e sociedade. Como Gênesis 1-11 foi um texto
muito contra-cultural em seu contexto, precisamos ter uma visão da
humanidade contrária a que está propagada hoje em nossa cultura
pós-cristã.
Referências Bibliográficas
Mitchell, T. C., and British Museum. The Bible in the British Museum.
Paulist Press, 2004.
Wenham, Gordon J. The Pentateuch. Vol. 1. Exploring the Old Testament.
SPCK, 2003.
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Uma vista geral da Torá
• A Torá como Fundamento da Bíblia
• A Teologia de Gn 1-11 no contexto do Antigo
Oriente Próximo
• Formas literárias na Torá
39
A Torá: formas da literatura e teologia
Observe bem essa tabela1. Os nomes dos cinco livros nas diversas
línguas (hebraico, grego e latim) são programáticos. Qual é a ligação
entre o nome e o conteúdo para cada livro? Você está convidado a
colocar suas ideias no nosso fórum.
Como primeira parte do AT, esses livros (também chamados
de “pentateuco” – que significa “cinco livros”) são fundamentais para
entender o restante do AT e até mesmo a Bíblia inteira. Todos os outros
livros bíblicos têm o Pentateuco como base e desdobram os temas lá
mencionados. Como tal, grande parte da Bíblia pressupõe a Torá e
toma como certo que a conhecemos. Sem saber bem a literatura da
Torá, perdemos muitas das alusões sutis para os seus temas, o que nos
ajudará a entender muitas passagens do AT, bem como do NT.
41
A Torá como Fundamento da Bíblia
Para pensar...
Olhando pra as questões fundamentais da humanidade, como
você reescreveria ou usaria o Gênesis para responder aos
questionamentos de sua própria cultura e comunidade?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
Gordon J. Wenham, The Pentateuch. Vol. 1. Exploring the Old Testament. SPCK, 2003, 197.
3
43
A Teologia de Gn 1-11 no contexto do Antigo
Oriente Próximo
Dando continuidade à última unidade, gostaria de destacar
algumas perspectivas sobre a teologia dos primeiros capítulos da Torá,
a fim de nos deixar entusiasmados sobre esta parte fundamental da
Bíblia. Na unidade 2, conclui com um parágrafo sobre o contexto
literário de Gn 1-11.
A teologia nunca “acontece” no meio do nada. Ela é sempre, e
em qualquer tempo, incorporada a um contexto muito concreto. Toda
a nossa vida influencia a nossa teologia, nossos pensamentos sobre
Deus, sobre a humanidade e sobre o mundo maior. Cultura, tendências
sociais, filosofia, literatura, artes, economia, amigos, natureza, origem
social, educação e qualquer outro aspecto da vida molda a nossa
teologia. Isso significa que nossa teologia é feita em reação ao nosso
contexto.
O que isso tem a ver com a leitura de Gênesis a Deuteronômio?
Bem, esses livros representam a “teologia”, eles falam sobre Deus,
sobre os seres humanos em frente a Deus. Eles tentam moldar a nossa
percepção do mundo, querem que comecemos a ver por um nova
perspectiva a nossa realidade presente.
Ao pegar alguns dos temas mais fundamentais da nossa
humanidade, a Torá aborda questões como a nossa origem, nosso
destino, nossa razão de ser, porque há mal neste mundo, como lidar
com ele, e o que esperamos. Cada cultura fornece respostas para
estas perguntas. Não há surpresas quando o AT quer dar respostas a
esses assuntos. O objetivo é avaliar, remoldar e corrigir as respostas
prevalecentes entre os povos vizinhos de Israel.
Nós não precisamos propor que o autor de Gênesis literalmente
leu ou copiou de textos paralelos do Antigo Oriente Próximo. Essas
histórias circularam no mundo antigo, em diferentes versões, sejam
elas escritas ou orais. A maioria das pessoas, então conhecia a história
do dilúvio, embora não tivessem ouvido ou lido os épicos de Atrahasis
ou de Gilgamesh, assim como hoje as pessoas sabem sobre a evolução
sem ter lido Darwin (veja Gertz, 2009, que propõe uma tradição
“científica” comum a muitos povos do antigo oriente).
45
dos deuses. Em Gênesis existe apenas um Deus, que cria e controla
tudo. Considerando que os deuses da Babilônia não podem controlar a
inundação, o Deus de Gênesis pode – e ele pode muito soberanamente.
Gênesis 1 narra como Deus criou o mundo passo a passo.
Na Mesopotâmia, pensaram que o sol e a lua eram deuses muito
importantes, enquanto em Gênesis eles são meramente criados no
quarto dia – a luz podia existir sem eles.
Outra reinterpretação surpreendente do relato de Gênesis é
sobre a questão da finalidade da criação do homem. No pensamento
mesopotâmico o homem não é mais do que um escravo para fazer o
trabalho para as divindades menores. Em Gn 1-2 tudo é criado com
referência ao bem-estar da humanidade. A humanidade é a clímax, o
ponto de referência de toda a criação. Deus faz tudo para ela, criou-lhe
um ambiente ideal para viver e deu-lhe a tarefa régia de cuidar do resto
da criação. Considerando que os deuses da Babilônia deverão receber
alimentos, o próprio Deus está dando alimentos ao homem. Segundo
a visão do mundo mesopotâmico, um dos grandes problemas com a
humanidade é a fertilidade: a explosão populacional perturbou o sono
dos deuses. Apenas algumas alterações no processo de reprodução
poderiam resolver o problema (algumas mulheres são inférteis e muitos
bebês morrem cedo na vida). Gênesis tem uma perspectiva diferente.
A fertilidade é uma benção divina e Deus encoraja explicitamente a
procriação (“Sede fecundos e multiplicai-vos” Gn 1:28). O mesmo
é verdade, depois do dilúvio (lemos três vezes: “Sede fecundos e
multiplicai-vos” – 8:17; 9:1; 9:7)!
Para pensar...
Pense sobre as qualidades éticas dos deuses da Babilônia e
compare-as com a atitude de Deus, vista em suas reações sobre
o pecado humano (Gn 3 e 6-9). O que você conclui? Tente
pensar sobre as grandes histórias, líderes e ídolos da sua própria
cultura – o que os brasileiros aprendem com eles hoje? Que
histórias, como cristãos, devemos contar?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
47
Muitos especialistas estão tentando isto e, nos últimos 30 anos, estamos
muito mais perto de fazer justiça à Bíblia como literatura antiga. É a
palavra de Deus, e só por isso vale a pena todo esse esforço!
Aqui, nós não podemos ainda tentar resolver questões desta área
de pesquisa bíblica, mas podemos fazer um começo. O truque é estar
alerta para o gênero de um determinado texto bíblico. Um gênero
é uma forma literária, é a forma exterior para além do conteúdo do
texto. Você vai imediatamente reconhecer a seguinte forma literária:
Não quero fazer comentário sobre o
conteúdo deste “texto”. Isso é para outras
pessoas – sou teólogo, e nada mais.
Obviamente, temos a forma de um
obituário. A cor, o layout, as imagens falam-
nos de imediato. “Sabemos” este texto.
Todos nós procuramos, nos primeiros
segundos de ver isso, o nome do falecido e
talvez alguns detalhes sobre o funeral. Só
no segundo relance, percebemos que este
é um texto irônico. Este é um exemplo
extremo de como o gênero funciona para
um leitor que está habituado a certa convenção literária.
Na Bíblia encontramos o mesmo fenômeno. Como já vimos,
qualquer pessoa crescendo no segundo milênio a.C. e lesse Gn 1-11,
imediatamente compararia esse texto em sua mente com textos
semelhantes sobre a origem do mundo e da criação da humanidade.
Qualquer leitor de Êxodo 20-24 irá instantaneamente reconhecer
a semelhança na forma (e conteúdo) desta passagem com outras
coleções de lei do Antigo Oriente Próximo.
Sabendo disso, precisamos pensar sobre o lugar vivencial do texto
que estamos lendo. Assim como no nosso exemplo do obituário, o uso
“normal” de um gênero literário em que a Bíblia é bastante limitada.
No Antigo Oriente Próximo, histórias sobre a origem do mundo e da
humanidade não foram em nenhuma forma concebidas para serem
lidas como tratados científicos sobre aspectos físicos, geológicos ou
biológicos deste evento. Temos outros tratados como esses escritos
na mesma época – sobre a matemática, a engenharia civil, a magia
49
partes “legalistas” da Torá e a mensagem do evangelho do NT. Isso
representa uma leitura completamente deficiente das coleções de lei na
Torá. Podemos encontrar uma melhor compreensão e interpretação
do direito bíblico quando prestamos atenção aos vários gêneros da
Torá.
Para pensar...
O Novo Testamento afirma a validade permanente dos dez
mandamentos para a igreja primitiva (por exemplo, Mt 19,16-
19; Mc 10,17-20; Rm 13,9-10).
Mas eles são praticáveis hoje no Brasil moderno? Se você
fosse o presidente, quais mandamentos tentaria implantar e
quais deixaria de lado? Liste-os em ordem de importância – a
violação de quais você mais duramente penalizaria? Quais são
as diferenças presentes em sua lista e o que isso fala sobre os
valores da sociedade moderna e os valores bíblicos?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
Referências Bibliográficas
51
Anotações
__________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Lutando com Levítico
• O Tema da Torá
53
Para pensar...
