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Tanto indígenas quanto quilombolas possuem como pano de fundo das suas realidades a
desigualdade social e de saúde, o que poderia ser amenizado com o cumprimento integral das
políticas públicas existentes, como a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos
indígenas (2002) que possui como diretrizes os seguintes pontos:
● Organizar os serviços de atenção à saúde dos povos indígenas na forma de Distritos
Sanitários Especiais e Pólos-Base, no lugar da atenção primária e dos serviços;
● Desenvolver recursos humanos para atuação em contexto intercultural;
● Fiscalizar as ações de saúde dos indígenas;
● Articular os sistemas tradicionais indígenas de saúde;
● Proporcionar o uso apropriado de medicamentos;
● Promover ações específicas para situações especiais;
● Viabilizar uma pesquisa ética e ações de atenção à saúde envolvendo comunidades
indígenas;
● Possibilitar ambientes saudáveis e proteção da saúde indígena;
● Realizar controle social.
O objetivo dessa política é promover para os indígenas o acesso integral a atenção à
saúde, concordando com as diretrizes do SUS, abrangendo a diversidade sócio-político-
cultural, histórica e geográfica, com o intuito de favorecer a superação de obstáculos, fatores
que promovem a vulnerabilização na saúde, além de reconhecer a eficiência da medicina
indígena (BRASIL, 2002). Apesar de existirem políticas públicas que testificam a
necessidade e a importância a assistência às minorias étnicas, seria uma utopia acreditar que
tais políticas são suficientes ou que são corretamente executadas, porque se elas o fossem, a
determinação social e de saúde não se encontraria no cenário atual, onde indivíduos não
possuem o mesmo acesso à alimentação, a mesma qualidade e acesso a saúde, o mesmo
acesso a políticas públicas, e as mesmas oportunidades de emprego somente por não fazerem
parte da “maioria” da população. A desigualdade existe até mesmo na disponibilidade de
dados demográficos e sobre a saúde da minoria étnica, enquanto encontram-se diversos
inquéritos nutricionais para a população brasileira como um todo desde o ano de 1974, existe
somente um inquérito para os povos indígenas e somente uma chamada nutricional para
quilombolas.
POVOS INDÍGENAS
Atualmente existem mais de duzentas etnias indígenas no território brasileiro que
somam mais de 500 mil pessoas com diferenças socioculturais, incluindo cosmologias,
línguas, formas de subsistência e assentamento, organização social, sistemas políticos,
características nutricionais e entendimentos do que é saúde. Para exemplificar, são mais de
180 línguas faladas em território nacional. (BRASIL, 2009)
Eles representam apenas 1% da população brasileira, ocupando cerca de 15% do
território nacional, com mais ou menos 610 terras circunscritas e algumas demarcadas. E
ainda populações vivendo em áreas urbanas. (BRASIL, 2009)
Durante a colonização e no decorrer dos anos, o contato com o não índio ocorreu de
maneiras diferentes entre os povos indígenas brasileiros exercendo importantes e múltiplas
influências nos determinantes de saúde desses povos. Seja por meio da introdução de novos
patógenos, ocasionando epidemias; tomadas de territórios, que dificultam a aquisição de
alimentação e o sustento do modo de vida; perseguição e morte de indivíduos ou
comunidades inteiras; seja pela introdução do modo de vida capitalista com a necessidade da
aquisição do dinheiro, pela contaminação ambiental e pela crescente urbanização que
circunda as reservas. (CNDSS, 2008.)
Hoje, a tendência de fixar residência junto a postos indígenas ou a diminuição do
território somado a não disponibilidade de infraestrutura sanitária, segundo o Inquérito
Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas verifica são somente 19% dos domicílios
indígenas em todo o país que dispõem de banheiro dentro de casa, sendo que 30,6% dos
respondentes indicaram defecar fora de casa, no “mato”. Ainda a maioria relata o não
tratamento da água consumida e em aproximadamente 80% dos domicílios investigados
enterra-se o lixo nos arredores da aldeia. Tudo isso faz com que as doenças infecciosas e
parasitárias persistam como uma das principais causas de adoecimento e morte,
principalmente entre as crianças indígenas (BRASIL,2009), (COIMBRA, 2014). E essa
incidência prejudica ainda mais o déficit nutricional tendo como consequências uma alta
prevalência de baixo peso para idade e estatura para idade, como podemos verificar na figura
5 a baixa estatura para idade se comparados às crianças brasileiras não indígenas (figura 6),
cujas casas contam com uma cobertura melhor de saneamento básico, cerca de 80% da
população.
