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O tema da aula girou em torno da tônica envolvendo a gênese da Filosofia e seus primeiros
pensadores. A respeito da origem da Filosofia, não há um consenso claro sobre qual civilização
deu origem à Filosofia e esse dissenso envolve uma série de fatores que vão além da disputa por
quem teria sido por exemplo o primeiro filósofo ou a primeira filósofa. Um dos fatores desse
impasse é a questão ideológica eurocêntrica em que a Filosofia teria gênese europeia e por isso a
difusão da Filosofia como sendo um pensamento racional e lógico que superará o pensamento
mítico teria sido originado na Grécia em idos dó século VI a.C..
Por outro lado, há aqueles que defendem que os gregos foram beneficiados pelo intercâmbio
cultural e econômico ocorrido pelas navegações comerciais com povos do oriente e alguns dos
primeiros pensadores, segundo alguns relatos sobreviventes em historiadores como Diógenes
Laércio, teriam empreendido viagens ao Egito antigo e regiões que compreendem o território
indiano e por esses territórios, já se falavam em pensamento filosófico mas como uma sabedoria
de vida, um sistema moral de conduta que séculos depois seria conhecido como Filosofia Prática
ou Ética e esse pensamento filosófico oriental ainda estava associado à uma forte religiosidade,
algo que não foi diferente na Grécia já que o surgimento da Filosofia também está associado à
competição do modo de pensar filosófico com a religião popular que adotava os mitos homéricos
e hesiodianos como fonte de pensar.
Logo, quando pensamos no surgimento da Filosofia, mesmo no contexto grego que os
ocidentalistas defendem ser uma atividade racional e “mental” puramente humana, não dá para
desvincular a influência do Orfismo (seita religiosa que partia dos preceitos do poeta Orfeu) tanto
nos pré-socráticos quanto nos filósofos posteriores à Sócrates. Inclusive, podemos afirmar que a
Filosofia surge como uma alternativa quase religiosa se levarmos em conta que as práticas de
mistério como os Mistérios de Elêusis e de Dioniso eram concorrentes às práticas que não
congregavam com esses mistérios – eis então os filósofos como Pitágoras de Samos e Tales de
Mileto que viviam de modo a não congregarem com as ações vistas nesses rituais religiosos
primando em uma análise da vida em substituição ao aceitar passivo das regras vigentes tanto na
cidade quanto nesses rituais.
Os primeiros filósofos se ocuparam em tentar compreender o funcionamento do Universo a partir
do momento em que os mitos não conseguiam responder de forma lógica como que o mundo se
originou e de que modo que alguns fenômenos ocorriam tais como viver e morrer, fenômenos da
natureza e a inquietante questão o que deu origem a tudo. A Arkhé ou o princípio originário não
teriam fontes nos deuses mas na própria natureza que por sua vez é compreendida não como a
natureza imanente (as arvores, os animais, as planícies) mas como universo cósmico, ou seja,
quando se deduz por exemplo de que a água é o princípio originário, parte-se do pressuposto de
que a água seria responsável por tudo no universo (é eterna porque é causa de si mesma; é perene
porque sempre foi assim e sempre será desse modo e não de outro e é irredutível porque em todas
as coisas, a arkhé está contida da mesma forma em que se encontra na natureza) tal como
responsável tanto pela vida quanto pela morte; Por outro lado, compreende-se que na literatura
grega, as oposições se apresentavam quanto às propriedades de cada elemento (a água enquanto
o úmido; o fogo enquanto quente; o ar enquanto frio e a terra enquanto o seco ao passo de que a
dicotomia entre o quente e o frio se deduzia a oposição entre dois elementos como o hálito quente
que em contato com o ar frio, produz “fumaça”) e no caso da água, poderia se tratar do líquido
que não era necessariamente a água natural mas pelo fato de Tales ser um physiólogo, não poderia
descartar a possibilidade de ser a água “empírica” pois, ela está presente nessa Natureza.
Os pré-socráticos então idealizaram inúmeros argumentos para justificar a origem de todas as
coisas conforme cada um foi elaborando suas ideias a partir da concordância ou divergência com
Tales de Mileto que fora o primeiro a ter essa iniciativa. Assim, Anaximandro (discípulo de Tales)
discordou do mestre e seu discípulo Anaxímenes (todos de Mileto) discordou de Anaximandro.
