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C O N H E C I M E N TO E I M PAC TO E M G E S TÃO
w w w. fg v. b r / g v e x e c u t i v o
VO L U M E 1 6 - N Ú M E RO 2 -M A RÇ O / A B RI L 2 0 1 7
Especial
TECNOLOGIA LÍDERES DIGITAIS | INTERNET DAS COISAS | CIDADES
00162
R$30,00
INTELIGENTES | STARTUPS E CROWDSOURCING
9 771806 897002
| DINHEIRO ELETRÔNICO | BLOCKCHAIN | RELAÇÕES
FGV-EAESP
ISSN 1806-8979
VOLUME 16, NÚMERO 2
NA ERA DIGITAL | GERAÇÃO DE VALOR DA TI
MARÇO/ABRIL 2017
| EDITORIAL
INÍCIO DE UMA
ERA DISRUPTIVA
D
esde os livros de Júlio Verne e Isaac Asimov, com impactos que vão além do cotidiano das pessoas e
passando pelo filme clássico de Stanley Ku- das cidades.
brick 2001: Uma Odisseia no Espaço e pe- Alberto Luiz Albertin e Rosa Albertin discutem a Inter-
los desenhos de Os Jetsons, temos visões net das Coisas, que permite a integração de dados obtidos
(de bem-estar ou medo) sobre o que o futuro por sensores nos objetos. É quase impossível pensar na
nos reserva com o avanço tecnológico. No abrangência que essas conexões permitem. Entre os exem-
entanto, tais tecnologias não estão mais no futuro; elas
plos, Fabio Faria, diretor de Tecnologia de Informação da
dirigem o nosso presente. Emblemáticos são os exem-
Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), mostra como
plos do software Watson, da IBM, que está modificando
sensores em caminhões modificam empresas de minera-
completamente a forma de diagnosticar doenças; e das
impressoras 3D, já utilizadas na produção de bens por ção, e Luzia Valéria Sarno, da Copersucar, ressalta a im-
muitas empresas. portância da automação no agronegócio. Ainda nessa te-
Nesta edição especial sobre Tecnologia de Informação mática, Rodrigo Fernandes Malaquias destaca o impacto
(TI), apresentamos artigos que mostram alguns aspectos da Internet das Coisas na gestão pública, especialmen-
dessa transformação em empresas públicas e privadas, te nas cidades inteligentes, e Cid Torquato, Secretário
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A internet das coisas irá Em conexão
muito além das coisas com os cidadãos
Alberto Luiz Albertin e Rodrigo Fernandes Malaquias
Rosa Maria de Moura Albertin
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Líderes da As relações
transformação digital na era digital
Eduardo de Rezende Francisco, Agenor Leão
José Luiz Kugler e Cláudio Luis
Carvalho Larieira
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Um caminho
aberto à inovação
Marta de Campos Maia e
Italo Flammia
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Uma bússola
para os investimentos
Fernando S. Meirelles
6
42 Em busca de um novo modelo
Adriana Wilner e Aline Lilian dos Santos
O futuro do
dinheiro eletrônico
Adrian Kemmer Cernev COLUNAS
52 FORA DA CAIXA
O medo paralisa atitudes e esvazia os bolsos -
Samy Dana
53 ECONOMIA
Protecionismo, dívida pública e retomada do
crescimento - Paulo Sandroni
54 SUSTENTABILIDADE
46 Obra de Deus - Mario Monzoni
U
ma placa com a expressão Stop kvetching, de origem ídiche e tra-
duzida como Deixe de mimimi, prepara quem entra na sala de reu-
niões da Livraria Cultura, em São Paulo, para a chegada de seu
CEO, Sergio Herz. O filho primogênito de Pedro Herz, Presidente
do Conselho de Administração da empresa, define-se como um lí-
der que não está em sua posição “para agradar às pessoas” e conta
que o pai o considera “incendiário”.
Na Cultura, começou como estoquista, aos 16 anos, em 1987, quando a em-
presa fundada pela avó, Eva Herz, possuía apenas a loja do Conjunto Nacional,
na Avenida Paulista, e contava com menos de 40 funcionários. Apaixonou-se
pelo negócio da família, desistiu de ser médico e, fora um breve estágio no gru-
po editorial Penguin (Inglaterra), sempre trabalhou na Livraria.
Suas principais inspirações vêm de duas experiências pessoais: o ano de
Exército, no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva de São Paulo (CPOR/
SP), em que aprendeu “o poder da disciplina e da perseverança”, e os três me-
ses de trabalho em um kibutz, em Israel, onde conviveu com pessoas de vários
países e pôde “abrir a cabeça”.
Desde 2009 no comando da empresa ─ que hoje possui 18 lojas, além da
operação on-line, e conta com aproximadamente 1.500 colaboradores ─,
Sergio enfrenta duas crises: a conjuntural, que atinge o país, e a estrutural,
com as transformações que a internet vem provocando no segmento de livra-
rias. Diante disso, seus planos são dobrar as vendas on-line em cinco anos e
ganhar nas lojas físicas com a prestação de serviços, além de operar com uma
marca própria de restaurantes e cafés na Cultura, como revela nesta entrevista
exclusiva à GV-executivo.
GV-executivo: O setor de livrarias so- GV-executivo: Em quais outras fon- em preço. Levamos a precificação
freu queda de 16,5% no faturamen- tes de receita estão investindo? dinâmica da internet para as lojas,
to em 2016; a Livraria Cultura, de Sergio: Serviços, de galeria de arte a que conseguem mudar o valor dos
8,0%. Como estão lidando com essa restaurante, como temos no Shopping produtos a qualquer hora, conside-
situação? Iguatemi. Sabe aquelas métricas: ven- rando cada tipo de cliente. Não faz
Sergio: Estamos ganhando market da por metro quadrado, rentabilidade...? sentido dar desconto na Cultura do
share, mas o mercado está encolhendo. Esquece. No varejo não cabe mais. Qual Iguatemi, onde a maioria não se in-
O varejo passa por um movimento dis- é o nosso modelo de loja hoje? Entregar teressa por preço, diferentemente de
ruptivo, em que ninguém precisa mais experiência e achar fontes de receita que quem está no shopping da Pompeia.
ir à loja física para comprar algo. Com não dependam da venda de mercado- É outro público. Por que devemos ter
a crise no Brasil, o cenário é um pouco rias. Estranho, mas é assim. o mesmo preço?
pior: você precisa ter uma loja bonita,
em um ponto caro, com gente bem pre- GV-executivo: Quais são as prin- GV-executivo: Vocês planejam que,
parada, e competir com um depósito em cipais oportunidades em serviços? nos próximos anos, cerca de 60% do
Tocantins, com subsídio fiscal. Como Sergio: Estamos tentando desenvol- faturamento corresponda às vendas
se faz isso? Não faz; a conta não fecha. ver um modelo de loja que traga cultura on-line. Como?
Fora a competição de preços na inter- e entretenimento; quase um life style. Sergio: Em cinco anos, queremos
net, temos uma economia indexada: o Por exemplo: vou à Livraria Cultura dobrar o que temos hoje, e, para isso,
aluguel aumenta todo ano pelo IGP-M do Shopping Iguatemi porque tem um estamos aumentando a linha de produ-
[Índice Geral de Preços ─ Mercado], teatro para a minha filha, posso almo- tos. Apesar da crise, a venda on-line de
há os dissídios do sindicato, aumento çar e ver um concerto. Estamos criando brinquedos, por exemplo, está crescen-
de IPTU [Imposto sobre Propriedade todo esse contexto cultural para dispu- do 51% em relação a 2016. Além disso,
Territorial e Predial Urbana]... Tem de tar o tempo livre das pessoas. Também lançamos uma área de livros semino-
colocar tudo isso na conta sem poder vamos abrir uma operação de comida vos: se você o comprou há seis meses
repassar preço. com a nossa cara. Não será a mesma na Cultura, pode devolver, porque re-
marca, mas uma submarca. Queremos compramos. Ninguém faz isso.
