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VIÇOSA
MINAS GERAIS - BRASIL
AGOSTO/2012
UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS
DEPARTAMENTO DE ECONOMIA RURAL
RESUMO
Data: ___/___/___
que o homem, desde que começou a dominar a natureza, sobretudo, a agricultura, passou a ter
uma relação de exploração dos recursos naturais, até então utilizada somente como forma de
socioambientais, em seu conceito mais clássico, surgem quando determinados atores sociais
dado espaço, objetivando assim, anular os efeitos interativos de outros atores sobre aquele
espaço de disputa.
Neste sentido este relatório teve por intento apresentar o emblemático caso da
comunidade rural de São Sebastião do Soberbo, distrito de Santa Cruz do Escalvado - MG,
que fora atingida pela construção da UHE (Usina Hidrelétrica de Energia) Risoleta Neves.
Este caso que ficou conhecido como Candonga, nome do consórcio responsável pela
construção do empreendimento, formado pela Companhia Vale do Rio Doce e pela Alcan
Alumínio1 do Brasil, encontra-se em um embate que já dura mais de dez anos e pode ser
exemplo de luta entre uma comunidade rural e empreendedores dotados de grandes poderes
econômicos e político, demonstrando assim, um acirrado jogo de interesses que permeia por
1
Atualmente esse consórcio está sendo administrado pela Companhia Vale do Rio Doce e Novelis Aluminum.
A UHE Risoleta Neves está situada na bacia hidrográfica do Rio Doce, entre os
inauguração da usina aconteceu em 2005 pelo então deputado Aécio Neves, que na
oportunidade homenageou sua avó Risoleta Neves ao colocar o seu nome na usina. Entretanto,
cabe ressaltar que o processo começara muito antes, em 1996, com os primeiros estudos de
do projeto.
composto por famílias de baixa renda e escolaridade, onde a dinâmica econômica era
Em época de seca a maioria das famílias explorava o ouro por meio da faiscação2 e em tempos
de chuvas trabalhavam como meeiras ou exploravam sua própria terra (PENIDO, 2008;
PINTO e PEREIRA, 2005). Abaixo, na Figura 1, pode ser visto uma foto de como era São
2
Pequena extração realizada no rio pelo trabalho do próprio garimpeiro.
Figura 1- Reunião na praça da antiga comunidade de São Sebastião
algumas reuniões que a princípio serviriam para elucidar o processo. Segundo Barros e
Sylvestre (2004) no ano 2000 aconteceu a primeira audiência pública para explanar as nuanças
do projeto, todavia, o que se viu foi um discurso completamente tecnicista utilizado por
Até 2004, em média 150 famílias foram realocadas para o reassentamento intitulado
Novo Soberbo, mas no total foram 270 famílias afetadas diretamente, que não foram
reconhecidas ou foram reassentadas em outro lugar. Vale ressaltar que 14 famílias resistiram
até o fim, quando por intermédio de força policial (Figura 2) foram transferidos. O dia 3 de
maio de 2004 – em que foi removido as 14 famílias - ficou marcado pela indignação da
comunidade a ter que deixar seus lugares de origem. Neste mesmo ano o Núcleo de
Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (NACAB) entrou com uma ação civil
2008). Não obstante, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, anulou a decisão que impedia o
o reassentamento.
entre o empreendedor responsável pela obra e a comunidade atingida, que via de regra, tem
teve sua licença de operação caçada pelo Tribunal de Justiça Ambiental: “Diante da ausência
sua anulação, sob pena de ofensa ao texto constitucional e legal” (OBSERVATÓRIO SÓCIO-
na prática, mas, ainda sim, se tornou uma grande conquista dos movimentos sociais.
demonstrando uma aguçada assimetria de poderes entre os mesmos. Deste modo, esta
1- REVISÃO DE LITERATURA
Nesta seção serão apresentadas algumas discussões que foram indispensáveis para a
riquezas naturais em nossas terras e pelo modelo desenvolvimentista adotado pelo Estado que
desenvolvimento, socialmente mais justo. Segundo Berman (2007, p.2) são mais de “[...]