Houveram outros fora da cidade de Mileto como Parmênides de Eleia, Heráclito de Éfeso,
Xenófanes de Colofon e muitos outros que ora foram discípulos ou mestres de si quanto
concorrentes (cabe a crítica que Heráclito teria feito a Parmênides e vice versa).
Outro ponto é: Teria sido então o mito totalmente esquecido nesse período? Na verdade, o mito
sobreviveu porém perdia força por não resistir ao pensamento lógico já que uma das
características do mito é a descontinuidade das ações narradas cuja a origem explicitasse uma
estrutura lógica e uma narrativa mítica variava de cidade em cidade criando versões que muitas
vezes eram quase locais e não tinham uma unicidade literal ou não seguiam uma lógica. Com o
pensamento racional, é possível universalizar uma estrutura lógica pois ela funcionaria do mesmo
modo em qualquer parte do mundo (como a matemática)
Logo, a explicação da origem do universo passou de uma cosmogonia (explicação a partir da
origem dos deuses) para uma cosmologia (explicação a partir da ordenação cósmica da Natureza
explicada por suas leis, sua estruturação lógica) o que significa que por detrás da realidade, há um
lógos que pode ser compreendido tanto como Discurso (a palavra ou aquilo que denomina as
coisas pela intelecção) quanto Lei universal (a realidade é compreendida pela lógica estruturadora
do universo a partir de suas ações sequenciais que o ser humano não tem poderes de intervir) ou
Haviam pré-socráticos que defendiam a existência de um princípio único (o Uno) enquanto que
outros adotavam múltiplos princípios o que se aproximavam da ideia mais “material” do que
metafísica, o que de uma certa forma, todos os pré-socráticos utilizaram a metafísica como
sustentação para suas teorias. Os filósofos que adotaram múltiplos princípios também são
denominados como filósofos pluralistas.
A Filosofia é dividida didaticamente por 4 períodos. Além do período pré-socrático, temos o
período antropológico (marcado pelos sofistas e Sócrates); período onto-metafísico (sobretudo a
filosofia de Platão e Aristóteles) e o período helenista (compreende o período de domínio
macedônio e o declínio do regime de pólis além do surgimento das escolas estoica, cética,
epicurista e cínica).
Resumo da aula do dia 01/04/2019
Disciplina: História da Filosofia Antiga
Wanderley Costa de Oliveira Professor: Paulo Cesar Delboni
A aula foi direcionada para a continuação do tema anterior, ou seja, a rememoração dos períodos
compreendidos pela Filosofia e a ênfase aqui é o Período Antropológico até o Período
Neoplatônico. A ruptura da tendência fisiocrática se inicia com os sofistas em que a preocupação
não será mais buscar as causas e o que deu origem a todas as coisas mas a preocupação passa a
ser a relação que o Homem estabelece com o seu mundo como citada a frase de Protágoras (“O
Homem é a medida de todas as coisas, das que são pelo que são das que não são pelas que não
são”) que representa o Homem enquanto um fim em si mesmo ao passo de que a medida aqui não
é a proporção pitagórica mas o critério a ser adotado para tudo.
O período antropológico pode então ser compreendido a grosso modo como sendo a Filosofia que
desceu do céu para a terra, ou seja, a preocupação não é mais cosmológica mas ontológica;
Contudo, no caso dos sofistas em especial, tal ontologismo não se aplica dada a defesa dos valores
éticos que são relativos (válidos apenas em um local e não em todo o mundo) e se originam nas
convenções (no nómos) que determinam as leis a partir do costume restritamente local. Sendo
assim, os sofistas ao percorrerem por diversas cidades já que não tinham moradas fixas (eram
itinerantes), perceberam que todos os lugares apresentavam leis muito distintas entre si.
Outro ponto que fora levantado é a diferença entre aquilo que é natural (que não sofre mudanças
e que a ação humana é incapaz de modificar) e o que é convencional (que pode ser modificado
pela ação humana e depende da decisão, da vontade livre do ser humano) e a tentativa de
naturalizar aquilo que é convencional com o intuito de eliminar atritos e diferenças entre os
divergentes.