GV-executivo: Como estão enfrentan- potencializar a experiência de cafés e
do as crises estrutural e conjuntural? restaurantes na loja. GV-executivo: Hoje em dia, mui-
Sergio: Tudo veio junto; é a tempes- tas empresas vendem livros, inclu-
tade perfeita. No entanto, é um bom GV-executivo: É uma forma de se sive grandes redes como Extra e
momento, já que o mercado está tendo apropriar da margem dos cafés e Submarino. Como sobreviver?
de se reinventar. O comércio eletrônico restaurantes? Sergio: Monitoramos continuamen-
nos fará crescer. A loja física virou um Sergio: Sem dúvida. Por que a mar- te o preço dos top 15 mil livros ven-
ponto de engajamento de marca, mas gem fica, entre aspas, para um parcei- didos, o que nos ajuda a decidir: aqui
oferecer essa experiência ao consumi- ro, e não para a gente? vou abaixar, aqui não. Há quatro me-
dor custa caro. Como financiar isso? ses fazemos precificação um a um, por
Brinco que o novo modelo de loja ─ e GV-executivo: A margem diminuiu cliente. Quando tivermos a plataforma
já fazemos isso ─ não pode depender da no segmento de livrarias? mobile, quem passar perto da Avenida
venda de produtos e precisa gerar outros Sergio: Atualmente, o desafio para Paulista receberá ofertas com preços
tipos de receita. qualquer varejista é a inteligência especiais das publicações que deseja
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A internet das coisas Em conexão Líderes da As relações
irá muito além das coisas com os cidadãos transformação na era digital
digital
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Um caminho Uma bússola O futuro do Emerge uma nova
aberto à inovação para os dinheiro eletrônico tecnologia disruptiva
investimentos
A
Internet das Coisas (Internet of Things – entre máquinas. Em 2020, serão 43 milhões e, em 2025, o to-
IoT) pode ser entendida como a rede tal mundial ultrapassará 100 milhões, podendo chegar a 200
ubíqua e global que ajuda e provê a milhões. O IT Insider Online, site especializado em notícias
funcionalidade de integrar o mundo sobre tecnologia de Informação, tem publicado reportagens
físico. Isso se dá por meio da coleta, sobre os lançamentos e investimentos das grandes empresas
do processamento e da análise de da- de tecnologia na área de IoT. Em 23 de fevereiro de 2017,
dos gerados pelos sensores da IoT, que anunciou que a Nokia lançou uma rede mundial e integrada
estarão presentes em todas as coisas e se integrarão por meio de IoT; em 13 de março de 2017, informou que a SAP in-
da rede pública de comunicação. vestirá € 2 bilhões até 2021 nas suas soluções de IoT. Esses
Algumas projeções estimam que em 2020 o número de dados confirmam as expectativas de crescimento da IoT no
equipamentos conectados crescerá exponencialmente para mundo e no Brasil.
50 bilhões. Em 2015, a McKinsey & Company já informava Uma das bases desse crescimento é a integração dos equi-
que unir o mundo físico e o digital pode gerar até US$ 11,1 pamentos do nosso dia a dia e também das empresas e in-
trilhões de valor econômico por ano. A Gartner, em 2016, fraestruturas. Mas a IoT não se limita à conexão das coi-
avaliou que haveria grande crescimento dos investimentos sas; ela está relacionada com muitas outras infraestruturas e
e adoção de IoT: até o fim de 2017 haverá crescimento de aplicações de tecnologia, tanto para sua viabilização quanto
50% no número de empresas que adotam IoT e, até 2018, para o aproveitamento de seu potencial.
crescimento de 50% nos investimentos nessa tecnologia. Com essa abrangência, a IoT deve ser estudada também de
Seriam seis bilhões de coisas conectadas, e 50% dos gastos forma ampla, considerando especialmente a oferta de tecno-
em tecnologia seriam com integração das coisas. logia atual e futura, a demanda por suas funcionalidades e o
Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação próprio ambiente em que ela está inserida. Essa composição
(MCTI) e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), de forças deve ter equilíbrio e coerência, sob pena de compro-
atualmente o Brasil tem 20 milhões de conexões inteligentes meter o desenvolvimento, a consolidação e a utilização de IoT.
IOT NA MINERAÇÃO
| POR FABIO FARIA
A Internet das Coisas (Internet of Things – IoT) tem sido aplicada na indústria de mineração para tornar o negócio mais
competitivo, rentável e seguro. Na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), soluções de IoT são utilizadas na mina Casa de
Pedra, em Minas Gerais, com os objetivos de otimizar, automatizar, integrar e gerar informações que contribuem para a ges-
tão das atividades operacionais.
Com tecnologia GPS de alta precisão instalada nos equipamentos, é possível rastrear via satélite toda a frota de veículos
utilizada na operação da mina para que se obtenha o melhor aproveitamento desses recursos, como nos caminhões fora de
estrada, que realizam o transporte do minério extraído das diversas lavras. Dessa forma, é possível verificar em tempo real se
os caminhões estão carregados ou vazios, em processo de carregamento, na fila para carregar, em manutenção e até mesmo
apurar os tempos de viagem.
Outro aspecto interessante é a possibilidade de mapear toda a topografia da mina com a sua rede de estradas, bem
como os locais onde estão as escavadeiras. Com base nessas informações, o sistema otimiza automaticamente a alocação
de recursos e possibilita a seleção da melhor rota para que os caminhões não enfrentem filas nos pontos de carregamento, de
descarga e de abastecimento de combustível.
Outro componente dessa operação é um sistema de gerenciamento de manutenção também em tempo real, que utiliza
sensores instalados nos caminhões e que monitoram pneus, motores, pesos das cargas etc. As finalidades são reduzir os altos
custos de manutenção, aumentar a disponibilidade dos equipamentos e diminuir o custo por tonelada.
Os caminhões fora de estrada também são equipados com um sistema de detecção de fadiga, composto de câmeras e
sensores que observam e monitoram o operador, diagnosticando ininterruptamente o movimento das pálpebras e a orientação
da cabeça. Dependendo da velocidade dos veículos, eventos como o fechamento dos olhos por mais de 1,5 segundo e a distração
do operador fora da rota por mais de 4,5 segundos são detectados e alarmados, visando garantir aspectos de segurança em
toda a operação.Portanto, soluções de IoT como as citadas na indústria da mineração serão cada vez mais frequentes, pois
sem dúvida geram vantagens e diferenciais competitivos aos negócios.
FABIO FARIA > Diretor corporativo de Tecnologia da Informação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) > fabio.faria@csn.com.br
Essa visão ampla permite entender a complexidade ine- 3) evolução da integração eletrônica interna e externa.
rente à IoT ao mesmo tempo que contribui para a estrutu- Essas evoluções foram relacionadas entre si e com o seu
ração dos estudos e de pesquisas nessa área. uso pelas organizações e pelos indivíduos.
A evolução do hardware incluiu aumento de capacidade
EVOLUÇÕES E INOVAÇÕES QUE de processamento e armazenamento, diminuição do custo e
LEVARAM À INTEGRAÇÃO DA tamanho, mudanças nas formas e facilidade de uso, levando
INTERNET DAS COISAS à possibilidade de seu embarque em outros equipamentos,
A Tecnologia de Informação sempre esteve em evolução muito além dos computadores no seu sentido tradicional.
desde o seu surgimento, tanto na sua oferta como no seu uso Essa evolução, com ciclos de inovação, teve como
pelas organizações. Essa evolução apresentou ciclos claros consequência sua democratização e popularização, tanto para
de inovação tecnológica que levaram a ciclos de inovação as organizações quanto para os indivíduos, que passaram a
de produtos e serviços de tecnologia, que, por sua vez, per- utilizá-lo de forma ampla e intensa como uma infraestrutura,
mitiram ciclos de inovação de seu uso pelas organizações. aumentando a dependência e o uso eficiente. Considerando
Essa evolução permanente com seus ciclos de inovação essa presença intensa, o ambiente atual naturalmente busca
pode ser entendida e organizada de várias maneiras, conforme e está pronto para níveis elevados de integração.
o enfoque desejado. Neste artigo, será utilizada a visão A evolução do software incluiu aumento das funcionalida-
de 1) evolução do hardware, 2) evolução do software, e des, simplificação e facilidade de uso, complexidade interna,
diminuição de custo, disponibilidade de hardware para atender vez, partiu de modelos proprietários para infraestrutura pú-
à sua necessidade de velocidade e armazenamento, existência blica com a internet.
de padrões proprietários e abertos, e facilidade de criação de Não é adequado o uso de tecnologia justificado ape-
aplicativos, e teve como consequência sua democratização e nas pela própria tecnologia, mas, sim, seu uso em benefí-
popularização. Da mesma maneira, e acompanhando o har- cio das organizações e dos indivíduos, da sociedade com
dware, o software também passou a ter uso amplo e intenso um todo. Dessa forma, a tecnologia teve sua inovação e
pelas organizações e pelos indivíduos, tornando-se uma in- evolução para atender às necessidades da sociedade na
fraestrutura natural para muitos processos de negócio, aca- sua própria evolução. Nos ambientes sociais e de negó-
dêmicos e sociais. Essa utilização tão disseminada forma um cios, a evolução propiciou, exigiu e utilizou a evolução da
ambiente natural para níveis elevados de integração. tecnologia.