"deslocamento compulsório" – de cerca de 200 mil famílias, todas elas populações ribeirinhas
diretamente atingidas”.
percebe-se que a partir da Revolução de 1930 houve uma crescente demanda oriunda do
exploração das águas e do potencial energético no país. A partir de 1940, com a crescente
demanda por energia, ocorreu um gradativo processo de substituição das PCHs (superior a 1
MW e inferior a 30 MW) pelas UHEs (acima de 30 MW). Seguido pelo regime militar entre
Destarte, é possível verificar que a materialização dos anseios e dos desejos do homem
moderno perpassa pela questão do uso da energia, sendo um dos fatores chave do processo de
modernidade culminando em uma pressão para que a geração de energia seja muito forte em
diversos setores da sociedade. Não obstante, este novo modo de agir/viver da sociedade tem
acarretado diversos impactos socioambientais, para as comunidades atingidas colocando em
humanidade, pois antes mesmo da formação das escolas de pensamento da Grécia Antiga,
contribuíram para a análise dessas formas violentas de conflitos, ou mesmo, para outras
formas menos agressivas de embates entre indivíduos, grupos sociais, e até mesmo, Estados.
piores problemas enfrentados pela sociedade mundial. Antes, a crise se limitava a Europa e
para resolver o problema de escassez de alimentos, ocupação e espaço para uma grande massa
europeia houve o deslocamento para terras pouco povoadas, sobretudo, nas Américas com a
não mais haveria "terras novas" férteis e "disponíveis" para enviar milhares de pessoas
temática conflito. Por isso, tentaremos trazer aqui uma breve abordagem dos conflitos
socioambientais, construindo um conceito que melhor atenda nosso trabalho e que possibilite
Mineira.
Segundo Schimid (1997 apud VARGAS 2007), até pouco tempo os estudos referentes
aos conflitos oscilavam entre duas correntes teóricas, a objetivista e a subjetivista. A primeira
sociedade, portanto o conflito poderia existir independente das percepções das partes
Têm aqueles que reduzem o conflito socioambiental a uma questão de ordem econômica, tem
aqueles conflitos vistos sob a ótica sociológica e antropológica, e de maneira bastante presente
simbólicos.
ingredientes cosmológicos, rituais, identitários e morais, que por vezes passam despercebidas
aos olhares de outras linhas de conhecimentos. Nesse sentido, para o autor, a etnografia dos
Atualmente, uma vertente das ciências sociais chama a atenção por englobar os seres
política. A ecologia política, segundo Laschefski e Costa (2008), está pautada na análise dos
problemas ambientais no contexto sócio político focalizando a identificação dos atores sociais
e os seus interesses específicos. De maneira mais detalhada Little (2004) aponta alguns
fauna e flora e os fluxos hídricos, assim como a identificação das principais atividades
E por fim, "[...] a ecologia política é uma metodologia na qual as relações são o foco
de análise. Essas relações se expressam mediante múltiplas esferas de interação, cada um das
quais tem suas próprias regras e normas de funcionamento." (LITTLE, 2004, p.2).
Nesse sentido um assunto pouco estudado se refere a evolução destes conflitos. Por mais que
rio e da terra de outrora, este tipo de embate evolui para outras formas. Isto é, a obra
aconteceu e o deslocamento também, o que resta é a busca dos interesses das partes
envolvidas que pode ser resumido em: condicionantes supostamente não cumpridas, as quais
são reivindicadas pelos atingidos; a minimização dos custos de cumprimento das pendências
país por parte dos movimentos sociais; dentre outros. Mas nenhum desses está ligado a
preservação do meio ambiente em seu sentido mais restrito, que muitas vezes foram “gritos de
tornam cada vez mais em buscar as realizações pessoais do que de um coletivo maior. Ainda
assim, os líderes dessas comunidades impactadas guardam dentro de si um senso de luta por
todos, caso contrário estes não investiriam boa parte de seu tempo em enfretamentos contra os
comunidade podendo ocorrer inclusive uma ruptura de amizades. Às vezes, pelo simples fato
de uma parte desistir da luta pautada pela outra, ou até mesmo por cooperar com o
empreendedor pode ser motivo para o surgimento de um conflito interno. A partir de então,
começa um processo de fofocas que pode agravar ainda mais o conflito instaurado. Rumores
surgem na comunidade, sejam notícias boas ou ruins e vai se alastrando de forma distorcida
entre os moradores.
