A CONTRIBUIÇÃO DOS CLÁSSICOS PARA A SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO
Karl Heinrich Marx (1818 - 1883).
Nascido em 05 de maio de 1818 na pequena cidade de Trêves na
Alemanha, de família burguesa de origem judaica e convertida ao protestantismo luterano, doutorou-se em Filosofia em 1841 pela Universidade de Berlim com a tese sobre o materialismo de Heráclito Parménides. Por motivos políticos mudou-se para França, Bélgica e Inglaterra, onde veio a falecer em 1883. Para Marx, os modos de produção ajudam a entender a sociedade e, por conseguinte a religião. No discurso marxiano, a religião exerce a função de controle social dentro da sociedade burguesa, e a mesma religião desapareceria no próprio desenvolvimento do processo histórico; para Marx a religião é uma realidade histórica dependente do desenvolvimento das condições materiais de vida e da consciência dos indivíduos. Na análise marxista há questões que sobressaem pela sua relevância, são elas: alienação, dominação e conflito. Portanto, a crítica marxista à religião consiste em base filosófica e política. A religião é vista na perspectiva de Marx como elemento legitimador das relações de dominação, nas quais o dominado é mantido sobre controle advindo da religião. Mesmo a análise da religião sendo secundária na crítica marxista, a mesma não é vista como realidade sui generis, mas sim, o resultado de condições sociais determinadas, o que consistiria em vê-la como o "ópio do povo". O próprio Marx nos afirma que a "... angústia religiosa é, por um lado, a expressão da angústia real e, por outro, o protesto contra a angústia real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, a alma de um mundo sem coração, tal como é o espírito de condições sociais, de que o espírito está excluído, Ela é o opium do povo." Nesta perspectiva a verdade dada é que os vetores da emancipação do povo encontram-se arraigados nas expressões religiosas. Religião para Marx era essencialmente o produto de uma sociedade de classes. Suas ideias sobre religião são parte de sua teoria geral da alienação em sociedades divididas por classes. Religião é vista tanto como um produto de alienação e uma expressão dos interesses de classes. Ela é ao mesmo tempo uma ferramenta para manipulação e opressão das classes subordinadas da sociedade, como uma expressão de protesto contra opressão e uma forma de resignação e consolação em face da opressão.
Karl Emil Maximilian Weber (1864 -1920).
Alemão, nascido em 21 de abril de 1864 na cidade de Erfurt. Filho
primogênito de uma família próspera da burguesia têxtil. Em 1889, doutorou-se em Direito na Universidade de Göttingen. Morreu abruptamente aos 56 anos em 14 de junho de 1920 vítima de pneumonia. Weber concebe a religião como chave de interpretação para o entendimento da cultura, o que a faz constituir-se em uma janela de entrada para a compreensão da formação cultural do Ocidente e Oriente. Desta maneira, Weber aponta a religião (o protestantismo) como sendo um elemento causal preponderante na ética econômica do capitalismo europeu. Ele estava menos preocupado com a explicação da religião per se do que com as conexões entre os diferentes tipos de religião e de grupos sociais específicos e com o impacto de vários tipos de perspectivas religiosas sobre outros aspectos da vida social e em particular sobre o comportamento econômico. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo figura entre as principais obras, pois, neste ensaio histórico-sociológico ele buscou atrelar a economia capitalista ao conteúdo doutrinal do protestantismo, que por caracterizar-se por uma racionalidade especifica lançou bases para a noção de trabalho como vocação e ascese intramundana gerada no calvinismo. Trata-se, nesse caso "... do exemplo das relações entre o moderno éthos econômico e a ética racional do protestantismo ascético" (WEBER, 1989, p.12). A noção de tipos ideais de autoridade religiosa construída por Weber introduziu no estudo das ciências sociais a questão da legitimidade do poder social. Um tipo ideal é a seleção arbitrária das características de um fenômeno a partir de inúmeras qualidades presentes na realidade, sem nenhuma tentativa de colocá-lo em uma relação superordenada.
Desta maneira, para a sociologia weberiana pode-se afirmar em poucas palavras
que a motivação para obediência, cumprimento de uma determinada ordem e legitimidade do conteúdo pode decorrer da tradição, legalidade ou carisma, tipos ideais de dominação. Pelo estudo que Weber fez acerca da religião pode-se considerá-la como mais que um sistema de crenças e dependendo do momento histórico, do contexto social e dos valores culturais vigentes, haverá configurações diversas do religioso.