A evolução das redes de computadores acompanhou o Essas evoluções e esses ciclos de inovação levaram ao
movimento de hardware e software, tendo a sua própria cenário atual, no qual a IoT surgiu e está em expansão e
evolução e ciclos de inovação, atendendo à tendência de consolidação, com grande potencial para as organizações e
integração e, ao mesmo tempo, provocando a evolução os indivíduos. A visão mais cética pode considerá-la como
de seus componentes para níveis elevados de integração. mais uma evolução; a visão mais otimista considera-a como
Essa integração iniciou-se no ambiente interno das organi- um novo ciclo de inovação, tanto tecnológico como de pro-
zações, evoluindo para a integração externa, que, por sua cessos de negócio e sociais.
Governo
Sociedade Economia
Iniciativa
privada
BYOD** Crowdsourcing
IoT
Big Data * Learning
Serviços machine
Blockchain
Computação Computação
Setor Setor
em nuvem cognitiva
Hardware Soſtware privado público
Sociedade
Redes
Oferta Demanda
*IOT: INTERNET OF THINGS; **BYOD: BRING YOUR OWN DEVICE.
FONTE: ELABORAÇÃO DOS AUTORES
H
oje em dia, podemos utilizar nossos Além disso, tem propiciado aprimoramentos na interface dos
smartphones para fazer ligações, transa- sistemas para coleta, processamento, transmissão, acesso e
ções bancárias, tirar uma foto e enviá-la armazenamento de informações.
para um amigo que se encontra em outra Como é natural no uso de novas tecnologias, os usuários
localidade (seja perto ou do outro lado demandam elevada segurança. Esse é outro desafio impos-
do mundo), reservar hotéis, comprar e to às organizações responsáveis pela oferta da tecnologia
vender itens, entre várias outras opções cada vez mais integrada, a Internet das Coisas. Tais organi-
disponíveis pelos apps. Os recursos da internet também já al- zações são responsáveis por transmitir confiança e assegu-
cançam os televisores (smart TVs), veículos, refrigeradores rar transações seguras, principalmente em termos de risco
e controles residenciais diversos. à exposição de dados pessoais.
Essa gama de aparelhos conectados vem acompanhada
de uma elevada capacidade de geração, armazenamento e CIDADES INTELIGENTES
uso de informações. Empresas de telecomunicações e de Com a Internet das Coisas, o usuário pode ter melhores
processamento de dados precisam enfrentar o desafio cons- condições de vida, mais agilidade em suas atividades do
tante de gerenciar densos bancos de informações. O que, dia a dia e mais controle de sua saúde. Ademais, os bene-
de fato, precisa ser armazenado das transações realizadas? fícios estendem-se de forma mais ampla para a sociedade.
Por qual período? As atualizações devem ser feitas diaria- Podemos pensar em conceitos inovadores, como é o caso
mente, de hora em hora, a cada minuto, ou devem ocorrer das smart cities (cidades inteligentes). Cidades que buscam
em tempo real? incorporar conceitos inovadores de tecnologia da informa-
A crescente complexidade de perguntas como essas tem ção com sustentabilidade, gestão pública, soluções de trans-
levado a melhorias nas soluções para a intermediação digi- porte, entre outros, já estão espalhadas ao redor do mundo,
tal e na própria capacidade de os sistemas se autoajustarem. a exemplo de Nova Iorque, Londres e Paris.
No cenário brasileiro, o ranking 2016 das 50 cidades há muito a avançar. No cenário mais amplo do país, a pes-
mais inteligentes do país (Projeto Connected Smart Cities, quisa da Urban Systems revela que, de todos os pontos
da Urban Systems) apontou São Paulo, Rio de Janeiro e possíveis nos 11 eixos do estudo, as cidades brasileiras
Curitiba como as cidades que registraram maior pontua- alcançaram apenas a metade. A população pode ser signi-
ção entre 700 municípios avaliados. A pesquisa envolveu ficativamente beneficiada com mais esforços para tornar
73 indicadores em 11 eixos setoriais: mobilidade, urbanis- as cidades nacionais “inteligentes”, e o governo possui
mo, tecnologia e inovação, empreendedorismo, governan- papel importante nesse processo.
ça, educação, energia, meio ambiente, saúde, segurança e
economia. No ranking do ano de 2015, São Paulo e Rio de O GOVERNO E A TECNOLOGIA
Janeiro também estavam nos primeiros lugares. A participação do governo envolve estabelecer leis e re-
Os destaques apresentados por São Paulo no relatório soluções para incentivar investimentos em infraestrutura e
que acompanha o ranking referem-se à preocupação em desenvolvimento de novas tecnologias, fiscalizar o cum-
oferecer serviços que contribuam com a qualidade de vida primento de normas para serviços de telecomunicações e
da população, bem como iniciativas para melhorar a sus- estipular medidas para facilitar o amplo acesso à internet.
tentabilidade e a mobilidade. Observando seu posiciona- Também merece atenção a intermediação do governo no
mento entre os eixos setoriais avaliados pela pesquisa, sentido de facilitar o acompanhamento e a cobrança dos
São Paulo esteve classificada entre as melhores posições serviços de telecomunicações pelos consumidores.
em 9 dos 11 conjuntos de indicadores. Em segundo lu- É importante, ainda, que o próprio governo aprimore sua
gar no ranking 2016, está o Rio de Janeiro (no ranking política de transparência de informações. Os serviços ao
de 2015, a cidade foi classificada em primeiro lugar). cidadão, por meio do governo eletrônico, permitem redu-
Conforme apontado no texto que acompanha o ranking zir a burocracia e agilizar as atividades, como no caso dos
Connected Smart Cities 2016, o Rio possui experiência requerimentos para o seguro-desemprego e comunicação
em sediar grandes eventos que demandam investimen- de dispensa, que agora só podem ser feitos pela internet.
tos em infraestrutura, e suas iniciativas para melhoria na Nas esferas estaduais e municipais, tem-se ampliado o aces-
conexão (com investimentos em fibra óptica), capacita- so à internet em escolas públicas, por exemplo, a partir do
ção e sustentabilidade contribuíram para seu posiciona- Programa Banda Larga nas Escolas.
mento de destaque no levantamento realizado sobre as Outros exemplos de protagonismo governamental são
smart cities brasileiras. os programas de combate ao câncer, medidas para redu-
As palavras-chave que acompanham as cidades nas po- zir o tabagismo e ações para o enfrentamento ao mosqui-
sições seguintes do ranking Connected Smart Cities 2016 to Aedes Aegypti, cujos efeitos são ampliados por meio
são: humanização (em Curitiba/PR), empreendedorismo dos recursos tecnológicos. Por exemplo, pela internet, o
(em Brasília/DF), plano de desenvolvimento de médio e governo pode ampliar as ações de mobilização que es-
longo prazos (em Belo Horizonte/MG), conexão ampla tão sendo tomadas para o combate ao mosquito Aedes
com plataformas mobile (em Vitória/ES) e mobilidade (em Aegypti, com vídeos educativos e cartilhas informati-
Florianópolis/SC). Podemos perceber que esses termos tam- vas. O alcance da campanha ainda pode ser ampliado
bém são palavras-chave no que se refere às cidades inteli- por meio das redes sociais.
gentes e têm papel importante para que a população alcan- Observando a atuação do governo e as inovações tecno-
ce contínuo aumento em seu nível de qualidade de vida por lógicas, uma das medidas mais recentes está relacionada
meio de ações do governo. No cenário internacional, as ini- com o Plano Nacional de Internet das Coisas, cuja cons-
ciativas também abordam construções inteligentes, medidas trução envolve amplo debate nacional e a convergência
para redução do consumo de energia, aumento de seguran- com o que tem sido praticado em outros países. Esse pla-
ça, planejamento para soluções com inovação e tecnologia, no será utilizado para nortear ações e políticas públicas
além de eventos, com exemplo nos Estados Unidos (Smart relativas ao tema até o ano de 2022 ˗ incluindo questões
Cities Week), Índia (Smart Cities India) e Reino Unido como segurança de dados, regulação, privacidade e capa-
(IFSEC International e Internet of Things World Europe). citação de recursos humanos, com a expectativa de efeito
A terceira edição do evento Connected Smart Cities ocor- positivo no desenvolvimento do país.
rerá em junho de 2017, na cidade de São Paulo. Considerando Assim, de maneira geral, o planejamento para que
as demandas urbanas atuais e as possibilidades tecnológicas, se levem recursos inovadores ao ambiente das cidades
CID TORQUATO > Secretário municipal da Prefeitura de São Paulo > cidtorquato@prefeitura.sp.gov.br
RODRIGO FERNANDES MALAQUIAS > Professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU-Facic) > rodrigofmalaquias@yahoo.com.br
A
té recentemente, os gestores de tecno- A relação com os consumidores tornou-se mais instável
logia da informação (TI) precisavam e imprevisível. Eles são cada vez mais impacientes, infor-
se concentrar em dois desafios prin- mados e exigentes. Também são fortemente influenciados
cipais: em primeiro lugar, selecionar, pelos modelos de négocio free ou freemium, ou seja, espe-
adquirir e disponibilizar ferramentas ram pagar cada vez menos, mas exigem serviços e produ-
(softwares e aplicativos) e a respecti- tos de qualidade.