Outra característica é que durante os anos o conflito também pode ser mais visível ou
mais latente. Isto acontece porque sempre vão surgindo novos elementos nos conflitos o que
pode acarretar o desânimo ou um incentivo paras as partes. Um exemplo é quando chega perto
da renovação da Licença de Operação, pois para a comunidade que resiste e para os órgãos
pendências que existem por parte do empreendedor. Assim, diante desta oportunidade a
O problema é que tão logo aparece uma assimetria de poderes entre os atores sociais
envolvidos e com isso a renovação deste tipo de licença, via de regra, acontece, demonstrando
intensidade do conflito diminui até que apareça um novo fato que venha reerguer um dos
lados. A exceção cabe aos líderes das comunidades que não deixam de agir em nenhum
funcionamento da sociedade do que no meio ambiente (em seu sentido restrito de natureza).
Em verdade, usar o termo conflito ambiental ou socioambiental poderia ser apenas uma
mudança de valor semântico das palavras para aqueles que entendem o meio ambiente
composto pela natureza e as relações sociais. Por isso, muitos defendem que usar o termo
território está ligado as noções de lugar, a paisagem e o próprio espaço (SOUSA e PEDON,
2007). Todavia, entendemos que as definições de território para uma comunidade rural estão
muito além de uma simples base física, atrelada a custos de transporte e de comunicação. Um
resistência quando se sentem ameaçados por atores externos dentro de seu próprio território.
Pode surgir daí ações coletivas iniciadas por movimentos sociais de base com o intuito de
identidade territorial pode ser construída a partir da perspectiva de coletividade, para que
disputa pela apropriação do espaço, tornado território pelos usos humanos, seja percebendo
governamentais:
As formas de manipulação do espaço, parece claro, não jogam apenas um papel
decisivo para a realização das estratégias político-econômicas dominantes. Elas
podem corresponder também à base para a formulação de propostas minoritárias de
convivência social e a um referencial indispensável para a articulação e/ou
preservação de identidades coletivas diferenciadoras (HAESBAERT, 2002, p.14).
planejamento setorial, especialmente dos setores com o peso do setor de energia, devem
Seguindo essa linha de raciocínio, Nutti (2006) aponta para necessidade de conhecer e
simbólica, entre outras, como também processos de resistência aos atores hegemônicos. Ainda
para a autora, as lutas e conflitos por representação dos usos do território estão acionados
tanto na sociedade de forma geral como nas próprias formulações ideológicas das políticas
Diante das questões supracitadas Acselrad (2010) faz uma ligação entre a emergência
Para Vargas (2007), os recursos na maior parte das vezes são comuns em espaços
sociais onde são estabelecidas relações complexas e desiguais entre distintos atores sociais,
tais como empresários rurais, pequenos agricultores, minorias étnicas, agências do governo,
entre outros. Portanto, aqueles atores com maior acesso ao poder são os que detêm o controle
sobre o acesso e o uso dos recursos naturais.
3 - Materiais e Métodos
amplo. Neste sentido, os estudos de casos além de priorizarem dados qualitativos, possuem
algumas características importantes que devem ser salientadas e que explicam a escolha deste
(II) o pesquisador que escolhe o caminho do estudo de caso deve recorrer a uma grande
variedade de tipos de informantes; (III) o estudo de caso também apresenta diferentes pontos
de vistas sobre uma mesma situação social, não havendo uma única que seja a verdadeira
(RODRIGO, 2008).
Como forma de coleta de dados utilizamos a priori a pesquisa bibliográfica que pode
ser concebida como o processo de buscar elementos importantes – conceitos, dados
secundários, outras experiências - em materiais já publicados como livros, artigos de
periódicos, teses de mestrado e doutorado, materiais disponibilizados na internet, entre outros
(GIL, 2002).
