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REVISTA HISTÓRICO E
GEOGRÁFICO
DO MARANHÃO
Número 42 – SETEMBRO DE 2012 ISSN 1981-7770
COLETANEA
SEMINÁRIOS 4, 5, e 6
Edição Eletrônica
http://issuu.com/leovaz/docs/
Revista do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão, v.1, n.1 (ago. 1926) - São Luís: IHGM,
SETEMBRO DE 2012.
n. 42, setembro de 2012. Edição eletrônica
http://issuu.com/leovaz/docs/
ISSN: 1981-7770
p. 415
CDD: 918.21
CDU: 918.121 + 981.21
ISSN 1981 – 7770
NO 42 – SETEMBRO – 2012
EDIÇÃO ELETRÔNICA
Rua de Santa Rita, 230 – Centro - Edifício Prof. Antonio Lopes – 2º. Andar
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As idéias e opiniões emitidas em artigos ou notas assinadas são de responsabilidade
dos respectivos autores.
VI – A Diretoria do IHGM designará anualmente por portaria três (3) membros de seu
quadro de sócios efetivos com três (3) suplentes para comporem a Comissão de
Leitura, sendo o julgamento por votação com parecer escrito considerado
irrevogável.
Os suplentes serão, automaticamente, convocados pela ordem, quando houver
impedimento de quaisquer dos membros efetivos da mencionada Comissão.
VII – Os casos omissos serão decididos de comum acordo pela Diretoria do IHGM e
pela Comissão de Leitura e, em ultima Instancia pela Assembléia Geral do IHGM.
1
SEGUINS, José de Ribamar. Plano Editorial do IHGM. In Rev. IHGM, São Luís, ano LIX, n. 07,
dezembro de 1984, p. 83-84
SUMÁRIO
PLANO EDITORIAL DO IHGM 4
SUMÁRIO 5
LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ
10
APRESENTAÇÃO
Diretoria – Gestão 2012/2014 13
PLANO 21 DA GESTÃO Pe. ANTONIO VIEIRA PARA O
14
BIÊNIO 2012-2014
CALENDÁRIO DE EVENTOS PARA 2012 15
AGENDAMENTO DO CICLO DE PALESTRAS PARA 2012 15
POSSES 16
TELMA BONIFACIO DOS SANTOS REINALDO
DISCURSO DE POSSE DA GESTÃO PE. ANTONIO VIEIRA NO DIA 01 16
DE AGOSTO DE 2012
OSVALDO PEREIRA ROCHA
20
ASSEMBLEIA GERAL DE POSSE NO IHGM
JOSEMAR RAPOSO
POSSE DO PROFESSOR RAIMUNDO NONATO PALHANO NA 21
CADEIRA DE Nº 39
RAIMUNDO PALHANO
ELOGIO AO PATRONO - SABBAS DA COSTA E AS 25
CIRCUNSTÂNCIAS DA HISTÓRIA SOCIAL DO MARANHÃO
ANTONIO NOBERTO
DISCURSO EM RECEPÇÃO A JOSÉ JORGE LEITE SOARES QUE
OCUPARÁ A CADEIRA DE Nº 34, PATRONEADA POR WILSON DA 38
SILVA SOARES, NO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO
MARANHÃO
JOSÉ JORGE LEITE SOARES
DISCURSO DE POSSE NA CADEIRA DE NO. 34, PATRONEADA 43
POR WILSON DA SILVA SOARES EM 20 DE SETEMBRO DE 2012
EDOMIR MARTINS DE OLIVEIRA
47
DISCURSO EM RECEPÇÃO A SOFIANE LABIDI NO IHGM
SOFIANE LABIDI
DISCURSO DE POSSE NA CADEIRA N. 13, PATRONEADA POR 51
RAIMUNDO JOSÉ DE SOUZA GAYOSO
LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ
APRESENTAÇÃO DE ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA, NOVO
55
OCUPANTE DA CADEIRA 10, PATRONEADA PELO PADRE JOSÉ
DE MORAES, em 26 de setembro de 2012
ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA
DISCURSO DE POSSE NA CADEIRA NÚMERO 10, PATRONEADA 64
POR JOSÉ XAVIER DE MORAES DA FONSECA PINTO - Padre
Jesuíta José de Morais (1708-1777[?])
ARTHUR ALMADA LIMA FILHO 69
DISCURSO DE POSSE NO IHGM
IHGM NA MÍDIA 77
TELMA BONIFACIO DOS SANTOS REINALDO CONVITE DA
COMPANHIA VALE DO RIO DOCE AO IHGM PARA APRESENTAR
78
TRABALHO A RESPEITO DAS COMEMORAÇÕES DOS 400 ANOS
DE SÃO LUÍS
MARDEN RAMALHO
PROGRAMA 'EDUCAÇÃO É NOTÍCIA' RECEBE O PROFESSOR
79
EUGES LIMA, DIRETOR DE CULTURA DO SINPROESEMMA E VICE
PRESIDENTE DO IHGM
LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ
Apresentação do Livro: PROCESSO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO
FÍSICA EM IMPERATRIZ-MA – seus personagens e sua trajetória de 80
1973 a 2010, de MOISES CHARLES FERREIRA DOS SANTOS,
Editora Ética, 2012.
ÁLVARO URUBATAN MELO
82
ALCANTARENSES DEPOIS SÃO-BENTUENSES – II
ANTONIO NOBERTO
ESTIVERAM NA FRANÇA EQUINOCIAL E / OU NOS SEUS 84
ANTECEDENTES
NATALINO SALGADO FILHO
86
DIVERSIDADE LOCAL COMO SOLUÇÃO GLOBAL
NATALINO SALGADO FILHO
88
SBPC 2012: UM CENÁRIO DE MÚLTIPLAS POSSIBILIDADES
AYMORÉ ALVIM
90
AS ESTEARIAS DO ENCANTADO
ALDY MELLO
92
RESUMO DE LIVRO: O ENCONTRO
JOAQUIM NAGIB HAICKEL
93
A INDÚSTRIA CINEMATOGRÁFICA DO MARANHÃO
TELMA BONIFACIO DOS SANTOS REINALDO
QUEM QUER DOIS PERDE UM – COM OS PÉS NA ARGENTINA E A 95
CABEÇA NO BRASIL
AYMORÉ DE CASTRO ALVIM
97
OS BABAÇUAIS DE PINHEIRO
OSVALDO PEREIRA ROCHA
99
ADESG NO MARANHÃO
MANOEL SANTOS NETO
100
ALDY MELLO MANDA NOTÍCIAS DO TÚNEL DO TEMPO
JOAQUIM HAICKEL
104
CONTOS, CRÔNICAS, POEMAS & OUTRAS PALAVRAS
LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ
106
O MÚLTIPLO JOAQUIM HAICKEL
NATALINO SALGADO FILHO
109
O LEGADO DE RENATO ARCHER E A SBPC 2012
AYMORÉ DE CASTRO ALVIM
111
DE LONDRES AO RIO DE JANEIRO
ANA LUIZA ALMEIDA FERRO
113
CONVITE AO PASSADO DE SÃO LUÍS
OSVALDO PEREIRA ROCHA
115
ADVOGADO TEM O TÍTULO DE DOUTOR
ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA
117
O PASSADO DEVE SERVIR PARA ALGUMA COISA
ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA
120
TRIUNFO DO ESPÍRITO FESTIVO
ÁLVARO URUBATAN MELO
122
CÔNEGO GREGÓRIO LUÍS DE BARROS - UM SANTO.
OSVALDO PEREIRA ROCHA
124
20 DE AGOSTO - DIA DO MAÇOM
ANA LUIZA ALMEIDA FERRO
LANÇAMENTO DO LIVRO: O NÁUFRAGO E A LINHA DO 125
HORIZONTE: POESIAS
LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ
Apresentação dos Anais do 24º ENAREL – ENCONTRO NACIONAL
126
DE RECREAÇÃO E LAZER: “LAZER E DIVERSIDADE CULTURAL”
São Luís, MA - 28 a 31 de agosto de 2012
ÁLVARO URUBATAN MELO
130
OS FRUTOS DOS CAMPOS DE SÃO BENTO
OSVALDO PEREIRA ROCHA
132
25 DE AGOSTO – FATOS HISTÓRICOS
JOAQUIM HAICKEL
133
MEIA NOITE EM SÃO LUÍS
JOAQUIM HAICKEL
135
MEU AMIGO ROBERTO DUAILIBE CASSAS GOMES
ANA LUIZA ALMEIDA FERRO
WILSON PIRES FERRO 137
SÃO LUÍS, HERDEIRA DA FRANÇA EQUINOCIAL
ANTONIO NOBERTO
141
OS ARTÍFICES E OS DONOS DA FESTA
ANTONIO NOBERTO
A Exposição “FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE” e os quatro 143
séculos da profecia do amor
ANA LUIZA ALMEIDA FERRO
145
O FUNDADOR ESQUECIDO
ANA LUIZA ALMEIDA FERRO
147
CONVITE AO PASSADO DE SÃO LUÍS
ESPECIAL SOBRE OS 400 ANOS DE SÃO LUÍS 149
CRISTINA ROMANELLI
150
PRESENTE DE GREGO
NATALINO SALGADO FILHO
153
SÃO LUÍS: AS HOMENAGENS CONTINUAM
SAMARTONY MARTINS
155
VIDA MISSIONÁRIA DE PADRE BRANDT É CONTADA EM LIVRO
JOAQUIM HAICKEL
157
SAUDADE DE ANTONIO LOBO
NATALINO SALGADO FILHO
159
TURISMO E HOTELARIA NO CONTEXTO DAS CIDADES CRIATIVAS
NATALINO SALGADO FILHO
161
ENSINO A DISTÂNCIA REVOLUCIONA A EDUCAÇÃO NO MUNDO
ÁLVARO URUBATAN MELO
VICTOR LOBATO, O REVOLUCIONÁRIO 163
Fundado em 20 de novembro de 1925, registrado no Conselho Nacional de Serviço Social sob no.
80.578/75, de 14 de setembro de 1955
Reconhecido de Utilidade Pública pela Lei Estadual no. 1.256, de 07 de abril de 1926
Reconhecido de Utilidade Pública pela Lei Municipal no. 3.508, de junho de 1996
Cartório Cantuária Azevedo – Registro Civil de Pessoas Jurídicas – reg. no. 180, registro em
microfilme no. 31063, São Luís, 23 de agosto de 2007
GESTÃO 2012/2014
DIRETORIA
Presidente: Telma Bonifácio dos Santos Reinaldo
Vice-Presidente: Euges Silva de Lima
1ª. Secretaria: Clores Holanda da Silva
2º. Secretario: Antonio José Noberto da Silva
1º. Tesoureiro: Dilercy Aragão Adler
2º. Tesoureiro: Aymoré Castro Alvim
Diretor de Patrimônio: Álvaro Urubatan Melo
Diretor de Divulgação: Manoel Santos Neto
Conselho Fiscal
Titulares : Raul Eduardo de Canedo Vieira da Silva
Maria Esterlina Melo Pereira
José Ribamar Fernandes
10 Reunião de Diretoria
OUTUBRO 24 CICLO DE PALESTRAS Washington Cantanhede
31 ASSEMBLÉIA GERAL
07 Reunião de Diretoria
TERÇA-FEIRA
NOVEMBRO 20 ASSEMBLÉIA GERAL
Aniversário do IHGM
28 CICLO DE PALESTRAS Elisabeth Rodrigues
SEGUNDA-FEIRA –
03 ASSEMBLÉIA GERAL
Aniversário do IHGM
DEZEMBRO
12 Reunião de Diretoria Confraternização Natalina
20 CICLO DE PALESTRAS Revista 43
JOSEMAR RAPOSO
Apresentação do Empossando
Raimundo Nonato Palhano Silva nasceu na cidade Caxias em 30 de agosto de
1947, primeiro filho do casal Aracy Moura Palhano Silva natural de Codó e Pedro
Nunes da Silva Vianense, ambos falecidos. Ela a sempre mãe dedicada à família e as
atividades do lar. Ele ativo agente comercial, à época vendia mercadorias diversas, em
várias cidades do interior maranhense, eram então os bravos caxeiros viajantes - os
transportes rodo-ferroviário eram irregulares e limitados.
Pelo lado materno descendente da família Palhano importantes exportadores de
algodão e arroz, na cidade de Codó - segunda metade do século XIX. Esta conceituada
família formou médicos e engenheiros onde atuaram no estado do Maranhão e fora dele,
sobretudo em obras públicas na área da engenharia e do transporte ferroviário.
Dessa união nasceu seu único filho irmão Ruy Palhano Silva, renomado médico
psiquiatra, professor da Universidade Federal do Maranhão, Membro do Conselho
Regional de Medicina, do Conselho Nacional Antidrogas, Academia Caxiense de
Letras, e Ex Presidente da Academia Maranhense de Medicina. Sua tia mais velha Nair
Palhano Barros irmã da mãe do empossando, a matriarca da família. Este sólido núcleo
da familiar durou até o fim da vida das duas irmãs. Nair foi casada com o comerciante
Ezíquio Barros, sobrinho do Ex Governador Eugênio Barros e mãe de Ezíquio Barros
Filho, médico e político foi Presidente da União Maranhense de Estudantes, Diretor da
União Nacional dos Estudantes - UNE, além dos mandatos de Vereador, Vice Prefeito e
Prefeito Municipal da cidade de Caxias. Em 1954 sua família transferiu-se para São
Luís a fim de oferecer melhores condições de educação para suas crianças. Este fato
aconteceu graças ao estímulo do engenheiro e arquiteto Romeu Rosendo de Souza
casado com Ezinair Barros de Souza filha de Nair e Carlos Alberto Duarte Ramos. Foi
da conjugação desta circunstância familiar que Raimundo Palhano obteve a maternidade
e a “inspiração humana para traçar sua caminhada pessoal, profissional e social, que
culmina com a sua eleição para Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico –
IHGM, em agosto de 2012”.
O início dessa grande jornada aconteceu na cidade de Caxias, sua terra natal. Aos
sete anos de idade muda para a cidade de São Luís, por decisão dos seus familiares.
“Indagado sobre o que representou para sua vida, não hesita em considerá-la uma das
mais saborosas páginas de sua existência, pois, até hoje, guarda lembranças
inesquecíveis que o acompanharam para sempre”.
Ainda sobre sua terra natal: “Enche-se de emoção ao relembrar a magia que era o
Largo de São Benedito, defronte de sua casa, palco de brincadeiras e fantasias e da
incomparável Festa em homenagem àquele Santo, que atraia para o lugar toda a
população caxiense no mês de agosto e, principalmente, pelas canoinhas, carrosséis e
trens fantasmas dos parques de diversão que eram instalados no período dos festejos”.
Foi nesta época que manteve os primeiros contatos com o mundo da escola, suas
professoras e colegas de turma. O jardim de infância o fez no grupo Escolar Gonçalves
Dias, em sua terra natal, e as quatro séries iniciais do primário na Escola Modelo, nesta
capital. Em 1961 ingressa no Colégio Maranhense onde concluiu o ginasial e iniciou o
científico, finalizando-o em 1967, na Moderna Associação Brasileira de Ensino no Rio
de Janeiro. Nesta cidade maravilhosa engaja-se em movimentos estudantis e pertenceu à
Frente Unida dos Estudantes do Calabouço – FUEC*. Retorna para São Luís em 1968 e
1969 é aprovado para as Faculdades de Direito e de Economia, optando pelo Curso de
Ciências Econômicas.
*Falando em Calabouço seu padrinho, neste sodalício, não resistiu aos
inesquecíveis fatos e momentos, por ele vividos naquele famoso calabouço,
popularmente conhecido como BIFE DE OURO, no período 1956/64, quer na condição
de Presidente do Centro dos Estudantes Maranhense do Rio de Janeiro – CEM e de
Presidente do Diretório Acadêmico da Faculdade de Ciências Econômicas da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ.
Síntese Curricular
Nome: Raimundo Nonato Palhano Silva
Endereço: Rua 39, Quadra 30, Edifício Portobello, Apto. 602 – Ponta D’Areia – São
Luís-MA / CEP 65.077-370
Filiação: Pedro Nunes e Silva e Aracy Moura Palhano Silva
Nascimento: 30/08/1947 – Caxias – MA
Pesquisa e Extensão
Desde 1991 vem realizando pesquisas com destaque para as áreas de:
- Historia do Brasil – República;
- Política Publica;
- Política e Planejamento Governamentais;
- Economia Regional e Urbana;
- Administração Educacional;
-Planejamento e Avaliação Educacional;
RAIMUNDO PALHANO
Ao tomar posse no IHGM, em 27/08/2012, como Titular da Cadeira 39
ANTONIO NOBERTO
O DIPLOMATA
Um dia nublado de junho. A barba bem feita, bigode alinhado, perfume discreto,
um blazer claro com listras azuis verticais, um chapéu Panamá e um livro à mão direita,
ele caminhava elegante e tranquilamente pelas ruas da Praia Grande. Sorrisos e
saudações generosas aos conhecidos, abraços nos amigos e nos mais chegados. Aperto
de mão a um feirante que o reconheceu em meio a tantos transeuntes. Era José Jorge,
que, não obstante aos compromissos, apreciava as belezas do pomposo acervo colonial
ludovicense. Não estava lá a negócio, bem que poderia, mas desta vez não. Apenas
contemplava o Maranhão novecentista. Talvez visualizando aquele lugar repleto de
pessoas, homens bem apresentados, sinhás, escravos conduzindo sinhazinhas nos
palanquins. Todos com suas virtudes e defeitos, transitando com as roupas da época:
saias rodadas talares, leques, fraques, sobrecasacas, chapéus, bengalas e jornal debaixo
do braço. A final, quem vive a frente do seu tempo também tem a capacidade de
visualizar e até viver os tempos anteriores, ainda que a regressão seja de cem anos ou
mais.
Foi este, confreiras e confrades, senhoras e senhores, o quadro que imaginei e
visualizei do nosso empossando. Foi por entender que sua trajetória é uma obra de arte,
que me decidi a este exórdio novelesco. Nada mais justo. A final, falamos de uma
grande alma, que pelo conhecimento, disciplina e sensibilidade acumulados, consegue
transcender tempos e épocas. O que lhe permitiu ser essa pessoa de valor, sábia e
atenciosa. Um gentleman, cultivador de boas amizades, um homem circundado pelo
poder. Por certo, já leu os manuais que preparam um cortesão de sucesso. Um diplomata
na essência. Não é por acaso que galgou por duas vezes a glória do parlamento Estadual
e foi secretário de estado por três vezes. Mas quem conhece apenas o José Jorge Leite
Soares, diplomata, homem público e cônsul, está perdendo o melhor da festa. Nossos
avôs diziam que “vida boa é a vida do vizinho”, e o dito se enquadra muito bem à
história dele, pois quem o vê no auge do sucesso pode imaginar que o mundo sempre
lhe sorriu ou que ele nasceu com alguma parte do corpo virada para o céu. Ledo
engano! Nosso noviço sócio, como quase todos os vencedores, também teve seu “vale
da sombra da morte”, pois Deus, que a tudo e a todos perscruta, na sua imensa
sabedoria, não deixou de colocar à prova o jovem Zé Jorge. Hoje ele não gosta muito de
ovo frito, o famoso “bife do olhão”, pois, ainda na adolescência, em Brasília, foi morar
na casa de um parente. E como as coisas lá não iam muito bem, o magro cardápio
sempre contava com o popular produto da galinha. Na verdade havia uma criativa
variação: quando não era ovo frito ou cozido, era ovo mexido. Dormia em um cubículo,
a cama tinha que desmontar pela manhã. Restava-lhe, então, mirar o alvo, o estudo, o
futuro. A fé, companheira inseparável, a convicção daquilo que imaginava e desejava
para si, juntava-se à esperança de dias melhores. Além delas, servia como ópio para
fugir, ainda que por breves momentos, das dores daquela estrangeirice, escassez e
solidão, as boas e revigorantes lembranças daqueles dias mágicos na Princesa da
Baixada. Uma infância saudável, repleta de amigos, coleguinhas com quem dividiu o
melhor da vida. Impagável caminhar de pés descalços, descompromissado. Como era
boa a vida vagabunda!
Foi a provinciana cidade de Pinheiro, na Baixada Maranhense, belo lugar de
muitos alagados repletos de peixes, caças e aves, o berço do pequeno Zé Jorge. No
bairro da Matriz, seu real lugar de nascimento, lembra com olhar saudoso daquela mesa
de seis lugares, que lhe parecia gigante. Gostava de brincar e se esconder debaixo dela.
Tinha apenas seis anos de idade. Das muitas imagens inesquecíveis, muito vivas até,
relata-nos aquele período farto, o amontoado de melancias no Porto do rio Pericumã.
Melancias que o pai cortava ao meio, cavava e depois fazia barquinhos. Ah, como era
bom! Com a irmã, Ana Lourdes, ou com os amiguinhos brincava com carrinhos de
madeira. Brincava na burra, o galamarte, aquele brinquedo formado por duas peças de
madeira bruta. Uma enfiada ao chão sustentava outra que girava sobre a primeira. Com
uma criança de cada lado, a burra girava até deixar seus brincantes tontos. Entre os
muitos amigos de infância está o conhecido delegado Nordman Ribeiro. Lembra ainda
de outras estripulias, como pular de galho em galho e outras atividades que
proporcionavam plena sensação de liberdade!
No futebol, nunca foi um Neymar, mas era “secura” (e quem nunca foi?). Debaixo
do sol ardente do meio-dia jogava muita bola (não sei se em quantidade ou qualidade).
A Curacanga, “a mulher com cabeça de fogo” era algo temido, pois os adultos gostavam
de botar medo nas crianças. E quem quiser saber mais sobre esta lenda que permeia o
imaginário da Baixada é só adquirir a excelente obra do José Jorge, lançada
recentemente, inclusive, prefaciada pelo consagrado Mário Prata.
Voltemos à infância...
O pai, Orleans Mendes Soares, o Seu Orlico, era homem simples, foi carregador,
era fumante e muito amigo de José Sarney. Cartesiano, sempre muito controlado para o
lado de dinheiro. A mãe, Dona Diana Leite, era mulher ativa e virtuosa, de muitos
predicados: costurava, fazia bolos, participava de blocos de carnaval. Fundou o bloco
“Lá vem elas”. Hoje está com 84 anos de idade. Se hoje Zé Jorge compreende bem a
finitude da vida material e, por conta disto, empreende e realiza, deve isso a ela, pois foi
quem o ensinou a viver a vida.
O pai do senador Sarney, desembargador Sarney Costa, é primo do Chico Leite,
avô de Zé Jorge. Chico Leite estudou no Ceará e se tornou advogado. Os pais foram
grandes incentivadores nos estudos do pequeno Zé Jorge, sendo os padres italianos
decisivos no seu processo educativo. O Frei José Preciosa, por exemplo, foi quem o
encaminhou para a área técnica, para a engenharia.
A adolescência foi marcada pela mudança brusca de endereço. Não foi fácil sair
da segurança dos pais na pacata Pinheiro para morar em São Paulo, onde iniciou o nível
médio na Makenzie. Mas logo no início veio para Brasília, lá chegando, aos 14 anos, no
período de efervescência política provocado pelo Golpe de 1964. O apego aos estudos
rendeu-lhe a maior alegria, quando viu seu nome na lista dos aprovados para o curso de
Engenharia Mecânica na UNB, isto aos 17 anos. Passou em 13º lugar. No ano seguinte,
aos 18, corrigiu a timidez, quando se tornou professor de física no colégio chamado
Elefante Branco. Só retorna ao Maranhão em 1986.
A POLÍTICA
Nunca teve um forte viés político, foi incentivado pelas circunstâncias, em
especial, pelo avô, Chico Leite, que era político de esquerda e fazia reuniões secretas
em casa. Zé Jorge nunca pensou entrar na política. Foram os amigos que o levaram a
sair candidato a prefeito em Pinheiro. Mesmo sem conhecer muito bem os ciclos de São
Luís foi candidato e se elegeu duas vezes a deputado estadual no Maranhão, depois
suplente quando assumiu parte do mandato. Foi um verdadeiro sucesso, julgando que
ele nunca havia freqüentado o ciclo político da capital maranhense, vez que saiu direto
de Pinheiro para o eixo centro-sul. Somado a isto tem a decepção do seu primeiro
discurso na CEMAR. Um mico! Pois, na ocasião, nervoso, repetidas vezes chamou de
Teixeira o colega Fonseca. O que provocou muitas gargalhadas dos presentes.
Nosso recepcionado tem o dom de transitar bem nas diversas linhas políticas.
Possui uma rede de relacionamento muito boa, seja no meio político, acadêmico ou
artístico. Seu curriculum é extenso e avalizador deste bom trânsito. O lado diplomata
veio da boa criação dos pais e a influência dos padres. As três virtudes: o equilíbrio, o
bom trânsito e a diplomacia, no entanto, são legados creditados em maior parte ao pai.
José Jorge é um sommelier de mão cheia. Conhece tudo de vinho. No início do
ano eu fobava à mesa dizendo que em maio, na França, me hospedaria na vinícola de
um amigo, que havia me convidado para tomar um gostoso vinho Beaujolais. Zé Jorge,
fazendo jus a fama de diplomata, baixou minha bola e me explicou que um Beaujolais é
um vinho simples, não era uma Brastemp. Observou, no entanto, talvez para me
consolar, que existem alguns bons Beaujolais. Mas o paladar do nosso amigo vai muito
além das bebidas. Na cozinha é um mestre cuca, um verdadeiro chef de cuisine. Cada
prato que prepara é um show. Neste sodalício vai disputar o primeiro lugar com o
confrade Joaquim Haickel. Tais dotes revelam apuramento e refinamento do nosso
homenageado.
CURRÍCULO EXTENSO
No mínimo invejável a trajetória de José Jorge Leite Soares. Um currículo que
não deixa dúvida da dedicação, labor, vitória e sucesso do nosso cônsul honorário e
agora confrade.
Graduado em Dezembro de 1972 no Curso de Engenharia Mecânica pela
Universidade de Brasília. Especializou-se no campo de conservação de energia, atuando
como consultor do Instituto Brasileiro do Petróleo, do Conselho Nacional do Petróleo,
do CEBRAE – Centro Brasileiro de Apoio a Pequena e Média Empresa e do CEAG –
Centro de Assistência Gerencial do Estado do Rio de Janeiro. Exerceu atividades
docentes nas Universidades Estadual do Maranhão, Federal de Pernambuco, Petróleo
Brasileiro S/A – PETROBRÁS, Instituto Brasileiro do Petróleo-IBP e NTT/UFRJ –
Núcleo de Treinamento Tecnológico. Foi executivo da Empresa Multinacional (Spirax
Sarco), Diretor de Operações da Empresa Concessionária de Energia Elétrica
(CEMAR).
Na educação, entre outros, graduou-se pela Universidade de Brasília no curso de
Engenharia Mecânica (1968-1972). Fez especialização na área de conservação de
energia: Department of Energy. London-England, 1981; Spirax Sarco. Chelteham-
England, 1981; Nova Scotia Power Plant. Hallifax-Canadá, 1988; Energy Management
Course. Fabrimetal-CIFoP. Brussels-Belgium, October and November-1989. Participou
de cursos promovidos pela Dale Carnegie Training (The Leader In You, Leadership
Training for Managers and Strategic Presentations Workshop), em São Luís-Maranhão
(2000 e 2001). Entre 2003 e 2004 fez MBA em Gestão de Serviços Públicos. Fundação
Getúlio Vargas/ISAN. São Luís-Maranhão.
Foi professor da Faculdade de Engenharia Mecânica-UEMA, Disciplina Tempos e
Movimentos e Instalações Industriais. Período de 1974/1975 e 1987/1989; Coordenador
do Curso de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual do Maranhão. 1974/1975;
Professor Auxiliar de Ensino da Universidade Federal de Pernambuco, Disciplina
Instalações Industriais. 1977/1978; Palestrante do Instituto Brasileiro do Petróleo,
Cursos de Distribuição de Vapor, Conservação de Energia e Distribuição de Ar
Comprimido. 1979/1986; Professor contratado pela PETROBRÁS – CEMPES, Cursos
CEMANT 1979 e 1980, Curso CIM 1980, e Curso CENTO 1984, 1985 e 1986;
Consultor contratado pela CORPORACION ESTATAL EQUATORIANA
PETROLERA-CEPE, para ministrar curso realizado em Guayaquil-Equador, em
Setembro de 1982; Consultor Técnico na área de conservação de energia pelo
CEAG/CEBRAE-RJ. 1982/1986.
Entre os muitos empregos, foi chefe do Departamento de Manutenção e
Transporte da Cemar, Engenheiro Chefe da Manutenção do Hospital Presidente Dutra,
Engenheiro e Gerente Regional da Spirax Sarco, Diretor de Operações e Diretor de
Planejamento e Relações Institucionais da CEMAR.
Na literatura, publicou Lugar das Águas (Pinheiro 1956/2006) - 2006
Coisas de Antanho (Coletânia de artigos de Josias de Abreu publicados no Jornal
Cidade de Pinheiro) – 2006. Quadros da Vida Pinheirense (Coletãnia de artigos de
Jerônimo de Viveiros publicados no Jornal Cidade de Pinheiro) – 2006. E,
recentemente, Curacanga. É articulista do Jornal o Estado do Maranhão.
Na política foi Deputado Estadual duas vezes (1995 a 2002); Gerente de Estado
de Desenvolvimento Regional de Rosário (1999/2000); Secretário de Estado
Extraordinário no exercício da Gerência Regional de Pinheiro (2000/2001); Secretário
de Estado Extraordinário de Coordenação das Gerências Regionais (2002/2004).
É Cônsul Honorário da França em São Luís desde 2004; foi Presidente do
Conselho Diretor da Aliança Francesa (2004/2007); Membro da Academia Pinheirense
de Letras Artes e Ciências; Condecorado com a Medalha do Pericumã (Prefeitura de
Pinheiro); Condecorado com a Medalha Manoel Bequimão (Assembleia Legislativa do
Maranhão). Recebeu o Título de Cidadão de Guimarães, Pedro do Rosário, São Bento e
de Esperantinópolis. Ufa!
Apesar de ser muito ocupado, sempre lhe resta um tempo para olhar ao redor,
curtir a família e apreciar a beleza das flores. Consegue ser ele mesmo em meio às
muitas tarefas.
É casado com Elisabeth Soares e tem dois filhos: Júlia e Bruno Soares.
José Jorge é essa pessoa maravilhosa, escritor, diplomata, administrador,
morubixaba, homem público de muitos adjetivos, que, não obstante aos muitos degraus
galgados, nunca se deixou levar pela vaidade excessiva e nunca perdeu a essência de
uma criança. Consegue conciliar com sabedoria a vida de homem público de sucesso
com uma pessoa popular, interiorana, egressa na provinciana Princesa da baixada.
Portanto, José Jorge, com os cumprimentos deste sodalício e dos demais
presentes, convido-o agora a entrar nesta Casa cultural para também dar a sua
contribuição fazendo valer seus dons, talentos e virtudes.
Muito obrigado!
DISCURSO DE POSSE DE JOSÉ JORGE LEITE
SOARES NA CADEIRA DE NO. 34, PATRONEADA
POR WILSON DA SILVA SOARES EM 20 DE
SETEMBRO DE 2012
Saudação à MESA
Costuma-se dizer que quando desejamos algo o universo conspira a nosso favor.
Desta feita foi o meu dileto amigo e destacado membro do Conselho Diretor da Aliança
Francesa de São Luís, Antonio Noberto, que conspirou para que eu pudesse tomar
assento neste destacado espaço que abriga ilustres confreiras e confrades, cada qual
chegado aqui por merecidas e reconhecidas participações na vida acadêmica, científica e
cultural da comunidade maranhense.
Fazendo uso das palavras de Wilson da Silva Soares, quando, depois de longos
anos ausente de sua terra natal, retorna a Pinheiro no final do ano de 1933, me dirijo ao
confrade Antonio Noberto para dizer: “O vosso amável gesto, vislumbrou em mim
merecimentos que não possuo senão quando sou observado pela lente
pronunciadamente convexa da simpatia, por mercê da qual as qualidades triviais se
desnaturam para parecer aos olhos do observador desprevenido atributos tão
marcantes”.
Imaginem, prezadas confreiras e confrades, um menino nascido numa pequena
cidade do interior do Maranhão, que aos 14 anos de idade, em busca do conhecimento,
tomou o fluxo das águas do Pericumã e rumou pela foz da baia de Cumã em direção a
São Luís para empreender uma longa viagem a Brasília e, mais tarde, a São Paulo,
Recife, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, sem sequer ter feito um estágio na capital do
Estado. Mais de duas décadas longe de sua terra, já com família constituída (Beth sua
amada mulher e os filhos Julia e Bruno), decidiu por fazer o caminho de volta. As raízes
que sempre o mantiveram ligado ao solo de sua terra o trouxeram de volta ao seu torrão
natal.
E hoje, esse menino sonhador, realiza mais um sonho acalentado nos bancos do
colégio Odorico Mendes lá em Pinheiro. Ocupar uma cadeira neste Instituto que já
abrigou e continua a acolher personalidades das mais importantes no seio de nossa
sociedade. Este momento tem para mim um significado ímpar e registro de início o meu
compromisso de retribuir tamanha honraria com aquilo que disponho: a capacidade de
trabalho, a dedicação e a vontade de acertar.
Estar hoje recebendo das mãos de sua presidente Dra. Telma Bonifácio dos
Santos, avalizado pelos demais confrades e, mais ainda, de estar ao lado de conterrâneos
do quilate do Dr. Aymoré Alvin, do Dr. José Marcio Leite e da Dra. Joana Bitencourt,
me faz crer que valeu a pena ter recebido umas palmatórias de Dona Mundica Costa
(para aprender a tabuada), ter ficado de castigo ajoelhado nos caroços de milho de frente
para a parede e dos ensinamentos ministrados nas aulas de redação por Dona Cici
Amorim e do apoio e carinho de Dona Diana, minha querida mãe de quem tantos
incentivos tive ao longo de toda a minha vida. Sem maiores traumas, olho para traz e
vejo como tudo isso foi importante para a minha formação.
Quis o destino que hoje esteja eu assumindo a cadeira de no. 34, do Instituto
Histórico e Geográfico do Maranhão, cujo patrono era um conterrâneo de Pinheiro. E
mais ainda, um parente. Wilson da Silva Soares.
A família Soares, através de Odilon Soares, médico renomado, poliglota capaz de
dominar fluentemente o alemão, o italiano, o francês, o inglês e o espanhol, alem de
largos conhecimentos do Latim, foi o primeiro deputado federal nascido em Pinheiro,
marcando sua passagem na Assembleia Constituinte de 1946 como um parlamentar de
raro brilho conseguindo a aprovação de dezenas de projetos de sua autoria. Ocupou a
cadeira de no. 25 deste Instituto.
Oswaldo da Silva Soares, tabelião, portador de invejável cultura, pesquisador
dos mais notáveis, colecionador de obras de arte e com atuação destacada nesta Casa,
chegou a ocupar a cadeira de no. 13.
Luiz Alfredo Guterres Soares, poeta, escritor e jornalista, ocupante da cadeira
no. 39, tem prestado relevantes serviços a este Instituto e, humildemente, me junto a
eles com o compromisso de somar esforços para o engrandecimento desta Casa.
Assim como eu, Wilson da Silva Soares nasceu em março. Era final do século
XIX, 1898.
Segundo André Ribard, na Prodigiosa História da Humanidade, nesse ano
acontecia mundo afora uma verdadeira revolução no conhecimento científico: Thomas
Edison aperfeiçoava a energia elétrica, madame Curie e Monsieur Becquerel isolavam o
radium e estudavam a radioatividade natural, Nos Estados Unidos o telefone ligava pela
primeira vez duas cidades distantes e na França surgia o cinema com os Lumière.
Por outro lado, segundo Jerônimo de Viveiros, em Quadros da Vida Pinheirense,
Pinheiro sofria os efeitos da abolição da escravatura, abalando a sua economia baseada
na produção de cerca de quarenta fazendas sustentadas pela força dos braços de mais de
mil escravos.
E foi lá que em 20 de março de 1898 uma parteira lhe aplicou as primeiras
palmadas e a sua mãe ouviu o choro daquele que viria a se tornar um dos mais
importantes filhos de Pinheiro.
Seus estudos foram iniciados em sua terra natal e mais tarde em São Bento,
transferindo-se para São Luís em decorrência do falecimento de seu progenitor. Amante
das letras, leitor contumaz, iniciou seus estudos superiores na Faculdade de Direito,
porém sua vocação pelo jornalismo o levou a abandonar a carreira jurídica.
Fez-se jornalista dos mais notáveis e brilhantes da sua época. Dirigiu o Diário de
São Luís, período no qual desenvolveu uma rica produção de artigos publicados em
diferentes revistas científicas e culturais.
Habituado ao convívio amável dos bons livros foi um colecionador cuidadoso de
obras literárias e chegou a organizar nos baixos da sua residência, em três grandes
salões na Rua dos Afogados a maior e mais importante Biblioteca do Estado, não
somente pela quantidade de obras, que atingiu a casa dos quarenta mil volumes, mas,
principalmente, pelo alto valor literário da grande maioria delas, algumas de renomada
raridade.
Após ter criado a Sociedade Maranhense de Estudos, foi um dos idealizadores da
Academia Maranhense de Letras e um dos fundadores do Instituto Histórico e
Geográfico do Maranhão, quando em 1925 foi escolhido Patrono da cadeira de no. 34
que hoje, com muito orgulho, repito, assumo neste momento.
Rotariano de destaque e sempre a frente de iniciativas inovadoras, chegou a
ocupar a direção da imprensa Oficial do estado do Maranhão, do Arquivo Público do
estado e do departamento Estadual de Estatística.
Wilson da Silva Soares, pelo seu elevado espírito público e dedicação teve o
reconhecimento dos principais mandatários da época, tais como o presidente do estado
José Pires Sexto e do interventor Paulo Ramos. Sua notoriedade já se fazia presente
quando influenciado por amigos e correligionários tentou uma vaga na Assembleia
Legislativa. Mesmo não obtendo êxito, recebeu uma votação significativa, notadamente
de seus conterrâneos pinheirenses.
Registros do Jornal Cidade de Pinheiro mostram que nesse ano, mais
precisamente no final de 1933, chegava à redação do Jornal um telegrama informando
da visita que faria à sua terra natal.
Partindo de São Luís a bordo do barco Capricho, após ter vencido os banzeiros do
boqueirão, ter contornado a Pedra Grande de Itacolomy e ter adentrado pela baia de
Cumã, rumo a sua terra natal, Wilson chega a Pinheiro.
Filho dos mais ilustres da cidade àquela época, Wilson fez-se acompanhar pelo
desembargador Elizabetho Barbosa de Carvalho e foi recebido pelos seus conterrâneos
com salvas de foguetes tão logo a comitiva foi avistada na Ilha de Ventura, à entrada da
cidade.
O diretor do Jornal, Josias Abreu abriu as portas e salões de sua elegante
residência para recebê-lo na presença das principais autoridades, dos membros da Loja
Maçônica “Renascimento” e de lideranças de Pinheiro onde proferiu em nome da cidade
a saudação ao mais notável de seus conterrâneos:
“Abre-vos Pinheiro os braços, neste momento emocionada e trêmula para o
amplexo de boas vindas que simboliza na eloquência de um gesto, todo o sentir de seu
povo” e, finalizando, conclui: “assim, hospedes queridos, não vos dou as chaves da
cidade. Ela, para vós, não possui portas e não tem muralhas”.
Mesmo não obtendo êxito na aventura política e dedicando-se com afinco aos
estudos estatísticos por ocasião em que dirigia o Departamento de Estatística do estado,
foi convidado pelo embaixador Macedo Soares, à época presidente do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, para instalar no Estado de Sergipe o Departamento
de Estatística local.
Wilson da Silva Soares foi certamente um dos pinheirenses que honraram a terra
onde nasceu, por seu talento, por sua cultura e por sua capacidade admirável de trabalho
que ele sempre empregou por onde passou com o brilho de sua inteligência e com o
elevado espírito público que sempre carregou consigo.
Veio a falecer no Rio de Janeiro em 9 de dezembro de 1949 sendo sucedido por
Elizabeto Barbosa de Carvalho. Formado em direito pela Universidade de
Pernambuco, natural do estado do Piauí, casou-se com uma pinheirense quando de sua
passagem pela cidade de Pinheiro como Juiz de Direito. A essa época, fundou o jornal
Cidade de Pinheiro, o hebdomadário mais antigo ainda em circulação no estado do
Maranhão, contando com a colaboração de Wilson Soares e Clodoaldo Cardoso, entre
outros.
Desembargador do Tribunal de Justiça do estado do Maranhão, ocupou o cargo de
Corregedor Geral do Estado, chegando a ser o Presidente do Tribunal de Justiça. Como
advogado desempenhou-se de forma brilhante como presidente da Ordem dos
Advogados do Maranhão. Em 1942 foi nomeado Interventor Federal no Estado do
Maranhão, chegou a ocupar pela vontade do povo uma cadeira na Câmara Federal e
encerrou sua brilhante história de vida em defesa dos interesses do povo do Maranhão
atendendo, mais uma vez, aos apelos populares, quando foi eleito Prefeito de Pinheiro
para o período de 1960 a 1964.
Veio a falecer em 18 de março de 1966.
Esta cadeira ainda foi ocupada pelo seu irmão Fernando Barbosa de Carvalho,
piauiense de Amarante que adotou o Maranhão para desempenhar seu importante papel
como homem público.
Como jurista de formação, teve destacado papel na elaboração da Constituição do
estado do Maranhão, ocupou o cargo de Secretário de Estado da Educação e Cultura no
governo Eugênio Barros e, posteriormente, no governo de Eurico Ribeiro, conduziu a
pasta da Secretaria de Interior, Justiça e Segurança.
Os arquivos do jornal Cidade de Pinheiro registram uma leva de artigos
publicados por “Tirso Júnior”: pseudônimo usado por ele durante muitos anos para
exercitar, de forma refinada, a sua arte da escrita. Na Academia Maranhense de Letras, a
cadeira de No. 17, patroneada por Sotero dos Reis foi, por ele, coupada por muitos anos.
Faleceu em 1976.
Como vêem, minhas senhoras e meus senhores, confreiras e confrades, pesa sobre
os meus ombros uma carga hercúlea ao suceder estes homens que fizeram de suas
histórias a História do Maranhão. Minha responsabilidade torna-se imensa na medida
em que a mim só resta envidar todos os esforços para o engrandecimento desta
instituição. Este é, a partir de hoje, o meu compromisso com esta Augusta Casa.
Muito obrigado.
DISCURSO - POSSE DE SOFIANE LABIDI NO
IHGM
2
Crisol é uma cavidade, um vaso, um cadinho, um pote ou instrumento usado pelo oleiro para purificar o
ouro no fogo. Em sentido figurado é a provação, uma prova em que se revela o verdadeiro quilate das
boas qualidades. O olhar e a posição epistêmica adotada viabilizou a construção de pesquisas e estudos
que abriram em seus métodos um cadinho como um campo de possibilidades no diálogo entre os
saberes, uma espécie de crisol da ciência, na aposta de parcerias, diálogos, debates, discussões e
produção de conhecimento sobre os temas atuais que envolvem as formações culturais e subjetivas nas
áreas das chamadas artes, ciências humanas e sociais. Criado como Grupo de Pesquisa (UFMA) em
2001, o Crisol se constituiu como um espaço de debate e produção de idéias entre pesquisadores e
estudantes sobre o estudo da dinâmica dos patrimônios bioculturais e do teatro das memórias na
sociedade contemporânea, e de reflexões sobre cultura, arte e imaginário na fase atual da "virada
cultural" do Capitalismo. http://crisol-gpec.com.br/site/
Alexandre, de ultima hora, atendeu convite para nosso segundo Seminário como
um dos debatedores; os presentes àquele evento extasiaram-se com suas palestras e
erudição. Alguns sócios sugeriram um convite a ele, para acompanhar-nos nessa dura
jornada. Informei que já fora formalizado o convite, e ele ceita-o. Breve o teríamos
como Confrade. Esse dia chegou...
Creio que - como me identifico -, Alexandre seja um maranhense que por
descuido geográfico nasceu carioca. É do Rio de Janeiro, nascido em 1º de março de
1963, filho de Djalma Corrêa Filho e Maria Leny Fernandes Corrêa – ambos nascidos
em 1940, e moradores do Rio de Janeiro; foi casado, desde 1997, com Adriana Cajado
Costa (Brasiliense/DF, Psicóloga e Psicanalista), tendo dois filhos: Bruno de Lorenzo e
Thiago Bello.
Aqui, lembro que Adriana, fisicamente, não está mais entre nós; acompanhamos a
evolução de sua doença, as angustias do Alexandre e seus familiares, até a passagem
para o outro plano...
O Professor-Doutor Alexandre Fernandes Corrêa começou sua formação
intelectual na Escola Municipal Abílio Borges, localizada no bairro Humaitá/Botafogo;
o Ensino Médio fez em escolas particulares: no Princesa Isabel, no Brasil-América e no
São Fernando. Continuou os estudos, já em nível superior, na Universidade Federal do
Rio de Janeiro, onde se bacharelou em Ciências Sociais: Antropologia (1986); Mestre
em Antropologia Cultural, pela Universidade Federal de Pernambuco (1993); Doutor
em Ciências Sociais (Antropologia), pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(2001); e Pós-doutorado em Antropologia, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(2006). Tem um segundo Pós-Doutorado em Antropologia (UERJ-2009).
Em seu Doutorado em Ciências Sociais defendeu a tese que teve por título:
“Vilas, Parques, Bairros & Terreiros (Patrimônios Bioculturais) - Novos Patrimônios
na Cena das Políticas Culturais de São Luís e São Paulo”. A dissertação de Mestrado
em Antropologia teve por título: “Festim Barroco: um estudo do significado cultural da
festa dos Prazeres em Pernambuco”. E na graduação em Ciências Sociais -
Antropologia discorreu sobre: “Academia de Ciências Humanas do Rio de Janeiro:
aspectos históricos”.
Seu interesse acadêmico abrange: (1) Patrimônio Cultural, tendo como objeto de
estudo o imaginário social das práticas do patrimônio e da memória; (2) Memórias
Sociais, que abrange estudos e pesquisas sobre as práticas sociais da memória; (3)
Antropologia Urbana, onde estuda o meio urbano. Dedica-se ainda aos (4) Estudos
Culturais, sobre o imaginário social relacionado às práticas sociais do patrimônio e da
memória; (5) à Epistemologia da Complexidade, com estudos na área da Metodologia
do trabalho científico implementada nos estudos e pesquisa sobre as praticas sociais do
patrimônio e da memória; (6) Patrimônio Etnográfico, sobre tombamento e preservação
de bens culturais folclóricos e populares na sociedade brasileira; e por fim, dedica-se à
(7) Antropologia do Patrimônio Biocultural.
Atualmente, é professor Associado III da Universidade Federal do Maranhão. É
Membro do Programa de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (UFMA). Líder do
Grupo de Pesquisas e Estudos Culturais (CRISOL). Foi Membro do Conselho Estadual
de Cultura do Maranhão nos anos 2008-9.
Tem publicado quatro livros:
O MUSEU MEFISTOFÉLICO E A DISTABUZAÇÃO DA MAGIA: análise do
tombamento do primeiro patrimônio etnográfico do Brasil.. 1. ed. São Luís: UFMA,
2009. v. 300. 192 p.
FESTIM BARROCO: culturanálise da festa de Nossa Senhora dos Prazeres de Jaboatão
dos Guararapes/PE. 1. ed. São Luís: EDUFMA/PGCult, 2009. v. 1. 136 p.
PATRIMÔNIOS BIOCULTURAIS: ensaios de antropologia do patrimônio e das
memórias sociais. 1. ed. São Luís: EDUFMA, 2008. v. 500. 220 p.
VILAS, PARQUES, BAIRROS E TERREIROS: novos patrimônios na cena das
políticas culturais de São Paulo e São Luís. 1. ed. São Luís: EDUFMA, 2003. v. 100.
240 p.
E em quatro outros, é autor dos capítulos seguintes:
DINÂMICAS DAS PAISAGENS, DOS PATRIMÔNIOS E DAS MEMÓRIAS
SOCIAIS NA ATUALIDADE: O Complexo de Dédalo em Perspectiva In: Flávio
Leonel Abreu Silveira; Cristina Donza Cancela. (Org.). PAISAGEM E CULTURA:
Dinâmicas do Patrimônio e da Memória na Atualidade. 1 ed. Belém: EDUFPA, 2009, v.
1, p. 179-194.
SOCIOLOGIA NO ENSINO MÉDIO NO MARANHÃO: Reflexões sobre a
Transmissão da Cultura Sociológica para Jovens. In: Manoel Matias Filho. (Org.).
ESPAÇO DOS SOCIÓLOGOS. 1 ed. Natal: Espaço Social, 2009, v. 1, p. 78-85.
METAMORFOSES CONCEITUAIS DO MUSEU DE MAGIA NEGRA: primeiro
patrimônio etnográfico do Brasil. In: Manuel Ferreira Lima Filho; Cornelia Eckert; Jane
Beltrão. (Org.). Antropologia e Patrimônio Cultural: Diálogos e Desafios
Contemporâneos. 1 ed. Blumenau: Nova Letra, 2007, v. 1, p. 287-318.
TEATRO DAS MEMÓRIAS E DO PATRIMÔNIO CULTURAL. In: Manuel Ferreira
Lima Filho; Márcia Bezerra. (Org.). Os Caminhos do Patrimônio no Brasil. Goiânia:
Alternativa, 2006, v. 1, p. 69-88.
De sua vasta produção científica, destacamos: 28 artigos completos publicados
em periódicos, 12 Textos em jornais de notícias/revistas, 16 Trabalhos completos
publicados em anais de congressos, 17 Resumos publicados em anais de congressos; 19
Apresentações de Trabalho; 17 Produções técnicas; 19 Produções artística/cultural.
Estão identificados ao final desta apresentação...
Perguntei ao Alexandre como veio parar em São Luis. Disse-me ser seu avô
pernambucano, e desde sua formação e vivência no Rio de Janeiro - nascido na Zona
Norte (Méier) e criado no bairro de Botafogo -, nutria uma atração muito grande pelo
Nordeste.
São Luís foi a primeira cidade nordestina que conheceu; aqui, a grata surpresa:
da cidade corresponder àquelas imagens que tinha na cabeça, sobre o passado colonial
brasileiro. O centro urbano antigo de São Luís produziu pensamentos e sensações
profundas, que até hoje são objeto de suas pesquisas e reflexões. Atualmente, ao realizar
pesquisas sobre o Teatro das Memórias Sociais - as Festas e Rituais Comemorativos na
sociedade local e nacional continua tentando responder aquele espanto inicial ao
conhecer a cidade. Sua chegada foi num 25 de fevereiro de 1987, direto no Baile de
Carnaval do Clube Jaguarema!
Acabou ficando por aqui, indo trabalhar com Teatro no Município de Morros,
com a Profa. Maria de Jesus Medeiros Muniz e Silva; em seguida, começou a dar aulas
de Sociologia para o Magistério na Escola de Carlos Cunha, da Rua do Sol; aulas de
Antropologia, Sociologia e Geografia, no antigo CETEMA (Centro Teológico do
Maranhão, da Igreja Católica). Em 1989, começou a dar aulas de Antropologia, como
Professor Colaborador e Substituto na UFMA. Em 1990 iniciou curso de Mestrado em
Antropologia Cultural na UFPE (concluído em 1993), do qual produziu o livro Festim
Barroco. Em 1991, concurso público para Professor Auxiliar em Antropologia, pela
UFMA.
Ter chegado a pleno Carnaval, foi um sinal de que as festas seriam objeto
especial de reflexão e pesquisa, como se confirma no momento. Desde aquele fevereiro
de 1987 que tenta, através do estudo e da pesquisa, conhecer e compreender a história e
a cultura maranhense; trabalho que lhe tem dado muita satisfação e alegrias.
Seja bem vindo, Alexandre...
APRESENTAÇÕES DE TRABALHO
1. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Mito e Ideologia: aproximações teóricas. 2011. (Apresentação de
Trabalho/Conferência ou palestra).
2. CORRÊA, Alexandre Fernandes. ANTROPOLOGIA, LITERATURA E PSICANÁLISE: as
representações do mal à brasileira na poética de Dante Milano.. 2011. (Apresentação de
Trabalho/Conferência ou palestra).
3. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Ação cultural, fixação identitária e excessos da patrimonialização.
2011. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra).
4.CORRÊA, Alexandre Fernandes ; COSTA, A. C. . FIXAÇÃO IDENTITÁRIA,
TERRITORIALIDADE E EXCESSOS DA PATRIMONIALIZAÇÃO: riscos para a criatividade e o
imaginário artístico e cultural contemporâneo.. 2010. (Apresentação de Trabalho/Comunicação).
5. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Dédalo em tempos de globalização e mundialização. 2010.
(Apresentação de Trabalho/Simpósio).
6. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Configurações histórico-culturais do Futuro do Passado na cena
cultural atual. 2010. (Apresentação de Trabalho/Comunicação).
7. CORRÊA, Alexandre Fernandes. A experiência do amor como aproximação do crime, da loucura e da
morte.. 2010. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra).
8. CORRÊA, Alexandre Fernandes. DÉDALO EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO E
MUNDIALIZAÇÃO. 2010. (Apresentação de Trabalho/Comunicação).
9. CORRÊA, Alexandre Fernandes; COSTA, A. C. . IDENTIDADE, CRIATIVIDADE E ARTE: Riscos
do excesso de patrimonialização. 2010. (Apresentação de Trabalho/Comunicação).
10. CORRÊA, Alexandre Fernandes. MUSEU MEFISTOFÉLICO: Primeiro Patrimônio Etnográfico do
Brasil (1938). Pesquisa de Pós-Doutorado UFRJ/UERJ (2005-2010). 2010. (Apresentação de
Trabalho/Conferência ou palestra).
11. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Observatório do Patrimônio Cultural. 2010. (Apresentação de
Trabalho/Comunicação).
12. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Ciências Sociais: atuação profissional e suas vertentes . 2010.
(Apresentação de Trabalho/Comunicação).
13. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Cidade como Fenômeno Cultural. 2010. (Apresentação de
Trabalho/Conferência ou palestra).
14. CORRÊA, Alexandre Fernandes; COSTA, A. C.. Cultura e Subjetividades: Cenas e linguagens nas
formações subjetivas e na produção cul;tural no estágio atual da modernidade.. 2010. (Apresentação de
Trabalho/Comunicação).
15. CORRÊA, Alexandre Fernandes. PAISAGENS, PATRIMÔNIOS E MEMÓRIAS SOCIAIS NA
ATUALIDADE.: O Mito de Dédalo em Perspectiva. 2009. (Apresentação de Trabalho/Comunicação).
16. CORRÊA, Alexandre Fernandes. 400 anos de São Luís: contribuições para uma sócio-história das
instituições de ensino, dos professores e dos intelectuais no Maranhão. 2008. (Apresentação de
Trabalho/Comunicação).
17. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Museus como Agentes de Mudança Social e Desenvolvimento.
2008. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra).
18. CORRÊA, Alexandre Fernandes. MUSEU DE MAGIA NEGRA DO RIO DE JANEIRO. 2008.
(Apresentação de Trabalho/Comunicação).
19. CORRÊA, Alexandre Fernandes. O Papel do Antropólogo na Gestão do Patrimônio Cultural e
Natural na Atualidade. 2006. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra).
PRODUÇÃO TÉCNICA;
1. CORRÊA, Alexandre Fernandes; MATIAS FILHO, Manoel; SANTOS ALMEIDA, Alderico José.
NOTA TÉCNICA A ATUAÇÃO DOS SOCIÓLOGOS NA POLÍTICA NACIONAL DE
ASSISTÊNCIA SOCIAL PNAS FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SOCIÓLOGOS FNS / MARÇO
2011. 2011.
2. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Teatro das Memórias Sociais e do Patrimônio Biocultural: pesquisa
antropológica na região metropolitana de São Luís/MA.. 2006.
3. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Consultoria sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais no Maranhão.
2002.
1. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Ciência Hoje: Patrimônio Histórico de São Luís. 2012. (Programa de
rádio ou TV/Entrevista).
2. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Relatório Final de Pesquisa Teatro das Memórias. 2011. (Relatório
de pesquisa).
3. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Curso Livre de Cultura Popular. 2010. (Curso de curta duração
ministrado/Outra).
4. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Relatório de Atividades de Estágio de Pós-Doutorado. 2010.
(Relatório de pesquisa).
5. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Ação Cultural em Museus e Patrimônios: gestão de heranças e
legados sócio-culturais. 2008. (Curso de curta duração ministrado/Extensão).
6. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Relatório Parcial Projeto de Pesquisa 2006-2008. 2008. (Relatório de
pesquisa).
7. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Projeto Ação Cultural TEATRO DAS MEMÓRIAS. 2007. (Curso de
curta duração ministrado/Extensão).
8. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Relatório de Atividades de Pós-Doutorado: Museu Mefistofélico: o
significado cultural da coleção museu de magia, primeiro patrimônio etnográfico do Brasil (1938)..
2006. (Relatório de pesquisa).
9. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Políticas do Patrimônio e da Memória em São Luís/MA. 2005.
(Relatório de pesquisa).
10.CORRÊA, Alexandre Fernandes . Mini-Curso Atualidade do Ensino da Sociologia na Escola Média.
2004. (Curso de curta duração ministrado/Extensão).
11. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Educação Patrimonial. 2004. (Curso de curta duração
ministrado/Extensão).
12. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Religação dos Saberes - Propostas para o Ensino do Futuro. 2003.
(Curso de curta duração ministrado/Extensão).
13. CORRÊA, Alexandre Fernandes. Vestibular da Cidadania. 2002. (Desenvolvimento de material
didático ou instrucional - Apostila Pré-Vestibular).
14.CORRÊA, Alexandre Fernandes. Políticas do Patrimônio e da Memória. 2002. (Relatório de
pesquisa).
Palavras Finais
Termino esse breve discurso agradecendo publicamente o convite do Prof.
Leopoldo Gil Dulcio Vaz indicando meu nome para compor o IHGM; muito obrigado
pela gentileza, reconhecimento, ajuda e amizade. E aproveito para agradecer também o
acolhimento e aprovação da indicação, por parte da assembleia de confrades e
confreiras.
Estive pensando nos motivos que levaram Prof. Leopoldo Vaz a nos convidar para
participar e integrar essa Instituição que possui vultos renomados de escritores,
pesquisadores, professores e eruditos sobre a História, Geografia, Sociedade e Cultura
do Maranhão.
Sou professor universitário, pesquisador e escritor que tem produzido
investigações acerca da cultura e sociedade brasileira, e em especial, a maranhense, pelo
menos nos últimos vinte anos; algumas vezes de modo mais sistemático, outras vezes de
modo mais livre.
Creio que ao participar do nosso II Encontro de Estudos Culturais, que
organizamos no Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho, e do III Encontro:
Cultura e Subjetividades, ocorrido no auditório do jornal O IMPARCIAL, o Prof.
Leopoldo Vaz reconheceu nossa disposição em dar continuidade aos esforços de
realização de estudos e pesquisas culturais sobre São Luís, o Maranhão e o país;
orientando e estimulando estudantes e pesquisadores, com entusiasmo e dedicação.
Quando digo nós é porque ainda tínhamos a companhia agradável, amorosa e
criativa de Adriana Cajado Costa, que nos oferecia confiança e firme presença,
qualificando o trabalho comum, com dignidade e beleza. Ela foi uma entusiasta do
aceite desse convite; o que justifica nossa presença aqui e agora.
Creio que foi esse conjunto de atividades e atmosfera de estudos e pesquisas que
chamaram a atenção do Prof. Leopoldo Vaz, e de tantos outros amigos que conviveram
conosco nesses últimos anos. E é isso que poderemos continuar oferecendo, muito
embora, não contando mais com a presença e o apoio de nossa querida Adriana Cajado
Costa; que se foi prematuramente.
Nosso entusiasmo tinha uma fonte segura, quando ainda hoje nos encontramos
sob o manto do luto; mas, nossa missão é dar continuidade e preservar os frutos dessa
vida em comum, oferecendo nossos melhores esforços para o florescimento de novas
perspectivas e olhares sobre a cidade de São Luís, o Maranhão e o Brasil. Conhecimento
novo e mais que necessário, pois urgente e emergente, a fim de conduzir nossas vidas
para melhores destinos.
Durante o programa serão abordados temas como IHGM, Cultura, SBPC e novo
Estatuto do Educador.
Quando ouço ou leio notícias sobre Imperatriz, reajo como se por aí ainda
estivesse... Quando ouço ou leio amigos falando ou escrevendo sobre Imperatriz, reajo
como se dela continuasse a fazer parte... Não poderia ser diferente, pois jamais deixei
Imperatriz e nunca abandonei o sentimento de pertencimento construído ao longo dos
anos em que nela vivi...
Assim que recebo o livro do Charles. E o sentimento de pertencimento fica mais
patente quando me vejo retratado; deixando de ‘fazer’ história, Charles me coloca como
parte da História da Educação Física, dos Esportes e do Lazer de Imperatriz. Necessário
alertar que Charles exagera minha participação...
Tenho me dedicado ao estudo da História dos Esportes, da Educação Física e do
Lazer no Maranhão ao longo dos últimos 25 anos; tenho acompanhado o surgimento de
alguns Historiadores que têm essa área como tema de suas pesquisas. E Charles,
licenciado em História pela UEMA em 2002 – quando abordou os Jogos Escolares de
Imperatriz – e dentro desse mesmo tema retorna agora, em sua monografia de graduação
em Educação Física. Mas não deixou de ser Historiador...
Ao assumir função de Gestor da Educação Física, ao planejar o futuro da
Disciplina na rede pública municipal, buscou entender o passado para projetar o futuro.
Como essa Educação Física e Esportiva começou? Quais eram as teorias, as abordagens,
o pensamento de seus introdutores? Teve de retornar aos anos 70, quando o Campus
Avançado da Universidade Federal do Paraná, através da Fundação Projeto Rondon –
FunRONDON -, se instalou na cidade.
Os primeiros eventos ligados à recreação pública, as primeiras Colônias de Férias,
o entendimento que havia necessidade de incluir a Educação Física e a prática do
Esporte Escolar nas escolas da cidade.
As propostas do Professor Alberto Milléo Filho, a “invenção” das Olimpíadas
Escolares de Imperatriz – OCOI – só poderiam ocorrer na junção de vários elementos
favoráveis – os Jogos Escolares Brasileiros – JEBs – que se iniciavam; os Festivais de
Esporte da Juventude – FEJs – na Capital, São Luís, logo transformados em Jogos
Escolares Maranhenses – JEMs -; um Professor de Educação Física na direção do
Campus Avançado, e o Interventor na Prefeitura sere um dos maiores esportistas que
este Estado já teve: o Coronel PM Bebeto – Carlos Alberto Barateiro da Costa. Estavam
reunidos num cadinho que só poderiam resultar na criação da Divisão de Educação
Física, Esportes e Recreação – DEFER. Era aquele o momento... E é essa História que
Charles resgata em sua monografia.
Mas não se limita ao resgate da história; vai além, preocupado com os rumos que a
Educação Física e o Esporte Escolar seguem após aqueles anos iniciais – 1976 a 1978,
época em que trabalhei em Imperatriz, junto com a Marilene Mazzaro. Vai além e
procura respostas... O que aconteceu, quais as mudanças havidas nos anos seguintes? O
período da direção das atividades da Profa. Mary de Pinho, a transformação da OCOI
em JEI; a criação da Secretaria Municipal de Desportos e Lazer; as incúrias
administrativas que causaram sua extinção; o seu reaparecimento; os dias atuais, até que
passa a ser, ele Charles, o Gestor, na administração do Prefeito Madeira.
Na realidade, Charles procura entender o passado, os passos acertados e os erros
cometidos, para justificar uma retomada dos ideais daqueles anos 1976/78, quando o
Esporte na/da Escola procurava a inclusão de todos em seu desenvolvimento. Como ter
um esporte, na escola, inclusivo? Foi buscar nas suas lembranças de menino como era a
Educação Física de seu tempo de estudante para oferecer aos seus colegas de profissão
uma alternativa: que é possível ter uma educação física para todos; um esporte na escola
para todos. Esse, o trabalho que Charles nos apresenta...
Aqui, concordo com Lino Castellani Filho, quando afirma gostar de se referir à
História se valendo de uma metáfora com o ato de dirigir. Quando se está ao volante,
tem-se o que nos circunda como referencia de realidade presente. Tudo o que fazemos
ou deixamos de fazer está diretamente ligado ao que acontece conosco e ao nosso
redor...
Pois é a partir desse lugar que buscamos alcançar o nosso destino, ou seja, nosso
lugar futuro, o que nos faz olhar para frente. Mas ao olharmos adiante, não nos
descuramos de olharmos – nos valendo dos retrovisores laterais - para os lados, cientes
de que o que nos cerca pode determinar o que veremos à frente. Ao mesmo tempo em
que o fazemos, não deixamos de prestar atenção ao que vai ficando para trás, com se
fosse nosso passado, para isso lançando mão do retrovisor dianteiro...
Não sei se me fiz explicar. É o presente que nos anima a perscrutar o que ficou
para trás... São as crises que nele se instalam ou novos efeitos de fatos passados que
nele se inscrevem que nos motiva a dar conta de estabelecer visitas a tempos passados.
Ao assim fazer, contando com o que o presente fornece mais elementos podemos
recolher para, melhor entendendo-o, perspectivar o futuro...
Esse, o livro que Charles nos trás; não só um livro de História da Educação Física,
dos Esportes e do Lazer em Imperatriz-MA. Um livro que resgata a história de vida de
diversas pessoas que tiveram suas vidas modificadas pelas vivencias que a OCOI
proporcionou, pelas vivencias nos locais de prática esportiva, pelas lições que levaram
para a vida. Como resgatar isso, na Educação Física e no Esporte Escolar de hoje. É o
que busca e nos faz refletir sobre nossa profissão...
Boa leitura, a todos...
E, Charles, obrigado pela sua generosidade, e falo também em nome da Turma 49
do Projeto Rondon – Imperatriz, 1976...
O Brasil está servindo de cenário para um dos mais importantes eventos deste
início de século: a conferência Rio + 20, realizada na cidade do Rio de Janeiro, reunindo
representantes de 194 nações. Essa conferência acontece exatos 20 anos mais tarde,
após a realização da ECO 92, que foi o primeiro grande evento das sociedades
contemporâneas a pensar o meio ambiente como um assunto totalmente global. As
centenas de atividades do evento estão abordando temas que nortearão o futuro do
planeta e, por consequência, da humanidade, e que deverão fundamentar um novo
paradigma de desenvolvimento sustentável, baseado no conceito de economia verde,
que envolve a preocupação com a redução dos índices de pobreza.
São temas atuais, que despertam calorosas discussões entre as nações pobres e
ricas, pela diversidade de opiniões sobre a tradicional relação entre o capital e o
trabalho. Temas estes que pretendem trazer soluções para problemas, que envolvem
todas as nações, como o aquecimento global, escassez de água, produção de alimentos,
explosão demográfica e, ainda, o aumento do padrão de consumo material e energético
dos países emergentes como o Brasil. O que está em jogo, em todas essas questões, é
como manter o crescimento do planeta, com a consequente qualidade de vida das
pessoas, e, ao mesmo tempo, garantir o desenvolvimento econômico dos países.
Atendendo a esse chamado de oferecer soluções, é que a Universidade Federal
do Maranhão se insere no contexto de incentivo à produção e disseminação de
conhecimentos, em especial a partir do estudo da diversidade natural em nosso Estado.
Poderia apontar inúmeros exemplos, mas quero destacar, neste artigo, o papel
desempenhado pelo Campus Universitário da UFMA em Chapadinha, que, por meio do
Centro de Ciências Agrárias e Ambientais (CCAA), oferece os cursos de Agronomia,
Ciências Biológicas e Zootecnia. O Campus de Chapadinha está estrategicamente
localizado numa região que faz parte do cerrado maranhense, segundo maior bioma que
se espalha por oito estados e ocupa cerca de 24 % da superfície do nosso país.
Essa área representa, por suas características climáticas, topográficas e de solo, a
mais explorada pela agricultura nacional ou o chamado agrobusiness. Em particular no
município de Chapadinha e região, essa área vem apresentando um desenvolvimento
acelerado nos últimos anos, com a implantação de grandes lavouras de soja e milho,
além do incremento da produção agropecuária. Isso reforça a decisão acertada de
interiorização da Universidade Federal do Maranhão de ocupar estrategicamente as
microrregiões que possuem grande potencial, mas que, até há pouco tempo, careciam de
conhecimento técnico especializado para sua exploração.
Foi a partir da constatação da diversidade e da riqueza natural da região que a
pesquisadora Maria da Cruz Chaves Lima Moura, do curso de Agronomia, do CCAA,
elegeu como fonte importante de pesquisa uma fruta tipicamente maranhense, o bacuri
(Platonia insignis Mart, Clusiaceae), que tem sido fonte de sustento para muitas
famílias que dela sobrevivem pela coleta extrativista e processamento da polpa,
principalmente. Esse esforço de catalogação de informações sobre o Bacuri permite, por
exemplo, antever um grande potencial econômico que pode vir a ser explorado pela
economia verde.
A pesquisa da professora informa que das sementes é possível extrair o óleo
para fins medicinais, fabricação de sabão com características antifúngicas e
antibactericidas; da casca dos frutos, é possível a produção de doces, geleias, sucos,
licores, sorvetes e outros produtos que já possuem valor de mercado no Brasil e em
outros países; da madeira, é possível extrair material para obras hidráulicas e
carpintaria. Além disso, há um grande potencial para uso do produto na fabricação de
cosméticos e, possivelmente, uso farmacêutico ainda inexplorado. Tudo isso está sendo
pensado, tendo como base a manutenção das áreas nas quais a planta surge naturalmente
como mata nativa, o que, portanto, diminui o desmatamento, combate a pobreza e
fortalece a pequena agricultura familiar ou cooperativista.