David Émile Durkheim (1858-1917).
Nasceu em 15 de abril de 1858 em Épinal noroeste da França, filho de pais
judeus optou por não seguir o rabinato, como era costume na família. Formou-se em Filosofia em 1882, e depois de haver lecionado na Universidade de Bordeaux tornou-se professor na conceituada Universidade de Sorbonne. Morreu no dia 15 de novembro 1917, um ano após a morte do filho no front da primeira Guerra Mundial. A obra As formas elementares da vida religiosa explicitam de maneira bem exaustiva e acabada a visão do social como também a proposta de sociologia do conhecimento sistematizada por Durkheim. Ao fazer uma crítica às teorias que lhe são contemporâneas, Durkheim busca uma definição para o seu objeto de estudo e o faz ao dizer que a sociedade "é uma realidade transcendente, dotada de autoridade moral sobre o indivíduo e, ao mesmo tempo, capaz de elevá-lo além de si mesmo; depois, reconhece no sagrado a própria sociedade em forma simbólica" (MARTELLI, 1995, p. 67). Dessa maneira, o interesse de Durkheim pela religião funda-se na busca por remontar as fontes de ligação social com vistas à uma refundação dessa ligação em uma sociedade laicizada. Ao estudar o sistema totêmico de tribos aborígenes australianas, Durkheim anunciava que o propósito do estudo ao olhar a religião mais primitiva e simples segundo ele o totemismo era caracterizar a natureza da religião e definir seu objeto de estudo. Para tanto, no capitulo I de tal obra ele discute o conceito de religião como também explicita os seus métodos de estudo.
As conclusões de Durkheim são interessantes, especialmente quando
afirma que a religião não é simplesmente um sistema de crenças e concepções, mas uma força coletiva da sociedade representada nas significações dos indivíduos. Ao salientar claramente a origem social da noção de sagrado, o que se entende é que desta maneira a realidade pode ser percebida com duas naturezas radicalmente diferentes, em outras palavras, dividida entre o sagrado e o profano.
O próprio Durkheim escreve o seguinte: "... temos a impressão que nos
relacionamos com duas espécies de realidades distintas, e que uma linha de demarcação claramente estabelecida separa uma da outra; de um lado, o mundo das coisas profanas, e do outro, o das coisas sagradas" (DURKHEIM, 1989, p. 267).
O sentimento do sagrado suscitado no culto e ritual é na verdade é uma
força externa que o crente experimenta, ou seja, a experiência das forças coletivas. As representações coletivas atribuem muitas vezes às coisas as quais se referem propriedades que aí não existem sob nenhuma forma e em nenhum grau. Do objeto mais vulgar, podem fazer um ser sagrado e forte. Entretanto, ainda que puramente ideais, os poderes que lhe são assim conferidos agem como se fossem reais; determinam a conduta do homem com a mesma necessidade que forças físicas (DURKHEIM, 1989, p. 284).
Para Durkheim a integração e coesão social são asseguradas pela religião
que alimenta normas e valores fundamentais à vida em comum e os consolida na consciência dos indivíduos, ao mesmo tempo em que a sociedade sustém a religião ao oferecer-lhes os símbolos religiosos que advém da sacralização de sentimentos morais existentes em uma dada sociedade. Dessa forma há entre a religião e a sociedade o que Martelli (1995, p.68) denomina de sinergia: ... de um lado, as crenças religiosas sacralizam as normas de comportamentos vigentes, fornecendo-lhes uma legitimação definitiva e inapelável, que favorece o autocontrole dos indivíduos e a adoção de medidas repressivas contra os que se desviam. Além disso, os ritos suscitam e exprimem atitudes que reforçam o temor e o respeito para tais normas: desse modo, a religião fornece uma sólida base para o controle social das tendências desviantes, sublimando os impulsos perigosos para a estabilidade da sociedade. Assim o que se percebe é que na fase final dessa obra sociológica, Durkheim impacta-se por uma religião que a saber, é uma religião que consagra ritualmente e reatualiza psicologicamente a coesão do grupo humano. Durkheim afirma que "a força religiosa é apenas o sentimento que a coletividade inspira a seus membros, mas projetado fora das consciências que o experimentam, e objetivado" (DURKHEIM, 1989, p. 285).