O que você acha sobre o cumprimento parcial das promessas
divinas aos patriarcas? Clines está correto ao dizer que na
Torá só se observa um cumprimento parcial das promessas?
Ou podemos encontrar também um cumprimento total ou
áreas onde não há qualquer cumprimento? Observe as quatro
partes das promessas: a terra, os descendentes, a relação entre
o homem e Deus e a benção para as nações. Você seria capaz
de atribuir um “grau do cumprimento” destas quatro áreas da
promessa?
55
e o homem. Assim, os sacerdotes (ou Moisés) representam Deus ao
homem e o homem a Deus. Limpar o altar com o sangue sacrificial
significa que, ao mesmo tempo, a pessoa, que oferece o sacrifício é
representada diante de Deus junto ao altar, e também é lavada no altar.
Assim, neste mundo conceitual, a limpeza é intimamente ligada ao
perdão e, portanto, à restituição da comunhão com Deus.
Isso nos leva à questão da pureza e impureza. Esses conceitos têm
muito pouco a ver com a higiene, e muito mais com uma expressão
metafórica da religião. Para o israelita todo o cosmos é estruturado
por princípios de pureza e impureza. Isso é muito difícil de entender
a partir de uma perspectiva moderna. Para Israel o mundo inteiro
é estruturado através das linhas de pureza: tempo, espaço, pessoas
e coisas. Há coisas, pessoas, tempos e espaços (por exemplo, as
ferramentas no templo) que são muito intimamente relacionados com
Deus, o sumo-sagrado, assim eles são “muito santos”. O resto do mundo
e do tempo é menos santo. Então, os sacerdotes têm de atingir padrões
mais elevados de santidade que os levitas e os israelitas comuns. Um
passo mais à frente (em termos de distância a Deus) estão os pagãos. A
mesma hierarquia existe com respeito a lugares: o templo de Jerusalém
em si mesmo tem vários níveis de santidade (o santo dos santos – as
várias praças), mas também a terra de Israel é percebida como “terra
santa”. Agora, nos tempos depois da Páscoa, as coisas são diferentes:
Todo o mundo é a terra de Deus – isso já é uma antecipação da nova
criação, que um dia Deus vai estabelecer.
Qual é a lógica por trás da
diferenciação do mundo em santo
e profano, puro e impuro? Muitas
ideias têm sido propostas, algumas
delas mais sensatas do que outras.
Com certeza não cabe definir a pureza
através de ideias nutricionistas modernas. Um bom lugar para começar
seria a consciência da natureza de linguagem metafórica e simbólica.
Para Israel, tudo o que simbolicamente reflete Deus como o doador
da vida perfeita é puro. Assim, qualquer deficiência, como doenças
de pele ou ferimentos, tornarão uma pessoa impura. Certos animais
são “normais” (como os peixes com escamas ou animais com unhas
57
promessa ou a bênção é tanto a iniciativa divina em um mundo onde as
iniciativas humanas provocam sempre o desastre como uma reafirmação
das intenções divinas primordiais para o homem.1
Não podemos só observar como este tema é verdadeiro referente
a Torá em sua totalidade, mas também como esse tema é desenvolvido
nas partes constituintes – basta olhar para as histórias de Abraão, ou
a história do bezerro de ouro. Note-se também como Clines inclui
Gênesis 1-11 em seu tema! Este tema pode ajudar bastante na nossa
leitura dos primeiros cinco livros da Bíblia.
A Torá abre o caminho à literatura bíblica e estabelece a base da
cosmovisão bíblica. Mas ela continua a ser um livro sem conclusão.
Assim, nós, como leitores, estamos ansiosos para aprender mais sobre
como tudo se desenrola e como veio até o lugar onde estamos hoje.
Referências Bibliográficas
Introdução
59
Objetivos
Ao final da unidade, o aluno:
1. Refletirá sobre a diferença entre história e
historiografia;
2. Descobrirá os vários níveis de leitura das histórias.
Plano da unidade
• O Gênero das Histórias
• Visão panorâmica das histórias
“Omri foi rei de Judá”, Mesha Stele (ca. 852-841 aC) - Fonte: Wikimidia Commons
61
Visão panorâmica das histórias2
Como estão na Bíblia hoje, as histórias formam a continuação
da narrativa iniciada no Pentateuco. O Pentateuco descreve a criação
do mundo e os primórdios da história humana e, em seguida, em
sua maior parte, enfoca as relações do criador com o povo de Israel.
Deus compromete-se com Israel por aliança e lhes dá um chamado,
de trazer a bênção para as nações do mundo. Deuteronômio, o último
livro do Pentateuco, termina com Israel prestes a entrar em Canaã,
a terra que Deus prometeu dar-lhes como território nacional. Neste
ponto, as histórias começam.
Josué descreve a conquista de Israel sobre Canaã sob a liderança
de Josué, e a divisão de Canaã e partes da Cisjordânia (a terra ao leste
do rio Jordão) entre as 12 tribos de Israel. Os próximos capítulos de
Josué demonstram que até o final da vida de Josué os israelitas ainda
não tomaram posse completa de Canaã.
Em Juízes, a geração posterior a de Josué não completou a
conquista de Canaã. Segue-se um longo período de infidelidade
religiosa e de instabilidade política. Líderes (juízes) surgem, mas
apenas trazem alívio temporário. O livro termina com Israel ainda
sem a plena posse das terras.
Rute é situada no período dos juízes. Rute, uma mulher moabita,
adentrou a uma família israelita, trazendo bênção para si mesma e aos
outros. Ela é uma ancestral de Davi, futuro rei de Israel.
Samuel é o último dos juízes de Israel, mas os livros de Samuel, em
homenagem a ele, descrevem os primórdios da monarquia em Israel.
O reinado de Saul, primeiro rei de Israel, termina em desastre. Mas
Davi emerge como o sucessor de Saul e conclui a conquista de Canaã
ao tomar Jerusalém. Ele derrota ou faz alianças com nações vizinhas,
trazendo estabilidade. Durante os últimos anos do seu reinado, ele
tem de superar uma rebelião liderada por seu filho Absalão.
Os livros dos Reis descrevem o reinado de Salomão, filho de Davi,
que constrói um templo para YHWH, em Jerusalém. Após sua morte,
seu único reino se divide nos reinos do norte, Israel e o do sul, Judá. O
2
Este sumário foi traduzido de Philip E. Satterthwaite and J. Gordon McConville, A Guide to the
Historical Books, vol. 2, Exploring the Old Testament (InterVarsity Press, 2007), 1-3.
63
Referências Bibliográficas
Introdução
Objetivos
65
Plano da unidade
• Sansão – uma narrativa simbólica
• A Ética das Histórias
67
aprova um comportamento aparentemente muito questionável – e, às
vezes, até exige isso?
O processo de deduzir a ética dos autores das histórias é bastante
difícil. É realmente bom tudo o que Abraão fez? Será que o fato de
ser o rei escolhido por Deus permitia a Davi agir da forma que agiu?
Será que o autor de Josué realmente aprovou o genocídio que Israel
realizou no processo de conquista de Canaã? Precisamos ter cuidado,
uma série de estudos têm surgido para nos guiar nesse caminho:2
• Precisamos ter uma perspectiva histórica: textos de épocas
diferentes podem ter pontos de vista diferentes e, sendo assim, podem
diferir de nossos tempos.
• Temos que tentar discernir o relatório das ações e os ideais
subjacentes.
• Precisamos estar atentos à avaliação literária de eventos e
até mesmo à falta dela. Muitas vezes os autores bíblicos dão o seu
veredicto nas entrelinhas, por exemplo, a maneira que um personagem
se desenvolveu, ou o fato de um autor simplesmente ficar em silêncio
sobre determinados resultados ou reações.
• Nós também precisamos estar cientes do fato de que, por vezes,
nós, como seres humanos, tendemos a fazer outras coisas que Deus
tem nos destinado inicialmente.
A questão da ética no AT nunca será fácil e difícil ao mesmo
tempo, especialmente nas histórias. Mas, ao mesmo tempo em que
estamos tendo bastante cuidado para não lermos esses textos de forma
muito plana, começamos a descobrir muitas informações valiosas
sobre o comportamento humano e como lidar com ele de uma forma
fiel à complexidade do mundo. Em nossa vida real raramente há um
preto e um branco. Muitas vezes tentamos nos orientar em uma névoa
cinzenta. Isso não era diferente nos tempos antigos. Precisamos ter os
olhos fixados em Deus e em seguida, tentar explorar a vida a partir do
ponto de vista do amor e da justiça.
2
Por exemplo John Barton, Understanding Old Testament Ethics: Approaches and Explorations
(Louisville: Westminster John Knox Press, 2003); Wenham, Story as Torah: reading Old Testament
narrative ethically; Christopher J. H. Wright, Old Testament Ethics for the People of God (Downers
Grove: Inter-Varsity Press, 2004).
69
Anotações
__________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
Introdução
Para pensar...
O que significa o termo “sabedoria” hoje? Como é que o
relacionamos a conhecimento, compreensão, inteligência,
experiência?
1
Anthony R. Ceresko, A Sabedoria no Antigo Testamento. Espiritualidade Libertadora (São Paulo:
Paulus, 2004), 11-12.