Essa pesquisa alia, evidentemente, o conhecimento tradicional ao científico,
agora registrado na pesquisa mencionada, já que aponta para uma multiplicidade de
usos dessa planta, que se sobrepõe à sua principal utilidade, isto é, uma fruta de
consumo extrativista. Esse conhecimento é outro patrimônio que precisa ser ainda mais
valorizado para que dele se possa partir para novas descobertas científicas, sem o
desmerecimento do conhecimento tradicional. Nesse sentido, uma pesquisa americana
aponta que a utilização do conhecimento das comunidades nativas economiza em 400 %
o tempo entre a pesquisa, os testes, as matérias, os equipamentos e os salários de
cientistas envolvidos.
A geração de novas oportunidades de emprego, o desenvolvimento e as divisas
para o Brasil passa, necessariamente, por esse tipo de conhecimento catalogado com
repercussões importantes para o debate sobre a nossa biodiversidade, uma das maiores
do mundo. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) estima que esse
patrimônio genético valha cerca de U$$ 2 trilhões. Outras nações e a rica indústria
cosmética e farmacêutica têm se utilizado de plantas e animais de várias partes do
mundo, inclusive do Brasil, na produção de diversos produtos que movimentam um
mercado de bilhões de dólares por ano.
Guardando-se as devidas proporções, pode-se afirmar que o estudo do Bacuri e
de dezenas de outras plantas com igual potencial pode ajudar a realizar as metas de um
desenvolvimento sustentável – à semelhança daquelas discutidas na Rio + 20 – e
contribuir para soluções que afetarão positivamente não somente nossas comunidades,
como também outras similares em nosso país. Afinal, uma terra só pode ser considerada
próspera se aqueles que nela habitam forem igualmente prósperos. O equilíbrio entre os
tipos de conhecimentos – o tradicional e o científico – é o que pretendemos debater a
exaustão na 64ª Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC,
que acontecerá de 22 a 27 de julho de 2012, na UFMA.
SBPC 2012: UM CENÁRIO DE MÚLTIPLAS
POSSIBILIDADES
AYMORÉ ALVIM
Professor da UFMA aposentado e Diretor do IHGM.
Texto publicado anteriormente no Blog Pinheiro em Pauta.
http://pinheiroempauta.blogspot.com.br/2012/06/as-esteariasdo-encantado-acad.html
O ENCONTRO
ALDY MELLO
Lançado na SBPC, dia 23 (2ª feira) às 19 horas, na Programação Cultural - Café Literário
da Expo T&C, no Campus do Bacanga.
Esse livro traz um imaginário de seu autor. Ele constrói encontros entre seres que
um dia foi vivo e tiveram a experiência da vida vivida, agindo como muitos agem hoje.
Eles foram cientistas, políticos, pensadores, filósofos, guerreiros, religiosos, inventores,
enfim, homens que ajudaram a fazer a história dos homens e da humanidade, deixando
as suas contribuições para o desenvolvimento do mundo. Sabemos que eles não voltam
mais a terra, mas, possivelmente, continuam a torcer para que suas contribuições
possam ser cada vez mais úteis ao universo, mais práticas para a vida moderna e ajudar
os homens a serem melhores seres e fazerem suas experiências de vida.
Os mais antigos e famosos filósofos gregos se encontram e falam da filosofia
antiga. Sócrates, Platão e Aristóteles discutem, entre si, suas verdades. Eles falam da
ética, da virtude e da sabedoria. Confúcio, chinês, e Gandhi, indiano, falam dos
caminhos que indicaram para o mundo e para a humanidade. Abraão e Moisés, um
patriarca e outro profeta, representam a Bíblia Sagrada e falam da terra prometida e do
povo de Deus. Júlio César se encontra com Péricles e lembram seus tempos de Roma e
Atenas. Jesus Cristo, Buda e Maomé mostram em que suas religiões se diferenciam e
falam dos seus milhares de seguidores. Hamurabi, Beccaria e Lombroso abordam
crimes e penas. Maquiavel e Abraham Lincoln discutem sobre o Príncipe e a
democracia americana. Cícero e Sêneca comentam sobre Roma, seus tresloucados
Imperadores e as proezas da época. Leonardo da Vinci e Picasso, dois grandes
expoentes das artes plásticas, discutem sobre arte. Shakespeare e Miguel de Cervantes
discorrem sobre suas obras que encantaram o mundo. Copérnico, Galileu Galilei e Isaac
Newton discutem ciência. Napoleão Bonaparte e Alexandre, o Grande lembra-se de
suas ambições. Marco Polo e Cristóvão Colombo recordam suas aventuras de
descobridores. Albert Einstein e Henry Truman falam de bomba atômica. Montesquieu,
Voltaire e Rousseau lembram o iluminismo. Max Weber e Taylor rememoram a
revolução industrial e suas consequências. Karl Marx e Mao Tsé -Tung relembram o
comunismo e a Revolução Cultural da China. Santo Agostinho e o Imperador
Constantino comentam a evolução do cristianismo. Beethoven e Mozart recapitulam a
música erudita. Santos Dumont e Júlio Verne lembram os primeiros aviões. Lênin e
Franklin Roosevelt falam do regime soviético e da democracia americana. Simón
Bolívar e Thomas Jefferson discutem imperialismo. Lutero e João Calvino debatem
religião. Alexander Fleming e Pasteur constatam a falta de saúde. Thomas Edison e
Graham Bell comentam a tecnologia em Cingapura.
A INDÚSTRIA CINEMATOGRÁFICA DO
MARANHÃO
JOAQUIM NAGIB HAICKEL
Publicado em O Estado do Maranhão, dom, 08/07/12 http://colunas.imirante.com/platb/joaquimhaickel/
Esta entrevista foi publicada originalmente na edição de sábado(5/08/12) do Guesa Errante, Suplemento
Cultural e Literário do Jornal Pequeno.
Biografia
Natural de Tutóia, município localizado no litoral Norte do Maranhão, onde
nasceu no dia 28 de agosto de 1942, Aldy Mello de Araújo é professor aposentado da
Universidade Federal do Maranhão (UFMA); mestre em Ciências Sociais pela
Universidade de Louvain, na Bélgica; especialista em Administração Universitária pela
Organização Universitária Nacional – OUI, do Canadá; especialista em Metodologia da
Pesquisa Social pela Portland State University, nos Estados Unidos; professor emérito
da Arkansas State University, também nos Estados Unidos; bacharel em Ciências
Jurídicas e Sociais pela UFMA.
Quem não conseguir ganhar, vai continuar sonhando sempre com a próxima. Não
é uma boa compensação?
CONVITE AO PASSADO DE SÃO LUÍS
Pesquisa chegada a mim, por e-mail, com artigo da Advogada Doutora Carmen
Leonardo do Vale Poubel, de Canhoeiro de Itapemirim – ES informa que o título de
doutor atribuído ao advogado tem procedência jurídica, independentemente de ele haver
cursado doutorado. Dele reproduzi trechos que integram este artigo.
“O título de doutor foi concedido ao advogado por D. Pedro I em 1827. Título
este que não se confunde com o estabelecido pela Lei nº 9.394/96 (Diretrizes e Bases da
Educação), aferido e concedido pelas Universidades aos acadêmicos em geral”.
“A Lei do Império de 11 de agosto de 1827 cria dois cursos de Ciências Jurídicas
e Sociais; introduz regulamento, estatuto para o curso jurídico; dispõe sobre o título de
(grau) de doutor para o advogado”. A referida Lei possui origem legislativa no Alvará
Régio editado por D. Maria I, a Pia (A Louca), de Portugal, que outorgou o tratamento
de doutor aos bacharéis em direito em exercício regular da profissão e no Decreto
Imperial (DIM), de 1º de agosto de 1825, editado pelo Chefe de Governo Dom Pedro
Primeiro. O Decreto 17.874A, de 09 de agosto de 1827, declara feriado o dia 11 de
agosto de 1827, data em que se comemora o centenário da criação dos cursos jurídicos
no Brasil. Os referidos documentos encontram-se microfilmados e disponíveis para
pesquisa na Biblioteca Nacional, localizada na Cinelândia (Avenida Rio Branco – Rio
de Janeiro – RJ).
A Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994, no seu artigo 87 (Estatuto da OAB), ao
revogar as disposições em contrário, não dispôs expressamente sobre a referida
legislação. Revogá-la tacitamente também não o fez, uma vez que a legislação Imperial
constitui pedra fundamental que criou os cursos jurídicos no Brasil.
Historicamente, sabe-se que o título de doutor foi outorgado pela primeira vez no
Século XII aos filósofos – DOUTORES SAPIENTIAE – como, por exemplo, Santo
Tomaz de Aquino, e aos que promoviam conferências públicas, advogados e juristas,
estes últimos como JUS RESPPONDENDI. Na Itália, o advogado recebeu pela primeira
vez o título como DOUTOR LEGUM, DOCTORES ES LOIX. Na França, os
advogados eram chamados de DOCTORES CANONUN ET DECRETALIUM, mais
tarde DOCTORES UTRUISQUE JURIS e assim por diante em inúmeros países.
Pesquisa histórica creditada ao Doutor Júlio Cardella (Tribuna do Advogado,
1986, página 05), considera que o advogado ostenta legitimamente o título de doutor
antes mesmo que o médico, uma vez que este, ressalvado o seu imenso valor, somente
recebeu o título por popularidade.
E mais, historicamente a Bíblia denomina de juristas àqueles que interpretavam a
Lei de Moisés, no Livro da Sabedoria, considerados doutores da lei.
Não é difícil encontrar-se quem menospreze os advogados, expurgando destes o
título legítimo de Doutor, por falta de conhecimento legal e jurídico.
Não obstante, o referido título não se reveste de mera benesse monárquica. O
exercício da advocacia consubstancia-se essencialmente na formação de teses, na
articulação de argumentos possíveis juridicamente, em concatenar ideias na defesa de
interesses legítimos, que sejam compatíveis com o ordenamento jurídico pátrio. Não
basta, portanto, possuir formação intelectual e elaborar apenas uma tese. “Cada caso é
um caso”. As teses dos advogados são levadas a público, aos tribunais, contestadas nos
limites de seus fundamentos, argumentos, convencimento e, por fim, julgadas à
exaustão. Se confirmadas pela justiça passam do mundo das ideias para o mundo real,
por força judicial. Não resta dúvida que a advocacia possui o teor da excelência
intelectual e, por lei, os profissionais que a exercem devem ostentar a condição de
doutores.
O advogado, profissional da advocacia e do direito, deve a si mesmo o
questionamento interior de estar à altura de tão elevada honraria, por mérito, por
capacidade e competência; deve ser distinto e justo na condução dos interesses por Ele
defendidos.
O Advogado (bacharel em direito aprovado no exame da OAB e nesta
devidamente inscrito) é legalmente doutor; é Doutor por Excelência! SL, 11/08/2012)
O PASSADO DEVE SERVIR PARA ALGUMA
COISA
ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA
Os leitores que hoje possuem mais de 40 anos devem ter ouvido falar da peça de
teatro Calabar escrita por Rui Guerra e Chico Buarque, e dirigida por Fernando Peixoto
em 1973. Devido a censura da ditadura militar só foi encenada em 1980. A lembrança
desse texto nesse momento de debates sobre a fundação francesa ou portuguesa da
cidade de São Luís nos parece oportuna. As reflexões sobre o tema das origens míticas
ou históricas da capital maranhense têm adquirido sobressaltos um tanto dramáticos;
com partidários apaixonados dividindo-se entre posições de defesa veemente dos
fundadores franceses (francofilia), de um lado; e dos portugueses (lusofilia), de outro.
Semelhanças há com a história de Recife e Olinda, estudadas quando nós pesquisamos
em Pernambuco, no final dos anos de 1980. Ao realizar esse trabalho de pesquisa nos
famosos Montes Guararapes, nos quais se realizaram as memoráveis batalhas pela
expulsão dos holandeses; pudemos constatar que ainda há reminiscências profundas do
mesmo conflito entre duas versões de fundação e identificação histórico-cultural. Em
Pernambuco também encontramos o dilema tratado no fundo da peça: a qual senhor
europeu o Brasil deve servir? O Brasil - projeto de futuro nativismo - seria melhor
colonizado por holandeses ou portugueses?
No ensaio Festim Barroco (Corrêa, 2008), nós traçamos algumas considerações
críticas sobre as versões históricas e econômicas desse conflito, e suas conversões
míticas e culturais mais sobressalentes. Podemos então tirar algumas lições desse
trabalho, através do exercício da mitanálise, tomando foco agora sobre os nossos atuais
estudos dos mitos e dos ritos de fundação da capital ludovicense.
Domingos Fernandes Calabar foi utilizado por Chico Buarque e Rui Guerra, no
início da década de 1970, como personagem de crítica ao momento pelo qual passava o
país sob o jugo severo do regime ditatorial militar; período em que eram comuns os
usos das metáforas nas produções artísticas a fim de, por um lado, burlar a censura
rigorosa do sistema e, por outro, denunciar a situação atual. Na peça encontramos
distorções históricas importantes, com intuito deliberado de causar espécie de
inquietação, com muita força dramática; licenças mais que compreensíveis naquele
contexto. Quando aqui forçamos alguma comparação com o que foi tratado nessa obra,
é no sentido de provocar uma movimentação no nosso imaginário social sobre a questão
em voga. Afinal, realmente há semelhanças que suscitam comparações intrigantes. Em
Pernambuco, ainda hoje é comum ouvirmos elogios as possibilidades de maior
desenvolvimento de Recife e Olinda, caso os holandeses continuassem como senhores.
Invocam-se as ciências e as artes de Nassau, o esclarecimento dos empreendedores
batavos e judeus, e muitas outras vantagens modernistas e capitalísticas que os
holandeses teriam sobre os atrasados, semi-feudais e barrocos portugueses e ibéricos.
Em São Luís parece-nos que o ‘elogio da traição’ às origens lusitanas e ibéricas graça
com força, ao ponto de ser oficializada a sua fundação por franceses. Contudo, em
Pernambuco jamais essa traição ganhou apoio institucional; aliás, naquele estado da
federação as Forças Armadas do Brasil celebram as suas origens, fincadas nas batalhas
dos Montes Guararapes, em rituais de rememoração teatralizados, com grande pompa e
ostentação espetacular, comemorando a expulsão dos invasores holandeses.
Sempre que pensamos nessas celeumas históricas, sobre as faustosas vantagens
que poderíamos obter ser fossemos colonizados por franceses ou holandeses, lembro-me
dos países de fronteira ao norte: as Guianas! Parece que nenhum desses três países
colonizados por europeus não-ibéricos são exemplos de desenvolvimento nos trópicos.
Os defensores de “senhores melhores e mais esclarecidos” se esquecem de consultar os
índices de desenvolvimento humano desses países fronteiriços colonizados, e alguns
ainda submetidos, as três metrópoles européias: Inglaterra, França e Holanda!
Voltando a peça teatral, no meio do ATO I, no diálogo entre Mathias
Albuquerque (ex-governador de Pernambuco) e uma personagem que representa o
Holandês, diz-se: “No fim das contas o passado deve servir para alguma coisa...” (2006,
p. 45). Pode parecer irônico, mas em São Luís ocorre um fenômeno interessante;
enquanto em Recife e Olinda (Pernambuco) se expressa sorrateiramente, e as vezes bem
queixosamente, a infelicidade de ter caído de novo nas mãos ibéricas, no período
designado de ‘Restauração’ (começando com a expulsão dos holandeses em São Luís!);
entre nós, maranhenses, desde 1912, ao se escolher o ‘pai’ fundador, deu-se atestado ao
gaulês. No nosso pacto edípico firmado no começo do século XX, as elites hegemônicas
entronizaram os francos, como os fundadores da cidade e da capital do Estado. A
‘traição’ foi legitimada e, sem resistências contundentes, percorreu o tempo em
celebrações cada vez mais espetaculares, culminando com a apoteótica consagração em
1962! Agora, em 2012, prenuncia-se nova espetacular encenação cívica, com o passado
servindo para muita coisa! Dessa vez, ao que parece, com algumas resistências de
membros de academias científicas e universitárias, engrossando as falanges dos
descontentes com essa ‘traição’ ou ‘mistificação francófila’; não querem deixar passar
para o século XXI tal atentado aos princípios da historiografia e da verdade histórica.
Reler a peça Calabar: o Elogio da Traição, hoje, é um exercício para espírito
que fará muito bem a todos; movimentando nossa musculatura ética e sacudindo nossa
mente das poerias e teias de aranha das velhas e costumeiras ideias, repetidas ad
nauseam. Trata-se de uma obra inteligente e sutil que coloca em foco; como escreveu
Fernando Peixoto: “o comportamento dos homens entre si, observados numa
determinada circunstância histórica. Essa postura traz o texto até nossos dias”. Sem
dúvida, tal objetivo é alcançado com maestria. E vemos até que, no que tange aos
entrelaçamentos dos mitos individual e coletivo, comentados em outro artigo nosso, um
dos autores da obra traz no nome a marca desse entrelaçamento mitológico. O que nos
faz relembrar de Mircea Eliade: “É por isso que o inconsciente apresenta a estrutura de
uma mitologia privada. Podemos ir ainda mais longe e afirmar não só que o
inconsciente é ‘mitológico’, mas também que alguns dos seus conteúdos estão
carregados de valores cósmicos, isto é, que eles refletem as modalidades, os processos e
o destino da vida e da matéria viva. Podemos até dizer que o único contato real do
homem moderno com a sacralidade cósmica se efetua através do inconsciente, quer se
trate dos seus sonhos e da sua vida imaginária, quer das criações que surgem do
inconsciente (poesia, jogos, espetáculos, etc.)” (Eliade, 2000, p. 68-69). Citação que cai
perfeitamente no caso, como uma mão na luva! Temos analisado os mitos, os ritos, as
versões históricas e historiográficas, e os discursos de fundação da cidade de São Luís,
há alguns anos, e consideramos que nossa contribuição torna-se significativa e útil na
medida em que pretende alargar nossos horizontes para além das obviedades e da
dimensão anedótica. Nessa trilha analisamos os contornos desses debates e pontuamos
aspectos muitas vezes encobertos e negligenciados; afinal, o inconsciente social é
dinâmico e não convêm posturas reducionistas no seu trato. O desafio é trazer à tona
continentes subterrâneos que subjazem aos enunciados tomados como naturais e óbvios;
trabalho que demanda tempo, elaboração e profunda escavação na história cultural.
Referências
BUARQUE, Chico. Calabar: o elogio da traição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.
CORRÊA, Alexandre Fernandes. Festim Barroco. São Luís: EUFMA, [1993] 2008.
ELIADE, Mircea. Aspecto do mito. Lisboa: Edições 70. [1963] 2000
TRIUNFO DO ESPÍRITO FESTIVO
ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA
3
Uma análise mais especifica desse aspecto, ver o texto O labirinto dos significantes na cultura barroca
(Corrêa, 2009).
prazer; o ensejo lúdico, proporcionando a fuga do ‘horror ao vazio’. É a eficácia do
artifício político de fazer prender e submeter todos à magia admoestadora do brilho e da
glória do poder. Como escreveu João Francisco Lisboa, sobre a Festa de N. S. dos
Remédios; ilustrando nossa tese:
Um dos maiores benefícios que dispensa a Virgem com sua festa (...) é este
prazer universal, tantas classes confundidas, tantas dores adormecidas,
tantos escravos deslembrados de seus ferros. Inda mal, que é tudo tão
fugaz! Não importa, é um momento de repouso nesta lida que só tem a
morte por termo, é um conforto para recomeçar-se com mais vigor a tarefa
do dia seguinte. Mil ferventes e gratas orações à compassiva e
misericordiosa Virgem (1992, p. 61).
Para nós, nos limites dessa crônica, esse modelo de festividade, ou festival, segue
a linha temporal da festa maior da nossa história colonial, qual seja o Triunfo
Eucarístico de 1733, ocorrida em Vila Rica. Nela aglutinam-se, numa só imagem
coletiva: a) as desinências culturais do sagrado e do profano, escrevendo uma primeira
metáfora do êxito sociológico da miscigenação e do sincretismo místico, alimentada até
hoje - azeitando a máquina comemorativa -, com pujança tropical e dionisíaca; e, b) a
resistência das classes dominadas contra a coerção de uma estrutura hierarquizada,
desigual e historicamente perversa, consolidada na sociedade brasileira, e
permanecendo ainda inalterada em diversos torrões. E no torrão maranhense esse
processo se dá de forma extraordinariamente semelhante e persistente 4.
O consagramento festivo do Triunfo Eucarístico premonitório nos tem preparado
para entender a contradição brasileira e em especial suas aberrações e incongruências
regionais e locais. Além de servir para compreender a festa brasileira, e os fenômenos
ligados à antiestrutura e ao excesso, como processos vinculados à gênese e à
transformação de nossa cultura e de seus agentes sociais. Ajuda também a apreender a
lição moderna de liberdade e interação que ainda nos é presentificada pelo espetáculo
cíclico do Carnaval, modelo de alegria eufórica programada, agendada, ritualizada e
cada vez mais frugal, nos prometendo um estado permanente de festa e efervescência
coletiva, como bálsamo fugaz em meio a tantos infortúnios.
4
Utilizamos o termo torrão no sentido de torrão natal (homeland), terra natal, empregado pelo geógrafo
maranhense Raimundo Lopes que aos 17 anos de idade publicou livro famoso no Maranhão, O Torrão
Maranhense. Obra que hoje compõe publicação reeditada conhecida como Uma Região Tropical (Lopes,
1970). A expressão adquiriu grande repercussão no imaginário regional, surgindo recorrentemente em
toadas de bumba-boi e em diversas canções e poemas populares e eruditos. Em breve, vamos desenvolver
estudos sobre possíveis paralelos literários entre o torrão natal (homeland) dos poetas brasileiros e a
waste land (tierra baldia) do poeta T. S. Eliot (1888-1965). Sobre a obra Waste Land de Eliot, ver as
análises do antropólogo mexicano Roger Bartra, em Culturas Liquidas (2008).
CÔNEGO GREGÓRIO LUÍS DE BARROS - UM
SANTO.
Há cento e dez anos, dia 8 de junho de 1902, assumia a paróquia do Senhor São
Bento, o seu 13° vigário, padre Gregório Luís de Barros, um de seus mais devotados
sacerdotes, nomeado que fora em 24 de maio anterior.
Nascido em Loreto a 17 de novembro de 1868, seguiu para Recife, cidade que por
alguns anos cursou a Faculdade de Direito. Em Olinda, ingressou no Seminário e
estudou Ciências Eclesiásticas. Ordenado a 13 de maio de 1902, logo foi servir na
paróquia do Senhor São Bento, localidade que já conhecia desde seu tempo de
seminarista.
Durante sua permanência de dezesseis anos, sua gestão foi marcada de trabalho,
muita generosidade, devoção e uma vida de simplicidade.
Tudo o que ganhava acudia os mais carentes, ou investia na melhoria física da
igreja. A mobília de sua modesta casa resumia-se de alguns tamboretes e umas caixas
vazias, e assim recebia o bispo Dom Francisco, o governador do Maranhão e qualquer
autoridade.
Homem de profunda fé, sem destemor fustigou os que dissonavam dos princípios
cristãos e éticos. Essa inflexível conduta fê-lo granjear um punhado de descontentes
paroquianos que utilizavam da denúncia infundada como torpe vingança. Em face ao
elevado conceito desfrutado nos altos escalões da Mitra, e o menoscabo de seus
maledicentes, infrutíferas eram. Pediram-lhes a transferência, ao invés de atendê-los o
bispo o nomeou cônego, e para contrariar os desafetos, manteve-o na paróquia, com
todo prestígio.
Das calúnias, a mais sórdida o cidadão Raimundo Hermógenes boatava que o
padre namorava Maroca Melo, bela devota chegada de Manaus, com quem todas as
noites, para se encontrarem pulava a cerca da casa em que habitava. Diante de tão
absurda notícia, os honrados senhores Bentoca Corrêa e Inácio José Rocha, tipo São
Tomé decidiram comprovar. Esconderam-se e mais tarde, das bandas da Casa Paroquial
lá vem o padre. Decepção, surpresos, mas conhecedores da santidade do reverendo
decidiram-se capacitar-se. Foram à residência dele bateram na janela, chamaram:
cônego, cônego. Aberta a janela, surge o suposto difamado a segurar o breviário,
lanterna e uma arma, e aflito perguntou o que é filhos que vocês tão impacientes
desejam a estas horas da noite? .
- Nada, nada, saíram apressados, foram convidar os vizinhos, ficaram na espreita.
Quando o padre namorador saltou a cerca, foi desmacarado. Era o dito Raimundo
Hermógenes, vestido de uma batina que o filho trouxera ao ser expulso do Seminário,
ato que o pai admitia haver sido influência de cônego Barros. Esse episódio foi mais
bem descrito em artigo da lavra do historiador Desembargador Nicolau Dino que,
concluiu: enquanto seus caluniadores morreram de doenças malignas, o padre foi tido
como Santo, venerado pelos romeiros que iam ao santuário do Coco da Aparecida,
devoção estimulada pelo seu fervor.
Depois de realizar seu objetivo, retirar-se de São Bento somente concluir a
reforma da matriz, retornou para sua terra natal quando profetizou que o padre Felipe a
quem entregou o bastão, seria o último são-bentuense a ordenar-se. Durou mais de meio
século. É de bom alvitre que nosso querido município já havia dado onze sacerdotes ao
Catolicismo, entre eles um arcebispo, um bispo, um arcediago, três cônegos, um mestre-
escola. Concluiu que São Bento cresceria como rabo de cavalo, e chegaria ser
governado por moleques.
Monsenhor Barros domiciliado em seu município foi a 11 de maio de 1925,
honrado pelo Santo Padre com o título de Monsenhor Camareiro Secreto.
Cercado de total respeitabilidade faleceu em Loreto a 26 de janeiro de 1935.
20 DE AGOSTO - DIA DO MAÇOM
OSVALDO PEREIRA ROCHA
Hoje, 20 de agosto, é, legalmente, consagrado ao Maçom, Homem diferente, que
se dedica à prática do bem e que pertence à Sublime Instituição Maçonaria.
Em homenagem a este dia, ontem, 19/08/2012, a Maçonaria Unida do Maranhão
(Grande Loja Maçônica do Estado do Maranhão – GLEMA, Grande Oriente do Brasil
no Maranhão – GOB-MA e Grande Oriente Autônomo do Maranhão – GOAM), sob a
coordenação da Grande Loja Maçônica do Estado do Maranhão – GLEMA, realizou,
com muito sucesso, a 10ª Grande Ação Social da Maçonaria Maranhense, com cerca de
100 mil atendimentos, à qual este articulista compareceu.
Mas, afinal, o que é ser Maçom?
“Ser Maçom é buscar a verdade; ser Maçom é lutar em prol da liberdade, da
igualdade e da fraternidade”. “Nenhum Maçom é tão pequeno que não possa fazer algo
pela Humanidade”.
Ser Maçom é ser amante da virtude, da sabedoria, da justiça e do ser humano.
Ser Maçom é trabalhar incansavelmente pela harmonia das famílias, da concórdia,
da harmonia e da união. É lutar pela Paz do gênero humano.
Ser Maçom é derramar por todas as partes os esplendores divinos da instrução, a
educar a inteligência para o bem comum, conceder os mais belos ideais do Direito, da
moralidade e do amor, e praticá-los.
Ser Maçom é levar à prática o formosíssimo preceito de todos os lugares e de
todos os séculos que diz, com infinita ternura aos seres humanos indistintamente, do ato
de uma Cruz e com os braços abertos ao mundo: “Amai-vos uns aos outros, formai uma
única família, sede todos irmãos”!
Ser Maçom é amar a luz e aborrecer as trevas; é ser amigo da Ciência e combater
a Ignorância; é render culto à Razão e à Sabedoria.
Ser Maçom é praticar a tolerância, exercer a caridade, sem distinção de raça,
crença ou opinião, é lutar contra a hipocrisia e o fanatismo.
Ser Maçom é realizar, enfim, o sonho áureo da Fraternidade Universal entre os
Homens.
Parabéns Maçons, especialmente os maranhenses, pelo seu dia!
LANÇAMENTO DO LIVRO O NÁUFRAGO E A LINHA DO HORIZONTE: POESIAS
(São Paulo: Scortecci, 2012)
5
REIS, Fábio José Garcia dos. Patrimônio cultural: revitalização e utilização. In Fonte:
http://www.lo.unisal.br/nova/publicacoes/patrimoniocultural.doc, disponível em
http://www.etur.com.br/conteudocompleto.asp?idconteudo=14218, 6/11/2009, acessado em
03/09/2010.
6
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. LAZER, HOSPITALIDADE, IDENTIDADES E CULTURAS
REGIONAIS E LOCAIS. Fala na Mesa Redonda 1 do 22º ENAREL - Lazer e Hospitalidade: desafios
para as cidades sede e subsedes de megaeventos esportivos, tendo como tema: Lazer, Hospitalidade,
Identidades e Culturas Regionais e Locais.
7
http://pt.wikipedia.org/wiki/Diversidade_cultural
8
CASTRO Cláudia Steffens de. Educação para o turismo: preservação da identidade regional e respeito à
cultura imaterial. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais. Outubro/ Novembro/ Dezembro de
2008 Vol. 5 Ano V nº 4, ISSN: 1807-6971, Disponível em: www.revistafenix.pro.br acessado em
09/09/2010.
engloba a consciência de si mesmo e o reconhecimento do outro 9. Assim, a identidade
de um povo é o resultado da identidade individual e coletiva estabelecidas pelos
membros de uma mesma comunidade 4.
No século XX a sensação da fragmentação da identidade, da perda das referências
culturais, despertou no homem o desejo de “retorno a algo perdido”, ou seja, a
necessidade de buscar manifestações culturais que pertencem a seu passado vivo, a
comportamentos que deixaram de ser comuns, pois o frenesi contemporâneo exige
atitudes da sociedade globalizada: “A preservação do patrimônio tem entre suas funções
o papel de realizar “a continuidade cultural”, ser o elo entre o passado e o presente e nos
permite conhecer a tradição, a cultura, e até mesmo quem somos e de onde viemos.
Desperta o sentimento de identidade. Margarita Barreto 10 defende a ‘recriação de
espaços revitalizados’, como um dos fatores que podem ‘desencadear o processo de
identificação do cidadão com sua história e cultura”.
Então, ao se buscar a identidade, fatalmente chegar-se-á a quem realmente se é. A
essência cultural é o que une os povos, permitindo que se reconheçam como grupo,
como coletividade diante de sua diversidade. A identidade irá se concretizar a partir da
consciência de que a riqueza das pluralidades culturais, reveladas através da memória
coletiva, está inserida no potencial de superação de marcas particulares do indivíduo.
Até que ponto é possível conservar essa identidade num mundo marcado pela
intensificação de fluxos globais de informação? É possível pensar em mundialização da
cultura?
Costa (2002) 11 considera haver um “paradoxo das identidades culturais em
contexto de globalização”: Porventura, um dos aspectos mais importantes a sublinhar é,
justamente, o cruzamento de dinâmicas identitárias que este tipo de contexto urbano
cosmopolita proporciona. Cruzamento que se estabeleceu entre cada uma das
representações de identidade cultural nacional ali presentes e a representação de uma
“síntese global” da multiplicidade cultural planetária; síntese global essa, por sua vez,
“localizada” num espaço de representação que se constituiu como referente identitário
privilegiado da cidade e da sociedade promotoras. (p. 23)
Da globalização cultural emergem novas identidades nacionais, regionais e locais
agora com novas abordagens. Vê-se atualmente o ressurgimento das culturas populares
com algumas de suas características regionais modificadas para atender um novo
mercado de consumo de bens simbólicos em um mundo gerido pelos meios de
comunicação, de informação e inclusive, do turismo 12.
Chamo aqui atenção, ao me referir às questões de cultura, memória, identidade
regional e local, ao fato de que teremos um grande evento por estes lados: os 400 anos
9
BETTIO, Valéria Maria da Silva. Movimento Brasileiro: crítica e nacionalismo no Modernismo. Porto
Alegre: PUCRS, 2000.
10
BARRETO, Margarita. Turismo e legado cultural. Campinas: Papirus, 2000, citada por REIS, 2009,
obra citada, disponível em http://www.lo.unisal.br/nova/publicacoes/patrimoniocultural.doc .
11
COSTA, António Firmino da. Identidades culturais urbanas em época de globalização. Revista
Brasileira de Ciências Sociais, v. 17 n. 48, fev. 2002, citado por ALMEIDA, Bárbara Schausteck de;
MEZZADRI, Fernando Marinho ; MARCHI JUNIOR, Wanderley. CONSIDERAÇÕES SOCIAIS E
SIMBÓLICAS SOBRE SEDES DE MEGAEVENTOS ESPORTIVOS. In Motrivivência Ano XXI, Nº
32/33, P. 178-192 Jun-Dez./2009
12
CASTRO Cláudia Steffens de. Educação para o turismo: preservação da identidade regional e respeito
à cultura imaterial. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais. Outubro/ Novembro/ Dezembro de
2008 Vol. 5 Ano V nº 4, ISSN: 1807-6971, Disponível em: www.revistafenix.pro.br acessado em
09/09/2010
de São Luís. Esse fato foi primordial para que esta edição do ENAREL viesse para esta
parte “de cima do mapa”, haja vista que “a Cidade do Maranhão” é um lugar de
diversidade cultural, com tradição na arte, na poesia, na dança, nas manifestações
folclóricas, na música, na culinária e em seu patrimônio histórico. Tudo isto demonstra
a relevância de um patrimônio material e de toda uma herança imaterial que contribuiu
para a obtenção do título de Patrimônio da Humanidade.
Desse modo, toda a diversidade de São Luís favorecerá as discussões no ENAREL
2012, a partir de óticas especiais, o lazer e a cultura em suas mais simples e mais
complexas expressões, no reconhecimento do tema como importante e oportuno assunto
para um Brasil moderno e audacioso.
O objetivo é promover a reflexão, o debate e o intercâmbio científicos,
fundamentados em contribuições acadêmicas advindas de estudos, pesquisas e ações
sobre o lazer e a pluralidade da cultura em suas vivências e experiências sociais; os
aspectos culturais das comunidades, com suas configurações refletidas no lúdico em
articulações individuais e coletivas em termos dos modos de vida, dos costumes, dos
fazeres e os lazeres nos diversos espaços e tempos sociais.
Em São Luís, vamos recuperar a importância do evento. Foi o que discutimos em
2010 - Uvinha, Bramante, Leila, Giuliano, Marcellino... Ano passado veio Avaré e as
conversas continuaram: como recuperar o ENAREL, tornando-o um evento que de fato,
estude o Lazer… pois virara um evento voltado para a recreação, esporte de aventuras e
turismo, sem maiores debates epistemológicos; estaria esgotado o modelo? O lazer
deixou de ter importância enquanto campo de estudo, absorvido pelo Turismo?
Somos uma comunidade científica, aberta em pluralidade epistemológica e
disciplinar, atuamos em um campo extremamente marginal e secundário na ciência e
nas políticas públicas. Já não vivemos mais a época do constrangimento citado por S.
Parker em falar que estudamos lazer.
A recuperação da importância estava depositada em São Luis, quando se reveria
esses aspectos. Na formulação do evento, houve a participação de todos os grandes
nomes para dar um cunho efetivamente científico.
É um evento com possibilidades de congregar um número maior de pessoas que
trabalham e estudam recreação, lazer e temas afins, interessadas em divulgar seus
trabalhos e trocar experiências: tivemos 169 trabalhos inscritos e 154 aprovados. O que
demonstra a revitalização do ENAREL.
Começamos por algumas discussões, nos encontros temáticos, coordenados pelo
Prof. Dr. Antonio Carlos Bramante, com os seguintes eixos: ET (1) Docência, Pesquisa
e Extensão na Recreação e no Lazer; Coordena pela Profª Dra. Gisele Schwartz (Unesp
Rio Claro); ET (2) Terceiro Setor na Recreação e no Lazer, sob a Coordenação do Prof.
Esp. Sergio Castro (ONG Estação Eco Guanhanhã; ONG Instituto Dom Quixote;
Instituto Oceanográfico USP); o ET (3) Recreação e Lazer no Sistema “S”,
Coordenador: Prof. Luiz Wilson Pina/SESC – SP; ET (4) Gestores Privados da
Recreação e Entretenimento, Coordenadores: Prof. Me. Sidnei Castro (Universidade
Anhembi Morumbi) e Prof. MSc. Luiz Fernando Oliveira (Universidade Anhembi
Morumbi); ET (5) Gestores Públicos da Recreação e do Lazer, Coordenador Prof Esp.
Liviomar Macatrão (Prefeitura Municipal de São Luís-MA/SETUR – SL); ET (6)
Animadores Socioculturais da Recreação e do Lazer, Coordenador Prof. Esp. Tiago
Aquino (LEL – Unesp; ABRE – Associação Brasileira de Recreadores).
A conferencia de abertura terá por tema “Lazer e Diversidade Cultural”, proferida
pelo Prof. Me. Lerson Fernando Maia (IFRN). As demais palestras estarão a cargo de
Prof. Dr. Nelson Carvalho Marcellino (UNIMEP – Universidade Metodista de
Piracicaba/SP): “Barreiras intra e interclasses sociais para a prática do lazer”; e dos
participantes da mesa redonda “Educação para a Diversidade Cultural: contribuições do
Lazer”, mediada pela Prof. Dra. Linda Rodrigues (UFMA), tendo como convidados o
Prof. Dr. Ricardo Ricci Uvinha (USP) e o Prof. Me. Sergio Souza (UFMA).
Não fugindo à prática, serão realizadas as seguintes oficinas: (1) – “Ritmos
Maranhenses“ com o Prof. Dr. Nonato Viana (UFMA); (2) – “Jogos Eletrônicos, Lazer,
Recreação e Entretenimento”, Prof. Esp. Cleber Mena Leão Júnior /Pesquisador do
GELL/PUCPR; Membro da Confraria dos Profissionais de Lazer do Paraná; Sócio
Diretor do Clube dos Recreadores; Diretor da Associação Brasileira de Recreadores no
Paraná; (3) – “Caldeirão da Recreação com Ênfase na Motricidade Humana”, com
Prof. Me. Sergio Nassar (UFPA); (4) – “Rodas, Brinquedos Cantados e Danças
Folclóricas: Lazer e Diversidade Cultural?” sob a responsabilidade do Prof. Esp. Edinho
Paraguassu/FAAP-SP; (5) – “Jogos Teatrais e de Improviso” com Prof. Esp. Tiago
Aquino (Palhaço Paçoca) - (LEL – Unesp; ABRE – Associação Brasileira de
Recreadores).
As sessões de PÔSTERS e as COMUNICAÇÕES ORAIS estão distribuídas nos
seguintes eixos: (1) – Lazer e Políticas Públicas; (2) – Lazer, Corpo e Saúde; (3) –
Lazer, Turismo e Meio Ambiente; (4) – Lazer, Formação e Atuação Profissional; (5) –
Lazer e Trabalho; (6) – Lazer, Cultura e Educação.
Em 1803, nasceu o Irmão Maçom Luiz Alves de Lima e Silva, Duque de Caxias,
Patrono do Exército Brasileiro e Grão-Mestre de Honra do Grande Oriente do Brasil;
em 1961, com apenas seis meses de mandato, o Presidente da República, Irmão Jânio
Quadros, renunciou ao cargo e pediu asilo na Embaixada da Austrália e assumiu a
Presidência da República o Presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazilli,
estando viajando à China o vice-presidente João Goulart (Jango); em 1969, foi fundado
o Grande Oriente do Estado do Rio Grande do Norte, federado ao Grande Oriente do
Brasil – GOB e em 1973, foi fundada a Potência Maçônica o Grande Oriente Autônomo
do Maranhão – GOAM, sendo que, dois dias antes, haviam sido fundadas as Lojas
Maçônicas Guardiã da Independência e Defensores da Ordem, lojas estas que, com as
Lojas Oliveira Roma, de Chapadinha, Atalaia Codoense, de Codó e Cruzeiro do Sul VI,
de Caxias, foram as fundadoras da referida Potência Maçônica.
Ressalto que os maiores líderes das supracitadas fundações maçônicas foram os
Irmãos Afonso Augusto de Morais, José Joaquim Ramos Filgueiras, Raimundo
Ferreira Marques, Felinto Ribeiro da Silva Neto, José Maria Serejo Santos Jacinto e
Israel Perdigão Freire, e que este articulista integrou o quadro de fundadores da Loja
Guardiã da Independência e foi o seu primeiro Orador, bem como o primeiro Grande
Secretário de Administração do GOAM. E que em 25 de agosto de 1999 assumi a
Cadeira nº 8 do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM, patrocinada
pelo Padre João Felipe Bettendorf, sucedendo ao escritor Bernardo Coelho de Almeida.
25 de agosto é, também, o Dia do Soldado, instituído em homenagem a Luiz
Alves de Lima e Silva, nascido em 25/08/1803 que, com pouco mais de 20 anos de
idade já era capitão e, aos 40, marechal-de-campo, e que entrou para a História como ‘o
pacificador’. Sufocou muitas rebeliões contra o Império. Comandou as forças brasileiras
na Guerra do Paraguai, vencida pela aliança Brasil-Argentina-Uruguai, em janeiro de
1869.
Canhões, baionetas e muito sangue. A Guerra já durava quatro anos. As tropas
não estavam conseguindo passar a ponte do Ribeirão de Itororó, para tomar a estrada
para Assunção... Eis que no meio do campo de batalha surgiu um homem de 65 anos,
mas em pleno vigor, montado a cavalo, que se destacou dos demais e bradou “SIGAM-
ME OS QAUE FOREM BRASILEIROS! Foi o brado de comando de Luiz Alves de
Lima e Silva. Os brasileiros ultrapassaram não só a ponte, mas o caminho para a tomada
da capital inimiga. E, finalmente, em 1º de janeiro de 1869, a bandeira do Império
brasileiro tremulou vitoriosa, quando o Exército brasileiro chegou a Assunção, capital
do Paraguai.
Luiz Alves de Lima e Silva, exemplo de amor e dedicação à Pátria, foi elevado à
condição de Duque de Caxias, o mais alto título de nobreza concedido pelo Imperador.
Publique-se, igualmente, que o dia 20 de agosto é consagrado ao Maçom
brasileiro.
Salve a Maçonaria, os Maçons e o Soldado, que nos fazem Irmãos!
MEIA NOITE EM SÃO LUÍS
JOAQUIM HAICKEL
Já havia escrito uns quatro parágrafos sobre outro assunto ao qual voltarei num
domingo adiante, quando me ligaram dizendo que meu amigo Roberto Duailibe Cassas
Gomes havia falecido.
A partir dali a minha crônica para hoje iria mudar de direção. Passaria a ser, pelo
tom triste e saudoso do adeus, um réquiem, mas seria principalmente um instrumento de
catarse, de enfrentamento de alguns de meus maiores defeitos, de algumas de minhas
maiores fraquezas.
Como diz o título, vou falar-lhe um pouco sobre meu amigo Bob.
Nasci 53 dias antes dele. Eu em dezembro de 1959 e ele em fevereiro de 1960.
Talvez tenhamos vindo ao mundo pelas mãos de médicos diferentes, em hospitais
diferentes. Mas logo iríamos nos encontrar, pois nossos pais se conheciam. Quase todos
se conheciam em São Luis durante os anos 60 e 70.
Não me lembro ao certo como e onde nos conhecemos. Acho que foi em um
aniversário na casa de Daniel Aragão, amigo e sócio de meu pai. Tio Daniel morava no
Apeadouro. Tia Oneide, sua viúva, ainda mora lá.
Uma tia de Roberto morava em frente e as famílias se frequentavam. Deve ter sido
assim. A primeira coisa que soube sobre ele é que era neto do dono da Cola Jesus. Isso
era o máximo.
O certo é que crescemos juntos. Convivíamos nas aulas de judô, nas mesas de
ping-pong, nas escolinhas de basquete, nas peladas de futebol, nos jogos de vôlei, nas
quadras de tênis, tanto no Lítero como no Jaguarema.
Lembro de uma época em que meu pai era um grande distribuidor de bebidas, em
especial da Cola Jesus. Algumas vezes me levava com ele até a fábrica que ficava ali no
Filipinho, perto de nossa casa, no Outeiro da Cruz. Muitas dessas vezes encontrei com
Roberto por lá. Uma de nossas maiores diversões era tirarmos as garrafas de refrigerante
das esteiras de transporte, quando elas saiam da máquina, antes de serem tampadas.
Escalávamos os engradados, brincávamos de esconde-esconde e de “mãos ao
alto”. A vida parecia que não nos traria até aqui.
Roberto sempre foi uma dessas pessoas que você conhece e automaticamente
gosta.
O tempo foi passando e nossas vidas foram naturalmente seguindo seus cursos.
Nos últimos anos não nos víamos mais com tanta assiduidade.
A cidade, graças a Deus, cresceu. Nós, infelizmente crescemos. Mas Roberto foi
um daqueles que conseguiu preservar em algum lugar dentro de si o garoto alegre e feliz
que ele sempre foi. Esse trabalho de preservação é que faz com que pessoas como ele se
destaquem por onde quer que passem.
Encontrei-o certa vez no saguão de aeroporto. Conversamos, matamos a saudade,
colocamos os assuntos em dia. Passávamos tempos sem nos ver, mas sempre que nos
encontrávamos era como se tivéssemos nos visto ontem. Era como se ele soubesse que
eu havia me separado e casara novamente, que minha filha acabara de chegar de um ano
de estudos em Londres. Era como se eu soubesse a quantas ia a sua vida. Éramos
verdadeiramente amigos.
Soube algum tempo atrás que Bob estava doente. Torci para que o caso fosse fácil
de resolver. Quis me convencer que seria.
É aqui que começa o meu drama. Devo reconhecer que sou um grande covarde,
desses que não consegue presenciar a dor de quem ama. Desse defeito me penitencio
diariamente. A dor proveniente disso é resultado da vergonha que sinto, de minha
impotência, de minha incapacidade de conviver com o sofrimento de alguém com quem
partilhei momentos tão alegres e tão felizes.
O egoísmo que transparece nessa covardia eu assumo. Mesmo que não admita
para mim outro tipo de egoísmo ou outra forma de covardia. Não fujo da luta. Fujo do
luto. Não abandono os amigos, da mesma forma que não ambiciono para mim coisas
dos outros ou me apego demasiadamente a bens materiais.
Quando soube que Roberto estava muito mal, meu coração ficou pequeno. Mesmo
diminuído, bloqueou minha garganta. Minhas mãos gelaram.
Por um momento me lembrei de seu sorriso juvenil e ele, em minha mente foi
tomando o aspecto da doença. Fechei os olhos para não ver meu pensamento. Sacudi a
cabeça na tentativa de fazer passar a imagem que teimava em ser projetada em minha
cabeça. Preferi outras: Ora era ele de kimono, ora jogando basquete com suas pernas
arqueadas, ora com a raquete de tênis na mão, ora simplesmente brincando. Sempre
sorrindo.
Quanto a mim, que vivo também sempre risonho, não consegui escapar do choro
enquanto aqui catava milho e desenhava essas palavras.
Não tive coragem de ir ver Roberto doente. Perdoe-me tia Zezé, tio Eli, Sham,
Roberta… Nisso sou um fraco. Apesar de tê-lo visto morto, quero preservar a antiga
lembrança de meu amigo Bob, de nossa infância e de nossa adolescência.
Gosto de pensar que esse fraco aqui se torna forte por preservar impressa, de
forma definitiva no jornal de minha existência, as crônicas de meu tempo que contam as
histórias de pessoas como Roberto.
Se existir um céu, deve algo ser parecido com um imenso ginásio de esportes e
tenho certeza que esse garoto, uma hora dessas, está lá numa das primeiras filas,
torcendo para que quando chegue a minha hora de comprar o meu ingresso para o
grande evento, consiga um lugar no mesmo setor que ele, que certamente é um dos
melhores
SÃO LUÍS, HERDEIRA DA FRANÇA EQUINOCIAL
Se, no fértil campo semeado pelos mitos, a Atenas dos gregos, cidade da Ática,
preferiu a patronagem da deusa da razão e da sabedoria, de mesmo nome – a mesma
Minerva cultuada pelos romanos, cujo presente fora uma oliveira plantada na colina da
Acrópole –, àquela de Poseidon, ou Netuno, seu nome latino, cuja oferta fora um lago
de água salgada, a Atenas dos trópicos desde cedo se renderia ao reino do deus que
governava os mares, em uma época em que a partilha do mundo dependia da partição do
Mar-Oceano e da ousadia e coragem dos navegadores no desafio ao Mar Tenebroso e a
seus monstros lendários.
Pelos mares nunca dantes navegados, celebrados por Camões, a atual Ilha de São
Luís, antes Upaon-açu (significando “Ilha Grande”), Jeviré, da Trindade, das Vacas e do
Maranhão, foi repetidamente frequentada por franceses e lusitanos, em meio a imensas
dificuldades, ao longo do século XVI e, finalmente, ocupada, conquanto somente por
pouco mais de três anos, pelos franceses, que aí plantaram um forte batizado de Saint
Louis – em homenagem ao Rei Luís XIII, então menor –, moradias, duas capelas e
outras construções em 1612, sob o comando dos locotenentes-generais François de
Razilly e Daniel de la Touche, ambos fidalgos, um católico, o outro huguenote, sob a
regência da florentina Maria de Médicis, contando com a valiosa colaboração e auxílio
dos aliados tupinambás, habitantes da terra, os quais desejavam a proteção da Coroa
gaulesa contra os inimigos portugueses, que já os haviam expulsado do leste do Brasil.
Por esses mares navegaram as naus Régent e Charlotte e o patacho Sainte Anne, que
trouxeram a expedição gaulesa ao Maranhão, com seus gentis-homens, soldados,
colonos, marinheiros e quatro capuchinhos, dois dos quais seriam praticamente os
primeiros historiadores de nossa terra: os notáveis cronistas Claude d’Abbeville, autor
da fantástica Histoire de la mission des pères capucins en l’Isle de Maragnan et terres
circonvoisines (História da missão dos padres capuchinhos na Ilha do Maranhão e
terras circunvizinhas), originalmente publicada em Paris, no princípio de 1614, e Yves
d’Évreux, Superior da missão no Brasil setentrional, autor da também fascinante Suitte
de l’histoire des choses plus memorables advenuës en Maragnan, és annees 1613 &
1614 (Seguimento da história das coisas mais memoráveis, ocorridas no Maranhão nos
anos de 1613 e 1614), obra igualmente publicada naquela cidade no ano de 1615, edição
destruída pelo tipógrafo François Huby – por ordens superiores, para evitar mal-estar
nas relações com a Espanha, alegada senhora do Brasil nos termos da União das Coroas
Ibéricas (1580-1640), em virtude do casamento ajustado do soberano francês com a
infanta Ana d’Áustria –, de que sobraram pouquíssimos exemplares, nenhum completo,
um dos quais salvo por pronta interferência de Razilly.
Independentemente da tempestade política, diplomática e militar que se formava,
nasceu a colônia da França Equinocial em 8 de setembro de 1612 – em cerimônia de
posse formal da terra em nome do Cristianismo e da Coroa gaulesa –, situada pouco
abaixo da linha do Equador ou “equinocial”, como era chamada naquele tempo, e com
ela a única capital brasileira fundada por franceses: São Luís.
A infante cidade, como defende Guy Martinière, foi a “capital sonhada” da França
Equinocial, posterior e gradualmente relegada à condição de “capital abandonada”, por
força da deletéria mudança dos ventos da política europeia, vindo a ser conquistada
pelos lusos em 1615, como resultado das ações dos comandantes Jerônimo de
Albuquerque e Alexandre de Moura, a serviço da Coroa Ibérica, e conhecendo, a partir
daí, um deliberado processo de urbanização, mas que, possivelmente, fora idealizada
para constituir o centro de um império ultramarino francês na América do Sul, à
semelhança da cidade de Québec, fundada por Samuel de Chaplain no ano de 1608,
tornada a capital da Nova França na América do Norte.
Embora menos conhecida que a anterior e também malograda colônia da França
Antártica, instalada na Baía de Guanabara (1555-1567), talvez por ter sido menos
duradoura, a França Equinocial, sediada na Ilha do Maranhão, foi mais promissora sob
muitos aspectos: a relação entre católicos e protestantes nesta foi bem mais amistosa ou,
pelo menos, bem menos marcada por hostilidades do que a conduzida naquela; a
colonização portuguesa ainda não se iniciara em todo o norte do Brasil – bastante
desguarnecido militarmente –, apesar de algumas tentativas dos lusitanos nesse sentido,
todas infrutíferas; o Maranhão era a porta para o vasto território amazônico, no qual se
escondia, conforme a crença, o famoso Eldorado; e, sobretudo, a Ilha Grande já era um
próspero entreposto comercial beneficiado por uma linha quase regular de navegação
entre o Porto de Dieppe e a costa setentrional brasileira, organizada pelo Capitão
Guérard a partir de 1596.
A França, nos séculos XV, XVI e XVII, não reconhecia a exclusividade concedida
pela Santa Sé aos portugueses e espanhóis para a exploração e domínio das terras
descobertas ou ainda por serem descobertas no Novo Mundo, a América de hoje, as
Índias Ocidentais de então. Em outras palavras, não acolhia a tese do mare clausum,
afirmada no Tratado de Tordesilhas (1494) e em várias bulas papais de partição do Mar-
Oceano. A observação espirituosa do Rei francês Francisco I de que gostaria de tomar
conhecimento da cláusula do testamento de Adão que o excluíra da partilha do mundo
ficou célebre.
Ademais, os gauleses utilizaram no Maranhão uma estratégia colonial baseada no
estabelecimento de uma aliança prévia com os tupinambás, habitantes da ilha, os quais,
liderados pelo morubixaba Japi-açu, voluntária e espontaneamente aderiram ao projeto
da França Equinocial, com tudo o que ele significava – sujeição à autoridade da Coroa
francesa e adoção do Cristianismo, mais exatamente da fé católica, como religião –, em
troca de proteção contra os inimigos lusos. Por isso, é consenso que o tratamento que
dispensaram aos indígenas da terra foi mais benigno do que o empregado pelos ibéricos,
de um modo em geral, na América meridional, com suas constantes iniciativas de
conversões forçadas e escravização dos nativos. Isto é uma realidade, mas não um
atestado de que um povo fosse mais ou menos cruel, mais ou menos benevolente, do
que o outro: diferentes circunstâncias determinaram a opção por estratégias coloniais
distintas.
De qualquer maneira, é míope a visão, propagada pelos vencedores – os
portugueses – de que os vencidos – os franceses – foram “invasores” da terra. Em 1612,
quando do desembarque dos gauleses na Ilha Grande, ainda não existia o Brasil como
nação independente, a colonização por parte dos ibéricos na região ainda representava
uma quimera e a definição da posse sobre todo o território em questão era uma questão
a ser resolvida pela ocupação e povoamento. Mesmo os tupinambás não eram
originários da ilha e lá haviam se estabelecido no século precedente, após expulsarem
indígenas rivais. Em suma: o Maranhão, do ponto de vista europeu, não tinha dono,
ainda que a Coroa Ibérica o reivindicasse como possessão sua; e, do ponto de vista
índio, a colonização francesa era bem-vinda e foi estimulada.
O Maranhão hodierno, no ano em que sua capital São Luís completa quatro
séculos de fundação pelos franceses, no longínquo 8 de setembro de 1612, procura
reviver este passado distante, jamais olvidado. A fundação de São Luís por La
Ravardière e Razilly – este, injustamente, pouco lembrado – não é e nunca poderia ser
um mito: é, sim, um fato histórico preciso e documentado. O único mito de que
poderíamos falar é o mito português de fundação da cidade, fomentado, desde o século
XVII até o presente, inicialmente pelos vencedores de Guaxenduba e posteriormente por
autores lusófilos, com o propósito de apagar ou, pelo menos, fazer esmaecer a memória
do feito francês.
A cidade, hoje com pouco mais de um milhão de habitantes, em contraste com os
cerca de dez a doze mil tupinambás que habitavam a Ilha Grande quando da chegada
dos gauleses em 1612, estes em número aproximado de 500, conserva o fascínio de seus
primeiros tempos. Para a comemoração da efeméride, ela ostenta uma rica história,
tesouro de muitos eventos e muitos personagens. Seus sobradões, que já conheceram
épocas de maior fausto, ainda guardam a imponência de outrora, apesar dos maus-tratos
ao patrimônio histórico; seus mirantes, que já contemplaram horizontes mais
promissores, ainda encontram no mar argênteo a lembrança das épicas navegações dos
franceses e portugueses, apesar da pouca visão de alguns de seus novos morubixabas;
seus monumentos, que já testemunharam tantos fatos, feitos e malfeitos, ainda mantêm
viva a esperança de dias mais venturosos; seus modernos edifícios, que já se
incorporaram à paisagem quadricentenária, ainda prometem a chegada do novo às praias
do antigo. O Palácio dos Leões e a Igreja e Seminário de Santo Antônio, para a maioria
dos estudiosos, ou o Recolhimento (atual Colégio Santa Teresa) e a Igreja do Rosário,
na Rua do Egito, para outros, marcam os sítios originais onde os franceses edificaram,
respectivamente, o Forte São Luís e o Convento de São Francisco – para os meninos
colonos e índios, quiçá a primeira escola do Maranhão –, no que é ainda hoje o coração
da cidade, onde estão situados o seu centro administrativo e a maioria de suas igrejas
tradicionais, a qual, se herdou dos lusitanos os traçados das ruas e os azulejos dos
sobradões, recebeu de seus fundadores vencidos, mas não esquecidos, o nome, o ponto
de partida e as primeiras construções.
Ao longo de sua história, a cidade teve sua fascinante história contada por uma
considerável plêiade de mortais e imortais, a exemplo de Claude d’Abbeville, Yves
d’Évreux, Ferdinand Denis, Charles de la Roncière, José Ribeiro do Amaral, Mário
Meireles, Carlos de Lima e, mais recentemente, Vasco Mariz e Lucien Provençal.
Afirma o escritor Oscar Wilde, a propósito, que qualquer pessoa pode fazer história,
mas apenas um grande homem pode escrevê-la, em elogio ao mister dos historiadores:
Anybody can make history. Only a great man can write it.
A França Equinocial foi sonhada por homens que acreditavam na força de um
ideal, como Daniel de la Touche de la Ravardière e François de Razilly. Sentencia o
historiador e ensaísta Thomas Carlyle, em tributo àqueles que deixam a sua marca para
a posteridade, que nenhum grande homem vive em vão, de sorte que a história mundial
se revela na biografia dos grandes homens: No great man lives in vain. The history of
the world is but the biography of great men.
A França Equinocial é um eco do passado, a inspirar a celebração do presente e
um vislumbre do futuro que São Luís merece ter.
OS ARTÍFICES E OS DONOS DA FESTA
ANTONIO NOBERTO
ANTONIO NOBERTO
“E os índios com os franceses fincaram os
estandartes da França no centro desta terra
recentemente conquistada não por armas, e sim pela
cruz, não pela força, e sim pelo AMOR”
Claude Abbeville
Linda e inesquecível esta data! Quatro séculos de uma saudável e feliz relação
França x Maranhão. E o que teriam feitos os franceses para continuarem sendo tão
lembrados tanto tempo depois? Eles simplesmente fizeram diferente de muitos outros
reinos e colonizadores ao conquistar o coração dos maranhenses plantando o estandarte
do amor. A relação com os autóctones era amistosa, em lugar da força a cruz, em lugar
das armas e do chicote a flor-de-lis. Em lugar da segregação a união. As crianças
tupinambás estudavam sob o mesmo teto das crianças francesas no primeiro convento
capuchinho do Brasil, o convento e igreja São Francisco, atuais Seminário e igreja
Santo Antonio. Os padres jesuítas portugueses se admiraram e não pouparam elogios ao
empreendimento gaulês no Maranhão. O próprio papa, em visita aos capuchinhos em
Paris, em 1631, lamentou o fim de “tão santa empresa”. O maior poeta brasileiro,
Antonio Gonçalves Dias, concluiu que “... a expulsão dos franceses levou consigo
muitas esperanças”.
Foi assim que David Migan e La Ravardière conseguiram manter cerca de vinte
mil selvagens sob seu comando, praticamente extinguindo o canibalismo entre eles.
Vale lembrar que na França Antártica no Rio de Janeiro, este foi um dos maiúsculos
problemas enfrentados pelo líder Villegaignon. No Maranhão foram criadas as “Leis
fundamentais decretadas” pelos franceses em 1612, primeiro conjunto de leis escritas
nas Américas, que, entre outras coisas, previam a proteção a íncolas e religiosos, e o
sossego público. O rei de Espanha, Felipe III, ao tomar o Maranhão dos franceses,
entendeu a estratégia gaulesa e deu garantia aos naturais da terra de que se submetessem
aos portugueses, pois nada mudaria e eles seriam protegidos. Meras palavras. Um só
governante da Ilha Grande, entre o Ceará e o Amapá, prendeu e matou meio milhão de
índios. Poucas décadas de colonização ibérica foram suficientes para a dizimação dos
íncolas da Ilha Grande e a conclusão do frei luxemburguês João Felipe Bettendorf, que
escreveu: ”quanta devia ser a crueldade e cobiça dos que acabaram por guerras e
trabalhos tanta gentilidade”.
A leveza e habilidade do maior líder do empreendimento gaulês, Daniel de La
Touche de La Ravardière, e as determinações da rainha regente Maria de Médici, foram
de suma importância para manutenção da paz e da ordem na Nova França. Foi a soma
destas santas premissas que fez com que eles passassem para a história como
“verdadeiros colonizadores tão cheios de humanidade” (João Lisboa). La Ravardière,
primeiro governador do Maranhão, é o vértice que une quatro cidades co-irmãs: São
Luís, Saint-Malo, Cancale e Berthegon (esta é a cidade natal dele). É por isso que
Cancale, cidade de onde partiu a expedição francesa em direção ao Maranhão, está
fazendo uma grande festa em homenagem a São Luís e a Daniel de La Touche. Saint-
Malo e Cancale enviaram, oficialmente, representantes para a festa, que também é deles.
Estão aqui em São Luís no dia de hoje, entre outros, Alain Roman e Yves Claquin.
Nunca li nada a respeito, mas ouvi dizer que a profecia do nosso primeiro cronista
ajudou a balizar a expressão ILHA DO AMOR. Quem sabe! Este é o segredo e a dica a
quem aspira conquistar os moradores desta terra, que receberam o adjetivo gentílico
ludovicense, derivado de Ludovico, Luis em latim. E flor-de-lis deriva de Flor-de-Luís.
Semeemos flores, então, pois quem semeia ódio, violência e destruição nesta terra está
fadado ao ostracismo.
Cada letra da palavra AMOR representa um século de existência da nossa bela
capital. Daqui a cem anos, quem sabe, a profecia de Abbeville esteja mais em voga
ainda e a palavra de ordem seja AMOUR.
Um pouco desta “bela história de AMOR” você poderá conferir visitando a
Exposição FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE, que permanece em cartaz até o
fim deste ano, no Palácio Cristo Rei, Praça Gonçalves Dias, São Luís - MA.
O FUNDADOR ESQUECIDO
Caro leitor, ludovicense por nascimento ou adoção, que estás a buscar inspiração
para as labutas de hoje e os desafios de amanhã nos tesouros ainda pouco explorados da
cidade, vai à Praça Gonçalves Dias, saúda primeiro o poeta, para que não fique
enciumado, entra devagar no Palácio Cristo Rei e prepara-te para voltar no tempo. Lá
estão abertas, de segunda a sexta-feira, das 8 às 12h e das 14 às 17h30min, desde 16
deste mês até 14 de setembro, as portas para o passado primordial de nossa urbe.
Descobre-te, como num passe de mágica, em Saint Louis Capitale de la France
Équinoxiale, no ano de 1615, e procura no mapa os quatro fortes implantados na Ilha do
Maranhão pelos franceses – inclusive o de São Luís, batizado pelo almirante François
de Razilly –, e o Convento de São Francisco, primeiro edificado pelos capuchinhos no
Brasil, também abrigando a primeira escola do Maranhão. Se preferires, mergulha nos
rios Maiove, Ibacanga e de la Touche, mas toma cuidado com Guasinduba, afinal não
quererás transformar a tua viagem numa batalha. Mas recua ainda mais no tempo:
sentirás a presença de um dos fundadores da cidade, Daniel de la Touche, em todo o
esplendor de seu sonho da França Equinocial, estabelecida em 1612, mas não poderás
contemplar-lhe o rosto, pois, afinal, o mistério é sempre estimulante... Ao invés,
entrevista-te com Razilly, o cofundador frequentemente olvidado de São Luís. Quando
o vi, estava sorrindo, mas pode ser que o encontres acabrunhado, pois não lhe deram um
palácio para descansar, nem uma avenida para fazer novo reconhecimento da ilha, nos
moldes daquelas que levam os nomes dos inimigos lusos Jerônimo de Albuquerque e
Alexandre de Moura. Se queres reviver o rebuliço em Paris pela chegada dos
embaixadores índios do Maranhão, conversa com Japuaí (ou Louis de la St.-Jean),
Itapucu (ou Louis Marie) e Uaroio (ou Louis Henri). Leva o intérprete Charles des Vaux
a tiracolo, no caso de não falares tupi. E faz uma oração pelos que não sobreviveram:
Anthoine Manen, François Carypyra e Jacques Patuá. O Cardeal de Joyeuse, que fez
doação para a construção em pedra do Convento de São Francisco, poderá te ajudar
nesse ato de piedade cristã. Além da assistência religiosa, aproveita para saber da
coroação de Maria de Médici, do batismo de Luís XIII e, fofoca suprema, dos bastidores
da anulação do casamento do Rei Henrique IV com a Rainha Margarida de Valois. E
fica para o casamento de Luís XIII com Ana d’Áustria. Entretanto, se necessitas de um
empréstimo, melhor consultares o riquíssimo banqueiro e conselheiro real, Nicolas de
Harlay, Senhor de Sancy, um dos chefes e financiadores da expedição de 1612. Talvez
ele te mostre o valiosíssimo diamante Sancy... Se os mapas são a tua praia, veleja pelo
mundo daqueles tempos e aporta na França e em Paris. Torna a ser criança e encontra,
pelas cores, os locais de nascimento de personalidades francesas ligadas à França
Equinocial, inclusive de Richelieu, que tanto trabalho deu aos três mosqueteiros de
Alexandre Dumas. E cuidado: estão em vigor as Leis Fundamentais da colônia,
decretadas na Ilha do Maranhão, “primeira manifestação com natureza constituinte
elaborada no Continente Americano, antecedendo a Declaração de Virgínia”, na
avaliação de José Cláudio Pavão Santana, e lá vale a pena de talião!
Tudo isso – e muito mais – está à disposição de qualquer ludovicense, por
nascimento ou adoção, viajante do tempo, que se aventurar pelos mares, terras e ilhas da
fascinante exposição “França Equinocial para sempre”, idealizada e coordenada pelo
amigo Antonio Noberto, turismólogo e historiador, talento emergente e dínamo
infatigável, e realizada pelo Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, pela Aliança
Francesa de São Luís, pela Universidade Federal do Maranhão e pela Universidade
Estadual do Maranhão. A exposição foi inaugurada na noite de 15 de agosto, em um
evento concorrido, prestigiado por autoridades, professores, membros de academias,
escritores e aficionados da história e da cultura maranhense em geral. Nessa noite
encantada, veio à luz a obra França Equinocial: uma história de 400 anos em textos,
imagens, transcrições e comentários, organizada pelo mesmo Noberto, também um de
seus autores. E os presentes ainda puderam se deliciar com uma encenação teatral sobre
a fundação de São Luís pelos gauleses, promovida por Joana Bittencourt, que dirige a
Sociedade Artística e Cultural Beto Bittencourt. E o Palácio Cristo Rei testemunhou a
saga de La Ravardière, de Itagiba e sua amada Lua Cheia e dos tupinambás
maranhenses, conheceu Maria de Médici e o jovem monarca Luís XIII e ouviu a
Marselhesa e o hino de São Luís, tudo numa única noite...
A França Equinocial é um eco do passado, a inspirar a celebração do presente e
um vislumbre do futuro que São Luís merece ter. Caro leitor, a França Equinocial está à
tua espera!
A TV Difusora (canal 4) vem realizando um especial sobre os 400 anos de São Luís,
contando um pouco da história da cidade e mostrando os pontos de vistas de
especialistas, historiadores e professores de história.
São Luís completa 400 anos no dia 8 de setembro e vai receber do governo do
Maranhão um presente orçado em nada menos que R$100 milhões: a chamada Via
Expressa, primeira avenida de grande porte da capital, com cerca de nove quilômetros
de extensão. A previsão é que dois quilômetros já estejam prontos este mês. A festança,
no entanto, gera polêmica. A obra não foi aprovada pelo Conselho Regional de
Engenharia (Crea-MA) e acabou embargada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (Iphan),pois foi iniciada em 2011sem nenhum estudo arqueológico,
como a lei exige. Mesmo assim, os tratores continuaram a trabalhar, revirando o bairro
do Vinhais Velho, onde há vestígios de ocupação anterior à fundação da cidade.
O caso começou a ser investigado pela Procuradoria da República no Maranhão
em agosto de 2011. Segundo o procurador Alexandre Soares, em abril deste ano foi
estabelecido um acordo indicando as medidas necessárias de salvamento e proteção do
material arqueológico. “A equipe de arqueólogos contratada pelo estado apresentou um
relatório afirmando que realmente houve dano ao patrimônio durante as obras, mas que
agora as medidas estão sendo cumpridas. As obras na região do Vinhais Velho deverão
ficar paralisadas até que o Iphan apresente um relatório confirmando essas informações,
e que nós realizemos uma audiência com todos os envolvidos, incluindo moradores”,
afirma o procurador.