O grande embate foi travado com Sócrates que os acusava de vendedores de ilusões já que os
sofistas vendiam o conhecimento sobretudo habilidade para falar em público e por meio da
persuasão, conseguir aquilo que fosse desejado pelas vias pragmáticas, ou seja, os sofistas
ensinavam como fazer e Sócrates “ensinava” o que fazer. Para Sócrates, o conhecimento é
inalienável e por isso, a tentativa por exemplo de sistematizar o conhecimento ou registrar por
escrito é uma tentativa de alienar a Sabedoria e aprisionar o saber quando na verdade, Sócrates
defendia o ensino do conhecimento pelo diálogo oral sem nada escrever dele.
Depois de Sócrates, Platão e Aristóteles definirão o rumo da Filosofia rompendo com essa
perspectiva oralista socrática, ou seja, a Filosofia passa a ser sistematizada e estruturada como
uma disciplina. Nesse sentido, partirá de Platão e Aristóteles os primeiros escritos de um sistema
filosófico cuja a característica estará marcada pela fundação das primeiras escolas em espaços
públicos (primeiro a Academia de Platão; em seguida o Liceu de Aristóteles)
Um detalhe nos chama a atenção é o estilo literário das obras que sobreviveram desses dois
filósofos: Os diálogos exotéricos (voltados para o público geral e escrito em forma de diálogo
para “ajudar” a compreensão das teorias) de Platão sobreviveram mas seus textos esotéricos
(voltados unicamente para os “iniciados” e proibidos de saírem da Academia) não sobraram
nenhum; Por outro lado, com Aristóteles ocorreu o contrário: os textos exotéricos não sobraram
nenhum mas os que chegaram até nós foram os textos esotéricos (que muitas das vezes eram
escritos pelos alunos de Aristóteles) com uma didática mais explicativa do que os diálogos
platônicos.
Outro detalhe é a ênfase que Platão e Aristóteles deram à vida em sociedade (especificamente nas
pólis): Ambos partiam da ideia que o ideal de vida paira na esfera política, ou seja, a pólis era
suficiente para garantir o bem estar do indivíduo quando ele se tornava íntegro (fazendo parte da
pólis) à coletividade.
Ocorre que em virtude da turbulência sócio-política vivida na Grécia tais como guerras, conflitos,
as tomadas de Alexandre, o Grande e dos romanos no século I a.C., o regime de pólis sucumbiu
dando lugar às filosofias que primavam pelo individualismo e o apoliticismo: O Epicurismo, o
Estoicismo, o Cinismo, o Ceticismo e com o intercâmbio das culturas grega e romana, surge no
contexto romano o Ecletismo cuja a característica é a “soma” das ideias estoicas nos filósofos
romanos (Estoicismo Imperial).
Resumo da aula do dia 08/04/2019
Disciplina: História da Filosofia Antiga
Wanderley Costa de Oliveira Professor: Paulo Cesar Delboni
Os temas abordados na aula foram a retomada dos conteúdos da aula passada sobre a arkhé e os
motivos que levaram Tales de Mileto a acreditar na água como o princípio originário de todas as
coisas. Além disso, há alguns elementos comuns na Filosofia pré-socrática tais como o Panteísmo
(Deus é tudo, é todas as coisas, está em todas as coisas e tudo é Deus), o Hilozoísmo (a matéria
viva ou a manifestação imanente do princípio) e o cosmologismo (que pode ser tanto o monismo
quanto o pluralismo enquanto arkhé, ou seja, todos os pré-socráticos defendiam tanto a existência
de um princípio apenas – o monismo – quanto dois ou vários – o pluralismo – enquanto princípio
originário de todas as coisas.
Além disso, no caso da Arkhé de Tales, esse raciocínio implicaria por exemplo em uma
subordinação direta dos elementos naturais fogo, terra e ar à água, ou seja, sendo a água o
elemento que prevaleceria sobre os demais elementos, não haveria a harmonia entre os contrários
e sim um desequilíbrio natural dos elementos no caso de se pensar uma Justiça derivada das leis
naturais que garantiria o equilíbrio de todos os 4 elementos juntos.
Então, rejeitando a teoria de Tales em que a água não poderia ser a origem de todas as coisas,
Anaximandro atribui então a existência de uma lei natural da qual duas esferas no infinito (nesse
caso, no chaos) foram atraídas por si em um movimento que culminou no choque entre elas pela
necessidade (o ananké). Tanto que há em Anaximandro a rejeição à recorrência à explicação
mitológica como fizera Tales mas Anaximandro não fugiu da influência religiosa do Orfismo
principalmente ao conceito de culpa original que o filósofo usará como razão de separação dos
opostos na sua cosmogênese.