71
Dentro da Bíblia hebraica há três livros (Jó, Provérbios
e Eclesiastes) que, apesar das suas diferenças, têm muito em
comum. Portanto, os acadêmicos passaram a considerá-los
como representantes de um tipo distinto de literatura. O que
estes três livros têm em comum é que eles estão preocupados
com a sabedoria. Se você usar uma concordância e pesquisar
a palavra, você encontrará que a “sabedoria” (ou os seus
cognatos) aparecem com relativa frequência. Abaixo quero
escrever um pouco sobre o fenômeno “sabedoria” e depois
vou introduzir o livro de Provérbios. Os outros dois livros
sapienciais têm uma perspectiva diferente e muito mais
pessimista. Vou comparar essas duas perspectivas no final
dessa unidade.2
Objetivos
Plano da unidade
• Sabedoria – a experiência humana
• Provérbios – “O mundo funciona assim...”
2
Talvez você esteja à espera de algumas anotações sobre Cantares. Este livro é ainda mais ligado com
poesia – então vou tratá-lo na unidade sobre Salmos.
Sidelight..
Em outras partes do Antigo Testamento, a palavra hebraica
para sabedoria “hokmah” significa algo como “habilidade”: o
conhecimento prático em qualquer esfera, desde o artesão até
o político. Mas em P hokmah é sempre habilidade de viver: a
capacidade do indivíduo conduzir sua vida da melhor forma
possível (Cf. Whybray, Proverbs, NCB, London: 1994, 4).
3
Usei muito o livro de Ernest C. Lucas, A Guide to the Psalms & Wisdom Literature, Exploring the
Old Testament, Volume 3 (InterVarsity Press, 2003), 79-115.
73
Sugestão...
Use uma concordância para estudar os temas abaixo no livro de
Provérbios. “Desenhe” um retrato dessas diferenças de caráter:
1. o mentiroso
2. o homem perverso
3. o mexeriqueiro
4. o bajulador
5. o escarnecedor
6. o justo e o mal
7. o sábio e o tolo
8. o uso sábio das palavras
Por que não preparar um estudo bíblico sobre estes temas para
sua comunidade?
Para pensar...
Leia o “prólogo” do livro de Provérbios (Pv 1:2-6) com a
declaração sobre a finalidade do livro. Você pode pensar em
qualquer forma moderna comparável a essa “literatura de
sabedoria”?
75
Nos livros sapienciais da Bíblia, o conceito “sabedoria” não
significa inteligência ou sabedoria intelectual, mas a capacidade de
gerenciar a vida cotidiana. Essa habilidade é baseada na observação
dos processos sempre repetidos da vida e das relações de reflexão e
transferência dessas experiências.
77
Muitos provérbios bíblicos são simplesmente observações “do
jeito que está” e não contém qualquer avaliação explícita. Não devemos
simplesmente assumir que a declaração de uma realidade significa a
sua aprovação. Compare o seguinte:
“O presente é, aos olhos dos que o recebem, como pedra preciosa;
para onde quer que se volte servirá de proveito” (17:8).
“O ímpio toma presentes em secreto para perverter as veredas da
justiça” (17:23).
Lendo estes dois provérbios juntos, podemos concluir que o
suborno frequentemente funciona, mas que é errado utilizá-lo. Isso
se equilibra ainda mais: “O que age com avareza perturba a sua casa,
mas o que odeia presentes viverá” (15:27). Nem todos os provérbios
oferecem conselhos bons – eles podem ser apenas uma observação da
nossa realidade.
Finalmente, os provérbios não são leis. Eles são observações
permanentes, que descrevem a norma e não expressam o inevitável.
Isso nós já observamos a partir da perspectiva diferente no parágrafo
anterior. A vida e os seres humanos são complexos demais para serem
resumidos em uma breve frase ou para detalhar a verdade sobre uma
determinada situação. Aqueles que são sábios estão cientes de usar os
provérbios com a devida discrição.
Referências Bibliográficas
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Jó e quando Deus faz o que Ele quer
• Eclesiastes – estabelece-se no insondável da vida
1
Talvez você esteja à espera de algumas anotações sobre Cantares. Este livro é ainda mais ligado com
a poesia – então vou tratá-lo na unidade sobre Salmos.
79
Jó e quando Deus faz o que Ele quer
Se a conexão entre ato e consequência é quebrada pelo pecado e
pela injustiça, o que a sabedoria pode oferecer em uma crise? Por que
o insucesso? Por que é que os opressores são ricos e gordos? Por que
é que alguns sofrem de uma doença ou da pobreza mesmo não tendo
feito nada de errado e sendo tementes a Deus? Muitas vezes, o mundo
parece estar fora de ordem. Parece que Deus não está fazendo o seu
trabalho para manter o sistema. As respostas do padrão tradicional
são bastante insatisfatórias para explicar a causa do sofrimento. Isso
pode ser visto no livro de Jó (e mesmo em nossa própria realidade).
Considerando que você já leu o resumo de Hans Walter Wolff
do livro de Jó, vou tocar em alguns outros pontos interessantes, que
podem nos ensinar algo sobre como lidar com algumas dificuldades
na Bíblia Hebraica. A primeira coisa seria como lidar com as tensões
evidentes no estilo de um determinado livro. Em Jó, o cenário narrativo
que constrói quase uma moldura ao redor do diálogo (Jó 1-2; 42:7-
17) é esteticamente bem diferente dessa parte principal do livro,
que é um diálogo de estilo alto-poético, artisticamente tecido. Além
disso, o cenário narrativo demonstra a localização de Jó e seus amigos
em Edom, sendo então, um contemporâneo de Abraão. As outras
características do livro, no entanto, sugerem fortemente os séculos
IV ou III para a sua forma final. Para complicar ainda mais, muitos
estudiosos sugerem que o capítulo 28, o poema sobre a sabedoria, não
pode fazer parte da primeira composição, por ser tão calmo e tranquilo
em sua entonação. O que podemos dizer sobre estas coisas?
Durante as últimas décadas, várias coisas mudaram
consideravelmente na área de estudos bíblicos e cada vez mais os
teólogos estão preparados para tentar ver os textos bíblicos com
olhos literários. Isso significa que eles tentam entender a Bíblia como
literatura e não como documentos arbitrários que testemunham sobre
Sidelight...
Em hebraico, há uma distinção forte entre o artigo determinado
e o indeterminado. Em Jó encontramos sempre “Satanás” com
artigo determinado (“o Satanás”). Podemos assim supor que
aqui “Satanás” é um título (o acusador / adversário), não um
nome. Só muito mais tarde na literatura judaica - e, claro, nos
escritos cristãos - encontramos a ideia de que “Satanás” denota
um ser especificamente demoníaco.
Lembre-se: este tipo de desenvolvimento do sentido de
vocabulário ocorre muitas vezes na Bíblia. Sabendo disso
podemos evitar uma interpretação ao pé da letra.
O capítulo 28, com seu tom calmo, não combina com a
argumentação calorosa de Jó. O que é falado por Jó parece ser sugerido
pela titulação 27:1. No entanto, há uma nova posição no 29:1, que
introduz um novo argumento. Assim, podemos supor que o cap. 28
nunca foi destinado a ser lido como a fala de Jó, mas sim como um
comentário do autor. Na verdade, Jó 28 vem em um momento muito
apropriado do diálogo. É uma expressão do ponto de vista de que os
humanos têm a capacidade de compreender a sabedoria divina e que a
resposta adequada a esta questão é ter reverência a Deus e evitar o mal.
Isto prepara o caminho para os discursos divinos – e ajuda o leitor a
separar mentalmente o último discurso de Jó do diálogo anterior.
Uma nota breve sobre a questão teológica deve terminar nossa
reflexão sobre Jó. Como já observado, muitos estudiosos veem uma
aparente tensão teológica entre o epílogo e o resto do livro. Os versos
de abertura do prólogo parecem indicar a doutrina convencional de
recompensa e punição. Jó é apresentado tanto como “íntegro e reto,
81
temente a Deus e afastando-se do mal” e como “o maior de todos os
povos do oriente”, o leitor pode supor que existe uma ligação direta
entre a sua grande piedade e sua grande riqueza e posição social.
No entanto, o pressuposto de que sempre deveria haver tal ligação é
quebrado quando Deus aceita o desafio do satanás, para experimentar
Jó. O diálogo, em seguida, explora as implicações do rompimento desse
vínculo. Em Jó 42:7-9, Deus condena os amigos de Jó por defenderem
a posição de que deve haver uma ligação entre a religiosidade e a
prosperidade. No entanto, a restauração de Jó parece restabelecer
essa ligação, contradizendo a essência da mensagem do livro. Houve
numerosas tentativas para resolver essa aparente tensão. Reitero
apenas algumas das mais prováveis.
Em função da quebra da ligação entre a justiça e a prosperidade,
a restauração de Jó não deve ser entendida como justiça, mas como o
fato de que o teste está terminado. Foi argumentado que a arte do livro
exigia isso. É preciso que haja uma conclusão adequada para o teste, e
qualquer coisa além da restauração de Jó seria intolerável para o leitor.
Outros veem no epílogo, não tanto a restauração de Jô, mas
a restauração da reputação de Deus. A aceitação de Deus ao teste
de Satanás e a aflição de Jó, no mínimo, levanta questões sobre a
preocupação de Deus com Jó. Isto precisa ser direcionado. Uma
resposta é dada, pelo menos em certa medida no epílogo, ao tratamento
de Deus para com Jó.