Figura 5 - Distribuição das crianças por macrorregião de acordo com a estatura para a idade
pelo padrão OMS.
Fonte: Brasil (2009).
O déficit nutricional mencionado é fruto, além das diarreias e vômitos causadas pelas
doenças, da redução do território das aldeias, com, muitas vezes, sedentarização perto de
postos do governo, transformando a produção e obtenção de alimentos. Antes,
suficientemente obtidos da caça, pesca, cultivo e coleta; agora, com a pressão territorial que
gera a diminuição e o esgotamento da terra e consequente redução das colheitas, torna-se
escasso.
Essa depleção nutricional também causa insuficiências na quantidade de
micronutrientes responsável por doenças, como a anemia cuja prevalência alta (51,2%),
junta-se às outras causas do déficit de estatura e ainda prejudica o dia a dia dessas crianças,
contribuindo na dificuldade de aprendizado e de realizar as atividades normais, como
brincadeiras. (COIMBRA, 2014)
Entre os adultos, uma nova dimensão pouco conhecida de epidemiologia dos povos
indígenas é a emergência de sobrepeso e obesidade e de doenças crônicas não-transmissíveis,
como hipertensão e diabetes mellitus, como consequência da mudança da alimentação, cada
dia mais semelhante à alimentação não indígena e da sedentarização.
A alimentação, desde o contato com o não índio, modificou-se com a entrada de
novas espécies de animais e vegetais e de novas formas de cultivo e, mais recentemente, com
a aquisição comercial e por meio de doações. (LEITE, 2012) Com isso, houve a introdução
de processados e ultraprocessados com grande concentração de calorias e baixa presença de
micronutrientes.
A sedentarização, que ocorreu simultaneamente, foi decorrente das transformações no
modo de subsistência, em que muitos são hoje funcionários das redes de assistência,
professores e no padrão de assentamento que também compromete a alimentação, como já
falado anteriormente, intensificando a entrada de alimentos exógenos.
A consequência pode ser constatada na figura 7 com as características do IMC em
mulheres entre 14 e 49 anos e na figura 8 com os dados de adultos obtidos por meio de
estudos pontuais.
COMUNIDADES QUILOMBOLAS
Segundo historiadores, os grupos quilombolas surgiram devido a necessidade de
sobrevivência física e cultural, além da prevenção de dignidade de homens e mulheres
descendentes de africanos traficados para o Brasil. Esses grupos são designados como
comunidades remanescentes de quilombos.
Além dos quilombos remanescentes do período da escravidão, outros quilombos
foram formados em 1888 após a abolição da escravatura, com o mesmo objetivo de
sobrevivência, pois a Lei Áurea não oferecia nenhuma garantia de patrimônios. Em meio a
miséria, os negros decidiram sair do espaço onde pessoas os consideravam inferiores e
desrespeitavam sua cultura. Várias dessas comunidades ainda existem e são caracterizadas
pelo seu modo de vida num determinado local onde prevalece a coletivização dos bens
materiais e imateriais.
Deste modo, comunidades remanescentes de quilombo são grupos sociais cuja
identidade étnica os distingue do restante da sociedade. (BRASIL, 2004)
Quilombos são grupos populacionais com características étnico-raciais específicas
localizados em diferentes regiões do país, principalmente em áreas rurais, com certo grau de
isolamento geográfico, grandes desigualdades socioeconômicas e acesso restrito a serviços de
saúde (Arruti 2008: 315- 350; Marques 2009: 339-374; Schmitt et al. 2002; Silva 2007: 112;
Silva et al. 2008).
Estima-se que no Brasil existam mais de quatro mil comunidades quilombolas, no
entanto apenas 2.278 são devidamente reconhecidas (CPISP, 2013). Estimativas feitas pelo
Programa Brasil Quilombola apontam que existem mais de 1 milhão de quilombolas no país,
que em sua maioria vivem em áreas rurais, em condição de extrema pobreza, recebem algum
tipo de auxílio do governo federal, como o bolsa família, e possuem pouca ou nenhuma
instrução escolar (LEITE, 2012). São casas com poucos compartimentos, nenhuma água
tratada ou canalizada, além de eliminação inadequada do lixo na natureza ou queima do
mesmo perto de suas residências e a ausência de redes de esgotos, sendo os dejetos expostos
a céu aberto ou em fossas sépticas (Moura, et al. 2014; Santos e Silva, 2014; Pinho et al.,
2015).