O ápeiron atua por necessidade envolvendo (circundando) e regendo o movimento ao qual todas
as coisas estão sujeitas de modo a compreender-se nesse sentido como se do indeterminado
surgem as coisas e como pelo indeterminado, as coisas desaparecem em um movimento cíclico
que o próprio indeterminado atua na criação, aparição e destruição das coisas. Além disso, a ação
do ápeiron é por si só regente de uma lei natural. No caso das leis da natureza, os opostos
subsistem de modo que um inevitavelmente dá lugar ao outro pois apenas a garantia de um implica
na existência do outro em uma alternância.
Os opostos se relacionam de modo que quando um dá lugar ao outro em uma cadeia eterna
iniciada no princípio dos tempos quando de uma única substância (o ápeiron), surgiram as forças
opostas entre si quente e frio, deduz-se então que “a rotação constante das substâncias opostas é
explicada por uma transferência justa, inspirada pela sociedade humana: a superioridade de uma
substância à custa de sua contraparte é "injustiça", seguida pelo transe do "culpado".
Em relação à chamada culpa original que fez os opostos serem criados no ápeiron, Anaximandro
não explicou (ou se explicou, não sobreviveu sua obra) de onde se originaria e essa culpa e porquê
seria a culpa mas foi ela a responsável pela chamada luta entre os opostos, ou seja, a razão que
faz dos opostos “superarem” um ao outro.
Enquanto discípulo direto de Anaximandro, Anaxímenes de Mileto desenvolverá sua Filosofia
naturalista mais próxima das práticas empíricas, ou seja, ele será o primeiro filósofo a se afastar
ainda mais da perspectiva religiosa e mitológica que estavam presentes em Tales e Anaximandro
porém não se desvencilhou por exemplo do Orfismo. Aqui, se trata de um Monismo corpóreo ao
contrário de Anaximandro cuja a tese defendida de que o ápeiron é a Arkhé é manifesta por um
Monismo incorpóreo.
Para Anaxímenes, o princípio originário de todas as coisas – a Arkhé é o ar, a névoa, ou o “sopro”
(pneuma). O ar representa a vida e dele, todos os seres vivos necessitam para se manterem vivos;
Além disso, Anaxímenes deduz ser o ar a arkhé por melhor representar a infinitude ou mesmo até
sua divindade.
Anaxímenes não foge à caraterística da Escola de Mileto mas há nele uma certa originalidade:
Mesmo tendo uma mínima influência órfica, a dedução de Anaxímenes foi empírica nos moldes
de experimentação, ou seja, o raciocínio adotado pelo filósofo foi derivado pela experiência
embora sendo uma espécie de senso comum.
Quanto mais o ar for “soprado”, haverá o processo de condensação que será o oposto do ar que
for menos “soprado” (o processo de rarefação). Em outras palavras, exemplos como o fogo que
pode surgir do ar rarefeito e que a água pode surgir do ar condensado quando este esfria.
Resumo da aula do dia 15/04/2019
Disciplina: História da Filosofia Antiga
Wanderley Costa de Oliveira Professor: Paulo Cesar Delboni
O fato de Empédocles ter sido médico faz com que não apenas sua filosofia mas a compreensão
cosmológica sofra mudanças desde Xenófanes, o primeiro pré-socrático a adotar enquanto arkhé
mais de um elemento. Eis então o motivo do qual Empédocles é o filósofo “fundador” da Escola
Pluralista. O Ser bem como Parmênides desejava, não pode ser Uno nessas condições pelo fato
de ser um paradoxo admitir a empiria da eternidade ou que as coisas são indestrutíveis ou
imutáveis negando até mesmo o estado atual que cada coisa se dispõe. Parmênides admitia a
supremacia do Ser sobre o mundo sensível, pelo menos no caso da medicina, aceitar a proposta
parmenídica seria negar a própria prática médica pois se há um Ser em todas as condições
inerentes a ele, o não-ser também pode afetar sobre esse Ser. Uma vez que o não-ser provoca a
mudança de estado do Ser na alternância entre o Ser e o não-ser, a doença será o fenômeno do
não-ser manifestado conforme sua patologia e a admissão da unicidade, é ao mesmo a negação
da pluralidade e a desvinculação da realidade empírica ao qual o médico se depara.