A análise dos dados foi feito por meio da eleição de duas variáveis. A primeira
consiste no discurso dos atores envolvidos no embate, ou seja, por um lado o Consórcio
movimentos sociais enaltece os impactos causados. Assim, o discurso dos atores foi cotejado
com outra variável, a realidade empírica, isto é, a demonstração do que realmente está
acontecendo na comunidade através de uma inserção em seu dia a dia. A posteriori fizemos
5- Objetivos
Gerais
Comunidade de Nova Soberbo - MG, identificando os atores sociais envolvidos bem como as
Específicos
comunidade.
6 - Resultados e discussões
A priori, para o sujeito que está de fora e não tem nenhuma relação com a comunidade
impactada, os efeitos benéficos do desenvolvimento são evidentes, afinal, na sociedade em
que vivemos hoje, quem não precisa de energia elétrica para sobreviver?
Portanto, podemos chegar à conclusão de que o setor elétrico é tido como o segmento
de infraestrutura essencial para o desenvolvimento econômico do país, fato comprovado pelos
grandes investimentos feitos pelo Estado nos últimos anos. No caso do estado de Minas
Gerais, é possível citar os dados do Programa de Geração Hidrelétrico do Estado de Minas
Gerais (PGHMG) 2007-2027, no qual estão previsto a construção de 45 UHEs e 335 PCHs
para o estado de Minas Gerais, totalizando um incremento de 7,7 mil MW, que
corresponderiam a cerca 45 % em relação à potência já instalada (FONSECA, OLIVEIRA e
SOUSA, 2011).
3
Segundo Verdejo (2006, p. 12), a DRP “[...] é um conjunto de técnicas e ferramentas que permitem que as
comunidades façam seu próprio diagnóstico e a partir daí comecem a autogerenciar seu planejamento e
desenvolvimento”.
Figura 4 - Aplicação da metodologia participativa "Realidade Desejo"
Além disso, é importante analisar o papel do Estado neste contexto. Em suas diversas
instâncias, tanto locais, regionais, estaduais quanto federais, o Estado se comporta de forma
diferente perante o caso. Por exemplo, as instituições ambientais representantes do estado de
Minas Gerais têm legitimado as ações do empreendedor, quando permitem o funcionamento
da usina mesmo com diversas pendências constatadas na comunidade, deste modo conferindo
poder de ação ao empreendedor. Por outro lado, o poder municipal, no mandato atual4, tem se
posicionado ao lado da comunidade, dando-lhe apoio em suas reivindicações. Além do mais, a
atuação do Estado pode mudar ao longo da história, estando em certa época ao lado da
comunidade e em outra época ao lado do empreendedor. Mas no fim, de forma geral, o poder
municipal deveria ter como principal propósito mediar os conflitos que se estabelecem nesse
processo de desenvolvimento.
Deste modo, a cota de poder que cada ator social envolvido diretamente nos processos
de desenvolvimento pode acarretar mais benefícios a "uns" e menos a "outros", assim como
prejuízos. Ao mesmo tempo em que a comunidade pode se beneficiar do desenvolvimento, ela
pode ser prejudicada por ele. Além do mais, um desenvolvimento macro pode trazer um
retrocesso no desenvolvimento para as comunidades rurais locais, caso em estudo, já que a
comunidade, que antes sobrevivia da agricultura familiar e das atividades do rio, hoje passa
por dificuldades no meio urbano (reassentamento involuntário) provocadas, mormente, por ter
uma cota de poder inferior, pois não teve possibilidade de escolher ficar em seu local de
origem. Portanto, de qualquer forma, independentemente dos tipos de percepções aqui
apresentadas, fica claro que a comunidade de Nova Soberbo é alvo de um pressuposto
desenvolvimento estabelecido por um sistema - articulação entre o Estado e empreendimentos
privados - aquém de seus limites territoriais, econômicos e políticos.
4
Segundo vários relatos de moradores, na época da construção da barragem, o prefeito abriu as portas para que o
empreendimento fizesse o que quisesse, contudo, o prefeito atual tem aceitação de quase 100% da comunidade.
6.2- Uma análise sob a perspectiva dos atores
Econômico Meu pai foi marrado, ou ele vendia pelo preço Comunidade
que eles quiseram paga ou ele não trazia nada, atingida
ficava sem nada!”(Depoimento6 da sra. M.H.,
2012).