Os moradores estão envolvidos a fundo nessa história e já conseguiram algumas
vitórias. De acordo com Leopoldo Vaz, vice-presidente do Instituto Histórico e
Geográfico do Maranhão, o traçado da Via Expressa passaria a poucos metros da
Igreja de São João Batista, que é tombada, e desalojaria mais de trinta famílias no
Vinhais Velho. Protestos dos moradores fizeram o número de casas desapropriadas
diminuir para oito e a via se afastar 100 metros da igreja. “Solicitamos a criação de um
museu para guardar as peças arqueológicas encontradas aqui e estamos negociando a
compensação dos moradores, porque as desapropriações ficaram muito aquém dos
valores dos imóveis”, diz Vaz.
Mesmo com as mudanças, a estrada vai cortar a vila ao meio, e a Igreja de São
João Batista poderá ser prejudicada. “Certamente haverá prejuízos, mas isso independe
da nossa vontade. Já mandamos um documento para a Secretaria de Infraestrutura,
responsável pelas obras, dizendo que esse patrimônio é tombado e deve ser respeitado”,
conta Andrea Costa, diretora do Departamento de Patrimônio Histórico, Artístico e
Paisagístico do Maranhão. Procurada pela RHBN, a Secretaria de Infraestrutura do
estado (Sinfra) não se manifestou sobre as denúncias.
A igreja tombada tem relação direta com os primórdios do Vinhais Velho. Ali, em
outubro de 1612, os índios tupinambás ergueram uma capela, benzida pelos padres
capuchinhos da missão francesa que colonizava o Maranhão. É este evento que marca a
fundação do bairro. A capela, que desabou várias vezes, foi sempre reerguida no mesmo
lugar.
De acordo com a historiadora Antonia da Silva Mota, da Universidade Federal do
Maranhão, os franceses cederam o território do Maranhão aos portugueses em 1615. No
local onde hoje está Vinhais Velho foi então organizada a primeira missão jesuítica no
norte da Colônia. “Em 1757, o local ganhou o nome de Vila dos Vinhais. Acreditamos
que durante o século XIX se consolidou o processo de expulsão das populações
indígenas. Poucos descendentes resistiram. Entre eles, a família Ribeiro, que tem cerca
de 50 membros no Vinhais Velho”, diz Antonia. Segundo ela, há duas cartas no
Arquivo Histórico Ultramarino, em Lisboa, enviadas pelo índio Manoel Ribeiro, da Vila
de Vinhais, em 1782 e 1790. Ele seria ancestral da família de mesmo sobrenome que
vive hoje no bairro. “Além dos traços físicos inegáveis, os mais velhos da família
Ribeiro contam que seus avós e bisavós estão enterrados no cemitério da comunidade,
fundado pelos jesuítas”.
Outros moradores, como Carlos Jacinto Penha, mudaram-se para o Vinhais Velho
há cerca de 30 anos, quando o bairro passou a ser menos isolado. O comerciante é dono
de uma das 35 residências que o governo havia decidido desapropriar. Depois das
negociações, ele se livrou de parte do problema, mas o quintal da casa ainda está no
trajeto da via expressa. “Soubemos disso tudo em setembro de 2011. Os engenheiros da
Sinfra diziam que, como é uma obra pública, não teríamos como evitar o despejo. Um
dos moradores tentou explicar para uma engenheira a importância das casas, mas ela
respondeu que o governo não avalia valor sentimental”, lembra Carlos Jacinto.
Pelo visto, tampouco avalia valor arqueológico. Segundo Kátia
Bogéa,superintendente do Iphan no Maranhão, foi preciso entrar na Justiça para ter
acesso ao licenciamento ambiental da obra. “Nós pedimos, mas eles não mandaram o
licenciamento e iniciaram as obras mesmo assim. Quando finalmente recebemos o
material, não tinha uma palavra sequer sobre o patrimônio cultural, que inclui o
patrimônio arqueológico. Depois de nos pronunciarmos no Ministério Público Federal,
ficou definido que o trecho do Vinhais Velho em diante só poderia passar por obras
depois do estudo arqueológico. Ainda assim, as máquinas entraram no bairro”, denuncia
Kátia.
Arqueólogos só foram contratados em fevereiro deste ano, depois de nova
intervenção do Iphan. A equipe, chefiada por Cínthia Moreira, encontrou mais de 80
peças. “Muito material já estava revirado. Se as obras não tivessem sido iniciadas,
teríamos encontrado o sítio com as peças ainda no subsolo. Só conseguimos fazer isso
nos quintais das casas, onde havia peças de até 20 centímetros”, conta Cínthia. Em um
mês de trabalho, a equipe encontrou artefatos de cerâmica tupinambá e faianças. Ainda
não foi feito um estudo para confirmar a datação, mas algumas peças podem ser
anteriores à ocupação francesa.
SÃO LUÍS: AS HOMENAGENS CONTINUAM
POLÍTICA BRANDTIANA
Em O universo de padre Brandt, José Fernandes conta que o sacerdote usou o seu
talento, o seu prestígio de líder religioso, professor e dirigente de uma escola para aliar-
se aos opositores do prefeito de Arari, Antônio Garcia que por mais de duas décadas
comandou a cidade. O escritor explicou que padre Brandt ingressou na política local por
conta de uma decepção com o então governador que entregara a direção do partido da
situação a Theodoro Batalha, ex-católico colaborador da Igreja, que teria se convertido a
Assembleia de Deus.
A sua primeira atitude ostensiva foi criar o Movimento Católico Arariense, que
era uma espécie de ala política destinada a combater os protestantes, a quem chamava
de hereges, que no fundo, servia de pretexto para implantar uma oposição aguerrida.
"Consciente de sua força política, padre Brandt teve a feliz ideia de candidatar à
prefeitura na eleição de 1950, Justina Fernandes Rodrigues, conhecida como Dona
Bembém, descendente da aristocracia rural, e o conceituado enfermeiro Antônio de
Jesus Santos, o Tonico Santos, pai do cantor Zeca Baleiro como vice-prefeito que foram
eleitos sepultando de vez a hegemonia política de Antônio Anísio Garcia, o mais antigo
líder político de Arari de todos os tempos", contou Fernandes.
Para Mauro Rego, que assina a orelha do livro, a juventude, a cultura, a brilhante
oratória de padre Brandt fizeram dele não somente um sacerdote que manteve total
domínio sobre seus paroquianos, como também um ser partidário que levou seus
seguidores a subserviência, chegando estes a se armarem para defende-lo de hipotéticas
ameaças. "Mais do que um ensaio, esta é uma bibliografia bem apurada, um dos
melhores livros da atual safra literária", acrescentou Mauro Rego.
SAUDADE DE ANTONIO LOBO
JOAQUIM HAICKEL
domingo, 16 de setembro de 2012
PS: Como tenho andado muito ocupado, esse texto serve de resposta, tardia, mas
necessária, a um imbecil. E a outros também!
TURISMO E HOTELARIA NO CONTEXTO DAS
CIDADES CRIATIVAS
NATALINO SALGADO FILHO
RESUMO
O objetivo deste trabalho é discutir sobre a temática da diversidade cultural no processo educativo.
Refletir em torno do mito da democracia racial, cultural, racialismo, etnia, identidade ética e
multiculturalismo. Pontua-se ainda a presença de diferentes experiências socioculturais no Brasil,
contribuindo para o repensar da prática pedagógica do professor e a formação do aluno enquanto sujeito
das suas ações.
Palavras-chave: Cultura, identidade ética, diversidade cultural, educação e cidadania.
ABSTRACT
The objective of this work is to discuss on the theme of the cultural diversity in the educational process.
It is to contemplate around the myth of the democracy racial, cultural, racialism, ethnic, ethical identity
and multiculturalism. It is still punctuated the presence of different sociocultural experiences in Brazil,
contributing to rethinking of the teacher's pedagogic practice and the student's formation while subject of
their actions.
Keywords: Culture, ethical identity, cultural diversity, education and citizenship.
INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho é pontuar as características das lutas de diferentes grupos
sociais em favor do reconhecimento de suas diferenças culturais. Abordará o conceito
de multiculturalismo, fazendo uma ponte dessa temática com o papel que a escola vem
desempenhando no seu bojo para incluir esse fenômeno no seu currículo Pretende-se
ainda identificar as múltiplas maneiras de perceber a diferença cultural entre os seres
humanos, no período que corresponde aos séculos XVII e XIX, nas sociedades
ocidentais, e sua relação com a constituição da cidadania como um direito, apontando as
implicações e os limites dessa concepção. Pontuaremos também os diversos
significados do respeito à diferença no cotidiano escolar, distinguindo a diferença entre
tolerância com o “outro” e exercício da cidadania cultural no espaço escolar. Para
finalizar, será feita uma reflexão, quando ousaremos perspectivar um cenário de futuro
para a escola frente o multiculturalismo.
Atualmente, vários movimentos sociais no Brasil e no mundo têm questionado a
visão homogeneizada na sociedade e reivindicam uma política de reconhecimento, tanto
de suas diferenças, de suas múltiplas identidades, como de suas desvantagens e
desigualdades sociais, oriundas da discriminação social de gênero, de raça, de opção
sexual e de origem regional. As ações dessas diferentes instituições são cognominadas
multiculturalismo. Nesse sentido, é obrigação dos Estados democráticos contribuírem
para que os grupos que se encontrem em desvantagem possam conservar as suas
culturas contra as interferências das culturas majoritárias ou de massa. A política
voltada para o reconhecimento da diferença exige que as instituições públicas não
passem por cima das particularidades. Afinal, existe um leque muito largo de opções
para viver a vida em sociedade. E o mais interessante é quando “apreendemos” e
compreendemos o outro, ocasião em que podemos perceber com nitidez o que somos e
os valores que norteiam nossas vidas.
Esse movimento de reconhecimento e valorização das especificidades culturais do
outro tem sido um postulado desafiador para a escola por alguns indicadores, que
convém refletir para que possamos perceber e entender atitudes exclusivas por parte
desta instituição, quando na verdade tem como função primordial respeitar as
diferenças, haja vista, ser um palco onde desfila a democracia e, principalmente, pelo
seu principal objetivo: proporcionar o aprendizado do aluno, considerando o ritmo
individual de cada um.
Neste sentido, pretendemos neste diálogo, construir um entendimento de cultura à
luz dos estudiosos desse tema para, a partir de então, refletir a atenção que temos
disponibilizado sobre esse entendimento dentro da escola. Seria na verdade a
desconstrução do conceito de cultura e outro olhar para essa concepção.
Larraia (2005) no seu livro Cultura: um conceito antropológico apresenta alguns
fatores que promoveriam a homogeneização da cultura, aborda o determinismo
biológico, o geográfico, mas conclui dizendo que não é o suficiente para manter uma
cultura de um povo igual ao outro e ratifica dizendo:
As diferenças existentes entre os homens, portanto, não podem ser
explicadas em termos das limitações que lhes são impostas pelo seu aparato
biológico ou pelo seu meio ambiente. A grande qualidade da espécie
humana foi a de romper com suas próprias limitações: um animal frágil
provido de insignificante força física dominou toda a natureza e se
transformou no mais terrível dos predadores. Sem asas, dominou os ares;
sem guelras ou membranas próprias, conquistou os mares. Tudo isto por
que difere dos outros animais por ser o único que possui cultura (LARRAIA,
2005, p. 24).
Mas afinal o que é a cultura? Este é o ponto no qual vamos nos deter neste
momento a fim de encaminhar um foco, uma possível resposta ou, quem sabe, provocar
dúvidas e incertezas sobre o assunto.
Larraia (2005), depois de ter elencado vários conceitos de cultura, arrisca mais
um e diz que:
O homem ao adquirir cultura, perdeu a propriedade animal, geneticamente
determinada de repetir os atos de seus antepassados, sem a necessidade de
copiá–los ou de submeter a um processo de aprendizado. Logo tudo que o
homem faz, aprendeu com os seus semelhantes e não decorre de imposições
originadas fora da cultura. Portanto, cultura é um conjunto de artefatos
imprescindíveis para a existência humana, isto é, para definir cultura,
significa compreender a própria natureza humana, tema perene da
incansável reflexão humana (LARRAIA, 2005, p. 42).
Referenciando Murdock (1932), “os antropólogos sabem de fato o que é cultura,
mas divergem na maneira de exteriorizar este conhecimento” (p. 63).
Toda esta discussão é para nos remeter a uma reflexão: Por que descortinar essa
concepção de que somos todos iguais? O que tem de fato nos atraído no cenário atual
que embala essa discussão acerca do multiculturalismo? Parece que tudo leva a crer que
este embate permeia e se intensifica nas últimas décadas, devido aos efeitos da
“globalização”, isto é, a integração mundial das economias, dos meios de comunicação
de massa e das políticas governamentais. Neste mundo globalizado, uma antiga
concepção de nação, vista como culturalmente homogênea, uma só língua, uma só raça,
uma só história, uma só cultura, etc., deixou de fazer sentido.
No meio desse debate, está também uma visão de cidadania, formada a partir de
dois movimentos históricos, políticos e culturais importantes: o Iluminismo e a
Revolução Francesa, os quais lançam uma série de ideias fundamentais e que estão
presentes no nosso cotidiano. Uma delas é a de que todo ser humano é um indivíduo
naturalmente livre e igual a todos os outros.
Entretanto, compete à escola e aos educadores, em especial, fazerem indagações
do tipo: será que essas noções que influenciam o nosso modo de vida são adequadas?
São capazes de satisfazer os desejos de homens e mulheres de diferentes regiões do
planeta? Será que essa noção de cidadania, de que somos todos livres, todos iguais, é
suficiente para fundamentar nossa prática pedagógica? Seremos mesmo todos iguais?
O que podemos dizer de antemão é que essa concepção tem tomado outro rumo,
graças às inquietações e conflito de movimentos diversos que têm surgido e se alastrado
pelo mundo inteiro. O que tem nos mostrado tais conflitos, é que por todo o planeta,
povos, maiorias e/ou minorias, têm exigido o reconhecimento de suas especificidades
culturais e de suas desigualdades sociais, o que exige das instituições políticas, que
levem em conta os múltiplos modos de ser e de estar no mundo, que caracterizam essas
populações. Como alternativa de luta em favor de suas especificidades culturais,
diferentes instituições vêm procurando desenvolver ações conhecidas por
“multiculturalismo”. Destarte, convém refletir: Mas afinal, o que é multiculturalismo?
Trata–se de uma série de ações institucionais, desenvolvidas na sociedade civil e nos
diversos níveis de poder da República; ações voltadas para a compreensão do problema
das diferenças e para a elaboração de projetos capazes de fazer frente aos mecanismos
que permitam a reprodução das desigualdades. É um termo típico do contexto
globalizado e se constitui em um dos mecanismos para lutar contra toda forma de
intolerância e em favor de políticas públicas capazes de garantir os direitos civis básico
de todos.
Sob uma perspectiva multiculturalista, os Estados democráticos têm obrigação de
contribuir para que os grupos que se encontrem em desvantagem, os chamados grupos
minoritários, possam conservar as suas culturas contra as interferências das culturas
majoritárias. Dessa forma, uma política voltada para o reconhecimento da diferença
exige que as instituições públicas não passem por cima das particularidades. Afinal,
existem muitas maneiras de viver a vida em uma sociedade.
A título de ilustração, tomemos como exemplo a pesquisa de um professor em
escola pública de Minas Gerais, publicada num caderno pedagógico da Universidade
Estadual de Santa Catarina (2002), sobre discriminação racial. Ao perguntar ao corpo
docente sobre a presença de desigualdades e da prática de exclusão, ouviu de seus
interlocutores quase sempre a mesma resposta: “Nesta escola, não existe racismo,
tratamos todos os alunos como iguais”. Isto nos remete a uma reflexão imensa, a ponto
de questionarmos: Será que a questão é tratarmos todos os alunos iguais?
Um depoimento do professor Roque de Barro Laraia (2005) enriquece a discussão
quando afirma: “Os africanos removidos violentamente de seu continente e
transportados como escravos para uma terra estranha e habitada por pessoas de
fenotipia, costumes e línguas diferentes, perdiam toda a motivação de continuar vivos”
(LARRAIA, 2005, p. 75).
Ainda refletindo, ele continua dizendo: a apatia dizimou parte da população
kaingang de Pão Paulo, quando teve seu território invadido pelos construtores da estrada
de ferro de noroeste. ao perceberem que os seus recursos tecnológicos e mesmo os seus
seres sobrenaturais eram imponentes diante do poder da sociedade branca, estes índios
perderam a crença em, sua sociedade. Muitos abandonaram a tribo; outros,
simplesmente, esperaram pela morte que não tardou. (LARRAIA, 2005, p. 75 –76).
O que pretendemos com este depoimento é fazer uma analogia com a pesquisa
supracitada. Neste momento, cabe uma série de indagações, como por exemplo: Será
que a postura da escola e de seus atores em conceber os alunos como classe homogênea,
não tem provocado mortes, falta de iniciativa, dificuldade em se expressar, tolhimento
pelo fato de serem considerados iguais, quando na verdade somos excepcionalmente
diferentes, até mesmo no bojo familiar, que é uma instituição mais estreita?
Acreditamos plenamente que sim, partindo do pressuposto que pesquisas têm
comprovado que o aluno, ao adentrar a escola, não é uma tabula rasa, não é um sujeito
desprovido de conhecimento. E a nossa preocupação é exatamente com o cenário da
escola diante desse contexto, ou seja, procurar entender como essa instituição tem
desenvolvido suas ações, perspectivando lidar com a diversidade cultural e, a partir
desse entendimento, perceber a importância que tem essa concepção na construção do
conhecimento por parte do aluno.
Como a escola tem respondido às demandas pelo reconhecimento do direito à
diferença? Como construir um currículo sob uma perspectiva multicultural?
A imaginação que temos acerca dessa discussão é que a exigência de respeito à
pluralidade cultural significa, antes de tudo, o desenvolvimento de ações específicas
voltadas, no caso brasileiro, para a incorporação dos grupos “minoritários” - nativos
americanos e afro-descendentes. Não por acaso, existem ainda os que defendem a
ampliação do campo de preocupação, principalmente na região sul do Brasil, para a
inclusão do estudo dos povos germânicos, italianos e demais migrantes europeus.
O problema desse tipo de posição é que entendemos o respeito à diversidade
como mera somatória, ao currículo tradicional, de uma série de assuntos que dizem
respeito aos “outros”.
Dessa maneira, não temos colocado em questão este “nós” oculto, que tem
norteado as práticas escolares cotidianamente. Cria direta dos ideais iluministas, a
escola se vê como instrumento civilizador. Logo, considera tarefa sua transferir aos
alunos uma série de conhecimentos considerados universais.
O problema é que sobre a capa do universalismo, a escola toma o modo de vida
das elites européias e as transforma em modelo civilizatório válido para todos os grupos
humanos, como se fôssemos todos noruegueses. Dessa forma, uma política de
reconhecimento da diferenças não pode se limitar à política de classificação, controle e
fiscalização de referências culturais. Uma política de tolerância e conservação deve
constituir-se em esforço de satisfação de demandas sociais e políticas, que mobilizam os
indivíduos nos termos de uma identidade ética. Portanto, em uma política multicultural,
em especial no campo da educação, não se trata apenas de reconhecer o “outro”, mas,
igualmente, de desbancar a pretensão etnocêntrica das culturas das elites brancas
brasileiras, de constituir uma referência normativa, a partir da qual todos os outros
valores culturais possam ser julgados.
Assim sendo, não basta introduzir conteúdos afro-brasileiros nas disciplinas
curriculares, ou mesmo pensar numa educação bilíngüe para as crianças nativas
americanas. É preciso colocar em questão a totalidade do currículo e das práticas
cotidianas que constituem a escola como um espaço fundamentalmente de formação do
indivíduo. É preciso questionar as ideologias nacionalistas, racionalistas e
profundamente assimilacionistas, centradas no “mito de democracia racial”. Práticas
escolares comprometidas com a constituição da identidade; uma “mesmidade” nacional,
que atuaria no sentido de minimizar diferenças e ressaltar aqueles fragmentos que,
aparentemente, dão um sentido coerente.
EXCLUSÃO E EDUCAÇÃO
O que nos move a incluir esta discussão neste trabalho, passa pela necessidade de
refletir o papel da escola frente a esta realidade tão presente, que é a exclusão. Portanto,
discorrer sobre multiculturalismo, inclui, de certo modo, o processo de exclusão ou
inclusão, dependendo do ângulo que a escola assuma enquanto espaço vivo dos
problemas sociais.
Após toda essa reflexão sobre multiculturalismo e sobre como ele está presente na
escola e, a partir da escola, como está presente na relação com a sociedade, vamos
procurar analisar como podemos pensar o espaço escolar e a sala de aula como lugares
que possam pontuar estratégias para superação, esse olhar unilateral, isto é, esta lente
única por onde a escola vê os seus alunos. A sensibilidade para esse olhar perpassa por
vários fatores no que diz respeito à formação do professor.
Para enriquecer os argumentos supramencionados, convém referenciar André
Marli no seu livro Etnografia da Prática Escolar (2004), quando ela lança um
depoimento sobre a formação de professor dizendo:
[...] resultados de estudos indicam que há pelo menos três determinantes
fundamentais que afetam o processo de construção de competência docente.
De um lado coloca-se o ambiente/ familiar/cultural em que o professor
cresceu e se desenvolveu, isto é, valores, hábitos, crenças, costumes
adquiridos, sexo, a classe social a que pertence, os modelos com que foi
exposto. Por outro lado, se mostra muito relevante o processo de
escolarização pelo qual passou quando se deu a formação, em que tipo de
instituição ela teve lugar, quem foram seus professores. Tem ainda um peso
bastante grande na competência construída o ambiente de trabalho em que
o professor desenvolveu sua prática docente, os papéis e funções
desempenhados e os desafios enfrentados. (ANDRÉ, 2004, p. 90).
Desse modo, acredita-se que cada indivíduo caracteriza-se pelo que lhe é peculiar,
isto é, por uma identidade pessoal/social, uma marca que os distingue dos outros
indivíduos e que o leva a buscar certos objetivos. Isto nos remete a um entendimento de
que essa identidade muda, amplia-se, transforma-se em decorrência do momento, da
cultura e de todo o ambiente social, político, religioso e econômico que o rodeia. Esse
contexto que o cerca, apresenta dados que concorrem ou se opõem à consecução de seus
objetivos.
Nesse sentido, cabe à escola essa responsabilidade na otimização dessa formação,
no sentido de repensar as formas com que vem implementando essa política, a fim de
fazer as correções e reformulações necessárias.
Mota (2002), analisando exclusão social, argumenta que este termo aparece 39
vezes, no ano de 1994, nos arquivos do jornal Folha de São Paulo, enquanto que em
2001 este número sobe para 171 citações. A tese levantada pelo autor denuncia a
inadequação da abordagem do tema exclusão. Para ele, não existem excluídos no Brasil.
Aqui, todos somos incluídos que fazemos girar a máquina da reprodução das
desigualdades. O jornalista argumenta que, na Índia, onde existe o Sistema de Castas e
os Panas, pode até haver exclusão social, mas no Brasil não. Exemplifica que o catador
de latinhas de alumínio, que trabalha arduamente para obter dois ou três reais por dia,
não está excluído e que o seu trabalho permite ganhos mais substanciais ao atravessador
(comprador de latinhas).
Mota diz ainda que raramente as pessoas que detêm o poder da palavra
reconhecem como meio legítimo as palavras e cidadania desses cidadãos como
produtores de suas histórias. Ele destaca a necessidade da construção de narrativas que
reconheçam que não há no Brasil dois mundos separados.
Carmem Lúcia Guimarães de Matos no seu artigo Exclusão, uma meta categoria
nos estudos sobre educação, afirma que de fato existem inúmeras dificuldades para se
identificar quem é o excluído, quantos são no Brasil, se eles pertencem a um grupo
específico, ou até se eles têm existência de modo isolado no sistema social brasileiro.
Dados estatísticos da última década, analisados pelo PNAD do IBGE, revelam
números que retratam, entre outros, a desigualdade e a exclusão. Em destaque,
pontuaremos informações relacionadas à educação e que podem nos ajudar a entender
melhor esse quadro.
No que se refere ao analfabetismo funcional entre jovens, o PNAD declara que, no
período de 1992 a 1999, são alarmantes as proporções de analfabetos funcionais
existentes em todas as regiões do país (PNAD 200). Na região sudeste, a taxa é de
22,3%.
Os atuais níveis de escolaridade são baixos. A média de anos de estudos da
população economicamente ativa (PEA) era de apenas 6.3 anos. Os dados evidenciam
ainda que o perfil educacional da PEA feminina é melhor que a da PEA masculina,
independente do local de residência. Enquanto as mulheres, em média, de 6,8 anos de
estudos, entre os homens essa média é 5,9 anos. No que concerne ao grupo etário, de 18
e 19 anos. A escolarização atingia em 1999 pouco mais da metade desse contingente
populacional (51,9%). Considerando que parte desses alunos freqüenta, ainda, o
supletivo do ensino fundamental ou as séries iniciais do ensino médio, significa dizer
que a parcela de jovens no ensino superior ainda é bastante reduzida.
Outras informações que convém pontuar é com relação aos negros, onde o
analfabetismo é mais expressivo, (35%), do que entre os pardos (28,4%) e os brancos
(21,3%). Também no Sudoeste, onde são encontradas as menores taxas de
analfabetismos do Brasil, os negros (14,4% e os pardos (11,4%) também apresentam
uma taxa bastante superior à dos brancos (5,6%).
Estes dados foram analisados para fortalecer a nossa discussão diante dos
excluídos que, se juntos àqueles que conseguem um registro na escola e sutilmente
desaparecem, sem dizer que estão se afastando, podemos deduzir o grande índice de
pessoas marginalizadas do processo escolar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se, portanto, que a educação pode ser uma via de combate à discriminação. Isso
pode ser manifestado por intermédio de gestos, comportamentos e palavras, muitas
vezes explicitas ou não, que, de certo modo, afastam e estigmatizam grupos sociais.
Contudo, ao mesmo tempo em que não se aceita que permaneça a atual situação
da qual a escola é cúmplice, ainda que só por omissão, não se pode esquecer aqui que
esses problemas não são essencialmente do âmbito comportamental, individual, mas
também das relações sociais e como estas têm história e permanência.
O desafio que se coloca para a escola enquanto instituição formadora e
responsável pela disseminação da cidadania e inclusão em primeira ordem, é que ela
desenvolva no seu bojo outras formas de relação social e interpessoal, por meio da
interação do trabalho educativo escolar e das questões sociais, posicionando-se crítica e
responsavelmente diante delas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais, V. 10 (Pluralidade Cultural e
Orientação sexual). Brasília: MEC/SEF. 1997.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
terceiro e quarto ciclos: Apresentação dos Temas transversais – Brasília MEC/SEF,
1998 436p.
CUNHA, Manuela Carneiro. Negros estrangeiros. São Paulo: Brasiliense, 1987.
DA MATTA, Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? 3. ed. Rio de Janeiro: Rocco,
1989.
DA MATTA, Roberto. Relativisando: uma introdução à Antropologia Social. Rio de
Janeiro: Rocco, 1987.
FORQUIN, Jean-Claude. Escola e cultura. As bases e epistemológicas do
conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
LARASA, Roque de Barros. Cultura: um conceito Antropológico. 18 ed. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar ed. 2005.
MARLI, Eliza D. A. de André. Etnografia da Prática Escolar. 11ª ed. São Paulo:
Papirus. 2004.
MELLO, Luís Gonzaga de. Antropologia Cultural iniciação, teorias e temes.
Petrópolis, Vozes. 11ª ed. 2004
OS 80 ANOS DO INSTITUTO HISTÓRICO E
GEOGRÁFICO DO MARANHÃO - IHGM
(publicado para efeito de registro, a pedido do Autor)
INTRODUÇÃO
Inicialmente julgamos oportuno destacar fatos que registram a origem destas
entidades civis no Brasil cujo principal objetivo é preservar a MEMÓRIA NACIONAL,
realizando estudos permanentes nas áreas de História, Geografia, Etnologia,
Antropologia, principalmente.
OS FUNDADORES
Seus ilustres sócios fundadores foram:
1. Benedito Barros Vasconcelos;
2. Padre José Ferreira Gomes;
3. Cônego Arias de Almeida Cruz;
4. José Ribeiro do Amaral;
5. José Pedro Ribeiro;
6. José Abranches de Moura;
7. Wilson da Silva Soares;
8. Justo Jansen Ferreira;
9. Domingos Reis Perdigão;
10. José Domingues da Silva;
11. Antônio Lopes da Cunha
PRIMEIRA DIRETORIA
Presidente — Justo Jansen Ferreira
Vise-Presidente —José Domingues da Silva
Secretário Geral — Antonio Lopes da Cunha
Tesoureiro — Wilson da Silva Sousa
CONCLUSÕES PRELIMINARES
Inegavelmente o Maranhão não dispõe de arquivos de apreciável valor histórico
visto que muitos documentos referentes ao passado desapareceram.
Mesmo tendo um historiador notável - João Francisco Lisboa, que legou à
posterioridade, na segunda parte do “Jornal de Timon”, impolgante quadro do passado
de nossa terra.
Esta realidade inquestionável foi, em parte, comprovada pelas longas pesquisas
realizadas por este confrade, nos maiores arquivos ultramarinos – ARQUIVO DA
TORRE DO TOMBO EM LISBOA, BIBLIOTECA NACIONAL DE LISBOA E
ARQUIVO ULTRAMARINO.
Acerca da historia do Maranhão que pretendera elaborar, João Lisboa, pouco antes
de morrer, escrevia a um amigo e compromiciano.
... ”Júlgo que quem se deve ocupar com essa terra ilustre são os seus filhos
prediletos e mimosos. Quanto a mim parece-me que me não devo matar, só pelo prazer
que poderiam ter meia dúzia de amigos meus com a leitura de algumas horas – a fora
isso não vejo mais nada que me estimulasse. Devo confessar-lhe que há tempos tive
impulso de queimar tudo e quanto tenho feito até o presente”.
É verdade que os jesuítas destruiram muitos papéis de sua prestante Companhia
quanto daqui tiveram que sair, mas mesmo assim deixaram grande parte de seus
documentos, além da preciosa livraria do Colégio Nossa Senhora da Luz, fundada pelo
padre Antônio Vieira com livros que escrevera na Itália, Portugal, França, Holanda, etc.
Os cartórios e livrarias das outras ordens religiosas desapareceram, quer dos
conventos de São Luís que dos de Alcântara.
Já o arquivo do Bispo, hoje Arquidiocese Metropolitano de São Luís, arrumado e
catalogado meticulosamente por César Marques foi, em parte, destruido pela ação dos
cupins.
Felizmente a Arquidiocese Metropolitano de São Luís vem, na medida de suas
possibilidades, preservando e atualizando seus arquivos.
Deveremos, pois, ler com atenção o que sobre nossos arquivos Ferdinand Denis
escreveu há muitos anos em apêndice à edição da “Viagem ao Norte do Brasil” do
Padre Yves d’Évreux:
“As recordações do passado que tanto desenvolvem a população, aí não existem”.
Não há arquivos, bibliotecas públicas e nem instituições literárias, e tanto é
verdade isto, que o Imperador D. Pedro II, incumbiu um dos homens mais ativos e
eminentes desse país para examinar, na cidade de São Luís, o estado real dos depósitos
literários da capital do Maranhão.
Não reproduziremos aqui as queixas de Gonçalves Dias.
Assim já mais se escreverá uma História do Maranhão cabalmente documentada
sem auxílio de pesquisas arquiviais demoradas no Pará, Rio de Janeiro, Portugal,
França, Espanha e Vaticano.
Destaque-se o fato ímpar com as monografias de Ribeiro do Amaral e Justo
Jansen, acerca, da questão de Tutóia, pois os dois ilustres maranhenses foram a Europa
comissionados pelo Governo, à procura de documento que servissem para defesa do
Maranhão no dissídio.
O professor Antônio Lopes faz alusão à “Noite dos Tempos” – espécie de abismo
de onde saem todas as coisas de princípios ignorados, ao afirmar que as origens de
Alcântara perederam-se na história do Maranhão.
Na própria história geral do Brasil há fatos por nós ainda ignorados, mas os
arquivos europeus tem uma farta documentação sobre eles.
O caso do Maranhão não é diferente.
No período anterior à fundação da França Equinocial, pela expedição de
Làravadiere, as fontes de consultas históricas são questionadas. Que se sabe ao certo,
das mais antigas explorações do litoral e das primeiras tentativas de povoamento dos
portugueses?
Muito do que se sabe é inverossímil, para quem deve exigir da História fatos e
documentos claros e consequentes.
Particulamente, na história de São Luís há muitas questões e dúvidas a elucidar.
Os pesquisadores estão, assim , diante de um vasto campo de trabalho e desafio.
Esta apresentação está sendo feita em versão preliminar. Posteriormente será
apresentanda de conformidade com as normas regulatórias do IBBD e outras.
Exposição
“FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE”
UMA HISTÓRIA DE 400 ANOS
De 16 de agosto a 14 de setembro no Palácio Cristo Rei.
ANTONIO NOBERTO
A peça foi encenada pela Companhia de Bonecos Beto Bittencourt, que pertence à
Sociedade Artística e Cultural Beto Bittencourt. O Espetáculo é uma adaptação da obra
Itagiba – O braço de pedra da França Equinocial (romance histórico), de autoria da
pesquisadora do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM), Joana
Bittencourt.
A encenação França Equinocial narra a chegada do francês Jacques Riffault, em 1594,
em Upaon-açu (ilha de São Luís), na qual estabeleceu uma feitoria que deixou sob a
responsabilidade de seu compatriota Charles Dês Vaux, que logo conquistou a amizade
dos indígenas, chegando a casar com uma índia. Esse contato levaria a França a fundar a
cidade de São Luís, única cidade fundada por franceses. Toda a história é contada com
canções e narrações, com uma linguagem simples e uma sensibilidade que leva o
público a sentir um encantamento pela cultura francesa, valorizando o legado deixado
por essa nação europeia em terras maranhenses.
A encenação é rica em detalhes desde os figurinos até a utilização da língua francesa,
bem como a singularidade das canções bem interpretadas pelos atores, além dos efeitos
especiais que remontam o clima nativo de São Luís na época de sua fundação e todo o
brilhantismo da corte francesa. Outro detalhe que chamou a atenção foi a união da
cultura regional, como o bumba-boi, o reggae e a cultura francesa. Houve uma sintonia
entre música, estética de figurinos e sensibilidade dos atores que interpretaram seus
personagens com maestria.
A diretora da peça, Rosa Ewerton, disse que essa é a primeira vez que o espetáculo é
apresentado com a presença de atores no palco, antes, ela só havia sido encenada com
bonecos. Segundo Rosa, a intenção do grupo é expandir esse trabalho, levando-o para
escolas e outros locais de grande visibilidade. “O nosso objetivo é mostrar para as
pessoas como é importante conhecer esse lado da nossa história, saber a versão francesa
da chegada deles no Maranhão”, enfatiza Rosa.
Joana Bittencourt, que é diretora da Companhia Beto Bittencourt, falou com muito
entusiasmo sobre esse projeto. Segundo ela, levar esse espetáculo para outros lugares
como escolas será importante para a divulgação da história de São Luís. “Assim como a
exposição França Equinocial para sempre, que conta essa parte importante da história de
nossa capital, a peça também serve como um elemento propagador desse legado. O que
torna o espetáculo mais encantador é a forma didática de contar a história. Nosso
espetáculo é belíssimo, não há quem não pare e fique encantado com a qualidade da
nossa encenação”.
Michael Magalhães, diretor da Aliança Francesa em São Luís, também aprovou a
iniciativa e disse que tanto a Exposição quanto a peça sobre a França Equinocial são
importantes para que os ludovicenses conheçam mais sobre sua própria história e a
valorize. A Companhia de Bonecos Beto Bittencourt pretende encenar a peça em outros
lugares, valorizando a cultura francesa em São Luís. E a exposição França Equinocial
para sempre está aberta para visitações até o dia 14 de setembro, de segunda a sexta-
feira, das 8h às 12h e das 14h às 17h30, no Palácio Cristo Rei, que fica na Praça
Gonçalves Dias.
A Sociedade Artística e Cultural Beto Bittencourt
A Sociedade é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos e
econômicos. Ela foi fundada no dia 05 de setembro de 1999, em homenagem ao ator e
bonequeiro Beto Bittencourt. O objetivo da companhia Beto Bittencourt é fomentar a
educação e a cultura, por meio de produções artísticas, teatrais, literárias e musicais. São
várias as áreas de atuação do grupo, como segurança, saúde e meio ambiente. A
sociedade artística realiza, também, oficinas e espetáculos que são encenados em
teatros, abrigos, asilos, comunidades e instituições públicas e privadas.
CANTO À CIDADE DE SÃO LUIS – MA
PELOS SEUS 400 ANOS.
Fui gerado, nasci e fui criado em São Luis, Capital do Estado do Maranhão, e ao
longo dos 75 anos de minha vida, sempre vivi nesta encantadora ilha, berço de grandes
tradições, que traz nos versos poéticos do Hino do Maranhão, Estado do qual ela é a
Capital, a mensagem de que “seja de glória tua existência inteira”, e me propicia como
sempre propiciou a felicidade das grandes conquistas que a sociedade permite.
Habituei-me, desde minha infância, aos problemas, superações, vitórias e
conquistas da encantadora Cidade, berço de Gonçalves Dias, Coelho Neto, Humberto de
Campos, Ruben de Almeida, e tantos outros imortais, que fizeram refulgir as letras
maranhenses porque eles mesmos tinham luz própria e as iluminaram sempre com a
doação do seu intelecto, para que ocupássemos espaço nas letras e nas artes.
Olhei sempre e até com orgulho, suas ladeiras, seus azulejos, suas ruas tortuosas,
suas praças e ruas com nomes até muito extravagantes, porém, que traduzem, em si
mesmo, uma história do Brasil que não pode ser esquecida.
Caminhei por ruas como do Sol, Afogados, Alegria, Inveja, Veados, Giz, Passeio,
Hortas, Remédios, que conduziam sempre a praças como da Alegria, Misericórdia,
Mercado Central.
Ao lado desses nomes pitorescos, contudo, formavam-se outros, em homenagem a
nomes ilustres, como Rua Rio Branco, e Praças: Pedro II, Benedito Leite, João Lisboa,
estas em homenagem a grandes nomes ligados ao cenário nacional e internacional.
Passear pela Rua Osvaldo Cruz, popularmente conhecida por Rua Grande,
contemplar as vitrines de grandes lojas de exposição de roupas e calçados, jóias, ver a
beleza do adorno dessas lojas, contemplar as vitrines da Real Jóias, de lojas de calçados,
artisticamente preparadas, tudo isso que ficou na lembrança e que não mais existe. Hoje,
passear por essa rua principal de São Luís, causa preocupação e nos assusta, em razão
dos marginais que por ali campeiam.
Passear pela Praça João Lisboa e Pedro II, onde estavam localizados bares de São
Luís, que deliciavam seus clientes servindo entre outras coisas, sorvetes de frutas
regionais, tais como bacuri, murici, jenipapo, que dizer deles? Ah! Quantas belas
lembranças!
Vi e revejo em minha memória São Luis, minha Cidade natal, que hoje continua
doando nomes ilustres ao cenário cultural do País, como José Chagas, Nauro Machado,
Arlete Nogueira da Cruz, Ferreira Gullar, este, segundo noticia a imprensa falada e
escrita está cotado para receber o prêmio Nobel de Literatura. Ressalta-se que Ferreira
Goulart, nunca quis o seu nome ligado a qualquer academia, embora seja detentor de
grandes títulos nacionais e internacionais, que por si só já o imortalizaram. São
intelectuais que têm luz própria e sempre impregnam de luz o lugar onde estão.
Herdaram dos antepassados correligionários, as luzes próprias que fazem
resplandecer o nome do Maranhão, produzindo poesias, romances, contos, crônicas, etc.
Suas seculares Igrejas estão a dizer da fé do nosso povo temente a Deus e de
hábitos ligados á participação constante em cultos religiosos, principalmente aos
domingos, onde assistem a Santa Missa e as homilias que os sacerdotes pregam em
mensagens de fé e esperança aos fiéis.
Aqui formam como Igrejas históricas a Catedral Metropolitana, com uma nave de
templo belíssima, onde se tem a certeza de que só um homem inspirado por Deus
poderia pintar um teto tão belo.
A Igreja do Carmo, situada na praça do mesmo nome, herança dos Frades
Capuchinhos que tantos e belíssimos serviços emprestaram e continuam emprestando
até hoje à nossa terra.
Igreja do Desterro, de sagradas tradições, rica em história local, com construção
datada do século XVIII; Igreja de Santana e Igreja de São João, dirigidas por piedosos
sacerdotes, que têm bem conduzido o rebanho ao aprisco do Senhor.
Ao lado dessas Igrejas está a formar as Igrejas Evangélicas, o que acaba se
constituindo de um valor histórico enorme, vez que Igrejas como as Presbiterianas e
Batistas principalmente, a cada dia têm mais adeptos, com a pregação da Bíblia Sagrada
e mensagens constantes também de fé e esperança aos fiéis, registrando-se aqui, nomes
de oradores sacros como Benedito Guimarães Aguiar, Orlando Lopes de Morais,
Capitulino Lázaro Amorim, Rui José de Morais Barbosa (in memoriam), Silas Marques
Serra e mais recentemente, sobressaindo-se o nome do Pastor Antonio Fontes Martins
de Sousa, grande nome do Ministério Sagrado Presbiteriano atual.
Fluem-me à mente, no campo do exercício das ciências médicas, nomes como
Djalma Marques, Neto Guterres, este chamado de “médico dos pobres”, pois nunca
deixou de atender qualquer paciente que o procurasse, não importando se podia ou não
pagar consulta. Genésio Rego, Carlos Macieira, Odorico Amaral de Matos, Alarico
Pacheco, este por mãos de quem o autor deste texto foi trazido à luz, para citar apenas
alguns nomes de ilustres médicos de outrora, sendo que hoje nomes de novos médicos,
continuam a prestar relevantes serviços ao Maranhão, destacando-se entre eles, na
pediatria, Orlando Araújo, Raimundo Nina Rodrigues, in memorian, Getúlio Ferreira de
Albuquerque, e na angiologia, Sebastião Barreto de Brito Filho, que independente da
posição social dos pacientes, sempre a todos atenderam e atendem de braços e coração
abertos.
Acodem-me no campo das Ciências Jurídicas e Sociais nomes de outrora como o
do grande criminalista Valdemar Brito, Soares de Quadros, e José Santos, estes dois
últimos, excelentes civilistas, todos destaques como nomes de outrora, que inestimáveis
serviços jurídicos prestaram ao povo e a Cidade.
Atualmente, apenas a titulo ilustrativo, vinculamos o nome dos grandes
advogados Pedro Leonel Pinto de Carvalho, José Caldas Góis e Mário Macieira, este,
no momento Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Maranhão
(OAB-MA), em nome de quem saúdo a todos os valorosos militantes das Ciências
Jurídicas e Sociais, que caminham ao abrigo da Deusa Themis.
E no magistério? Neste sagrado mister de formação de homens para o futuro,
temos por imperioso dever de citar entre estes nomes Zoé Cerveira, Zuleide Bogéa,
Luiz de Moraes Rêgo, Francisco Solano Rodrigues, Rosa Castro, Carmem de Berredo
Martins, que se ocuparam na formação de jovens com raro brilhantismo. Foram meus
professores, estes dois últimos, e eu lhes devo muito pela sólida formação que me
transmitiram.
No exercício do magistério Superior, relembro com a maior alegria, nomes como
Orlando José da Silveira Leite, Tácito da Silveira Caldas, Antenor Mourão Bogéa,
Fernando dos Reis Perdigão, Clodoaldo Cardoso, Pedro Neiva de Santana (in
memoriam), José Maria Ramos Martins, registrando-se que Pedro Neiva de Santana, foi
médico, que formou ao lado dos outros nomeados e juntos lecionaram na velha e
tradicional Faculdade de Direito de São Luis.
Muitos são os nomes de professores, magistrados, estes na esfera estadual ou
federal, políticos, que ainda na época atual, continuam fazendo resplandecer o nome da
nossa terra.
Não se pode deixar de falar também do rico folclore maranhense, onde ocupa
lugar de destaque o bumba-meu-boi, que através das matracas ou orquestras, encanta
nas festas dos arraiais da Cidade, maranhenses e turistas no mês de junho, época dos
festejos.
A “festa da melancia”, que era procedida todos os anos na Avenida Beira-Mar,
também por um imperioso dever de boas lembranças, tem que ser mencionada, pois ali
era um local de encontros românticos, aonde casais apaixonados vinham, com suas
presenças, se divertir ao ar livre e a custo baixo, saboreando esta gostosa fruta.
Os enfoques acima dão uma visão panorâmica da Cidade de São Luis, aonde
reminiscências da minha vida me conduzem aos bondinhos elétricos, às fábricas de
tecidos, às oleaginosas, às fábricas de sabão, às casas de ferragens, à chamada Praia
Grande, (todas que infelizmente não mais existem).
Recordo-me dos cinemas Roxy e Éden, este último pela natureza do nome já
conduzia os espectadores ao paraíso dos cinemas e dos filmes que a empresa Moisés
Tajra trazia. Afluem-me à mente, o Teatro Artur Azevedo, belíssima casa de
espetáculos que tantas gerações abrigou. Este, felizmente, sobrevive, enquanto aqueles
cederam lugares a outros empreendimentos.
Vale lembrar a Casa das Variedades, A “Lobrás” - Lojas Brasileiras S.A (de nível
nacional), Lundgren Tecidos S. A., Tabuleiro da Baiana (loja de variedades), a Loja
Singer que vendia as máquinas do mesmo nome, que engalanavam a Rua Grande com
suas lojas bem trabalhadas.
Afloram-me à imaginação os passeios pelas praias: Ponta da Areia, Olho d´Água,
do Meio, Araçagy, Raposa, estas quatro (4) últimas, à época, de difícil acesso, por
ficarem mais afastadas do centro da Cidade, nas quais se podia tomar banho de mar a
qualquer hora, sem o perigo de contaminação de qualquer espécie, diferentemente do
momento que ora vivemos, onde os alertas aos banhistas são de que evitem banhos de
mar, pois as águas estão impróprias para banho, em virtude de estarem contaminadas
por coliformes fecais, com esgotos que irresponsavelmente são jogados nas águas do
mar.
Eis por que turistas e banhistas locais limitam-se, hoje, a uma partida de futebol e
prática de outros esportes que minimizam o sofrimento por ver o mar e se limitarem tão
somente a isso.
Fazem parte ainda das minhas lembranças as agências bancárias à época: Banco
do Brasil S.A., Banco do Estado do Maranhão S.A., Banco do Maranhão, Companhia
Progresso do Maranhão, Banco da Lavoura de Minas Gerais S.A., como principais
agentes financeiros, dos quais apenas o Banco do Brasil S.A. sobreviveu, enquanto que
os demais foram encampados por outros estabelecimentos de crédito.
Entre as casas de cultura, sempre se destacaram e felizmente ainda hoje existem
para gáudio dos intelectuais, o IHGM (Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão) e
a Academia Maranhense de Letras.
Muito ainda poderia ser dito. No coração de cada pessoa pulsará sempre o desejo
de conhecer mais um pouco desta Cidade Patrimônio Cultural da Humanidade.
É preciso, pela beleza de sentimentos que ela expressa ao visitante, dar um
destaque especial para a Praça Gonçalves Dias. Quem visita essa praça, sente a poesia
do poeta maior que emprestou nome à praça: Antonio Gonçalves Dias, que tanto
decantou o amor, quando nos deixou o legado do seu nome à Ilha, ao nos dizer: “ Minha
terra tem palmeiras, onde canta o sabiá/ Não permita ó Deus que eu morra, sem que eu
volte para lá”. E neste canto poético, estando a falar de si, foi como encontrou a morte,
afundando junto com o navio Ville de Boulogne, nas costas maranhenses, bem próximo
à Ilha.
A Praça Gonçalves Dias, onde está localizada a Sede da Reitoria, da Universidade
Federal do Maranhão, com o histórico Palácio Cristo Rei, sintetiza tudo que tivemos e
ainda temos, de história e de tradições onde precisa ser lembrado o nome do Reitor
Cônego Ribamar Carvalho, sacerdote, poeta, escritor, membro da Academia
Maranhense de Letras e tribuno, do mais alto quilate.
Morando há mais de 15 anos no bairro do Renascença, em nossa São Luis, vejo
uma nova Cidade, a substituir fisicamente a antiga, o que nenhum prejuízo traz à Velha
Cidade que sobreviverá sempre na eterna lembrança dos que, como nós, amamos nossa
vetusta Ilha.
Apresenta-se agora plena de prédios e construções modernas e ainda assim, ao ver
uma São Luis modernizada que está acompanhando o progresso com paisagens
artificiais impostas pelo homem, vaticino que ao lado do seu embelezamento,
continuará sempre sendo berço de glória de maranhenses ilustres.
Tu, São Luís, caberias inteirinha nesta praça. Ela permite vista panorâmica da
cidade, das praias, de ruas, igrejas, quer da velha cidade, quer da cidade nova e acima de
tudo, sentir os encantos do poeta Gonçalves Dias que sintetizou sua poesia e seu imenso
amor por São Luis, ao rezar ardentemente: “não permita ó Deus que eu morra sem que
eu volte para lá”.
SÃO LUIS DO MARANHÃO EM SEUS 400 ANOS
DE FUNDAÇÃO: ENTRE SONHOS, RUPTURAS E
ASSIMILAÇÕES E O FAMOSO PECUAPÁ.
CLAUBER PEREIRA LIMA
Dedico este trabalho aos amigos Luis Mario Lula, que foi padre e hoje é pai de
verdade e sua eterna Chiquita, que vivem felizes no querido Québec - Canada
10 de Janeiro de 2012, dia de São João Batista:
Pecuapá dormia nas escadarias em frente da Igreja do Carmo e, de repente
começou a escutar partes do sermão do Frei Guilhermino que lhe fizeram levantar as
sobrancelhas:
Com um sotaque italiano assim falou o bom frade:
- Sim, meus queridos fiéis devotos desta linda cidade de São Luis do Maranhão. São
Luis é sim a filha primogênita da Amazônia e daqui brilham as luzes do conhecimento
para todo o território amazônico.
São Luis não pode querer expressar-se no território brasileiro, sem esquecer-se
de que faz parte de uma simples bacia amazônica. Aqui não há grandes intelectuais,
porque a terra é pobre e o sol é quente demais, destruindo todos os neurônios do
caboclo. Foi um milagre do bom Deus a existência de Padre João Mohana e Padre Jocy
Neves Rodrigues neste solo, mas eles foram os últimos padres intelectuais, que por
acaso nasceram no Maranhão.
Hoje os padres, os pastores evangélicos, os pais e as mães de santo apenas
trabalham em suas comunidades e não deixam registro do que fazem e do que sonham;
não mais se escreve nesta terra de Humberto de Campos, porque não há mais tempo
para isso. Primum vivere, deinde Philosophare.
Vocês têm que se conformar. Busquem em Jesus e na Virgem Maria um consolo
espiritual e deixem que a preguiça e a moleza do calor acalentem os vossos sonhos de
civilização que nunca se concretizam. Abandonem a macumba e a dança do coco e
parem de querer ser o que não são. Como disse El-rei: aqui não há ouro, nem prata;
trabalhem na terra e deixem que outros pensem por vocês. Vamos agora rezar o nosso
Credo...
Pecuapá ficou nervoso com estas palavras e, tapando os ouvidos num ar de
pânico, colocou as mãos no queixo e a pensar repetiu incansavelmente para si mesmo:
- São Luis, a filha da Amazônia brasileira. Como se deu isso na nossa história? Não
acho que isto esteja correto.
Saiu caminhando pela rua do Sol, passando pela fonte do Ribeirão, que jorra
suas águas desde os tempos das sinhazinhas. Foi até próximo da antiga estação de trem
da RFFSA, em frente do Primeiro Distrito Policial, passando em frente ao rio Anil e, na
ladeira que dá para o Seminário Santo Antônio parou e olhou para o céu cheio de
estrelas e, sentindo o frescor da brisa sorriu.
Neste instante, Antonio passou correndo por ele e disse: - Ei Pecuapá! Tú estás a
pensar por ti ou pelos outros. És o homem de um livro só, ou de livro nenhum?
Pecuapá disse: - É hoje que a porca torce o rabo. Não basta ler rapaz. É preciso
interpretar, digerir o que se lê e transformar tudo num novo argumento, numa nova
síntese filosófica, antropológica e matemática.
Pecuapá foi se aproximando até parar no bar do português Albino, que de calça
comprida e sem camisa, barriga estufada, atendia e servia aos fregueses do bar e da
quitanda.
Encontrou-se com a turma da Universidade Federal do Maranhão - UFMA e da
Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, e lançou a questão:
O que tu achas Estevão do que o Frei Guilhermino disse, de que São Luis é a
filha primogênita da Amazônia?
Estevão levantou sua barriga pro ar, conseqüência de muita cerveja e vinho tinto
de terceira categoria, barato e ruim, e foi logo dizendo:
- Adoro os sermões do Frei Guilhermino, mas fico confuso com suas lições de História
e Geografia. Nunca li um livro do começo ao fim. Da História tenho pavor, porque tem
muitas datas e só falam de guerra. Explica tú mesmo essa questão histórica porque só
aprendemos o suficiente para saber que São Luis foi fundada por franceses, embora os
portugueses digam que foram eles que tudo fizeram por estas bandas. Para te dizer a
verdade Eu sou apenas um cantor.
Josefina, ajeitando os seus cabelos longos interveio na conversa, dizendo:
- Alguns dos nossos professores não sabem fazer a conexão entre o livro e a geografia
da cidade e do Estado. Todo mundo sabe um pouco de tudo, mas, quanto à nossa
identidade nacional, quanto a saber se São Luis é a capital do reggae ou se ainda é a
Atenas do Brasil, ninguém sabe dizer.
Aliás, falar de Atenas já não soa tão bem como antes. Talvez seja melhor ser a
filha da Amazônia por causa do minério de ferro que escoa dos portos de São Luis para
o resto do mundo. A cidade e o estado do Maranhão estão perdendo sua identidade, pois
a cidade está cheia de forasteiros, matemáticos e engenheiros que nada escrevem e nada
pensam, apenas constroem pontes, viadutos ou máquinas pesadas, como se nos cálculos
que fazem para qualquer projeto de engenharia civil ou mecânica não houvesse um
conteúdo filosófico, histórico, geográfico e até teológico.
Isto é o que eu tenho escutado pelos corredores da UFMA e da UEMA, foi logo
se defendendo Josefina com um ar infantil. Mas gostaria de te escutar. Fala para o nosso
coração e nossa alma o que tú pensas disso tudo.
Sim, repetiu Estevão. Queremos te escutar.
Pecuapá disse sorrindo:
- Bem minha gente, e, levantando a mão com um ar nobre de caboclo pediu ao Albino
uma aguardente local para molhar a garganta.
Eram 8 horas da noite e Pecuapá estava calmo. A brisa do mar sacudia os
cabelos das mulheres em volta que, tanto bonitas como feias, louras, morenas ou negras
sorriam meigamente.
Mês de Junho era o mês das festas populares e de muita conversa ao pé da porta
e o mês de Santo Antonio casamenteiro.
Todos se voltaram para ele a fim de escutá-lo atentamente.
Levantando sua mão direita pra cima com o dedo polegar direito empinado,
respirou fundo e disse:
- Espero que esta conversa não fique muito longa porque todos começarão a dormir.
Disse em seguida: - Pessoal querido desta terra equatorial. Como todos sabem, o
Maranhão teve e tem uma ligação muito forte com a França através dos padres
capuchinhos franceses e dos marinheiros da Bretanha e Normandia, que já faziam
comércio com os índios tupinambás, nestas terras que eles consideravam como a França
equinocial. É só vocês pararem de ver a novela das oito e começarem a ler todos os
livros de História disponíveis ou a escrever a tradição oral para as gerações futuras.
Em qualquer cidade maranhense, por mais analfabeto que seja o sertanejo sente
que deve haver uma origem além mar para o Maranhão e se orgulha disto. Por mais
pobre que alguém seja, você não vê em São Luis, Tutóia, Caxias, Codó, Santa Inês,
Pedreiras, Imperatriz, Carolina ou Balsas qualquer pessoa correr atrás de turista. O
turista brasileiro ou estrangeiro ou mesmo qualquer trabalhador que para cá vem é bem-
vindo, mas ninguém bajula ninguém. Queres comprar, compra. Se não queres outros o
farão. Queres criticar, critica, pois o papel aceita tudo, mas não comentas erros de
sintaxe. Queres visitar, visita; se não o queres: outros dias virão e outras pessoas irão
passar por aqui e deliciar-se com a nossa juçara e cochilar em nossas redes lendo Josué
Montello.
Não querendo te interromper e já te interrompendo, disse Maria Nunes: - Eu
acho que tú tens razão e é por isso que todos são poetas ou poetisas no Maranhão e até
filósofos. O lavrador mais analfabeto do vale do Mearim tem um linguajar refinado e
não aceita nenhum poderio econômico passar por cima da dignidade de um homem ou
de uma mulher.
É assim mesmo Maria.
Pecuapá retoma a conversa:
- Lembram-se do Padre Antonio Vieira e dos seus sermões inflamados na Capela ou
Igreja de Nosso Senhor dos Navegantes em que defendia os índios e seus direitos a uma
vida digna. Este orgulho de ser maranhense e bem falante está no sangue de todos, quer
sejam descendentes da mãe África, da mãe Europa ou da terra Brasilis.
Bem. Como o projeto da França equinocial foi destruído, começou então o
projeto lusitano, em que o Maranhão enquanto capitania foi se transformando aos
poucos no Maranhão luso-equinocial.
Se vocês forem dormir num casarão colonial de São Luis, vão encontrar os
armadores para as redes em que as Sinhazinhas dormiam embaladas pela fresca do mar.
Os arquitetos e construtores portugueses foram inteligentes ao adaptarem-se às
condições do clima equatorial e a um modelo de cidade banhada pelo mar e por seus
rios e baías. Os arquitetos e engenheiros de hoje têm que fazer o mesmo, pois as águas
das chuvas devem escoar para uma bacia de tratamento antes de ir para o rio e o
Oceano. Os seus conhecimentos de Cálculo devem ser complementados com estudos de
História e Geografia para que a cidade não fique alagada com o menor chuvisco. Alguns
arquitetos e engenheiros fazem também suas rupturas e o resultado é visto através de
ruas alagadas e esburacadas. Provavelmente o material usado não condiz com a força
das chuvas; é preciso mais pesquisa para descobrir que material seria adequado para o
mar de águas que caem na época das chuvas.
Bom, já estou cansado e com fome, falou o Pecuapá e assim se expressou com o
seu dedo polegar levantado:
- Albino, traz-me uma caranguejada com um arroz de cuxá e uma cerveja bem gelada e
oferece para todos porque hoje estou pagando.
Todos falam ao mesmo tempo: - Que bom que temos comida de graça! Diz o
Seu Luis: Longe de quem trabalha e perto de quem come, diziam os mais
velhos.
Albino, afadigado mas, contente com o número de fregueses, responde lá de
dentro:
- Tú não estás no Restaurante Sra Cabana. Aqui nós temos apenas caldo de peixe ou
mocotó. Se quiseres vou logo buscar.
Traz-me então um mocotó e deixa de conversas. Afinal tú não és o Eça de
Queiroz ou o Ramalho Ortigão para quereres desvendar numa só noite todo O Mistério
da Estrada de Sintra.
Tudo já está desvendado: maranhense não gosta de sopa, mas aceita um caldo de
bom grado.
Todos os presentes aplaudem e dizem É isto mesmo!
Ao comer este caldo bem apimentado com molho de pimenta bem maranhense
e, depois de tomar sua cerveja bem geladinha, Pecuapá fala com voz de locutor de
radio:
- Como eu estava dizendo: - Se o Padre Antonio Vieira inaugurou em 1654 uma
concepção filosófica, poética e barroca do Maranhão colonial pode-se dizer que em
termos históricos o século XVII foi somente de tentativas de formação de um povo e de
um território, mas o fracasso predominou sempre porque ninguém vive só de filosofia e
poesia.
Minha concepção é a de que: para estudar a História do Maranhão,
antropológica e filosoficamente falando, é preciso levar em conta as rupturas Políticas,
Culturais, Religiosas, etc., ao longo destes 400 anos.
Além das rupturas políticas: primeiro os espanhóis, depois os franceses e
holandeses e por fim os lusitanos, temos a questão dos rios, que separam o homem da
terra e cortam o seu ser em dois: de um lado um homem e uma mulher fortes e
altaneiros e de outro, pessoas doentias e febris, com possibilidades de adoecer de
Hantavirose ou Esquistossomose e muitas outras doenças geradas pela umidade e calor,
misturada com a abundância das águas, tanto dos rios quanto das chuvas.
Os nossos médicos têm levado em consideração este fator climático nas suas
consultas da população, e têm dado o melhor de si para a população. É Preciso
continuar estudando as bactérias em sua adaptação ao nosso clima maranhense para
encontrar soluções locais para os nossos problemas de saúde.
Meses depois...
Todos foram para suas casas e, meses depois se encontraram novamente, mas
desta vez na beira-mar pelo meio da tarde.
- Ei Pecuapá, disse Josefina. - Continua então aquela conversa sobre a ruptura
Psicológica e Cultural do povo do Maranhão.
- Sim Josefina. Que bom reencontrar você e todos os outros nesta tarde de sol quente em
pleno Janeiro de 2012, que deveria ser de chuva, já que estamos em plena estação do
inverno e até meados de Março é chuva que não acaba mais em São Luis. Por sua vez li
nas notícias que chove forte lá em Imperatriz e, em Porto Franco, a água do rio
Tocantins subiu e desabrigou muitas famílias. Isto é uma ruptura que provoca tragédias
humanas que poderiam ser evitadas se houvesse prevenção.
- Ei Estevão. Fizeste uma dieta porque estás com um aspecto melhor.
- Sim Pecuapá, tive que ir para a Academia e além disso só como beijú e cuscuz de
milho e pão de nenhum tipo não como. A ruptura agora no Maranhão é também com o
corpo físico e, por isso precisamos malhar. O negócio agora é malhação e evitar pão e
açúcar; vamos comer a comida do pobre lavrador: macaxeira e beiju com café e leite e
muito arroz de cuxá com peixe. A comida do pobre hoje é a mais saudável de todas.
Neste instante, alguns pescadores saiam do portinho para irem em busca do
peixe da madrugada. Eram por volta das 5:45, quase 6 horas da tarde e o sol já ia se
pondo na beira-mar e no Itaquí-Bacanga.
- Que foto linda! Disse Freddy Servais ao tirar várias fotos do pôr-do-sol, e da cidade
dos azulejos, dos seus mais variados ângulos. Turistas passavam com seus guias falando
das proezas da Nega Catarina Mina e de seus rebolados de fazer a alegria da praia
grande.
Todos se encontram novamente mas desta vez no Restaurante do Joarez, nos
fundos do Mercado Central.
Pecuapá pede uma pescada e diz que já está parando de beber. Pede um suco de
maracujá, para acalmar os nervos.
Joarez, um senhor bem vestido e aparentando um ar europeu nórdico, que era o
dono do restaurante aquele ano, manda o garçom servir o grupo prontamente. Era um
local bem organizado e asseado. Lugar para nenhum turista botar defeito e os garçons e
as meninas do caixa, eram todos bem treinados.
Pecuapá disse então: - Vocês querem retomar aquela conversa que tivemos há
meses atrás.
- Sim, respondeu logo Josefina e toda a turma da UFMA e da UEMA.
- Bom, então continuando vou logo dizendo:
- Falando um pouco sobre os índios do Maranhão, posso afirmar que as rupturas e
assimilações culturais fazem com que a cultura indígena dos Canelas seja preservada e
diferenciada das demais, apesar de todas as tentativas de destruição, conforme
reportagem do programa do Fantástico da Rede Globo de Televisão do dia 1° de Janeiro
de 2012. As rupturas culturais dos índios canelas com a cultura brasileira, são bastante
salutares porque demonstram que ainda existe uma cultura tradicional, que através da
dança em círculos e da corrida das toras insiste em permanecer no ambiente da aldeia.
Fazendo um adendo, podemos dizer que estes nossos índios estão melhores, se
comparados com a realidade dos índios canadenses, na cidade de Saskatoon, onde,
segundo o documentário Out in the Cold, há uma tentativa de destruição de uma cultura
tradicional, reduzindo-a um simples problema de ordem policial. Os índios seguem com
suas rupturas.
Voltando para o que eu estava falando do povo. Tudo o que eu disse sobre a
população da nossa terra faz do maranhense um povo forte e manso, esperançoso e
sonhador.
As águas dos rios, quando não se tornam enchentes devastadoras, servem de
inspiração e formam o caráter de um povo.
Dos rios de que falei pode-se mencionar os principais: Rio Itapecurú, Mearim,
Pindaré, Corda e Parnaíba, em Balsas, bem lá no sul do Maranhão.
Por falar em Balsas, alguns querem transformar toda aquela região no Maranhão
do Sul, e a cidade de Balsas na capital da soja e do agronegócio e, desconhecendo
totalmente os fundamentos históricos e topográficos de nossa cultura querem deixar de
lado este lado poético e saudosista do maranhense.
Em Balsas há também rios e riachos e isto vem moldando o caráter do povo. A
riqueza econômica não deveria ser um empecilho para o desenvolvimento da
transcendência e do valor da vida porque existem outros valores que formam um povo
além do financeiro.
Como disse são muitos os rios do Maranhão e muita água, e isto molda a terra e
o homem. Se formos analisar o rio Itapecurú, que hoje, segundo Carlos Wilmsen está
secando rapidamente, vemos que sua artéria divide o centro do Maranhão num grande
arco até o rio Parnaíba, sendo a artéria mais histórica do Estado. Segundo Astolfo Serra,
que todo estudante deveria ler: Essas águas rolam pelos quatro séculos de formação
histórica do Maranhão. Estes rios todos formam a identidade cabocla e à parte do resto
do Brasil.
Para dar um descanso a Pecuapá, Josefina intervém mais uma vez e, de saia
rodada e com os cabelos em rabo de cavalo, diz: - Canta para nós alguma coisa Estevão.
Estevão diz: : - Eu gostaria de cantar as músicas do Maranhão que continuam
inéditas no Arquivo Público do Estado, doadas que foram pelo Pe. João Mohana, mas
como não posso vou cantar outra coisa. Com a licença do César Teixeira vou cantar:
A flor do mal me quer, eu a quero também, só pra saber o gosto que a morte
tem. E, quando os espíritos voltarem da guerra, encherei os olhos com a mais
suja terra e ferrarei a mula rumo a Portugal...
Bravo! Esta é a verdadeira música maranhense .
Pecuapá continua num tom calmo e sem contestação:
- Tivemos também as rupturas religiosas, que me fazem pensar no que teria acontecido
de diferente em nossa História Eclesiástica se o Bispo Dom Jacinto Carlos de Oliveira
tivesse tomado posse de verdade e não apenas por procuração lá de Portugal, no dia 21
de setembro de 1779, vindo a renunciar ao cargo no dia 8 de Agosto de 1780, sem
nunca ter pisados os pés no Maranhão. Triste dele que não pisou na areia fofa da praia
da Raposa, nem contemplou o sair dos barcos de pescadores na baía de São José de
Ribamar.
Quais teriam sido suas diretivas pastorais para aquele século da Revolução
Americana e Francesa? Isso nós não iremos ficar sabendo, mas é curioso pensar nisto.
Na sua fundação histórica, o Maranhão foi tudo menos Brasil. Algumas pessoas
do sul do Brasil e outras de fora também dizem na surdina que o Maranhão não é Brasil.
Pois eu vos afirmo como de um mirante: - Esta é a pura verdade histórica e não é uma
ofensa.
O Maranhão é um marulhar de águas, e isto influencia a dolência do povo, o ser
pacato e pensativo e, juntando-se ao analfabetismo crônico e a uma economia informal,
da pesca ou da coleta do côco babaçú, etc., faz com que o Maranhão seja geográfica e
politicamente uma incógnita, um aglomerado de pensamentos e sentimentos, que faz
surgir figuras históricas que aparecem e desaparecem rapidamente: Neste caso temos
um Padre Antonio Pereira, um Padre José Constantino Gomes de Castro, um Padre
Raimundo Alves da Fonseca, que não temeu os ataques literários da pena de Tobias
Barreto e que, de acordo com Graça Aranha, foi (a maior figura do clero do Norte e um
dos mais conspícuos sacerdotes brasileiros) e que hoje ninguém se lembra em nossas
terras.
Foram e são as rupturas e assimilações filosóficas, culturais, geográficas,
econômicas, religiosas e políticas que produziram aquilo que se pode denominar de um
emaranhado cultural maranhense.
Deste jeito maranhense de ser confuso e orgulhoso do passado glorioso da
Atenas brasileira surgiu um Nauro Machado e sua poesia hermética e que ainda hoje
pode falar tranquilamente com todos os que passam por seu caminho na Rua do
Alecrim. Tivemos um Joãozinho Trinta e o seu brilho de um carnaval diferente, temos
um José Sarney que, com sua sabedoria política fez tremer os generais da República e
faz calar todos os que de norte a sul do país o criticam, saber talvez que para ele, que leu
Maquiavel e o interpretou de forma original: perder em política é o pior das perdas,
erros e danos.
Por todo o nosso abençoado solo existem poetas e poetisas anônimos de norte a
sul do Estado.
A comprovação destas rupturas dá-se através das caixeiras do Divino Espírito
Santo que, lá em Alcântara tocam as suas caixas em louvor dos seus ancestrais africanos
e das tradições Católicas Açorianas. Convém que sejam feitos estudos mais detalhados
para ver como surgiu em Portugal esta devoção da irmandade do Divino Espírito Santo
como forma de ajudar os pobres a enterrar seus mortos, sob os auspícios da rainha Santa
Isabel e que aqui perdurou, apesar de todas as rupturas.