Em ambas as interpretações do epílogo os estudiosos salientam
que Deus age livremente, não sob a restrição de qualquer vinculação
inevitável de piedade e de prosperidade, como fora afirmado pelos
amigos de Jó. As ações de Deus no epílogo devem ser vistas como
decorrentes da liberdade de Deus. Esta liberdade é a lição a ser
aprendida com os diálogos e seu clímax nas intervenções divinas. Deus
não é obrigado a agir de acordo com uma lei rigorosa de recompensa
e punição. Ele pode agir gratuitamente para com os seus servos – e Ele
age!
Para pensar...
A ideia de uma ligação direta entre a piedade e a prosperidade é
bastante comum no Brasil moderno – no pensamento popular,
bem como na religião. Como este fato faz o livro de Jó ser
relevante nos dias de hoje? Coloque no fórum as suas ideias!
Sidelight...
83
É impressionante como as interpretações destes versículos podem
ser variadas. Crenshaw1 compreende esses versículos como expressão
de uma visão profundamente pessimista sobre a vida. Ele traduz hevel
como “absurdo” ou “fútil” e, portanto, 1:2 representa uma avaliação
muito negativa da vida. A palavra jitron ele traduz como vantagem
e, portanto, 1:3 expressa que
os seres humanos podem não
ganhar nada, independente de
todos os seus esforços. Perdue2,
por outro lado, interpreta
Qohelet como tendo uma visão
menos pessimista. Ele vê na
raiz hebraica de hevel o sentido
da respiração e aponta para
A grandeza da palavra refere-se ao número de vezes que essa a sua qualidade metafórica
palavra aparece no livro Eclesiastes.
“efemeridade”. A vida é como
um vento, uma sombra, muito instável e breve. Para Perdue, Qohelet
lamenta a brevidade da vida e não a sua insignificância.
Estas duas concepções diferentes de 1:2-3 levam-nos a diferentes
compreensões das várias passagens em Eclesiastes, que defendem o
gozo da vida (por exemplo, 3:12 e 22; 5:18; 11:8-9). Crenshaw vê isso
como algo que incentiva os prazeres em uma tentativa sem fundamento
para salvar alguma coisa além da insignificância da vida. Com base no
entendimento de Perdue, essas passagens podem ser vistas sob uma
luz mais positiva. Whybray3 assinala que essas passagens formam
uma série onde há um aumento constante de ênfase, e que o último
nessa série (11:9-12,7) tem uma posição chave no final do livro. Uma
característica comum dessas passagens é a afirmação de que todo
prazer vem como um dom de Deus. As exortações a aceitar o gozo da
vida como um dom de Deus podem ser vistas como, implicitamente,
afirmações de que, apesar de sua brevidade, a vida tem algumas
qualidades positivas, porque Deus não abandonou suas criaturas a
uma vida de desespero completo.
1
James L. Crenshaw, Ecclesiastes: a Commentary, OTL (Philadelphia: Westminster Press, 1987).
2
Leo G. Perdue, Wisdom & Creation: The Theology of Wisdom Literature (Nashville: Abingdon,
1994).
3
Norman Whybray, “Qoheleth, Preacher of Joy,” JSOT, no. 23 (1982): 87-98.
Referências Bibliográficas
85
Anotações
__________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
Introdução
87
Objetivos
Plano da unidade
• Poesia hebraica
• O Saltério – um livro!
• Os gêneros dos Salmos
Poesia Hebraica
Textos poéticos do antigo Israel não têm a aparência que
normalmente esperamos de poemas. Eles não rimam. Mesmo quando
você lê-los em hebraico, não rimam. Você pode já ter observado isto,
lendo poesia moderna. Alguns poetas modernos escrevem sem rima.
Geralmente, na poética a linguagem é utilizada com fins estéticos. Isso
significa que o poeta normalmente toma grande atenção com a forma
do texto e com a escolha das palavras. Um poeta bom pode comunicar
emoções e sutilezas que um texto de prosa não pode transmitir. “A
poesia é a mínima distância entre o sentimento e o papel” (Levi
Trevisan). Então, quando lemos poesia devemos interrogar menos
“Que é isto?” e mais “Que significa isto?” Poemas querem abrir – ou
até construir – um mundo de significado. Normalmente, neste mundo,
encontramos bastante metáforas, linguagem indireta, repetições e
exageros.
Tudo isso não é diferente com a poesia hebraica. A forma literária
mais utilizada neste grupo de textos é o parallelismus membrorum
(paralelismo das partes). Os poetas do Antigo Israel criaram textos
que vivem de diferencas sutis no significado de palavras ou de
expressões. É um processo semântico onde uma linha expressa uma
89
• Utilização de pares de palavras: homem/mulher, céu/terra,
fidelidade/verdade, acordar/dormir... (Sl 115,16: Os céus são os céus do
SENHOR; mas a terra a deu aos filhos dos homens.);
• Ritmo, mas esta é uma característica bastante difícil e muito
variável (algo somente visto no original hebraico);
• Linguagem figurada: já temos observado isso quando refletindo
sobre poesia em geral. Frequentemente não podemos entender
literalmente (Is 55,12: Os montes e os outeiros romperão em cântico
diante de vós, e todas as árvores do campo baterão palmas.).
Por que isso é importante para nós? Bem, basicamente você
não pode ler a poesia como outros textos não-poéticos. Muitas vezes,
uma leitura literalmente não faz sentido – e não deve nos assustar.
Como sempre: não é tão importante interpretar a Bíblia literalmente,
mas interpretá-la corretamente! A consciência de suas características
literárias ajuda muito a evitar muitas armadilhas exegéticas.
Saltério – um livro!
Dentro do cânon, os Salmos ocupa uma posição especial. Neste
livro, diferentes linhas do Antigo Testamento são juntadas. Aqui, há
retrospecção da história de Israel (Sl 78, 106 e outras), há elementos
proféticos (Sl 50 e em outros lugares), e textos de sabedoria (Sl 1, 49 e
outras). O saltério combina o que em outras partes do cânon fica para
si.
O saltério guia o leitor na oração, um caminho de lamento a
louvor. No início do livro superam os salmos de lamento, mas no final
todo mundo se junta no louvor a Deus. Este é o caminho por onde cada
salmo de lamento quer levar o orador. Também é a linha principal que
atravessa todo o livro.
Como um “livro de orações da Bíblia”, o saltério é indispensável
para a igreja do Novo Testamento. Ele nos ensina como podemos falar
com Deus e nos mostra Deus como o todo-poderoso é misericordioso,
um Deus que se volta a nós em cada necessidade. Só ele merece toda
honra.
91
150 Salmos em cinco livros. No final de cada livro tem uma doxologia
breve.1
Através destas cinco partes do Saltério é formalmente criada
em paralelo o Pentateuco. No entanto, não podemos determinar uma
correlação mais extensa ou profunda. Para concluir, quero enfatizar
que o saltério é realmente um livro. Podemos descobrir muitos grupos
de Salmos que são compostos deliberadamente juntos. Um exemplo:
Sl 26-32 começa com três salmos de pedido (26-28) que correspondem
aos três salmos de agradecimento (30-32). No centro Sl 29 celebra
Deus como um rei que salva o seu povo.
93
do antigo Israel, bem como fornecer-nos com algumas ferramentas
para compreender melhor a importância teológica dessas orações.3
A maioria dos estudiosos da Bíblia concordam no seguinte
sistema de classificação dos salmos:
• Hinos
• Louvor geral de Deus
• Salmos celebrando Deus como Rei
• Salmos de Sião (46, 48, 76, 84,87, 122)
• Salmos de Lamentação
• Individuais
• Coletivos
• Salmos de Ações de Graça (Todah)
• Individuais
• Coletivas
• Salmos reais
• Tipos menores: Salmos da Confiança, Salmos Sapienciais...
Louvai ao SENHOR.
3
Usei muito de Ernest C. Lucas, A Guide to the Psalms & Wisdom Literature, Exploring the Old
Testament, Volume 3 (InterVarsity Press, 2003), 1-28.
Salmos de Lamentação
Consistem no maior grupo no saltério. Mais ou menos uma
terceira parte dos salmos pertence a este tipo. Eles expressam a reação
do autor a Deus quando enfrenta uma situação de necessidade ou
aflição. Sua estrutura é relativamente flexível: nem todos os elementos
aparecem em todos os salmos e nem sempre na mesma sequência.
95
Tipo: Salmo de Lamentação
• Endereço a Deus, Invocação;
• Reclamação a Deus (descrição do problema: uma crise de
qualquer tipo; em salmos penitenciais é o pecado; uma reivindicação
de inocência; uma condenação do “mau” ou do “inimigo”;
• Afirmação de Confiança (“Mas, quanto a mim” ou “Não
obstante”; isto, às vezes, é o ponto de viragem do salmo);
• Petição (para a intervenção de Deus; muitas vezes usa-se a
expressão “salvar” ou “entregar”);
• Aviso de Resposta (voto de louvor, de adoração);
• Exclamação de louvor.