5
Elencamos apenas alguns dizeres já que eles se repetem em várias fontes mudando apenas a forma como é dita.
6
Os depoimentos podem ser encontrados no site < http://www.youtube.com/user/novasoberbo?feature=watch>.
quilos, num tenho salário ,num tem terra
direito pra prantá”(Depoimento do sr. M.A.P,
2012)
Infraestrutura/moradia “Entre os dias 10 e 25 de setembro, o Consórcio Candonga
Consórcio Candonga realizou reparos na rede
de distribuição de água de Sebastião do
Soberbo. Em cumprimento aos procedimentos
padrões foram feitas limpezas em dois poços
que abastecem o sistema da Estação de
Tratamento de Água (ETA)” (CONSÓRCIO
CANDONGA, 2012).
Neste quadro que apresentamos alguns dos discursos dos atores envolvidos no
usina hidrelétrica o empreendedor responsável tem como via de regra, fornecer subsídios para
que a comunidade reassentada restabeleça novas formas de geração de renda que são
outro lado a comunidade diz que os projetos de Reativação Econômica não vêm dando certo.
social dos moradores da comunidade, isto é, por algum motivo os projetos propostos pelo
empreendedor não tem obtido êxito. Uma grande parte da população teve uma piora na renda
(Gráfico 1) após a ida para o reassentamento demonstrado pelas respostas das entrevistas que
Este problema de geração de renda ainda é agravado por dois outros fatores que afetam
diretamente até mesmo aqueles que responderam que a renda não melhorou nem pirou: (I)
Inicialmente os gastos por morar no reassentamento aumentaram. Por exemplo, o gasto com o
a conta de luz, já que antes pagavam luz rural e agora pagam tarifas urbanas que são mais
caras. Outro problema averiguado (II) foi que na Velha Soberbo eles produziam praticamente
tudo que consumiam e agora, com vida em perímetro urbano precisam comprar muitos
gêneros alimentícios. Estes dois agravantes podem ser averiguado em diversas falas dos
moradores:
“La cê tinha muita coisa. Se precisava de pagar uma luz, vendia ovo e pagava. Se
precisava de galinha não precisava preocupar que tinha. Lá precisava de tá
comprando. Lá tinha casa que não era tão bonita, não adianta casa bonita e bolso
vazio.” (Senhor A, 2012)
“Porque antes tirava da terra para sobreviver. Não salário mas tirava da terra.”
(Senhora V, 2012)
“Lá tinha mais plantação. Plantava arroz, feijão e milho.” (Senhor E, 2012)
“Luz é um absurdo, lá era barato. Casa é mais difícil de limpar, gasta mais produtos
de limpeza, piso branco. O que custo de vida é mais alto em relação ao anterior.
Tenho que compra a 10 reais o carrinho de lenha, antes buscava lenha no rio ou na
mata perto de casa.” (Senhora C, 2012)
Outro fator que demonstra um confronto no discurso dos atores envolvidos se refere à
entanto vamos elencar dois que está diretamente ligado a condições básicas de sobrevivência
da comunidade: (I) o primeiro se refere a condição das casas do reassentamento que podem
entrevistados alegaram a melhora nas moradias, além do fato de que hoje possui asfalto, o que
velhos. A perda do quintal, a cozinha voltada para a rua e as lembranças da casa antiga supera os padrões
Ademais, (II) o quintal para as comunidades rurais constitui em um importante espaço de socialização
e de complemento dos gastos domésticos. Segundo 94% (Gráfico 3) dos moradores entrevistados o quintal no
reassentamento é pior do que aqueles que possuíam na Antiga Soberbo. Isso pode ser explicado talvez pelo
tamanho, já que estes foram drasticamente reduzidos por estarem em um complexo urbano e, além do mais, a
terra é improdutiva, existem limitações do que plantar7 e quanto a criação de alguns animais.
7
Esta limitação ocorre, sobretudo, pelo tamanho das culturas já que as casas são muito próximas uma das outras incidindo um risco
sobre as mesmas.