Para que não fique falando sozinho e ninguém contra-argumente vou expor-vos
o seguinte:
Se os séculos XVIII e XIX foram o século de ouro destes 400 anos, e isto com o
cultivo e exportação do algodão, e as intervenções políticas do Marquês de Pombal,
fazendo surgir um Gonçalves Dias, monárquico e altaneiro, figura de peso que se podia
igualar a Homero e a um Coelho Neto, que já foi um dos mais lidos autores brasileiros e
que hoje poucos estudantes no Brasil têm a coragem debruçar-se, alegando que sua
linguagem está ultrapassada, aqui vai uma questão:
Porque a São Luis do Maranhão republicano do século XXI se reduziu tão
somente à capital do reggae e dos crimes mais inesquecíveis da nossa
página policial local. Será que perdemos a capacidade de ler e interpretar
os fatos da vida numa congruência filosófica que nos torna diferentes dos
demais Estados brasileiros?
Não somos contra o Reggae, que o diga a cantora Rosa Reis e suas músicas de
Lelê e Reggae, mas no Maranhão, do ritmo Reggae deveriam se feitos estudos a fim de
que ele pudesse ser assimilado e transformado em algo novo, como aconteceu com as
Festas do Divino Espírito Santo.
Os crimes hediondos deveriam servir como estudo para a Polícia Técnica e
Científica elaborar projetos de prevenção e fazer com que os criminosos vejam de uma
vez por todas que o Crime não Compensa, como dizia no famoso Programa Policial do
locutor Ruy Dourado e seu querido Xeleléu. Tem algo errado ai. Falta um que de
ruptura e assimilação. Falta mais leitura e tempo para pensar e produzir conhecimentos
novos para o nosso povo. O desconhecimento por alguns de nossa riqueza intelectual
faz com que de forma pragmática ao modo Americano, uma cultura e um povo sejam
classificados de forma preconceituosa e pejorativa, daí resultando afirmações tais como:
maranhense é preguiçoso, paulista é trabalhador. Estas são afirmações que desconhecem
a História real de um povo e não tem comprovação científica.
No Maranhão a pobreza e a fome já produziram revoltas como a Balaiada, e até
este fenômeno pode servir de modelo para a tese da ruptura e assimilação em que o
auto-proclamado Imperador das Liberdades Bem-te-vis, que, para além da luta armada e
sangrenta fez poesia e sonhou com um mundo diferente, sem temer as forças de Luis
Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias.
A geografia maranhense, com suas águas ribeirinhas produz sono e fantasia,
imaginação e poesia, dolência e produção musical e literária.
Para conhecer em primeira mão a diversidade geográfica deste querido Estado
viajei em 1987 por longas 14 horas de barco no rio Turiaçu, pelas cidades ribeirinhas de
Apicum-Açu, Turiaçu, Cândido Mendes e Carutapera, dormindo e acordando com o
barulho do motor da lancha, entre céu e água, entre conversas sobre matemática e
astronomia, carnaval de rua, filosofia e política, ouvindo o canto do Sabiá saudoso de
terra, porque no Maranhão até os pássaros têm saudades, como a rolinha no paiol da
fazenda.
Em Turiaçu estive distraído pela conversa e perdi a beleza da ararajuba, ave
símbolo do Brasil com sua beleza singular, que vive nas matas da Reserva Biológica do
Gurupi, mas de qualquer forma não se tem acesso a esta reserva e os caçadores
deveriam ser colocados em prisão caso tentem burlar a lei.
Nas nossas rupturas e assimilações dorme o poeta e o louco e ninguém é
censurado a não ser pela velha do sobrado do Carmo em São Luis, que aos gritos foi
retirada de seu casarão numa tarde de sol, como esta que vivemos hoje.
Enquanto não aparece um contestador, como Angel Vega e seu Orós grego, no
teatro das paixões da vida ou o irônico Fenômeno Aristotélico, que é o ser ai entufado e
presunçoso, as assombrações desfilam pelas dunas dos lençóis maranhenses nas noites
de lua cheia, enquanto que os turistas paulistanos e mineiros, americanos e franceses
dormem nas pousadas depois de um passeio de bugue, sem compreenderem de onde
vem tanta miséria e tanto orgulho deste emaranhado de povo, que é uma mistura de
poeta e sertanejo, filósofo positivista anti-clerical, mas cheio de vivências espirituais e
de devoção católico-popular a São João Batista e Santo Antonio ou com um cunho
evangélico exacerbado em que a visão de Jesus como único Salvador predomina ou os
tambores da Casa das Minas que embalam as noites e madrugadas de São Luis; um
povo analfabeto mas com um falar macio e doce como as noites das danças folclóricas
em Braga ou da calmaria de uma manhã no Porto em Portugal, porque culturalmente o
Maranhão está mais para Portugal do que para São Paulo ou Rio de Janeiro, mais para
La Baule, Le Croisic e Nantes na França do que para Great Falls no Estado de Montana
nos Estados Unidos. Quando este povo tiver mais acesso à educação formal ninguém o
impedirá de produzir Ciência com Poesia, Engenharia com leveza Filosófica.
Aqui em São Luis até o mendigo mais pobre e o pescador sobre a ponte do São
Francisco à beira-mar, como o seu Zé Sabonete sabe o valor do uso da vírgula e, mesmo
sem nunca ter ido à escola tem um falar até certo ponto correto e educado.
Nas cidades grandes do país faz-se pontes e viadutos, mas o povo vive triste e
sem laços, enquanto que aqui faz-se literatura e pontes de convívio no bairro da Madre-
Deus. A literatura foi o que sobrou para o povo maranhense nesta República que
tardiamente se tornou democrática e que em suas promessas, continua a viver sob o
medo da discussão do rumo de uma monarquia interrompida, que no Maranhão deixou
saudades.
No Maranhão tudo é interrompido: amores são interrompidos como os de
Gonçalves Dias e Ana Amélia, palácios são interrompidos como os palácios de
Alcântara, projetos são interrompidos como o da França equinocial ou o da Holanda,
que foi destruído por uma guerra tão violenta, que até hoje o povo acende velas pelos
finados da guerra, tanto portugueses como holandeses lá no Outeiro da Cruz. O que
permaneceu por inteiro no Maranhão foi a Literatura e a Poesia na alma de um povo
assimilado mas contente, disposto a romper e assimilar-se num consolo com a vida
digno do filósofo Epicuro.
Poucas coisas são permanentes por aqui e o rei português Dom Sebastião é
outra, para além da Literatura. Com seu ar fidalguio e seu rosto de menino, caminha
com sua espada e couraça de guerreiro cristão pelas dunas dos lençóis maranhenses,
entre o marulhar das águas cristalinas, numa contínua simbiose entre águas e dunas
noite a dentro. Enquanto o mouro não o abate vive, o sonho de um Portugal eterno,
próximo ao seu cachorro branco com pintas negras.
Também nós vivemos o sonho de um Maranhão eterno, assim viveram nossos
antepassados com a fartura do algodão que enriqueceu o Estado. Vivemos assim com as
ilusões de um passado glorioso e assim vivem os jovens maranhenses e estrangeiros
neste século XXI, feito de máquinas e tecnologia, a sonhar que com o gás natural virá a
riqueza fácil e o ócio tão necessários para a poesia.
Estes jovens maranhenses têm que observar as atitudes de seus colegas
americanos, que embora tenham uma excelente formação petroquímica ou em diversos
componentes da Engenharia industrial, uma só coisa rodeia as suas mentes: ganhar um
bom dinheiro e retornar para a querida América porque aqui pode ser tudo menos
América. Eles agora fazer parte da nova geração da ruptura tecnológica e
preconceituosa que vê o outro não como desprovido de neurônios e mesmo capacidade
de aprendizagem.
As estatísticas atuais dizem que somos o Estado mais pobre do Brasil e os
jovens tem baixos resultados no estudo da língua portuguesa. Isso prova que a
República nos deixou na margem mais longínqua da nossa história. Somos quase a
Sibéria tropicalensis, como dizia Dom Xavier nos seus tempos de padre, se referindo a
Tutóia, baseado no que afirmou Monsenhor Hélio Maranhão. Apesar disso não
conseguimos nos esquecer de que aqui se fala um bom português, quando se tem as
condições favoráveis para isso.
Neste ponto Justino entra na conversa e diz:
- Geograficamente falando, já é bastante sabido que o Estado do Maranhão é um estado
de transição entre o Norte e o Nordeste do Brasil, com um relevo de costa recortada,
planície litorânea, com dunas únicas no mundo e planalto no interior e isto produz uma
vegetação composta de cocais a leste, mangues no litoral, floresta Amazônica a oeste e
cerrado ao sul do Estado. Esta parte de floresta Amazônica ou semi-amazônica
confunde a pessoa e muitos dizem que o Maranhão é também Amazônia.
Sim, isto é verdade, mas apenas em parte porque acima do Maranhão passa a
linha imaginária do Equador a 2 graus de latitude que faz toda a diferença com o resto
da Amazônia. Qualquer turista estrangeiro ou brasileiro deveria pedir ao seu guia local
para mostrar-lhe o sol em pleno meio-dia.
À pergunta: onde está o sol? A resposta simples de qualquer criança é: Está lá
em cima pai. Por causa disto é que o calor é grande e o paulistano, se não quiser derreter
tem que andar de ventilador portátil como Dom José da Motta e Albuquerque, nos seus
auges de Arcebispo.
Josefina continua: Se o turista quiser frio terá que ir para Caxias do Sul e
saborear as uvas deliciosas que produzem um vinho brasileiro que está cada vez melhor,
sem se comparar ainda com o vinho Francês, Sul-Africano ou Português mas a
tendência é melhorar. Neste caso deve evitar a querida Caxias porque lá o sol é eterno.
Caso esteja disposto a experimentar o calor então venha e aproveite as nossas praias e
os nossos lençóis maranhenses e coma bastante bacuri, buriti, murici, jenipapo,
tamarindo, cajú, cupuaçu, jaca e tantas outras frutas deliciosas e, sorria porque você está
no melhor do Brasil. Aqui somos pobres mas felizes. A taxa de suicídio, é mínima se
comparada com a do Japão porque o maranhense é povo feliz.
Pecuapá retoma as reflexões e diz: Se formos fazer um apanhado geral podemos
dizer que em termos filosóficos aqui no Maranhão o método filosófico que se baseia na
tese, antí-tese e síntese hegeliana retomada por Karl Marx de forma materialista, tem
um novo patamar que seria: ruptura, assimilação e, ao invés da síntese final, temos um
novo recomeço com a ruptura segunda, num contínuo Ad eternum, que a nossa História
futura dirá até onde vai chegar.
Como exemplo disso temos os vasos comunicantes dos laboratórios de Química
dos anos oitenta. No Maranhão estes vasos seriam incomunicantes, porque cada um
chega e faz a sua História, sem levar em conta o que o outro fez ou disse. Há uma
presunção e discontinuidade que irrita o pesquisador ou o estudante de História e
poucos deixam o registro histórico dos fatos. Neste caso a conclusão seria Ruptura,
Assimilação e Ruptura como constantes filosóficas de nosso modo de ver a vida e os
fatos e isto tem um pouco de herança lusitana e europeia com suas guerras infindáveis.
Antes da guerra que pós fim à ex-Iugoslávia, o filósofo Emanuel Lévinas dizia em Paris
numa conversa que tivemos em 1990 que era a primeira vez em que a Europa vivia um
período de paz por muito tempo.
Depois de tanta conversa, Pecuapá foi-se embora para Pedreiras no primeiro
ônibus que encontrou e se retirou para debaixo da ponte que separa Pedreiras da
Trizidela do Vale e, adormeceu sob as dunas do rio Mearim, sob o calor dos trópicos
que só os locais apreciam.
Gabriela, a young lady of 20 years of age said in English to the tourists from
Canada, USA, South Africa and Australia outside Sao Luis’s Cathedral: This is the
story of Pecwapah or Pepe like Canadians lovely call him, and the city of Sao Luis in
Maranhao State – Brazil.
If you wish to know more about it’s foundation 400 years ago look for the
Museum of the city and talk to the people of the Institute of History and Geography of
Maranhao. There is a lot to know about Maranhao and it’s relationship with England
because Lord Cochrane was Governor here in the XIX century. In Maranhao there is
always unfinished business. Conquered by French, Portuguese and Dutch, Sao Luis will
be forever the land of poets and authors despite of its poverty. Maybe its richness
resides on the passion for literature.
Bibliografia consultada:
ALDY MELO
Existem conceitos que são fundamentais para se entender bem o que foi a colonização,
como e porque agiram os colonizadores enquanto pessoas, ou cumpridores de ordens
superiores, quais os interesses principais dos paises colonizadores e o comportamento
dos colonizados. É importante, também, que nos estudos sobre o poder, se constate
igualmente as marcas do tempo da colonização, o poder que exerciam os governos e os
grandes rumos que o mundo daquela época vinha tomando, até chegar aos nossos dias. 13
Em qualquer língua e em qualquer dicionário, colonização sempre é vista como
um processo de povoamento de um território por indivíduos ou povos que a eles não se
vincula ou, como bem diz a expressão comumente usada, são estranhos. Colonização
significa ocupação de um território estrangeiro por outros povos. Vindos de outros
paises ou regiões, povos diferentes daqueles que habitam os territórios, assumem o
poder e exercem o domínio, quase sempre subjugando os habitantes naturais. Esse foi o
processo que fez com que a espécie humana se espalhasse e crescesse pelo mundo a
fora, fazendo surgir paises, cidades ou conglomerados de pessoas que absorveram, sob
pressão, os costumes e os valores dos colonizadores individualmente ou das nações. A
colonização, como tudo na vida humana inclusive a própria vida, teve seu início e seu
fim, mesmo que continue em alguns casos, mas com outros nomes e outros métodos.
A colonização foi uma aventura do poder estabelecido, mas foi também uma rara
prova de fidelidade dos seus líderes, quase sempre fidalgos, nobres ou mercadores de
alta confiança do Rei ou Imperador.
Nos diversos processos de colonização, encontramos distintos perfis de
colonizadores, cada um exercendo suas tarefas específicas de acordo com o
ordenamento real ou imperial. Havia os mercadores e mascates, responsáveis pelas
atividades mercadológicas de acordo com os desejos da colonizadora; os
administradores das colônias; os olheiros, aqueles que exerciam as funções de delatores
dos contrários á vontade da coroa; os arrecadadores de tributos; os zeladores da fé,
quase sempre bispos, padres ou missionários. Aos colonos cabia a missão de produzir,
de seguir as ideias dos senhores, não se opondo ao rei ou imperador. Já nessa época,
quando se expandia a aventura da colonização, surgiram os primeiros traficantes de
escravos negros, oriundos do litoral africano, sobretudo para as colônias portuguesas e
espanholas. Os colonizadores eram assim: exploradores dos nativos habitantes, pondo
em prática uma política escravocrata nos novos territórios colonizados 14.
15
Em seu livro “Gente do Mar... Maranhão”, o autor Carlos Alberto Santos Ramos, assim se expressa: “
Os navegadores portugueses exploraram, se apossaram e fundaram várias cidades portuárias no seu
litoral, que serviam de Feitorias e pontos de apoio para inúmeras Frotas e Esquadras de navios
portugueses que operaram na Carreira das Índias; destacam-se os Portos de Goa e Málaca, pontos
estratégicos para a conquista europeia no continente asiático; esses portos foram posteriormente
ocupados por holandeses e ingleses que alí se estabeleceram nas suas expansões marítimas no oriente.”
rainha Victória proclamou-se Imperatriz da Índia. Em 1884, deu-se a Convenção de
Berlim que dividiu os territórios africanos entre as diversas coroas europeias. A
Alemanha, detentora de uma parte importante do território africano, criou a sua
Associação Colonial para proteger suas colônias na África. A Rússia terminou a metade
do século XIX como uma das grandes potências da Europa e uma das monarquias
hereditárias mais absolutistas da Europa. No final do século XIX, os japoneses
dominam a Coreia, ocuparam parte da China, a Indochina, as Filipinas e a Indonésia que
também era chamada de Índias Orientais Holandesas.
No século XX, a Grã-Bretanha devolve Hong Kong à China e o colonialismo com
visto nos séculos anteriores passa para a história da humanidade. Uma história de
horror, humilhação e tristeza. Se observarmos a história, podemos descobrir que a
colonização também seguiu uma cronologia.
O poder dos colonizadores ocorreu dentro de um tempo que lhes era favorável e
de acordo com os interesses que defendiam na época. Assim podemos dizer que o
poder do Império Alemão nem sempre correspondeu ao poder colonialista da Coroa
Britânica. O poder da Coroa Espanhola não foi igual ao poder da Coroa Francesa. A
Coroa Holandesa não tinha os mesmos interesses da Coroa Portuguesa e essa última não
fazia o que fazia a Coroa Russa. Mais tarde, passado o tempo de colonização, vieram as
Independências das nações e dos povos, com vida e morte.
A cronologia da colonização
A Coroa Espanhola foi pioneira em descobrimentos e conquistas no território do
Novo Mundo, fundando suas colônias no Caribe, na América Central e na América do
Norte. As terras encontradas por Cristóvão Colombo logo foram disputadas pela coroa
portuguesa. A disputa foi grande que precisou da interferência da igreja católica. O
Papa Alexandro VI, que era espanhol, propôs a Bula Inter Coetera que, através de um
meridiano, dividiu o Oceano Atlântico em duas partes: a parte que pertenceria à
Espanha e a parte que pertenceria a Portugal. Foi o Tratado de Tordesilhas, em 1529.
No Caribe a Coroa Espanhola possuía as seguintes colônias: Antígua e Barbuda, Cuba,
Hispaniola (hoje República Dominicana e Haiti), Jamaica e Porto Rico. Na América
Central: Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua e Panamá. Na
América do Norte: México, Novo México, Texas, Colorado, Nevada, Nebraska, Dakota
do Sul e do Norte, dentre outras regiões.
A colonização espanhola começou no século XV, com Cristóvão Colombo que
descobriu as Américas em 1492. Diz a história que Colombo buscava um caminho para
as Índias. Nessa época, a Europa vivia a euforia da expansão territorial e pipocava por
todo o velho continente a ganância por novos territórios e pelas suas riquezas naturais e
minerais, como o ouro. Os espanhóis tiveram que fazer muitas concessões e alianças
com os nativos, sobretudo, os Incas e Astecas que contavam com os seus impérios.
Todo o processo de colonização da Coroa Espanhola começou no século XV,
com o interesse de chegarem até as Índias Ocidentais. Cristóvão Colombo, embora não
fosse espanhol, começava o processo de colonização espanhola quando, em 1492,
descobriu o continente americano. O império colonial espanhol existiu no período de
1494 a 1898, ou seja, desde a era dos reis católicos até 1898, quando foi feita a
dissolução do império. O mundo vivia no século XV, a era dos descobrimentos, e a
Espanha e Portugal empolgavam-se pelos territórios americanos descobertos por
Colombo e logo implantavam seus projetos de colonização em territórios que foram
divididos pelo Tratado de Tordesilhas, em 1529. Os espanhóis tinham sob seu controle
toda a costa das Américas Central e do Caribe, indo até a costa brasileira que pertencia a
Portugal. Os espanhóis,diferentes dos ingleses, não estavam interessados em
desenvolver seus territórios colonizados e sim na exploração dos recursos naturais e
minerais. O império colonial espanhol expandiu-se até o novo continente americano,
chegando a ser chamado de império onde “o sol não se punha”, devido a sua ganância
por territórios novos e riquezas. Ele assumia a liderança nas explorações por mar e por
terra trazendo não apenas novos conhecimentos, mas especiarias, e muito luxo para a
Coroa Espanhola. No entanto, com a chegada do século XIX e os movimentos de
independência, a Espanha perdeu suas antigas colônias e passou a ser uma potência de
menor tamanho e importância para a Europa, diferente do que fora nos séculos XVI e
XVII.
A colonização portuguesa foi responsável pela chamada América Portuguesa,
mais tarde chamada de Brasil. O sentimento europeu da época era o de expansão
marítima e comercial. No princípio do século XIV, os portugueses já haviam descoberto
a explorado as Ilhas Canárias, no reinado de D. Afonso IV. Mas foi com a conquista de
Ceuta, em 1415, que Portugal deu início ao seu processo de colonização e começou
efetivamente a chamada “era dos descobrimentos” portugueses, onde se inclui o Brasil,
em 1500, terras da China, em 1513, e terras do Japão, em 1543. Os interesses
comerciais de Portugal conduziram as decisões da Coroa Portuguesa, levando em conta
os portos do Mediterrâneo, as rotas comerciais da época e os caminhos existentes na
Europa. A expansão portuguesa era seu objetivo e sua principal ambição era chegar até
as Índias. Ainda no século XV, os portugueses descobriram a Ilha da Madeira, sem
qualquer povoamento, na costa africana, depois vieram ao arquipélago de Açores e
chegaram até a costa oeste da África, após contornar o Cabo Bojador, referido por
Fernando Pessoa. Em seguida vieram Cabo Verde, ilha do Oceano Atlântico, Golfo de
Guiné, Serra Leoa, Benin, Gabão e as Ilhas São Tomé e Príncipe, na África. Em 1500,
foi descoberto o Brasil por Pedro Álvares Cabral, que se caracterizou como uma mera
colônia de exploração. No período colonial brasileiro que foi de 1500 a 1530, não
houve, por parte da Coroa Portuguesa, planos para o desenvolvimento da nova região,
cabendo aos portugueses somente a defesa contra as invasões, como foi ocaso da
França Antártica, no Rio de Janeiro, e da França Equinocial, no Maranhão. Depois
foram criadas as Capitanias Hereditárias, visando o desenvolvimento da colônia e a
defesa das mesmas contra a invasão de estrangeiros. É bom esclarecer que o modelo
colonial vindo da Coroa Portuguesa, no Brasil, foi caracterizado pela escravidão vinda
da África, instituindo-se o tráfico negreiro. A colonização portuguesa foi uma
colonização que mais contou com estruturas do ponto de vista econômico e social e das
condições nacionais para o exercício das conquistas. Os portugueses foram, sem
dúvidas, os europeus que mais dispuseram de instrumentos que garantissem seus
procedimentos de expansão marítima e comercial para fixar seus domínios coloniais.
Os ingleses iniciaram a colonização desde Henrique VII, em 1465, mas foi no
reinado de Isabel I que surgiu a primeira colônia britânica, a Califórnia, com o nome de
Nova Inglaterra. Em 1587, no reinado de Jaime I, surgiu a segunda colônia, também no
continente americano, chamada de Virgínia, em homenagem à futura rainha virgem,
Elizabeth I. Mas foi a partir do século XVII, já no reinado de Elizabeth I, (1558 a 1603)
após a Espanha e Portugal, que a Grã-Bretanha assegurou seu processo de colonização.
Ela avançou no Novo Mundo, embora suas terras colonizadas fossem de pouca
produção e não muito úteis a seus interesses mercantilistas. Mas tarde foi criada a
Companhia de Comércio e, em 1620, a Grã-Bretanha chega ao Canadá e avança seu
poder de colonizadora, passando a ter territórios no Note, no Sul de no Centro do
território americano até atingir as 13 colônias só no futuro Estados Unidos. A Grã-
Bretanha desenvolveu um processo distinto nas suas colônias americanas, diferente dos
espanhóis e dos portugueses, dando às colônias poderes para se desenvolverem, desde
que não pudessem fugir do domínio exercido pela coroa britânica. Na colonização
inglesa nos Estados Unidos, os protestantes que foram da Europa fugindo da
perseguição religiosa tiveram um importante papel no processo produtivo que lá se
implantou. A Grã-Bretanha estendeu seu poder a outros novos continentes e marchou
para a Índia. Até l670, a Coroa Britânica já contava com as seguintes colônias: Nova
Inglaterra, Virgínia e Carolina, na América do Norte; Barbados, Belize e Jamaica, além
da Índia, graças ao desempenho da Companhia das Índias Orientais. Com a
independência dos Estados Unidos, estende seu poder sobre a Austrália e a Nova
Zelândia. Em 1819, é incluída Cingapura e logo depois o Canadá. Em 1872, a rainha
Vitória proclamou-se Imperatriz da Índia, num gesto de engrandecimento do poder
colonial. A Grã-Bretanha ocupa Xangai, na China, e na África conta com o Egito, Cabo
da África do Sul, Sudão, Tanzânia, Uganda e Rodésia. Com a partilha da África, em
1884, a Coroa assumiu o Senegal, a Nigéria e Gana, além da região onde já exercia seu
poder colonial. Após a Primeira Guerra Mundial, foi criado o Crommonweath que
muito fortaleceu a unidade da Coroa em suas colônias. Na Segunda Guerra Mundial, a
Coroa Britânica sentiu as reações da Índia e do Paquistão caminhando para suas
independências. A partir da Segunda Guerra Mundial iniciou-se a desagregação do
Império Colonial Britânico indo terminar, em 1997, com a entrega de Hong Kong à
China. Hoje a Grã-Bretanha não é mais potência para enfrentar ou desafiar o mundo.
Os franceses também chamados de bretões e normandos voltavam suas atenções
para o novo continente americano e pretendiam disputar com os espanhóis e
portugueses que já tinham seus territórios definidos pelo Tratado de Tordesilhas, em
1529. Como ocorreu com a Grã-Bretanha, a colonização francesa aconteceu
tardiamente, quando as nações ibéricas já tinham avançado bastante. O processo de
colonização francês começou efetivamente no reinado de Francisco I, pela ocupação de
áreas na América do Norte, sem, no entanto, ter tido sucesso. Eles começaram suas
aventuras em 1563 pela Flórida, lá deixando a cidade de Jacksonville. Em 1589,
partiram para a Nova Escócia, em território canadense, sem muito sucesso também, só
voltando mais tarde para fundar Quebec, com o nome de Nova França. Trataram de ir
ao território brasileiro fundar a França Antártica, no Rio de Janeiro, mas foram
expulsos por Mem de Sá.
No século XVII tentaram novamente fundar um nova colônia, deste vez no
Maranhão, onde fundaram a cidade de São Luis, e a chamaram de França Equinocial,
em 1612. Novamente foram expulsos pelos portugueses. No caso específico da
fundação da cidade de São Luis, que comemora seus 400 anos, o Professor Mário
Martins Meirelles em seu livro França Equinocial pág. 65 nos conta o momento da
fundação. Assim relata:
“Por fim, dada por formalmente fundada a Colônia, o Senhor de Razilly deu
ao Forte o nome de Saint-Louis, em homenagem ao rei menino, Luis XIII,
de França e Navarra, de quem era loco-tenente-generais na terra; e ao
ancoradouro, ao pé do Forte, e do Port de Sainte-Marie, em homenagem à
Virgem Mãe de Deus, pois que era aquele o dia de sua natividade, e em
homenagem à Rainha-Mãe e Viúva, Maria de Médici, patrocinadora da
expedição.”
A Coroa Francesa estendeu seu poder para as Índias Ocidentais ou Antilhas,
quando surgiu o Haiti. Consegui chegar até a costa brasileira, emGuiana Francesa.
Fundou também as colônias de Guadalupe e Martinica. Em 1699, os franceses chegaram
a Louisiana no território americano, instalado as cidades de Mobile e New Orleans. Na
África, a Coroa Francesa apoderou-se do Sudão francês, atual Mali, e outras regiões
coloniais menos importantes, estendendo seu poder até a Índia. Durante o império de
Napoleão, a França teve o Egito como colônia, embora por um curto período.
Diz a história que a Alemanha chegou bem tarde ao grupo de colonizadores da
Europa, pois só após a Convenção de Berlim os alemães tiveram com precisão uma
política de colonização. A Convenção de Berlim realizou-se no período de 1884 a 1885,
visando uma partilha da África entre as potências coloniais da Europa. Foi organizada
pelo chanceler alemão Otto van Bismarck, chamado também de “Chanceler de Ferro.”
Por essa convenção, a África ficou assim dividida entre os colonizadores: Alemanha -
Sudeste Africano, onde hoje está situada a Namíbia, e o Tanganica, hoje a Tanzânia;
os Estados Unidos ficaram com a Libéria, na África Ocidental; a Grã-Bretanha com a
África Austral, com exceção das colônias portugueses Angola e Moçambique, toda a
África Oriental e o Sudoeste Africano, com exceção da Tanganica; os territórios da
Grã-Bretanha, no Norte, foram compartilhados com a França e a Espanha; Portugal
ficou em Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Cabo Verde; a Bélgica com o Gongo.
Em 1883, a Alemanha criou a Associação Colonial Alemã com a finalidade de proteger
suas áreas de colonização na África. O Império Colonial Alemão não teve muita
duração e foi um império muito disperso. Lutou muito pela unificação da Alemanha e
logo se interessou pela Rússia e a Romênia, estendendo seus interesses a toda a região
dos Balcãs. Com a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, que terminou com
o Tratado de Versalhes, em 1919, a Alemanha perdeu seus territórios voltando para a
França, o Reino Unido e a Bélgica. Os colonizadores alemães além da África
colonizaram também as Américas e terras brasileiras, mais especificamente o Paraná,
Santa Catarina e o Rio Grande do Sul. A colonização alemã, no Brasil, ocorreu no
governo de D. João VI e continuou até o império de D. Pedro II.
A Holanda, com o nome de Províncias dos Paises Baixos, atingiu a sua
independência em 1609. Até então, os holandeses integravam o Império Espanhol na
Europa, e viviam sob o domínio da Espanha, até o reinado de Felipe II, rei da Espanha.
Com a independência dos Países Baixos tornaram-se um dos mais fortes países
europeus e tinham como bases de seu desenvolvimento o poderio marítimo e o
dinamismo da sua burguesia que era protestante. Em 1602, os holandeses criaram a
Companhia das Índias Orientais e, em 1621,a Companhia das Índias Ocidentais. Essas
duas empresas foram fundamentais para que os Países Baixos dessem decisivos passos
para o desenvolvimento e independência do povo holandês, lutando contra o domínio
dos espanhóis. Os holandeses ocuparam o Ceilão (hoje Sri-Lanka), Java, Sumatra, e
Molucas (arquipélago hoje pertencente à Indonésia), no Oriente. Em 1654, invadiram o
nordeste do Brasil, especificamente Pernambuco e Bahia, movidos pela produção
açucareira da região e o mercado de escravos. Mais tarde, sob o comando do conde João
Maurício de Nassau, foram adotadas várias medidas administrativas e progressistas que
levaram a produção e venda de açúcar ao auge junto ao mercado europeu. Coube
também a Maurício de Nassau pôr em prática seus projetos de reforma urbanística na
cidade de Recife. Em 1641, deu-se a invasão dos holandeses no Maranhão. Os
holandeses deixaram o nordeste brasileiro após vários choques militares com os
portugueses, a quem pertenciam as áreas invadidas, e depois de amplas e demoradas
negociações diplomáticas entre a Holanda e Portugal. Depois de expulsos do Brasil, os
holandeses ocuparam a Guiana e Curaçao, nas Antilhas. Na América do Norte,
ocuparam o vale de Hudson e lá fundaram a Nova Amsterdã que foi mais tarde a
colônia de Nova Yok e Delaware. A colonização holandesa teve uma característica
ímpar na história das colonizações, que foi a sua vinculação com a economia açucareira.
Naquela época, o açúcar era um produto agrícola de muita aceitação no mercado
europeu, dando, portanto, muito lucro para os seus produtores, o que vinha suprir o
mercado de minerais preciosos como o ouro.
Os últimos europeus a buscarem a colonização foram os russos. No século
XVIII, os russos procuraram ampliar seus territórios e consequentemente o Império
Russo. Foram eles que descobriram o Alasca e as Ilhas Aleutas no território das
Américas, regiões muito ricas em peles de animais selvagens e madeira. Em 1840 a
colônia do Alasca extinguiu-se e em 1867 foi vendida para os Estados Unidos porque a
Rússia não tinha mais condições financeiras de mantê-la. O Império Russo foi instituído
em 1721 pelo czar Pedro I, também chamado do Pedro, o Grande, até o czar Nicolau II,
em 1917, quando foi deposto. O Império Russo chegou a ser o terceiro império mais
importante na história moderna, dando à Rússia o título de maior país do mundo, em
1855, com a maior população do planeta. A capital do Império Russo era São
Petersburgo e o império incluía os estados bálticos da Lituânia, Letônia e Estônia, a
Finlândia, Cáucaso, Ucrânia, Bielorússia, parte da Polônia, Moldávia, parte do Irã e
Mongólia, na China. A Rússia era considerada uma das cinco grandes potências no
início do século XIX, até a Primeira Guerra Mundial, em 1914, e tida como uma das
maiores monarquias hereditárias absolutistas da Europa. A religião predominante era a
Igreja Ortodoxa Russa. O czar Pedro I foi substituído por Catarina I, sua esposa que
governou até 1727.
Conclusão
Os países europeus não tiveram suficientemente matérias-primas para garantir
seus progressos, por isso buscavam produtos minerais como o ferro, o chumbo e o
cobre, produtos agrícolas como o algodão, a borracha, a madeira e o açúcar. Assim
começava o processo de colonização que conduziu o povo europeu a buscar também
riquezas do solo como o ouro para seu próprio enriquecimento. Tudo mão passou de
formas que encontraram para invadir novas terras para exploração. As Américas, como
se pode observar no processo de cronológico da colonização do mundo, foi o primeiro
território explorado, desde o século XV, vindo depois os continentes africano e asiático.
A Revolução Industrial acelerou o processo de colonização no século XIX, porque os
europeus buscavam novas fontes de recursos para se tornarem industriais. Segundo a
historiografia colonizatória, foi exatamente no século XIX que a África recebeu maiores
impactos de colonização, só vindo a ter uma política continental em 1884 com a
Convenção de Berlim.
Em uma de suas afirmações sobre verdade, Sêneca disse certa vez “que ninguém
conserva por longo tempo o poder exercido com violência.” Será que a colonização tem
a ver com o dizer de Sêneca? Como sabemos e a história nos narra, a colonização se
caracterizou, quase sempre, por invasões. Era um ato vinculado aos interesses
mercantilistas europeus e à ganância por novos territórios. Afigurava-se uma época em
que as relações de dominação eram vinculadas à subordinação das metrópoles, o que
marcou muito bem o sistema colonial mercantilista. Havia um profundo
sentimento e compreensão por parte dos líderes da colonização, tanto com a fé religiosa,
como com a Coroa, os desejos de Sua Majestade. Como bem relata o Professor Mário
Meirelles no seu livro França Equinocial pág. 54, o sentimento dos colonizadores
ocorrido no Maranhão parece ser o sentimento de todos aqueles que se deixavam levar
pelo prazer de colonizar. O autor relata:
“Nós, abaixo-assinados, damos voluntariamente nossos bens e nossas vidas
em prol do estabelecimento da Colônia francesa além da linha Equinocial,
a serviço do rei, em obediência aos desejos de Sua Majestade.....” e
continua: “Resolveram os chefes da expedição tomar posse solenemente.,
primeiro em nome da Fé, depois em nome da Coroa...”
Uma das premissas que os colonizadores faziam ao invadir os territórios e instalar
as colônias era instituir leis e normas que garantissem suas terras e o poder da Coroa.
Eram leis e ordens em nome e a serviços do rei. Tais leis e normas passavam, assim, a
ser institucionais.
Os círculos da colonização terminaram efetivamente com as independências das
colônias, ocorridas, sobretudo, nos séculos XVIII e XIX.
REFERÊNCIAS
DREIFUSS, René Armand. Política, Poder , Estado e Força: uma leitura de Weber.
Petrópolis: Vozes, 1993. (3)
SCHNEIDER, Adolfo Bernardo. Povoamento-Imigração Colonização. Edição do
Autor, Joinville-SC, 1983. (8)
MEIRELLES, Mário Martins. França Equinocial. São Luis - Ma: Ed.Civilização
Brasileira,1982. (4)
BOXER, C. R. Os holandeses no Brasil (1624-1654) S.Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1961.(2)
MEIELLERS, Mário Martins. Dez Estudos Históricos. São Luis – Ma: Alumar
Cultura, 1994. (5)
TOFFLER, Alvin. O Choque do Futuro. Rio de Janeiro: Editora Arte Nova, 1972. (10)
RAMOS, Carlos Alberto Santos. Gente do Mar - Maranhão. São Lujs-Ma: Ed.
Palmares, 2007. (6)
ROMAG, Frei Dagoberto. Compêndio de história da igreja. Rio de Janeiro: Vozes,
1952. (7)
SCHWARTZ, Stuart B. e LOCHART, James. A América Latina na época colonial. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. (9)
BOSI, Alfredo. Dialética da Colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. (1)
QUEM HABITAVA UÇAGUABA/MIGANVILLE?
16
http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_Maranh%C3%A3o
amistosas entre os dois povos 17, esta aldeia teria fornecido de trezentos a quatrocentos
trabalhadores para a fortificação do nascente núcleo colonial na ilha Grande, depois ilha
de São Luís, após a chegada de Daniel de La Touche, senhor de La Ravardière (1612).18
Dentre outros franceses, freqüentava a Ilha Grande o Capitão Guérard, que em
1596 armou dois navios, sendo um deles para o Maranhão – Poste, chegou ao Camocim
– estabelecendo com regularidade as visitas à terra de corsários de Dieppe, de La
Rochelle e de Saint Malo. É nesse ano que o Ministro Signeley toma como ponto de
partida dos direitos da França nesta região, funcionando como uma linha regular de
navegação entre Dieppe e a costa leste do Amazonas. Datado de 26 de julho de 1603 há
um arresto do tenente do Almirantado em Dieppe relativo a mercadorias trazidas do
Maranhão, ilha do Brasil, pelo Capitão Guérard19. Meireles (1982, p. 34) 20 traz também
Du Manoir em Jeviré; Millard e Moisset, também encontrados na Ilha Grande. Os
comandados de Du Manoir e Guérard chegam a quatrocentos; há esse tempo já dois
religiosos da Companhia de Jesus haviam estado no Norte do Brasil.
Henrique IV, de França, concede a René-Marie de Mont-Barrot, Carta Patente
datada de 8 de maio de 1602, autorizando-o a arregimentar 400 homens e fundar uma
colônia no norte do Brasil; se associa a Daniel de La Touche, transferindo-lhe a
empreitada. O Senhor de la Ravardière com o navegador Jean Mocquet parte a 12 de
janeiro de 1604 com dois navios, chegando as costas da Guiana (Oiapoque) a 8 de abril,
retornando àquele porto a 15 de agosto.
Ante a desistência de Mont-Barrot, o monarca francês, por Carta Patente de 6 de
julho de 1605 nomeia La Ravardière seu Lugar-tenente e vice-almirante nas costas do
Brasil. A primeira concessão a Daniel de La Touche, data do mês de julho:
“Luis, a todos os que virem a presente. Saúde. O defunto rei Henrique, o
Grande, nosso muito honrado senhor e pai [...] tendo por cartas patentes de
julho de 1605 constituído e estabelecido o Sr. De Ravardiére de La Touche
seu lugar-tenente na América, desde o rio do Amazonas até a ilha da
Trindade [...] 21
Segundo o sócio do IHGM Antonio Noberto, é confirma a presença de franceses
pelo Padre Luis Figueira, em sua Relação do Maranhão (de 1608):
"Mandamos recado a outra aldea para sabermos se nos quirião la e q'
viessem alguns a falar cõ nosco, e tãbem nos queriamos emformar dos q'
tinhão vindo do maranhão q' la estavão principalmente acequa dos frãcesez
que tinhamos por novas que estavão la de assento com duas fortalezas feitas
em duas ilhas na boca do rio maranhão". 22
17
D´ABBEVILLE, Claude. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCHINHOS NA ILHA DO MARANHÃO E TERRAS
CIRCUNVIZINHAS. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: USP, 1975.
18
http://pt.wikipedia.org/wiki/Forte_de_S%C3%A3o_Sebasti%C3%A3o_de_Alc%C3%A2ntara
19 (MEIRELES, Mário Martins. FRANÇA EQUINOCIAL. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira;
São Luis: Secretaria de Cultura do Maranhão, 1982)
20
MEIRELES, Mário Martins. FRANÇA EQUINOCIAL. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira;
São Luis: Secretaria de Cultura do Maranhão, 1982
21 LIMA, Calos de. HISTÓRIA DO MARANHÃO – A COLONIA. São Luis: Geia, 2006, p. 170-171,
nota de pé-de-página;
MEIRELES, Mário Martins. FRANÇA EQUINOCIAL. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; São
Luis: Secretaria de Cultura do Maranhão, 1982
22
Conforme Antônio Noberto original deste documento está nos arquivos da Ordem de Jesus Claudio
Aquaviva, Maison d'Etudes, Exaten, Baaksen, Limburgo Hollandez. Estas informações estão no
Em 1607 - ou 1609 - Carlos Des-Vaux retorna à França cansado de esperar por
Riffault, e é recebido por Henrique IV.
Ainda em 1609, Daniel de LaTouche e Charles Des-Vaux visitam o Maranhão. De
LaTouche certifica-se de que as informações sobre a terra eram verdadeiras e pede
licença ao rei para explorá-la. Mas com o assassinato de Henrique IV, sucede-lhe ao
trono Luis XIII, ainda menor, governando em seu nome Maria de Medicis. É esta quem
concede licença à Daniel de La Touche, Senhor de La Ravardiére, de formar uma
companhia para explorar as "terras" de Riffault:
“[...] e havendo ele feito duas viagens às Índias para descobrir as enseadas
e rios próprios para o desembarque e estabelecimento de colônias, no que
seria bem sucedido, pois apenas chegou nesse país soube predispor os
habitantes das ilhas do Maranhão e terra firme, os tupinambás e tabajaras,
e outros, a procurarem nossa proteção e sujeitarem-se à nossa autoridade,
tanto por seu generoso e prudente procedimento [...] de lhe fazer expedir
nossas cartas patentes de outubro de 1610 para regressar, como Chefe, ao
dito país, continuar seus progressos, como teria feito e aí demorar-se-ia dois
anos e meio com os portugueses.”, em paz e 18 meses tanto em guerra como
em tréguas”. 23
De acordo com Moreira (1981) 24 essa concessão foi uma farsa dos franceses, pois
na verdade eles não tinham credencial nenhuma e tanto é verdade, que Maria de
Médicis, que reinava em nome de seu filho, ainda menor, Luís XIII, estava há muito
tempo negociando o casamento dele com a princesa Ana d’Austria, filha de Felipe III,
que era portador das coroas Espanha e Portugal. Nutria esse desejo de muito tempo e
por isso, não iria autorizar um aventureiro e conhecido pirata Daniel Ravardiére,
inimigo da sua religião, a invadir terras que eram da coroa portuguesa, desde a
assinatura do Tratado de Tordesilhas, homologado pelo Papa Alexandre VI, há 118
anos, isto é, antes da descoberta do Brasil.
Marie de Médicis Louis XIII enfant Le duc de Montmorency Philippe III d'Espagne
Damville, Amiral de
France
La-Ravardière, associa-se a François de Razilly, Senhor de Razilly e Aunelles,
ajudante de ordens do Rei, gentil homem de sua câmara, aparentado com o cardeal de
trabalho do Barão de Studart Documentos para a história do Brasil especialmente a do Ceará - 1608 a
1625, publicado em Fortaleza em 1904.
23 LIMA, Calos de. HISTÓRIA DO MARANHÃO – A COLONIA. São Luis: Geia, 2006, p. 170-171,
nota de pé-de-página;
MEIRELES, Mário Martins. FRANÇA EQUINOCIAL. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; São
Luis: Secretaria de Cultura do Maranhão, 1982
24 MOREIRA, José. Fundação Da Cidade De São Luís. In Jornal o Estado do Maranhão, 1981, p. 6
Richelieu; Nicolas de Harlay, Senhor de Sancy e Barão de Molle e Gros-Bois, membro
do Parlamento e do Conselho do Rei; além deles conseguiu o apoio e a proteção do
Senhor de Dampulho, Almirante de França e Bretanha, primo do Rei, e do abastado
Auber de Claumont.
25 LIMA, Calos de. HISTÓRIA DO MARANHÃO – A COLONIA. São Luis: Geia, 2006, p. 174.
/ Miganville (atual Vinhais Velho), misto de aldeia e povoação européia.
Terceiro, o porto usado nessas atividades era o de Jeviré (Ponta d'Areia)”.
Para Noberto, é quase inimaginável que todo esse aparato comercial existisse sem
uma forte proteção das armas. Some-se que o chefe maior de tudo isso era David
Mingan, o Minguão, o "chefe dos negros" (daí o nome de Miganville), que tinha a seu
dispor cerca de 20 mil índios e era "parente do governador de Dieppe". Por fim, a
localização da fortaleza está exatamente no lugar certo de proteção do Porto de Jeviré e
da entrada do rio Maiove (Anil), que protegeria Miganville.
Pianzola, em sua obra “OS PAPAGAIOS AMERELOS – os franceses na conquista
do Brasil (1968, p. 34)26 apresenta decalque de mapa datado de 1627 ou 1627, cujo
original desapareceu, feito em torno de 1615 pelo português João Teixeira Albernaz,
cosmógrafo de sua Magestade, certamente feito a partir daquele que LaRavardiére deu
ao Sargento- Mor Diogo de Campos Moreno durante a trégua de 1614. O autor chama
atenção para os nomes constantes dos mapas, entre os quais muitos de origem francesa,
‘traduzidos’ para o português. Vê-se, na Grande Ilha dentre outros, Migao-Ville,
propriedade do intérprete de Dieppe, David Migan, seguramente um psudônimo, no
entender de Pianzola:
“[...] No último quartel daquele século, o que era apenas um posto de
comércio, sem maior raiz, tornou-se morada definitiva dos corsários
gauleses, vindos de Dieppe, Saint-Malo, Havre de Grace e Rouen, que aqui
deixavam seus trouchements (tradutores) que viviam simbioticamente com
26
PIANZOLA, Maurice. OS PAPAGAIOS AMERELOS – os franceses na conquista do Brasil. São Luis:
SECMA; Rio de janeiro: Alhambra, 1968
os tupinambá (escreve-se sem “s” mesmo). Entre estes estava David Migan,
o principal líder francês desta época. Ele era o “chefe dos negros” (índios)
e “parente do governador de Dieppe”. Tinha a seu dispor cerca de vinte mil
guerreiros silvícolas e residia na poderosa aldeia de Uçaguaba (atual
Vinhais Velho), apelidada de Miganville[...].(NOBERTO SILVA, 2011)27.
27 SILVA, Antonio Noberto. In Blog de Antonio Noberto O Maranhão francês sempre foi forte e líder.
http://antonio.noberto.zip.net/, publicado em 03/11/2011
Evandro Junior, in Jornal O Estado do Maranhão, 18.12.11: Saint Louis Capitale de La France
Equinoxiale, disponível em http://maranhaomaravilha.blogspot.com/2011/12/saint-louis-capitale-de-la-
france.html
28
PIANZOLA, Maurice. OS PAPAGAIOS AMERELOS – os franceses na conquista do Brasil. São Luis:
SECMA; Rio de janeiro: Alhambra, 1968
29 SILVA, Antonio Noberto. In Blog de Antonio Noberto O Maranhão francês sempre foi forte e líder.
http://antonio.noberto.zip.net/, publicado em 03/11/2011
Yves d'Evreux de "o sítio Pineau" em razão de Louis de Pèzieux, primo do Rei, ter
adotado o local como moradia 30.
Capistrano de Abreu esclarece que: “EUSSAUAP - nom do lieu, c'est à dire le
lieu ori on mange les Crabes. - Bettendorf leu em Laet Onça ou Cap, que supôs
Onçaquaba ou Oçaguapi; mas tanto na edição francesa, como na latina daquele autor, o
que se lê, é EUSS-OUAP. Na história da Companhia de Jesus na extinta Província do
Maranhão e Pará, do Padre José de Morais, está Uçagoaba, que com melhor ortografia
é Uçaguaba composto de uça, nome genérico do caranguejo, e guaba, participio de u
comer: o que, ou onde se come caraguejos, conforme com a definição do texto ...". 31.
Vencidos os franceses em Guaxenduba (19/11/1614), os portugueses se
estabelecem no Maranhão, vindo com Jeronimo de Albuquerque os padres Manuel
Gomes e Diogo Nunes, aqui permanecendo estes até 1618 ou 1619:
"A primeira missão ou residência, que fundaram mais junto à cidade para
comodidade dos moradores, foi a que deram o nome de Uçagoaba, onde
com os da ilha aldearam os índios que haviam trazido de Pernambuco ...".
(MORAES, 1987, p.58)32.
A residência dos jesuitas em Uçagoaba é ocupada com a chegada da segunda
turma de jesuitas ao Maranhão, os padres Luis de Figueira e Benedito Amodei. De
acordo com CAVALCANTI FILHO (1990) 33 a missão jesuitica no Maranhão inicia-se
com a chegada dos padres Figueira e Amodei:
"... Ao que tudo indica, a aldeia de Uçaguaba, situada a margem esquerda
do igarapé do mesmo nome, teria sido o ponto de partida dessa missão ...
desta primeira, denominada 'Aldeia da Doutrina'".(p. 31).
Antes dos franceses, os portugueses, pois com o início da colonização do Brasil
em 1534, D. João III divide ‘suas novas terras’ - "descobertas" pela expedição de Pedro
Álvares Cabral em 1500 - entre seus vassalos, pois preocupado com a presença de
corsários franceses que navegavam por estas costas desde 1504. Estabele o sistema de
Capitanias Hereditárias (Regimento Castanheira).
O Maranhão atual, por sua extensão litorânea do Paraíba ao Gurupi, está
compreendido nas duas mais setentrionais, dentre elas: a de Fernão Alvares de Andrade,
com 70 léguas de costa contadas da foz do Mundau (Camocim) aos Mangues Verdes
(Golfão Maranhense) e uma segunda, de João de Barros, com 50 léguas, dos Mangues
Verdes à foz do Gurupi. João de Barros e Fernando Álvares de Andrade associam-se a
Aires da Cunha, na tentativa de apossarem-se dela, sem resultado. Eram lotes enormes,
30
Evandro Junior, in Jornal O Estado do Maranhão, 18.12.11: Saint Louis Capitale de La
France Equinoxiale, disponível em http://maranhaomaravilha.blogspot.com/2011/12/saint-louis-
capitale-de-la-france.html
"(...) levaram-nos os índios, de canoa, até Eussauap, onde chegamos no sábado seguinte ao meio-dia. O
sr. de Pizieux e os franceses que com ele aí residiam receberam-nos com grande carinho (...)".
(D'ABBEVILLE, 1975, p. 114).
31
ABBEVILLE, Claude d’. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCHINHOS NA ILHA DO
MARANHÃO E TERRAS CIRCUNVIZINHAS. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: USP, 1975,
p.107
32
MORAES, José de. HISTÓRIA DA COMPANHIA DE JESUS NA EXTINTA PROVÍNCIA DO
MARANHÃO E GRÃO-PARÁ. Rio de Janeiro : Alhambra, 1987.
33
CAVALCANTI FILHO, Sebastião Barbosa. A QUESTO JESUÍTICA NO MARANHÃO
COLONIAL. São Luís : SIOGE, 1990.
de cerca de 350 km de largura, até à linha estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas,
interior a dentro:
"Dez anos depois de criadas, as desordens internas, as lutas com os índios e
a ameaçadora presença dos franceses acabaram provocando o colapso do
sistema que o rei e seus conselheiros haviam optado por aplicar ao Brasil"
(BUENO, 1999)34.
Vamos seguir Ribeiro 35, ao perguntar: qual era a verdadeira missão de Aires da
Cunha?
Quando a costa brasileira foi tocada pela primeira vez por Pedro Álvares
Cabral, em 1500, os portugueses mal imaginavam qual a extensão exacta da
"Terra Brasilis". Os métodos cartográficos eram muito rudimentares e os
mapas, muito vagos. Assim, o "descobrimento" ainda estava apenas
começando. Tanto que muitas regiões só foram colonizadas décadas depois
da chegada de Cabral. A história do Maranhão ilustra bem a dificuldade
dos descobridores e, até hoje, guarda em seus arquivos a mal-explicada
história do navegador Aires da Cunha - um personagem misterioso e pouco
explorado pelos livros.
Lembremos que por mais de 30 anos após o descobrimento, o Maranhão foi
totalmente desprezado pelos portugueses. O ano de 1536 é tido como o da chegada ao
Maranhão dos sobreviventes da expedição de Aires da Cunha. Até hoje se discute o
local do desembarque desses sobreviventes: se na Ilha Grande (Trindade, São Luís) ou
na Ilha Pequena (Sant' Ana) ou na do Boqueirão (do Medo) onde teriam erigido a aldeia
de Nossa Senhora de Nazaré. Outros a localizam em terras de Cumã (Alcântara) ou
mesmo há quem afirme que ela nunca tenha existido.
Luís de Melo da Silva estivera por aqui em 1554 e tenta retornar em 1573, quando
naufraga no Mar-Oceano sua nau-capitânea "São Francisco" que tinha Luis da Gamboa
como comandante.
Deixamos a seguinte questão em aberto: tivemos uma invasão francesa a um
território português, como está registrado na História, ou teria sido, na verdade, uma
invasão ibérica a uma ocupação francesa, que se estabelecia por conta de um período
histórico confuso, que já não mais garantia o domínio indiscutível dos portugueses
sobre a região?
36
FEITOSA, Antonio Cordeiro. O MARANHÃO PRIMITIVO: UMA TENTATIVA DE
RECONSTITUIÇÃO. São Luis: Augusta, 1983.
37
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http://www.revistasextosentido.net/news/%20as%20cidades%20perdidas%20do%20maranh%C3%A3o
/
Correia Lima e Aroso (1989) 38 apresentam as correntes migratórias das
Américas, segundo Canals-Pompeu Sobrinho, em número de cinco: Australóides,
Protossiberianos, Paleo-siberianos, Protomalaios, e Protopolinésios. Os australoides
deram descendentes em ambas as Américas, sendo que na do Sul, aparecem os Lácidas,
Huarpidas, Patagônicos.
Os Lácidas, paleossiberianos, atingem o Brasil e o Maranhão; assim como os
nordéstidas e os fueguinos, sendo que os primeiros atingem o Brasil e o Maranhão.
Na época da chegada dos portugueses ao Brasil, os povos que viviam ao longo
da costa eram os Tupi. Estes tinham escorraçado os povos de língua e cultura Jê para o
interior, vivendo, em geral, na região dos cerrados.
Durante a expansão dos Tupis-Guaranis – descendentes dos protomalaios, e
desembarcados nas costas ocidentais do istmo do Panamá, deslocaram-se para o suleste,
atravessando os Andes, e atingindo o Amazonas, onde fizeram seu centro de dispersão
(CORREIA LIMA, AROSO, 1989). Migravam com muita freqüência,
surpreendentemente rápidos. Desceram o Rio Amazonas e se embrenharam em seus
afluentes: Madeira, Tapajós, Xingu, Tocantins, Araguaia e ainda Gurupi, Mearim, etc.
Passaram ao rio Paraguai e seus afluentes do Paraná, chegando ao Atlântico.
Marginaram-se em direção ao Norte, parando no Maranhão, para reencontrar
seus irmãos amazonenses. Sua migração pela costa nacional é recente e se fazia sempre
ás custas dos velhos ocupantes, notadamente os Lácidas, os quais eram empurrados para
o interior. Deixaram sempre ocupantes por onde passam, a exemplo dos Tupinambás, na
Ilha de São Luis.
Dos Tupis, hoje, restam os Guajajara – Tenetehára – com uma história longa e
suingular de contato, a partir de 1615, nas margens do Rio Pindaré, com uma expedição
exploradora francesa. Os Awá-guajá – se autodenominam Awá, também chamados
EVREUX, Ives d´. VIAGEM AO NORTE DO BRASIL FEITAS NOS ANOS DE 1613 A 1614. São
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http://www.ciadanoticia.com.br/v1/tag/derrubada-de-toras/, 08/01/2011, acessado em 23/01/2011
38
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CORRIA LIMA, O.; AROSO, O. C. L. Cultura rupestre maranhense – arqueologia, antropologia
REVISTA IHGM Ano LX, n. 11, março de 1986 07-12
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CORRÊA LIMA, O. No país dos Timbiras REVISTA IHGM Ano LXI, n. 13, dezembro de 1987 82-91
CORREIA LIMA, O. Mário Simões e a arqueologia maranhense REVISTA IHGM Ano LXII, n. 14,
março de 1991 23-31
Wazaizara (Tenetehara), Aiayé (Amanayé), Gwazá. O termo Awá significa ‘homem’,
pessoa’, ou ‘gente’; sua origem é obscura, acreditando-se originários do baixo
Tocantins. Acredita-se que a partir da Cabanagem (1835-1840) tenha inicado a
migração rumo ao Maranhão. Já os Ka´apor (Urubu-Kaapor, Kaáporté) surge como
povo distinto à cerca de 300 anos, provasvelmente na região entre os rios Tocantins e
Xingu. Talvez os conflitos com colonizadpores luso-brasileiros e outros povos nativos,
iniciaram longa e lenta migração, por volta de 1870, do Pará ao Maranhão, atraves do
Gurupi. Foram pacificados em 1911. 39
Correia Lima e Aroso (1989) trazem que os Lácidas foram os primeiros
povoadores do Maranhão, como o foram do Brasil.
Vieram através de correntes migratórias interioranas e se localizaram de
preferencia na parte setentrional e maranhense do Planalto Central do Brasil. Eram
representados por um povo, os Tremembé (Tatamembé, Trememmbé) que ocuapava
inicialmente a costa maranhense, antes da chegada dos brasílidas. Na época do contato,
viviam da fronteira do Pará (Rio Caeté) à do Piauí (Tutóia), sendo sua área preferida o
Delta do Parnaíba e a Baia de Turiaçú.
Os Nordéstidas chegaram ao Maranhão pela corrente litoranea local, ocupando
todo o litoral, sendo os primeiros a usar essa corrente, vindo do Nordeste. Apenas os
Muras seguiram para o amazonas, tornando-se fluviais.
Correia Lima e Aroso (1989) ao analisarem as estearias maranhenses, área
ocupada pelos brasilidas, que atingiram também o Maranhão através de duas correntes
migratórias, interiorana – Nu-Uraques (Uraques), depois os caraíbas, e finalmente os
Tupi-Guaranis - e pela litoranea, e às vesperas e durabnte o contato, chegaram os
ultimos Tupis, representados pelos Tupinambás. Com a invasão dos Tupis-Guaranis
perderam a Ilha de São Luis e seus arredores.
Ainda dos Macro-jê temos os Canelas (Rankokamekrá; Apanyekrá); são
remanescentes das cinco nações Timbira Oriental, sendo os Rankakomekrás
descendentes dos Kapiekran, como eram conhecidos até 1820. Os primeiros contatos,
indiretos, se dão por forças militares no fim do século XVII, ocorrendo incursões contra
essas populações na ultima decada do seculo XVIII, dizimados por volta de 1814. Os
Krikati se localizam ao sul do Maranhão, com os primeiros contatos por volta de 1814.
O Gavião (Pukobyê) teve contato a partir do século XVIII, por volta de 1728. 40
Vaz (1991, 1996, 2001, 2011) 41 traz que a ocupação do território maranhense se
deu através de três correntes migratórias - Lácidas, Nordéstidas e Brasílidas, nessa
39
Associação Carlos Ubbiali; Instututo Ekos. OS ÍNDIOS DO MARANHÃO. O MARANHÃO DOS
ÍNDIOS. São Luís: Associação Carlos Ubbiali, 2004
40
Associação Carlos Ubbiali; Instututo Ekos. OS ÍNDIOS DO MARANHÃO. O MARANHÃO DOS
ÍNDIOS. São Luís: Associação Carlos Ubbiali, 2004
PREZIA, Benedito; HOORNAERT, Eduardo. ESTA TERRA TINHA DONO. 6 ed. Revs. E atual. São
Paulo: FTD, 2000
41 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A história do atletismo maranhense. "O IMPARCIAL, 27 de maio de
1991, p. 9.
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A corrida entre os índios canelas – contribuições à história da educação física
maranhense. In SOUSA E SILVA, José Eduardo Fernandes de (org.). ESPORTE COM IDENTIDADE
CULTURAL: COLETÂNEAS. Brasília: INDESP, 1996, p. 106-111;
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A corrida entre os índios canelas – contribuições à história da educação física
maranhense. In REVISTA “NOVA ATENAS” DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA, São Luís, v.4, n. 2,
jul/dez 2001, disponível em www.cefet-ma.br/revista.
ordem, seguindo Correia Lima e Aroso (1989). Embora os traços mais antigos da
presença do homem no continente americano datem de 19 mil anos, as teorias mais
recentes o dão como procedentes da Ásia a 20 ou 30 mil anos (CORREIA LIMA &
AROSO, 1989) 42. Esses autores, ao adotarem a sistemática de Canals (1950) - Pompeu
Sobrinho (1955), afirmam que caçadores australóides do nordeste asiático - Sibéria, de
acordo com Aquino, Lemos & Lopes (1990, p.19) 43 - ingressaram no Alasca há pelo
menos 36 mil anos e durante os 20.000 anos seguintes consolidaram sua cultura e se
expandiram pelo território, tendo seus descendentes atingido Lagoa Santa há 7.000
(mais ou menos) 120 anos.
Sander-Marino (1970, citados por Correia Lima & Aroso, 1989, p. 19) registram
entre 40 e 21 mil anos a presença dos superfilos MACRO-CARIB-JÊ, uma das
correntes pré-históricas povoadoras das Américas. Para Feitosa (1983, p. 70) 44 há um
consenso quando da "determinação temporal" da chegada dos australóides no Novo
Mundo, com as estimativas variando de 20.000 a.C. (RIVET); 28.000 a.C. (CANALS);
40.000 a.C. 45
De acordo com pesquisas mais recentes, realizadas em São Raimundo Nonato -
Piauí, foram encontrados fosseis com datação de 41.500 anos (FRANÇA & GARCIA,
1989) 46.
Os Lácidas, descendentes dos australóides, atingem o Maranhão. Das famílias
lingoculturais suas descendentes, destaca-se a JÊ, grupo mais populoso; de maior
expansão territorial; e de melhor caracterização étnica. Os Jês caracterizam-se pela
ausência da cerâmica e tecelagem, aldeias circulares, organização clânica e grande
resistência à mudança cultural, mesmo depois de contato, como se observa entre os
Canelas, ou RANKAKOMEKRAS como se denominam os índios da aldeia do
Escalvado (DICKERT & MEHRINGER, 1989ª, 1994). 47
Paula Ribeiro (1841, apud CORREIA LIMA & AROSO, 1989); Paula Ribeiro
(2002) 48; Franklin e Carvalho (2005) 49 descrevem uma das principais "manifestações
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A CORRIDA ENTRE OS ÍNDIOS CANELAS. REV. IHGM 36, MARÇO
2011, p 128
42
CORREIA LIMA, Olavo & AROSO, Olir Correia Lima. PRÉ-HISTÓRIA MARANHENSE. São Luís:
Gráfica Escolar, 1989.
43
AQUINO, Rubim S.L; LEMOS, Nivaldo J. F. de & LOPES, Oscar G.P. C. HISTÓRIA DAS
SOCIEDADES AMERICANAS. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1990.
44
FEITOSA, Antonio Cordeiro. O MARANHÃO PRIMITIVO: UMA TENTATIVA DE
RECONSTITUIÇÃO. São Luis: Augusta, 1983.
45
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A CORRIDA ENTRE OS ÍNDIOS CANELAS. REV. IHGM 36,
MARÇO 2011, p 128
FUNAI. JOGOS DOS POVOS INDÍGENAS. Disponível em
http://www.funai.gov.br/indios/jogos/novas_modalidades.htm#005
46
FRANÇA, Martha San Juan & GARCIA, Roberto. Os primeiros brasileiros. Superinteressante v. 3,
n. 4, p. 30-36, abril de 1989.
47
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A CORRIDA ENTRE OS ÍNDIOS CANELAS. REV. IHGM 36,
MARÇO 2011, p 128
48
PAULA RIBEIRO, Francisco de. MEMÓRIAS DOS SERTÕES MARANHENSES. São Paulo:
Siciliano, 2002
49
FRANKLIN, Adalberto: CARVALHO, João Renor F. de. Francisco De Paula Ribeiro – Desbravador
Dos Sertões De Pastos Bons: A Base Geográfica E Humana Do Sul Do Maranhão. Imperatriz: Ética,
2005
do lúdico e do movimento" - para usar uma expressão de Dieckert & Mehringer (1989b,
1994) 50 -, na cultura Jê, referindo-se à música e à dança:
"... enquanto as muitas mulheres guizam as comidas, dançam eles e cantam
ao som de buzinas, maracás e outros instrumentos... esta dança e música
noturna, melhor repetida depois da ceia, dura quase sempre até as cinco da
manhã..." (p. 39).
NIMUENDAJÚ, Curt. A corrida de toras dos timbira. Mana v.7 n.2 Rio de Janeiro oct. 2001
50
DIECKERT, Jurgen & MEHRINGER, Jakob. A CORRIDA DE TORAS NO SISTEMA CULTURAL
DOS ÍNDIOS BRASILEIROS CANELAS (RELATÓRIO DE PESQUISA PROVISÓRIO). Zeitgschift
Muncher Beltrdzur Vulkerkunde, julho, 1989.
DIECKERT, Jurgen & MEHRINGER, Jakob. Cultura do lúdico e do movimento dos índios Canelas.
REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, Campinas, v. 11, n. 1, p. 55-57, set. 1989.
DIECKERT, Jurgen & MEHRINGER, Jakob. . A corrida de toras no sistema cultural dos índios
brasileiros Canelas. Revista Brasileira de Ciências do Esporte - v.15 - n.2 - 1994
Os Jê são conhecidos no Maranhão com a denominação de "TIMBIRAS", e
dividem-se em dois ramos principais, segundo seu habitat - Timbiras do Mato e
Timbiras do Campo -, estes apelidados de canelas finas "pela delicadeza de suas pernas
e pela velocidade espantosa que desenvolvem na carreira pelos descampados",
conforme afirma Teodoro Sampaio (1912, apud CORREIA LIMA & AROSO, 1989, p.
41), confirmando Spix e Martius (1817, citados por CORREIA LIMA & AROSO,
1989, p.59) quando afirmam, sobre os Canelas, "... gaba-se a sua rapidez na corrida, na
qual igualariam a um cavalo.".
Os Timbira são um povo física, lingüística e culturalmente caracterizado como
da família Jê, que disperso, habitava o interior do Maranhão e partes limítrofes dos
Estados do Pará, Goiás e Piauí. Esse povo existe ainda parcialmente, compondo-se hoje
das seguintes tribos (NIMUENDAJÚ, 2001) 51:
Timbira orientais:
Timbira de Araparytiua
Kukóekamekra e Kr˜eyé de Bacabal
Kr˜eyé de Cajuapára
Kre/púmkateye
Pukópye e Kr˜ikateye
Gaviões
Apányekra (Canellas de Porquinhos)
Ramkókamekra (Canellas do Ponto)
Krahó
Timbira ocidentais:
Apinayé
Seus parentes mais próximos são os Kayapó do norte, os Suyá e os hoje extintos
Kayapó do sul.
Hoje, os Tremembé são um grupo étnico indígena que habita os limites do
município brasileiro de Itarema, no litoral do estado do Ceará, mais precisamente na
Área Indígena Tremembé de Almofala (Itarema), Terras Indígenas São José e Buriti
(Itapipoca), Córrego do João Pereira (Itarema e Acaraú) e Tremembé de Queimadas
(Acaraú). Originalmente nômades que viviam num território que estendia-se nas praias
entre Fortaleza e São Luís do Maranhão. Foram aldeados pelos Jesuítas no século XVII
nas missões de Tutoya (Tutóia-Maranhão) 52, Aldeia do Cajueiro (Almofala) e Soure
(Caucaia). Foram declarados como não existentes pelo então governador da Província
do Ceará (José Bento da Cunha Figueiredo Júnior), após decreto de 1863. Antes disto,
em 1854, os índios perderam o direito da terra pela regulamentação da Lei da Terra.
Estes ressurgem no cenário cearense nas décadas de 1980 e 1990, quando são
reconhecidos pela FUNAI. 53
51
NIMUENDAJÚ, Curt. A corrida de toras dos timbira. MANA v.7 n.2 Rio de Janeiro oct. 2001
52
VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. “BREVE DESCRIÇÃO DAS GRANDES RECREAÇÕES DO RIO
MUNI DO MARANHÃO, Pelo Padre João Tavares, da Companhia de Jesus, Missionário no dito
Estado, ano 1724”. REVISTA DO IHGM, No. 37, junho de 2011 – Edição Eletrônica, p 176-186
http://issuu.com/leovaz/docs/revista_ihgm_37_-_junho_2011
53 http://pt.wikipedia.org/wiki/Trememb%C3%A9s
No século XVII, a populaçõa indígena do Maranhão era formada por
aproximadamente 250.000 pessoas, pertencente a cerca de 30 etnias, a maioria delas,
hoje, não existindo mais:
“Povos indígenas como os Tupinambá que habitavam a cidade de São Luis,
os Barbados, os Amanajós, os Tremembé, os Araioses, os Kapiekrãs, entre
outros, foram simplesmente exterminados ou dissolvidos social e
culturalmente [...] São notórias as causas do desaparecimento de cerca de
20 povos indígenas no Maranhão: as guerras de expedição para escravizar,
as doenças importadas, a miscigenação forçada, a imposição de novos
modelos culturais, entre outras”. 54
54
Associação Carlos Ubbiali; Instututo Ekos. OS ÍNDIOS DO MARANHÃO. O MARANHÃO DOS
ÍNDIOS. São Luís: Associação Carlos Ubbiali, 2004, p. 2
LES FRANÇAIS AU BRÉSIL, LA RAVARDIÈRE ET
LA FRANCE ÉQUINOXIALE (1612 -1615)
55
Jean Mocquet, né dans les environs de Vienne en 1575, était un voyageur français qui
donna beaucoup de détails sur les sauvages et sur l'histoire naturelle de l'Amérique
méridionale...
apprendre, patatras, que le 14 mai 1610, Henri IV a été assassiné. Qui dirige la France ?
Il nous faut faire un retour en arrière.