Por outro lado, a proposta de Empédocles acabou por criar um próprio princípio único, uma
espécie de paralelismo cosmológico entre o ser humano e a physis de tal modo que Natureza e ser
humano são guiados pelo mesmo princípio esférico que é Uno mas se apresenta nos 4 elementos
simultaneamente, ou seja, A arkhé de Empédocles serão as raízes (rizomatas) cujos rizomatas
representam os 4 elementos fogo, terra, ar e água. Há o Ser, não como o Ser de Parmênides (vazio
interiormente), mas segundo Empédocles, no interior deste Ser, reúnem-se os 4 elementos todos
juntos, ou seja, na pluralidade dos seres, há os 4 elementos atuando simultaneamente e também
simultaneamente, esse Ser esférico com os elementos presentes na natureza foram responsáveis
pela origem de todas as coisas o que por sinal, mantêm a qualidade das arkhés jônicas, ou seja,
imutáveis e inalteráveis qualitativamente mas não mantém o caráter monista.
Temos então na doutrina de Empédocles a ação de duas energias corpóreas, duas forças cósmicas
que são antagônicas entre si e além de serem as responsáveis pelo devir no cosmos, de moverem
o mundo, elas sincronizarão os rizomas de modo compor ou decompor; unir ou desunir todas as
coisas: São o amor e o ódio.
Sob efeito do amor, as coisas são formadas porque os 4 elementos são atraídos, ou seja, cada um
dos elementos são atraídos; esse fenômeno é entendido como o nascimento ou a mistura dos 4
elementos reunidos em um “corpo” só. Quando está sob efeito do ódio, os 4 elementos se
dissolvem voltando para o estado originário de cada elemento, ou seja, os elementos se dispersam
e retornam para a natureza; esse fenômeno é entendido como a morte ou a dissolução, separação
e dispersão dos elementos. Como dissemos anteriormente, Empédocles é influenciado também
pela mitologia na formulação de sua filosofia.
No entanto, se cada semente contém nela não somente os elementos mas os opostos e tudo que
dela pode surgir, uma vez que as sementes são originadas, resta-nos responder duas perguntas
sendo que a primeira delas será também uma das objeções de Zenão de Eleia: Como as sementes
se multiplicam? Quem é responsável por agregar e desagregar tais sementes? O Noûs será o
responsável pelo movimento de agregar e desagregar as sementes e a multiplicação das sementes
se dá (ou se deu) no movimento “dialético” entre os contrários em uma semente originária
chamada magma, ou seja, o Cosmos tivera origem quando no interior desse magma, atuaram duas
forças (energias): a primeira força foi a de exteriorização do qual os opostos dilataram o magma
ao ponto de se separarem do magma inicial; a segunda força foi a de interiorização que ao unir as
sementes contendo os opostos que estavam no magma inicial, foram constituindo todas as coisas
por conta do Noûs que agregou-nas.
Sendo assim, as sementes são como o Ser de Parmêmides nas condições de perenidade,
incorruptibilidade, imutabilidade e até mesmo de imobilidade já que as sementes por si mesmas
não se movem mas sendo o Noûs então é uma intuição “empírica”, ao Noûs não é possível aplicar
as categorias de imaterial e espiritual uma vez que Anaxágoras não rompeu com a perspectiva
materialista mesmo admitindo uma Inteligência Suprema que atua sobre as sementes no processo
de agregação e desagregação das coisas. Nesse caso, a proposta de Anaxágoras seguiu a tendência
de admissão enquanto arkhé dos elementos primordiais que já existiam e se apresentavam na
Natureza, na physis.
A proposta de Anaxágoras em definir o Noûs como uma Inteligência que organiza, alocando todas
as coisas parece ter resolvido alguns problemas que foram deixados por seus antecessores e que
ainda não tinham soluções. Contudo, nenhum outro pré-socrático antes de Anaxágoras havia
intuído a ação de uma Inteligência e tampouco se aproximaram dessa solução, mesmo que o
filósofo de Clazômenas não superou o materialismo dominante do período.