va infraestrutura (equipamentos, ser- Na dimensão da gestão informacional ocorre uma acelera-
vidores e redes); em segundo, aplicar tais recursos para ção sem precedentes, tanto na geração de dados (big data e
atender às necessidades específicas dos usuários por meio Internet das Coisas) como no incremento do potencial ana-
de projetos e serviços. lítico das ferramentas para tratar dessa explosão de dados
O atual cenário competitivo trouxe uma profunda ruptura (inteligência artificial, geoanálise, computação cognitiva).
em relação a tais paradigmas. Atualmente, o mundo empre- Essas tendências demandam um novo mindset por parte dos
sarial passa por uma inflexão abrupta devido aos impactos gestores de TI, uma vez que seu papel mudou de provedores
simultâneos em três dimensões: na estrutura de custos dos de infraestrutura, redes, equipamentos e “fazedores de proje-
sistemas produtivos, na relação com os consumidores e na tos” para agentes de transformação digital. As funções desem-
gestão de informações. penhadas anteriormente continuam necessárias, mas não são
Em todos os setores econômicos, a estrutura de custos mais suficientes. A área de tecnologia da informação tornou-se
vem sofrendo impactos diretos de várias tecnologias, como o principal vetor de modificação das empresas, e essa mudança
robotização, drones, impressão em três dimensões (3D), deve ser ancorada em um roadmap estratégico, pactuado en-
blockchain, nanotecnologia, criptomoedas, entre outras. tre a TI e as áreas de negócio, parceiras nessa transformação.
Cada vez mais, as organizações orientam-se para a a liderar transformações organizacionais. A figura do
criação de áreas combinadas de marketing (ou negócios) Chief Marketing Technologist, Chief Knowledge Officer
e tecnologia, ou vislumbram necessidades de transfor- ou Technology Chief Analytics Officer é cada vez mais
mação ainda incipientes e criam departamentos ou di- comum em grandes corporações, especialmente aquelas
retorias de inovação, sem ao menos avaliarem sua real em que há a intensa cultura de uso de informações inter-
influência. Vivemos uma era em que entender os hábi- nas e, principalmente, externas (big data).
tos, as atitudes e as expectativas do consumidor está na Atualmente, no ambiente empresarial, parece haver mais
essência da proposição de novos negócios e na melho- consciência de que o escopo, as competências e as respon-
ria de processos. Para tal, profissionais de TI e de áreas sabilidades do profissional de TI aumentaram. Resta-nos
de negócio e de marketing passam a trabalhar mais co- saber como a trajetória da transformação digital se dará a
nectados. A era do comportamento do consumidor passa partir de agora.
A
indústria de tecnologia tem se trans-
formado significativamente. A inter-
net e o crescimento exponencial da Implementado em meios
mobilidade propiciaram a troca de in- “analógicos”, o modelo de
formações em larga escala e tempo
real como nunca foi possível antes. relações com as consultoras
Também cresceu a capacidade de pro- acontece cada vez mais nas
cessamento simultâneo de um grande número de dados (e
redes sociais e por meio das
de forma economicamente sustentável, por meio do uso
de cloud computing). Essas mudanças democratizaram a ferramentas digitais.
utilização de tecnologia.
Nesse cenário, as grandes organizações passaram a en-
frentar dois grandes desafios na área de tecnologia: • Diariamente surgem startups com novos modelos de
• A Tecnologia da Informação (TI) deixou sua função negócio em praticamente todos os setores da economia.
tradicional de suporte. Antes, suas principais respon- Em muitas situações, os entrantes tornam-se concorrentes
sabilidades limitavam-se à automatização de processos diretos das indústrias tradicionais, pondo em risco suas
e à geração de informações. Agora, a TI assume lugar margens. Mesmo quando não implicam concorrência di-
central na estratégia das organizações, seja como im- reta, trazem importantes reflexões sobre o uso da tecno-
pulsionadora dos negócios tradicionais, seja como ge- logia. Com a utilização inteligente de dados, os antigos
radora de novos negócios. Isso implica uma transfor- “usuários” de tecnologia passam a ser clientes exigen-
mação cultural para as organizações e seus profissionais tes e começam a comparar todas as experiências com as
de tecnologia. oferecidas pelos novos players, nativos da era digital.
Dado esse contexto, um novo papel é requerido para as digital e sua rápida incorporação e disseminação na socie-
áreas de Tecnologia da Informação nas grandes empresas: dade. As relações na Natura acontecem cada vez mais no
o de habilitador e promotor da transformação digital dos âmbito das redes sociais e nas ferramentas digitais.
negócios. É uma tarefa complexa e vital, que demanda es- Não é incomum, nos dias de hoje, consultoras operarem
treita conexão com os atores de toda a companhia, de modo seus negócios por meio de aplicativos de chat, canais pelos
a gerar novas oportunidades de negócios. quais interagem, recebem e enviam pedidos. São inúmeros
Alguns elementos-chave são relevantes para essa mu- os casos de consultoras e equipe de vendas (que lhes dão
dança, incluindo, como primeiros passos, a formulação de apoio) que se relacionam com as suas redes nas mídias so-
uma estratégia digital que evidencie claramente o futuro a ciais, seja recomendando produtos ou realizando encontros
ser construído e uma estratégia tecnológica que sustentará e treinamentos virtuais. Em um negócio com essas caracte-
a evolução necessária. Novas formas de atuar são também rísticas, a digitalização transcende as ferramentas entregues
fundamentais, com modelos de desenvolvimento ágeis, e controladas pela organização.
maior orientação para o consumidor final e foco na expe- Uma das grandes vantagens das novas tecnologias é a
riência de uso dos ativos digitais à disposição dos clientes. possibilidade de conhecer melhor os consumidores (seus
desejos, anseios e necessidades) e, com isso, endereçar
A TECNOLOGIA NA NATURA experiências personalizadas de produtos e serviços. Cada
A Natura é uma empresa cujas vendas se dão por meio de consultora tem seu painel com informações sobre seus
relações. A empresa tem cerca de sete mil colaboradores e clientes, informações de vendas e perfis de consumo, além
seus produtos são vendidos por 1,8 milhão de consultoras. de comunicação direta com os clientes em seus disposi-
O modo de atuação sempre se caracterizou como uma “rede tivos móveis. Dessa forma, a antiga Tecnologia da Infor-
social”, ligando o negócio às consultoras de beleza e estas mação modernizou-se e passou a ser agente fundamental
aos consumidores finais. na promoção do bem-estar, com ganhos tangíveis, tanto
Implementado em meios “analógicos”, esse modelo vem financeiros quanto na qualidade das relações ao longo de
sendo impactado pela evolução acelerada da tecnologia todos os elos da cadeia.
C
om as transformações aceleradas no cená-
rio competitivo, muitas empresas come- O desenvolvimento tecnológico
çaram a utilizar ferramentas de inovação possibilita usar a inteligência
aberta (open innovation) para buscar fora
de suas fronteiras ideias de como enfren-
da multidão e das startups
tar melhor a concorrência. Hoje, o desen- para ter acesso a fontes de
volvimento tecnológico possibilita usar a inspiração, desenvolver novos
inteligência da multidão (crowdsourcing) e das startups para
ter acesso a fontes de inspiração, desenvolver novos produtos produtos e serviços e
e/ou serviços e gerar conhecimento. gerar conhecimento.
CROWDSOURCING
O crowdsourcing é uma forma de conectar o conhecimen- O crowdsourcing não é uma estratégia única. Ele gera
to das pessoas pela rede. Por meio dele, torna-se factível a várias possibilidades, como:
execução de tarefas superiormente complexas ou até mes- • Sabedoria das multidões: o objetivo é usar a “inte-
mo específicas. Separadamente, os recursos humanos não ligência coletiva” de pessoas de dentro ou de fora de
seriam capazes de alcançar determinados conhecimentos. uma organização para resolver problemas complexos.
1) ACELERADORA DE STARTUPS:
Até o momento, já foram lançados três ciclos de chamada no mercado, convidando startups a se candidatarem ao pro-
cesso seletivo. Foram inscritas cerca de mil startups em cada ciclo. Destas, 19 empresas foram escolhidas para ser incubadas.
O foco são empresas que têm alguma sinergia com os produtos e serviços da Porto Seguro. A Porto Seguro, em par-
ceria com a aceleradora Plug and Play Tech Center, localizada do Vale do Silício, pode adquirir 10% da propriedade das em-
presas selecionadas.