Marie de Médicis
Pourtant, le 1er octobre 1610, Marie, au nom de son fils âgé de 9 ans, précise la
mission : fonder une colonie, dans un rayon de 50 lieues autour de Upaon Açu, la
grande île du Maranhào et y convertir lês indigènes ; La Ravardière, placé sous l'autorité
de l'Amiral de France, le duc de Montmorency Damville, en est le chef.
François de Razilly
La Ravardière traite du voyage et de la logistique ; s'associent à lui deux
catholiques : François de Razilly, Poitevin, bien en cour qui recrute lês participants et le
richissime banquier Harlay de Sancy responsable Du financement ; les trois hommes
sont bientôt nommés lieutenants généraux avec pouvoirs égaux.
Nicolas de Harlay
70 000 livres sont aisément trouvées malgré les réticences de la régente qui tarde
à décider. Elle obtient de Rome l'envoi de quatre missionnaires capucins, avouant ainsi
sa priorité aussitôt indiquée à La Ravardière qui devra revenir en France avec ses
coreligionnaires une fois la colonie établie. Les participants sont nombreux ; outre les
600 habituels migrants, la noblesse est largement représentée ; citons au hasard Henri de
Richelieu, frère de l'évêque de Luçon, Félisbert de Brichanteau, fils d'un amiral de
France, Louis de Pézieux, cousin du prince de Condé et du Roi, Claude et Isaac, frères
de François de Razilly... Il est à noter que tous ces gens affirment par écrit leur
solidarité et mettent en garde contre un ennemi non cité.
C'est à Cancale qu'en présence de l'amiral de Montmorency Damville se prépare
le départ dans une succession de festivités civiles et religieuses présidées par l'évêque de
Saint Malo ; deux vaisseaux, le "Régent" et la "Charlotte", une patache, la "Sainte
Anne", constituent la flotte.
Le 19 mars, tambours, trompettes et salves d'artillerie saluent l'appareillage mais
la tempête oblige la flotte à une courte escale en Angleterre à Dartmouth, Plymouth et
Falsmouth.. Le 26 juillet après 116 jours dans des conditions difficiles, vengeance de
Satan, disent les capucins,et une courte escale à Fernào de Noronha, les colons
découvrent ce qu'ils croient être le paradis terrestre.
C'est grâce aux témoignages de Claude d'Abbeville et Yves d'Evreux, deux
capucins, que nous connaissons les débuts de la colonisation.
Les bâtiments mouillés à Upaon Mirim, la petite île du Maranhào aussitôt
rebaptisée Sainte Anne, les cérémonies commencent, érection d'une croix, procession,
messe solennelle, "Te deum laudamus", "veni creator". Avant toute autre initiative, des
Vaux va s'assurer que les sentiments des caciques à notre égard n'ont pas changé trois
ans après son départ ; pleinement rassuré, il fait découvrir la "Grande Ile" à François de
Razilly qui organise la réception solennelle ; il faut en effet convaincre et impressionner
les "natives" dont 12000 vivent là regroupés en 27 villages ...
Le 6 août à l'aube, la flotte rallie la Grande Ile où commence un cérémonial
parfaitement orchestré ; une procession s'organise, capucins appelés prophètes par des
Indiens habillés de bleu pour la circonstance, nobles en armes puis colons ; tout ce
monde défile dans une ambiance à la fois festive et solennelle ; bien sûr, une croix est
plantée, un "te Deum" est entonnée, une grand messe suit où, pour impressionner les
indigènes, un voile vient cacher la consécration. Les salves d'artillerie tirées peu après
impressionnent fort les autochtones qui ne doutent plus de la puissance de la France. Un
somptueux déjeuner est servi chez Du Manoir dont quatre cents marins et deux
vaisseaux sont présents.
Rassuré, Harlay de Sancy rentre en France, laissant ses pouvoirs à François de
Razilly qui devient, en fait, le maître de la colonie. Il reste maintenant à se mettre au
travail.
Les deux lieutenants généraux restants se répartissent ainsi les tâches ; à La
Ravardière, La défense et l'organisation urbaine, à Razilly, les relations humaines, la
reconnaissance de pays et l'évangélisation des Indiens. Chaque étape est marquée par de
grandioses cérémonies. Les tupinambas participent avec enthousiasme à l'oeuvre
commune. Bientôt, um port peut accueillir les plus gros navires du temps ; sur un
éperon rocheux, là où se trouve aujourd'hui le palais du gouverneur, s'élève une
forteresse baptisée Saint Louis inexpugnable pour l'époque. Près d'une fontaine, une
chapelle de branchages est bientôt remplacée par le futur couvent Saint François. Des
magasins et dês logements permettent de vivre à l'abri en toute sécurité... Les
inaugurations solennelles ont lieu le jour de la Sainte Claire ou de l'Immaculée
Conception em présence d'indigènes toujours invités et toujours présents, sûrs de la
force de leurs nouveaux protecteurs ; eux, pour qui nous n'étions que dês commerçants,
découvrent que nous sommes aussi dês combattants et des croyants.
Tupinambas
François de Razilly, Claude d'Abbeville, accompagnés de Des Vaux fidèle
malgré une foi différente, parcourent inlassablement un pays acquis à leur cause. Japi
Açu, le cacique, est souvent présent ; on arrive, on palabre, on célèbre un office dans un
lieu de culte sommaire, on catéchise, on baptise et on marie ; seuls incidents, la mort du
père Arsène de Paris victime de fièvres et le discours d'un vieillard qui doute de nos
bonnes intentions. Mais, les coeurs sont déjà colonisés.
Il faut maintenant doter de lois la nouvelle colonie ; ce sera fait le 1er novembre,
jour de la Toussaint ; toujours cette volonté de lier le public au sacré.
A l'issue d'un somptueux défilé militaire suivi de salves d'artillerie et de
sonneries diverses, toute la population est rassemblée ; tous, nobles, colons et
Tupinambas sont revêtus de leurs plus beaux atours. Il leur est donné lecture dans les
deux langues d'un texte pompeusement appelé "lois fondamentales de la France
Equinoxiale". Il s'agit en fait de règles de comportement ainsi résumées : devoirs de
tous envers les capucins dont la mission de conversion est une priorité, discipline stricte
imposée aux Européens, respect dû aux Indiens et à leurs femmes notamment.
Cet enthousiasme de façade cache mal les soucis ; tous ont conscience de la
faiblesse dês moyens mis à leur disposition mais aussi d'une action subversive menée de
la cour contre l'action engagée. François de Razilly est chargé d'aller chercher à Paris
des renforts et de l'argent ; il será accompagné de Claude d'Abbeville afin de convaincre
d'autres missionnaires de se lancer dans l'aventure et de quelques Indiens témoins de
leur intégration. Pendant son absence, Le commandement sera exercé par La Ravardière
soumis à un conseil de tutelle ; au retour de Razilly, La Ravardière obéissant aux voeux
de la Régente, reviendra en France avec les autres protestants. on ne peut vraiment pas
dire que le lieutenant général soit placé dans les meilleures conditions.
Il en profite néanmoins pour faire reconnaître le pays par ses subordonnés sans
autre succès que le ralliement de tribus éparses ; hélas, les richesses de l'Eldorado ne
sont pas au rendez-vous. Lui-même, laissant le commandement à Louis de Pézieux se
lance dans une aventure amazonienne en milieu hostile quelque peu risquée. Une
inquiétante incursion portugaise contre les positions françaises motive son rappel mais
trois mois ont été perdus . Des mesures de défense s'imposent.
A Paris, Razilly est bien reçu; les Tupinambas exhibés devant le jeune Louis
XIII produisent le meilleur effet; les promesses sont nombreuses mais il faut se rendre à
l'évidence, il y a loin des paroles aux actes. Seul, Claude d'Abbeville obtient quelques
succès, douze missionnaires partiront, diriges hélas par un Ecossais rigide, Pembroke,
dont le comportement nuira à la colonie. Marie de Médicis promet certes vingt Mille
livres mais n'en remet que six mille aux seuls capucins; pour le reste, on verra plus tard.
D'Harlay de Sancy, on n'entend plus parler.
Jeronimo de Albuquerque
Philippe III ignore les lettres patentes délivrées par les rois de France, elles sont
sans objet, La Ravardière et les siens sont dês corsaires qu'il faut chasser du Maranhào ;
il charge de cette mission Le gouverneur du Brésil Gaspar de Souza ; tout juste consent-
il à quelques arrangements pour ne pas heurter la cour de France. La reconquête est
confiée à un métis, Jeronimo de Albuquerque, auquel est associé Diogo de Campos
Moreno qui a déjà combattu La Ravardière autrefois em Flandres . C'est à Campos
Moreno que nous devons la relation dês événements qui vont suivre.
Les deux hommes ont beaucoup de mal à organiser l'opération, les effectifs sont
faibles, les moyens navals dérisoires, les Indiens amis sont réticents , les atterrages du
Maranhào sont inconnus de leurs pilotes. Néanmoins, ils parviennent à proximité du
camp français qu'Albuquerque veut attaquer aussitôt, Capos Moreno le calme, lês
Portugais s'installent au fond d'une baie fermée nommée Guaxenduba, inaccessible à
marée basse et y construisent une fortification sommaire.
Les Français, sûrs de leur supériorité dans tous les domaines ne s'inquiètent pas.
Suivent une série de provocations réciproques et d'engagements mineurs à la suite
desquels les Portugais se trouvent bloqués au fond de leur trou sans aucun moyen d'en
réchapper ; le combat est inévitable.
Guaxenduba
Le 19 novembre, la flotte française, "le Régent" en tête, se présente devant
Guaxenduba ; La Ravardière a choisi de rester à bord avec deux compagnies de réserve
et de confier les forces débarquées, soit quatre compagnies renforcées par un millier de
Tupinambas, à Louis de Pézieux ; CE faisant, il ne peut ignorer que le jusant
l'empêchera d'intervenir ; en face, Albuquerque choisit de diviser ses forces en deux et
d'attaquer séparément le dispositif français.
Alors que tout se passe bien pour les Français, La Ravardière, chevalier du
moyen-âge égaré au XVIIème siècle, a l'idée aussi noble que saugrenue d'accorder à
l'ennemi une trêve de quatre heures pour capituler ; inconsciemment, Louis de Pézieux
met ses hommes au repos. Albuquerque et Campos Moreno n'en attendaient pas tant, ils
feignent de ne pas avoir compris l'ultimatum et attaquent les Français sans défense ; s'en
suit un désastre pour les troupes à terre, cent quinze Français dont trente nobles sont
tués ou noyés tandis que les Tupinambas prennent la fuite ; lês réserves françaises ne
peuvent intervenir pour pallier un "sauve qui peut" général ; les pertes portugaises sont
extrêmement faibles.
La situation des Français n'est cependant pas désespérée, ils restent maîtres de la
mer, leurs forces sont considérables face à un adversaire épuisé et toujours bloqué au
fond de son trou.
Après une période de tension et de reproches réciproques, les relations entre
belligérants s'humanisent ; des visites de courtoisie sont échangées, des repas sont
offerts ; conscients de leurs faiblesses, La Ravardière et Albuquerque ne veulent plus se
battre et négocient un armistice ; Campos Moreno y prend une part active.
Aux termes de cet accord, il est admis que les deux partis camperont sur leurs
positions et vivront en paix jusqu'en décembre 1615 ; La Ravardière a la faiblesse
d'accorder à son adversaire la libre circulation maritime, ce qui, compte-tenu des
distances à parcourir, le rend maître de la mer et l'autorise à recevoir des renforts. Pour
ce qui est de la possession du territoire, on s'en remet à La décision des deux couronnes,
Paris et Madrid, auprès de qui seront envoyés des émissaires.
Marie de Médicis qui retarde l'âge de l'accession au trône de Louis XIII ne réagit
pas ; à Madrid, Philippe III est furieux, il n'admet pas que l'appartenance du Maranhào à
la couronne espagnole soit remise en cause ; il désavoue l'accord conclu par
Albuquerque et ordonne au gouverneur du Brésil d'expulser les Français militairement ;
il admet cependant que quelques compensations soient accordées à La Ravardière et aux
siens ; la tâche est dévolue à Alexandre de Moura qui disposera à ces fins de moyens
considérables. Compte tenu des liens que le roi a noué avec la Régente de France, il
nous semble invraisemblable que celle-ci n'ait pas été informée par les três actifs
ambassadeurs d'Espagne à Paris..
La Ravardière qui dispose encore de moyens de défense conséquents est
moralement abandonné ; il n'a plus de bateaux, les missionnaires sont partis ; seuls deux
cents hommes et lês Indiens lui sont restés fidèles.
Dès le 1er juillet 1615, une première escadre portugaise aux ordres de Francisco
de Castelo Branco se presente devant Saint Louis ; des conversations s'engagent
courtoisement mais le Portugais en position de force exige certaines évacuations, la
Ravardière sans nouvelles de La métropole ne peut qu'obtempérer.
Le 31 octobre, Alexandre de Moura mouille à son tour au Maranhào ; avec l'aide
d'Albuquerque, il contraint La Ravardière à capituler ; le 4 novembre, le fort Saint Louis
est remis entre les mains du vainqueur qui n'a pas eu à tirer um seul coup d'escopette et
n'a fait aucune concession à des "pirates dirigés par un hérétique" ; il n'a accordé
aucune dês concessions admises par son roi ; tout juste a-t-il racheté les armes, les
matériels et les munitions.
La tour de Belem
La Ravardière et son ami des Vaux qui ont choisi de ne pas revenir en France de
crainte de représailles sont amenés à Pernambouc où ils sont correctement traités par le
gouverneur du Brésil puis à Lisbonne. Amoureux de "son" Maranhào, La Ravardière
propose ses services au roi d'Espagne qui, en raison de l'inflexibilité religieuse du
Français et des risques qu'il représente ne donne pás suite. Sous un prétexte futile , La
Ravardière et des Vaux sont enfermés à la tour de Belem où CE dernier meurt
d'épuisement.
Après quatre ans de captivité, et grâce aux interventions Du gouvernement de
Louis XIII, enfin Roi, et de sa soeur Elizabeth, le huguenot est autorisé à revenir en
France.
Sào Luis
Saint Louis rebaptisée Sào Luis, nous avons pu le constater, conserve une piété
filiale pour ces malheureux Français qui l'ont créée ; invité à y prononcer une
conférence, j'y ai été royalement reçu ; la ville, classée au patrimoine mondial de
l'Unesco, est riche de son passé ; développée par lês Portugais, elle est restée pourtant
fière de ses origines et affiche ses différences. Elle s'apprête à fêter son quatre centième
anniversaire.
Plusieurs historiens se sont passionnés pour le sujet ; en France citons les
missionnaires capucins, Claude d'Abbeville et Yves d'Evreux, Ferdinand Denis, Hélène
Clastres, Andréa Daher et bien sûr Léon Guérin et Charles de La Roncière.
Este ano a elite ludovicense (2) (prefeitura de São Luís, governo do Estado do
Maranhão e grupos econômicos que operam por aqui) celebrará os 400 anos da
“Fundação Francesa de São Luís”, um mito que surgiu em 1912, quando a capital
maranhense completou 300 anos.
O objetivo das festividades é envolver as populações maranhenses, que da janela
da casa, das telas de TV ou mesmo dos visores de telefones celulares assistirão a sonhos
e realidade desfilarem juntos e misturados, revelando uma grande oportunidade para se
discutir a cidade que, apesar do orgulho narcísico de suas elites, vive ao abandono e
desprezo delas mesmas. Essa imagem, a idéia da Fundação Francesa de São Luís,
ingressou oficialmente nas últimas décadas nos sistemas de ensino e hoje ocupa lugar
central da programação midiática local.
É amplamente aceito que para a elite exercer o seu domínio não lhe interessa o
esclarecimento das amplas massas populares, como por exemplo, sobre a relação entre
orçamento público e desenvolvimento humano. Ao contrário, nas questões norteadoras
da sociedade a confusão ou o “desentendimento” toma conta do “senso comum”. É o
caso deste tema que, nos parece, ainda não foi bem colocado para discussão, o que gera
muita confusão, alimentando várias opiniões discrepantes. Para uns a cidade de São
Luís teria sido fundada por portugueses, para outros por franceses, holandeses, nativos
indígenas e outros povos. Também há quem diga que agora isso pouco importa.
Mas qual é o caráter deste enunciado, uma imagem concebida no “mundo das
idéias” provincianas, mas que encontra abrigo na pós-modernidade?
Nosso objeto de análise não é propriamente a fundação da cidade de São Luís.
Tomando como pressuposto o domínio da elite ludovicense no campo das idéias sobre
as demais populações do Maranhão, nos interessa o “Enunciado Ludovicense” (3) da
fundação francesa de São Luís que, fundamentado em uma cerimônia religiosa,
apresenta-se em um contexto em que é retirado da reflexão seu conceito central:
fundação. Ora, a partir dos dicionários de língua portuguesa, por fundação entendemos
o ato de assentar os alicerces de um edifício; levantar os fundamentos de uma
construção. Ademais, para além da materialidade poder-se-ia admitir as intenções
manifestadas ou projetos revelados.
Embora não se considere a verdade como dogma, também não nos aventuramos
no horizonte aberto pela pós-modernidade onde não cabem verdades duradouras. E
trabalhando com a hipótese de que o que está em questão não é a “fundação de São
Luís”, mas o enunciado sobre este fato, nesse quadro obscuro e confuso - em que
mesmo aqueles que não se identificam com os interesses da elite reproduzem o discurso
em voga - conservamos como fio condutor a busca da verdade racional e objetiva, na
qualidade de uma necessidade especificamente humana pelo seu valor produtivo,
educativo, moral, estético e especialmente político.
Nosso problema é o Enunciado Ludovicense da Fundação Francesa de São Luís,
isto é, sua natureza. Objetivamos tirar o problema da confusão em que se encontra no
campo da ciência e da cultura e compreendê-lo em uma ampla perspectiva política. Com
isto pretendemos enquadrar essa problemática em bases racionais, ao alcance do
entendimento dos “simples mortais”, de modo a permitir àqueles que pretendam
contribuir para o debate que o façam claramente. A importância desta reflexão
corresponde à necessidade de se entender um discurso que envolve politicamente a
capital do Maranhão, um dos estados naturalmente mais ricos da federação brasileira,
mas que tem suas populações sobrevivendo como as mais pobres das Américas.
Sobre o mito
Embora superficialmente, aqui elencamos alguns aspectos do mito, necessários à
compreensão deste problema. Desde a filosofia clássica grega o termo mito vem sendo
criticado e rejeitado. Quando a história enquanto ciência positiva procurou encontrar as
bases fundamentais sobre as quais se sustenta irrefutavelmente um enunciado em geral
esse termo ganhou uma acepção correspondente a “fábula”, “invenção”, “ficção”.
Atualmente o mito de origem é aceito como era compreendido pelas sociedades
arcaicas, como designação de uma “história verdadeira”, exemplar e significativa – pelo
seu caráter sagrado. Ou seja, hoje há uma ponderação de que o mito de origem não
corresponde necessariamente a uma falsidade.
Considerando ser “difícil encontrar uma definição de mito que fosse aceite por
todos os eruditos e, ao mesmo tempo, acessível aos não especialistas” Mircea Eliade
(Mito e Realidade. São Paulo: Perspectiva, 2010) apresenta o mito como uma realidade
cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada através de
perspectivas múltiplas e complementares e o define da seguinte forma: “o mito conta
uma história sagrada; ele relata um acontecimento ocorrido no tempo primordial, o
tempo fabuloso do princípio”.
Situados no contexto sócio religioso, os mitos podem ser divididos em
cosmogônicos e de origem; narram uma criação, (origem) seja de uma realidade total –
o cosmo, ou apenas um fragmento, como por exemplo, uma ilha ou o próprio homem. O
modelo cosmogônico trata da criação do mundo como criação por excelência, e como
todo aparecimento ou criação implica a existência de um Mundo, o mito de origem
pressupõe e prolonga a cosmogonia. Sobre a estrutura e a função dos mitos, ela
apresenta preliminarmente cinco características. 1) Os protagonistas da narrativa
mitológica são Entes Sobrenaturais; 2) Por ser obra de Entes Sobrenaturais, o mito é
considerado uma história verdadeira; 3) O mito sempre se refere a uma “criação”,
contando ao homem como algo veio a existir, e por isso se constitui um paradigma para
as ações humanas significativas; 4) O mito não pode ser conhecido exteriormente,
abstratamente, mas apenas pelo ritual – que o justifica; 5) O mito impregna-se na
cultura pelo poder sagrado e exultante de eventos rememorados ou reatualizados.
No caso da “Fundação Francesa de São Luís” a historiadora encontra na própria
historiografia a não correspondência entre o enunciado e o fato histórico o que torna o
enunciado uma falsidade. Aqui, o que caracteriza o mito é o sentido atribuído à missa
três séculos depois da passagem dos franceses pelo Maranhão. É nesse sentido que a
ciência afirma que A “fundação francesa de São Luís” é um mito. Ou seja, neste caso se
emprega o vocábulo mito não com referência à Mitologia Tradicional, mas para
designar em termos científicos uma imagem falsa - o mito moderno, um discurso que
não se sustenta na Ciência nem na Mitologia Tradicional.
“O mito deve ser pensado aqui como mito moderno. É uma fala roubada e
restituída, que, ao ser trazida de volta, não se encontra mais no mesmo lugar, para
utilizar a formulação sintética de Roland Barthes, no Mitologias. O mito se coloca num
terreno ambíguo ‘nem verdadeiro nem falso’, ele simplesmente deforma, apresenta uma
nova significação” (Flávio Reis, jornal O Imparcial 08.09.2007). Então, se no escopo
epistemológico essa ideia não encontra respaldo, como mito de fundação ela continua
desamparada.
Considerações finais
Consideramos que o Enunciado Ludovicense da fundação francesa de São Luís é
apresentado ao “domínio público” em termos mitológicos e não nos termos de um
discurso lógico, factual. E a pretensão de seus promotores é de imprimir-lhe a força de
um mito, e não de um argumento lógico. Neste aspecto este enunciado é de natureza
mitológica. Entretanto, se por um lado já não se sustenta como argumento, por outro
não reúne as qualidades de um mito de origem, se revelando um mito moderno, e que
faz parte de um esforço “para fazer as imagens ultrapassarem a condição de meras
matérias-primas das aparências da vida”.
Sobre o carnaval, é mesmo uma festa que reúne fantasias, histórias, mitos e
lendas. Quanto ao ciclo de debates do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão, que prioriza a questão da fundação de São Luís, o que poderia ser uma
ocorrência esclarecedora como um amplo processo de debate pautado no princípio da
objetividade científica, uma vez que essa problemática foi (re)colocada na esfera da
mitologia, nos parece mais uma peça a serviço da negação do esclarecimento, pois o
lema impresso nos cartazes, folderes e peças publicitárias do IHGM vaticina: A cidade
do Maranhão – uma história de 400 anos.
Ora, a própria referência a São Luís como “a cidade do Maranhão” é a
representação da “ideologia da singularidade ludovicense” construída no século 19, mas
que ainda hoje confunde a mente de muita gente e contribui para manter a cidade de São
Luís diferenciada e distanciada das outras regiões do estado e do Brasil. E quando diz
“uma história de 400 anos” - embora admita outras “conclusões possíveis” - o IHGM já
deixa claro o partido que defende.
Conclui-se finalmente que a “fundação de São Luís” como fato histórico está
fora de questão, a contenda é outra. “O que importa é o que se diz”, ou seja, o problema
é o enunciado, o discurso. Um discurso de caráter mitológico. Entretanto, embora se
encontre desamparado no âmbito da mitologia tradicional, como mito moderno se
apresenta associado a uma ideologia (singularidade) local. E, pressupondo que nesta
combinação não há neutralidade e cada um desempenha suas funções interferindo em
vários aspectos importantes da realidade humana, conclui-se que seguir tal enunciado é
uma escolha política. E assim, para além do salutar aspecto teórico, adotar a missa como
mito de fundação ou adotar o mito moderno como versão histórica é uma escolha que
não se deve reduzir ao refinamento cultural de alguns “iluminados” que contemplam o
mundo com a pura luz da razão. Quanto à ideologia da singularidade ludovicense, que
pelo viés da cultura procura justificar o “isolamento” de São Luís, é outro problema.
São Luís, MA. Fevereiro de 2012.
Notas
Quem vai a Itapecuru Mirim, cerca de 110Km da capital, São Luís, não imagina a
importância deste lugar na história do nosso país e como ainda hoje outros locais como
Rio de Janeiro, por exemplo, têm relação com a “ribeira do Itapecuru”. Mesmo porque
sua história parece ter sido esquecida nos últimos 10 anos e a cultura abandonada.
As primeiras referências à povoação da região datam dos anos de desbravamento
para exploração das terras. Em 1768 os moradores pediram ao rei de Portugal
confirmação de vila que ali fora fundada anos antes por ordem régia, o que indica haver
história anterior a esta data.
Pouquíssimas pessoas sabem que em terras itapecuruenses viveu um príncipe
irlandês, patriarca de uma das famílias mais importantes do Maranhão. Lancellot
(Lourenço) Belford chegou ao Maranhão no ano de 1736 e por votla dos anos de 1738
ou 1739 casa-se com Isabel de Andrade Ewerton, filha do capitão (norte americano)
Guilherme Ewerton, rico proprietário de lavouras na região de Cajapió, baixada
maranhense.
Lourenço Belfort nasceu em Dublin, Irlanda, em 05 de Julho de 1708, foi batizado
na paróquia da vila de Michans, arcebispado de Dublin, como comprovam sua certidão
de batismo e de cristão velho. Descende de uma antiquíssima família de nobres
irlandeses, os Berford, família de origem no nobre Geoffry Berford que viveu em 1190.
Sua saída da Irlanda está ligada á perseguição religiosa e ao confisco de terras em
determinada época por problemas sociais daquele país.
De espírito aventureiro Lourenço Belfort sobe o rio Itapecuru à procura de lugar
para se estabelecer. No sítio escolhido para tal objetivo funda um engenho ao qual deu o
nome do castelo de seus ancestrais na Irlanda, Kilrue. O engenho prosperou com o
plantio, colheita e industrialização dos frutos da terra com maior destaque para o arroz e
algodão.
Lourenço envia pedido de reconhecimento de sua ancestralidade nobre de origem
irlandesa e em 20 de Julho de 1758 D. José I, rei de Portugal, concede a este o Hábito
da Ordem de Cristo 1. Em 21 de Junho de 1761, na igreja de N. S. da Conceição de
Lisboa, foi armado Cavaleiro da Ordem de Cristo, neste mesmo dia, na igreja de N. S.
da Luz tendo professado e recebido o hábito.
“Ao muito illustre e Reverendíssimo Senhor Doutor Joam Rodrigo Covette,
Acipreste da Igreja Cathedral do Maranhão, Comissário da Bulla da
Cruzada Vigário Geral do Temporal e Spiritual, Juiz dos Cazamentos e
Justificaçõens e Habelitaçõens de geração, e das Capellas e Riziduios no
Bispado do Maranham, pelo Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor Dom
Frey Antonio de Sam Jozé da Ordem de Santo Agostinho, Bispo do Mesmo
Bispado, do Conselho de Sua Magestade Fidelíssima.Frey Thomaz de
Burgo, da Ordem dos Pregadores, Mestre na Sagrada Theologia,
Protonotario Apostólico por Graça de Deus e da Santa Sé Apostólica, Bispo
de Osoria, Sofraganio do Illustrísssimo e Reverendíssimo Dom Ricardo
Limeollo Arcebispo de Dublim, Primaz da Ibernia, deseja muita saúde ao
sobre dito.
“Receby as letras requisitórias de vossa Senhoria Reverendíssima a
respeito da inquirição do Senhor Lancellote Belfort, e dos seos ascendentes,
e sobre os quisitos della com toda a diligencia tomei todas as informações
necessárias, e oportunas assim por testemunhas, como por notários
públicos desta Província aonde reina a ejrezia, por cuja razão
nãomandamos os actos originaes,. Pois se deve dar mais credito, os que das
ditas inquiriçõens dissemos nos Dom´nios, e Estados Catholicos pela nossa
fé, do que a tudo o que contem a letra, a inquirição que tomamos.Porem vos
attestamos nós Arcebispo e Bispo sobredito, e vos damos sem duvida ffe de
que pellos documentos autênticos, nos consta claramente.Primo; quue o
referido Senhor Lancellote Belfort, que agora vive no Maranham, he filho
legítimo do Senhor Ricardo Belfort, e da Senhora Izabel Lowther ambos
Catholicos Romanos, os quais tivera este filho de leggítimo matrimonio que
contrahirão, que foi baptizado na Parochia da Cidade de Sam Micama do
Arcebispado de Dublim em sinco de Julho de mil settecentos e oito. –
Segundo, que o dito Ricardo nasceo em Castello Ricardo no Condado
Midensi junto do Quilrã Castello eludial da família Belforts, pertencente a
mesma. ha muitos secolos, e sua mulher Izabel Lowther nasceo em
Onnisfrilenam Capital da Provoação do Condado de Ferinacanni, ambos
baptizados solennemente.Terceiro, que referidos Pais do dito Lancellote
morrerão no Grêmio da Santa Madre Igreja Catholica com todos os
Sacramentos, e se sepultarão na Parochia de Santa Maria de Moleidard
junto a Metropole de Dublim. – Quarto, que os Avos do dito Lancellote,
Pais de Ricardo et setra, forão João, que nasceo no referido Castello
Kilerânne, e sua nmulher a Senhora Catharina Barneval, filha do Senhor
Patricio Barneval Cavaleiro Ilustre do ditto Condado Midensi, os quais
todos forão christaons baptizados e catholicos Romanos.Quinto, que o
sobredito Lancellote Belfort, tanto pela parte Paterna como Materna, he
aparentado com os principaes do Reino Biscondes, et setra, Baroens et
setra que se omittem por evitar prolixidade. – Sesto, que o Sobredito por
seus Pais e Avos he Christão velho, Catholico Romano, sem raça de infecta
nação Judaica, e para que se de inteira ffe as presentes letras, e a esta
Attestação, como que fosse aos proprios documentos, que se juntão, de que
esta se extrahe; se extrahe seo mesmo dos referidos documentos de minha
própria mão a estrahy dellas, e seley com o meu sello, e asistencia do
referido e Illustrissimo Arcebispo; dada em Kalibannia a outo de Dezembro
de mil sete centos e sincoenta e nove. Frey Thomaz da Ordem dos
Pregadores, Bispo Osiriensse.”
Lourenço Belfort morreu em Lisboa no final do ano de 1777 quando ali se
encontrava de passagem, por lá foi sepultado. Deixou testamento e seus herdeiros, não
menos importantes figuras na província do Maranhão deram continuidade ao seu
lagado. Podemos, para citar alguns, destacar dentre seus descendentes magistrados,
barões, nobres e ricos proprietários de terras.
No local onde fundou seu engenho hoje há uma pequena povoação que
conservou o nome “kelru”, aportuguesamento da denominação do castelo de onde se
origina a família Belfort (ou Belford, em irlandês). Em outro sítio da mesma
propriedade Lourenço mandou construir uma capela em homenagem a Saint Patrick,
onde, segundo Edmundo Murrey (2006), houve a primeira manifestação do Saint
Patrick’s Day de que se tem registro no Brasil, no dia 17 de Março de 1770. A tal capela
já não mais existe, mas uma pequena povoação com o nome de São Patrício de Kelru
preserva a memória da história ímpar da região.
Ainda hoje os Belfords irlandeses buscam assegurar o direito às propriedades
que lhes foram tiradas pela política de confisco da coroa britânica, que tomou as terras
dos antigos clãs gaélicos e hiberno-norman dandos aos colonos provenientes da
Inglaterra. Isto causou um choque social, criando uma calsse dirigente protestante que
acabou por depor a antiga calsse dominante católica.
Há registro de suas posses na região de Kylrue em documentos irlandeses
datados desde o ano de 1563, mas um detalhado genealógico feito pelo Journal of the
Meath Archaeological and Historical Society atesta sua presença no baronato de
Ratoath desde o século 12.
“O primeiro senhor feodal que tomou o nome de Belford, ou Berford em
irlandês, era originário da Normandia príncipe e duque que sendo coronel
foi alferes mor (porte oriflamme) de Henri II, Rei da Inglaterra, a quem
acompanhou a Irlanda onde, em 1171, foi criado conde de Belfort e Lord de
Tarah. Investido de um dos antigos principados irlandeses, que sob a forma
de condado feodal foi successivamente passando aos seus descendentes,
todos condes e lords, coube de direito a todos elles a hereditariedade do
título de príncipe, deixando de ser transmissível o título de duque por ter
continuado o seu domínio féodal a ser sempre mantido sob forma de
condado, ou por ser elle duque como chefe militar, título que então trazião os
generaes chefe de exército». Há em nossos arquivos alguns documentos
referentes à Família Belfort, que foram registrados no Consulado do Brasil,
em Paris, a 15 de Setembro de 1910, provando sua origem Real no século XI
- e que, pelos Reis de Portugal descende diretamente de Roberto “O
Devoto”, Rei de França, e de Affonso VI, Rei de Leão e Castela; e pelo
primeiro Senhor feudal de Belford, Príncipe e duque, descende de Guilherme,
duque da Normandia, posteriormente Rei da Inglaterra.” (BARATA, 2001).
“O último irlandês conde e príncipe de Belfort, de direito, segundo alguns
pesquisadores, foi Lancelot Belfort [bat. 05.07.1708, Dublin, Irlanda -
Lisboa], que deixou testamento feito em São Luiz do Maranhão, a 15 de
março de 1775. E data incerta, retirou se para Portugal, de onde emigrou
para o Brasil, fixando se na Capitania do Maranhão, onde foi Almotacel em
1744, 1750 e 1754; Vereador de 1753 e 1759 e Juiz de Fora interino. Fundou
na margem esquerda do rio Itapicuru uma importante Fazenda, denominada
“Kylrue” nome da propriedade feudal de seus antepassados, na Irlanda.”
(BARATA, 2001)
1. Ordem de Cristo é uma ordem religiosa e militar, criada a 14 de Março de 1319 pela Bula Papal Ad
ea ex-quibus de João XXII, que, deste modo, acedia ao pedidos do rei Dom Dinis. Recebeu o nome de
Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo e foi herdeira das propriedades e privilégios da Ordem do
Templo.
FONTES:
COSTA, John Wilson da. “A Casa dos Belfort no Brasil” in Revista do instituto
Heráldico e Genealógico, nº 9, 1942.
COUTINHO, Milson 2005. Fidalgos e Barões. Uma história da nobiliarquia luso-
maranhense. São Luís. pp. 137-139.
GALLWEY, Hubert 1979. The Berfords of Kilrue. Ríocht Na Midhe, Vol. VI, 4, 89-115
JIM BYRNE, Philip Coleman and Jason King (eds.), Ireland and the Americas:
Culture, Politics and History (Santa Barbara, CA: ABC-CLIO, forthcoming 2006).
MARSHALL, Oliver, Brazil in British and Irish Archives (Oxford: Centre for Brazilian
Studies, University of Oxford, 2002)
VON ALLENDORFER, Frederic. 'An Irish Regiment in Brazil 1826-1828' in The Irish
Sword Vol. 3 (1957-1958), pp. 28-31.
A FUNDAÇÃO MÍTICA DE SÃO LUÍS
56
Descoberta e Invenção do Brasil, publicado no Jornal da Tarde de 16/04/2000.
MITO, IDEOLOGIA, SONHO E O ENIGMA DOS 400
ANOS.
ALEXANDRE FERNANDES CORRÊA E
ADRIANA CAJADO COSTA
Com a aproximação da efeméride dos 400 anos da cidade de São Luís, o que
temos a dizer sobre os mitos? O mito é uma fala histórica, como adiantou Roland
Barthes. E nesse momento oportuno nada mais fecundo do que invocar algumas
reflexões sobre o trabalho de recuperação do mito na modernidade. O mito tanto remete
a uma fala histórico-cultural, como também a fala do mundo psíquico individual.
Veremos mais a frente que uma estrutura analítica mais pessoal, não nega homologia
com os processos de análise sociocultural. De certa forma, podemos dizer que há muita
semelhança entre o trabalho da Psicanálise e o da Culturanálise e Mitanálise; operam
escavações arqueológicas do inconsciente social e psíquico, sob os mesmos regimes de
escuta, pontuação, interpretação etc. Por isso, afirmamos que é um grave erro a leitura
do mito como discurso falso, enunciado mentiroso. Trata-se de uma resistência
epistemológica reativa; remetendo-nos a um cientificismo obscurantista e retrógrado.
O diálogo entre Logos e Mythos ecoando desde a Antiguidade Clássica já passou
por viradas importantes, em diversas revoluções epistêmicas do século XX. A crise do
cartesianismo e do positivismo já vem de longa dada e hoje já entramos num novo
estágio de conceituação da Mitologia. Contudo ainda encontramos sobreviventes do
velho paradigma, resistentes na visão já anacrônica do mito como discurso falso e
enganador. São recalcitrantes presos a um racionalismo do século XIX, que contagiou
espíritos da envergadura de um Karl Marx, por exemplo. Como se sabe, o jovem Marx
chegou a considerar a noção de ideologia de um ponto de vista negativo: como ilusão,
falsa representação, falsa consciência. Na verdade podemos dizer que os que têm o mito
como discurso mentiroso, o identificam com a noção de ideologia; no jargão do jovem
Marx da Ideologia Alemã (1846). Mas os que se apegam a definição platônica do mito,
também se vinculam aos pré-freudianos, os mesmos que ainda consideram o sonho
como material psíquico sem importância; um disparate insignificante.
Só depois de Freud o sonho passou a ser considerado material relevante para a
análise psicológica. Da mesma forma, só depois da revolução epistemológica realizada
no século XX, pelos revisores do próprio marxismo, passou-se a considerar a ideologia
de um ponto vista positivo, e não mais negativo. Encontramos em Louis Althusser um
dos grandes teóricos dessa virada filosófica e conceitual. Desde então, ideologia deixou
de ser definida como sonho e ilusão, para ser considerada um sistema de representações
articulando valores e ideias dominantes, em qualquer sociedade. “A ideologia é eterna,
como o sonho”, escreveu Althusser. E parafraseando o filósofo francês, também
podemos dizer que o mito é eterno.
E no intuito de solapar de vez as resistências ao estudo positivo do mito,
recolhemos algumas citações significativas de alguns mestres da alta modernidade. E
começamos com Edgar Morin: “O mito não é uma mentira, pois é verdadeiro para quem
vive e é uma forma espontânea do homem situar-se no mundo, elevá-lo a outra esfera,
ao transcendente, oferecendo valores absolutos e paradigmas às atividades humanas,
ocupando-se de tudo o que suscita a interrogação, a curiosidade, a necessidade e a
aspiração” (1986, p. 150). Nessa mesma linha de raciocínio, lembramos de Mircea
Eliade, ao constatar que “o mito é uma realidade cultural complexa, que pode ser
abordada e interpretada em perspectivas múltiplas e complementares... Conta uma
história sagrada, relata um acontecimento que teve lugar no tempo primordial, o tempo
fabuloso dos começos” (2000, p. 12). Afinal, é ao mito que cabe preservar a verdadeira
história, a história da condição humana; falando de realidades e do modo como elas
passaram a existir. Conhecer os mitos é aprender o segredo da origem das coisas. Por
outras palavras, “aprende-se não só como as coisas passaram a existir, mas também
onde as encontrar e como fazê-las ressurgir quando elas desaparecem” (p. 19).
Azoubel Neto comenta: “A psicanálise redescobriu o mito, retomou o seu estudo
e fê-lo através de um método de trabalho próprio, um método que constitui em si um
processo de resgate. Localizou a presença do mito como uma condição real, atuante e
atual no inconsciente” (1993, p. 15). E retomando Eliade: "É por isso que o inconsciente
apresenta a estrutura de uma mitologia privada. Podemos ir ainda mais longe e afirmar
não só que o inconsciente é ‘mitológico’, mas também que alguns dos seus conteúdos
estão carregados de valores cósmicos, isto é, que eles refletem as modalidades, os
processos e o destino da vida e da matéria viva. Podemos até dizer que o único contato
real do homem moderno com a sacralidade cósmica se efetua através do inconsciente,
quer se trate dos seus sonhos e da sua vida imaginária, quer das criações que surgem do
inconsciente (poesia, jogos, espetáculos, etc.)" (2000, p. 68-69).
Jacques Lacan afirma que a função do mito é a de liberar as pessoas de uma
pergunta que dizima os seus melhores... “querendo responder ao que se apresenta como
enigma, quer dizer, àquilo que se presume ser sustentado por esse ser ambíguo que é a
esfinge, onde se encarna, falando propriamente, uma dupla disposição por ser feita, tal
como o semi-dizer, de dois semi-corpos” (1992, p. 113). O mesmo autor reitera que este
progresso do imaginário ao simbólico constitui uma organização do imaginário em
mito, ou, pelo menos, está a caminho de uma construção mítica verdadeira, isto é,
coletiva, e nos lembra disso por todos os lados, a ponto mesmo de evocar para nós os
sistemas de parentesco (1995, p. 273).
É quando nos aproximamos de Lévi-Strauss (1985): “A substância do mito não
se encontra nem no estilo, nem no modo de narração, nem em sintaxe, mas na história
que é relatada. O mito é linguagem, mas uma linguagem que tem lugar em um nível
muito elevado, e aonde o sentido chega, se é lícito dizer, a decolar do fundamento
lingüístico sobre o qual começou rolando” (p. 242). Enfim: “o mito se desenvolverá
como em espiral” (1958/1985, p. 265).
Considerando todas essas referências mestras, acusar o propalado enunciado de
fundação francesa de São Luís do Maranhão de exercício espúrio de mitomania
interessada ou alienada, é perpetuar o véu do obscurantismo: afinal, que nome teria essa
cidade? Os que tentam resolver de modo simplório o dilema do drama sociocultural
subjacente a essa configuração mitológica no campo simbólico, apenas encobrem com
inconsequente irresponsabilidade algo que submerge nessas falsificações e mistificações
pseudo-esclarecedoras. Subjacente a estas incompreensões e confusões está o debate
sobre o reconhecimento das identificações recalcadas e não resolvidas, pois encobertas e
disfarçadas neuroticamente. Acusar de mitomania os que se alinham a fraconfilia, é
querer falsificar a ciência sob o manto da verdade historiográfica - recurso último da
propaganda lusófila -, da qual não se tem garantia alguma de carta fundacional mais
legitima ou mais verdadeira. Para solucionar esse enigma é preciso superar os
obstáculos que ainda obnubilam a mente dos que se dizem críticos. Em suma, mito não
é mentira, ideologia não é ilusão e sonho não é um disparate! Parafraseando o grande
poeta portenho Jorge Luis Borges: só na lenda, começou São Luís!
SÃO LUÍS, REI DE FRANÇA
Pensatempos.
Mia Couto
57
Uma análise mais especifica desse aspecto, ver o texto O labirinto dos significantes na cultura barroca
(Corrêa, 2009).
última potência; como prometem os organizadores oficias do grande evento, já
designado de bigfesta. No fenômeno da festa, como se sabe, há a motivação buscada do
prazer; o ensejo lúdico, proporcionando a fuga do ‘horror ao vazio’. É a eficácia do
artifício político de fazer prender e submeter todos à magia admoestadora do brilho e da
glória do poder. Como escreveu João Francisco Lisboa, sobre a Festa de N. S. dos
Remédios; ilustrando nossa tese:
Um dos maiores benefícios que dispensa a Virgem com sua festa (...) é este
prazer universal, tantas classes confundidas, tantas dores adormecidas,
tantos escravos deslembrados de seus ferros. Inda mal, que é tudo tão
fugaz! Não importa, é um momento de repouso nesta lida que só tem a
morte por termo, é um conforto para recomeçar-se com mais vigor a tarefa
do dia seguinte. Mil ferventes e gratas orações à compassiva e
misericordiosa Virgem (1992, p. 61).
Para nós, nos limites dessa crônica, esse modelo de festividade, ou festival, segue
a linha temporal da festa maior da nossa história colonial, qual seja o Triunfo
Eucarístico de 1733, ocorrida em Vila Rica. Nela aglutinam-se, numa só imagem
coletiva: a) as desinências culturais do sagrado e do profano, escrevendo uma primeira
metáfora do êxito sociológico da miscigenação e do sincretismo místico, alimentada até
hoje - azeitando a máquina comemorativa -, com pujança tropical e dionisíaca; e, b) a
resistência das classes dominadas contra a coerção de uma estrutura hierarquizada,
desigual e historicamente perversa, consolidada na sociedade brasileira, e
permanecendo ainda inalterada em diversos torrões. E no torrão maranhense esse
processo se dá de forma extraordinariamente semelhante e persistente 58.
A consagração festiva do Triunfo Eucarístico premonitório nos tem preparado
para entender a contradição brasileira e em especial suas aberrações e incongruências
regionais e locais. Além de servir para compreender a festa brasileira, e os fenômenos
ligados à antiestrutura e ao excesso, como processos vinculados à gênese e à
transformação de nossa cultura e de seus agentes sociais. Ajuda também a apreender a
lição moderna de liberdade e interação que ainda nos é presentificada pelo espetáculo
cíclico do Carnaval, modelo de alegria eufórica programada, agendada, ritualizada e
cada vez mais frugal, nos prometendo um estado permanente de festa e efervescência
coletiva, como bálsamo fugaz em meio a tantos infortúnios.
58
Utilizamos o termo torrão no sentido de torrão natal (homeland), terra natal, empregado pelo geógrafo
maranhense Raimundo Lopes que aos 17 anos de idade publicou livro famoso no Maranhão, O Torrão
Maranhense. Obra que hoje compõe publicação reeditada conhecida como Uma Região Tropical (Lopes,
1970). A expressão adquiriu grande repercussão no imaginário regional, surgindo recorrentemente em
toadas de bumba-boi e em diversas canções e poemas populares e eruditos. Em breve, vamos desenvolver
estudos sobre possíveis paralelos literários entre o torrão natal (homeland) dos poetas brasileiros e a
waste land (tierra baldia) do poeta T. S. Eliot (1888-1965). Sobre a obra Waste Land de Eliot, ver as
análises do antropólogo mexicano Roger Bartra, em Culturas Liquidas (2008).
PROJETO FRANÇA EQUINOCIAL:A TENTATIVA
FRANCESA DE COLONIZAÇÃO DO MARANHÃO
NO SÉCULO XVII
EUGES SILVA DE LIMA
http://ihgm1.blogspot.com.br/2012/09/projeto-franca-
equinocial_8244.html?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed:+InstitutoH
istricoEGeogrficoDoMaranho-
ihgm+(INSTITUTO+HIST%C3%93RICO+E+GEOGR%C3%81FICO+DO+MARANH%C3%83O-IHGM)
A presença francesa no norte do Brasil no século XVII deve ser entendida dentro
do contexto das disputas franco lusitanas. Num primeiro momento, meramente restrito à
concorrência da indústria extrativa do pau Brasil e outros gêneros tropicais, para depois
se tornar projeto de colonização com vistas a um estabelecimento permanente. Embora
de iniciativa particular, o projeto de colonização francesa em terras do Maranhão contou
com a chancela real.
Na medida em que a colonização portuguesa foi se tornando mais efetiva ao longo
do litoral brasileiro, os franceses foram sistematicamente avançando em direção ao
norte, as incursões francesas à costa do Brasil no decorrer dos séculos XVI e XVII,
ocorreram no sentido sul/norte. Observe que as invasões gaulesas iniciaram-se no Rio
de Janeiro em 1555 e culminaram no Maranhão em 1615.
Isso se deve principalmente em razão da união ibérica, em 1580. A exigência
espanhola era que a ocupação e colonização do Brasil se desse em direção ao norte, ao
contrário do que estava acontecendo até então (sentido sul). A intenção espanhola era
proteger suas minas localizadas na região do Peru, de possíveis invasões estrangeiras.
Maranhão e o Amazonas constituíam portas de entradas para essas regiões
mineradoras. É nesse sentido que a colonização portuguesa pós união peninsular
coincidiu com o banimento dos franceses dessas regiões mais localizadas ao norte. O
Maranhão passou a ser alvo dos franceses, na medida em que constituía ainda uma das
poucas áreas restante do litoral brasileiro livre da ação portuguesa.
François de Razilly
Embora o nome de Daniel de la Touche, Senhor de la Ravardière seja
comumente evocado como o principal líder da expedição francesa às terras
maranhenses, é necessário, contudo, ressaltar a imprescindível participação de François
de Razilly nos preparativos e administração dessa empresa, não só em termos religiosos
como sugeriu o capuchinho francês Claude d’Abbeville, mas principalmente no que diz
respeito à articulação para reunir recursos para o bom andamento dos negócios. O
projeto: França Equinocial era uma empresa cuja liderança era dividida entre Razilly e
La Ravardière, sendo que em momento algum, o Senhor de Razilly assumira papel
secundário. Se La Ravardière assume posição de liderança principal nos acontecimentos
finais de 1614 a 1615 no Maranhão, isso se deu, certamente devido à ausência de
Razilly que se encontrava na França.
Se por um lado, não podemos negar a intenção francesa em fundar uma colônia
em plagas do Maranhão, por outro lado, os três anos e quatro meses que aqui
permaneceram os franceses não foi tempo suficiente para que eles se consolidassem, no
sentido de estabelecerem uma colônia propriamente dita ou até mesmo uma cidade. A
chamada França Equinocial não conseguiu criar raízes, o projeto francês ainda estava
em andamento quando da chegada dos portugueses.
A experiência francesa no norte do Brasil, em todos os seus aspectos, não
chegou a se consolidar enquanto modelo de colonização típica do século XVII, as
relações entre metrópole e colônia durante 1612 a 1615 não foram tão regulares assim,
aponto de se estabelecerem ali os fundamentos necessários que envolviam as relações
metrópole e colônia, típicas do sistema colonial. Portanto, mais pertinente seria
entendermos essa ocupação dos gauleses no Maranhão, como uma tentativa de
colonização que foi frustrada pela vinda dos portugueses e não fundação de algo no
Maranhão, seja uma colônia, seja uma cidade.
Na aventura francesa do Maranhão seiscentista, os indígenas eram peças chave
nos métodos de cooptação dos brancos. As alianças entre mairs (franceses) e
Tupinambás demonstram uma relação com o “outro” feita com base em negociações
comerciais, ao mesmo tempo em que também se constituía uma política para se
viabilizarem em terras da América.
Sem o apoio das tribos Tupinambás do Maranhão, dificilmente os franceses
tinham condições de se estabelecerem por estas terras. Os “Papagaios Amarelos”, como
eles eram chamados pelos indígenas, tinha tanta consciência disso que procuram
estabelecer leis que protegessem os índios, pois sabiam que o sucesso da empresa,
dependia, do bom relacionamento entre os europeus, mas principalmente da relação
amistosa entre franceses e nativos.
DO MARANHÃO
CICLO DE ESTUDOS/DEBATES
A CIDADE DO MARANHÃO –
UMA HISTÓRIA DE 400 ANOS
2011 – 2012
SEMINÁRIO 4 – SÃO LUÍS FOI FUNDADA POR FRANCESES
EXPOSIÇÃO
FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE
CURADORIA:
ANTONIO NOBERTO; CLORES HOLANDA; JOANA BITTENCOURT
29 de agosto de 2012
PALÁCIO CRISTO REI – 08:00 ÀS 12:00 HORAS
SEMINÁRIO 4 – SÃO LUÍS FOI FUNDADA POR FRANCESES
08:00 – Abertura
09:30 – Debatedor(es)
INTRODUÇÃO:
O presente artigo é uma síntese da Conferência Magna proferida no Ciclo de
Estudos/Debates promovidos pelo Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão
intitulado “A CIDADE DO MARANHÃO – UMA HISTÓRIA DE 400 ANOS.
Registra-se o mais sincero agradecimento pelo honroso convite.
Põe-se, assim, de maneira sintética o assunto que tem nos ocupado como pesquisa
e que possibilitou a publicação do livro “O PRÉ-CONSTITUCIONALISMO NA
AMÉRICA”, pela Editora Método de São Paulo.
Trata das normas concebidas e escritas pelos franceses quando da fundação da
França Equinocial e que completarão 400 anos de publicação no dia 1º de novembro de
59
JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA - Doutor em Direito do Estado - Direito Constitucional pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Recife, da
Universidade Federal de Pernambuco - Menção Distinção. Professor do Curso de Mestrado em Direito da
Universidade Federal do Maranhão; Professor Adjunto IV do Departamento de Direito da Universidade
Federal do Maranhão. Subprocurador Geral do Estado do Maranhão, tendo sido o primeiro Procurador
Geral de carreira É membro efetivo da Academia Maranhense de Letras Jurídicas; Membro do Instituto
Brasileiro de Direito Constitucional.; Membro do Instituto Maranhense de Direito Eleitoral. Foi membro
do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão, por dois biênios, na classe de jurista. É autor de: "O PRÉ-
CONSTITUCIONALISMO NA AMÉRICA", obra individual pela Editora Método: SP; "Pré-
Constitucionalismo na América: Uma abordagem acerca das manifestações constitucionais nas terras do
Maranhão no Século XVII". EDICEUMA: MA;CONSTITUIÇÃO: ENTRE O CONTRATADO E O
DESEJADO": Letras Contemporâneas: Florianópolis; "CONSTITUIÇÃO: SENTIMENTO E
CONSCIÊNCIA". Saraiva: SP. É articulista de vários jornais Conferencista em eventos internacionais e
nacionais.
http://www.facebook.com/joseclaudio.pavaosantana # http://claudiopavao.blogspot.com.br/
2012. Saber de sua densidade jurídica e valor constituinte é o objetivo, a fim de se
identificar o contributo ao constitucionalismo americano.
O CONSTITUCIONALISMO:
O Constitucionalismo é concebido como o fenômeno histórico que estuda o
aparecimento do Estado Constitucional. Muitas são suas perspectivas de abordagens que
ora o concebe como movimento revolucionário, ideológico, político, sociológico etc. Os
autores tem reservado ao final do século XVIII o marco fundamental desse período de
rompimento com os fundamentos do estado absolutista monárquico. Em verdade o
Estado inicial, mais do que constitucional, é o Estado Legal, de bases racionalista que
transpõe o teologismo existente.
De fato, sejam manuais propedêuticos, sejam tratados de densidade notória,
enfim, a literatura constitucional converge para esse cenário, sinalizando com a
Constituição Americana e os demais documentos que lhe antecedem, como sendo a
primeira manifestação efetiva constitucional do continente americano.
A riqueza da literatura sobre o assunto tem registrado como principais
documentos históricos a “Magna Charta Libertatum” (1215-1225), a “Petition of
Rights” (1628), o “Habeas Corpus Amendment Act” (1679), o “Bill of Rights” (1688).
A Declaração de Mayflower (1620), a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia
(1776), a Declaração de Independência dos Estados Unidos, A Constituição Americana
(1787) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) constituem o
conjunto de documentos formais que dão força emblemática ao assunto.
Como, nem sempre, a história é infensa ao subjetivismo do seu narrador que
muita vez se seduz por circunstâncias pautadas por conveniências (ou conivências) o
registro de alguns fatos passam a ter dimensão capitular e, eventualmente, sendo
reservado a acontecimentos significativos para a história a clausura de uma nota de
rodapé.
Isto estimulou-nos a iniciar a pesquisa sob uma perspectiva até então inédita:
apreciar as Leis Fundamentais do Maranhão sob uma ótica-histórico-jurídica.
O PRÉ-CONSTITUCIONALISMO:
A ideia de pré-constitucionalismo nasce da necessidade de buscar o valor
constituinte das Leis Fundamentais do Maranhão.
Não se pode pretender que com os critérios formais do Século XVIII seja dada
dimensão constituinte às leis concebidas e escritas no Maranhão. É preciso buscar “a
Constituição como uma realidade orgânica cuja presença independe de um dado
momento histórico, sendo, aqui, úteis as ideias de constituição natural e consituição
intitucional...”60 Por isso a ideia de estabelecer a noção de um período anterior ao
chamado constitucionalismo:
“Sendo assim, e retomando o estudo histórico com base na técnica de
divisão dos acontecimentos em Idades, é lícito afirmar que o pré-
constitucionalismo, embora se situe na Idade Moderna (a exemplo do
60
SANTANA, José Cláudio Pavão, O rpé-constitucionalismo na América, São Paulo: Método, 2012, p.
72.
constitucionalismo visto sob a perspectiva jurídica), com ele não se
confunde, pois reúne as manifestações que antecedem 17 de setembro de
1787.”61
Pré-constitucional, assim, é todo o período associado ao chamado Estado de
Direito, na realidade Estado Legal, eis que a discussão democrática só mais tarde porá
na berlinda a verdadeira dimensão do que é Estado de Direito.
É necessário registrar que o que há de mais remoto concebido no continente
americano é precisamente a Carta Colonial da Virgínia (1606), mas que chegou a
continente por obra e graça da côrte, portanto, sendo escrita na Europa.
Mas, ainda, no continente americano, merece registro a Declaração do
“Mayflower”, estabelecendo bases principiológicas para construção de um Estado de
Direito que data de 1620.
É quando entra em cena a reunião de dois elementos fundamentais para a pesquisa
desenvolvida, e que mudam o panorama do que tem sido ensinado no estudo do Direito
Constitucional até aqui.
O CENÁRIO:
O mundo do século XVII era aquele mapeado pela Igreja Católica. O Tratado das
Tordesilhas já o havia dividido entre Portugal e Espanha, fato que se faz atribuir a
Francisco I de França indagar sobre o testamento de Adão nesse sentido. O Brasil havia
sido descoberto, conquanto sua exploração por piratas e corsários persistisse, dado ao
completo desinteresse pela colonização desta terra.
O Maranhão fora alvo dessa exploração. Aqui já estivera o capitão Riffaut (1594)
que, por infortúnio, deixou inúmeros franceses em terras brasileiras, dentre os quais o
Sr. Des Vaux, principal responsável pelos relatos entusiasmados a Sua Majestade
Henrique, O Grande, cuja prudência enviou Daniel de La Touche para verificação e
constatação da narrativa.
Aqui passou seis meses, retornando,após, à França, onde se deparou com a morte
do magnânimo rei. Só em 1611, já no reinado de Luis XIII e da Rainha Regente, sua
mãe, Maria de Medicis, foi possível o empreendimento de fundar aqui uma colônia, o
que contou com a sociedade do Sr. de Rasilly e do Barão de Sansy (D’ABEVILLE:
1975, pág. 23).
Somente em 1612 veio a se concretizar o empreendimento, tendo como marco a
fundação de São Luís no dia 8 de setembro.
Discussões à parte acerca da fundação da cidade o que importa destacar é a
contribuição normativa (legislativa, modernamente) institucional elaborada em terras
maranhenses, fato que, por si mesmo, singulariza o acontecimento de tantas conquistas
anteriores, quando as normas eram escritas e entregues aos conquistadores empreiteiros
da realeza. É esta circunstância singular que nos interessa aqui.
61
IDEM, p. 54.
Sucede que esse documento, seguindo a prática da época, foi introduzido no
continente americano como originário daA determinação de constituir uma colônia e o
propósito de catequizar seus habitantes revela-se em diversos momentos do
empreendimentos, tendo como marco inicial o compromisso assumido em Cancale dias
antes da partida “de observar o que for necessário ao bem da colônia” (D’ABEVILLE:
1975, pág. 27).
Mas o fato nodal da história de formação constitucional reside precisamente na
concepção, redação e publicização em terras americanas das Leis Fundamentais do
Maranhão.
Elas davam força formalizante ao simbolismo da cruz plantada em terras
maranhenses, que para o franceses implicava na configuração da posse das terras,
seguida dos rituais das procissões e estandartes, diferenciando-os dos rituais ingleses,
espanhóis e holandeses de conquista da Nova Terra (SEED:1999, pág. 19).
A necessidade de legitimação encontra nas Leis Fundamentais (1 o./11/1612) a
criação de autoridade baseada na característica de então, uma sucessão de normas
voltadas a Deus, ao Rei e aos franceses. Para PIANZOLA (1992, pág. 163) “espécie de
constituição implicitamente destinada, a bem da verdade, unicamente aos franceses...”.
Em verdade é impróprio imaginar-se uma norma constitutiva aqui unidirecional,
pois ao se tratar de fenômeno relacional (a norma) encerra uma ideia de bipolaridade,
implicando, sim, em normas direcionadas tantos aos franceses quanto aos índios que
habitavam as terras do Maranhão. É nesse sentido, aliás, que tem simbologia o discurso
do Sr. Des Vaux respondido por Japi-açu “principal de Juniparã e de toda a
ilha...”(D’ABEVILLE: 1975, pág. 84). Eis, aí, o pacto firmado que se vai concretizar
nas Leis Fundamentais do Maranhão.
As bases institucionais das normas guardam, certamente, conotação eclesiástica
como fruto do Estado da época, fundado no teocentrismo absoluto, mas revelam
preocupações que bem mais tarde restaram assentadas em disposições constitucionais
expressas, inclusive a atual Constituição da República de 1988.
Atento à brevidade do texto merecem destaque disposições como:
“Ordenamos que o autor de qualquer homicídio, a menos de perpetrado
comprovadamente em legítima defesa, seja punido de morte para exemplo;
Ordenamos que quem quer que seja, convencido de falso testemunho contra
quem quer que seja, sofra a pena que caberia ao acusado;
Ordenamos que quem que se encontre furtando seja, da primeira vez,
acoitado ao pé da fôrca, ao som da corneta, e sirva durante a um ano nas
obras públicas, com perda, nesse espaço de tempo, de tôdas as dignidades,
salários e proveitos; da segunda vez seja o infrator enforcado. Em se
tratando de criado domestico seja já no primeiro roubo enforcado”.
O conjunto de disposições transcritas se não é suficiente para identificar nas Leis
Fundamentais do Maranhão uma Constituição, com base nos elementos edificados pelo
liberalismo, certamente importa, para a época em estudo, uma conotação institucional
das leis, dantes só vistas na “Magna Charta” de João Sem Terra.
A instituição das bases religiosas, seguidas pelas disposições atinentes à honra do
Rei dão a composição fundamental das leis consignadas no seu próprio nome, alem de
contar com a convergência de vontades formalizadas no pacto contido na cláusula final
das normas, a saber:
“As presentes leis e ordenações acima transcritas foram lidas e tornadas
públicas, de modo a que ninguém alegue ignorância, neste dia de Todos os
Santos, 1o de novembro de 1612...
Transcritas no arquivo Geral do Estado e Colônia Francesa no Brasil as Leis
Fundamentais do Maranhão possuem precedência cronológica em relação a todas as
normas escritas no continente americano que tenham por propósito a constituição de um
estado. Nem mesmo a Declaração de “Mayflower” (1620) a antecede.
“Sob o aspecto formal, as Leis Fundamentais do Maranhão são um
documento único, de modo escrito, obediente aos preceitos estruturais da
espécie normativa, vale dizer, atende às características que identificam as
Leis Fundamentais existentes na Idade Média, que mais tarde foram
resgatadas pelo sistema real do século XVII.”62
A natureza constituinte das Leis Fundamentais guarda, ainda, uma particularidade
que ratifica este entendimento sobre sua natureza precursora: Foram escritas em solo
maranhense, portanto, a exemplo da Declaração de “Mayflower”, é obra escrita na
América, mas com a singularidade de preceder-lhe e a todas as demais manifestações
formais da espécie.
Portanto, quer sob o aspecto geográfico, dado que foram escritas no continente
americano, quer sob o aspecto cronológico, pois antecedem os documentos como a
Declaração de “Mayflower” (1620) quer sob o aspecto geográfico, pois escritas aqui, no
que diferem da Carta Colonial da Virgínia (1606), escritas na Europa, as Leis
Fundamentais do Maranhão podem ser consideradas as primeiras manifestações
constitucionais, pois “...orgânico-constitutiva escrita com natureza fundamental no
continente Americano do sil que se tem notícia, vocacionada à instituição de uma
sociedade politicamente organizada.” 63.
Finalmente, e para menção e identificação de preceitos hoje constates em
Constituições modernas, pode-se sintetizar que as Leis Fundamentais do Maranhão
possuem: Cláusulas de origem e fundamento, cláusula de incidência, cláusula de
salvaguarda, cláusula da companhia e da sociedade, cláusulas de proteção dos índios e
cláusulas do sistema de penas.
Colhidas à miúde, pode-se constatar a presença de normas que hoje estão
presentes no ordenamento constitucional pátrio e que são normas sobre o meio-
ambiente, normas penais, e, sobremodo, sobre a dignidade da pessoa humana.
CONCLUSÃO:
De certo que se exigir a composição formal de uma Constituição com critérios só
mais tarde concebidos pelos revolucionários americanos seria impor à história um
método estanque de conhecimento, circunstância inapropriada para quem observa,
reflete e escreve a história dos homens.
Ainda quando se não possa concordar com o argumento, ainda assim, é plausível
compreender que os franceses ofertaram contribuição significativa ao estudo do Direito
62
IDEM, p. 81.
63
IDEM, p. 35.
Constitucional, uma vez ser possível compreender, que houve na história o pré-
constitucionalismo, como tal compreendido o estudo da formação do Estado
Constitucional em época anterior ao século XVIII.
A organização da colônia, a proteção da propriedade, da liberdade e da
integridade física dos índios, através do estabelecimento de normas jurídicas cujas
consequências iniciavam pela declaração de desobediência do sossego público
chegando até a pena de morte - aplicáveis, inclusive, aos franceses -, revela a natureza
institucional e orgânica das Leis Fundamentais, que seriam, como foram, adotadas
como princípios fundamentais à organização do estado constitucional.
Assim sendo, em que pese a “imperfeição” utilizada àquela época, além de regras
de conteúdo iminentemente teológico - até porque a catequização era objetivo
indissociável da colonização - vemos com muita ênfase as normas penais destacadas,
como forma de garantir, sobretudo em relação aos índios, os direitos de liberdade e
propriedade. Portanto, não observamos a presença de norma afirmativa de direito como
as declarações emergentes do séculos XVIII, mas constatamos a previsão de direitos a
partir da advertência a uma conduta firmada em critérios substancialmente morais. E a
noção de ordenamento jurídico é que nos permite chegar a tal conclusão.
Desse modo, a preocupação em dispor de um elemento normativo que
estabelecesse um relacionamento social e jurídico na colônia e político com a coroa,
além de dimensionar um constitucionalismo primário, por assim dizer, merece destaque
pelo pioneirismo no continente americano. Portanto, sem que se possa negar a natureza
da Declaração da Virgínia como documento que estabelece direitos atendendo aos
critérios do constitucionalismo moderno, do mesmo modo reconhece-se que as Leis
Fundamentais representam a primeira e mais autêntica manifestação constitucionalista
no continente americano, pois produzida em terras maranhenses e para serem aqui
aplicadas.
Portanto, concluímos por entender que as normas instituídas nas terras do
Maranhão, ainda carentes da feição constitucional presente na Declaração de Virgínia,
quer sob sua ótica formal ou material, dispõem de conteúdo jurídico-político suficiente
para afirmar que as Leis Fundamentais podem ser consideradas a primeira manifestação
do que, por prudência, resolvemos chamar de pré-constitucionalismo no continente
americano.
Mais do que uma praça e um forte que dá nome à cidade, mais do quem uma
história e lendas que permeiam suas ruas, mais do que uma cruz e seus estandartes, os
franceses, pioneiramente, firmaram nesta terra valores e princípios que mais tarde
seriam resgatados pelo constitucionalismo moderno e que ainda hoje permeiam os
textos constitucionais. Quisera tivessem deixado o sentimento de obediência e zelo,
desvinculados do personalismo que vulnera insensivelmente a Lei Fundamental atual.
BIBLOGRAFIA:
D’ABBEVILLE, Claude, História da missão dos padres capuchinhos na ilha do
Maranhão e terras circunvizinhas. São Paulo: Ed. Da Universidade de São Paulo, 1975.
DOUGLAS, William O., Uma carta viva de direitos. São Paulo: IBRASA, 1976.
PIANZOLA, Maurice, Os papagaios amarelos – Os franceses na conquista do Brasil.
São Luís: Alhambra, 1992.
SANTANA, José Cláudio Pavão, O Pré-constitucionalismo na América, Coleção
Gilmar Mendes, 14.. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Editora Método, 2010.
SANTANA, José Cláudio Pavão, Eram os franceses corsários? Ensaio veiculado na
página http://claudiopavao.blogspot.com.br/[ acesso em 10 de setembro de 2012].
SANTANA, José Cláudio Pavão, Maranhão tinha constituição em 1612, Jorna; O
Imparcial, 15 de junho 2008, p 7.
SANTANA, José Cláudio Pavão, Pré-constitucionalismo na América: Uma abordagem
acerca de manifestações constitucionais nas terras do Maranhão do século XVII. São
Luís: Ediceuma, 1997.
SEED, Patrícia, Cerimônias de posse na conquista européia do novo mundo. São Paulo:
UNESP, 1999.
SWARTZ, Bernard, Os grandes direito da humanidade. Rio de Janeiro: Forense, 1979.
WILLIAMS, William Carlos, En la raiz de América. Madrid: Turner Fondo de Cultura
Econômica, 2002.
A FUNDAÇÃO DE SÃO LUÍS
E O DNA DA CONTESTAÇÃO
ANTONIO NOBERTO64
Discurso proferido no Ciclo de estudos e debates “A cidade do Maranhão: uma história
de 400 anos”, promovido pelo Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM
em agosto de 2012 por ocasião das comemorações dos quatrocentos anos de São Luís.
64
Antonio Noberto é turismólogo, pesquisador, escritor, consultor em turismo, Representante
regional da ANPRF, Sócio-efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM e
membro do Conselho diretor da Aliança Francesa de São Luís.
oriundos deste legado à cidade e ao estado. Mas, como de praxe, ainda não aprendemos
a valorizar da melhor forma aquilo que realmente nos interessa, uma das razões do
nosso secular atraso.
Falar sobre fundação de São Luís não é algo tão fácil. As dificuldades que
permeiam o assunto, por sua vez, são muito mais por envolver amores, ódios e paixões.