97
Tipo: ação de graça
• Introdução que envolve o nome de Deus (Javé). Pode
incluir uma declaração da intenção de agradecer Deus e pode ser
expandido por várias adições hínicas;
• A seção principal é basicamente um relato da experiência do
salmista (isto pode incluir uma descrição de seu estado anterior de
angústia; uma oração de libertação, que foi proferida neste estado;
uma conta do ato de Deus da libertação; uma referência para o
cumprimento do seu voto);
• Conclusão, incluindo muitas vezes uma exortação ao louvor
a Deus.
Referências Bibliográficas
99
Anotações
__________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
_______________________________________________________
Para pensar...
O que você acha da “defesa” de Zenger do uso dos salmos
de vingança no culto público hoje? Você tem algumas
ideais práticas de como recuperar estes salmos em nossas
comunidades?
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Aspectos Teológicos dos Salmos
101
Para pensar...
Salmos 15-24 podem ter um único tema teológico. No
início e no final, há referências a “a porta”. 15,1 e 24,3
levantam a questão de quem merece estar no monte do
Senhor. O tema aqui poderia ser o de “pertencer” ou
“estar em casa”, na presença de Deus. O movimento de
desejo a repouso - você pode rastrear essa progressão
através desses salmos?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
Prepare um estudo bíblico para a sua igreja!
103
Cântico dos Cânticos
Cântico dos Cânticos foi “o livro mais frequentemente interpretado
da cristandade medieval” (Ann Matter) e também inspirou um grande
número de comentários judaicos medievais. O Cântico dos Cânticos
tem desempenhado um papel fascinante na cultura ocidental. Foi um
caso de teste e uma oficina para o método alegórico e ainda um esteio
de ascetismo e um ímpeto para o misticismo.
É muito mais difícil estabelecer uma mensagem teológica do livro
comparado com qualquer livro profético, por exemplo – Ct nem sequer
menciona Deus – e ainda lê-lo refresca o coração e a incentiva para
apreciar e para afirmar a vida, especialmente na área de sexualidade.
Formalmente, o livro é poético em alto estilo. Muitas palavras são
difíceis de traduzir, pois só aparecem aqui na Bíblia hebraica. Cântico
dos Cânticos representa um conjunto disperso de 30 canções de amor:
“Discursos” da mulher alternam com respostas por parte do homem.
Não há desenvolvimento evidente da trama. Apesar disso, estruturas
foram encontradas (isso faz parte de ser teólogo, eles sempre podem
descobrir estruturas em qualquer texto). Um dos mais prováveis é
descrito na tabela a seguir:2
105
sociedade, é cantado como um poder que obedece as suas próprias leis.
A consideração de Ct na Sagrada Escritura poderá, assim, preservar,
biblicamente orientadas, uma antropologia e doutrina da sexualidade
humana diante de uma fixação patriarcal, de um direcionamento
unilateral para gerar descendência, e da observância exagerada de
aspectos jurídicos.
Com a valorização e admiração do corpo do homem e da mulher,
Ct se posiciona diametralmente contra toda cultura que hostiliza o
corpo e o amor. Voltando a refletir sobre o significado original de Ct, a
Igreja poderá ser vitoriosa em superar tendências hostis ao corpo e ao
amor de sua própria história.
Contudo, também por respeito à história da interpretação
judaica e cristã, não se deve deixar totalmente de lado a explicação
alegórico-tipológica. Ela percebeu corretamente que no “amor físico”,
como é enaltecido em Ct, reside uma força que transcende a dimensão
meramente corporal humana.3
Para pensar...
O que você acha sobre essa interpretação teológica do Cântico
dos Cânticos? Se não podemos usar cada versículo para basear
um sermão – podemos usar o texto em geral. Essa seria uma
mensagem para sua comunidade? Talvez seja texto para ler só
com os homens ou só com as mulheres.
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
Referências Bibliográficas
Ibid., 348.
3
Introdução
107
Para pensar...
Na sua igreja tem alguém com o dom de profecia? Qual
é o papel que ele/ela desempenha na sua comunidade?
Quais são os tipos das mensagens transmitidas? Qual é a
relação entre essas mensagens e as mensagens proféticas
do AT?
Coloque as suas ideias no nosso fórum!
Objetivos
Plano da unidade
• O profeta e o seu livro
• O profeta – uma pessoa estranha
• O livro
• A arte dos profetas
1
Para esta seção aprendi bastante, e usei bastante, um texto não publicado do meu amigo Prof. Dr. C.
Rösel, Marburg.
109
O Profeta – Uma Pessoa Estranha
Podemos ver os profetas por várias perspectivas. De um ponto de
vista sociológico, podemos distinguir 4 tipos de profetas, dependendo
de sua filiação a um grupo e/ou alguma instituição:
• Irmandades proféticas: Estudantes de escolas proféticas,
“cooperativas proféticas”;
• Profetas do templo (ligados a uma instituição);
• Profetas da corte (ligados a uma instituição);
• Profetas individuais (que são os profetas literários como Isaías
ou Jeremias, mas também Elias, Eliseu, dentre outros).
• Uma outra perspectiva óbvia é a cronologia:
111
O livro
Palavras proféticas orais foram bastante comuns no antigo
Oriente Próximo. Mas os livros proféticos são uma característica
singular de Israel e Judá.
A escrita das palavras começou no momento em que a mensagem
dada por via oral foi recusada (cf. Jr 36). Jörg Jeremias escreveu:
“Paradoxalmente, foi a desobediência e a falta de vontade de ouvir dos
ouvintes em primeiro lugar, que levam as primeiras palavras escritas
dos profetas. O imediatismo das palavras orais ganha, por ser escrito,
uma qualidade paradigmática e comunica aspectos gerais sobre o
relacionamento de Deus com Israel, que seriam transferidas para
novas situações históricas” (J. Jeremias, Hosea und Amos, FAT 13,
Tübingen 1996, 29+31).
113
a Palavra de Deus e eles fazem isso de inúmeras formas para que sejam
adequadas ao seu objeto (Deus e o reino celestial) e a sua intenção (para
chamar as pessoas de volta a Deus). O discurso profético é basicamente
uma fala de um mensageiro. Mas como é que este discurso pode ser
eficaz? A pronúncia de uma sentença pode ter o efeito de transformar
as pessoas de seus pecados, e assim evitar o julgamento que lhe foi
pronunciado. O melhor (talvez o único) exemplo disto no corpus
profético é o livro de Jonas, no qual o povo de Nínive se arrepende.
A intenção retórica de Deus foi presumivelmente cumprida no seu
arrependimento, mesmo que Jonas tenha sido oposto a isso!
Referências Bibliográficas
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Temas teológicos
• Isaías
• Jeremias – Ezequiel – Daniel
• Os profetas menores – o Livro dos Doze
115
Temas teológicos
Com a pregação dos profetas, no tempo de crise política (após
760), podemos observar o início de um novo modo de falar e agir de
Deus com seu povo.
Os escritos proféticos são mais conhecidos por sua crítica às
instituições que, inicialmente, foram dadas pelo próprio Deus, mas
que se desenvolveram longe Dele. Assim, eles formam um corretivo
necessário contra o estabelecimento de sacerdotes e reis. O importante
para eles é a crítica a um sentido errado da eleição e da autoafirmação
que acaba por conduzir a um abandono das palavras de Deus. Faz parte
desta mensagem um futuro glorioso para Israel (e do mundo inteiro),
apesar de todos os atos de autoengrandecimento. Os profetas têm uma
mensagem corretiva que acaba abrindo um caminho para mudar e,
finalmente, para evitar a condenação. Mas há também a noção de
julgamento inevitável (esp. Amós, que só fala, muito timidamente,
de uma salvação futura). Esta mensagem mostra como o amor divino
pode ser profundamente violado.
Mesmo como comunidade do Novo Testamento, precisamos
estar atentos a essa forte mensagem (simplesmente não podemos
prever, quando Deus irá “permitir-nos” colher dos frutos do nosso
pecado, ou quando ele vai agir no perdão misericordioso mesmo tendo
as consequências naturais da nossa natureza). Claro que isso precisa
ser equilibrado pela vitória final da sua misericórdia – o julgamento já
foi tomado por Jesus.
Um aspecto importante que merece destaque é o da necessidade
de restabelecer em nossas igrejas: o cultivo da correção crítica das
pessoas da liderança – seja da sociedade (política), da economia ou
da própria igreja. Pentecostes foi o dia em que a visão da profecia
universal de Joel tornou-se realidade. O Espírito de Deus foi derramado
sobre todos os crentes para que eles pudessem conhecer a mensagem
divina com a cruz e a ressurreição de Jesus em seu coração. Portanto,
o trabalho de todos consiste em testemunhar esta mensagem para o
mundo, tal como os profetas fizeram por Israel.
A dupla mensagem dos profetas – a oposição ao culto de outros
deuses do que Javé e a procura de justiça social na comunidade,
Para pensar...
117
Isaías
Ler Isaías é sempre muito edificante – aqui encontramos alguns
dos textos mais amados do Antigo Testamento. É realmente muito
difícil limitar-se ao introduzir este livro – mas é necessário.