As empresas selecionadas pela aceleradora recebem US$ 150 mil, sendo US$ 50 mil em investimentos diretos e
US$ 100 mil em investimentos indiretos, como uso de serviços na nuvem, rede, equipamentos, consultoria e mentoria es-
pecializada. Tais startups participam de um programa de aceleração por três meses em São Paulo. Nesse período, os em-
preendedores ficam exclusivamente dedicados ao crescimento do negócio, à aquisição de usuários e ao posicionamento do
produto. Recebem mentorias interna e externa e apoio de profissionais referência no mercado. Na mentoria interna, cada
startup tem como padrinho um diretor da Porto Seguro, na mentoria externa, o foco é no desenvolvimento de técnicas de
gestão e de negócios e na formação do time.
Além do investimento inicial, as empresas têm acesso aos mercados de atuação da Porto Seguro, aos serviços e às fer-
ramentas da empresa; recebem suporte do time da Plug and Play Tech Center para identificar oportunidades adicionais de
levantamento de fundos e parcerias estratégicas; e contam com acompanhamento da evolução de sua empresa pela equipe
da Liga Ventures, aceleradora especializada em fazer conexões entre grandes empresas e startups.
Uma vez prontas, as empresas têm a oportunidade de passar três meses no Plug and Play Tech Center nos Estados
Unidos, no Vale do Silício, para ampliar e internacionalizar seus produtos. Com essa experiência, também conseguem ter
acesso a fundos de investidores estrangeiros e outras empresas do Vale.
2) PRÉ-ACELERAÇÃO:
O programa de pré-aceleração é voltado aos funcionários da Porto Seguro. A chamada para participação é apresentada
de forma simples, algo como: “Sr. Funcionário que sonhou em ter sua própria empresa, inscreva-se na Oxigênio Aceleradora
e vamos ajudá-lo a criar o seu próprio negócio”.
Os funcionários, normalmente os melhores, apresentam projetos que tenham sinergia com os produtos e serviços da
Porto Seguro. Eles pedem licença não remunerada de três meses e recebem mentorias para construírem seus produtos.
O produto desenvolvido é de propriedade do funcionário. Após esse período, o funcionário decide se volta a trabalhar
na empresa – a Porto Seguro garante sua recolocação –, ou se pede demissão para se tornar empreendedor e investir na
sua própria startup. Se seu projeto for aprovado e ele decidir prosseguir com o negócio, entra diretamente no processo da
aceleradora de startups.
Até o momento, já ocorreram duas chamadas internas, com cerca de 50 inscritos em cada ciclo. Foram selecionadas
cinco empresas criadas por funcionários. Entre elas, três já viraram parceiras de negócio da Porto Seguro, e as demais con-
tinuam desenvolvendo o projeto.
N
indicadores de diagnóstico e gestão de TI.
os últimos 30 anos, a Tecnologia da líquido da empresa. Esse indicador é chamado de Índice G
Informação (TI) vem ganhando im- na Pesquisa do GVcia e inclui todas as despesas, as amorti-
portância nas empresas. O gasto e o zações e o capital investido em TI, incluindo: equipamento,
investimento com TI passaram de 1,2 instalações, suprimentos e materiais de consumo, software,
para 7,6% de 1988 a 2016 e devem ul- serviços, comunicações e custo direto e indireto com pes-
trapassar 8% do Produto Interno Bruto soal próprio e de terceiros trabalhando em sistemas, suporte
(PIB) no Brasil em dois ou três anos. e treinamento em TI.
Simetricamente, o tamanho do ramo de TI no PIB é também O Índice G depende do porte, do setor ou do ramo da eco-
crescente e próximo de 8%. nomia e do estágio de informatização da empresa. Quanto
O papel estratégico que a TI hoje ocupa demanda infor- mais informatizada for a empresa, maior será o valor do
mações precisas sobre a área. É importante desenvolver Índice G. Esse é um conceito que não costuma ser facil-
indicadores não só para diagnosticar, mas também para ad- mente assimilado pelos executivos. Muitos raciocinam que,
ministrar, monitorar, comparar, traçar metas, comunicar, depois de realizado um vultoso investimento, o índice deve-
alinhar e planejar o uso da TI nas organizações. ria diminuir – mas não é isso que ocorre. O Índice G cresce
Pesquisas do uso de TI nas empresas, como as do Centro conforme a organização avança nos estágios do uso da TI.
de Tecnologia de Informação Aplicada da FGVEAESP Assim, uma empresa mais informatizada tem relativamente
(GVcia), do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) mais gastos e investimentos com TI.
e da consultoria Gartner, geram anualmente muitos indica- Considerando os setores econômicos, o Índice G é me-
dores. Vamos revelar dois neste artigo. nor no setor de comércio (menos da metade da média ge-
ral de 7,6%), enquanto atinge maior patamar no setor de
ÍNDICE G, O PRIMEIRO INDICADOR serviços, 50% acima da média. A explicação está, em par-
O índice mais utilizado calcula o gasto e o investimen- te, na estrutura de faturamento, diferente nos dois setores
to total destinado à TI como um percentual do faturamento (não é possível comparar, por exemplo, 1% da receita de
um supermercado e de um banco), e, em parte, no está- do GVcia revelou que as indústrias com ações na bolsa que
gio de informatização. No comércio, a utilização de TI é mais investiram em TI, no período de 2001 a 2014, obtive-
mais operacional do que em serviços. Este setor inclui os ram maior crescimento da sua receita operacional e resul-
bancos, o ramo da economia que mais gasta e investe em tados operacionais mais eficazes. Para cada 1% a mais de
TI (14%) do faturamento líquido – e no qual a tecnologia gastos e investimentos em TI, depois de dois anos, o lucro
tem papel estratégico. Na indústria, o Índice G é, assim aumentou 7%.
como no comércio, inferior à média. Ao investigar o impacto da TI no desempenho das em-
É importante verificar que, em todos os setores, a tendência presas brasileiras, descobrimos quatro tipos de compor-
de gastos é crescente. Para o gestor de TI, o Índice G é útil tamento distintos, classificados em conservadores, pru-
para acompanhar o comportamento da sua empresa, de em- dentes, analógicos e digitais. Conforme ilustra o quadro
presas similares e a evolução do setor, de forma mais ou Comportamentos padrão na gestão de TI, as empresas
menos agregada. digitais estão no quadrante mais favorável, pois não só
investem mais como também conseguem utilizar melhor
MAIS INVESTIMENTO, os recursos investidos. Já as empresas analógicas estão
MELHOR RESULTADO no pior quadrante, pois investem em TI, mas sem utili-
Estudos demonstram que as empresas que mais inves- zar bem os recursos, pois não digitalizaram os negócios.
tem em TI são as mais lucrativas. Por exemplo, pesquisa As empresas prudentes, assim como as conservadoras,
OS INDICADORES DE TI EM PRÁTICA
| POR JORGE LUIS CORDENONSI
Em duas empresas globais de diferentes setores em que trabalhei como chief information officer (CIO), foram implanta-
das abordagens para medir e comunicar o desempenho de TI. No primeiro caso, foi implementado um sistema de informação
para automatizar processos operacionais, o que permitiu extrair dados para medir e controlar o desempenho do negócio e,
como consequência, o valor agregado da TI. No segundo caso, foi criado um processo para medir os benefícios ao negócio de
todos os projetos que envolviam TI. Em ambos, foram necessários: forte disciplina, apoio da alta administração, estruturação
de processos, colaboração interdepartamental e garantia de que os indicadores do sistema de medição do valor de TI iriam
ser coletados e avaliados de forma sistemática. Eis os casos:
1) Empresa de serviços de alimentação, atuando nas Américas do Sul e Central, tinha duas questões-chave: como admi-
nistrar e reduzir o custo de matéria-prima e de pessoal nos restaurantes? Como a TI poderia ajudar a empresa a medir e reduzir
o custo? Por ter uma operação descentralizada, com restaurantes localizados internamente dentro das empresas-cliente adminis-
trados por nutricionistas, o desafio adicional era melhorar o nível de gestão do contrato. A solução adotada foi a implementação
de um sistema de gestão dos serviços de alimentação, que contemplava desde a elaboração dos cardápios até o controle diário
dos custos. Esse sistema possibilitou o controle e a redução efetiva dos custos. Isso permitiu que a empresa alcançasse melhores
margens operacionais, reduzisse o preço dos serviços e, ao mesmo tempo, conseguisse melhor nível de competitividade. Foi desen-
volvido um sistema para medir a contribuição de TI para a redução dos custos de operação (matéria-prima e pessoal) do negócio.
2) Empresa da indústria automobilística, com forte presença na América Latina, havia decidido internalizar toda a ope-
ração de TI. Era preciso ter um programa bem estruturado e efetivo de projetos que pudesse transferir para dentro da empresa
todos os processos que estavam sob a gestão de um provedor de serviços de TI. Como resultado, foi implantada uma nova es-
trutura global para a área de TI, com CIOs globais para cada linha de negócio e funções específicas na área. Foram construídos
centros de inovação com o objetivo de desenvolver sistemas específicos de acordo com a demanda dos negócios. Foi estabele-
cido um indicador de desempenho de TI denominado Annual Direct Business Benefit (ADBB), que se tornou o principal parâmetro
de avaliação, tanto na aprovação de um projeto quanto na medição do real valor após a implementação.