Acredito que as falas apresentadas neste Ciclo de estudos e debates ajudarão a balizar
posicionamentos sobre o assunto, mas ninguém se engane pensando que deste evento
sairá uma palavra final que porá termo à discussão. Os ânimos sempre estão acirrados
entre as partes. Existe um patrulhamento ostensivo, principalmente por parte daqueles
que contestam a fundação de São Luís. Entendo, por outro lado, que é preciso um
posicionamento oficial por parte deste Instituto. Do contrário, não existiria razão para
realizá-lo.
Ouvi, desde criança, que não se deve discutir futebol, política e religião. Meu
engajamento e participação ativa neste assunto me avalizam concluir pelo acréscimo de
mais este item: a fundação de São Luís, pois sempre “dá muito pano para a manga”. Às
vezes mais parece um Vasco x Flamengo, um GRENAL (Grêmio x Internacional), um
PT x PSDB, catolicismo x protestantismo ou ainda INRI Cristo x Padre Quevedo.
Observa-se, no entanto, uma imperial necessidade de continuarmos mostrando as raízes
históricas da nossa capital e o real valor da França Equinocial e do título de “única
capital brasileira fundada pelos franceses”. Enquanto alguns, por motivações que
mostraremos neste estudo, sempre tentaram esconder de maranhenses e brasileiros o
belo legado gaulês, eu e muitos outros pesquisadores maranhenses, nacionais e
estrangeiros nos dedicamos a mostrar as maravilhas da Nova França no Maranhão.
Outra razão é o recorrente desencontro de informações sobre este tema e a tentativa de
alguns em desacreditar e diminuir o legado francês neste torrão. Outros tentam
confundir o leitor / interlocutor usando a estratégia de misturar fundação com
colonização. Recentemente um dos suplementos de um importante diário ludovicense,
não se sabe por qual razão, dominado pela crítica infundada aos franceses, fez uma
tremenda confusão na sua apresentação. Deixou a entender que os franceses iniciaram
um holocausto em São Luís. Um total desconhecimento da história da cidade e do
estado. Na verdade, são muitos os desencontros de informação neste tema. Entre os
próprios maranhenses percebemos uma carência de aprofundamento, vez que, por
exemplo, ainda hoje muitos ainda chamam a ocupação francesa na Ilha Grande de
invasão, o que é um erro primário, pois os gauleses já a ocupavam, com anuência e
parceria dos tupinambás desde o final dos anos mil e quinhentos. A França Equinocial
foi a ocupação oficial do lugar. E quem entre na casa de alguém convidado jamais
poderá ser chamado de invasor.
Neste pequeno estudo buscaremos analisar o que foi e como se deu a fundação de
São Luís pelos franceses em 1612. Mostraremos o que caracterizava de fato a fundação
de uma cidade em tempos tão primitivos, que dispensava aparatos mais adiantados,
comparando-a com a fundação de algumas das principais cidades do Brasil daquele
período. E analisaremos o DNA da contestação da fundação de São Luís, para isto,
aproximando a lupa a fim de vermos o detalhe e os reais motivos das querelas que
permeiam o assunto. Ao final, abordaremos o que São Luís ganha com o título de
“única capital brasileira fundada pelos franceses” e o que perde com a semeadura do
antigalicismo. Talvez consigamos mostrar ao leitor os motivos que levam algumas
pessoas a nutrirem ódio aos franceses, que só fizeram o bem quando aqui estiveram, e a
louvarem aqueles que por séculos, enraizaram o privilégio branco (tão presente nos
nossos dias), escravizaram a magia africana e dizimaram a indolência indígena.
Neste trabalho lançaremos mão de parte de alguns artigos já publicados na mídia
local e regional, como o texto o Quadricentenário de São Luís: Fundação francesa e
oportunidades.
Com a aproximação do evento das comemorações do quadricentenário da capital
do Estado. Especula-se muito. Vemos e ouvimos de tudo: críticas, polêmicas,
contestações, politização do evento, manifestações, atrasos, cobras e lagartos. Quase
tudo contra a gestão pública nas três esferas de poder. E que pena que muito do que é
falado realmente procede. Não precisava ser assim! Tudo bem que não somos um
Canadá da vida, que iniciou seus preparativos dos quatro séculos com quase uma década
de antecedência. Tivemos muito tempo para começar a trabalhar, mas não o fizemos.
Deixamos tudo para a última hora, como sempre. Mas o mal maior talvez seja a
tentativa de alguns de politizar o evento, vez que o quarto centenário cai em ano
eleitoral. E o que era para ser um jogo de frescobol, onde um arredonda a bola para o
outro, tornou-se um desafio de tênis, um dificultando a vida do outro. O que todos
torcemos é que uma oportunidade tão grande para São Luís e para a população não seja
totalmente esvaziada por interesses pessoais e político-partidários. Por outro lado, não
se pode esquecer que nem tudo está perdido e estagnado, existe a mobilização de alguns
que estão correndo atrás e, com isto, muitas ações deverão acontecer neste ano de 2012
e 2013. E é procurando visualizar mais as oportunidades que as dificuldades, mesmo em
meio aos desentendimentos, contestação e outras mazelas, que São Luís caminha para
ser a mais nova integrante do grupo de cidades quadricentenárias das Américas. É senso
comum, por sua vez, que dificuldades assim quase sempre antecedem grandes eventos
similares.
O Brasil, no evento comemorativo dos 500 anos, também não conseguiu fugir de
polêmicas. Na década de noventa, alguns dos principais líderes políticos de quatro
estados da Federação iniciaram querelas em torno do descobrimento. A aproximação do
mega-evento dos quinhentos anos foi o combustível para o desencadeamento de uma
grande peleja, briga de gente grande. O jogo de interesses político-econômicos teve de
um lado, o então governador de Pernambuco, Miguel Arraes, defendendo que Vicente
Pinzón chegou ao Cabo de Santo Agostinho em janeiro de 1500, quatro meses, portanto,
antes de Pedro Álvares Cabral. Tasso Jereissati pediu vênia e defendeu que o Cabo onde
Pizón arribou não era outro senão o do Mucuripe, no Ceará. O senador e ex-presidente
José Sarney se adiantou e reivindicou a passagem do navegador Duarte Pacheco Pereira,
em 1498, no litoral oeste do Maranhão – entre Guimarães e a foz do Gurupi. Outro
poderoso do cenário político, o senador paraense Jader Barbalho, alegou que Pacheco
teria aportado no litoral de lá, entre o rio Gurupi e a terra dos Caetés – hoje Bragança.
Em meio ao puxa pra cá, estica pra lá, o homem forte do governo FHC, o baiano
Antonio Carlos Magalhães, ciente de que a precedência do descobrimento vai muito
além de algo romântico ou novelesco por envolver grandes interesses políticos e
econômicos, impulsionado pelo trade turístico da terra de Jorge Amado, bateu o pé e
sentenciou: “Tais polêmicas são desnecessárias, pois o que importa é que Cabral é o
descobridor oficial porque foi o primeiro que aportou aqui para esse fim, autorizado
pela coroa portuguesa”. O papo estava encerrado e a Bahia promoveu sem mais
problemas o grande evento do descobrimento – exceto, todos lembram, a réplica da nau,
não navegou. O Canadá, em 2008, no evento dos 400 anos, também precisou transpor
seus obstáculos e polêmicas antes da grande festa. Mas ao final todo esforço valeu a
pena.
Não bastassem problemas políticos, também se observam polêmicas semelhantes
a esta que antecedeu as comemorações dos quinhentos anos do descobrimento do Brasil,
que tentam arrefecer os ânimos comemorativos e as iniciativas programadas. E uma
destas polêmicas gira em torno da fundação francesa de São Luís, sob o argumento de
que o evento protagonizado pelos franceses quatro séculos atrás não caracterizaria bem
uma fundação. E é por entendermos justamente o contrário que nos debruçamos sobre
esta curiosa e importante temática, que sempre ocupa espaço nos diários são-luisenses.
O leitor que nos acompanha sabe que sempre defendemos, com propriedade e
riqueza de informação, a França Equinocial e a fundação francesa de São Luís, por
compreender terem sido acontecimentos dos mais valorosos do Brasil colonial e uma
das maiores oportunidades atuais de geração de emprego e renda aos maranhenses
através da maior indústria econômica mundial, o turismo. A convivência harmoniosa e
sustentável entre franceses e nativos à época foi um grande legado para os nossos dias e
uma contundente afirmação de que é possível conciliar diferenças e caminhar de mãos
dadas rumo ao progresso e ao desenvolvimento. Tudo isto soaria como uma visão
ingênua e sonhadora não fosse isso o que a história tem registrado desde os períodos
mais remotos. Os franceses, históricos aliados dos maranhenses, sempre estiveram
presentes participando e construindo os capítulos mais destacados da história do estado.
Foi assim na proto-história, na fundação, no século do luxo (séc. XIX) e nos dias atuais
como maior demanda estrangeira, que consome a oferta turística do estado e, com isso,
com sua moeda forte, mantém muitos dos empregos gerados pelo setor. O interessante é
que tudo isto se dá sem a disponibilização de políticas públicas a este fluxo francês.
Este é o momento ideal para revisionarmos esta injustiça.
Os franceses no Maranhão, comandados pelo General La Ravardière, foram além
das fundações brasileiras da época. O historiador Jerônimo de Viveiros cita na sua mais
importante obra História do comércio do Maranhão (LITHOGRAF. São Luís, 1992.
P.3) que os franceses na Ilha Grande construíram em pedra. O fato é comprovado no
“Depoimento dos prisioneiros franceses em Guaxenduba” prestado em novembro de
1614 a Jerônimo de Albuquerque no Forte de Santa Maria. A Biblioteca Nacional do
Rio de Janeiro conserva uma cópia destes depoimentos. Os originais estão na Espanha.
Edificaram a princípio em madeira, palha e barro e, dois anos depois, iniciaram a
reconstrução em pedra, foi assim com o Counvent Saint-François (Convento São
Francisco), atual Capela dos Navegantes (núcleo inicial da Igreja e Convento Santo
Antonio), primeiro convento capuchinho do Brasil, e o Fort de Caillou (pronuncia-se
caiú), e quer dizer “Forte de Pedra”, que deu origem ao termo “Caur” e hoje se chama
Caúra, em São José de Ribamar. Calhau é outro termo originário da palavra francesa
caillou. O dinheiro para a edificação em pedra do Convento no Maranhão foi doado
pelo Cardeal François de Joyeuse, o mesmo que batizou Luís XIII e coroou Maria de
Médici. Alicerces e paredes foram levantados em pedra, mas não foi concluído, vez que
os conflitos de novembro de 1614, a famosa Batalha de Guaxenduba, absorveram os
trabalhadores franceses. O forte ficou apenas cheio os alicerces.
Outras considerações também não podem ser omitidas. A capital da França
Equinocial tem o nome do Rei da França e está localizada até hoje no mesmo lugar onde
foi fundada por escolha de Daniel de La Touche. Fossem os portugueses, tudo seria uma
incógnita, ninguém poderia dizer onde e como seria. Não dá para imaginar a capital
maranhense com outro nome: São Felipe, Dom Manuel ou Nazaré. Ou ainda, fundada
onde hoje está Cururupu, Alcântara, Tutóia, Guimarães, para não falar nas áreas mais
interioranas (Portugal planejou no início da colonização transferir a capital maranhense
para as imediações de Rosário e Bacabeira, como forma de garantir mais proteção à
cidade e seus habitantes de possíveis invasões). Faltaram recursos materiais.
A reivindicação da fundação da cidade de São Luís pelos franceses, ao contrário
do que equivocadamente é apregoado, não foi obra de maranhenses e historiadores do
século passado, pois já constava em literaturas coloniais. O cronista luxemburguês
Felipe Bettendorf, habituado à pomposidade européia, não arriscou dar o crédito total
aos franceses na fundação de São Luís, disse apenas que os franceses começaram a
fundação.
“Mas se perguntarmos, e buscarmos quem foi o primeiro que descobriu,
povoou a Ilha do Maranhão, fazendo nela casa-forte, e edificando moradas
para soldados, acharemos que foram os franceses, como manifestamente se
prova e convence do nome S. Luís, Rei da França, com que apelidaram
primeiro a cidade do Maranhão, que também começaram a fundar65”.
(grifo nosso)
Já aclimatado à realidade brasileira, celebrou uma missa no interior do Pará em
uma frágil capela de pindoba. A celebração passou para a história como o marco da
fundação de Santarém e ele se tornou o fundador da cidade paraense. Outro jesuíta, o
padre José de Moraes, sempre habituado aos paradigmas brasileiros, muito conhecedor
da realidade e dos fundamentos das possessões portuguesas, publicou em 1759 uma das
mais importantes obras do Brasil colonial. Nela, por diversas vezes, ele relata que os
franceses haviam fundado São Luís. De onde transcrevemos uma dessas muitas citações
que diz que os capuchinhos franceses participaram ativamente da construção de São
Luís e
“... acabaram aquela pequena e ainda pobre cidade a que deram o nome de
São Luís do Maranhão, lembrados de um tão grande santo, que duas vezes
tinha enobrecido o ilustríssimo nome da nação francesa” 66.
Moraes faz outras referências à cidade francesa 67. E nos fala que os portugueses
apenas a “fundaram em melhor forma”, vez que os franceses já a estabeleceram em
forma de cidadela (compreendendo todo o espaço da atual Praça Pedro II – Capitania
dos Portos, Banco do Brasil, Tribunal de Justiça, João Goulart, Hotel Central, Igreja da
Sé, Cine Rox, Grand São Luís Hotel, Prefeitura, etc. Tudo isto cercado por um fosso e
uma paliçada), com todos os aparatos, critérios e ofícios necessários à uma cidade à
época. Vale lembrar que o atual Palácio dos leões era apenas o núcleo do Forte São
Luís. Foi assim que muitos destes mesmos franceses fizeram no Canadá, quando
fundaram a Acádia, tendo Issac de Razilly se tornado governador (1632).
Mais adiante, abordaremos a fundação de importantes cidades brasileiras e
faremos a comparação com a fundação de São Luís. Salvador (cidade-fortaleza), Rio de
Janeiro (acampamento militar), Belém (frágil fortaleza de pau-a-pique), etc. A maioria
delas não possuíam Câmara, e nem aparatos de cidades, eram apenas fortalezas de pau-
a-pique.
65
BETTENDORF, João Filipe. Crônicas da missão dos padres da Companhia de Jesus no
Estado do Maranhão. 1ª Ed. – Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2010. P. 5.
66
Moraes, José de. História da Companhia de Jesus na extinta província do Maranhão e Pará.
Alhambra. 1987. Rio de Janeiro. P. 41.
67
Ibid, PP. 42, 53, 57.
A FUNDAÇÃO DA FRANÇA EQUINOCIAL E DE SÃO LUÍS
A permanência dos franceses na Ilha Grande é algo conhecido pela maioria dos
ludovicenses e muito mais por vocês que aqui se encontram, creio. Por isso a
descreverei de forma sucinta.
Foi em uma reunião entre a rainha regente Maria de Médici com a alta cúpula
francesa, nobres e generais, no então Palácio do Louvre, hoje museu, em Paris, que foi
decidido o estabelecimento da França Equinocial, com sede na Ilha Grande do
Maranhão. Esta reunião selou também o núcleo fundacional de São Luís, pois foi ali
que se concluiu a idéia de “construção de um forte” (atual Palácio dos Leões) e, junto a
ele, “um porto” (Praia Grande / Rampa Campos Melo), além de um convento para os
religiosos capuchinhos (Atual igreja e seminário Santo Antonio).
Aqui chegados, em harmonia com os naturais da terra, trataram de fundar a
sonhada colônia, tendo como sede São Luís. O dia 08 de setembro foi a data
comemorativa da conquista pelos sucessos e trabalhos investidos. Contaram com a
ajuda dos eternos aliados tupinambás, que trabalhavam entusiasmados no
estabelecimento da empresa. Alteraram o espaço físico natural e construíram moradias,
várias capelas (sendo duas “junto ao forte”), uma escola, o primeiro convento
capuchinho do Brasil, prédios públicos, quatro fortes, aí incluído o Forte São Luís – em
forma de cidadela cercada por uma paliçada, onde hoje se encontra a Praça Pedro II –,
serraria, estaleiro e uma serralheria. Trouxeram toda sorte de profissionais necessários
ao sucesso de uma colônia e de uma cidade, sendo soldados, pedreiros, serradores,
agricultores, carpinteiros, construtores navais, dentre outros, e também profissionais
ligados às ciências: dois astrólogos, e à moda: artesãos, fiadores, tecelões, costureiros e
sapateiros. A determinação da rainha de que aqui só deveria ser pregada uma única
religião, as Leis fundamentais decretadas na Ilha do Maranhão, primeiro conjunto de
leis elaborado nas Américas, e a habilidade do general Daniel de La Touche foram
determinantes para a regulação da boa convivência neste torrão.
O complexo edificado pelos gauleses na Ilha Grande, por mais incipiente que
possam nos parecer – principalmente se comparado com a pomposidade das grandes
cidades de hoje, repletas de prédios, shoppings e com milhões de habitantes – atendia as
“exigências” de uma cidade para época.
Os padres capuchinhos de Saint-Honoré, Claude Abbeville e Yves d’Evreux,
mostram o respeito mutuo e a boa convivência no Maranhão entre franceses e
tupinambás. Os padres jesuítas foram pródigos em narrar o caráter pacífico da
colonização francesa no Maranhão. E centenas de outros pesquisadores, historiadores e
escritores se dedicaram em resgatar o importante evento simbiótico que foi a França
Equinocial. E foi esse exemplo de boa convivência que fez com que maranhenses e
franceses nunca se esquecessem deste primeiro capítulo da nossa história.
68
LISBOA. Frei Cristovão de. História dos animais e árvores do Maranhão. 3. ed. São Luís:
Alumar, 1998. (Documentos maranhenses, 2). p. 65.
FUNDAÇÃO DE VILAS E CIDADES NO MUNDO PORTUGUES: inexistência
de normatização
Criticar os fundamentos iniciais das cidades estabelecidas nos dois primeiros
séculos do Brasil colonial – seja ela de fundação francesa, portuguesa, inglesa ou
qualquer outra – não deixa de ser uma atitude grosseira e até arrogante da parte de quem
o faz, pois se hoje vivemos um mundo hi-tech, onde a sociedade e as cidades desfrutam
de comodidades, luxo e conforto, ele tem lastro no ontem, nas frágeis bases legadas
pelos pioneiros conquistadores. Tudo fruto da ação antrópica e da evolução do lugar e
dos atores que o estabeleceram e o desenvolveram. Os critérios das fundações coloniais,
em especial aquelas estabelecidas até a primeira metade do século XVII, não podem ser
confundidos com nenhum outro. São um caso particular, vez que inexistiam critérios
definidos. Até esse tempo, os reinos, via de regra, sequer possuíam exército regular,
fardamento, etc. Nas viagens marítimas, mesmo as oficiais, não havia a exigência de rol
de passageiros (na França isso só passou a ser obrigatório a partir de 1680).
A obra do escritor Antonio Lopes (1889 – 1950) nos informa que
“Segundo expressões de um documento oficial do século XVII (como reza a
carta régia de 26 de junho de 1675, constante de manuscrito da Biblioteca
de Évora – Cód. CXV/2/18/f 65 v), eram requisitos indispensáveis à
fundação de vilas d’el-rei de Portugal: igreja, casa para cadeia e governo
político”69. (Destaque nosso).
A data em tela, 1675, está em consonância com o período de normatização
verificados na maioria dos reinos. Antes, prevalecia a informalidade e os fundamentos
legais e institucionais básicos. Foi assim com quase todas as cidades iniciais do período.
Em um dos debates travados com a contestação, ouvi um argumento pouco
convincente sobre o que seja fundar. Foi inferido que “fundar é continuar”. Mas até
quando? Nosso entendimento é bastante diferente. Fundar é fazer o básico, é fazer
nascer. E quando se nasce, isso sempre acontece da forma mais incipiente possível. O
dicionário Aurélio é taxativo sobre o verbo fundar, quando diz: “levantar os alicerces de
(construção)”. O que era então fundar uma cidade em tempos tão remotos? Uma
importante referência é o escritor, doutor honoris causa pela Universidade de Zurique e
pela Sorbonne, Leonardo Benévolo, que na obra História da cidade (Ed. Perspectiva.
1983), mostra diversas formas de fundação mundo afora e de onde se observa que o
estabelecimento de uma cidade não exige mais do que quatro fundamentos simples,
sendo este o quadripé: alteração do espaço físico natural (aí incluídos a abertura do
espaço e as edificações oficiais e particulares); presença de um governo oficial;
delimitação territorial e local de ajuntamento cívico-militar (representado geralmente
pela praça). Aí estão as bases da maioria das fundações das cidades brasileiras daquele
período, sendo que muitas não contavam com os quatro pilares, mesmo assim estas
fundações não são contestadas. A obra do famoso pesquisador e escritor Nestor Goulart
Reis, um dos papas no conhecimento do estabelecimento de vilas e cidades do Brasil
colonial, sempre deixa entender que as cidades, mesmo nascendo frágeis e
extremamente carentes de infra-estrutura, as datas de fundação são aceitas e não são
refutadas.
Em todo o Brasil colonial são muitos os exemplos de lugares e cidades
estabelecidos em fundamentos primitivos. Foi assim na Paraíba com o forte do
69
LOPEZ. Antonio. Alcântara: subsídio para a história da cidade. 2. Ed. – São Paulo : Siciliano,
2002. P. 204
Cabedelo (1587) construído em palha, madeira e barro; Belém – Forte do Castelo
(1616). A capital paraense contava na data de fundação um pouco mais de uma centena
de pessoas. As melhores casas de Belém, mais de dez anos após seu estabelecimento,
eram de taipa revestida. Quase vinte anos depois, a cidade ainda era chamada por
muitos de povoação, devido a sua fragilidade. “Formou-se a matriz de taipa de vara”,
finaliza o historiador Ribeiro do Amaral70.
A fundação da primeira capital, Salvador, não fugiu à regra: madeira, palha e
barro. O historiador Francisco Adolpho de Varnhagen (1816 – 1878), que não raro
trocou farpas com o historiador maranhense João Francisco Lisboa (1812 – 1863) é
sintomático quando fala sobre as precárias condições do lugar. Ele, apesar da “simpatia
que nutria pela monarquia, que lhe rendeu severas críticas”, dá-nos a verdadeira
dimensão do que era a fundação de uma cidade à época, quando narra a criação do
arraial de Salvador.
“Para a primeira vivenda dos colonos, construíram-se provisoriamente,
com a ajuda de muitos índios, alguns como tujupares cobertos de palmas.
Depois tratou Tomé de Sousa de dar mais solidez à cerca, substituindo-a
por uma forte muralha de taipa (...) A este arraial, ainda apenas em
princípio, deu o primeiro Governador-geral do Brasil o religioso nome de
“Cidade do Salvador71”. (grifos nosso)
Dois anos depois de fundada, a cidade do Salvador continuava com os mesmos
fundamentos. Detalhe, na data de fundação ainda não existia Câmara, até porque não
existia intendente (prefeito), mas um Governador-geral. E
“Por tempo já a cidade-capital se achava bastante bem fortificada, e toda
amuralhada de taipa, tendo dois baluartes, um deles de madeira de
mangue. (...) A dita muralha de taipa saiu um pouco alta, e não deixou de
sofrer na invernada desse ano72. (grifo nosso)
Observa-se que na data de fundação de muitas capitais e cidades brasileiras não
existiam Câmara. O Rio de Janeiro, por exemplo, na data da fundação por Estácio de
Sá, não era mais que um frágil acampamento militar. E, tal qual Salvador, também não
seguiu etapas para ser reconhecida como cidade.
Observa-se a inexistência de parâmetros definidos para a fundação de cidades
naquele período inicial do Brasil. À Época inexistia uma cartilha disciplinando normas
de fundação. Daí a quase totalidade das fundações portuguesas no Brasil não se
enquadrarem nas “exigências” da contestação. Cem por cento delas era em madeira,
palha e barro. Só depois as construções eram edificadas em fundamento mais forte.
Outra informação importante era a inexistência de câmara. São Luís, ao contrário do
que alguns disseminam, não possuía Senado da Câmara. Jerônimo de Albuquerque
morreu sem ver uma Câmara em São Luís, pois só construída anos depois por Simão
Estácio da Silveira. O mesmo aconteceu com muitas das principais cidades brasileiras.
O nascimento de Salvador e de São Luís possui muito mais em comum do que se
imagina. Além de estabelecidas com os mesmos fundamentos iniciais, possuíam
70
AMARAL, Ribeiro do. Fundação de Belém do Pará: jornada de Francisco Caldeira de Castelo
Branco em 1616. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2004. P.79.
71
VARNHAGEN. Francisco Adolpho de. História geral do Brasil: antes da sua separação e
independência de Portugal. São Paulo: Edições Melhoramentos, em convênio com o
Instituto Nacional do Livro, MINC. 5 v. 9ª Ed. Tomo I. 1975. P.241.
72
Ibid., p. 256.
governador (Tomé de Sousa e La Ravardière), e não intendentes (substituído pela figura
do prefeito). Não possuíam edis (vereadores), mas conselheiros. Características das
cidades iniciais estabelecidas em regiões isoladas e sem vizinhança.
São Paulo é a maior metrópole da América do Sul, mas nos seus cinqüenta
primeiros anos a população não ultrapassava os trezentos habitantes. E para não
ficarmos apenas nos exemplos distantes, lembramos da fundação de Santarém no Pará,
onde o marco é uma capela de pindoba sem paredes, e a celebração de uma missa,
realizada pelo conhecidíssimo frei e escritor luxemburguês João Phillippe Bettendorf
(1625 – 1698). O que dizer da vizinha Icatu, que tem como data de fundação a
construção do forte de Santa Maria (1614), feito, às pressas, inicialmente nos mesmos
fundamentos primitivos, e que depois ficou abandonado no matagal. A cidade de Icatu,
como todos sabem, foi edificada em outro momento e em outro lugar, distante do forte,
sendo a construção do mesmo aceita como data de fundação da cidade. Trouxemos
todas estas informações à tona por entendermos ser condição sine qua non comparar a
fundação de São Luís com as demais fundações de cidades brasileiras da época. E não é
só no Brasil que os estabelecimentos se davam desta maneira. No filme Novo Mundo,
produção hollyhoodiana estreada em 2005, com direção de Terrence Malick, mostra
como se deu a pedra fundamental dos Estados Unidos, sendo as construções, cem por
cento delas, em madeira. E os pioneiros desbravadores, como não poderia deixar de ser,
passaram para história como heróis, com destaque para a índia Pocahontas e o inglês
John Smith.
A data de fundação das cidades brasileiras do período colonial quase sempre
respeita o evento principal inicial: a construção de um forte, de uma capela, uma igreja,
a celebração de uma missa, etc., pois fundar é fazer o básico, o fundamental. É como
nascer. Não nascemos indefinidamente, apenas uma única vez, pequenos, frágeis,
carentes de cuidado, mas mesmo assim já nascemos, viemos ao mundo. Assim nascem
coisas e pessoas.
Não vemos atualmente polêmicas criadas pelos brasileiros em razão da fragilidade
da fundação da cidade onde moram, ao contrário, como é de se esperar, são orgulhosos
ou, no mínimo, encaram com normalidade o evento. A implantação de Câmara e cadeia,
plano urbanístico, etc., a exemplo de Salvador, São Paulo, Belém e Rio de Janeiro, não
são exigências das mais urgentes para que uma povoação seja reconhecida como cidade.
Os requisitos iniciais das primeiras cidades do Brasil são aqueles de caráter urgente –
residências, capelas, fortaleza, etc. Ou, no máximo, aqueles mostrados anteriormente no
quadripé fundacional. No Maranhão, tornou-se um álibi da contestação o incremento do
plano urbanístico de Frias de Mesquita, implementado (aparentemente) de imediato,
porém, concluído em um dilatado espaço de tempo. Não existem dúvidas sobre a
importância de um plano urbanístico para uma cidade, porém, as primeiras delas foram
fundadas sem tais aparatos. O escritor maranhense Domingos Vieira Filho nos dá uma
dimensão da importância dos logradouros no período colonial.
“As ruas não tinham por então as funções socializadoras de hoje, porque
na sociedade colonial, como na medieval, a rua era uma simples linha de
comunicação do que de transportes (...) Podiam por isso ser estreitas que
por elas não transitavam carros” 73.
73
FILHO, Domingos Vieira. Breve história das ruas e praças de São Luís. Rio de Janeiro: Gráfica
Olímpica e Editora Ltda, 1971. P. 10.
Lembramos que os primeiros logradouros de São Luís foram criados pelos
franceses de La Ravardière, estando entre eles a Praça do Forte (Pedro II), o caminho
que interligava o Forte ao Convento (atual rua dos Afogados) e o porto Santa Maria
(Praia Grande).
Não esqueçamos ainda incontáveis fundações do Brasil colonial que não
contavam com nada, absolutamente nada na data de fundação, tendo como marco
fundacional a passagem de uma personalidade, a celebração de uma missa, etc. Nota-se
aí que os moradores são parte importante neste processo de decisão, ignorados por
aqueles que criticam a fundação de São Luís.
74
Ernesto Von Ruchert. http://wolfedler.blogspot.com.br/2011/02/historia-e-uma-ciencia.html
e os ludovicenses. E, como diriam nossos avós, “justiça para ser boa começa pelos de
casa”. Se a contestação realmente que fazer algum tipo de justiça, antes de criticar a
fundação de São Luís, deve fazê-lo primeiramente com as fundações portuguesas do
Brasil colonial, pois quase cem por cento delas estão em desacordo com as novas
exigências da contestação, vez que Portugal não investia a contento nas suas colônias e
não provia a estrutura mínima devida às cidades que ele mesmo estabelecia. A jornada
ao Maranhão feita por Jerônimo de Albuquerque a partir de Pernambuco foi realizada
em maior parte a pé, não por profissão de fé ou algo similar, mas pela carência material,
pelo perigo das frágeis embarcações lusas (com reduzido número de canhões e armas)
se depararem com embarcações de outras nações, o que poderia ser um desastre para
suas forças. Aquilo que a contestação chama de fundação portuguesa de São Luís, no
início de 1616, foi feito, na verdade, com o espólio gaulês. Uma flagrante continuação e
ampliação do trabalho do general Daniel de La Touche de La Ravardière, que aqui
deixou toda a estrutura para uma nascente cidade: fortalezas (o forte São Luís já era
uma pequena cidade), casas, capelas, convento, serraria, serralheria, estaleiro, depósito,
porto, lavouras, etc.
Se hoje o país pena pela falta de regulamentação em diversos setores, imagine
àquela época. No início do século XVII não havia regulamentação sobre fundação de
cidades. E cem por cento delas eram fundadas de forma extremamente frágeis, pois
feitas em palha, madeira e barro.
O DNA DA CONTESTAÇÃO
A contestação da fundação de São Luís é uma filosofia bem feita, bem arranjada,
um pacote bonito recheado de belas cores e formas, uma prateleira arrumadinha, que faz
o leitor ou ouvinte acreditar que, assimilando-a, tornar-se-á um crítico a tantas
“vaidades” e ao “narcisismo” da sociedade local e, com isto, tornar-se-á diferente dos
demais. As argumentações são tantas e tão “lúcidas” que praticamente não dão outra
opção a quem com ela se depara que, de pronto, o leitor/ ouvinte “se converte” e passa,
inclusive, a nutrir raiva ou ódio aos franceses e à própria sociedade ludovicense, da qual
ele próprio faz parte e corrobora. O leitor é conduzido como gado ao matadouro, sem
lhe ser permitido levantar a cabeça ou olhar ao redor.
Escaramuças sobre a fundação de São Luís são bem antigas, vem do século
passado, vez que alguns outros escritores se manifestaram sobre o assunto. O que todos
tem em comum é a omissão dos parâmetros de uma fundação à época e a ausência de
comparação com outras cidades.
Estratégias
Uma das estratégias da contestação é tentar fazer crer que São Luís, em mãos
portuguesas, sempre foi um céu. O estratagema é maximizar os feitos e ações de
Albuquerque (início do século dezessete) fazendo uma ligação direta com o período
áureo lusitano (início do século dezenove). Com isto leva as pessoas a vincular
fundação com o pomposo casario (fruto da colonização), edificado quase duzentos anos
depois. Omite o caos reinante na colônia, que vigorou a partir da saída dos franceses,
estimulados pelo massacre dos nativos e conflitos entre os próprios colonos. Nessa
época São Luís era apenas um entreposto militar que ajudava na proteção do Amazonas.
Ao mesmo tempo que maximiza tudo o que é luso, faz parte do pacote aviltar o legado
gaulês no Maranhão. Por isso a insistente utilização de termos como piratas, invasores,
hereges, tugúrios, casebres, pau-a-pique, etc., expressões com conotação política
utilizadas durante os séculos por governantes e escritores portugueses ou que serviam
ao reino português. A realidade, no entanto, é bem distinta. Como nos informa o Padre
Antonio Vieira, que reclamava que São Luís era “acanhada e de ruas tortuosas... e os
melhores da cidade se vestiam de saco de algodão tingido e preto”.
Sobre a precariedade de São Luís na gestão portuguesa Amaral também é
elucidativo:
“Em vereação de 6 de outubro de 1646 delibera a Câmara de São Luís que,
visto as casas da cidade ou as mais delas serem de pindoba, ninguém
trouxesse ou desse fogo senão em panela para se evitarem incêndios, pena
de mil réis pagos na cadeia.
“A princípio eram de pindoba as paredes e os tetos das casas, mas com o
correr dos tempos, sobretudo 1692 em diante, foi essa edificação sendo
substituída por outra mais de acordo com o progressivo desenvolvimento
que foi tendo a cidade. Passaram então as casas a ser construídas de taipa
de pilão com telha-vã sobre mal polida madeira. Por aquele tempo tinha
São Luís quinhentas casas”75.
Tutela
Outra estratégia, utilizada durante anos, é tutelar as pessoas mais próximas e os
menos avisados. Bombardeá-los com suas informações, para, com isso, reduzir qualquer
possível influência de quem defende posicionamento contrário. Um caso emblemático é
que vem acontecendo com uma historiadora que, sabendo do sucesso da Exposição
FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE – quase três mil visitas em vinte e seis dias
–, passou a convidar alguns dos seus amigos – geralmente pessoas influentes - para vê-
la, antes que estas o façam a seu talante e possam receber informações não tuteladas.
Algo no mínimo estranho.
Escritores e historiadores que defendem a fundação francesa são sistematicamente
criticados e emparedados. Algo que beira a tortura psicológica. Alguns se deixam
intimidar. Outros não ligam para a contestação. Grandes historiadores maranhenses, que
deram vasta contribuição ao estado, passaram a ser alvos preferenciais daqueles que não
medem conseqüência e fazem de tudo, até atropelar a história e a realidade brasileira
para fazer prevalecer a qualquer custo a sua verdade.
Quando estamos a beira de repetir as palavras do apóstolo Paulo, quando
perguntou aos irmãos da igreja de Corinto: “Não há um sábio entre vós?” (I Coríntios
6:5), aproximamos novamente a lupa e observamos que a contestação não é um produto
da universidade ou mesmo do curso de história, mas de interesses de alguns grupos que
tiram proveito da crítica. Uns tem como alvo a censura a França, outros a sociedade,
pelo simples desejo de se saciar através da crítica fácil. Mas existem aqueles que
utilizam o assunto como degrau para ascensão política. O útil ao agradável. Saciam o
ego e ainda tem o dividendo político-sindical. A maior parte do universo acadêmico, por
sua vez, não pactua com a crítica indulgente, ao menos da forma interesseira como está
posta.
75
AMARAL. José Ribeiro do. O Maranhão histórico – Artigos de jornal (1911 – 1912). São Luís:
Instituto Geia (Coleção Geia de Temas maranhenses), 2003. P. 75.
A crítica tem como alvo preferencial os historiadores – e, consequentemente, a
sociedade do início do século passado – que teriam criado o “mito da fundação
francesa”. O perfeito entendimento do assunto, porém, requer melhor análise e
entendimento. É verdade que houve uma maximização do evento gaulês neste torrão,
acontecido em 08 de setembro de 1612. E que isto foi sabiamente usado em prol dos
interesses sociais da época, quando a República necessitava de fato ser firmada em
detrimento do império, recém substituído. Foi com a saída dos comerciantes lusos que
foi possível aos ludovicenses tomarem as rédeas do seu destino. Mas será que mudanças
como estas à época não aconteceram em todo o Brasil? A Semana de Arte Moderna de
1922 não foi um reacender das luzes, uma negativa ao modelo colonial absolutista luso?
Ou alguém acredita que o Brasil se tornou de fato independente em 1822 com o grito do
Ipiranga? Desde o final do século dezenove o Brasil buscou romper com muitas das
práticas e costumes de toda ordem. Foi a partir de então que o país passou a perseguir
um modelo mais condizente com o novo momento de independência, pautado na
salubridade. Para tanto criou o serviço de vigilância sanitária; sistema de abastecimento
de água nas principais cidades; proveu de forma mais limpa e saneada ruas, praças e
logradouros; residências em melhores condições, etc.
A historiadora pernambucana Vanessa de Castro, referindo-se a salubridade e a
novas práticas na sua cidade natal, o Recife, nos fala que o objetivo dos novos
idealizadores naquele final do século XIX era
“...romper com as referências simbólicas e materiais relacionadas à
condição de ex-colônia portuguesa. Para tanto, impuseram um novo
conceito de cidade: limpa e esquadrinhada, de onde deveriam ser banidos
os elementos potencialmente nocivos à “ordem urbana”. Além disso,
comportamentos deveriam ser moralizados, tendo como referência os países
europeus, especialmente a França”76.
A observação que fazemos em relação ao texto acima é que tal objetivo de
vinculação ao modelo francês não foi prerrogativa do Recife e de São Luís, mas de
quase todo o país. E não somente isto, o início das comemorações do aniversário da
capital maranhense coincide também com o luxo e as comodidades da Belle époque
(1875 – 1914). O final deste período, em razão da Primeira Guerra mundial (1914 a
1918), teria início o que o economista e colunista da revista Veja, Claudio de Moura
Castro, chamou de “O milagre brasileiro”. Segundo ele:
“Faz um século, não éramos quase nada (...) colonizados pela nação mais
atrasada da Europa Ocidental. Em 1900, Portugal tinha a mesma taxa de
alfabetização (15%) que a Europa antes de Gutemberg. Entramos no século
XX com a renda per capta menor que a do Peru e cinco vezes menor que a
da Argentina (e com nossas revistas escritas e impressas na Europa), Mas a
economia disparou. Entre 1870 e 1987, nosso PIB cresceu 157 vezes (...)
por mais de um século lideramos o crescimento mundial (...) o salto
econômico foi enorme. Viramos um país industrializado (...) Trocamos uma
agricultura semi-feudal por um agronegócio de forte base tecnológica,
apoiado em pesquisa de primeira linha”.77
76
CASTRO, Vanessa de. Das igrejas ao cemitério: políticas públicas sobre a morte no Recife
do século XIX. Recife : Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2007. Il. P.281.
77
CASTRO, Claudio Moura. O milagre brasileiro. Veja. Ed. 2173, 14/07/2010. Ano 43, nº 28. P.
24.
O início do século passado foi realmente esse momento de transformação.
Impulsionado pela liberdade nunca antes visto. O país passou a visualizar um novo
futuro, sem o cerceamento de outrora. Foi neste ambiente de liberdade e expansão que o
Brasil assumiu seu próprio destino fazendo bonito, como visto no texto acima. São Luís,
tendo uma demanda reprimida de três séculos com relação a fundação francesa, fazendo
valer sua condição de guardiã do legado gaulês, principalmente em razão da
implantação oficial de uma colônia próximo a Linha Equinocial, definitivamente livre
do jugo e opressão portuguesa, passou a comemorar a fundação da cidade na data
assinalada da fundação da Colônia gaulesa. Lembremos que Portugal nunca o havia
feito em razão da falta de legitimidade, pois consciente da precedência gaulesa nessas
terras.
Grave Equívoco
Um dos graves equívocos da contestação é o de desconhecer completamente que
no período colonial já se falava que os franceses já haviam fundado São Luís, conforme
mostramos na primeira parte deste texto. A teoria contrária não sabia ou sequer ouviu
falar disto, porém, divulga aos quatro cantos que foi um grupo de intelectuais,
encabeçado pelo escritor Ribeiro do Amaral, faz um século, quem “inventou” a
argumentação. Grave erro, que preferimos acreditar que realmente desconhece esses
textos.
Do Canadá para o Maranhão
A contestação da fundação de São Luís é bonita e bem redigida, mas, como “de
longe toda montanha é azul”, é preciso aproximar a vista, ou a lupa para entendermos a
origem dela na forma agressiva e tendenciosa como está posta. O DNA dela está no
Canadá, no tratado de Paris de 1763, quando a França, vencida pelos ingleses no campo
de batalha, foi obrigada a entregar suas colônias da América do Norte, inclusive o
Canadá. Alguns franceses, sentindo-se abandonados pela pátria-mãe, passaram a nutrir
sentimentos pouco nobres contra a França. Passou o tempo e o fato foi perdoado ou
esquecido pelos canadenses. Alguns poucos, no entanto, conservaram o ódio, e foi esse
sentimento, contraditoriamente trazido por sobrenome francês, que chegou entre nós na
década passada e passou a semear o antigalicismo, para tal, utilizando a fundação
francesa de São Luís.
No seio da academia, a crítica não foi bem aceita pela maioria. Alguns a refutam e
a maioria a despreza. Alguns núcleos radicais, geralmente ligados a interesses político-
partidários e ou sindicais, por sua vez, viram a oportunidade da crítica política, e
abraçaram o argumento como forma de censurar a sociedade. Tem-se a partir daí a
junção de dois interesses: a crítica à França e a crítica aos ludovicenses, um casamento
que não foi para o bem da cidade e de seus moradores. Felizmente os maranhenses
souberam peneirar e subtrair os radicalismos, pois sabedores de que os franceses neste
torrão só fizeram o bem. Semearam a paz e foram reconhecidos, inclusive, pelo papa,
que chamou o empreendimento no Maranhão de “tão santa empresa”.
Talvez o que esteja em debate não seja apenas a fundação de São Luís, mas duas
visões distintas sobre a história do Maranhão. Uma que dá maior importância à forma e
outra à essência. Uma visão otimista, das oportunidades, e outra pessimista e
preconceituosa. A continuação do joio político semeado pelo vencedor, pelo
colonizador. Algo que nunca interessou ao nosso país e aos brasileiros, mas sempre
rendeu muitos frutos aos que sabem tirar proveito do caos que eles mesmos instalam.
Ninguém deve se enganar minimizando o valor deste debate, pois que o que está
em jogo nesta peleja vai muito além de estima e sentimentos, de um debate acadêmico
se São Luís foi fundada ou não por esse ou aquele. Na realidade, escondidos nas
entrelinhas, estão interesses políticos de alta monta, que podem definir rumos à cidade e
aos seus moradores, interesses coletivos ou sectários, melhores ou piores aos
maranhenses.
Abordaremos o motivo de uma deformação. O que leva um segmento da
academia a marginalizar os franceses e até nutrir ódio a eles, que só fizeram o bem,
semearam a paz e viveram harmoniosamente com os primeiros habitantes locais, e, por
outro lado, a se posicionar a favor, defender e até louvar aqueles que promoveram o
genocídio da gentilidade tupi-guarani, escravizaram a magia africana e marginalizaram
os estrangeiros, verdadeira raiz dos desmandos históricos do Brasil, aí incluídos os mais
altos impostos do mundo, a ligação telefônica mais cara, a política do individualismo,
do “salve-se quem puder”, onde “manda quem pode e obedece quem tem juízo”. O que
vemos e continuamos sofrendo na pele não é outra coisa que a estratégica continuação
da massacrante política colonial, que sempre negou qualquer outra presença estrangeira
ou precedência no país. Digo isto, mas sabendo que um revisionamento de tudo o que
foi legado só depende de nós. Mudança que foi sabiamente iniciada nas últimas décadas
pelo Governo Federal, e está sendo intensificada no atual governo (redução considerada
nas taxas de juros, pressão por melhores serviços sobre as operadoras de celular, etc.).
A GRANDE CONTESTAÇÃO
Entendemos, por outro lado, que o maior combustível para qualquer tipo de
contestação da fundação de São Luís não deixa de ser a inércia do poder público, que de
posse de uma história única, valorosa e importante para maranhenses, brasileiros e
franceses, nunca se ocupou de resgatá-la e, com isto, deixa de gerar emprego e renda à
comunidade local e regional. E não cansamos de dizer que nossa maior oferta é história
e cultura, e dentro desta, o maior atrativo é a pioneira e legítima fundação francesa de
São Luís, uma das três grandes oportunidades que o Maranhão tem para trazer de volta
momentos de riqueza e prosperidade só vistos no século dezenove, o século do luxo,
promovido, em grande parte pelos muitos franceses que aqui se instalaram e formaram
uma “Colônia de comércio de artigos de luxo” deixando muitos descendentes entre nós.
Os franceses, mesmo sem políticas públicas locais direcionadas a eles, estão entre os
estrangeiros que mais visitam São Luís e, com isto, dão importante contribuição à
economia local gerando e mantendo empregos no município.
O consagrado consultor e ex-secretário de turismo de Saint Malo – cidade que
recebe anualmente quatro milhões de visitas –, Jean Claude Weisz, conhecedor das
oportunidades e dos benefícios advindos da atividade turística, nos exorta: “Vocês
dormem sobre um tesouro e não estão sabendo”. Weisz sabe do potencial do grande
casario lusitano, das manifestações populares e, principalmente, da exclusividade da
fundação da capital da França Equinocial. São Luís, por conta disto, fundada em forma
de cidadela, completa seus quatro séculos com o mesmo nome, situada no mesmo lugar
(atual Praça Pedro II), mantendo o mesmo formato de praça. São Luís – e somente São
Luís – é a VERDADEIRA CONTESTAÇÃO, vez que a partir do próprio nome,
encravada neste mundo português, permanece firme e incisiva afirmando que a bula
papal – o Tratado de Tordesilhas – foi algo totalmente questionável, sem a legitimidade
pretendida pelos ibéricos, vez que atendia a interesse de apenas dois dos vários países
que disputavam o Novo Mundo. Se na América do Norte existe Canadá e Estados
Unidos, na América do Sul as Guianas (Inglesa e Francesa) e Suriname (de origem
holandesa), no Brasil, SÃO LUÍS É A GRANDE CONTESTAÇÃO, que faz coro com
o rei francês Francisco I, que dizia: “Que me mostrem o testamento de Adão que deu o
mundo a Portugal e Espanha”. Com o nome do rei da França, sendo a grande
contestação, não é por acaso a metralhadora das críticas de todo lado. Enquanto isso, a
contestação permanece com um silêncio sepulcral com relação às demais cidades
brasileiras fundadas nas mesmas condições por portugueses. Ela sabe que se abrir o
bico, se tocar neste assunto, a “teoria” vai pelo ralo e o véu não mais existirá.
As cidades francesas de Saint-Malo, Cancale, Paris e Berthegon são boas
oportunidades de captação de visitantes para São Luís. Investir na relação com estes
lugares poderá ser uma excelente janela de incremento da nossa economia a partir do
turismo, pois eles mesmos sempre quiseram este intercâmbio entre os dois países.
Turismo e história são dois irmãos que devem andar de mãos dadas. Ora, se Brasil
e Argentina são rivais apenas no esporte, na economia procuram andar juntos, pois
ambos ganham com o mercado comum, por que nós da academia temos que nos
digladiar? A história de São Luís poderá ser uma importante ferramenta no incremento
da economia do município. O desafio é fazer com que seus atores tenham esse
entendimento e compromisso com a sociedade, que espera a retribuição do investimento
feito nos quatro ou cinco anos que estiveram na universidade.
São Luís possui três belos atrativos que qualquer cidade brasileira queria ter:
fundada por franceses, colonizada por portugueses (acervo lusitano) e manifestações
populares excêntricas.
Vale a reflexão! Muito obrigado!
A ELABORAÇÃO DO DISCURSO DO MITO DA
ATENAS BRASILEIRA PELO GRUPO
MARANHENSE E A FORMAÇÃO DOS NOVOS
ATENIENSES
MARIA APARECIDA C. M. SANTOS
Porém, na segunda metade do século XIX, a fase áurea das atividades intelectuais
da plêiade da Atenas Brasileira entraria em baixa com a morte de alguns de seus
principais representantes e com a emigração de alguns ícones da geração para outras
Províncias na tentativa de obterem reconhecimento intelectual: “mortos alguns gênios
da pena e emigrados outros tantos, a chama vibrante da Atenas de outrora, agora se
exauria ante a falta de oxigênio econômico e cultural”. (SILVA, 2008, p.147). Outro
fator determinante para a decadência do Grupo Maranhense está relacionado à crise
algodoeira enfrentada pela Província nessa mesma época. A partir daí – dessa escassez
das atividades intelectuais e do declínio da economia – postulou-se um discurso de
decadência na região maranhense. Como explica Graça Aranha:
Aquella floração intellectual brilhante, artificial, extinguia-se. A poesia e a
criação estylizavam-se na grammática e na copia de clássicos verbais,
longínquos e estranhos. Os que deviam trazer a seiva nova ainda não eram
entendidos. A intelligencia desertou do seu antigo solo e seu êxodo e o das
forças da mocidade, precipitaram a decrepitude. A preguiça espiritual
marcava o ritmo moroso [...]. (ARANHA, 1903 apud CORREA, 2001, p.
127).
Entretanto, entre as décadas de 1870 e de 1890, surge outro grupo de intelectuais,
os Novos Atenienses, que almejavam resgatar e reconstruir o período áureo da cultura
maranhense. Ícones como José Ribeiro do Amaral, Antônio Lobo, Fran Paxeco,
Justo Jansen, Antonio Lopes da Cunha, Domingos de Castro Perdigão, José
Nascimento Moraes, Antônio Baptista Barbosa de Godóis e tantos outros, formavam
os Novos Atenienses. A estes intelectuais coube a iniciativa de reestruturar a presença
mítica da Atenas Brasileira, dando-lhe uma nova relevância. Estes pensadores
representavam “promessas intelectuais em busca de afirmação, situadas no centro da
tensão e do desconforto de descortinar e construir o futuro, sem, contudo, olvidar o
passado mitológico, onipresente, herdado dos ‘gigantes’ da velha Atenas [...]”.
(MARTINS, 2006, p. 118).
Os Novos Atenienses proporcionaram ao Maranhão, a construção de espaços e a
reforma de outros já existentes, com a intenção de resguardar e perpetuar a memória do
passado grandioso que teria levado à ascensão cultural do Estado. Então, foram
destinados ao Liceu Maranhense, a Escola Normal, a Escola Modelo, a Escola de
Música, a Renascença Literária e a Academia Maranhense de Letras (AML) a
importância de preservar e propagar o ideal de que o Maranhão seria culto por essência.
No que se refere às criações feitas pelos Novos Atenienses, a Academia Maranhense de
Letras é sem dúvidas uma das instituições que merece destaque, pois por meio dela esse
grupo de jovens intelectuais honravam as tradições literárias do Estado.
A AML foi fundada em 1908, tendo como precursor a Oficina dos Novos –
instituição criada em 1900 com uma estrutura organizacional nos moldes das
Academias de Letras existentes no Brasil até então. A lista de fundadores da Academia
Maranhense de Letras apresenta um número significativo de intelectuais, dos mais
reconhecidos àqueles que tiveram menor destaque, mas nem por isso dignos de
esquecimento. No âmbito do desenvolvimento das atividades intelectuais executadas
pelos Novos Atenienses, exaltavam a volta ao passado glorioso. Compreendia-se que
mais um período de opulência intelectual vinha progredindo a cada dia no intuito de
resguardar e reconstruir a história de uma época nostálgica. Sobre essa questão, Antônio
Lobo afirma que:
aos anos de apatia e marasmo que se seguiram à brilhante e fecunda
agitação literária, de que foi teatro a capital deste Estado, nos meados do
século findo, e que ficará marcado para honra e gloria nossa, uma das
épocas mais fulgentes da vida intelectual brasileira, substituiu-se, afinal,
uma fase franca de revivescência intelectual, que desde o início, vem
progressivamente caminhando, cada vez mais acentuada e vigorosa,
destinando-se a reatar as riquíssimas tradições de nossas letras, que a
muitos já se afigurava totalmente perdida. (LOBO, 1970, p. 4–5).
A Academia Maranhense de Letras enquanto “lugar de memória”, representou um
papel fundamental para dar credibilidade ao mito da Atenas Brasileira. Contudo, com o
passar dos anos, esta mesma instituição, não seria mais suficiente para satisfazer os
anseios de seus membros. A partir de então, houve um número considerável de
intelectuais que emigraram para outras regiões a fim de obter notoriedade por suas
produções. Estes homens das letras almejavam reconhecimento e condições mais
favoráveis para expandir as suas ideias e vivências. Após a crescente “fuga” dos jovens
estudiosos para outras regiões, com o objetivo de serem reconhecidos nacionalmente, o
Maranhão deu início a mais um fase de declínio no exercício de suas atividades
intelectuais. Os literatos que não rumaram para outros Estados lastimavam a realidade
em que se encontravam. Contudo, a responsabilidade daqueles que ficaram para honrar
a sua terra natal e o seu compromisso com a Academia Maranhense de Letras, estava
diretamente ligada ao fato de preservar e glorificar um passado grandioso, ofuscado pela
decadência vivenciada.
Em suma, percebemos que a trajetória cultural do Maranhão no campo das
Letras, obteve oscilações significativas no âmbito das suas maiores conquistas e no
declínio gradual de suas atividades. Contudo, nota-se que todos esses intelectuais
tiveram um objetivo comum – fazer renascer a fase de esplendor das Letras no
Maranhão e perpetuar à todas as gerações as tradições culturais elaboradas a partir do
mito da Atenas. Por fim, preocupavam-se em elaborar ideias, obras e discursos que
honrassem e ao mesmo tempo regatasse a cultura do Estado: “a marcha prosseguirá
porque um só ideal, que é puro e sacrossanto, nos anima e nos irmana, sob a bandeira de
nossos patronos – o de fazer eterna a glória do Maranhão Atenas”. 78
REFERÊNCIAS
ALBURQUE JÚNIOR, Durval Muniz. A invenção do nordeste e outras artes. São Paulo: Editora
Cortez, 2001.
CORRÊA, Rossini. Atenas Brasileira: a cultura maranhense na civilização nacional. Brasília: Thesaurus;
Corrêa & Corrêa, 2001.
LOBO, Antônio. Os Novos Atenienses: subsídios para a história literária do Maranhão. 2. ed. São Luís:
Academia Maranhense de Letras, 1970.
MARTINS, Manoel de Jesus Barros. Operários da saudade: os Novos Atenienses e a invenção do
Maranhão. São Luís: EDUFMA, 2006.
MÉRIAN, Jean Yves. Aluísio Azevedo – vida e obra (1857-1913). Rio de Janeiro: Espaço e Tempo;
banco Sudameris-Brasil; Brasília: INL, 1998.
SILVA, Ana Ladia Conceição. Falas de decadência, moralidade e ordem: a "História do Maranhão" de
Mário Martins Meireles. Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade de São Paulo.
Dissertação de Mestrado. 2008.
78
Discurso pronunciado por Mário Meireles na sessão comemorativa do cinqüentenário da
Academia, a 10 de agosto de 1958. Revista da Academia, Ano 80, v. 20, dez, 1998. p. 175.
INCLUSÃO E LAZER PARA TODOS: conhecendo
Centro Histórico São Luis
INTRODUÇÃO
A educação inclusiva é uma questão de direitos humanos e implica a definição
de políticas públicas, traduzidas nas ações institucionalmente planejadas e avaliadas. A
concepção que orienta as principais opiniões acerca da educação inclusiva é que a
escola é um dos espaços de ação e de transformação, que conjuga a ideia de políticas
educacionais e políticas sociais amplas que garantam os direitos da população. Assim, a
implantação de propostas com vistas à construção de uma educação inclusiva requer
mudanças nos processos de gestão, na formação de professores, nas metodologias
educacionais, com ações compartilhadas e práticas colaborativas que respondam às
necessidades de todos os alunos.
PROBLEMÁTICA
A escola busca uma intervenção junto aos alunos deficientes com os colegas que
estarão próximas deles, de modo a assegurar uma real inclusão. A análise da aceitação e
do desenvolvimento das interações sociais de alunos portadores de necessidades
especiais por seus colegas de escola contribui, não somente para uma avaliação das
conseqüências sociais para os estudantes em ambiente inclusivo, mas também para
auxiliar no esboço de uma prática educacional inclusiva que promova a interação e
aceitação social de todos os estudantes.
Nesta relação de aceitação do outro surge o projeto INCLUSÃO E LAZER
PARA TODOS: conhecendo Centro Histórico São Luis, que nasce com a escola,
haja vista que estes alunos fazem parte da comunidade Vila Maranhão onde a escola
esta inserida
Através da disciplina de turismo ministrada pela professora Jossilene
Louzeiro Alves diante dessa realidade, senti-se a urgência de criar mecanismos que
possam dar condições para que essas crianças tenham espaço para se desenvolverem
com o que têm e não com o que lhes falta. E como incluir os alunos por meio do lazer –
na forma de passeio possibilitando aos alunos Portadores de Deficiência e aos demais
alunos da escola Gomes de Sousa.
Percebendo o quanto é importante para os alunos desta UEB Gomes de Sousa
uma aula prática para além do muro da Escola, cuja meta é caminhar para a inclusão
ampliando o contexto social desses alunos em participar do turismo quanto na forma de
passeio, porém não o fazem por dificuldades financeiras, acessibilidade, outros não
participam por insegurança e outros por se acharem incapazes.
OBJETIVOS
79
Professora Mestranda em Ciências da Educação, pela Universidade Lusófona de Humanidades e
Tecnologias. Professora da rede municipal de São Luís-MA.
Os objetivos consistem em refletir sobre a aprendizagem, possibilitando uma
aula fora dos muros da escola onde o aluno passa vivenciar seu aprendizado interagindo
com o meio, sua comunidade; Melhorar a qualidade do ensino oferecido aos alunos,
estabelecendo um diálogo com a comunidade mais de perto com um novo olhar. A
disciplina de Turismo proporciona desenvolver pesquisa sobre São Luis. Tendo como
objetivos permitir aos alunos conhecer a história da sua cidade através de um passeio,
estudando ao ar livre os conteúdos trabalhados em sala de aula.
Os objetivos mais amplos do projeto foram direcionados pensando em quatro
frentes: Propiciar alternativas de cultura, lazer, e formação para os alunos EUB Gomes
de Sousa. Estimular o encontro entre alunos e outras pessoas para integração e
conseqüente perspectiva de organização popular para iniciativas, demandas ao poder
público, melhorias para os alunos em conhecimento através de trabalhos conjuntos e
articulados, desenvolvimento da auto-estima, além de troca de experiências. Estimular o
uso, pelos alunos, dos espaços públicos existentes no Centro Histórico - como a escola -
, tornando-os possíveis fontes de alternativas de formação e lazer nos bairros. Servir de
exemplo a outras escolas d Município.
METODOLOGIA
Como metodologia faz-se a uso do currículo das séries envolvidas no projeto
contemplando os conteúdos. Para que o aluno venha compreender os relatos sobre os
Monumentos de São Luís são parte indissociável de um imenso patrimônio cultural.
Neles, a cidade guarda sua história, preserva suas tradições e, mais importante ainda,
assegura a manutenção de sua identidade junto às novas gerações.
Através de aulas expositivas e outros recursos como mapas do centro histórico
de São Luís tornava-se possível o conhecimento das praças, igrejas, fortes, casarões e
fontes não são, portanto, apenas pontos turísticos, nem devem ser vistos, entendidos ou
admirados tão somente como realizações arquitetônicas cuja beleza deslumbra e
empolga quem vem a conhecê-los de perto
A professora de Turismo graduada em História – UFMA, foi questionada pelos
alunos sobre a importância de conhecer o Centro Histórico de São Luís, passo que
culminou na idéia deste projeto que nasceu em Fevereiro de 2007, quando estudávamos
na disciplina Turismo sobre a fundação da cidade de São Luís. Os alunos da 7ª da
U.E.B. Gomes de Sousa. Então começou a se reunir com o objetivo de refletir e propor
alternativas de realizarmos uma aula a passeio, pelo centro histórico. Os alunos
organizaram – se em equipe para analisamos a importância da aula a passeio, pois os
mesmos relataram a importância de conhecer melhor a cidade e suas riquezas, pois só
ouvir não basta já ouviram falar sobre o Centro histórico, porém não o conhecem e
ficaram alegres em saber que poderão tirar fotos para mostrar para as pessoas da sua
comunidade e relataram Por que é importante a aula a passeio no centro histórico . Em
São Luís do Maranhão, muitos dos monumentos amados pelos homens passaram, assim
como suas casas suntuosas. Mas, se aqui as Casas de Deus são humildes, elas, no
entanto, permanecem de pé. Respiram o Eterno. Então resolvemos registrar as
produções destes alunos, conforme ilustração abaixo.
RESULTADOS, DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Centro histórico - O conjunto arquitetônico de São Luís é formado por mais de
3,5 mil edificações, a maioria dos séculos XVIII e XIX. Os sobrados que margeiam as
ruas estreitas do centro e da Praia Grande exibem em suas fachadas azulejos
portugueses de diferentes cores e padrões. Por refletir o sol e tornar as paredes
impermeáveis, esse revestimento ajudou a preservar os prédios. Cerca de mil dessas
construções históricas encontram-se restauradas. Merecem destaque o Teatro Arthur
Azevedo, de 1817, em estilo neoclássico, e a Casa das Tulhas, de 1820, onde hoje
funciona um centro de vendas de produtos maranhenses. O Palácio dos Leões foi
originalmente uma fortaleza erguida pelos franceses, depois transformada em palácio
pelos portugueses. O antigo mercado de escravos funcionava em um sobrado em estilo
colonial do século XIX, chamado de Cafua das Mercês. Também deve ser conhecido o
Centro de Cultura Popular, instalado em um casarão do século XIX, que tem em seu
acervo com objetos e trajes referentes a manifestações folclóricas e populares, como
Tambor da Mina e Carnaval. E a Matriz da Sé, que foi construída no século XVII, cujas
reformas alteraram seu estilo para o neoclássico. Tem altar-mor em ouro.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto INCLUSÃO E LAZER PARA TODOS: conhecendo Centro
Histórico São Luis nos permitira verificar a aprendizagem dos conteúdos de forma
contextualizados e também os alunos estarão melhorando seu relacionamento com as
pessoas, conseguindo explicar os objetivos das tarefas para a comunidade, e assim a
comunidade estará valorizando mais a escola.
O Maranhão é um desses lugares abençoados pela natureza. Localizado numa
zona de transição entre o Nordeste e o Norte do Brasil, tem na diversidade dos
ecossistemas uma das suas características mais marcantes. Praias, florestas, cerrados,
lagos e rios são alguns desses atrativos, que fazem do Maranhão um estado diferenciado
além, é claro, da sua história, cultura popular e muitas outras que você precisa descobrir.
Portanto se faz necessário oportunizar essa aula a passeio ao Aluno UEB. Gomes
de Sousa. E contamos como o apoio desta secretaria de educação. Assim como o apoio
da Secretaria Municipal de Turismo cuja meta consiste em promover o conhecimento
aos seus escolares.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRÊS, Luís Phelipe de Carvalho Castro. Centro histórico de São Luís-Maranhão:
patrimônio mundial. São Paulo: Audichromo Editora, 1998.
CAMARGO, L. H. Fundamentos multidisciplinares do turismo: história. In: TRIGO,
Luís Gonzaga Godoy (Org). Turismo como aprender como ensinar. São Paulo: Senac,
2000.
CANTANHEDE, Palmerio de C. Saneamento das Cidades e sua aplicação à capital
do Maranhão. São Luís,Tipografia Frias, 1902.
LOPES, Raimundo. Uma região tropical. 2ª ed., Rio de Janeiro. Fon - fon e Saleta,
1970
MONTE, Francisca Roseneide Furtado do e SANTOS, Idê Borges dos. (Coordenação
Geral). Saberes e práticas da inclusão: introdução. Reimpressão. Brasília: MEC,
SEESP, 2004. (Educação Infantil).
SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão. Construindo uma sociedade para todos. Rio de
Janeiro: WVA, 1997
KRIPPENDORF, Jost. Sociologia do Turismo: para uma nova compreensão do lazer e
das viagens. São Paulo: Aleph, 2000.
MORIN, Edgar. Ética, cultura e educação. 2º edição.São Paulo: Cortez, 2003.
SUNG, Jung Mo; SILVA, Josué C. da. Conversando sobre ética e sociedade.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
ANEXOS
DO MARANHÃO
CICLO DE ESTUDOS/DEBATES
A CIDADE DO MARANHÃO –
UMA HISTÓRIA DE 400 ANOS
2011 – 2012
SEMINÁRIO 5 – SÃO LUÍS NÃO FOI FUNDADA POR
FRANCESES
29 DE AGOSTO DE 2012 – PALÁCIO CRISTO REI
EXPOSIÇÃO
FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE
CURADORIA:
ANTONIO NOBERTO; CLORES HOLANDA; JOANA BITTENCOURT
29 de agosto de 2012
PALÁCIO CRISTO REI – 14:30 ÀS 18:00 HORAS
SEMINÁRIO 5 – SÃO LUÍS NÃO FOI FUNDADA POR FRANCESES
14:30 – Abertura
16:00 – Debatedor
80
-Rafael Aguiar dos Santos: Graduado em História pela Universidade Federal do Maranhão - UFMA,
Graduando em Direito pela Universidade Federal do Maranhão - UFMA, Pós-Graduando em Geo-
História e Didática do Ensino Superior pelo Instituto de Ensino Superior Franciscano - IESF.
Historiador com ênfase em intelectuais e discurso historiográfico. Professor da Educação Básica da
Rede Privada de Ensino de São Luís do Maranhão. E - mail: raf_500@hotmail.com.br.
Introdução
Durval Muniz de Albuquerque coloca que o historiador é como um rio “natural e
humano, cursivo e discursivo, inventa na História e a História” (ALBUQUERQUE JR,
2007). Nesse sentido tecer a prática da escrita envolvendo o discurso historiográfico
ligado ao projeto de colonização francesa no Maranhão traduz-se como uma prática
riquíssima e um grande desafio por parte do historiador. Nesse aspecto, abordaremos no
presente trabalho o mito da fundação francesa da cidade de São Luís visando à
construção do que o filosofo francês Michel Foucault conceitualiza como uma
Arqueologia do Saber81, sobre a temática.
Tendo a consciência que trabalharemos com documentos muitas vezes riscados,
embaralhados ou reescritos. Que foram interpretados sobre as mais diversas óticas e
perspectivas e que assumem determinado sentido de acordo com a realidade histórica no
qual são interpretados ou estão inseridos. Constituindo assim uma análise nas
entrelinhas da construção hermenêutica da produção discursiva sobre a fundação
francesa da cidade de São Luís, enquanto relação de poder condicionada a determinado
tempo histórico, dentro de uma ótica: “onde o principio da interpretação nada mais é
que seu interprete” (FOUCAULT , 2000, p.49). Realizando assim o que Benjamim
coloca como escrever a “História a contrapelo” (BENJAMIN, 1993).
A História do Maranhão que permanece ainda permeada por fantasmagorias, onde
o discurso historiográfico reproduz ainda de modo conservador uma tradição
construtora de nossa identidade enquanto espaço de memória permeada por um passado
histórico anterior mal interpretado. Estabelecemos nossa própria História através de
repetições quase obrigatórias como coloca-nos Flávio de Moura Reis:
A história do Maranhão foi se povoando de sombras, personagens, fatos e
processos irreais – a “França Equinocial”, a “loucura industrial” a “greve
de 51”, o “sistema agroexportador”, a “decadência”, a “oligarquia”,
entre inúmeros outros quase-acontecimentos e processos-fantasmas, que
existem apenas em seu fundo falso e podem ser olhados pelo avesso. (REIS,
2011, p.17)
E descortinar parte desse passado forjado e ainda vivo, reafirmado todos os dias
nos livros, em manuais educacionais, nos discursos e enunciados, nas instituições, nos
meios de comunicação, na promoção de festas e eventos demagogicamente lucrativos,
tanto economicamente, quanto politicamente, faz-se uma tarefa necessária. Nesse
sentido partiremos para a construção de uma análise critica de um pedaço desse passado
forjado enquanto ambiente de memória: o mito da fundação francesa da cidade de São
Luís.
Trabalhando o conceito de mito no seu sentido antropológico, enquanto narrativa
que constrói a si mesma e “solução imaginária para tensões, conflitos e contradições que
não encontram caminhos para serem resolvidos ao nível da realidade.” (CHAUÍ, 2000,
p.09). Enquanto mito fundador, o discurso historiográfico sobre a fundação francesa da
cidade de São Luís acaba por impor de modo autoritário um vinculo teologal com o
passado enquanto origem, visando assim a um projeto de imposição de uma realidade
forjada que acaba por mascarar os conflitos e as contradições inerentes da nossa própria
sociedade.
81
Michel Foucault coloca-nos que “A genealogia é cinza: ela é meticulosa e pacientemente documentaria.
Ela trabalha com pergaminhos embaralhados, riscados às vezes reescritos” (FOUCAULT , 1979,
p.15).
O mito de fundação, também “não cessa de encontrar novos meios para exprimir-
se, novas linguagens, novos valores e idéias, de tal modo que, quanto mais parecer ser
outra coisa, tanto mais é a repetição de si mesmo” (CHAUÍ, 2000, p.09), nesse sentido o
mito de fundação francesa da cidade de São Luís vem sendo (re) significado desde o
final do século XIX, estando sempre em aberto e em disputa, assumindo determinado
significado e caráter de acordo com a realidade histórica e social no qual está inserido e
sendo construído, mas se constituindo como uma repetição de si mesmo e se
caracterizando ainda enquanto instrumento de poder, adquirindo assim atualidade.