Uma coisa que eu deveria mencionar é a divisão de Isaías 1-66
em três “profetas”: Isaías (1-39), Deutero-Isaías (40-55) e Trito-Isaías
(56-66). Cada uma destas partes pertence a uma época muito diferente
de Israel e apenas 1-39 têm qualquer ligação real com o homem Isaías,
filho de Amós, a partir do final do século VIII. Os outros são do
exílio ou pós-exílio. Essa divisão foi consenso
acadêmico por muito tempo, mas está se
dissolvendo cada vez mais, pois a maioria dos
estudiosos hoje está convencida de que não faz
sentido ler um destes três separados dos outros
dois. Os temas e palavras-chaves funcionam
durante o livro inteiro. Apesar de algumas
discussões consideráveis sobre a data do livro
de Isaías, você pode ficar tranquilo que você
está perfeitamente certo de lê-lo como uma
unidade. Como se você não tivesse feito isso
Visão de Isaías - (Sieger Köder)
de qualquer maneira.
Então aqui vem uma proposta de uma estrutura geral (também
vou destacar algumas passagens importantes):1
119
estabelecimento da justiça ao seu povo. Este pensamento é, então,
desenvolvido no que chamamos de promessas messiânicas, de um rei
que realmente cumpre plenamente o que Deus exige dele (Is 9-11).
Esta figura messiânica domina a primeira parte de Isaías, enquanto no
segundo momento, a metáfora se volta para o servo. Essa transição não
é muito dura, como “servo” era uma designação comum para o rei do
Antigo Oriente Próximo – o rei é o servo de Deus que deve estabelecer
a justiça e a paz ao seu povo. A identidade deste “servo” em Isaías é
difícil de definir. Podendo ser um indivíduo ou um grupo (Israel), ele
tem características divinas e, por outro lado completamente humanas,
parece, às vezes, uma figura real, por vezes, um profeta. O tema de
servo anda de mãos dadas com a mensagem da salvação das nações
(Is 49:6). O retorno do exílio da Babilônia não é um simples retorno à
forma como as coisas eram antes. Deus quer um povo verdadeiramente
justo para habitar sua “cidade” – e este povo será composto de pessoas
de muitas nações.
A data do livro é outro grande problema. Mas lembre-se da nossa
discussão acima sobre a relação do profeta com o seu livro: podemos
ser bastante relaxados sobre isso. O próprio profeta em primeiro lugar,
falou ao seu povo por via oral. Só em uma fase posterior o livro foi
escrito e certamente com a intenção de preservar a mensagem do
profeta para as gerações futuras. De fato, ao tentar ler a mensagem de
Isaías em diversos cenários históricos, a retórica faz sentido em todos
eles – e ainda, o livro continua a falar para nós. Isso aponta para a
qualidade literária dos textos deste livro.
Para pensar...
Pensando no “servo”... se a identidade dessa pessoa continua a
ser tão vaga em Isaías, o que isso lhe diz sobre seu próprio papel
como um “servo”? (É claro que Jesus tem que ser interpretado
como o servo final, mas isto não exclui as outras interpretações!)
O que isso quer dizer sobre ser parte de um novo Israel? Que
tipo de motivação missionária viria com isso?
121
Os profetas menores – o Livro dos Doze
Os doze profetas menores formam um livro. Essa coleção, logo
no início, acabou sendo considerada um livro; como pode ser visto na
tradição massorética: as somas da Masora final se referem a todas as
palavras destes doze livros e afirmam que a palavra “Sião” em Mi 3:12 é
(matematicamente) a palavra central desta coleção. Nós encontramos
várias referências aos doze (nos rolos de Wadi Murabba’at e Qumran e
em uma referência em Eclesiástico 49,10).2
Essa coleção segue uma sequência cronológica. Primeiramente,
encontramos os profetas que ameaçavam a queda do reino do norte:
Oséias, Amós, Miquéias (1:2-7). Judá era salva deste mesmo destino,
porque eles seguiram o conselho de Joel e pediram a ajuda de Deus,
que por sua vez poupou seu povo (Joel 2:18). Obadias e Jonas
discutem como as nações estão relacionadas com o destino de Israel.
Com Miquéias, Naum, Habacuque e Sofonias, ouvimos os profetas
pregarem o castigo a Judá. Suas advertências passaram despercebidas
e, assim, Judá também desapareceu. Entre Sofonias e Ageu deveríamos
ler sobre o exílio, mas isso não acontece. Ageu, Zacarias e Malaquias,
finalmente, gravam a mensagem que levou à restituição limitada de
Judá, sob o domínio persa. Mas ao mesmo tempo, sublinham a forma
final do desejo de Deus para salvá-los e com eles todo o mundo; ainda
é uma coisa do futuro.
Eu adoraria ir mais fundo na mensagem e nas retóricas de vários
escritos maravilhosos, mas, novamente; não há espaço. No entanto,
comecem a estudar como estes profetas interpretam a realidade atual
na luz do relacionamento especial entre Deus e Israel.
Referências
Introdução
Objetivos
Ao final da unidade, o aluno:
1. Descobrirá a sequência histórica dos
acontecimentos como eles são registrados no Antigo
Testamento;
2. Conhecerá algumas questões relacionadas com
a história de Israel durante o qual nenhum acordo foi
alcançado;
3. Refletirá sobre algumas questões teológicas
relacionadas a estas épocas.
123
Plano da unidade
• Antes de ser povo
• Religião dos patriarcas
• O Êxodo e a Formação do Povo
• O êxodo do Egito
• Formação do povo de Israel
• Os profetas menores – o Livro dos Doze
Para cada período vou dar este tipo de tabela. Talvez você
já tenha percebido que os dados colocados por Balancin são um
pouco estranhos. Parece que Balancin adere a uma visão bastante
rigorosa, quando quer limitar o período patriarcal a 1350– 1250
a.C. – normalmente falamos de 1950–1500 a.C. para esse período
(KITCHEN, 2003, p. 423ss).
Lendo a narrativa bíblica que cobre este período, reconhecemos
várias características marcantes. Entre elas, está a expectativa de
vida longa dos patriarcas. Além disso, parece que existem lacunas
consideráveis nas genealogias de Gênesis 5 e 10. Para nós, isso parece
muito estranho. Ao escrever sobre história, tendemos a favorecer
125
seriam valores razoáveis. Mas as suas vidas, após o nascimento dos
seus filhos ainda seriam bastante elevadas (a esperança de vida total
seria, em média, 180/190 anos). Isto pode ser devido à possível prática
de contar os anos do clã, que era conhecido pelo nome do patriarca.
Mas tudo isso permanece na especulação. Por outro lado, não há
necessidade de entrar em qualquer discussão detalhada quando
alguém tenta questionar a confiabilidade do Antigo Testamento só por
causa desses números elevados. Obviamente, para os antigos, esses
textos eram bastante aceitáveis e serviram a sua necessidade de uma
pré-história confiável.
maneira muito superficial. O que o cristianismo ou judaísmo tem a ver com o Islã ou outras religiões
monoteístas (p.ex. o monoteísmo de Akhenaton na Egípcia ou dos testemunhos de Jehová)?
127
é o caso mais tarde com o povo de Israel. No entanto, não pode esconder
a ênfase no temor de Deus no ciclo de Abraão, que claramente obriga o
beneficiário da promessa a obedecê-lo. Isso também é ilustrado na situação
em que: Abrão recebe o mandato de “ir” (Gn 12) e toda a narrativa do
sacrifício de Isaque é sobre a exposição da obediência de Abraão. Ambos
os contextos enfocam a promessa de Deus a Abraão. Aqui se combina a
promessa e o compromisso.
Quanto ao culto: o culto dos patriarcas não é removido da vida
cotidiana, ao contrário do culto no templo, apresentado mais tarde.
Os lugares santos andam juntos com os Patriarcas. Não existem vasos
sagrados, nem calendário fixo, nem uma ordem de culto (sacrifícios não são
necessários), nem sacerdócios (o sacrifício, a bênção, a mediação da palavra
de Deus são assumidos pelo pai! Instituições não existem). Por isso, “tudo
o que acontece entre Deus e o homem, é feito diretamente, sem qualquer
intermediário” (WESTERMANN, 1989, p. 124). Santuários abaixo de
árvores e de pedra foram, aparentemente, aceitáveis para os patriarcas,
mas, mais tarde em Israel, eles foram absolutamente rejeitados. O dízimo,
no entanto, já era prática comum para Abraão e Jacó. Circuncisão, um ato
motivado pela religião, mostra bem a continuidade dos pais e da religião de
Israel.
Livros da Bíblia
II. Confederação das Tribos de Israel
129
O hino triunfal de Êx 15 representa uma resposta hebraica aos
hinos orgulhosos egípcios do Novo Império que falam das grandes
(re-)conquistas dessa época. De uma maneira semelhante podemos
interpretar as pragas como crítica da cosmovisão egípcia: O faraó
não era capaz de dar estabilidade e segurança para o seu povo. Neste
projeto o rei estava dependente da colaboração dos deuses egípcios.
O rio Nilo, que em vez de trazer vida (a função do deus Hapi), está
trazendo morte – um sinal da fraqueza no meio da soberba de Egito.
Mesma coisa com as profundas trevas: Ra, o deus do sol, se tornou
invisível! Podemos ver que a ênfase do texto bíblico está claramente
na habilidade e soberania de Javé. O super poder daquela época não
podia fazer nada contra o plano de Deus.