Por fim, compreende-se que a ideia do Noûs, diferente das outras concepções pré-socráticas, não
participa do processo de separação e mistura mantendo-se isolado no interior de todas as coisas
promovendo o movimento de exteriorização, ou seja, na criação do Cosmos e por sua vez, de
todas as coisas, o Noûs será a força inteligente que somente introduz. Dessa forma, as sementes
assumem as mesmas características de uma arkhé pré-socrática (imutáveis, únicas, incorruptíveis,
indestrutíveis e perenes) mas ao invés delas gerarem o movimento de criação de todas as coisas,
são elas que se movem em razão do Noûs que tem também as mesmas características de uma
arkhé.
Contudo, os equívocos ou as aporias de Anaxágoras serão corrigidas por Platão e Aristóteles com
base nos conceitos de “Motor Imóvel” (no caso de Aristóteles no Livro XII da “Metafísica”) e na
metáfora da “Segunda Navegação” (no caso de Platão no diálogo “Fédon”).
Resumo da aula do dia 26/04/2019
Disciplina: História da Filosofia Antiga
Wanderley Costa de Oliveira Professor: Paulo Cesar Delboni
A iniciar a apresentação de um outro filósofo pré-socrático, este fora Zenão de Eleia. Discípulo
direto de Parmênides e exceção em meio aos pré-socráticos pluralistas, Zenão de Eleia será um
ferrenho defensor da Unicidade do Ser ao mesmo tempo que ele mesmo tentará resolver as aporias
deixadas por seu mestre. Ao mesmo tempo que Zenão contra-atacava os inimigos de Parmênides,
ele acabou por criar um novo método: a Dialética. A Dialética de Zenão é muito diferente da
Dialética encontrada em Heráclito, pois, em Heráclito, os contrários (o ser e o não-ser) se alternam
em um devir constante de modo que os contrários se harmonizam a medida com que um dá lugar
ao outro, ou seja, a alternância entre o ser e o não-ser é que garante o movimento dialético. Em
Zenão, a dialética passou a ser uma poderosa ferramenta de argumentação ao qual visa por meio
de perguntas e respostas evidenciar as falácias discursivas que envolvem os argumentos a serem
combatidos.
Os famosos paradoxos de Zenão (4 argumentos em favor da tese imobilista do Ser) podem ser
entendidos da seguinte forma:
A respeito de Demócrito, podemos dizer que ele fora discípulo de Leucipo além de ter sido ele o
filósofo que mais desenvolveu a teoria de seu mestre. Para ambos, a arkhé será o átomo e com
eles também inicia-se a Escola Atomista que terá influência em filósofos contemporâneos como
Bertrand Russell e Ludwig Wittgenstein no século XX. O átomo nesse contexto não é o mesmo
que vemos na Química com prótons, nêutrons e elétrons distribuídos em núcleo (prótons e
nêutrons) e camadas eletrônicas (elétrons) mas a teoria atomista será aquela que também resgatará
a cosmologia naturalista frente ao Eleatismo que começava a ganhar mais força pelos trabalhos
de Zenão de Eleia e Melisso de Samos.
Isso não quer dizer que o Eleatismo fosse um “inimigo” invencível e que a Escola Eleata fosse de
tal excelência ao ponto de não deixar qualquer controvérsia, pelo contrário, não só tinha como os
filósofos atomistas notaram que haviam controvérsias ontológicas eleatas a serem exploradas e
também o Eleatismo explorava tanto a física jônica quanto o hilozoísmo como sendo duas
correntes que já estavam chegando ao seu limite e estavam sendo esgotadas de tal modo que os
problemas já não poderiam ser resolvidos por essas correntes justamente porque a própria
controvérsia eleata já era um problema.
Mas o fato de Demócrito ter resgatado (ou pelo menos tentou fazer isso) a cosmologia materialista
diante do Eleatismo não fez dele um adversário por exemplo de Parmênides. Demócrito por
exemplo negou a supremacia dos sentidos como sendo fontes confiáveis do conhecimento de
modo que ao discordar de Heráclito, Demócrito reforçou as ideias de Empédocles e Anaxágoras
quando ao nascer e o perecer de todas as coisas derivados do movimento de articulação e
desarticulação dos átomos, ou seja, quando as coisas nascem, os átomos se agregam e quando as
coisas perecem ou morrem, os átomos se desagregam. Também reforçou as ideias de Heráclito
quanto à sua rejeição à doxa e ao conhecimento superficial que o senso comum propagava.