82
O Conceito de Campo compreendido a partir da noção apresentada pelo sociólogo francês Pierre
Bourdieu como um “espaço social relativamente autônomo” e “dotado de suas leis próprias”, onde os
agentes, de acordo com a posição em que ocupam nesse campo e dos bens simbólicos que possuem,
determinam o “que eles podem e não podem fazer (BOURDIEU, 2004, pp.20-23)
Sancy e aceitando ainda a participação na empreitada colonial de uma missão de padres
capuchinhos que tinham um projeto de evangelização das comunidades indígenas
locais.
A professora Andrea Daher aponta que provavelmente François de Razilly, foi o
principal responsável pela solicitação a coroa francesa da presença missionária
capuchinha no Brasil visando catequizar as comunidades indígenas locais e implantar a
fé católica no novo mundo. E a própria escolha capuchinha não deve ser tomada como
algo inópito, ou fruto do mero acaso, uma vez que os mesmos gozavam de grande
prestígio na França do período, pois detinha grande conhecimento farmacêutico,
freqüentavam a corte, e em meio a um contexto histórico francês do final do século XVI
e inicio do século XVII marcado por conflitos no âmbito religioso que envolviam os
processos de reforma e contra reforma religiosa, foram os responsáveis por importantes
conversões de diversos elementos da nobreza francesa ao catolicismo (DAHER, 2007,
pp.52-53).
Assim, a então regente do trono francês, a rainha de origem italiana, católica
notória, Maria de Medicis, deu aprovação e financiamento da coroa ao projeto de
colonização nas terras do Norte do Brasil. Mas a escreveu pessoalmente a La
Ravardière, impondo-lhe que somente a religião católica deveria ser difundida na nova
colônia francesa que deveria se constituir:
[...] que em todos os sítios e lugares dos países em que ires conquistar para
neles implantar uma colônia francesa e também a fé do nosso Senhor, não
permitais exercício de nenhuma religião que não seja a Católica Apostólica
Romana (FORNEROD, 2001, p.31-32) .
Em Julho de 1612, liderados por La Ravardière e Razilly, os franceses
desembarcaram nas terras do Maranhão e iniciaram os primeiros contatos com os povos
indígenas tupinambás que aqui habitavam, constituíram um pequeno núcleo de
povoamento composto por algumas cabanas de pau-a-pique, a construção de um
armazém e do Fort Sant-Louis de madeira, assim como a exploração da região
(D'ABBEVILLE,1975). Mas a Manutenção do projeto colonial francês no Maranhão
dependeria cada vez mais de novos recursos materiais e humanos, que deveriam ser
conseguidos junto à coroa ou a iniciativa particular nesse momento.
Assim devido à necessidade de homens e recursos para levar-se adiante o projeto
da França Equinocial, os bons frutos da missão capuchinha no Maranhão multiplicaram-
se cada vez mais no discurso empreendido pelos padres Yvrex e Abberville. Segundo
Daher, as cartas dos mesmos endereçadas a França passaram a ter um entusiasmo que
foi proporcional “a dificuldade ressentida pelos cumprimento de sua obra Evangélica
junto a tão elevado numero de infiéis, febrilmente ávidos conversão” (DAHER, 2007,
p.56).
Enquanto Razilly partiu em direção a França em 07 de Dezembro de 1612,
acompanhado do padre Claude d`Abberville e de seis embaixadores tupinambás,
visando obter apoio e financiamento para o Projeto da França Equinocial. A presença
dos seis índios tupinambás na França foi marcada por procissões e diversas solenidades
festivas, altamente ritualizadas, onde se incluiu a recepção dos indígenas no Louvre e o
batismo de três dos mesmos celebrado pelo arcebispo de Paris na Igreja dos
Capuchinhos.
Solenidades essas que se inseriram dentro de um verdadeiro projeto
propagandístico da missão colonial francesa visando à arregimentação de recursos para
a mesma. De acordo com Andrea Daher o Livro de Claude d`Abberville História da
missão dos Padres capuchinhos na ilha do Maranhão é publicado em meio a essa
verdadeira “campanha publicitária” (DAHER, 2007, pp. 91-92), buscando em um
contexto de urgência e em meio à iminente partida de uma segunda companhia,
conseguir novos colonos e apoio total da monarquia ao projeto colonial brasileiro. A
publicação do livro, realizada em edição luxuosa, as cerimônias solenes e a ritualização
em torno dos índios inseriam-se sem dúvida, nesse claro propósito de encorajar o
projeto de colonização da França Equinocial em terras maranhenses.
Em meio a toda a pompa e circunstância que marcou a propaganda monárquica de
encerramento das cerimônias parisienses de 1614, alinhava-se o contexto global dos
princípios da expansão católico cristã nos séculos XVI e XVII. Pois missões como a
capuchinha nas terras maranhenses, representavam junto aos agentes que as promoviam
a internalização de um sentimento quase divino de está contribuindo efetivamente para a
salvação de almas, em um projeto que transcendia a própria terrenidade.
Enquanto isso, percebendo o sério perigo que representava o avanço francês sobre
as possessões portuguesas na América, o então governador-geral do Brasil Gaspar de
Sousa, enviou uma expedição ao Maranhão, comandada por Jerônimo de Albuquerque e
com objetivo de expulsar os franceses do território Maranhense, iniciava-se o conflito
pela posse do Maranhão.
Um ano depois, em 1615, o capuchinho Yves d’Evreux publica a sua famosa obra
Viagem ao Norte do Brasil: Feita nos anos de 1613 a 1614, cuja leitura foi muito pouco
conhecida pelo público da época, devido principalmente ao fato dos exemplares terem
sido destruídos dentro do próprio ateliê de impressão do editor, François Huby. A
destruição dos exemplares da obra do padre d’Evreux ocorreu principalmente graças as
mudanças ocorridas na dinâmica na política européia do período. Pois em meio à ordem
político-diplomática e aos acordos de estado que visavam estabilizar as tensões
internacionais da época, tivemos o estabelecimento do casamento do jovem monarca
francês Luís XIII com a infanta espanhola Ana d’Áustria. O estado francês deixa então
a sua própria sorte o projeto de implantação de uma colônia no Brasil em meio a uma
verdadeira guerra contra os portugueses pelo controle da região.
Em 17 de outubro de 1615, o então capitão general de Pernambuco, Alexandre
Moura, liderando mais 600 homens e trazendo armamentos e víveres, junta-se as forças
portuguesas comandadas por Jerônimo de Albuquerque (FORNEROD, 2001, p.21). A
chegada de reforços e uma nova frota portuguesa representaram então um duro golpe
aos franceses.
Em novembro de 1615, com o forte de São Luís constantemente atacado e
cercados, os franceses serão definitivamente derrotados pelos portugueses e acabam
oficialmente capitulando no dia 04. Era o fim da França Equinocial e dos planos de
estabelecimento de uma colônia francesa no Maranhão, parafraseando tais planos não
passaram de sonhos de uma noite de verão.
83
Diogo de Campos Moreno: fora militar português, tendo vindo para o território brasileiro em 1602,
com o posto de Sargento-mor. No Maranhão juntou-se a Jerônimo de Albuquerque Maranhão e a
Alexandre de Moura na luta contra os franceses, redigiu enquanto cronista as obras: "Livro que Dá
Razão ao Estado do Brasil" e "Jornada do Maranhão" . Nesta última, Moreno relatou a conquista do
território maranhense, embora houvesse seguido uma linha de escrita que acabou por enaltecer os seus
próprios feitos.
84
João Felipe Bettendorff (1625-1698), padre Jesuíta nascido em Luxemburgo, atendendo a um convite
do Pe. Antônio Vieira, veio ao Maranhão em 1661, iniciando sua vida missionária, assumiu vários
cargos, tais como superior da Missão (1668 a 1674 e 1690 a 1693) e reitor do colégio do Maranhão
(1674), sendo um importante cronista sobre o Maranhão no século XVII.
85
Bernardo Pereira de Berredo e Castro: historiador e administrador colonial português. Foi
governador do Estado do Maranhão, de 1718 a 1722. Tendo como obra mais conhecida os Annaes
historicos do estado do Maranhão no qual escreve sobre o Maranhão desde o inicio de sua
colonização até o ano de 1718.
de Campos Moreno, por exemplo, fora militar português com o posto de sargento-mor,
tendo lutado no processo de expulsão dos franceses do território maranhense; João
Felipe Bettendorff, padre jesuíta que ocupou diversos cargos de destaque na colônia
portuguesa e Berredo fora governador do Maranhão entre 1718 e 1722. Logo
compreendendo que a escrita da história parte de um “lugar social” (CERTEAU, 2008)
torna-se facilmente compreensível o porquê a produção discursiva emitida pelos
mesmos de representação e reconstituição do passado seguisse uma lógica voltada para
a apologia da fundação portuguesa da cidade de São Luís.
Na aurora do século XIX, tivemos ainda um processo de continuidade do discurso
histórico ligado a uma fundação portuguesa da cidade de São Luís, onde historiadores
como Raimundo José de Sousa Gaioso, César Augusto Marques86 e João Lisboa87
apontaram também os franceses como invasores e não como fundadores da capital
maranhense. De acordo com Lacroaix, João Lisboa,
foi de opinião semelhante. Ao descrever a ocupação e expulsão dos
franceses, nosso eminente jornalista, em seus Apontamentos para a História
do Maranhão, encerrou o capitulo dizendo: “Assim findou a primeira
invasão estrangeira que sofreu a nossa pátria.” (LACROIX, 2000, p.34).
Também inexiste qualquer verbete França Equinocial ou algo do gênero e
qualquer outra referência à origem francesa de São Luís no famoso Dicionário
Histórico-Geográfico da Província do Maranhão, obra escrita por César Augusto
Marques no século XIX, considerada ainda hoje por muitos historiadores como
referência nos estudos relativos ao Maranhão. César Marques assim como todos seus
antecessores,
reafirmou a fundação da cidade de São Luís pelos portugueses, quando
assim se expressa(LACROIX, 2002, p.57):
Jerônimo de Albuquerque, inteiramente senhor de suas ações e livre dos
cuidados inerentes à guerra, aplicou-se à fundação da cidade, hoje de São
Luís, como lhe fora recomendado pela Côrte de Madrid. Dentro de pouco
tempo por seu zêlo e atividade pôde adiantar tanto a povoação “que
reduzida a regular forma de república, na frase de Berredo, debaixo da
proteção soberana de Maria Santíssima com o augusto título de Vitória,
que já lhe tinha decretado no feliz lugar de Guaxenduba, lhe declarou à
invocação de São Luís.”(MARQUES, 1970, p.445 In: LACROIX, 2002,
P.57)
No inicio do século XX, Barbosa de Godois 88 também foi de opinião semelhante,
o historiador local também colocou os franceses como invasores, e em sua obra clássica
História do Maranhão para o uso dos alumnos da Escola Normal, publicada em 1904,
defendeu a origem da cidade de São Luís a partir de uma perspectiva ligada a fundação
lusitana, colocando Jerônimo de Albuquerque que havia liderado o processo de
expulsão dos franceses no atual território do Maranhão como legitimo fundador da
cidade:
86
César Augusto Marques (1826-1900): médico, professor e historiador maranhense cuja obra de maior
relevância foi o Dicionário Histórico-Geográfico da Província do Maranhão.
87
João Francisco Lisboa (1812-1863): Político, historiador, escritor, jornalista e cronista maranhense.
88
Antônio Batista Barbosa de Godóis (1860-1923): Historiador, educador, escritor e jurista e um dos
fundadores da Academia Maranhense de Letras (AML).
de posse do governo do Maranhão, Jerônimo de Albuquerque, cumprindo
as ordens que recebera da Corte de Madrid, tratou com solicitude da
fundação da cidade, dando o nome de São Luiz (GODOIS, 1904. In:
LACROIX, 2000, p.34)
Mas, a partir da última década do século XIX, tivemos o inicio de um processo de
ruptura e descontinuidade dentro do discurso histórico ligado a fundação da cidade de
São Luís, processo esse que foi consolidado nas primeiras décadas do século XX; onde
a afirmação de que São Luís foi fundada por franceses começa a tomar corpo, passando
a ser construída, dita e repetida com certo orgulho pela elite ludovicense, como parte da
constituição da própria singularidade maranhense (LACROIX, 2000, p.34).
Portanto, durante a primeira republica brasileira (1889-1930) o mito da fundação
francesa da cidade de São Luís: foi gestado, construído e consolidado, dentro do
processo de descontinuidade ligado ao próprio discurso historiográfico. E o primeiro
trabalho que defendeu abertamente a idéia de uma fundação francesa da capital
maranhense foi o Estado do Maranhão de autoria de José Ribeiro do Amaral89,
publicado em 1896, no qual o autor coloca La Ravardiére como fundador da cidade de
São Luís. Em 1912, Ribeiro do Amaral retornou a temática na obra Fundação do
Maranhão, construindo ainda uma nova interpretação dos fatos históricos no qual o
marco de fundação da cidade passou a ser o momento da cerimônia religiosa de
benzimento e batizado do forte de São Luís, episódio narrado e descrito de modo
minucioso pelo padre capuchinho Claude D’Abbeville em seu Livro História da Missão
dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão (LACROIX, 2002, p.62).
A idéia de uma origem francesa de São Luís foi assim aos poucos sendo
sedimentada e a mesma acabou sendo facilmente aceita e reproduzida pela elite
intelectual local, que em um momento no qual o Maranhão passava por um estágio
letárgico de periferização tanto econômica quanto em termos de representação política
na primeira republica brasileira (1889-1930), buscou elementos de singularidade e auto
afirmação.
Com a reestruturação produtiva do Estado ocorrida no âmbito econômico devido
principalmente ao final da escravidão em 1888 e as transformações na política estadual
e de ordem de representação federal com os ajustamentos aos novos mecanismos de
controle da República Velha (1889-1930), tínhamos uma realidade local no final do
século XIX e inicio do século XX, lida pelos intelectuais locais sob a ótica da
decadência econômica e intelectual, onde havia um presente pautado por dúvidas e
incertezas, mas restava um passado profundamente idealizado de glórias a se exaltar e a
perspectiva de um futuro projetado no mesmo a se construir (ALMEIDA, 1983, pp. 67-
69). Visão essa da realidade maranhense que Alfredo Wagner Berno de Almeida
89
José Ribeiro do Amaral (1853-1927): Maranhense, natural de São Luís. Fundador do Colégio de S.
Paulo. Catedrático de História e Geografia do Liceu Maranhense, instituição no qual também foi
diretor, ex-diretor da Biblioteca Pública. Sócio fundador da academia Maranhense de Letras, e
correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Suas principais obras publicadas foram:
“O Estado do Maranhão em 1896”, 1898; “Apontamentos para a História da Revolução da Balaiada
na Província do Maranhão”, 1898, 1900, 1906; “A Fundação do Maranhão”, 1912; “Apontamentos
para a História da Vida e Obras do Senador Candido Mendes de Almeida, 1913; “História do
Maranhão” - Edição para a infância-, 1914, 1923; “Limites do Maranhão com o Piauí ou a questão
Tutoya”, 1919; “As Revoluções do Segundo Império e a obra pacificadora de Caxias”, 1922;
“Ephemerides Maranhenses - 1° Parte - Tempos Coloniais”, 1923; “Estado do Maranhão”-
Contribuição ao 2° Volume da Introdução Geral do Dicionário Histórico, Geográfico e Etnográfico do
Brasil do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. (SANTOS, 2012, p.64)
caracterizou como ideologia da decadência, temática que permeou boa parte da
produção intelectual maranhense na primeira República;
(...) pode-se inferir que os historiadores regionais, classificados como
patronos e clássicos acabam por introjetar nas representações acerca do
Maranhão um dilema básico que contrapões a mencionada decadência à
prosperidade. Configura-se nos desdobramentos desta oposição uma
imagem de progresso que remete invariavelmente para o passado numa
busca de relevar e explicar o declínio geral sempre observado no tempo
presente. O procedimento resume-se em pensar uma existência anterior e
vivê-la, de uma forma idealizada, num momento presente que a desdiga por
completo. A reflexão se dá pela evocação do avesso. A apologia do
progresso, que é um objeto presumivelmente alcançável, passa por esta
idealização do passado. (ALMEIDA, 1983, pp. 67-69)
O passado fora assim idealizado como referência para a construção do futuro,
assumindo um caráter didático pedagógico, com a História pensada como um
importante elemento para a afirmação do estado e a construção de um projeto de
identidade e singularidade local. A História do Maranhão seguiu assim uma dimensão
teleológica, que vinha ao encontro à construção da ideologia da decadência, onde o
Maranhão assumiu um caráter de uma eterna tendência, um permanente vir a ser
(ALMEIDA, 1983).
Em meio à realidade social em que estavam inseridos, os intelectuais maranhenses
da primeira republica constituíram um discurso sem perspectivas promissoras quanto ao
presente, visto sob a ótica da decadência, mas formaram um modelo representacional do
passado, especialmente do século XIX, como o momento áureo maranhense. O que
reproduziu dois mitos principais: o mito da Atenas Brasileira e o mito da fundação
francesa da cidade de São Luís, ligados a um projeto elitista de invenção da identidade
local e da singularidade maranhense.
E a construção do mito de origem ligado à fundação francesa da cidade de São
Luís gerou ainda sua contraparte necessária: o rito comemorativo dos 300 anos de São
Luís, festa faústica, constituída em 1912, onde se comemorou o aniversário da cidade
no dia 8 de Setembro em meio à reprodução do discurso da fundação francesa da cidade
de São Luís por parte de diversos intelectuais da época, do qual se destacaram José
Ribeiro do Amaral, Justo Jansen Ferreira 90, e Domingos Perdigão 91. Que deram a sua
90
Justo Jansen Ferreira (1864-1930): maranhense, nascido em São Luís, médico com formação no Rio
de Janeiro. Atuou como professor de Geografia do Brasil do Liceu Maranhense, de física, química e
mineralogia da Escola Normal do Maranhão, Sócio fundador efetivo da academia maranhense de
Letras e correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do Instituto do Ceará, da
Sociedade Astronômica de Paris, da Sociedade de Geografia de Lisboa, da Sociedade de Geografia do
Rio de Janeiro, da Sociedade de Medicina e cirurgia do Rio de Janeiro e da Sociedade de medicina do
Paraná. Seus principais trabalhos publicados foram: “Fragmentos para a Chorographia do Maranhão”,
1904; “A propósito da Carta do Maranhão”, 1904; “Breve notícia sobre o ensino de Física, Química e
Mineralogia no Maranhão”, 1907; “A Barra da Tutoya”, 1908 “Geografia Médica e Climatologia do
Estado do Maranhão”, “A Mulher e o ensino primário”, obras publicadas em 1910; “Carta Geográfica
do Maranhão”, 1912; “Carta Geográfica da Ilha de São Luís”, 1912; “Planta da Cidade de São Luís”,
1912; “Contribuição para a História e Geografia do Maranhão. Ainda a Barra da Tutoya”, 1913; “A
divisória Pelo Parnaíba”, 1921. Boa parte de sua obra desenvolveu-se no âmbito geográfico, com uma
vasta problematização sobre as áreas limítrofes entre o Maranhão e o Piauí na região do delta do Rio
Parnaíba (SANTOS, 2012, pp.63-64).
91
Domingos de Castro Perdigão: Maranhense. Ex-diretor da Biblioteca Pública do Estado do Maranhão,
com diversos trabalhos publicados, entre os quais prefiguraram: “Catálogo do Estado do Maranhão na
contribuição para a consolidação do mito: através de artigos, ensaios, trabalhos e
publicações, cujo discurso vinha de encontro ao mesmo.
Alicerçava-se assim o mito da singularidade maranhense ligado à fundação
francesa da cidade de São Luís, mito esse que vem sendo desde a sua construção no
final do século XIX (re) significado por sucessivas gerações de intelectuais locais até
hoje, através de ensaios, seminários, artigos e trabalhos, o que atualiza sua simbologia
junto ao imaginário local. Um projeto de esplendor idealizado do passado, construído
por elites decadentes que buscavam a autoafirmação através de um projeto de
superioridade do maranhense em suas origens francesas, nas palavras de Lacroaix:
Pela visão exagerada de todo um questionável esplendor desse passado, o
maranhense sentiu-se superior às populações da outras províncias e
procurou buscar uma diferença até nas suas origens, atitude esta
confirmada pela autoria dada aos franceses à fundação da cidade de São
Luís, capital do Maranhão. (LACROIX, 2000, p.65).
Consolidou-se então “o culto as origens francesas do Maranhão (...), como reforço
a idéia de singularidade” (LACROIX, 2000, p.73) enquanto projeto elitista de
forjamento de uma identidade local. E no inicio do século XX, a população maranhense
já estava completamente imbuída do “orgulho de ser a Atenas Brasileira e da sua
presumida origem francesa” (LACROIX, 2000, p.35). Idéias que serão reproduzidas e
(re) significadas no âmbito acadêmico entre os intelectuais locais também na segunda
metade do século XX. Lacroaix descreve-nos que o historiador maranhense Mario
Martins Meireles, por exemplo,
No corpo do seu trabalho intitulado França Equinocial, não se refere à
cidade de São Luís, porém no capitulo final, intitulado A frança equinocial
em três séculos e meio demonstra que incorporou o discurso da
inteligência, da cultura e do requinte da sociedade ludovicense, de sua
origem francesa, assim como da vaidade de ser deferentes de suas
congêneres. (LACROIX, 2000, p.36).
Porém, se analisarmos a principal obra de Mario Meireles que aborda a temática
sobre o projeto de colonização francesa no Maranhão: França Equinocial, publicada
inicialmente em 1962 por ocasião das festividades relativas aos 350 anos da cidade de
São Luís. Nas entrelinhas do discurso notamos que o historiador maranhense dentro de
sua narrativa não se arriscou em defender abertamente a fundação francesa de São Luis.
A escrita de Meireles que geralmente se caracteriza por um viés profundamente
cientificista, e um rigor metodológico sob uma perspectiva influenciada pelo arcabouço
teórico ligado ao historicismo rankeano, opta por uma descrição dos fatos de modo
pomposo, mas visando a uma neutralidade objetiva que podemos classificar até mesmo
como quimérica.
Porém Meireles, que foi um dos principais nomes da escrita da História do
Maranhão no século XX. Após uma minuciosa descrição da cerimônia religiosa de
Conclusão
Embora a construção da estrutura física da cidade de São Luís tenha sido
delineada pelos portugueses após a expulsão dos franceses consolidada em 1615, e a
historiografia local até o século XIX houvesse constituído um discurso que
caracterizava os franceses como invasores e os portugueses como fundadores da capital
maranhense. Tivemos a partir da primeira república brasileira (1889-1930) um processo
de ruptura e descontinuidade do discurso historiográfico. Ruptura essa demarcada pela
construção do mito da fundação francesa da cidade de São Luís, ligado ao forjamento de
um projeto de identidade e singularidade maranhense, a partir de uma leitura
propositalmente idealizada e deturpada da obra do Padre Capuchinho Claude D’
Abberville: História da Missão dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão, que
colocou o projeto da França Equinocial, ainda em construção, como grande marco de
fundação da cidade.
Sendo que tal visão foi se incorporando ao longo do século XX junto à boa parte
dos intelectuais e historiadores maranhenses, repetindo-se constantemente no
imaginário local, constituindo-se como mito fundador e sendo tomada enquanto estatuto
de verdade, protegida pelo manto da ciência histórica. Mas cabe-nos enquanto
historiadores descortinar esse passado, compreendendo-o como uma construção que foi
historicamente determinada, e visando a uma reflexão critica sobre o mito fundador e
seus elementos constituintes e o modo como o mesmo influencia na construção do
presente, pensando concretamente assim a realidade social na qual estamos inseridos,
uma vez que como nos aponta o historiador francês Michel de Certeau: a História
“combina o ‘pensável’ e a origem, de acordo com o modo pelo qual uma sociedade se
compreende” (CERTEAU, 2008).
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A FUNDAÇÃO DE SÃO LUÍS:
mitos e historiografia
INTRODUÇÃO
Pesquisar sobre os mitos que permeiam a historiografia maranhense é hoje uma
tarefa cada vez mais necessária aos historiadores. Estudar o mito fundador da cidade de
São Luís e suas conexões historiográficas torna-se relevante, na medida em que se
constitui um tema privilegiado para se refletir com quais concepções da história do
Maranhão forjou-se sua historiografia, principalmente a do século XX. Esta,
notadamente de caráter passadista, calcou-se na busca de uma identidade regional
marcada pelo traço da singularidade.
O presente artigo traz como objeto de estudo, a questão do mito fundador da
cidade e suas representações. Busca-se abordar a importância e implicações da
historiografia na construção de mitos relacionados à fundação de São Luís, por meio de
invenção de tradições, socialmente, culturalmente e historiograficamente construídas.
Contribuição importante sobre esse tema foi dada pela historiadora Maria de
Lourdes Lauande Lacroix, em 2000, com a publicação do livro “A Fundação Francesa
de São Luís e Seus Mitos”92, onde retoma uma antiga polêmica, há muito esquecida: o
questionamento da fundação francesa da cidade. A autora rompe com a historiografia
oficial do século passado, retirando dos franceses que aqui estiveram de 1612 a 1615, o
mérito da fundação da cidade e atribuindo-o aos portugueses. Como indica o título da
obra, ela classifica de mítica a idéia de uma São Luís fundada por franceses e o faz
baseada na leitura atenta da historiografia do século XVIII e XIX.
Embora não discorra sobre um tema totalmente inédito, Lacroix, o faz de uma
maneira nova, buscando os por quês, os franceses que aqui estiveram nas primeiras
décadas do século XVII e que foram vistos pelos cronistas e primeiros historiadores até
o século XIX como meros invasores, de repente passam a serem considerados pelos
92
Utilizamos a 3.ª edição, revista e ampliada, publicada pela Editora da UEMA, São Luís, 2008.
historiadores do século XX como legítimos fundadores da cidade. É através desse
problema que a autora buscou explicar quando, como e por que a cidade deixou de ter
uma origem lusitana para ter uma origem francesa.
Em artigo publicado no Diário Oficial do Estado do Maranhão 93, em 24 de
novembro de 1911, intitulado “Fundação do Maranhão”, o historiador José Ribeiro do
Amaral, lança uma nova visão sobre a fundação da cidade, considerando-a fundada
pelos franceses em 1612 e ignorando toda historiografia produzida até ali que via a
fundação a partir da colonização portuguesa, iniciada em 1616: “A Cidade de São Luís,
capital do Estado do Maranhão, é uma cidade de origem absolutamente francesa,
ocupando ainda hoje, o mesmo lugar escolhido por seus fundadores.” (AMARAL, 2003,
p. 39)
93
Esse e outros artigos do historiador Ribeiro do Amaral, publicados originalmente entre 1911 e 1912 no
Diário Oficial do Estado do Maranhão, por ocasião do sesquicentenário do autor, foram reunidos e
publicados pela coleção Geia de Temas Maranhense sob o título “O Maranhão Histórico”, São Luís:
Instituto Geia, 2003.
Crônica da Companhia de Jesus no Maranhão [1738]:
Desassombrado Jerônimo de Albuquerque de Alexandre de Moura, deu
princípio uma cidade em o mesmo sítio em que os franceses tinham o seu
forte. (CARVALHO, 1995, p.90)
Compêndio Histórico-Político dos Princípios da Lavoura do Maranhão
[1818]:
Fundação da cidade do Maranhão:
Livre o Maranhão n’aquele dia de toda a sugeição franceza, aplicou
Jeronimo de Albuquerque todo o seu cuidado na fundação de huma cidade
n’aquelle mesmo. (GAIOSO, 1970, p. 73)
Poranduba Maranhense:
Jerônimo de Albuqueque fundou logo junto á fortaleza de São-Luiz uma
cidade. (PRAZERES, 1891[1819], p. 42)
Jornal de Tímon [1858]:
1615 – Lançado fora os franceses, Alexandre de Moura, capitão-mor da
armada que ultimou a conquista, nomeou a Jerônimo de Albuquerque, que
a tinha começado , por capitão-mor do Maranhão, e a Francisco Caldeira
Castelo Branco, com igual patente, para o descobrimento e conquista do
Pará [...] Tanto um quanto outro fundaram pacificamente, e sem oposição
dos naturais, as duas cidades de S. Luís, e de Belém. (LISBOA, s/d, p. 13)
Semanário Maranhense (1867):
Retirando-se para Pernambuco Alexandre de Moura em 9 de janeiro de
1616, Jeronimo de Albuquerque volveo suas vistas para a fundação e
edificação da capital dando-lhe nova forma e ordem. (MARQUES, 1867, p.
2)
Barbosa de Godóis, em sua História do Maranhão para uso dos alunos da Escola
Normal, publicado em 1904, obra panorâmica sobre a história do Estado, que apesar da
finalidade didática na época foi visto depois como uma importante fonte de pesquisa por
várias gerações de historiadores, aborda assim o tema da fundação de São Luís:
De posse do Governo do Maranhão, Jerônimo de Albuquerque, cumprindo
as ordens que recebera da Corte de Madri, tratou com solicitude da
fundação da cidade, que pôs sob a proteção da Senhora da Vitória, dando-
lhe todavia o nome de São Luís, que os franceses haviam posto ao seu forte.
(GODÓIS, 2008, p. 138)
Para o autor, quem é considerado o fundador da cidade não é o fidalgo Daniel de
La Touche, senhor de La Ravardière, mas sim o mestiço pernambucano, Jerônimo de
Albuquerque94, filho de índia mais pai português. Em seu livro não demonstra qualquer
sinal de controvérsia ou dúvida acerca da fundação de São Luís, para ele é ponto
94
Sobre a primazia de Jerônimo de Albuquerque na fundação de São Luís, na obra Jerônimo de
Albuquerque Maranhão: guerra e fundação no Brasil colonial. São Luís: UEMA, 2006, p.147, capítulo
Jerônimo de Albuquerque Maranhão e a Fundação de São Luís, a professora Lacroix faz uma
revisão da historiografia dos séculos XVII – XX, onde Albuquerque Maranhão é visto como fundador
pelos primeiros cronistas e historiadores do Maranhão.
pacífico a origem lusitana da cidade. Evocando os frades cronistas franceses que aqui
estiveram em 1612, diz o seguinte:
Cláudio d’Abbeville, descrevendo que o lugar em que os franceses
construíram o forte, mais tarde nominado São Luís, é tão preciso nas suas
palavras, que admira como, em face do seu testemunho presencial, haja
quem, conhecendo a ilha de São Luís, alimente dúvidas a respeito da
posição escolhida pelos invasores para a montagem de sua fortaleza.
(GODÓIS, 2008, p. 100)
Os franceses são, portanto, vistos pelo autor, não como fundadores, mas como
meros invasores. A cerimônia do 8 de setembro de 1612, entre franceses e tupinambás,
na ilha de Upaon-açu, foi por Barbosa de Godóis ( 2008, p. 101), descrita assim:
[...] fizeram construir uma grande cruz de madeira, para ser em procissão
transportada ao forte, onde deveria ser levantada como símbolo da tomada
de posse do território, no interesse da religião do Crucificado, e da aliança
entre indígenas e a mesma religião.
Em seu livro “Cerimônias de Posse na Conquista Européia do Novo Mundo”, a
historiadora inglesa Patrícia Seed, corrobora com a idéia de Godóis. Faz uma acurada
análise de todas as cerimônias das principais metrópoles européias ao desembarcarem
na América entre 1492 e 1649. No caso do Maranhão, ela se refere assim à procissão do
8 de setembro de 1612:
Após quase seis semanas dessas demonstrações de aprovação nativa, os
franceses encenam o primeiro de dois rituais de posse política. Como
naquela miniatura de cerimônia de chegada na pequena ilha de Sainte
Anne, os elementos centrais foram uma procissão e a colocação de uma
cruz. (SEED, 1999, p. 64, grifo nosso)
É importante ressaltar que a visão aqui explicitada de Barbosa de Godóis, em
1904, sobre a fundação de São Luís, não representa uma leitura nova sobre o tema, ao
contrário, expressa a visão tradicional, desenvolvida desde os séculos XVIII e XIX,
portanto, já consolidada. Era a visão corrente até esse início de século XX.
95
Ver Eric Hobsbawm ;Terence Ranger (orgs.) em A Invenção das Tradições, Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 4. ed. 2006.
96
A comissão executiva dos festejos comemorativos era composta pelas seguintes autoridades e
intelectuais: Governador Newton Bello, Prefeito Ruy Mesquita, Sec. de Educação José Carvalho, Sec.
de Finanças Jesus Ribeiro, Prof. Mário Meireles, Prof. Ruben Almeida e Prof. Fernando Perdigão, entre
outros. Ver 350.º ANIVERSÁRIO DA FUNDAÇÃO DE SÃO LUÍS: programa das comemorações.
São Luís: Gráfica Industrial e Comercial LTDA, 1962.
QUESTIONANDO O MITO
O século XX é um período fértil de construção do mito da fundação francesa,
onde ele se gesta e se desenvolve, além de eventualmente ter sido questionado. Em fins
do século passado e início deste, verifica-se o momento de seu maior questionamento,
em grande medida pelos estudos da professora Lacroix. É precisamente nessa virada de
século que os mitos relativos à fundação da cidade ficam mais expostos e sujeitos a
novas leituras e desmitificações.
No final dos anos de 1970 e início de 1980, o mito da fundação francesa começa a
ser questionado. José Moreira, membro do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão e que assinava uma coluna nos jornais O Estado do Maranhão e O Imparcial,
denominada de “História da nossa História”, embasado na historiografia maranhense
dos séculos XVIII e XIX, passou a escrever vários artigos durante esse período,
chamando atenção para inconsistência da fundação da cidade pelos franceses, causando,
inclusive certa repercussão na imprensa.
Em 1993, Olavo Correia Lima, sócio honorário do Instituto Histórico e
Geográfico do Maranhão e professor de Antropologia da Universidade Federal do
Maranhão, é o primeiro autor a usar o conceito de mito para designar a consagrada
historiografia que defendia a origem francesa da cidade. Em artigo denominado “Duas
Controvérsias Científicas”, ele o classifica de o mito capital da história do Maranhão.
Para ele, a historiografia maranhense “vem repetindo-se erros dantanho, sem a devida
aferição da Pesquisa Histórica e até pela Crítica Científica. É natural que esteja recheada
de mitos, a começar pela fundação de São Luís, que representa, por sua vez, um dos
primeiros passos históricos do Maranhão” (CORREIA LIMA, 1993, p. 81).
Quando a controvérsia da fundação de São Luís parecia estar esquecida, a
polêmica reaparece com toda força, com a publicação em 2000 do livro “A Fundação
Francesa de São Luís e seus Mitos”, da historiadora Lacroix. Embora a contestação do
mito não fosse exatamente inédita, como foi ressaltado, no entanto, dessa vez, veio de
uma forma mais sistemática, através de um livro, algo inédito sobre o tema. Investigava
mais a fundo o que estava por trás dessas construções míticas relativas à fundação
francesa da cidade e buscava responder os por quês da virada historiográfica operada
por Ribeiro do Amaral nas primeiras décadas do século XX.
Lacroix chama atenção para a mudança de versão na historiografia sobre a
fundação da cidade, deixando de ser de origem portuguesa e passando a ser de origem
francesa, a partir das primeiras décadas do século XX. No entanto, para além da
controvérsia da fundação, se de origem francesa ou portuguesa, sua contestação,
assumiu uma dimensão maior, pois suscitou o debate e a reflexão acerca dos mitos e
símbolos que subjazem nossa historiografia. Nesse sentido, assinala Flávio Reis (2002):
A felicidade na formulação não estava em simplesmente recolocar uma
antiga questão controversa na mesa, como se fosse o caso apenas de
contrapor uma versão “verdadeira” a outra mítica, e sim em fazê-lo de uma
maneira que obrigava a pensar exatamente nessa criação de símbolos
afirmadores de um passado singular.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao se usar a expressão “mito fundador” é importante esclarecer o que está se
entendo por isso. Primeiro, o termo “mito”, aqui, não é usado somente no seu sentido
etimológico, grego, “mythos”, no sentido de narração pública de feitos lendários e
imemoriais, mas, sobretudo no seu sentido antropológico, onde essa narrativa funciona
como solução imaginária para tensões, conflitos, contradições que não encontram
maneiras de serem resolvidos no âmbito da realidade. Neste sentido, dizemos que é um
mito fundador porque o mito estabelece uma ligação interna com o passado como
origem, ou seja, um passado que não termina nunca, que se mantém permanentemente
presente e, portanto, não permite o exercício da diferença temporal e da compreensão do
presente enquanto tal. O mito é um “impulso à repetição de algo imaginário, que cria
um bloqueio à percepção da realidade e impede de lidar com ela”. (CHAUÍ, 2000, p. 9)
O problema em estudo reside em se explicar, como o mito fundador da cidade se
constituiu enquanto invenção histórica, enquanto construção cultural e suas conexões
com a historiografia.
É a elite decadentista ludovicense do início do século XX, influenciadas pelo
galicismo então em voga no mundo, que procede a construção e invenção do mito
fundador da cidade que agia também como reforço a outro, mais antigo, o mito da
Atenas Brasileira. Neste sentido, a transição da versão histórica dos séculos XVIII e
XIX para versão mítica do século XX da fundação de São Luís, deve ser compreendida
a partir da necessidade que as elites intelectuais maranhenses tinham de se sentirem
diferentes, únicas, em relação ao resto do país.
O livro de Lacroix permitiu-nos perceber o quão frágil é a historiografia
maranhense do século XX, construída a partir de uma concepção da história do
Maranhão representativa de uma visão acalentada em que a identidade do Estado estava
marcada pela afirmação de um passado glorioso, pela idéia de singularidade 97 do Estado
e seu povo. Ao estudar a criação do mito da fundação francesa, a autora, acabar por
desvelar o traço narcísico e passadista que permeia a historiografia maranhense do
século passado, resultando dessa percepção da história do Maranhão as construções e
invenções míticas e simbólicas. Sendo assim, as implicações contidas no seu livro, vão
além da querela da fundação da cidade e apontam para uma revisão da historiografia
maranhense.
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________________. O que é história cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.
97
Lacroix usa o conceito de Ideologia da Singularidade para explicar o conjunto de idéias que estavam
subjacentes ao mito da fundação francesa da cidade, ou seja, a necessidade que as elites intelectuais
maranhense tinham de serem vistas como diferentes, únicas, singulares. Ver “A Fundação Francesa de
São Luís e Seus Mitos. 3.ª ed. São Luís: EDUEMA, 2008, p. 64 - 69.
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O MARANHÃO DOS NEERLANDESES:
Discursos e causas da conquista de 1641
RESUMO
Análise das causa que levaram à invasão neerlandesa no Maranhão em 1641 tendo em vista o
contexto da Restauração Portuguesa e das negociações de trégua e paz estabelecidas com a
subida de D. João IV. Por meio da análise de discurso encontramos a descrição vantajosa da
conquista do Maranhão pelos bens que produzia, como o açúcar e pela posição geográfica.
Palavras-chaves: Restauração - Trégua - Invasões neerlandesas - Maranhão - Economia
RÉSUMÉ
Cette étude vise à analyser les causes qui ont conduit à l'invasion hollandaise de Maranhão en
1641 dans le contexte de restauration portugaise et les négociations de paix et trêve établies
avec la montée de d. João IV. Grâce à l'analyse du discours, nous trouvons la description de la
conquête du Maranhão en offrant des marchandises produisent, comme le sucre et par
emplacement géographique.
Mots clés : Restauration- néerlandais Invasions- Maranhão- Économie
98
Francis Drake (1540-1596) corsário, explorador e almirante inglês é famoso pelos seus ataques a navios
e estabelecimentos espanhóis no Novo Mundo. A Rainha Elisabeth I o nomeou cavaleiro em 1580 pelos
seus grandes feitos.
Mapa de Geradus Mercator
Os ataques neerlandeses mais pesados e contínuos concentraram-se nas
possessões portuguesas do que nas espanholas. Esta ‘preferência’ ocorreu porque a
América Portuguesa era o elo mais desprotegido do império espanhol: sendo uma
possessão portuguesa tinha uma posição subalterna nas prioridades militares do governo
dos Filipes. (BOXER, 2002, p. 120)
Esses conflitos envolveram muito mais que portugueses, espanhóis e
neerlandeses. Também participaram ingleses, dinamarqueses, congoleses, persas,
indonésios, cambojanos e japoneses, em diversos locais e datas. O Império Espanhol,
espalhado pelos quatro continentes, levou a guerra ibero-holandesa aos setes mares.
(BOXER, op. cit., p. 121)
A assinatura da trégua entre espanhóis e neerlandeses (1609-21) permitiu um
maior conhecimento das condições econômicas, sociais e geográficas do litoral
nordestino, assim como de seus portos e do traçado urbano das cidades, como Olinda,
que se tornavam essenciais para planejar uma invasão. Mas o acordo não foi renovado e
a guerra foi reatada. Por forte insistência da Zelândia, reduto da “indústria do corso”,
em 9 de junho de 1621 a Companhia das Índias Ocidentais (WIC) recebeu seu alvará
detendo como monopólio a conquista, navegação e o comércio em toda a área
compreendida entre a Terra Nova e o estreito de Magalhães, de um lado do Atlântico, e
entre o trópico de Câncer e o Cabo da Boa Esperança, do outro. (MELLO, 2010, p. 13)
A WIC foi fruto do empreendimento de um grupo de comerciantes calvinistas
originários dos Países Baixos espanhóis, que emigraram para a Holanda depois que
Flandres e Brabante foram reconquistados para a causa do catolicismo, em 1580. A
WIC era organizada como “sociedade por ações”. Seus estatutos autorizavam alianças
com os naturais da África e América, construir fortificações, nomear governadores,
funcionários, enviar tropas, contratar soldados e realizar comércio. 99 (LOPEZ, 2002, p.
14)
O incentivo à organização da WIC levou-se em conta o odium theologicum entre
calvinistas e católicos romanos, nesse caso o ódio da Espanha. Assim, investir na
Companhia se tornou algo popular. Os pequenos investidores, mesmo sem poder de voz
e voto100, eram muitas vezes participantes ativos da igreja reformada neerlandesa; e
levavam a guerra contra o catolicismo e a Espanha como um dever religioso a quem
Deus e seu dinheiro podiam ajudar. (LOPEZ, 2002, p. 14)
99
As autoridades civis deviam jurar lealdade à Companhia e aos Estados Gerais. Os oficiais e soldados
também deveriam jurar ao príncipe de Orange. (LOPEZ, 2002, p. 65)
100
Era necessário possuir ao mínimo 4 mil florins em ação para ser diretor. (LOPEZ, 2002, p. 67)
A escolha do Nordeste como lugar de invasão levou em conta que os núcleos de
poder espanhol estavam localizados nos altiplanos101, o que tornava a tarefa mais
complicada, enquanto os núcleos de povoação portugueses estavam ao longo do litoral
ao alcance do poderio neerlandês. O Brasil seria uma ótima localização contra as
operações espanholas no Caribe, as lusas no Oriente e havia a proximidade com as
minas de prata do Peru. (MELLO, 2010, p. 09)
Além de se constituir no elo frágil do sistema espanhol, a escolha do nordeste
como local de invasão foi pela perspectiva de obtenção de lucros pelo açúcar 102 e pelo
pau-brasil. O grande objetivo da WIC era conquistar as áreas açucareiras do Nordeste
do Brasil. O negócio do açúcar se mostrava bastante lucrativo, levando-se em conta o
transporte e a venda de açúcar branco, mascavo, de panela:
Desta terra do Brasil, podem anualmente ser trazidas para cá e aqui
vendidas ou distribuídas 60 mil caixas de açúcar. Estimando-se as mesmas
atualmente em uma terça parte de açúcar branco, uma terça parte de
açúcar mascavo e uma terça parte de açúcar de panela, avaliando-se cada
caixa em quinhentas libras de peso, poder-se-ia comprar no Brasil, sendo
estes os preços comuns nesse país, o açúcar branco por oito vinténs, o
mascavo por quatro e o panela por dois vinténs a libra; e descontando-se
doze florins de carga e de pequenas despesas por cada caixa, ter-se-ia um
lucro de aproximadamente 53 toneladas de ouro. As mesmas 60 mil caixas
de açúcar custam no Brasil, conforme a citada compra, aproximadamente
35 toneladas de ouro que a Companhia das Índias Ocidentais poderá
pagar, em sua maior parte, com mercadorias, lucrando com isso ao menos
30% de vantagem sobre os preços que Portugal costuma cobrar. Donde
resulta que a Companhia obterá ainda um lucro anual de dez toneladas de
ouro. (MELLO, 2010, p. 31)
101
As cidades castelhanas coloniais possuem um traçado geométrico com rigor matemático se comparado
às cidades coloniais portuguesas. Francisco Frias de Mesquita, engenheiro-mor do Estado do Brasil fez
planejamento urbano para Maranhão e Pernambuco, mas, em geral os núcleos de povoação portugueses
se adaptavam as condições locais: “É reconhecida a preferência lusa por cidades localizadas em
acidentes geográficos, protegidas, de um lado, por pântanos e morros, rios e, de outro, por ilhotas
perigosamente próximas a bancos de areia, capazes de conter ânimo das invasões corsárias”.
(CARDOZO ; CHAMBOULEYRON, 2009, p. 37)
102
Para manter a conquista ultramarina americana (que era ameaçada por invasores estrangeiros) era
necessário ocupar produtivamente, pois, seria a única forma estável e duradoura de colonização. Esse
produzir tinha que ser algo que a terra estivessem em condições de fornecer, que fosse forte no
mercado europeu, que os portugueses já tivessem o domínio da cultura, que a produção e seu valor
superasse as distâncias, a força de trabalho e o investimento. O açúcar se encaixou nesse perfil.
(SODRÉ, 2010, p. 23.)
organizou as gentes para a defesa como julgou conveniente. 103 . Logo que amanheceu,
os neerlandeses tomaram posse das entradas da cidade e chegando à entrada principal
não encontraram resistência. De pronto, se dirigiram à casa do governador Diogo
Furtado de Mendonça que quis reagir intentando pôr fogo nuns barris de pólvora e
empunhando a espada contra os invasores, mas não adiantou.
Devido à prisão do governador Diogo Furtado de Mendonça, se reuniram os
oficiais na última semana de maio de 1624, na Aldeia jesuítica do Espírito Santo, para
escolher o novo governador104, sendo escolhido Mathias de Albuquerque (1580-1647).
Mas esse estava governando a capitania de Pernambuco por seu irmão, Duarte de
Albuquerque Coelho. O bispo D. Marcos Teixeira de Mendonça foi eleito como
capitão-mor e teve logo como iniciativa retomar a cidade e ordenou um sítio informal à
cidade; adotou a “guerra brasílica”, que utilizava do conhecimento do terreno e das
práticas indígenas. Nessa tática foi que o coronel neerlandês Van Dorth, enquanto
estava cavalgando a fim de fiscalizar o forte de São Filipe, foi emboscado e morto
juntamente com o seu trombeteiro. O seu sucessor no comando das tropas, Alberth
Schouten, estava mais preocupado em freqüentar as tavernas e, por isso, não manteve a
disciplina das tropas da Companhia. (SALVADOR, 1989, p. 365)
Logo que o rei Filipe IV da Espanha (III de Portugal), cujo reinado em Portugal
se estende de 1621 a 1640, soube do ataque à Bahia ficou bastante irritado “por entender
que os holandeses por esta via determinavam diverti-lo das guerras que atualmente lhes
faziam em Holanda, ou que, por sustentá-la e acudir aos assaltos que continuamente lhe
faziam na costa da Espanha”. (SALVADOR, 1989. p. 381) Então, Filipe III despachou
ordens para “aprestar suas armadas” e que de Lisboa deveriam sair ajuda não só à
Bahia, mas, às outras capitanias, para que o inimigo não fosse além de onde estava.
Filipe III, para recuperar a Bahia, mandou organizar as armadas em Castela,
Portugal e em Biscaia, uma jornada que ficou conhecida como “Jornada dos Vassalos”.
A armada zarpou de Lisboa em 22 de novembro de 1624, onde foi se reunir em Cabo
Verde com a frota espanhola. No total, a armada foi composta de 52 navios de guerra e
quase 13 mil homens. Em seu comando estava D. Fradique de Toledo, um dos mais
importantes comandantes da marinha Espanhola. Além da esquadra, reuniram-se
Salvador Correia de Sá (1602-1688) e com seus homens do Rio de Janeiro, índios dos
aldeamentos jesuítas de São Vicente e Guanabara e o conde de Bagnuolo, futuro
comandante da guerra contra os neerlandeses em Pernambuco, no ano de 1630.
Na véspera de Páscoa de 1625, Frei Vicente do Salvador relatou que os
neerlandeses viram a armada espanhola e foram se preparar para o combate: os
primeiros retiraram os portugueses que estavam navegando, colocaram navios próximos
aos fortes para impedir a entrada da armada de Filipe III e recomendaram que a
população não saísse de casa. Os neerlandeses, sentindo o prejuízo que poderiam
adquirir, iniciaram uma batalha que durou duas horas e matou muitos da armada de
103
O senhor de terras é autoridade pública e militar em seu território. A Coroa é responsável pela defesa
do mar, pois é área de monopólio que pertence a esta. O senhor não é responsável pela defesa do mar e
a Coroa não é responsável pela defesa terrestre. A população do interior e do litoral estava sempre
organizada para a guerra e a Coroa detinha a defesa com seu poder marítimo. ( SODRÉ, op. cit., pp. 25-
42)
104
Segundo Frei Vicente do Salvador as ordens de El- Rei eram que em caso de morte ou ausência de
Diogo de Mendonça Furtado, Mathias de Albuquerque deveria substituí-lo. Já Varnhagen assinala que
na reunião feita pelos desembargadores na Aldeia, o governador foi considerado morto para o Estado
pela sua prisão e, por isso estava abertas as vias de sucessão, daí escolheu-se Mathias de Albuquerque
como governador. ( VARNHAGEN, 2002, p. 57)
Filipe III. Os franceses da WIC foram os primeiros desertores da tropa. O capitão dos
neerlandeses enfureceu-se e ofereceu recompensa a quem denunciasse outros. Mas as
tropas já estavam exauridas pela má alimentação e pelas punições impostas pelo
comandante, o que culminou numa rebelião e no ato de punir fisicamente o coronel.
(LOPEZ, 2002, p. 29)
Os neerlandeses, percebendo os danos causados pela armada real, decidiram
começar os tratados de paz. No dia 30 de abril de 1625 eles entregaram a cidade de
Salvador:
Os quais, depois de suas conferências, assentaram que os holandeses
entregariam a cidade ao general D. Fradique de Toledo em nome de Sua
Majestade, no estado em que se achava aquele dia 30 de abril de 1625, a
saber: com toda a artilharia, armas, bandeiras, munições, petrechos,
batimentos, navios, dinheiro, ouro, prata, jóias, mercancias, negros
escravos, cavalos, e tudo o mais, que se achasse na cidade de Salvador,
com todos os presos que tivessem, e que não tomariam armas contra Sua
Majestade até se verem em Holanda.
Em torno de 1627, os neerlandeses já circulavam pelo Atlântico Sul com
liberdade e sem grande oposição sobre o Atlântico Sul. Os ataques à costa brasileira
tornaram-se cada vez mais freqüentes: em 1627 atacaram novamente a Bahia; no ano
seguinte, 1628, atacaram e ocuparam a Ilha de Fernando de Noronha, sendo expulsos
por tropas de Pernambuco em 1629. (LOPEZ, 2008, p. 130)
Em 14 de fevereiro de 1630, os neerlandeses desembarcaram na praia do Pau
Amarelo e tomaram Olinda. A‘opção’ pela capitania de Pernambuco demonstra ainda o
desejo pelo domínio da produção açucareira pelos comerciantes e capitalistas de
Flandres e Brabante e judeus sefardistas portugueses. A arquitetura da invasão ocorreu
através das informações sobre as precárias condições de segurança da capitania.
(LOPEZ, 2008, p. 130)
Na mesma semana de fevereiro de 1630, os invasores neerlandeses marcharam
rumo ao Recife. O irmão do governador e donatário, Mathias de Albuquerque, tentou
impedir o avanço do exército sobre a cidade, mandando queimar 24 navios carregados
com 8 mil caixas de açúcar, além de pau-brasil, tabaco, algodão; e incendiou os
armazéns causando um prejuízo em torno de 1milhão e 600 mil cruzados. (LOPEZ,
2008, p. 130)
Duas semanas depois, no mês de fevereiro de 1630, os neerlandeses tinham
tomado Recife. Os portugueses, juntamente com Mathias Albuquerque, fugiram para o
interior, constituindo a resistência no Arraial do Bom Jesus que ficava entre Recife e
Olinda. (LOPEZ, 2008, p. 130)
O exército dos invasores tentou durante dois anos dissolver a resistência dos
habitantes em vão. Devido a este impasse, os neerlandeses tinham o domínio marítimo e
da cidade, enquanto os portugueses dominavam as roças e a cultura dos mantimentos.
Em 1633, a WIC mudou a estratégia de guerra e começou um lento, mas progressivo,
processo de conquista da zona açucareira; e o colapso da resistência deu-se quando o
Arraial do Bom Jesus e o Cabo de Santo Agostinho foram tomados, em 1635.
Em 1636, a WIC resolveu oferecer o cargo de governador-general da Nova
Holanda a Maurício de Nassau (1604-1679).105 A Companhia intentou enviar junto com
o novo governador uma armada composta de 32 naus e um exército que variava entre 7
mil a 8 mil homens para conquistar a região. Nassau derrotou a resistência de Porto
Calvo e capturou o forte de Povoação em fevereiro com exército neerlandês que
avançou por terra, ajudado pelos navios comandados pelo almirante Lichthart que
carregavam artilharia e suprimentos. Os ibero-brasileiros tiveram que recuar para a
margem sul do Rio São Francisco. (LOPEZ, 2008, p. 133)
Durante o seu governo, Maurício de Nassau tentou remontar o sistema de
produção açucareira e fazer alianças com os senhores de engenho que haviam ficado
nos territórios que estavam sob a posse dos neerlandeses oferecendo-lhes igualdade e
fidelidade à WIC:
Para apaziguar os senhores de engenho que permaneceram nos territórios
dos holandeses, Nassau prometeu-lhes igualdade perante as leis e liberdade
de consciência. Se jurassem fidelidade à Companhia, teriam o direito de
portar armas para defender-se dos bandidos, poderiam voltar para suas
terras e reconstruir seus engenhos. (LOPEZ, 2008, p. 134)
O conde de Nassau-Siegen logo percebeu que sem ajuda dos senhores de
engenho seria impossível que a empresa do açúcar desse certo, pois os neerlandeses não
sabiam fazer açúcar. Então, a WIC concedeu empréstimos tanto aos seus como aos
senhores de engenho para que remontassem o sistema produtivo. (LOPEZ, 2008, p.
134)
Ainda em seu governo, a Nova Holanda experimentou um curto período de paz
de menos de 3 meses, um avanço no crescimento urbano, Recife e a Cidade Maurícia
em 1644 tinham mais de 2 mil casas e a população mais cosmopolita da América.
Recife se tornou base para empresas à costa da África ocidental ao Caribe. Contrariando
as ordens dos Heren XIX, empreendeu ataques aos entrepostos de tráfico de escravos
africanos em Angola, Guiné que eram controlados pelos portugueses. (LOPEZ, 2008, p.
135)
Os ataques não cessaram. Em agosto de 1637, os neerlandeses tomaram a
Fortaleza de São Jorge da Mina para obter o controle do tráfico internacional de
escravos, mas não detiveram o controle do tráfico internacional com a tomada de São
Jorge da Mina. Tanto é que partiram para conquistar Angola anos depois. Em dezembro
deste mesmo ano construíram uma fortificação no Ceará. Em 1638 Nassau reuniu uma
frota de 36 navios e 3.600 europeus e índios no Recife e zarpou em 8 de abril para
conquistar a Bahia . Chegaram no alvo da incursão no dia 16 de abril devido às
correntezas favoráveis e aportaram sem nenhuma resistência ibero-portuguesa no porto
de São Brás. No dia 17 de abril de 1638, os neerlandeses não atacaram. Nassau se
preocupou com a alimentação dos soldados, mas, ao saber por um prisioneiro de um
desfiladeiro num engenho próximo, mandou um dos capitães fazer o reconhecimento
que lá descobriu o inimigo ibero-português entrincheirado. (MELLO, 2010, p. 189)
105
Johan Maurits, conde de Nassau-Siegen nasceu no condado alemão de Dillemburgo. Era membro de
uma das famílias mais antigas e tradicionais da Europa. Teve uma educação humanista e protestante em
Herborn, Basiléia e Genebra. Com o início da Guerra dos Trintas anos interrompeu os estudos e iniciou
sua carreira militar sob a tutela de seu tio que era stathouder da Frísia. Dois anos depois se alistou como
voluntário no Exercito dos Estados Gerais da Republica dos Países Baixos. Suas atuações no cerco a Den
Bosch (1629), captura de Maastrich (1632) e principalmente na tomada de Schenckenshans (1636) lhe
garantiu uma reputação em toda a Europa.
Essa notícia causou uma mudança nos planos de Nassau. De logo, ele mandou as
tropas ficarem em ordem de batalha sobre um morro que ficava de frente ao inimigo
ibero-português; e ao capitão Jan Mast ordenou que fosse para a cidade acompanhado
de 14 navios neerlandeses e ancorasse longe do alcance dos tiros rivais. (MELLO, 2010,
p. 189)
No dia 18 de abril de 1638, os ibero-americanos ergueram proteção contra os
tiros dos neerlandeses perto do Convento do Carmo. Com esta proteção, os lusos não
podiam defender o convento e Nassau mandou logo tropas para que o tomasse. Em 19
de abril de 1638, os neerlandeses avançaram pela cidade sempre tendo em vista o
inimigo nos desfiladeiros e rios, mas sempre em retirada. No dia 20 chegaram ao
acampamento, que distava pouco das fortificações dos ibero-portugueses que não os
atacaram, apesar do poderio militar. No mesmo dia, os ibero-portugueses abandonaram
o forte e os neerlandeses ocuparam-no. No dia 21, Nassau mandou o major Van den
Brande para conquistar o forte São Felipe e no dia 22 conquistaram o forte São
Bartolomeu.
Os desertores e prisioneiro neerlandeses, segundo Nassau, tiveram um papel
importante, pois contaram aos ibero-portugueses o quanto o contingente invasor era
inferior, causando uma verdadeira sucessão de ataques. Ao perceber que o intuito de
posse não seria alcançado, Nassau convocou Johan Gisselingh e todos os outros
comandantes que em reunião, visto as condições das tropas, resolveram retornar à
capitania de Pernambuco. No dia 25 de maio os neerlandeses saíram da Bahia.
106
Os Países Baixos foram domínio dos Habsburgos espanhóis desde 1515 com Carlos V (1500-1558) e
passaram a Filipe II, seu filho (1527-1598). A repressão religiosa feita ao calvinismo, doutrina reformada
muito difundida nessa região, levou ao movimento de emancipação dos Países Baixos do Norte em 1568
que passou a ser chamada de República das Províncias Unidas do Norte, mas, foi só reconhecida em 1648
pela Espanha. Esta luta ficou conhecida como Guerra dos Oitenta Anos. (PEREIRA, 2012, pp. 21-22)
Este Gedeo Morris, era capitão, foi preso pela prática corso na região e cumpriu
pena de oito anos de prisão no Grão-Pará e, quando retornou às Províncias e apresentou
a possibilidade de invasão ressaltando a extensão de quatrocentas léguas de costa, com
muitas especiarias e habitadas por no máximo 1.500 portugueses que estavam dispersos
pelo Maranhão , Cametá e Grão-Pará. Acentuou também que os gentios não se davam
bem com os lusos. (MEIRELES, 1991, p. 75.)
Segundo Barléus as razões da conquista do Maranhão eram que primeiramente
se alargariam as conquista da Companhia reforçando as anteriores. Os gentios com o
tempo auxiliariam e muitos e acostumariam aos costumes holandeses. Quanto ao
comércio, seria uma desvantagem aos portugueses e a localização geográfica era ótima
para incursões nas “ilhas do Mar Setentrional, Hispaníola, Cuba, Jamaica, Pôrto Rico e
as costas do continente ocidental”. O clima era convidativo “pela salubridade do clima,
pela urbedade do solo para prodizir açpucar, algodão gengibre e tabaco, pelo comércio
do sal e pela esperança de minas”. (BÁRLEUS, 1940, p. 232.)
Mário Meireles acentua que em 1620 o Maranhão estava em segundo lugar na
produção de açúcar (16, 36%) no Erário Real do Brasil. Somente abaixo da Bahia que
detinha 31, 2%. (MEIRELES, 1991, p. 74)
Assim, em 25 de novembro de 1641 chegou a São Luís e aportou na região do
Desterro uma esquadra neerlandesa composta de 18 navios de guerra, sob o comando do
almirante Johan Cornellizon Lichthardt e o coronel Koen comandando a tropa terrestre
de dois mil homens enquanto a população assistia a tudo, bestializada.
Considerações finais
Os neerlandeses ocuparam o nordeste pelo desejo de conquistar as áreas
açucareiras: primeiramente a Bahia e Pernambuco que eram os principais centros desse
sistema produtivo. Logrado sucesso em Pernambuco e não na Bahia procuraram invadir
todo o território do Nordeste atual. A Restauração Portuguesa abriu a possibilidade de
reatar as relações perdidas pelo domínio espanhol, mas, antes da paz definitiva era
necessário conquistar o Maranhão.
Referências Bibliográficas
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no brasil e noutras partes sob o govêrno do illustrissimo João Maurício conde de
Nassau.. Rio de Janeiro, Ministério da Educação, 1940.
Berredo, Bernardo Pereira. Annaes Históricos do Estado do Maranhão. Vol. II.
Florença: Tipografia Barbera, 1905.
BOXER, Charles. O império Marítimo Português, 1415-1825. São Paulo: Companhia
das Letras, 2002.
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colonial". Revista de Estudos Amazônicos: v. IV, 2009, p. 37-51.
LIMA, Carlos de. História do Maranhão. Vol. 1. 2 ed. São Luís: Instituto Geia, 2006.
LOPEZ, Adriana. Guerra, açúcar e religião no Brasil dos Holandeses. São Paulo:
Editora SENAC São Paulo, 2002.
_____________. História do Brasil: uma interpretação. São Paulo: Editora SENAC
São Paulo, 2008.
MEIRELES, Mário. Holandeses no Maranhão (1641-1644). São Luís: PPPG,
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Classics, 2010.
___________________. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. 9ª Edição,
Campinas, SP: Pontes Editores, 2010.
SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. 2ª Ed. São Paulo: Expressão
Popular, 2002.
PEREIRA, Joyce Oliveira. Em nome do Deus dos Exércitos: a teologia política
Antônio Viera no contexto das invasões neerlandesas na Bahia (1624-1641). 2012.
Monografia (Graduação em História) – Universidade Federal do Maranhão, São Luís,
MA.
VAINFAS, Ronaldo. Jerusalém Colonial: judeus portugueses no Brasil Holandês. Rio
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Trattado das tregoas e suspensao do todo o acto de hostilidade e bem assi de
navegaçao, commercio e juntamente socorro, feito começado e accabado em Haya
de Hollande a Xij de iunha 1641(..). Haia : Em caza da Viuva e Erdeiros de Ilebrandt
Iacobson van Wouw, Imprimidor Ordinario dos muy altos e poderosos Senores Estados
Generais, 1642. Disponível em <
http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/01936100> Acesso em 07/07/2012 às
12:02.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO
DO MARANHÃO
A CIDADE DO MARANHÃO –
UMA HISTÓRIA DE 400 ANOS
2011 – 2012
EXPOSIÇÃO
FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE
CURADORIA:
ANTONIO NOBERTO; CLORES HOLANDA; JOANA BITTENCOURT
05/SETEMBRO/2012
PALÁCIO CRISTO REI – 08:00 ÀS 18:00 HORAS
SEMINÁRIO 6 - SÃO LUÍS FOI FUNDADA POR QUEM? – CONCLUSÕES
POSSÍVEIS
08:00 – Abertura
EXPOSIÇÃO FRANÇA EQUINOCIAL PARA SEMPRE
CURADORIA: ANTONIO NOBERTO; CLORES HOLANDA; JOANA BITTENCOURT
09:30 – Debatedor:
ALEXANDRE FERNANDES CORREA – IHGM; UFMA/CRISOL
- A FUNDAÇÃO MÍTICA DE CIDADES: Elementos para a ritanálise
da Bigfesta dos 400 anos de São Luís.
10:30 – Debate com a plenária
organizado e suas conexões com o Poder Público: comentários à Lei nº 9.034/95: considerações
críticas. Rio de Janeiro: Impetus, 2000. p. 120.
112
KENNEY, Dennis J.; FINCKENAUER, James O. Organized crime in America. Belmont, California:
Wadsworth, 1994. p. 231.
113
MITO. In: HOUAISS; VILLAR. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss
da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. p. 1300.
origem portuguesa na formação histórica do Brasil se via assimilado a uma ‘invasão’:
tal era bem o caso das invasões ‘francesa’ e ‘holandesa’.” 114
O “Relatório de Alexandre de Moura sobre a expedição à Ilha do Maranhão e
expulsão dos franceses”, datado de 24 de outubro de 1616 e dirigido ao monarca
espanhol (ver ANEXO O), é um bom exemplo da retórica portuguesa de demonização
dos súditos de Maria de Médicis, acoimados de “corsários” e “hereges”, na condição de
ameaça continuada ao domínio luso no Brasil, nas searas intimamente ligadas da
soberania e da evangelização:
São terras que V. Magde deve mandar povoar e aproveitar asi para tirar ao
Demonio tantas almas como ali possue E ouvera de possuir se estivera em
poder de francezes hereges, como tambẽ pelo que se pode esperar de
proveito a sua real fazenda, e quando nenhũa destas, pelas tirar de mãos de
estrangeiros, que nellas hião fazendo hũ novo R no sendo continua escala de
cosairos que ali se hião refazer de suas largas navegaçõis E a muita
seguridade cõ que ficão a costa de guine do Brazil E a de Indias que dali
infestavão.115
Ainda na primeira metade do século XVII, papéis da burocracia espanhola, hoje
abrigados no Castelo de Simancas, referentes ao tempo da União das Coroas Ibéricas,
referiam-se amiúde a La Ravardière como herege, a exemplo do “Parecer a propósito da
mercê a ser concedida a La Ravardière”, de 11 de junho de 1617 (ver ANEXO Q), do
“Parecer do Conselho de Estado sobre duas consultas do Conselho de Portugal”, de 20
de junho de 1617, e do “Parecer do Conselho de Estado ao rei Felipe IV”, de 3 de
fevereiro de 1623.116
Bernardo Pereira de Berredo, governante do Maranhão de 1718 a 1722, na sua
obra Anais históricos do Estado do Maranhão, originalmente publicado em 1749, é
feraz em alusões críticas à suposta ilegitimidade política e religiosa dos franceses. Em
um trecho, ao mesmo tempo em que elogia François de Razilly por seu “zelo mais
católico” ao resistir às “diabólicas sugestões” do “mortal inimigo do gênero humano” e
primar pela defesa da afirmação do catolicismo na França Equinocial, censura Daniel de
la Touche por adotar a “errada seita de Lutero” e Claude d’Abbeville por não abordar,
em função de “culpável política”, a deplorável presença, na colônia, de muitos
protestantes, levados por La Ravardière. 117 Em passagem ulterior, ataca os dois líderes
da expedição pela “notória violência do seu procedimento”:
114
MARTINIÈRE, Guy. São Luís, capitale du Maranhão, capitale rêvée de la France équinoxiale: the
dream capital of equinoctial France. História, Franca, v. 30, n. 1, p. 254, June 2011. Available from
Internet: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
90742011000100012&lng=en&nrm=iso>. Cited: 06 July 2012. (Tradução nossa). Esta é a frase em
francês: “[...] toute allusion à un évènement autre que d’origine portugaise dans la formation
historique du Brésil se voyait assimilé à une ‘invasion’: tel était bien le cas des invasions ‘française’
ou ‘hollandaise’.”
115
Ver “Relatorio de Alexandre de Moura sobre a expedição á ilha do Maranhão e expulsão dos
Francezes” em BIBLIOTHECA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO. Annaes. Rio de Janeiro:
Officina Typographica da Bibliotheca Nacional, 1905. v. 26, p. 202.
116
Ver pareceres citados em DAHER, Andrea (Org.). Papéis da conquista do Maranhão (1612-1624).
São Luís: Edições AML, 2009. p. 42-43, 95.
117
BERREDO, Bernardo Pereira de. Anais históricos do Estado do Maranhão, em que se dá notícia do
seu descobrimento, e tudo o mais que nele tem sucedido desde o ano em que foi descoberto até o de
1718: oferecidos ao Augustíssimo Monarca D. João V. Nosso Senhor. 4. ed. Rio de Janeiro: Tipo
Editor, 1988. p. 54.
Vendo-se então os Senhores de la Ravardière, e Racily no domínio pacífico
do Maranhão, formaram novas máquinas para dissimular a notória
violência do seu procedimento; porque fazendo persuadir a todos os índios
pelos seus intérpretes, que para melhor se assegurarem na proteção da
França deviam procurar, que o real estandarte da nação fosse por eles
arvorado naquele mesmo sítio: reconhecido já como cabeça da colônia
[...].118
Mais adiante, o governador português desaprova Razilly – no episódio do regresso
do nobre à França em companhia dos embaixadores indígenas a serem apresentados ao
rei – por seu empenho na preservação da ocupação francesa no Brasil setentrional,
enxergada como usurpadora:
Não havia indústria, de que se não valessem os franceses para se
conservarem no intruso domínio do Maranhão; e Racily, que era nele um
dos mais empenhados, sabendo-se servir para o mesmo projeto da rudeza
dos índios, levava seis na sua companhia ainda pagãos, com o título de
embaixadores a el-rei cristianíssimo seu amo [...].119
Sobre La Touche, diz que, indubitavelmente, seria “dos mais ilustres de toda a
França, pelas ações da sua vida, principalmente nos sucessos da guerra com o exercício
de grandes empregos, se na parte mais essencial da imortalidade lho não escurecera com
merecida lástima o detestável erro do luteranismo.”120
Comentando algumas dessas passagens, Andrea Daher, na apresentação ao livro
Papéis da conquista do Maranhão (1612-1624), intitulada “A conquista do Maranhão
em letras”, destaca que, nas letras portuguesas, a França Equinocial foi retratada como
um fator de incômodo dentro da concepção do império lusitano, além de caracterizar a
onda nacionalista e bibliófila do século XIX sobre a “invasão francesa” do Maranhão e
a sua influência na historiografia do século XX:
Nas letras portuguesas, foi como ‘elemento perturbador’ do estado de
comunhão no império luso que foi representada a França Equinocial. Na
História do Brasil, redigida por volta de 1627, frei Vicente do Salvador
representa a heresia dos franceses do Maranhão [...].