JORGE LUIS CORDENONSI > Consultor de TI ISG (Information Services Group) > jorge.cordenonsi@fgv.br
12 Serviços 11%
10
Média 7,6%
8
% 6
Indústria 4,6%
Comércio 3,5%
2
0
1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 Tend
não investem tanto em TI, mas as prudentes conseguem custo anual de TI por outro parâmetro relevante para o
melhor lucratividade, pois usam estrategicamente seus negócio da empresa. Como o Índice G, o custo anual de TI
recursos. varia por segmento de atuação e grau de informatização.
Uma tarefa difícil nos estudos sobre retorno da TI é isolar Temos, por exemplo, o Custo Anual de TI por Usuário
o efeito da TI dos demais itens que afetam os resultados. (CAPU), que é o custo total de TI por ano dividido pelo
Assim, podemos afirmar que, na média, as empresas que número de usuários de TI da organização. Sua média foi
mais investem em TI são as mais lucrativas, mas não que de R$ 38.100 em 2015/16 (US$ 11,4 mil). De forma aná-
esse lucro ocorra somente por causa da TI. loga, considerando o número de dispositivos de TI que a
O valor da TI para os negócios depende do papel da TI e empresas possui, temos o Custo Anual de TI por Teclado
do nível de informatização ou de maturidade no uso da TI. (CAPT), de R$ 33.300; e o CAPF (custo anual de TI por
Os líderes da gestão da TI devem desenvolver métricas de funcionário) de R$ 32.400.
negócios e de TI para comunicar e alinhar as expectativas de Usando métricas de desempenho padrão do setor, po-
como o negócio muda e se beneficia com os gastos com TI. dem-se facilitar o entendimento e as comparações com
Devem-se utilizar indicadores de fácil compreensão e com outras organizações similares. Por exemplo, nos hospi-
a capacidade de permitir comparações (benchmarking) in- tais utilizamos o CAPL (custo anual de TI por leito), que
terna e externa. resultou em R$ 120 mil.
As aplicações do modelo de diagnóstico com indicado-
CUSTO ANUAL DE TI res demonstram que cerca de dez indicadores selecionados
O SEGUNDO INDICADOR são suficientes para um diagnóstico quantitativo do uso de
Um segundo indicador utilizado na prática é o custo TI na empresa. Conforme mostram pesquisas, as empre-
anual de TI. Ele pode ser medido de diversas maneiras: sas que utilizam indicadores regularmente superam seus
por usuário, por teclado, por funcionário ou dividindo o concorrentes em termos de retorno.
• Papel estratégico da TI
• Mais investimento em TI
• Menos investimento em TI
• Alta lucratividade
• Lucratividade média
CONSERVADORES ANALÓGICOS
LUCRATIVIDADE
Empresas do setor
Empresas de todos os setores e portes
industrial de maior porte
• Papel não estratégico da TI
• Papel pouco estratégico da TI
• Investimento em TI
• Menos investimento em TI
• A mais baixa lucratividade
• Baixa lucratividade
GASTOS E INVESTIMENTOS EM TI
FONTE: INDICADORES EM PESQUISAS SOBRE USO DE TIC NA GESTÃO DAS EMPRESAS, CGI.BR, 2017.
*MÉDIAS E GRANDES EMPRESAS. VALORES EM R$ DE 2015/16 COM ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA; CAPU: CUSTO ANUAL DE TI POR USUÁRIO; CAPT: CUSTO ANUAL DE TI POR TECLADO;
CAPF: CUSTO ANUAL DE TI POR FUNCIONÁRIO.
FONTE: PESQUISA ANUAL DO USO DE TI NAS EMPRESAS, FGV, 2016.
FERNANDO S. MEIRELLES > Professor titular de TI e fundador do GVcia da FGV EAESP > fernando.meirelles@fgv.br
Revista Brasileira de Casos a) Conteúdo gratuito com acesso livre: casos de ensino
de Ensino em Administração nas diversas áreas da Administração, disponíveis para o
público em geral.
Central de Relacionamento
Contatos: + 55(11) 3799-7999 ou 3799-7778
Fax: + 55(11) 3799-7871
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CE | TECNOLOGIA • O FUTURO DO DINHEIRO ELETRÔNICO
O
uso de cartões como instrumento de
FONTE: DINERSCLUB
pagamento deu-se no início do século
XX, entretanto foi somente na metade
do referido período que tomou forma
similar à atual.
O primeiro cartão de crédito ideali-
zado para uso amplo foi o Diners Club,
emitido em 1950, em papel-cartão, para cerca de duas cen-
tenas de clientes e aceito em apenas 27 estabelecimentos
comerciais. Sua lógica de funcionamento era bastante sim-
ples: uma mesma organização emitiria os cartões para os
Cartão Diners Club nos anos 1950
clientes, cadastraria os estabelecimentos comerciais rece-
bedores e processaria as compras realizadas.
Ao longo de quase sete décadas seguintes, a proposta inicial Mesmo assim, o Banco Central do Brasil (Bacen) avalia
evoluiu para um complexo e sofisticado ecossistema de paga- que, ainda hoje, o uso de meios de pagamento eletrônico –
mentos, separando as funções de emissor de cartões, creden- categoria na qual se inserem os cartões de crédito e débito –
ciador de estabelecimentos e intermediador de rede. Barreiras está muito aquém das necessidades do país. Diferentes estudos
geográficas, comerciais e operacionais foram superadas, per- sugerem a existência de uma relação positiva entre utilização
mitindo a expansão dos serviços, agora eletrônicos, para um de meios de pagamento digitais e crescimento da economia.
número incrivelmente grande de pessoas e organizações. Por esse motivo, em algumas oportunidades o Bacen inter-
Em 2015, havia mais de um bilhão de cartões na moda- veio nesse mercado, buscando aumentar a abrangência e a
lidade crédito nos Estados Unidos, sendo 636 milhões das eficiência dos sistemas de pagamento.
quatro maiores bandeiras (Visa, MasterCard, American
Express e Discover). Naquele mesmo ano, no Brasil, foram FIM DO APRISIONAMENTO
realizadas aproximadamente 12,2 bilhões de transações com Em julho de 2010, o Bacen extinguiu o lock-in existente en-
cartões de débito e crédito, as quais movimentaram mais de tre bandeiras de cartões e redes credenciadoras, também de-
R$ 1 trilhão na economia. nominadas de redes de captura ou adquirentes, promovendo
a interoperabilidade nas transações. Um comerciante não necessários tantos agentes para viabilizar um pagamento
precisaria mais contratar várias maquininhas de cartão para direto entre duas partes, se ambas já tinham acesso à tecno-
receber pagamentos com cartões de diferentes bandeiras. logia móvel? Seria viável resgatar a ideia original dos car-
Desde então, os comerciantes podem optar pela melhor pro- tões, no contexto brasileiro, porém agora com um modelo
posta comercial, pois qualquer rede adquirente deve aceitar de negócio simplificado e essencialmente digital?
todas as bandeiras autorizadas. Dessas discussões emergiram algumas iniciativas, como o
relançamento de uma bandeira nacional de cartões de crédito
REGULAMENTAÇÃO DAS (Elo), a emergência de serviços de mobile payments no país
INSTITUIÇÕES DE PAGAMENTO (como E-dinheiro, PicPay e RecargaPay), a promoção de
Em novembro de 2013, o Bacen regulamentou a Lei n.º 12.865, novos serviços por agentes financeiros tradicionais (Rédea
pela qual foi autorizada a operação das novas instituições e ar- e Stelo) e o surgimento das fintechs no país.
ranjos de pagamento. Depois de mais de 200 anos de sistema
bancário, pela primeira vez uma instituição não bancária pode- EMERGÊNCIA DAS FINTECHS
ria prestar serviço nesse mercado, com a abertura de contas e Fintechs é um termo que vem de financial technologies.
manutenção de depósitos à vista para cidadãos brasileiros. O Tem sido empregado para identificar novos empreendimen-
fato motivador era que, em dois séculos de existência, o siste- tos apoiados no uso intensivo de plataformas tecnológicas,
ma bancário tradicional atendia a somente metade da popula- os quais visam oferecer serviços financeiros por meio de mo-
ção economicamente ativa no país, e algo precisava ser feito no delos de negócio inovadores. Geralmente, são voltados para
sentido de promover maior inclusão financeira. novos públicos, incluindo clientes jovens e potenciais clientes
Mais do que aprimorar o atual sistema de pagamentos e precariamente atendidos pelo sistema financeiro tradicional.