131
Mesopotâmia nunca entrou em Canaã nessa época. O Egito dominou
essa área, mas não teve interesse nenhum na região montanhosa
de Canaã. Eles se preocupavam mais com as ruas importantes e as
planícies férteis perto do mar. Temos apenas uma anotação na estela
de Merenptah: As cidades Ascalon, Gaza e Yenoam. Terceiro, Kitchen
mostrou que o estilo das narrativas em Josué consiste exatamente no
que podemos supor para essa época (KITCHEN, 2003, p. 234–237). A
situação descrita em Juízes reflete exatamente os fatos arqueológicos:
Israel se estabeleceu entre os Canaanitas e não os suplantou; e isso
aconteceu na idade do bronze, no final do segundo milênio.
Referências Bibliográficas
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• O Reino Unido
• A instituição da monarquia
• O reinado de Saul
• O reinado de Davi
• O reinado de Salomão
• Datas mais importantes
133
O Reino Unido
Livros da Bíblia
III. Reino unido
Época: 1040-931 a.C.
Regime: monarquia. Reis: Saul, Davi, Salomão
Sistema: tributário
Religião: adoração a Javé.
Culto cada vez mais sofisticado em
Jerusalém. 1 e 2 Samuel;
Com Salomão: construção do Templo,
introdução de outras divindades 1Reis 1-11
Conflitos mais internos do que com inimigos
externos
Situação do povo: cada vez mais explorado e
empobrecido, ao lado do luxo e cultura
florescente da classe privilegiada
A instituição da monarquia1
Os textos sobre a instituição da monarquia começam em 1Sm 7.
Samuel atuava não somente como profeta e sacerdote, mas também
como juiz. Apesar de todo o poder político conferido a Samuel, ele não
era um rei. Essa condição levou o povo a pedir que Samuel presidisse a
mudança da forma de governo, ou seja, de juízes para reis.
Conforme 1Sm 8:20, a monarquia entre os israelitas, substituindo
o “sistema das doze tribos”, foi introduzida à moda de países
estrangeiros: “e seremos nós também como as outras nações”.
A monarquia no Oriente antigo se define não somente por seu
caráter político (Reino-Estado) e econômico (modo de produção
tributário), como também por sua ideologia: o rei é pai do seu povo,
encarregado por Deus (aspecto sacral) para garantir o suprimento das
necessidades do povo, através de uma organização estatal, com técnica,
cultura e “sabedoria”.
A monarquia israelita, abrindo caminho para um estilo próprio,
seguiu o modelo de outros países: de início mais semítico, para depois
imitar o estilo faraônico com Salomão.
De uma unidade escrita por Ênio Caldeira Pinto, FTSA, 2007, 2008.
1
O reinado de Saul
• Acesso à realeza: Dentre as narrativas que falam sobre o acesso
de Saul à realeza (1Sm 9-11), a mais antiga parece ser a de 1Sm 11:1-
15. Sua liderança inicial, ao reunir algumas tribos para defender os
habitantes de Jabes de Galaad contra os Amonitas e a vitória sobre
estes, fez com que o povo o escolhesse e fosse proclamado rei no
santuário de Guilgal (1 Sm 11:12-15).
• O âmbito do reinado de Saul é o vale médio do rio Jordão,
abarcando Galaad, a montanha de Efraim e a tribo de Benjamin,
centrada na região de Gabaá, de onde Saul expulsa os filisteus (cf. 1Sm
10:5) e aí estabelece sua capital.
135
• Modelo da realeza de Saul: Saul é, sobretudo, um chefe militar
ao estilo dos mesopotâmicos. Organiza um exército profissional
permanente, com sua guarda pessoal e general-chefe (Abner). Pouco
sabemos acerca da administração central do seu reino. Com certeza,
criou um mínimo de organização. Os relatos bíblicos estão mais
interessados na sua luta contra o inimigo central: os filisteus.
• Oposição a Saul: O reinado de Saul, desde o início, sofreu
contínuas pressões internas devidas, provavelmente, ao atrito entre
os partidários do novo sistema e os remanescentes do sistema tribal
(1Sm 13:7-15; 15). Além disso, a tribo de Judá entra em conflito com
Saul, pretendendo, a todo custo, obter o poder e a hegemonia dentro
do novo sistema. A lenta ascensão de Davi marca, pouco a pouco,
o descrédito sobre o governo de Saul e aponta para uma nova fase
do sistema. Com a morte de Saul, o povo judaíta, através de Davi,
encontrou mais facilidade para chegar ao poder.
O reinado de Davi
• Acesso à realeza: Acossado por Saul, Davi teve que buscar a
proteção de Aquis, rei filisteu de Gat (1Sm 21:11-16). Consegue, então,
reunir em torno de si os descontentes com o governo de Saul (1 Sm
22:1-2), formando um pequeno exército particular. Com esse exército,
Davi dá proteção a muitas cidades, ganhando a simpatia da tribo de
Judá, que o aclama rei em Hebrom, logo após a morte de Saul (2 Sm
2:1-4). Graças a uma política de assimilação, respeitosa das tradições
locais, Davi foi pouco a pouco conquistando também a simpatia das
tribos do norte, que o aclamam rei sobre todo o Israel (2 Sm 5:1-5).
Para preservar a unidade, sem ferir o orgulho tribal, Davi estabelece a
capital do reino em Jerusalém, que era um território jebuseu no meio
das tribos (2 Sm 5:6-10).
• Modelo da realeza de Davi. A administração segue o modelo
de inspiração egípcia, governando com uma espécie de secretário
de estado (Josafá), um secretário particular (Ozai), um conselheiro
(Aquitofel), um chefe do exército (Joabe) e um chefe da guarda
(Banaías). O serviço da justiça não estava organizado e dependia
O reinado de Salomão
• Acesso à realeza: Davi foi um guerreiro e construiu um império.
As lutas pela sucessão dividiram a própria família de Davi e, após uma
série de competições e intrigas familiares Salomão chegou ao poder.
Iniciava-se, assim, a dinastia judaíta de Davi, que mais tarde receberá
cunho teológico e escatológico.
• Administração: Salomão herdou um império já formado. Sua
tarefa não era a de conquistar, mas administrar, criando um aparelho
burocrático estatal que mantivesse a unidade do reino. O contrato
fundamental de Salomão com o povo era a construção do Templo,
sustentada pelos tributos. O rei, contudo, foi muito além, com um
desejo de equiparar Israel às outras grandes nações. Além de montar
uma máquina burocrática complicada, proveu a formação de um
grande exército e a construção de cidades fortificadas; construiu o
palácio real e outros palácios para suas mulheres. Desenvolveu tanto
o comércio interno como o comércio com o exterior, exportando
gêneros de primeira necessidade para importar artigos de luxo.
• Modelo da realeza de Salomão: toda essa grandeza e
desenvolvimentismo eram sustentados com o sacrifício do povo,
que teve de arcar com o pagamento de pesados tributos que não o
beneficiavam. Para agilizar todo o processo tributário, Salomão dividiu
o reino em distritos, cada um era encarregado dos fornecimentos
“in natura” por um mês. Por outro lado, a sustentação de tudo isso
137
exigia a formação de profissionais experientes. Para atender a essa
demanda, Salomão adotou modelos babilônicos e egípcios de uma
escola sapiencial que visava formar os diplomatas e também dar uma
forma orgânica à história e à cultura popular. Graças a isso, as tradições
tribais foram revistas e costuradas, de modo a formar uma ideologia
nacional favorável ao estado.
• Fim do reinado: Tendo iniciado com brilhantismo, o governo de
Salomão foi, pouco a pouco, criando certa ambiguidade que o levou a
uma situação insustentável: Israel se tornou uma “casa de escravidão”,
como outrora tinha sido no Egito. Com a morte de Salomão, o terreno
estava preparado para a desagregação nacional.
Referências bibliográficas
Introdução
139
Objetivos
Plano da unidade
• O reino divido
• Reis e Crônicas
143
coisas se tornaram irreversíveis e o candidato oposicionista, Jeroboão,
já presente em Siquém, aproveitou a oportunidade e foi eleito rei. No
início, Roboão tentava reagir pela força, reunindo Judá e Benjamin
para entrar na guerra – mas um profeta conseguiu convencê-lo que
isso realmente não era uma opção, uma vez que os “outros” são os
seus próprios parentes. Jeroboão, por sua vez, previu dificuldades ao
seu povo quando eles descessem a Jerusalém para adorar – Jerusalém
estava sob controle de Roboão. Por isso, ele introduziu um novo centro
de culto em Samaria com peça central de dois bois, um símbolo do
“Deus que nos tirou do Egito” (1Rs 12:28). Além disso, ele ordenou
sacerdotes não levitas e mudou as datas dos festivais.
Reis (o Livro) não critica Jeroboão porque ele se tornou rei
sobre as 10 tribos (cf. 11:29-39), mas sim por não confiar nestas
promessas divinas. Sua maneira de autoajuda, de tentar ficar no
controle e a violação óbvia dos mandamentos divinos centrais, são
interpretados como o início do fim de Israel (ver 1Rs 13:1-3). Para
ele, é mais importante que o seu povo permanecesse fiel a si mesmo,
do que fiel a Deus. Em seguida, o pecado de Jeroboão foi a tendência
dos reis em adotar formas de cultos que se adequam aos seus próprios
interesses.