Podemos dizer a grosso modo que o materialismo de Demócrito não é uma espécie de indutivismo
ingênuo, até porque, embora afirme que “tudo é átomo”, a teoria do átomo não deixa de ter raízes
no imaterialismo já que ele é invisível e só pode ser visto pelo pensamento, pela inteligência.
Nessas condições, Demócrito não se difere de Parmênides e Heráclito que eram inimigos da
opinião (da doxa). Mas temos um problema: Se os sentidos não são confiáveis pois a realidade
não pode ser conhecida pelos sentidos, como Demócrito argumentará em favor dos átomos?
A primeira hipótese é a de que os átomos, necessariamente, são acessíveis pelo intelecto pois essa
característica de invisibilidade e pelo fato do átomo ser indivisível e incorruptível. A segunda
hipótese é a admissão da existência do vazio (do não-ser) e ao passo de que se admite então o
vazio como o não-ser, temos um outro problema: De que modo os átomos estariam em interação
com o nascer e o morrer das coisas? Demócrito dirá pois que os átomos sendo imortais, eles
estariam o tempo todo na Natureza, sendo portanto, incriado e infindável. Mas o que aconteceria
com as coisas aos quais são formadas pelos próprios átomos?
Demócrito adota o mesmo modo que Empédocles e Anaxágoras quanto à explicação do devir das
coisas no mundo sensível, ou seja, as coisas nascem e morrem; surgem, deixam de existir e se
transformam em outras coisas mas os átomos continuam os mesmos em um processo de
articulação e desarticulação dos átomos em que há o movimento dos mesmos no vazio de forma
mecanicista. Desse modo, Demócrito não aceita a tese de Anaxágoras em que haja por detrás do
movimento uma Inteligência Suprema (daí o caráter “ateu” do atomismo) mas que os átomos se
agregam e se desagregam pelo movimento do acaso.
A admissão da existência do vazio ou a possibilidade de que o vazio pudesse ser o “não-ser” fez
com que houvesse uma reviravolta entre os filósofos naturalistas. As doutrinas de Empédocles e
Anaxágoras não estavam sendo compreendidas pelo fato de que os rizomas (as raízes presentes
nos 4 elementos) e as homeomerias (sementes) eram responsáveis pelo surgimento e
desaparecimento das coisas mas que esses movimentos, na verdade, não estavam justificados a
respeito do lugar ao qual fosse possível o movimento.
Tanto os rizomas quanto as homeomerias, a grosso modo, eram imutáveis e compreendidas por
meio das qualidades sensíveis do Ser, ou seja, ambos buscaram aquilo que os eleatas ignoraram
mas Leucipo e Demócrito questionam justamente como que há o movimento de agrupamento e
desagrupamento das coisas se os rizomas e as homeomerias não tem lugar nenhum para se
moverem (uma espécie de movimento sem um vazio)
O erro de Empédocles e Anaxágoras foi não se atentarem para o vazio e não admitirem a
possibilidade do vazio também ser uma realidade de mesmo patamar do Ser já que esse raciocínio
também salvaria o argumento do Ser já que o argumento eleata não conseguiria explicar como
que algo imóvel poderia gerar a realidade das coisas e apenas admitindo a possibilidade de haver
o vazio (ou o nada) daria ao Ser um lugar para ele se alocar, literalmente.
Logo, Demócrito fez com que o vazio se tornasse o próprio espaço de mesmo patamar que o
Cosmos de tal modo com que os átomos se movimentavam pela necessidade dentro de um espaço
em que só a inteligência pode visualizá-los. Esse movimento não é o Noûs mas o acaso que faz
dos átomos auto-moventes. Se há o vazio, o que há então entre os átomos mesmo na condição de
agregados? Também há o vazio, um vácuo entre um átomo e outro que permite-o se movimentar
tanto do exterior para o interior e vice-versa.
Temos então a conclusão de que os átomos fazem parte de uma estrutura criada por eles mesmos
e que chamamos de coisas existentes no mundo. Para concluirmos, os átomos, segundo Demócrito
se movem pela necessidade de modo que esse movimento é inevitável e voluntário, ou seja, o
vazio e a necessidade são propulsores dos átomos no devir (mudança).