cartões, o Bacen vislumbrava a emergência de inovadores Tendo em vista a abertura regulatória, a disponibilidade
modelos de negócio baseados em novas tecnologias. Algo tecnológica, a oportunidade de expandir e baratear os servi-
como retornar à simplicidade da ideia original da Diners, ços financeiros básicos e a possiblidade de ampliar a propos-
porém sem abrir mão dos benefícios da era digital. A aposta ta de valor a clientes, muitas fintechs emergiram no cenário
estava no potencial transformacional dos serviços de mobi- nacional, atuando em lacunas do setor financeiro. Grandes
le payments (pagamentos móveis). são as expectativas, porém, até o momento, somente alguns
A tecnologia, que permitiu a intermediação do sistema de poucos empreendimentos alcançaram massa crítica em suas
cartões e sua expansão, poderia permitir agora a desinterme- operações, como Catarse, MercadoPago, PagSeguro e Zuum.
diação em um ecossistema ampliado de pagamentos. A ideia Muitos empreendimentos com finalidades diversas estão
não era eliminar todos os agentes do processo, mas repensar sendo considerados fintechs, desde as startups de serviços
suas propostas de valor e principalmente a eficiência dos mo- financeiros - incluindo os serviços de mobile payments, mo-
delos com topologias mais enxutas. Alguns casos de sucesso bile wallets (carteiras digitais), P2P lending (empréstimos
internacionais ilustravam essa ideia, como o serviço M-Pesa diretos entre pessoas) e iniciativas de crowdfunding (finan-
de pagamentos móveis, no Quênia, focado na população de ciamento coletivo) - até os bancos comunitários, que pro-
baixa renda; PayPal, de pagamentos e transferências eletrôni- movem moedas sociais digitais e novos bancos e cartões de
cas; e TransferWise, para remessas internacionais de dinheiro. crédito com exatamente a mesma lógica tradicional, porém
Em todos esses casos, alguns pontos eram comuns: a tecno- com operação preponderantemente digital.
logia já estava disponível nas mãos dos usuários, das empresas Contudo, talvez nem todos esses empreendimentos sejam,
e até mesmo para parte da população de baixa renda desban- de fato, fintechs. É inegável que buscam promover mais efi-
carizada; os serviços financeiros tradicionais não correspon- ciência nos mercados em que atuam e o Bacen parece estar
diam às reais necessidades nem às expectativas dos clientes; atento a esse movimento de inovações no setor financeiro.
a operação era estruturada por poucos agentes intermediários
e, frequentemente, por somente um provedor da plataforma. ESTÍMULO AO
Algumas questões permaneciam em discussão em relação CRESCIMENTO ECONÔMICO
aos meios tradicionais de pagamento, como os cartões de Em dezembro de 2016, o governo federal anunciou al-
crédito. Por que uma organização estrangeira, como uma gumas medidas que buscavam fomentar a retomada do
bandeira de cartão de crédito, precisaria ser remunerada com crescimento econômico. Mais uma vez, o Bacen mirou o
royalties nas transações realizadas entre dois brasileiros, no consolidado mercado de cartões, justamente por sua im-
Brasil, frequentemente de forma presencial? Eram de fato portância na economia.
Com as novas tecnologias, o mercado de meios de pagamento está em transformação. Têm surgido, por exemplo, al-
ternativas para substituir as “maquininhas de cartão” por carteiras virtuais. Serviços como PayPal, Samsung Pay e Apple Pay
estão cada vez mais populares.
No Brasil, opera o PicPay, um aplicativo que permite transferências peer-to-peer (entre pessoas), eliminando o intermediário
e reduzindo, assim, o custo de transação por cliente. O aplicativo permite receber e enviar pagamentos para qualquer pessoa
pelo smartphone, de graça e instantaneamente. É possível, por exemplo, dividir a conta do bar ou rachar o presente de aniversá-
rio do amigo, desde que os devedores ou credores também baixem o aplicativo. A conta é carregada via cartão de crédito. Só
paga uma taxa, de 4,89%, quem utiliza o PicPay comercialmente para receber pagamentos pela venda de produtos ou serviços.
Outra tendência, conectada com as carteiras virtuais, são as plataformas de APIs (interface de programação de apli-
cativos). Ou seja, bancos e empresas do setor financeiro podem interligar serviços de outras organizações. Por exemplo, o
Banco Original lançou o Open Banking, uma nova plataforma que permite a integração de diversos aplicativos com
os serviços do banco. Os clientes podem transferir dinheiro da conta-corrente para a carteira virtual do PicPay, assim
como consultar saldo e extrato diretamente pelo Messenger do Facebook.
As transformações digitais continuam em ritmo acelerado e os bancos estão sendo desafiados a inovar
seu modelo de negócios. As fintechs, empresas que unem a tecnologia aos serviços financeiros, assim como
os bancos digitais, estão se expandido rapidamente e ofertando cada vez mais serviços inovadores. Quem
sai ganhando com todas essas inovações é o cliente.
NORBERTO MARQUE > Superintendente de Arquitetura do Banco Original > norberto.marque@original.com.br
Entre as medidas anunciadas naquele momento e no iní- físico também acarreta custos e riscos operacionais, os quais
cio de 2017, estavam: redução do prazo para pagamento precisam ser adequadamente avaliados pelos comerciantes.
aos comerciantes de 28 para 2 dias; possibilidade de dife- Além disso, recentes inovações em meios de pagamento
renciação de preço no varejo em função do meio de paga- podem se difundir no Brasil, em um futuro próximo, como as
mento utilizado; e limite de 30 dias de incidência de juros criptomoedas (bitcoins) e os serviços de pagamento integrados
no cheque especial, devendo a dívida ser transferida para a aplicativos de mensageria (WeChat e os recém-anunciados
outra linha de crédito após esse período. pagamentos via WhatsApp e Facebook Messenger), impul-
Essas medidas visam reduzir o custo de capital para os sionando o uso de alternativas eletrônicas. Novamente, so-
comerciantes, aliviando a pressão sobre os preços no va- luções digitais colocam em xeque os modelos de negócio já
rejo; reduzir as taxas e incentivar a utilização de meios de consolidados, pressionando as instituições financeiras tradi-
pagamento digitais mais baratos, inclusive aqueles não ba- cionais, as fintechs e o próprio regulador a continuar inovando.
seados em cartões; e diminuir a inadimplência dos clientes, Apesar dos riscos e desafios a serem superados, os meios
ao estruturar melhor suas dívidas. de pagamento eletrônicos continuam representando grande
De certa forma, o Bacen aposta na redução das taxas potencial transformacional nos serviços financeiros presta-
cobradas no uso de cartões, especialmente na modalidade dos à população, tendo papel importante tanto na inclusão
débito, assim como na maior utilização de outros meios financeira quanto no desenvolvimento econômico do país.
eletrônicos e serviços de pagamento. Porém há um risco
a ser contornado: tais medidas podem, eventualmente,
incentivar a utilização de dinheiro vivo no varejo, algo PARA SABER MAIS:
- Adrian Kemmer Cernev, Eduardo Henrique Diniz, Lauro Emilio Gonzalez Farias e João
diametralmente oposto ao intencionado. Isso porque os Porto de Albuquerque. Mobile Payments in Brazil: how to make it happen? The European
comerciantes podem estabelecer preços ainda mais bara- Financial Review, 2013.
- João Porto de Albuquerque, Eduardo Henrique Diniz e Adrian Kemmer Cernev. Mobile
tos para pagamentos em dinheiro, pois sobre esse instru- payments: a scoping study of the literature and issues for future research. Information
bido na utilização do papel-moeda. Afinal, o uso do dinheiro ADRIAN KEMMER CERNEV > Professor da FGV EAESP > adrian.cernev@fgv.br
E
m outubro de 2008, a crise financeira mun- sistema em rede computacional descentralizada, desenhada
dial atingiu seu auge, com diversos governos especificamente para esse tipo de transação.
tidos como liberais e não intervencionistas Claramente contra o sistema financeiro que estava em
atuando para salvar as empresas do setor. Foi convulsão, o artigo propunha um sistema de pagamento
quando apareceu publicado em um grupo de baseado em tecnologia de criptografia. Lançada em janeiro
discussão sobre criptografia o artigo Bitcoin: de 2009, a nova criptomoeda, bitcoin, só foi chamar atenção
a peer-to-peer electronic cash system, assina- em abril de 2011, quando a revista Forbes publicou uma
do por um obscuro (e até hoje sem identificação confirmada) matéria sobre o tema. Enquanto o interesse pela moeda se
Satoshi Nakamoto. Esse artigo propunha “uma versão de di- acelerava, mais notícias eram produzidas sobre ela, e uma
nheiro eletrônico que permite pagamentos on-line enviados corrida aos bitcoins passou a ser percebida.