Observe-se, como multifacetada a situação é: Por um lado a
rebelião das dez tribos se justifica por causa do comportamento
insensato de Roboão. De fato, essa rebelião foi a vontade de Deus
(12:15). Mas o resultado foi que Jeroboão levou as dez tribos para
longe de Deus. Porém, a culpa não é só de Jeroboão, as tribos fizeram
o rei e, portanto, aceitaram a sua adoração idólatra. Tanto o rei, quanto
as pessoas são culpados de infidelidade a Deus (14:15).
O reino do sul, sob Roboão, não se comportou muito melhor:
eles também caíram na idolatria e, rapidamente, a glória e a honra do
reinado de Salomão desapareceram por causa das invasões de vários
povos que viviam redor. De onde, então, vem a avaliação mais favorável
de Judá? Parece que Reis interpreta este curso de eventos em termos de
promessas divinas para a linha davídica de Judá que continuou apesar
de várias tentativas de usurpar o trono.
No reino do norte vemos uma dinastia após outra. Há pouca
continuidade dinástica. Após um período de guerra civil em Israel
Reis e Crônicas
Não é necessário narrar todos os acontecimentos que são
descritos em Reis e Crônicas. Você pode facilmente ler estes livros. No
entanto, algumas observações interessantes podem ser feitas. Quanto
à relação entre Reis e Crônicas, as coisas não são muito claras na
ciência bíblica moderna. Muitas vezes, supõe-se que Crônicas retoma
a discussão de Reis e acrescenta informações e avaliações de Reis, onde
ficou em silêncio. Por exemplo, a ausência de qualquer explicação em
Reis dos eventos negativos nos finais dos reinados de Joás, Amazias
e Azarias de Judá parece estranho. Crônicas preenche os detalhes
sobre a apostasia e os atos de desobediência desses reis. Muitas vezes
os intérpretes pensaram que Crônicas exagerou e inventou alguns
detalhes para relatar tudo de maneira lógica. Mas pode ser também
que o livro de Reis, deliberadamente, tenha omitido essas coisas
por causa das suas próprias razões teológicas. Reis parece ter uma
visão mais ampla do desenvolvimento histórico, enquanto Crônicas
olha para a cadeia imediata de causa e efeito. Este pequeno exemplo
mostra como é difícil diferenciar o fato “puro” e a sua interpretação. A
historiografia tem a tarefa de contar e interpretar. Nós, como leitores
modernos, precisamos estar cientes das diferenças conceituais entre
a nossa compreensão de como escrever sobre história e a maneira
145
hebraica antiga de fazer o mesmo.
Os livros de Reis e Crônicas podem muito bem ser baseados em
anais reais, mas eles são muito distintos dos anais reais encontrados
dos assírios, egípcios e babilônios, que foram escritos sob o comando
dos reis individuais para comemorar seus grandes feitos. Os livros
bíblicos são muito mais críticos: nenhum dos reis de Israel e muito
poucos dos de Judá recebem elogios. É mostrado como um rei pode
liderar o seu povo para a sua destruição quando ele age infiel a Deus.
A monarquia no norte e no sul levaram a um mal de grande escala
que foi intimamente ligado ao estado. Isto não tinha sido possível nos
períodos antes da monarquia (claramente, o pecado estava presente
durante o período patriarcal, a época do êxodo, e os primeiros anos de
Israel em Canaã – mas não em grande escala).
Os reis não são os únicos caráteres importantes nesses livros. A
figura do profeta que fala e aplica a palavra de Deus para a situação
atual desempenha um papel importante na narrativa. Às vezes, o
cumprimento das palavras do profeta está para acontecer e outras
vezes há gerações entre a proclamação e o cumprimento. Isto sugere
uma perspectiva sofisticada, em que a resposta humana relacionada
com a profecia é tão significante quanto a própria profecia. Escolhas
humanas podem reverter o destino da história – o arrependimento
é uma dessas escolhas. Mas também as escolhas erradas levam a um
cumprimento das profecias. Às vezes, os reis tentam reverter o curso
dos eventos silenciando um profeta ou forçando-o a alterar a sua
mensagem – mas isso não funcionou. A palavra de Deus permaneceu,
enquanto a loucura do rei é comprovada.
Haveria muito para escrever sobre referências extra bíblicas,
sobre questões de datas, sobre o ambiente político e as diversas e
rapidamente mutáveis alianças, sobre a prática religiosa das pessoas
ou sobre a arqueologia e a sociologia da época. Simplesmente não
há espaço suficiente para fazê-lo e gostaria de incentivá-lo a olhar
para alguns destes mesmos assuntos. Há muito para descobrir e sua
apreciação da Bíblia certamente irá crescer e se aprofundar.
Introdução
Objetivos
Plano da unidade
• Exílio
• Pós-exílio
147
Para pensar...
Tenho tentado mostrar como os livros bíblicos tentam
interpretar os acontecimentos políticos. Eu, pessoalmente,
estou muito hesitante para tentar fazer o mesmo para o meu
próprio tempo e época. O que você acha? Podem estes livros
nos ajuda a ver o nosso próprio tempo, de uma perspectiva
divina? Ou podemos avaliar somente épocas mais distantes?
Quais os perigos e dificuldades de uma interpretação teológica
da história “profana”?
1. Situação em Judá
Regime: colônia babilônica
Sistema: tributário
Religião: a adoração a Javé é preservada em círculos
camponeses; não há mais culto centralizado
Situação do povo: vive em condições precárias e
disperso Ezequiel; Lamentações;
Levítico1; Isaías 40-55;
Obadias
2. Situação dos exilados
Vivem em melhores condições dos que ficaram, mas
estão longe da pátria
149
completamente. Havia várias possibilidades. Eles puderam criar um
novo templo para o sacrifício contínuo, mas este não era realmente uma
opção, já que países estrangeiros eram considerados impuros. Outra
opção foi escolhida: o culto centrado na palavra. No início, é preciso
assumir que este culto era principalmente um culto de lamentação.
Ao longo do tempo o tipo de culto da sinagoga foi desenvolvido. Isso
foi muito importante para a continuação da identidade nacional. A
assimilação na grande mistura de nações na Mesopotâmia era um
perigo muito real. Essa nova identidade, no entanto, não foi dirigida
por funcionários religiosos ou políticos, mas sim desenvolvida nas
famílias. Especialmente a celebração das festas judaicas estava agora
concentrada no círculo da família (SASSE, 2004, p. 29–32).
De uma perspectiva mais sociológica, podemos observar
que, na verdade, somente a liderança de Judá deixou o país rumo
a Mesopotâmia durante o exílio. Cerca de um terço da população
original havia morrido durante a guerra devastadora antes da queda de
Jerusalém. O outro terço foi levado cativo, especialmente a liderança,
o sacerdócio e os artesãos mais qualificados. Os camponeses, artesãos
de base, pastores e outras pessoas inferiores na hierarquia social
continuaram na terra, e para muitos deles a vida cotidiana não mudou
muito durante o tempo do exílio. Para ordenar a vida dessas pessoas,
Nabucodonosor instalou Godolias em Mispá ao norte de Jerusalém, um
líder judaico experiente. Ele queria garantir a continuidade da colheita
e, assim, redistribuiu os campos entre as pessoas que ficaram no país.
Isto significou praticamente uma desapropriação da alta sociedade de
Jerusalém. Mas ajudou a manter a estabilidade do terreno para o povo
depois do exílio.
Sistema: tributário
151
Império Pérsico - 490 a.C.
Esta prática pode ter sido a base para permitir que os judeus
voltassem, junto dos seus utensílios do templo, para Jerusalém; e
que pudessem reconstruir o seu templo, como se lê em Esdras. Esta
estratégia estava longe de ser “religiosamente tolerante” em termos
modernos. Foi simplesmente uma estratégia política para controlar os
estados vassalos distantes, e conseguiram: o império persa dominava
todo o território do rio Indo até o rio Danúbio e do Mar Negro até o
Egito.
Aqui vem um resumo dessa época por Issac Agazi, já com
uma visão nos tempos intertestamentários (o tempo entre AT e NT):
“A parte da Palestina onde o povo emigrante se estabeleceu foi
chamada Judéia e seus moradores receberam o nome de judeus.
Povoaram novamente as cidades e obtiveram permissão para
reconstruir o Templo e as muralhas de Jerusalém. A forma de
governo daquele novo Estado foi uma espécie de república
teocrática. O povo vivia tranqüilamente, refazendo-se do
abatimento de que havia sido vítima durante os anos de cativeiro
na Babilônia. No tempo dos selêucidas o povo judeu sofreu
153
dedicavam demasiado tempo à vida mundana, e a dos essênios,
que com seu ascetismo e sua vida contemplativa se esqueciam da
vida humana, de suas necessidades e suas desditas. Os fariseus,
por seguirem a lei oral, foram os iniciadores do vastíssimo
trabalho que se conhece com o nome de Mishná. Não se deve
esquecer que as mais puras doutrinas evangélicas, que são um
compêndio das judias, surgiram não só dos círculos essênios,
como também dos fariseus; e que Jesus mesmo, assim como os
primeiros judeus conversos que se chamaram cristãos, tiveram
relações amistosas com muitos dos fariseus.
Para pensar...
Alguns escritores desta época nunca interpretaram o retorno
do povo para Canaã como retorno do exílio. Qual pode ser a
argumentação deles?
Referências Bibliográficas