A coisa se agrava quando tocamos no assunto saúde pública. Todas as famílias abordadas reclamaram
do problema da água, mesmo que no discurso o empreendedor diz que este problema já foi resolvido. Nas
oportunidades de incursão à comunidade podemos observar que todas não utilizam a água para beber, pois
esta exala um mau cheiro e possui uma cor amarelada. Toda a comunidade busca água em uma bica, que com
educação, como por exemplo, aulas de bordado, ginástica para idosos, filme na praça, entre outros. A
realidade empírica não refuta tal discurso, entretanto há uma baixíssima participação da comunidade. Existe
uma resistência programada por parte dos moradores em participar de alguns eventos realizados pelo
Consórcio. Talvez, o maior problema seja que existem diversos cursos (costura, de vigilante, etc.) que são
divulgados como geração de renda, o que não é verdade. Quanto à educação, foi identificado que existe uma
Por fim, inferimos que vão existir diversos pontos negativos contra o empreendedor, tais como
pessoas que não foram indenizadas justamente, coerção por parte dos funcionários do Consórcio, descaso,
abuso social, dentre outros. Por outro lado o empreendedor não economizará nos discursos e no marketing
visual – principalmente fotos – para provar que ela cumpre com todas as condicionantes e medidas
mitigadoras dos impactos sociais, econômicos e ambientais desde a construção da usina. Infelizmente, é
assim que se constrói um conflito, ou seja, quando existem partes divergentes. Não obstante, chamamos a
atenção que o embate possui agora diversos focos de conflitos que são cada vez menos ligados ao meio
ambiente, e passam a ser muito mais político e social. É o que defendemos como conflitos socioambientais.
32
7 - Considerações finais
O mundo no qual vivemos hoje é fruto de um desenvolvimento, caso contrário, nem as linhas que
permeiam este texto seria possível concretizar. Percebemos neste trabalho que o problema não está em buscar
o progresso, mas talvez de como isso tenha sido feito. Os custos de um desenvolvimento quando recaem
sobre pequenos grupos sociais é sinal de que talvez possa estar havendo uma evolução desigual.
Outro ponto que percebemos ter sido essencial e que talvez possa explicar essa dicotomia entre o
desenvolvimento de "uns" e o retrocesso de "outros" é o fator econômico. Segundo especialistas, a energia
gerada através das usinas hidrelétricas é limpa e barata, mas existem também outros tipos de energias limpas
como a solar, a eólica, biogás, entre outras, que são menos impactantes. Entretanto, o que tem pesado, entre
outros fatores, é o econômico. Primeiro, pelos investimentos caros em pesquisa e execução dessas formas
alternativas de geração de energia, segundo, pelo lucro que as empresas privadas têm conseguido pela
produção deste tipo de energia.
Ademais, percebemos neste estudo que a análise de um conflito socioambiental configura num
esforço metodológico maior de ir além do que está explícito, ou seja, existem motivações e verdades latentes
que só vão vir à tona pela imersão total no objeto de estudo, por aqueles que buscam tal compreensão. O
indivíduo que está em sua casa e vê uma propagando de geração de energia tem as melhores impressões sobre
a mesma. Isto se dá, pois a construção de uma usina hidrelétrica vem, a princípio, cobrir os anseios de uma
sociedade moderna cada vez mais demandante de energia. Além do mais, estas empresas em suas
33
Isto nos faz refletir que, devido ao pouco acesso a recursos econômicos e tecnológicos, os problemas
de uma comunidade rural dificilmente chegarão aos ouvidos daquele mesmo indivíduo que estava assistindo
em sua tv uma propaganda dos benefícios da geração de energia. Por isso é possível perceber uma forte
assimetria de poderes no caso aqui apresentado, entre a comunidade rural de Novo Soberbo – teoricamente
De forma inevitável o conflito socioambiental instaurado no caso Candonga toma variadas formas e
passa ter como foco principal o confronto nas ideias e nos argumentos, materializados, sobretudo, pelas lutas
judicias. Concluímos assim que a análise deste tipo de embate envolve dinâmicas muito complexas e existem
muitos outros atores sociais envolvidos que tem influência direta nos acontecimentos, isto é, necessita um
estudo muito mais profundo do que o proposto neste papper. Ainda sim, de forma simples, este trabalho tem
potencial para contribuir com os debates acerca desta temática que cada vez mais vem ganhando força na
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