De acordo com uma amostra de crianças quilombolas menores de 5 anos de idade
estudada pela Chamada Nutricional Quilombola 2006, foram observados os seguintes
resultados: a prevalência de formas crônicas de desnutrição identificadas pelo registro de
déficits de crescimento (baixa altura para a idade) foi de 11,6%. Déficits de peso para a
altura, que identificam formas agudas de desnutrição, foram raros entre as crianças estudadas,
2,0%, pouco abaixo do limite “normal” de 2,3%, aceito para o indicador. (Brasil, 2006)
(Figura 10)
Ainda sobre a pressão arterial, foi observado que 42,3% apresentam pressão arterial
sistólica com alteração e 51,9% apresentaram pressão arterial diastólica com alteração.
(Figura 13)
CONCLUSÃO
Sabe-se que atualmente a situação de saúde e nutricional de povos indígenas encontra-
se vulnerável à ocorrência de problemas como a desnutrição e obesidade, em grande parte
decorrente de transformações pelas quais esses povos vêm passando desde os primeiros
contatos com não índios. Somado a esse fator, tem-se que ainda há um predomínio de
condições sanitárias inadequadas, contribuindo para uma presença de doenças infecciosas e
parasitárias em níveis mais elevados que aqueles registrados entre não índios. Outro fator
preocupante no que tange a situação de saúde dos povos indígenas é o fato de que não se
dispõe de dados globais fidedignos, mas sim de dados parciais gerados por órgãos como a
Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), entre
outras organizações não governamentais e missões religiosas que aplicam projetos especiais e
prestação de serviços de atenção à saúde desses povos. Contudo, mesmo com a atuação
dessas instituições, não é possível caracterizar de forma satisfatória as condições de saúde dos
povos indígenas no Brasil, levando para uma invisibilidade demográfica e epidemiológica
que recai sobre esses povos levando à sua marginalização e insuficiência de políticas
públicas.
No que tange à situação das comunidades quilombolas, o cenário não se mostra muito
diferente da situação dos povos indígenas com relação às condições de desigualdade que
esses grupos enfrentam quando comparados ao restante da população brasileira em geral,
ficando também vulneráveis a ocorrência de casos de sobrepeso e obesidade, por exemplo. A
maioria dos quilombolas vivem em áreas rurais, em condições de extrema pobreza. Em
muitos dos casos vivem em casas com poucos compartimentos, nenhuma água tratada ou
canalizada, além de condições sanitárias inadequadas com a eliminação do lixo na natureza
ou queima desse próximo às suas residências e a ausência de redes de esgotos. É importante
destacar um fator importante que se faz presente quando se fala em comunidades
quilombolas, o racismo, onde sabe-se que negros têm experiências desiguais ao nascer, viver,
adoecer e morrer, por estarem, em sua maioria, entre as camadas populacionais mais pobres.
O acometimento de doenças crônicas também se mostra agravado nesse aspecto.
Portanto, o ponto chave das discussões acerca do perfil nutricional e estado de saúde
de povos indígenas e de comunidades remanescentes de quilombos é a desigualdade atrelada
à invisibilidade que esses grupos enfrentam, desencadeando um processo de marginalização
dos mesmos e condições precárias de saúde e nutrição. Sem contar na insuficiente
disponibilidade de dados demográficos e epidemiológicos sobre a saúde dessas minorias
étnicas, fazendo com que fiquem limitados o planejamento, a execução e a avaliação das
ações e políticas públicas em saúde desenvolvidas junto a essas comunidades, já que as
existentes mostram-se insuficientes para garantir o acesso à alimentação adequada e aos
serviços de saúde por esses indivíduos.
REFERÊNCIAS:
BRASIL, FUNASA. Política nacional de atenção à saúde dos povos indígenas. [S. l.],
2002. Disponível em
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_saude_indigena.pdf. Acesso em: 19 abr.
2019.
BRASIL. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos. [S. l.],
6 jul. 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-
1994/d0592.htm. Acesso em: 19 abr. 2019.
LEITE, Maurício Soares. Saúde Indígena: uma introdução ao tema. Brasília: Ministério da
Educação, 2012.
MELO, Maíra Fernanda Tavares de; SILVA, Hilton Pereira. Doenças Crônicas e os
Determinantes Sociais da Saúde em Comunidades Quilombolas do Pará, Amazônia, Brasil.
Revista da ABPN, [s. L.], v. 7, n. 16, p.168-189, mar- jun. 2015.
UNIC. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Rio de Janeiro, 2009. Disponível em:
https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf. Acesso em: 19 abr. 2019.