diretamente de pessoa a pessoa sem passar por uma institui- Depois de atingir um pico de valorização, em junho de
ção financeira”. Em sua essência, demonstrava a viabilidade 2011, apareceram as primeiras notícias de fraude no mundo
de um sistema de criptografia que garantiria a autenticidade bitcoin, derrubando seu valor. Essa primeira “crise” do
de pagamentos eletrônicos com o uso de uma moeda espe- bitcoin gerou dois efeitos importantes. O primeiro foi a
cífica, o bitcoin, para quem se dispusesse a participar de um mobilização da comunidade que apoiava o desenvolvimento
1 2 3
“A” deseja fazer uma É criado o primeiro bloco O bloco é transmitido
transferência de on-line para representar a a cada parte na rede
dinheiro para “B” transação
4 5 6
Os participantes da O bloco é adicionado à
“B” recebe o
rede aprovam e validam cadeia, que mantém registro
dinheiro de “A”
a transação permanente da transação
FONTE: @PDFORREST
PROTECIONISMO,
DÍVIDA PÚBLICA E
RETOMADA DO CRESCIMENTO
O protecionismo do presidente Donald Trump ame- Mas tais vantagens podem ser anuladas se os com-
aça agravar a crise econômica que assola o mundo e, pradores jogarem na retranca do outro lado do balcão.
principalmente, o Brasil. Quem não exporta ou exporta menos fará o mesmo
Lembremos que em 1930, nos Estados Unidos, a Lei com as importações; a China, por exemplo, maior
Smoot-Hawley, aprovada para evitar o desemprego resul- exportadora de calçados do mundo, é a maior impor-
tante da crise de 1929, elevou as tarifas médias de importa- tadora de couro do Brasil.
ção de 13,5% para 19,5% de mais de 20 mil produtos. Em Infelizmente, também existem outras ameaças para
3.200 itens, essa majoração alcançou quase 60%. Tentando a retomada do crescimento: além de a dívida públi-
proteger os empregos domésticos, tal medida contribuiu ca ter alcançado mais de R$ 3,1 trilhões, um deficit
para que ocorresse exatamente o contrário nos anos se- extra de aproximadamente R$ 58 bilhões em 2017
guintes: o comércio exterior norte-americano encolheu obrigou o governo a ensaiar um aumento de impos-
mais de 60%. Em protesto, os afetados tos. No entanto, diante do estrilo dos
impuseram barreiras contra os produtos empresários, preferiu-se cortar des-
norte-americanos e o desemprego no país pesas. São notícias ruins para os mais
saltou de 7,8%, quando a lei foi aprovada, pobres, que dependem dos serviços
para mais de 25%, em 1933.
AMERICA FIRST! públicos. Escaldados com a propos-
Bem, hoje a situação é diferente. A eco- RESTA SABER SE ta de terem de trabalhar mais para se
nomia estadunidense superou a crise de aposentar, percebem que nem os pés-
2008, o desemprego diminuiu expressi- ALGUÉM VEM simos serviços ainda brindados estarão
vamente e acordos de comércio no âmbi- garantidos no futuro.
to da Organização Mundial do Comércio
EM SEGUNDO... O presidente Michel Temer tirou da car-
(OMC) tornam políticas protecionistas tola duas medidas para agradar a tigrada:
mais difíceis de serem implementadas. o saque das contas inativas do Fundo de
Mas o presidente Trump já sinalizou seu Garantia por Tempo de Serviço (FGTS)
solene desprezo por instituições e acordos, especialmente e a transposição das águas do São Francisco. Mas tais
internacionais. Por exemplo, o recente estímulo à pro- ações não “colaram” e, nas pesquisas de opinião, não
dução e ao uso do carvão praticamente tira os Estados compensaram as maldades que, aos olhos do povão, ele
Unidos do Acordo de Paris sobre as mudanças climáticas. se especializou em fazer.
Tais políticas protecionistas e isolacionistas podem O paradoxo é que “sem essas medidas impopulares”
prejudicar nossa recuperação. Nossos últimos ciclos re- o governo corre o risco de perder o apoio dos empre-
cessivos começaram a ser superados pela reanimação sários. A ampliação do repúdio das ruas também pode
da indústria, com a retomada das exportações de ma- contaminar sua base de sustentação no Congresso,
nufaturados. A prolongada recessão encarregou-se de e, sem as reformas, especialmente a da Previdência,
criar três condições favoráveis a essas vendas: a desva- ele passa de útil a estorvo. Como um beija-flor, res-
lorização do câmbio, o barateamento da mão de obra e taria apoiar-se na própria vibração do autoengano.
a retração do mercado interno. Mas isso já causou a queda da antecessora.
OBRA
DE DEUS
A Londres de 1952 traz uma história de grande menos de 5 anos morrem todos os anos por problemas
aprendizado para os dias de hoje. Naquele ano, a ci- ligados à poluição ambiental.
dade foi invadida por uma densa fumaça tóxica, co- Diferentemente de Churchill, Trump acusa não o al-
nhecida como The great smog of London ─ episódio goz divino, mas uma conspiração chinesa para minar
bem retratado na série The Crown, da Netflix ─, que a soberania americana. A América deve ser grande de
fez ao menos quatro mil vítimas fatais. novo, e o meio ambiente ─ além dos chineses ─ é o
A capital inglesa era abastecida por termoelétricas a principal obstáculo. Enquanto assistimos a um expres-
carvão de péssima qualidade, com alto grau de enxo- sivo desinvestimento em óleo e gás no mundo e um
fre. Devido ao clima frio, à ausência de vento e a um crescimento exponencial das fontes renováveis, é difí-
anticiclone, a fumaça invadiu a cidade, causando uma cil acreditar que a recente aproximação entre Estados
das maiores tragédias ambientais do país. Questionado Unidos e Rússia não passe por negócios com petróleo.
por desconsiderar alertas dos meteoro- A onda conservadora que deteriora di-
logistas e por insistir na manutenção É PRECISO ENGAJAR-SE reitos socioambientais não se restringe ao
de uma política energética baseada no Hemisfério Norte. No Brasil, assiste-se à
carvão, o primeiro-ministro Winston EM DEBATES E simplificação do licenciamento ambiental
Churchill disse algo parecido com: “É o por meio da redução do tempo para ava-
clima! É passageiro! Não há o que fa-
BUSCAR ALTERNATIVAS liação de projetos, da impossibilidade de
zer! É a vontade de Deus!”. NAS QUESTÕES embargo de empreendimentos, da dispen-
O episódio terminou com grandes sa de licenciamento para algumas ativida-
debates sobre políticas de controle de SOCIOAMBIENTAIS. des, da não obrigatoriedade de consulta
poluição e com a emissão do City of às populações, entre outros retrocessos.
London (various Powers) Act, de 1952,
CHURCHILL REZARIA, Igualmente preocupante é a situa-
e o Clean Air Act, de 1954. DONALD TWEETA. PARA ção da demarcação de terras indíge-
Dois terços de século depois, outro nas, colocada em questão por medidas
chefe de Estado despreza a ciência e revi- NÓS, O QUE RESTA É AGIR. como a PEC 215 e a Portaria 80/2017,
gora a indústria de combustíveis fósseis, que transferem e relativizam poderes
além de dizimar a Agência de Proteção Ambiental dos da Fundação Nacional do Índio (Funai) em favor de
Estados Unidos (Environmental Protection Agency outras instâncias. Recentemente, o órgão responsável
- EPA) e destruir a legislação sobre mudança do cli- por proteger os direitos indígenas sofreu ainda corte de
ma. Em poucos meses, Donald Trump nomeou Rex 20% em seu corpo técnico, atingindo especialmente a
Tillerson, ex-CEO da ExxonMobil, como secretário coordenação que supervisiona o licenciamento de gran-
de Estado; tirou das cinzas o oleoduto Dakota, obra des empreendimentos e os impactos sobre essas terras.
cancelada pelo presidente Barack Obama e que cruza Em meio a tantas más notícias que ameaçam os di-
o território sagrado dos Sioux; e reativou o gasoduto reitos fundamentais das gerações de hoje e do futuro,
Keystone XL no qual é transportado petróleo da pro- mais do que nunca é preciso acreditar na humanida-
vincial Alberta, no Canadá, para refinarias em Illinois de. Não só indignar-se, mas engajar-se em debates,
e no Texas. Enquanto isso, a Organização Mundial da estimular a busca por alternativas. Churchill rezaria,
Saúde (OMS) relata que 1,7 milhão de crianças com Donald tweeta. Para nós, o que resta é agir.
C O N H E C I M E N TO E I M PAC TO E M G E S TÃO
w w w. fg v. b r / g v e x e c u t i v o
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VOLUME 16, NÚMERO 2
NA ERA DIGITAL | GERAÇÃO DE VALOR DA TI
MARÇO/ABRIL 2017