Em meados do século XVIII, os Annaes Históricos do Estado do Maranhão,
de Bernardo Pereira de Berredo, veicularam igualmente as mais severas
críticas à tentativa de colonização francesa, e particularmente ao relato de
Claude d’Abbeville. Berredo acusou o capuchinho de [...] silenciar sobre a
‘diversidade de religião’ da colônia francesa. Calcada ainda em
documentos portugueses, a crônica histórica de Berredo visava denunciar
não apenas o caráter herético, mas também usurpador da empresa [...].
Menos de um século mais tarde, o público teve acesso, pela primeira vez,
aos documentos em língua espanhola e portuguesa que tratam da derrota
francesa, com a publicação pela Academia das Ciências de Lisboa, em
1812, da coletânea intitulada Colleção de notícias para a história e
geografia das nações ultramarinas que vivem nos domínios portuguezes...,
em que se pode ler a ‘Jornada do Maranhão por ordem de S. Magestade
feita o anno de 1614’ de Diogo de Campos Moreno. A voga nacionalista e
118
Ibidem, p. 61.
119
Ibidem, p. 63.
120
Ibidem, p. 83.
bibliófila do século XIX permitiu ainda que o dossiê sobre a ‘invasão
francesa’ do Maranhão se enriquecesse, exatamente um século depois, na
primeira década do século XX, com toda uma série de documentos,
divulgados pela iniciativa do Barão de Studart e da Biblioteca Nacional do
Rio de Janeiro.
Nesses papéis, redigidos à época por capitães, missionários e cronistas
portugueses, a vontade de não deixar transparecer vestígios da presença
efetiva dos franceses no Maranhão é manifesta, e perfeitamente compatível
com a construção da positividade da representação da empresa francesa
como ‘invasão estrangeira’ pelos historiadores e bibliófilos que os
tornaram públicos, quase três séculos depois, na qualidade de peças para a
composição da história pátria.121
Não somente estes relatos escritos por militares, administradores, religiosos e
cronistas lusitanos ou lusófilos, produzidos no período colonial, notadamente
francófobos, inspiraram toda uma historiografia posterior, mas também Portugal, livre
da União Ibérica, submeteu o Brasil a um rígido controle sobre qualquer manifestação
de cunho cultural, chegando, inclusive, a reprimir os esforços de implantação da
imprensa em Pernambuco e no Rio de Janeiro. Jomar Moraes assim contribui sobre o
tema:
Ao lado dessas circunstâncias é preciso não esquecer que o obscurantismo
reinante em Portugal impunha uma política de severa repressão ao
desenvolvimento de qualquer manifestação cultural na Colônia, encarada
principalmente como fonte supridora das necessidades materiais do reino.
São bastante conhecidos os rigores com que Portugal reprimiu as tentativas
de implantação da imprensa em Pernambuco e no Rio de Janeiro. Por outro
lado, a difusão cultural através dos livros sofria as obstaculizações de uma
rigorosa lista proibitiva cuja inobservância importava em sanções legais.
Mesmo assim, a partir do século XVII têm início na Colônia as primeiras
manifestações literárias, como pálido prenúncio de uma atividade que só
encontraria a plenitude de seu desenvolvimento depois da Independêcia
(sic).122
No Maranhão, a situação não era diferente, como discorre Rossini Corrêa:
O Convento das Mercês e o Seminário de Santo Antônio contaram com
livrarias numerosas, compostas por milhares de volumes, em uma colônia
proibida de ter tipografia, por sucessivas e ameaçadoras Ordens Régias,
dispostas sempre a reafirmarem a necessidade das licenças da Inquisição e
do Conselho Ultramarino, para os livros serem impressos na metrópole,
sob o pretexto de que, nela, os serviços gráficos eram mais baratos, não
havendo necessidade de realização de despesas superiores na Colônia do
ultramar americano...
Enfrentar o desafio da censura régia poderia resultar prisão e as penas
decorrentes dessa ousadia literária deveriam ser cumpridas em Portugal. A
121
DAHER (Org.). Papéis da conquista do Maranhão (1612-1624), p. VII-VIII. Ver igualmente
DAHER, Andrea. O Brasil francês: as singularidades da França Equinocial, 1612-1615. Tradução de
Albert Stückenbruck. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. p. 27-28.
122
MORAES, Jomar. Apontamentos de literatura maranhense. 2. ed. São Luís: Sioge, 1977. p. 4.
Espanha, ibérica como os lusitanos, colonialista como os portugueses, não
foi, como Portugal, refratária à fundação de universidades coloniais. À
diferença do Peru e do México, o Brasil, só muitíssimo tardiamente
conheceu a experiência universitária. Refeudalizada a sociedade
portuguesa, com perseguição profunda ao capital mercantil judaico, houve
um vigoroso regresso à mentalidade do medievo ossificado, cuja tradição
moderna estaria presente no espírito da Contra-Reforma, diretivo da
formação social brasileira.123
E se a Independência, em 1822, abriu caminhos para a liberdade de expressão
literária e historiográfica no Brasil, não nos esqueçamos de que apenas no dia 28 de
julho de 1823 foi solenemente proclamada a adesão do Maranhão à Independência do
Brasil, quase um ano depois da proclamação desta última, dado que o Maranhão “foi
antes um reduto da lealdade à Coroa, graças a seu contato mais íntimo, até às vésperas
da independência, com a metrópole do que com o Brasil”, de forma que, neste estado
colonial, a influência lusitana era tão grande que a adesão se fez mediante “ação de fora
para dentro, forçada, haja vista que em nossa província não se haviam ainda oferecido
manifestações bastantes que nos permitam reconhecer que aqui tenha havido,
internamente, clima para uma adesão espontânea imediata”, conforme ensina Mário
Meireles.124
Por conseguinte, até pelo menos o primeiro quartel do século XIX, eram
praticamente inexistentes ou muito precárias as condições para que prosperassem no
Maranhão interpretações favoráveis ao reconhecimento do papel de fundadores da
cidade de São Luís, desempenhado por Razilly e La Ravardière. Também a França
contribuiu para lançar um manto de obliteração sobre a rica memória da França
Equinocial nos dois primeiros séculos que se seguiram à queda da colônia do Maranhão.
Embora tenha logrado a permissão real para a impressão de sua Suitte de l’histoire des
choses plus memorables advenuës en Maragnan, és annees 1613 & 1614, Yves
d’Évreux não teve a satisfação de ver a obra chegar ao público, porquanto os seus
exemplares foram destruídos ainda nas oficinas do editor François Huby, por ordens
superiores, no interesse de não comprometimento da aliança franco-hispânica, cujo
ápice foi o casamento do Rei Luís XIII com Ana d’Áustria em novembro de 1615.
Afortunadamente, François de Razilly conseguiu salvar um exemplar, porém mutilado,
com que ele presenteou o soberano em 1617. O livro foi parar na Biblioteca Sainte-
Geneviève, até ser finalmente encontrado pelo historiador Ferdinand Denis em 1835,
que providenciou a sua publicação, em edição comentada, em 1864. Outros dois
exemplares foram salvos. Todavia, mesmo do original conservado na Biblioteca Pública
de Nova York, considerado o mais completo, faltam, por exemplo, na seção do Primeiro
Tratado, parte do importantíssimo Capítulo III, dedicado à construção do Forte São
Luís, a totalidade dos capítulos IV e V e o começo do Capítulo VI, além de um número
indeterminado de capítulos finais, integrantes do Segundo Tratado. A perda é
deplorável, principalmente para os anais da História, conquanto em nada prejudique o
reconhecimento das origens gaulesas de São Luís, suficientemente estabelecidas no
conjunto dos registros, tanto franceses quanto ibéricos, disponíveis. Deve ser
sublinhado, por outro ângulo, que os capítulos desaparecidos talvez viessem a oferecer
123
CORRÊA, Rossini. Atenas Brasileira: mito & realidade: a arte de tirar leite das pedras. Jornal
Pequeno, São Luís, 3 mar. 2012. Suplemento Cultural & Literário JP Guesa Errante, p. 3.
124
MEIRELES, Mário Martins. História do Maranhão. 3. ed. São Paulo: Siciliano, 2001. p. 206.
ainda mais elementos sobre os progressos da colônia, pois Yves d’Évreux permaneceu
no Maranhão por dois anos, muito mais do que os quatro meses de Claude d’Abbeville.
Andrea Daher evidencia que os portugueses conquistaram o Maranhão não apenas
pelas armas, mas igualmente pelas letras, e que estes promoveram uma autêntica
“fundação letrada” da cidade de São Luís, por intermédio de textos como os de Luiz
Figueira e Simão Estácio da Silveira:
No lastro da fundação do Estado do Maranhão, em 13 de junho de 1621,
toda uma série de textos, publicados em Portugal, veio coroar a vitória
contra os franceses e integrá-la à propaganda xenófoba. O Maranhão seria
definitivamente português, por armas e por letras.
A ‘proto-história’ da cidade de São Luís foi marcada por uma verdadeira
caça ao estrangeiro invasor baseada, primeiro, no avanço das expedições
militares portuguesas e, em seguida, na destruição do sistema de alianças
comerciais franco-tupi, pela substituição vitoriosa do modo português de
colonização e de evangelização das populações locais. Todas essas
estratégias político-militares não deixaram, evidentemente, de ser
corroboradas por estratégias letradas.
Não é difícil constatar, em perspectiva histórica, que a fundação territorial
se dá tanto pela ocupação militar quanto pelos discursos. A noção de
‘fundação’ reativa a tópica muito antiga das letras e das armas, presente
especialmente em discursos demonstrativos coloniais que louvavam ou
vituperavam, prenunciando através da tópica o destino heroico da
colonização levada a cabo por portugueses grandiosos na prudência da
administração. Dessa forma se deu a ‘fundação letrada’ de cidades como
São Sebastião do Rio de Janeiro e, pouco mais de meio século mais tarde,
São Luís do Maranhão.
Relatos como os do jesuíta Luiz Figueira ou o de Simão Estácio da Silveira,
ainda nas primeiras décadas do século XVII, vieram preencher essa função
de fundação letrada de São Luís. Tal como o poema épico De Rebus Gesti
Mem di Saa e o auto de Na festa de São Lourenço, de José de Anchieta, que
representam a providencial vitória lusa sobre o invasor francês no Rio de
Janeiro, esses relatos veiculam representações de hereges usurpadores,
inimigos do Império e de Deus. Neles, o recurso narrativo de amplificatio,
consistindo na repetição de um episódio por vezes já descrito em relatos
anteriores, acrescido de sentenças laudatórias, sustenta a fundação letrada
na chave providencialista do Estado monárquico português.125
125
DAHER (Org.). Papéis da conquista do Maranhão (1612-1624), p. XXI-XXII.
Ela sublinha que os textos do jesuíta Luiz Figueira, nascido em Almodóvar em
1574, assemelham-se às crônicas religiosas, mais próximas de “relatos míticos do que
históricos”, e que a fundação letrada da cidade de São Luís pelos portugueses implicava
o esforço de estabelecimento da ilegitimidade dos colonizadores franceses que os
antecederam na ilha, enquadrados como hereges e usurpadores, e a necessidade de
apagamento dos traços das realizações do “invasor” derrotado:
A partir da retomada do Maranhão aos franceses, a fundação da nova
cidade deveria ser feita com base na negação da legitimidade do “invasor”.
Isto significa a tentativa de apagar as marcas deixadas pelo estrangeiro
para dar lugar à ocupação legítima. Nesses textos, aparecem veiculadas as
imagens do francês como invasor herege e usurpador, como aquele que
deveria ser rechaçado, dando lugar, evidentemente, ao legítimo
conquistador.126
A autora aponta a relevância desses escritos para as elites sociais lusitanas dos
séculos XVI e XVII, dentro de um processo de formação de um sentimento nacional:
Para o caso específico dos escritos de Luiz Figueira, consideramos que se
inscrevem também em uma trajetória que privilegia as descrições escritas
que, segundo Bethencourt, ganharam uma maior importância nos séculos
XVI e XVII entre a população letrada, pois as informações sobre o
território português faziam parte de uma movimentação das elites sociais
no sentido de conhecer Portugal através dessas representações escritas.
Desta forma, esses textos adquiriram grande importância para a elite
letrada da época, inserindo-se em um possível conjunto de gêneros em voga
no período.
Observando o modo como as elites sociais se movimentaram no processo de
formação de um sentimento nacional português, Bethencourt aponta para a
importância das descrições territoriais escritas que ganharam força neste
contexto [...].127
Ela também ressalta que a legitimidade da conquista militar lusa do Maranhão
encontrava justificação na ideia de que Portugal era especialmente privilegiado por
Deus na medida em que cumpria a Sua vontade e combatia os hereges gauleses,
“invasores” da terra destinada a ser incorporada ao reino divino, numa inseparável
associação entre os interesses da Coroa e da religião, regida pelo binômio formado pelos
símbolos da espada e da cruz, o que se traduzia na escrita jesuítica de Luiz Figueira:
Assim, acreditava-se que Portugal dispunha de uma particular proteção
divina, que se caracterizava por uma espécie de contrato entre Deus e os
lusos onde estes eram protegidos na medida em que cumpriam os seus
mandados. A partir dessas considerações, percebemos que a empresa da
conquista do Maranhão está inserida em uma ordem teológico-política que
assegura a legitimidade do empreendimento português através dos
interesses da fazenda e da fé, que são indissociáveis neste momento. A
empresa colonial era guiada por uma finalidade superior, que transcendia
sua dimensão prática e instrumental e, mais ainda, porque ‘a expansão
126
MENEZES, Aline Bezerra de. Os escritos do Padre Luiz Figueira e a fundação de São Luís no
Maranhão. Mneme – Revista de Humanidades, Caicó, v. 7, n. 16, p. 129, jun./jul. 2005. Disponível em:
<http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/mneme/article/view/300/276>. Acesso em: 24 ago. 2012.
127
Ibidem, p. 132.
portuguesa, inscreve-se no sentido meta-histórico da história – a dilatação
do reino de Deus – é não só querida e aprovada, mas até
sobrenaturalmente apoiada pelas forças celestes.’ Assim, os relatos de
aparições de santos durante as batalhas com franceses e os apelos ao
sagrado eram utilizados para explicar, justificar e legitimar a conquista do
Maranhão, configurando uma batalha pelas armas e pelas letras.
[...]
A conquista da América – circunscrita em uma ordem teológico-política
onde Estado e religião não são esferas separadas – teve como uma das
principais bases de apoio a atuação do braço espiritual das coroas
ibéricas.
[...]
Ao longo do texto Luiz Figueira relata várias ocasiões em que Deus
beneficiou os portugueses em detrimento dos hereges, provando assim que a
Divina Providência os acolhia.
[...]
Ainda com o intuito de agradar o destinatário, Luiz Figueira afirma que
Deus protege a colônia do Maranhão como um hortelão ao seu jardim,
resguardando-o dos perigos e confiando nos frutos que são as virtudes
cristãs e a propagação da fé. Desta maneira, percebe-se que há também
expressa a tópica do alargamento do império, pois quando a fé cristã se
expande aos homens através dos portugueses, alarga-se também o poder
temporal sobre os territórios.
[...]
Podemos observar, também nesse trecho, que a colônia do Maranhão
estaria defendida por Deus, primeiramente pela atuação das ordens
religiosas e também por meio das armas do rei que lutam contra os
inimigos. Esses inimigos são tidos por hereges que agem como animais,
tentando destruir a planta da boa fé católica recém-implantada no
Maranhão. Assim, observamos que o binômio cruz e espada marcou
definitivamente a conquista da América portuguesa.
[...]
Luiz Figueira compara os sucessos dos portugueses no Maranhão com a
punição de Deus sobre os filhos de Israel e conclui que, se houve sucessos
no Maranhão contra holandeses e franceses, significa que Deus favoreceu e
apreciou o andamento da colônia. Mais uma vez observa-se a interpretação
dos acontecimentos como sinais da vontade divina e a direção dos escritos
do gênero histórico, no sentido de ensinar através de relatos de fatos que
sempre comunicam exemplos pios de conduta.
[...]
A partir do estudo dos escritos de Luiz Figueira, identificamos suas
principais tópicas e percebemos as linhas de um projeto colonial português
para a fundação da cidade cristã no Brasil. A escolha de São Luís para este
estudo se dá por dois motivos: em primeiro lugar, porque foram grandes os
obstáculos para se implantar a colônia do Maranhão, uma vez aniquilado o
projeto da França Equinocial. Em segundo lugar, pela relevância e
repercussão que esses episódios tiveram nas letras seiscentistas, em
documentos administrativos, cartas, crônicas, histórias etc.
Tais escritos comunicam a exemplaridade dos fatos, tanto os bons quanto
os maus. No caso do Maranhão, o exemplo a ser seguido era o da
combatividade e lealdade dos homens em torno da missão de expulsar os
franceses e fundar uma cidade católica. Os maus exemplos estavam
relacionados à falta de cuidados espirituais com o gentio e do que isso
poderia acarretar de prejuízos para a Coroa e também para o serviço de
Deus.128
Por derradeiro, Aline Menezes antecipa, partindo da análise dos textos do padre,
as conclusões de Andrea Daher sobre a “fundação” da cidade de São Luís, realizada
pelos lusitanos, tanto pelas armas quanto pelas letras, ao mesmo tempo em que sugere o
caráter mítico desses escritos, forjadores de uma memória:
Desta maneira, a partir das letras, assim como das armas a cidade de São
Luís é fundada. Ao se referir à necessidade de manter os índios nas aldeias
para evitar que fossem escravizados e obter sucesso na sua conversão, ao
tratar dos deveres de administradores e colonos, ao louvar as atuações dos
religiosos, Figueira estava definindo os lugares e os papéis dos indivíduos
no corpo do império. A fundação de São Luís é, portanto, exemplar,
representada pela batalha contra os heréticos, espelhando as guerras de
religião entre católicos e protestantes em andamento na Europa.
[...]
Neste sentido, os relatos aqui examinados participam da fundação de São
Luís, na medida em que forjam uma memória desses acontecimentos. Esta
memória está atrelada à interpretação jesuítica dos fatos, enquadrados em
uma realidade que é divina, regida pela Providência.129
A concepção de que Portugal usufruía de uma particular proteção de Deus pode
ser exemplarmente identificada na lenda de que os portugueses, em um momento
crucial de desânimo na Batalha de Guaxenduba, receberam o auxílio de Nossa Senhora
na forma de uma bela e cintilante mulher, a qual teria transformado o que colhia do
chão em munição para os lusos contra os franceses hereges, chefiados pelo huguenote
Daniel de La Touche, e os tupinambás pagãos,130 à semelhança de São Sebastião no
128
Ibidem, p. 133, 135-137, 140-141, 152.
129
Ibidem, p. 153, 155-156.
130
Conta Jomar Moraes sobre o chamado milagre de Guaxenduba: “Em 1614, dois anos depois da
ocupação francesa, os portugueses, sob o comando de Jerônimo de Albuquerque, iniciaram a grande
investida belicosa pela retomada do Maranhão. Como a Ilha de São Luís estivesse ocupada pelo
inimigo, os lusitanos ergueram no continente, defronte da Baía de São José, o Forte de Santa Maria. A
19 de novembro deu-se o grande confronto entre as duas tropas rivais, e logo parecia claro que os
portugueses sairiam derrotados, pois estavam em grande inferioridade de armas, munições e
combatentes. Quando ânimo dos soldados de Jerônimo de Albuquerque já começava a abater-se por
completo, ante a evidente supremacia das hostes ao comando do huguenote Daniel de La Touche,
Senhor de La Ravardière, apareceu entre os portugueses, envolta por uma auréola resplandecente, uma
bela mulher que, ao contato de suas mãos milagrosas ia transformando a areia em pólvora e as pedras
em projéteis. Tomados de grande revigoramento moral em face de tão consoladora e providencial
presença, os soldados portugueses logo reverteram os lances do combate e facilmente impuseram aos
franceses a mais completa derrota. Em reconhecimento a esse feito, a Virgem-Mãe foi aclamada
“combate das canoas” no Rio de Janeiro em 1566, quase meio século atrás, o qual teria
combatido ao lado dos lusitanos contra outros gauleses hereges e os tamoios pagãos.
Patenteia o Padre José de Morais, em meados do século XVIII, que a lenda já era de
muito corrente:
Foi fama constante (e ainda hoje se conserva por tradição) que a Virgem
Senhora fora vista entre os nossos batalhões animando os soldados em todo
o tempo do combate, retardando-se milagrosamente a enchente da maré
para complemento da vitória~; e por esta causa lhe dedicaram depois os
portugueses o primeiro templo na cidade de São Luís, que é hoje sé
episcopal, com o título de Nossa Senhora da Vitória [...].131
Sintomaticamente, a campanha vitoriosa dos portugueses é chamada de “Jornada
Milagrosa”. Bem enraizada, portanto, no mito da “fundação” portuguesa da cidade de
São Luís a presença de uma “história sagrada”, cara aos mitos em geral, desde as eras
primordiais da humanidade.
Este mito, como manda a tradição, também é parcialmente verdadeiro, tem um
“fundo de verdade”: os portugueses efetivamente conquistaram o Maranhão, mas não o
reconquistaram, porque Aires da Cunha, Luís de Melo da Silva e outros que
antecederam os franceses da expedição de 1612 jamais haviam logrado êxito nesse
propósito; o dia 8 de setembro de 1612 marca a condução de uma cerimônia gaulesa de
tomada de posse da Ilha do Maranhão, contudo serve igualmente de marco da fundação
da cidade de São Luís; Jerônimo de Albuquerque, de fato, dedicou-se à urbanização de
São Luís, de que esta necessitava, porém não fundou a cidade, iniciada por Razilly e La
Ravardière, tanto que não ousou mudar-lhe a denominação, dada pelos inimigos
vencidos; o grupo dos Novos Atenienses realmente defendeu a interpretação da
atribuição da fundação da cidade aos franceses, todavia esses intelectuais não a criaram,
pois ela já existia antes do século XX e não estava restrita à posição de Ferdinand
Denis, tratando-se, na verdade, do resgate da memória de um fato histórico, por longo
tempo desestimulada e sufocada pelos ibéricos, especialmente pela metrópole
portuguesa em relação à sua colônia sul-americana, e por seus aliados.
O mito português, destarte, reúne todos os elementos clássicos do gênero: relato
de uma “criação”, permitindo o conhecimento das “origens”, do “tempo fabuloso do
‘princípio’”, dos “tempos heroicos”; representação de figuras e fatos históricos
idealizados, amplificados e glorificados por meio de tradições literárias; manipulação do
real, de feição a ocultar ou subestimar aspectos do fato não enquadráveis na narrativa
tida como verdadeira e a sobrevalorizar e exagerar alguns aspectos selecionados; e
presença do elemento sobrenatural ou sagrado. Na atualidade, o mito analisado exibe
seis características bastante peculiares:
a) desqualificação da historiografia (dominante) que propugna o reconhecimento aos
franceses do papel de fundadores da cidade de São Luís, tachada de “não científica”
(simples repetidora acrítica de posicionamentos de trabalhos anteriores) ou de mera
expressão dos interesses e anseios das elites do Maranhão;
padroeira da Cidade de São Luís, com o nome de Nossa Senhora da Vitória.” MORAES, Jomar. O rei
touro e outras lendas maranhenses. 2. ed. Imperatriz: Ética, 2008. p. 27-28.
131
MORAIS, Padre José de. História da Companhia de Jesus na extinta Província do Maranhão e Pará.
Rio de Janeiro: Editorial Allhambra, 1987. p. 48.
b) desqualificação dos autores que defendem as origens gaulesas de São Luís,
historiadores ou não, pesquisadores ou não, visualizados como “não cientistas” e
como meros reprodutores de uma versão mítica francófila;
c) desqualificação dos fundadores da França Equinocial e de suas realizações e
exaltação do papel desempenhado pelos vencedores de Guaxenduba;
d) escolha de Daniel de la Touche como antagonista do herói Jerônimo de Albuquerque;
e) subvalorização do papel do indígena na fundação da cidade e na disputa franco-
portuguesa pelo Maranhão;
f) mecanismo de projeção de seus traços característicos como mito para um alter,
mediante a identificação de um suposto “mito” da fundação francesa de São Luís, o
que denominamos “visão de espelho”.
Antes de passarmos ao exame da configuração do mito português em textos de
autores modernos, vejamos o que pode ser compreendido como fundação de uma
cidade.
Segundo o Dicionário Houaiss, fundar significa “assentar as fundações de (uma
construção); edificar”; é, por derivação, “dar início; estabelecer o princípio de; criar,
instituir”,132 enquanto fundação exprime o “ato ou efeito de fundar, de instituir”; a “base
sobre a qual se constrói um edifício; alicerce” (no campo da construção).133
No livro História da cidade, Leonardo Benevolo explica a origem das cidades e
acompanha a sua formação e evolução no tempo e no espaço. Não há, nem nunca
houve, uma única modalidade de fundação. As cidades nascem de diversas maneiras. O
espaço onde está situada a cidade italiana de Bolonha na atualidade, por exemplo, “tem
sido habitado desde a mais remota Antiguidade, e foi escolhido pelos romanos para a
fundação de uma colônia, em 189 a.C.”134 A belga Bruges, tida como a maior cidade
mercantil na região da Europa transalpina, desenvolveu-se “em volta de um castelo
fortificado – chamado posteriormente Oudeburg, o velho burgo – fundado pelos condes
de Flandres ao longo do curso do Rio Reye, no final do século IX.”135 A alemã
Nuremberg, que ficou tão conhecida após o término da Segunda Guerra Mundial, em
virtude do julgamento dos grandes criminosos de guerra nazistas, “foi fundada pelo
Imperador Henrique III em 1040, no ponto de confluência das vias de comunicação
entre a Baviera, a Francônia, a Suábia e a Boêmia”, sendo que o local selecionado “é
um vale percorrido pelo Rio Pegnitz, e dominado por um morro onde foi construído um
castelo”, aparecendo o conjunto habitado inicial “entre o morro e o rio, concentrado ao
redor do mercado, que permanece a partir de então o centro principal da vida da
cidade”.136 O autor deixa claro que umas cidades sofreram repetidas transformações ao
longo do tempo, não preservando a configuração original assumida quando da fundação,
enquanto outras tiveram definido o seu feitio ao tempo mesmo da fundação, sem
alterações posteriores expressivas, além de enfatizar que as cidades variam muito de
forma, sem que haja uma regra geral para a opção por um ou outro modelo, e que o
fundador de uma cidade é também o dono da área ocupada:
Veneza, Bruges, Bolonha e Florença são exemplos de grandes cidades,
fundadas na Antiguidade ou na Alta Idade Média e repetidamente
132
FUNDAR. In: HOUAISS; VILLAR. Dicionário Houaiss da língua portuguesa, p. 939.
133
FUNDAÇÃO. In: HOUAISS; VILLAR. Dicionário Houaiss da língua portuguesa, p. 938.
134
BENEVOLO, Leonardo. História da cidade. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2011. p. 325.
135
Ibidem, p. 313.
136
Ibidem, p. 340.
transformadas na Baixa Idade Média. Não é possível descrevê-las sem levar
em conta este dinamismo, e sua forma complicada registra todas as
vicissitudes de seu desenvolvimento.
Muitas outras cidades menores, ao contrário, foram fundadas na Baixa
Idade Média, e muitas vezes sua forma definitiva foi fixada, de uma vez por
todas, no momento da fundação.
Estas cidades têm todas as formas possíveis. Os estudiosos tentaram
classificá-las em vários tipos: lineares, circulares, radiocêntricos, em
tabuleiro etc.; mas não se conseguiu encontrar uma causa constante pela
qual se escolhe um tipo de cidade e não outro. Cada cidade é imaginada
como um caso especial, seja quando é desenvolvida com uma cadeia de
decisões sucessivas, seja quando é inventada com uma única decisão
inicial. Não se aceita nenhuma regra geral, mas se leva em conta um sem-
número de circunstâncias: a natureza do terreno, a tradição local, as
sugestões exóticas, o simbolismo sagrado e profano. Cada um destes
motivos pode ser determinado.
Quem funda uma cidade – o rei, o feudatário, o abade, ou o governo de
uma cidade-Estado – é também o proprietário de todo o terreno [...].137
Por outro lado, é evidente que o início das cidades igualmente ostenta pontos em
comum. A pesquisa de Benevolo parece apontar, em geral, para os seguintes traços
comuns na formação das cidades mundiais:
a) delimitação de uma área geográfica, com modificação da paisagem natural mediante
o erguimento de construções, mais ou menos próximas entre si, de destinação pública
e/ou privada, laboral e/ou residencial;
b) aglomeração estável de pessoas;
c) existência de um governo oficial;
d) existência de vias e de um lugar de ajuntamento para fins cívicos, comerciais,
militares e/ou religiosos;
e) especialização de atividades, não diretamente ligadas ao cultivo da terra, como as
comerciais. 138
No dia 8 de setembro de 1612, São Luís reunia todos estes padrões fundacionais.
Possuía, no mínimo, um forte principal, que não era o único na ilha; uma praça pública
para celebrações cívico-religiosas, que ganharia brevemente um pelourinho e uma
137
Ibidem, p. 382.
138
Ver ibidem, p. 10, 23, 55, 76, 136-137, 225, 269. Sobre a especialização das atividades, Leonardo
Benevolo sinaliza que este critério distingue as cidades das aldeias: “A cidade – local de
estabelecimento aparelhado, diferenciado e ao mesmo tempo privilegiado, sede da autoridade – nasce
da aldeia, mas não é apenas uma aldeia que cresceu. Ela se forma, como pudemos ver, quando as
indústrias e os serviços já não são executados pelas pessoas que cultivam a terra, mas por outras que
não têm esta obrigação, e que são mantidas pelas primeiras com o excedente do produto total. Nasce,
assim, o contraste entre dois grupos sociais, dominantes e subalternos: mas, entrementes, as indústrias
e os serviços já podem se desenvolver através da especialização, e a produção agrícola pode crescer
utilizando estes serviços e estes instrumentos. A sociedade se torna capaz de evoluir e de projetar a
sua evolução.” Ibidem, p. 23.
forca;139 um porto; numerosas habitações de um ou dois pavimentos; um convento
parcialmente edificado, primeira escola do Maranhão, cuja capela seria concluída no
Natal, seguida da construção de outra capela; um grande armazém, tudo assentado em
uma área delimitada e preparada por seus fundadores e pelos aliados índios para abrigar
essa estrutura (um promontório previamente escolhido). E ainda cresceria nos anos
subsequentes, até a queda da colônia, com o acréscimo, por exemplo, de lojas 140 e uma
serraria.141 Até a conquista lusitana, lá viveram, além dos nobres e dos soldados,
diversos artífices – carpinteiros, pedreiros, fundidores, serralheiros, tecelões, alfaiates,
sapateiros,142 entre outros –, dois astrônomos e um cirurgião, 143 não apenas homens,
porém igualmente mulheres e crianças, 144 comprovando a variedade populacional e a
especialização de atividades já existentes na cidade em evolução.
A cerimônia de 8 de setembro foi, sem dúvida, um evento solene de tomada de
posse da terra; afinal, quem funda uma colônia e com ela uma cidade precisa ser, por
antecedente de ordem lógica e material, o senhor do território. São Luís começou como
sede de uma promissora colônia, como muitas cidades pelo mundo nascidas de colônias
fundadas, por exemplo, pelos gregos e, depois, pelos romanos. Formou-se a partir da
construção de um forte, assim como incontáveis cidades europeias se originaram de
castelos, posto que a fortificação dos lugares escolhidos para o abrigo de povoações era
uma necessidade daqueles tempos de imensa insegurança territorial. Do mesmo modo
que outras tantas cidades do Velho Continente, São Luís teve a sua feição original –
imprimida pelos franceses – profundamente transformada posteriormente – pelos
conquistadores lusitanos.
Belém, que também nasceu de um forte, principiou com bem menos, tanto em
estrutura física, quanto em recursos humanos. Francisco Caldeira de Castelo Branco,
após a queda da França Equinocial, acompanhado de 150 soldados, foi enviado por
Alexandre de Moura ao Pará para solidificar a conquista da região, e ali fundou, no dia
12 de janeiro de 1616, para proteção própria e de seus comandados contra os nativos,
um forte de madeira, sob a denominação de Presépio, em homenagem ao dia 25 de
dezembro, data da partida de São Luís, no Natal de 1615, fortaleza esta que, apoiada por
uma capela e alguns casebres, constituiu o núcleo originário da futura cidade de Belém,
nome que apenas ulteriormente lhe foi atribuído.145 O autor, que faz questão de
asseverar que a fortaleza estabelecida pelo fundador de Belém não era de pedra, e sim
de madeira,146 admite a sua precariedade:
O Forte do Presépio foi o ponto de partida para o nascimento e
desenvolvimento do núcleo urbano. Do interior dessa modesta praça
139
Ver ÉVREUX, Yves d’. História das coisas mais memoráveis, ocorridas no Maranhão nos anos de
1613 e 1614. Introduções de Ferdinand Denis (e notas), Gabriel Marcel e Mércio Pereira Gomes.
Tradução de Marcella Mortara. Rio de Janeiro: Batel: Fundação Darcy Ribeiro, 2009. p. 146.
140
Ver PROVENÇAL, Lucien. A França Equinocial: os franceses no Maranhão. In: MARIZ, Vasco
(Org.). Brasil-França: relações históricas no período colonial. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército
Ed., 2006. p. 94.
141
Ver VIVEIROS, Jerônimo de. História do comércio do Maranhão: 1612-1895. São Luís: Associação
Comercial do Maranhão, 1954. v. 1, p. 8.
142
Ver “Interrogatorio dos prisioneiros francezes do combate de Guaxenduba” em BIBLIOTHECA
NACIONAL DO RIO DE JANEIRO. Annaes, p. 264, 269, 271-272.
143
Ver MEIRELES. História do Maranhão, p. 191.
144
Ver JARNOUX, Philippe. La France équinoxiale: les dernières velléités de colonisation française au
Brésil (1612-1615). Annales de Bretagne et des pays de l’Ouest, Rennes, t. 98, n. 3, p. 273, 1991.
145
Ver CRUZ, Ernesto. História de Belém. Belém: Universidade Federal do Pará, 1973. v. 1, p. 13, 19.
146
Ibidem, p. 19-23.
d’armas, construída de madeira, com os defeitos e as impropriedades dos
primeiros dias, saíram os desbravadores do povoado.147
Não menos precárias são as fundações de Salvador e do Rio de Janeiro. A respeito
de Salvador, primeira capital do Brasil, Mário da Veiga Cabral relata que a cidade
fortificada, fundada em 29 de março de 1549, nasceu com casas cobertas de palha,
cercadas por uma proteção de taipa grossa:
Chegado à Bahia, foi Tomé de Sousa festivamente recebido por Caramuru e
seus aliados – os Tupinambás, hospedando-se na casa daquele, no rústico
povoado da Vitória.
Tratou depois o governador de mudar o povoado para melhor lugar, isto é,
tratou de escolher o local em que devia ser fundada a nova cidade e foi
então iniciada a construção de casas cobertas de palha, sendo murado o
recinto com taipa grossa.
Recebeu essa cidade o nome de Salvador, tendo por armas em campo verde
uma pomba branca com um ramo de oliveira no bico, com a seguinte
inscrição em letras douradas: Sic illa ad arcam reserva est. 148
Semelhantemente, a povoação de São Sebastião foi iniciada por Estácio de Sá em
1º de março de 1565, a partir de um mero acampamento militar,149 caracterizado por
casas de palha guardadas por uma modesta cerca de pau a pique. 150 Este é o marco
fundacional mais aceito da cidade do Rio de Janeiro, a qual, no entanto, teve a sua sede
primitiva transferida da Urca para a atual Esplanada do Castelo por Mem de Sá em
1567, mudança essa não verificada com São Luís.
Como visto, a fundação de São Luís em nada foi inferior à fundação das duas
primeiras capitais do Brasil, já que a instalação de frágeis núcleos primordiais, de palha
e madeira, foi um traço compreensivelmente comum a grande parte das cidades
iniciadas pelos lusitanos no Brasil Colônia.
Se Estácio de Sá, antes de sua morte, chegou a legislar vedando a prática de certos
jogos, sob sanção de multa, e a nomear autoridades e funcionários para a infante cidade
de São Sebastião do Rio de Janeiro, como é o caso de Pedro Martins Namorado para
Juiz Ordinário e Francisco Dias Pinto para Alcaide-mor, o último empossado em 13 de
setembro de 1566, não é menos verdade que, em um primeiro momento da colônia e de
sua sede, François de Razilly e Daniel de la Touche, autorizados por suas respectivas
cartas patentes reais, concentraram poderes político-administrativos, legislativos e
judiciários em suas mãos, de que são fruto as importantíssimas Leis Fundamentais do
Maranhão de 1º de novembro de 1612, papel esse depois desempenhado unicamente por
La Ravardière, substituído à testa do governo, sempre que necessário, por Louis de
Pézieux, em consequência do regresso do lugar-tenente-general Razilly à França.
Já vimos como o mito da “fundação” portuguesa da cidade de São Luís foi
construído e fomentado como instrumento de afirmação da legitimidade da conquista e
da colonização lusitana do Maranhão, por meio do apelo ao sagrado e da
147
Ibidem, p. 39.
148
CABRAL, Mário da Veiga. História do Brasil: curso superior. 19. ed. Rio de Janeiro: Paulo de
Azevedo, 1959. p. 71.
149
Ver VIANNA, Helio. História do Brasil: período colonial. 3. ed. São Paulo: Melhoramentos, 1965. v.
1, p. 93.
150
Ver MAIOR, A. Souto. História do Brasil. 10. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1972. p.
69.
desqualificação dos franceses (acoimados de invasores, usurpadores e hereges), numa
relação simbiótica entre a promoção dos interesses da fé e a dos interesses da Coroa,
traduzida na comunhão de estratégias político-militares e letradas, em prol da edificação
do Império luso, da justificação do poder colonial da metrópole e da expansão dos
esforços de evangelização. No período colonial, o português Bernardo Pereira de
Berredo representa muito bem a historiografia que bebeu das águas originais desse mito.
Com a proclamação da Independência do Brasil e a gradativa laicização da
percepção de mundo, principia uma segunda fase, na qual o mito foi aos poucos
adaptado aos novos tempos, quase dessacralizado, contudo sem perder os seus traços
francófobos de origem. Os franceses ainda eram os invasores da terra, antes luso-
espanhola, depois somente lusa, agora brasileira, mas perdeu o sentido chamá-los de
hereges. Nesse contexto, Barbosa de Godóis (1860-1923) confirma Berredo na
atribuição da honra da fundação da cidade aos portugueses, após a expulsão dos
gauleses “invasores”,151 porém deixa no passado o enfoque anti-heresia.
Em artigo de 1993, Olavo Correia Lima reflete uma terceira fase do mito lusitano,
na qual predomina o ataque a um suposto mito da fundação de São Luís pelos súditos de
Maria de Médicis, denominado “Mito Capital” (é o que designamos “visão de
espelho”). Diz ele: “O mito da fundação de São Luís, pelos franceses, constitui o
pecado original de nossa história”, o qual é “falso e impatriótico”, aparentemente
“consolidado no século XIX, ao encanto da cultura francesa da época”, formado a partir
de dois fatores: “a) – falta de revisão histórica por parte dos historiadores; b) – a vaidade
maranhense de ter sido a sua capital criada pela suposta cultura francesa da época da
invasão, não tão brilhante e atualmente em franca decadência...” 152 Notemos o emprego
do vocábulo “impatriótico”: o francês é reconhecido como estrangeiro, invasor da
“pátria”, mas o conquistador a serviço da União das Coroas Ibéricas é celebrado na
figura de “Jerônimo de Albuquerque, o grande mameluco pernambucano”, por ser “o
Restaurador do Maranhão e o fundador de São Luís”, a “merecer lugar ímpar no
Panteão Maranhense e no coração de todos os brasileiros, especialmente do
ludovicente” (sic), em contraposição ao “intruso francês, sob o comando de La
Ravardière”, o qual “acovardou-se com o inesperado desastre inicial de sua tropa”,
findando por assinar “o vergonhoso armistício”. 153
François de Razilly tem seu nome olvidado como colíder da colônia, e, uma vez
mais, La Touche, selecionado como personificação do estrangeiro invasor, é afrontado,
não como herege, mas como covarde. O uso da palavra “restaurador”, em contraste com
“intruso”, é um mecanismo de acentuação da legitimidade da conquista lusa: só pode ser
restaurado aquilo de que alguém ou algo já teve a posse ou o domínio, o que não era o
caso do Maranhão, que jamais fora conquistado pelos portugueses antes dos gauleses,
apesar de algumas tentativas infrutíferas. É patente no artigo do autor a glorificação do
papel dos lusitanos e, em particular, de Jerônimo de Albuquerque, o herói brasileiro por
excelência, não importando o fato de que o Brasil não era uma nação independente no
século XVII e de que “o grande mameluco pernambucano” estava a serviço dos
interesses coloniais da União Ibérica, da mesma maneira que Razilly e La Ravardière
151
GODÓIS, Antônio Batista Barbosa de. História do Maranhão para uso dos alunos da Escola Normal.
2. ed. São Luís: AML/EDUEMA, 2008. p. 139; e GODOIS, Antonio Baptista Barbosa de. Historia do
Maranhão para uso dos alumnos da Escola Normal. São Luís: Mar. Typ. de Ramos d’Almeida & G.,
Suces., 1904. t. 1, p. 169.
152
LIMA, Olavo Correia. Duas controvérsias científicas. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão, São Luís, v. 63, n. 16, p. 82-83, abr. 1993.
153
Ibidem, p. 84, 86.
representavam os interesses franceses. Nenhum destaque é feito ao tupinambá como
símbolo de brasilidade. Já o gaulês é totalmente desqualificado, despido de virtudes
heroicas:
Mas, não houve maior heroísmo do que o dos restauradores do Maranhão,
às margens esquecidas do Guaxenduba, nem melhor fidalguia, que a de
Jerônimo de Albuquerque Maranhão, porque, além da etnialogia (sic)
nacionalista, é comprovado nos diferentes campos de batalha do Brasil
Colonial; nem maior brasão, que aquele acrescentado (Maranhão sem
ouvir o Rei) à perinidade (sic) da Ciência Histórica Maranhense!
O único título justo ao francês é o de frouxo intruso, que não suportou
sequer uns poucos minutos da Batalha de Guaxenduba.154
Não apenas o francês é desqualificado, como também a sua obra na Ilha do
Maranhão é assaz subestimada (ele não ergueu paredes ou casas e somente fez “uma
paliçada e duas grandes palhoças”, o que, evidentemente, é uma contrafação histórica).
O feito luso de urbanização da cidade é confundido com a fundação levada a cabo pelos
gauleses:
154
Ibidem, p. 86.
155
Ibidem, p. 84-85.
156
Ver BERREDO. Anais históricos do Estado do Maranhão..., p. 116.
157
LIMA. Duas controvérsias científicas. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
85, abr. 1993.
158
MORAIS. História da Companhia de Jesus na extinta província do Maranhão e Pará, p. 41.
e Lucien Provençal testificam que “os portugueses não conheciam o santo francês, nem
a bela história daquele velho rei de França”.159
Olavo Lima indica como “data de nascimento de São Luís a da própria
restauração do Maranhão, ou seja, 27 de novembro de 1614, data de assinatura do
armistício”, 160 o que configura uma visível contradição, porquanto a França Equinocial
ainda existia nessa data e os gauleses ainda dominavam o Forte São Luís e o sítio da
povoação que se transformaria na atual cidade de São Luís.
Neste autor, a aversão ao francês invasor da “pátria” não se restringe ao episódio
da França Equinocial. O Rio de Janeiro é adotado como modelo de identificação correta
daquele que merece o título de fundador: “O intruso [personificado na figura de
Villegagnon] não é considerado fundador da cidade, mas Estácio de Sá (que deu a vida
por ela)”. 161
Vale aqui o registro da constatação de Ribeiro do Amaral:
Dos franceses não se pode propriamente dizer que invadiram – não, eles
tomaram posse, ocuparam um território totalmente abandonado, cujas
primeiras explorações lhes eram devidas, pois haviam sido feitas por
armadores de Dieppe e datavam já de 1524, explorações completadas pelas
navegações de Afonso de Chaintongeois até às bocas do Amazonas, em
1542.162
Nessa terceira e atual fase, a reprodução do mito da “fundação” portuguesa de São
Luís alcança o seu ápice no livro A fundação francesa de São Luís e seus mitos (2000),
de Maria de Lourdes Lauande Lacroix, que desencadeia o aparecimento de outros textos
de diferentes autores com a mesma temática da “visão de espelho”. A própria professora
universitária retoma o assunto em manifestações posteriores, a exemplo dos artigos “A
reconquista do Maranhão”, publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão, em setembro de 2010 (edição eletrônica), e “O mito da fundação na era do
simulacro”, publicado no jornal O Estado do Maranhão (2010), e de uma entrevista
concedida ao mesmo periódico, a propósito do lançamento da obra São Luís do
Maranhão: corpo e alma (2012).
Preliminarmente, cumpre observarmos o emprego inapropriado da palavra
“reconquista” no título do artigo da Revista do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão. Os portugueses não podiam reconquistar o que jamais haviam conquistado
antes. A diferença é flagrante com o título do livro organizado por Andrea Daher:
Papéis da conquista do Maranhão (1612-1624), que é dedicado ao mesmo fato
histórico.
Na obra A fundação francesa de São Luís e seus mitos e nas manifestações-
satélite, a autora, com uma argumentação habilidosa e sedutora, confirma algumas das
principais inferências de Olavo Correia Lima, porém eleva o mito das origens lusitanas
da cidade a um novo patamar, mais sofisticado. Ela dá uma roupagem “científica” à tese
da “fundação” portuguesa de São Luís, utilizando-se de uma abordagem reducionista,
159
MARIZ, Vasco; PROVENÇAL, Lucien. La Ravardière e a França Equinocial: os franceses no
Maranhão (1612-1615). Rio de Janeiro: Topbooks, 2007. p. 141.
160
LIMA. Duas controvérsias científicas. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
86, abr. 1993.
161
Ibidem, p. 83.
162
AMARAL, José Ribeiro do. O Maranhão histórico – Artigos de jornal (1911-1912). São Luís:
Instituto Geia, 2003. p. 33.
de apelo em alguns setores da comunidade intelectual, centrada na sustentação de que a
ideia da atribuição da fundação de São Luís aos franceses é um mero mito, que teria
sido forjado a partir do começo do século XX no Maranhão, como produto dos
interesses das elites decadentistas locais pela afirmação de uma identidade singular para
estas plagas e do culto às origens francesas a partir do fim do século XIX. Ao mesmo
tempo, contrapõe o seu trabalho (ciência “honesta”) ao trabalho dos historiadores que
defendem os gauleses como fundadores (pesquisa superficial, reprodução de um mito):
É uma tradição inventada recentemente, ainda no século passado. Por uma
questão de honestidade histórica, de historiadora, eu tinha de mostrar esse
fato. Os historiadores anteriores eles seguiram José Ribeiro do Amaral sem
pesquisar mais ao fundo porque ele considerou a fundação no dia 8 de
setembro. Em vez de eles retomarem Claude D’Abbeville, não, eles apenas
começaram a repetir o erro, que é um hábito muito grande dos
historiadores maranhenses. Mais repetem o que o outro diz em vez de
pesquisar mais a fundo. Chamei isso de mito, porque é uma criação
fantasiosa de algo que desconhece o real. Amaral não levou em
consideração o que havia sido escrito anteriormente a isso. Os que estavam
acostumados a isso bradaram contra, mas nunca mostraram o motivo pelo
qual eu estaria errada em ‘A Fundação de São Luís e Seus Mitos’.163
Cita a pesquisadora que Alexandre de Moura, após a expulsão dos gauleses do
Maranhão, cumprindo ordem real, entregou a Jerônimo de Albuquerque um regimento,
datado de 9 de janeiro de 1616, com a recomendação de “reforma do forte de Saint
Louis”, agora sob a denominação de São Felipe, a determinação de estabelecimento de
uma cidade, o que seria uma política característica da colonização espanhola, e a
previsão de construção de uma olaria para a cobertura de todas as casas da fortaleza e da
povoação, visando prevenir incêndios; e que a primeira casa de barro e coberta de telha
erguida pelos lusos foi a da moradia de Albuquerque Maranhão, modelo para outras da
cidade e futura residência dos governadores, onde hoje está fincado o Palácio dos
Leões.164
Na sua ótica, Alexandre de Moura, Jerônimo de Albuquerque e Francisco Frias de
Mesquita, Engenheiro-mor do Brasil desde 1603, entre o final de 1615 e o princípio de
1616, selecionaram “o local ideal para a fundação da cidade de São Luís”, a qual teria
acontecido em 1616, “discutiram a adequação do projeto elaborado pelo técnico, dentro
das normas renascentistas”, providenciaram “a marcação das balizas norteadoras das
ruas e praças”, obedecendo à traça, e “determinaram o modelo e material empregado
nas casas.”165 Ela ressalta que as providências iniciais lusas “para a fundação da nova
Colônia foram a organização física e institucional da cidade de São Luís”, para a qual
“foi traçada pelo militar e Engenheiro-Mor do Estado do Brasil, Francisco Frias de
Mesquita, a primeira planta da cidade com duas grandes praças, atuais D. Pedro II e
João Lisboa”, daí partindo “algumas ruas traçadas em quadras regulares”. 166 Lembra
que, no ano de 1621, “foi criada a Câmara Municipal, com as funções legislativa,
163
LACROIX, Maria de Lourdes Lauande. Maria de Lourdes Lauande Lacroix – Historiadora. O Estado
do Maranhão, São Luís, 30 ago. 2012. Caderno alternativo, p. 5. Entrevista concedida a André S. Lisboa.
164
LACROIX, Maria de Lourdes Lauande. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e
Geográfico do Maranhão, Edição eletrônica, São Luís, v. 1, n. 34, p. 24-25, set. 2010. Disponível em:
<http://issuu.com/leovaz/docs/>. Acesso em: 6 set. 2011.
165
Ibidem, p. 25-26.
166
LACROIX, Maria de Lourdes Lauande. A fundação francesa de São Luís e seus mitos. 3. ed. São Luís:
Ed. UEMA, 2008. p. 44.
administrativa e política, exercidas por dois vereadores, dois juízes e um procurador”, e
que foram distribuídas terras aos colonos “e doado o antigo sítio, hoje Rua do Egito, à
Ordem Carmelita”, verificando-se a criação do Estado do Maranhão, “conforme a Carta
Régia de 4 de maio de 1617 por Felipe III, de Espanha e II, de Portugal”. 167 E enfatiza a
atuação de Jerônimo de Albuquerque:
Nos dois anos de governo, Jerônimo de Albuquerque Maranhão remodelou
o forte, antes Saint Louis, agora de São Felipe, terminou as obras do forte
de São Francisco, arruou a cidade de acordo com sua primeira planta,
instalou uma olaria para cobrir de telhas as casas, iniciou a construção de
um prédio maior para a residência dos capitães-mores, depois casa dos
governadores, posteriormente reformada e, hoje, Palácio dos Leões. Toda
extensão correspondente à parte que vai da Avenida D. Pedro II ao Cutim
foi considerada propriedade do município.
O projeto inicial português foi expandido espontaneamente, alargando a
área urbana, à medida que a população ludovicense aumentava.168
Também enumera as ações que julga atestatórias das origens lusitanas de São
Luís:
O núcleo como unidade urbana foi construído conforme a concepção de
estruturação portuguesa, com um traçado preliminar formalmente
determinado em 1615; a figura do engenheiro-mor do Brasil visualizando o
arruamento; a demarcação de ruas retilíneas, quadras iguais e
retangulares e praças, conforme o plano; o Capitão-Mor sugerindo o
modelo dos prédios cobertos de telha; a organização da olaria e as pipas de
cal deixadas para a execução dos trabalhos; a institucionalização de um
padrão de relações que iria se desenvolver no decorrer do período colonial;
o Senado da Câmara, com seus ‘homens bons’ discutindo e organizando a
realidade espacial, no cumprimento daquela instituição enquanto agente
urbanizador, todas essas ações dão a autoria da fundação de São Luís aos
portugueses.169
Para ela, os portugueses, em razão da posição estratégica, aproveitaram o mesmo
lugar no entorno da antiga fortificação francesa, “já terraplanado para exercício da
soldadesca, incendiaram palhoças do acampamento gaulês e aumentaram a área aterrada
para demarcar o traçado da cidade de São Luís, conforme plano elaborado pelo
engenheiro fortificador.”170
A autora descreve, na verdade, providências de urbanização (arruamento, reforma
do forte, construção de casas melhoradas, instalação de uma olaria) e não de fundação
de uma cidade. Jerônimo de Albuquerque, de fato, providenciou-lhe o começo do
arruamento, deu-lhe organização física, seguindo o plano de Francisco Mesquita, mas a
povoação, seja em termos de população, seja em termos de urbanização, não teve um
desenvolvimento tão rápido e vistoso quanto faz crer a historiadora. Registra Barbosa de
Godóis que, ainda em 1646, mais de trinta anos da expulsão dos franceses, “todas ou
quase todas as casas de São Luís eram cobertas de pindoba, segundo se vê de uma
167
Ibidem, p. 44-45.
168
Ibidem, p. 45.
169
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
28, set. 2010.
170
Ibidem, p. 25.
decisão da Câmara, impondo a multa de 1$000, paga na cadeia, a quem desse ou
trouxesse fogo, sem ser em panela.” 171 Isto nos revela que a telha por muito tempo
esteve longe de ser a regra na cidade, como muitos outros itens objeto de planejamento,
mas não de imediata ou breve execução. Mário Meireles bem retrata a situação:
Não obstante, a vila pouco progredia. Warden, em sua ‘História de
l’Empire du Brésil’, registra seu lento crescimento demográfico: em 1648 –
480 almas, em 1658 – 700, em 1683 – 1.000; por outro lado, Henriarte, na
‘Descrição do Estado do Maranhão’, diz a população da capital, em 1662,
de apenas 600 habitantes, enquanto Frei Domingos Teixeira ainda a
diminui para 500, em 1684 (‘Vida de Gomes Freire de Andrade’).
Era uma cidade acanhada, de ruas tortuosas, aladeiradas e sem
calçamento, a quase totalidade de suas casas de taipa e recobertas de
palha. O Senado da Câmara queixava-se de que era tal e tanta a miséria
que o geral dos moradores, e ainda os mais qualificados, andavam vestidos
de pano de algodão grosso da terra, tinto de preto.
[...]
Assim entra o século XVIII sem que São Luís houvesse progredido
sensivelmente.172
Antes da chegada de Simão Estácio da Silveira e de 240 casais açoreanos ao
Maranhão entre 1619 e 1621, São Luís possivelmente tinha uma população inferior ou
apenas equivalente àquela que ostentara na França Equinocial. O Senado da Câmara
somente foi instalado em 1621, quando o Capitão-mor já não mais vivia, falecido em
1618.
A pesquisadora parece prolongar o tempo fundacional por um longo período, pois
elenca medidas de urbanização e de organização político-institucional que apenas
gradativamente foram adotadas, superando em muito o governo de Jerônimo de
Albuquerque. Ao mesmo tempo, contraditoriamente, aponta 1616 como o ano em que
foi cumprida a ordem real de “reconquista da região e fundação da cidade de São Luís
do Maranhão”.173 Ora, São Luís, em 8 de setembro de 1612, possuía muito mais
estrutura que Salvador em 29 de março de 1549, que o Rio de Janeiro em 1º de março
de 1565 e que Belém em 12 de janeiro de 1616. A fundação não ocorre
indefinidamente, embora seja produto de convenção a definição de quando ela se
materializou. Mas, por qualquer critério que seja adotado, desde que não seja casuístico
(como o implicitamente sugerido pelos defensores da fundação “portuguesa” da cidade,
estabelecendo uma confusão entre fundação e urbanização, apenas aplicável ao
Maranhão), porém, ao contrário, válido, por exemplo, para a colonização em geral no
Brasil, a fundação de São Luís foi um feito francês, quer tenha ele se verificado em 7 de
agosto de 1612, quando os gauleses promoveram o início da construção das primeiras
casas e do forte cuja denominação passaria à cidade, no que guardaria maior semelhança
com as fundações de Salvador, Rio de Janeiro e Belém, quer tenha ele se concretizado
em 8 de setembro de 1612, quando os franceses solenemente tomaram posse da terra e
171
GODÓIS. História do Maranhão para uso dos alunos da Escola Normal, 2008, p. 140. Ver
igualmente GODOIS. Historia do Maranhão para uso dos alumnos da Escola Normal, 1904, p. 170.
172
MEIRELES, Mário Martins. França Equinocial. 2. ed. São Luís: SECMA; Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1982. p. 119. Ver igualmente MEIRELES, Mário Martins. França Equinocial. São Luís:
Tipografia São José, 1962. p. 131-132.
173
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
25, set. 2010.
já possuíam uma estrutura mínima de cidade, escolha que se afigura mais apropriada,
tanto em nível de edificação simbólica, quanto em nível de edificação física.
Lacroix alega que detectou “a ausência de qualquer registro” no tocante à “idéia
de fundação de uma cidade na esplanada ao lado do Forte Saint-Louis, tanto nos livros
de Claude d’Abbeville e Yves d’Évreux, quanto nas cartas e relatórios escritos pelos
franceses entre 1612 e 1615”; que a sustentação de São Luís como “cidade fundada
pelos portugueses” não é uma interpretação sua isolada, “mas de uma gama ampla e
variada de autores, cronistas, historiadores e urbanistas”; 174 entre os quais Bernardo
Berredo, César Marques e Barbosa de Godóis, 175 e que “a determinação da Coroa em
fundar a cidade e definir a ocupação do terreno está no Regimento de Alexandre de
Moura deixado a Alexandre de Moura”, no qual restaria demonstrado constituir “a
primeira preocupação dos portugueses a de fundar uma cidade no mesmo sítio
preparado pelos franceses para a instalação de seu forte”, ao contrário dos gauleses,
cujas prioridades residiriam no estreitamento da amizade com os indígenas por
intermédio da evangelização e na procura das riquezas da região “através de expedições
rios acima”.176 Assinala que constatou “a ausência de iniciativas para a formação de
uma cidade no local de chegada dos súditos dos Bourbon.”177 Sugere que a “ausência de
construções definitivas pode ser talvez justificada pela insegurança da propriedade da
terra, pela prioridade de duas frentes de trabalho”, que seriam “o reconhecimento da
região através de expedições exploratórias e a solidificação da amizade com os nativos”,
ou, ainda, “por concordarem ser precoce a escolha para a sede da sonhada França
Equinocial”.178 Comenta que as leis decretadas na colônia, que somente regulariam o
comportamento dos gauleses, “são omissas quanto a medidas com vistas à organização
jurídica ou de urbanização daquela área de Upaon-açu, que talvez nem fosse a escolhida
para capital da futura colônia.” 179
A autora aqui incorre em alguns equívocos. Existe uma sutil referência do
capuchinho Claude d’Abbeville à ideia da fundação da cidade:
Junto ao forte há uma grande praça tão cômoda quão admirável. Nela se
encontram belas fontes e regatos, que são a alma de uma cidade, existindo
também tôdas as comodidades desejadas, como sejam paus, pedras, barro e
outros materiais que tornam a construção barata.180
Entretanto, mesmo que seja considerado insuficiente tal registro, se uma fêmea
late como uma cachorra, tem a constituição genética de uma cachorra, nasceu de um
cachorro e uma cachorra, tem quatro patas, focinho e talvez algumas pulgas, ela não
deixará de ser uma cachorra, ainda que alguém a chame, com a autoridade intelectual de
um Graciliano Ramos, de Baleia. Mesmo que admitamos a inexistência de qualquer
menção literal de Claude d’Abbeville e Yves d’Évreux à ideia de fundação de uma
cidade, tal não significa que eles não tenham descrito, e com detalhes preciosos, a
fundação de uma, no caso São Luís. Pouco importa se os portugueses agiram em
174
Ibidem, p. 27.
175
Ver LACROIX, Maria de Lourdes Lauande. O mito da fundação na era do simulacro. O Estado do
Maranhão, São Luís, 24 out. 2010. Caderno alternativo, p. 3.
176
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
28, set. 2010.
177
LACROIX. A fundação francesa de São Luís e seus mitos, p. 25.
178
Ibidem, p. 30.
179
Ibidem, p. 37.
180
ABBEVILLE, Claude d’. História da missão dos padres capuchinhos na ilha do Maranhão. Tradução
de Sérgio Milliet. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1975. p. 58.
conformidade com uma determinação expressa da Corte no sentido da fundação de uma
cidade; eles não podiam fundar o que já fora fundado. E se tal era característico do
modus operandi da colonização espanhola, isto não o torna um requisito fundacional
aplicável a todos os povos. Também é falaciosa a sustentação de que os franceses não
tinham como prioridade a fundação de uma cidade. Não é possível fundar uma colônia
sem um núcleo de povoamento. A primeira pressupõe o segundo. O estabelecimento de
alianças com os índios e a exploração da área amazônica mais próxima eram meios para
o alcance do fim maior de implantação de uma colônia que não ficaria presa aos limites
da Ilha do Maranhão, embora a tivesse como local de sua sede. Todo o histórico da
presença exploratória ou comercial dos franceses na região desde o século XVI justifica
essa ilação. Não eram distintas, na essência, as prioridades lusitanas. A fé era, para
ambos os povos, um instrumento de conquista. Para os lusos, o estabelecimento de São
Luís era um meio para promover a colonização de todo o norte do Brasil, por muito
tempo negligenciado. A única diferença sensível estava, sim, no tratamento dispensado
pelos portugueses aos indígenas, que seguia uma estratégia, por princípio, mais
conflituosa. A alegada falta de construções definitivas na França Equinocial, em
comparação com as posteriormente erguidas pelos lusos, não indica hesitação quanto à
legitimidade e aos objetivos da empresa, nem quanto ao lugar da instalação da sede, mas
tão somente uma consequência direta do triunfo lusitano, que abortou o sonho colonial
francês por estas plagas. A especulação de que a Ilha do Maranhão talvez não fosse o
ponto escolhido para a implantação da sede da colônia não se ancora nos fatos
conhecidos. Charles des Vaux aí viveu durante vários anos; ele e La Touche estiveram
no Maranhão em 1609, por determinação de Henrique IV, para fazerem o
reconhecimento do território e confirmarem a existência das condições favoráveis à
instalação de uma colônia; a referência ao Maranhão é expressa no documento de
renovação da concessão dada pela Coroa gaulesa a Daniel de la Touche para a
implantação de uma colônia na América, com alusão às cartas patentes de 1605 e
1610;181 Claude d’Abbeville em mais de uma oportunidade menciona que o Maranhão
era o destino da expedição de 1612;182 o lugar do erguimento do Forte São Luís foi
previamente escolhido e atendeu a razões estratégicas; e, por último, nada há, em
qualquer documento da época ou em qualquer passagem dos cronistas capuchinhos, que
autorize a pertinência dessa possibilidade. No concernente à importância das Leis
Fundamentais do Maranhão, decretadas em 1º de novembro de 1612, é mister não
esquecermos que, consoante a avaliação de José Cláudio Pavão Santana, essas normas
“estabelecem um regulamento para a colônia” que se distingue “dos regulamentos
portugueses” e configuram a “primeira manifestação com natureza constituinte
elaborada no Continente Americano, antecedendo a Declaração de Virgínia”. 183
Lacroix atesta que a “visão da fundação pelos franceses é uma interpretação
posterior, criada e sustentada no século XX por círculos de intelectuais ligados à
Academia Maranhense de Letras”,184 mais precisamente os integrantes do “grupo dos
Novos Atenienses” e fundadores da dita academia, 185 os quais teriam mitificado “a
181
Ver nota de rodapé na Introdução de Ferdinand Denis à obra de ÉVREUX. História das coisas mais
memoráveis, ocorridas no Maranhão..., p. 31. Ver também nota de rodapé em ÉVREUX. Viagem ao
norte do Brasil, p. 27.
182
Ver ABBEVILLE. História da missão dos padres capuchinhos..., p. 49-50.
183
SANTANA, José Cláudio Pavão. O pré-constitucionalismo na América. Rio de Janeiro: Forense; São
Paulo: Método, 2010. p. 162.
184
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
28, set. 2010.
185
LACROIX. O mito da fundação na era do simulacro. O Estado do Maranhão, p. 3, 24 out. 2010.
cerimônia de 8 de setembro de 1612, atribuindo-lhe um outro sentido (de ação de graças
pela posse da terra e chegada do cristianismo no Maranhão de infiéis para a fundação da
cidade de São Luís)”.186 Sublinha que “posse da terra é uma coisa e fundação da cidade
é outra”, consistindo em “coisas totalmente diferentes”.187
Bate-se pela tese de que “a reinterpretação de fatos anteriormente descritos e
muito conhecidos por historiadores e cronistas dos séculos XVII a XIX resultou na
construção de toda uma mitologia”, propugnada como alguma coisa sacra “pela maioria
dos intelectuais no decorrer do século XX”.188
Assevera que o livro Fundação do Maranhão (1912), no qual José Ribeiro do
Amaral defende que o ato de 8 de setembro, “pela magnificência e excepcional
solenidade de que se revestiu é considerado como o verdadeiro auto da fundação da
cidade”,189 pode ser encarado “como um marco na construção de uma ‘tradição
inventada’”, bem como que até o ano da edição da indigitada publicação, quando, pela
primeira vez, teria sido celebrada a questionada fundação de São Luís pelos franceses,
com a festa do tricentenário, “a tradição historiográfica”, abarcando “cronistas e
historiadores portugueses e brasileiros”, “todos com conhecimento das obras deixadas
pelos franceses, destacando-se Claude d’Abbeville, afirmava que a cidade fora fundada
por ordem da corte de Madri, pois era o tempo da União das Coroas Ibéricas.” 190 Faz
uma ressalva no respeitante a Ferdinand Denis, que se referiu a São Luís como a
“cidade nascente” em suas notas críticas e históricas sobre a viagem do Padre Yves
d’Évreux, 191 argumentando que, apesar de ele divergir dos autores dos séculos XVIII e
XIX e do começo do século XX, o seu comentário “deve ser olhado com justa reserva”,
porquanto o Superior da missão do Maranhão não teria aludido a uma “cidade nascente”
em seu relato.192 Em termos singelos, especificamente no tocante ao Maranhão, anota
que, do século XVII ao XIX, cronistas e historiadores, “considerando os franceses
invasores, deram pouca importância à sua ação entre 1612 e 1615 e não tiveram dúvidas
em atribuir a fundação de São Luís aos lusitanos.” 193 Na mesma vereda, menciona José
Moreira, que, já no século XX, “sempre se levantou contra a idéia de atribuir aos
franceses a fundação de São Luís”, 194 pondo em relevo que este não julgou La Touche
“um grande senhor” e ainda declarou ser desconhecido “o grau de sua nobreza, não era
barão, visconde, conde, marquês ou duque”, além de haver considerado Razilly como
sócio na atividade pirata.195
Diversamente da asserção da pesquisadora, os intelectuais maranhenses
integrantes do grupo dos Novos Atenienses não criaram a interpretação de que São Luís
foi fundada pelos franceses. Do século XVIII ao início do século XX, admitiram ou
proclamaram a autoria da fundação da cidade aos gauleses, por exemplo, além de Jean-
186
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
28, set. 2010.
187
LACROIX. Maria de Lourdes Lauande Lacroix – Historiadora. O Estado do Maranhão, p. 5, 30 ago.
2012.
188
LACROIX. A fundação francesa de São Luís e seus mitos, p. 164.
189
AMARAL, José Ribeiro do. Fundação do Maranhão: [memória histórica]. 2. ed. São Luís:
AML/EDUEMA, 2008. p. 58.
190
LACROIX. O mito da fundação na era do simulacro. O Estado do Maranhão, p. 3, 24 out. 2010.
191
Ver nota de Ferdinand Denis em ÉVREUX. História das coisas mais memoráveis, ocorridas no
Maranhão..., p. 100-101; e em ÉVREUX. Viagem ao norte do Brasil, p. 385-386.
192
LACROIX. O mito da fundação na era do simulacro. O Estado do Maranhão, p. 3, 24 out. 2010.
193
LACROIX. A fundação francesa de São Luís e seus mitos, p. 85.
194
Ibidem, p. 121.
195
Ibidem, p. 123.
Ferdinand Denis, o Padre José de Morais, Léon Guérin e Charles de la Roncière. Os
Novos Atenienses não promoveram a formação de um mito; eles resgataram a memória
de um fato histórico, longamente reprimida pelos portugueses, desde os tempos
coloniais. Foram eles os vencedores, e os vencedores tendem a impor a sua
interpretação dos fatos na historiografia.
Sobre a cerimônia de 8 de setembro, cabe enfatizarmos que a posse da terra e a
fundação de uma cidade não são eventos excludentes, mas complementares, o primeiro
como antecedente lógico do segundo.
Outro ponto é a cansativa atribuição da pecha de piratas, corsários ou invasores a
La Ravardière e a Razilly, característica do mito lusitano. Eles não foram piratas nem
corsários, ocuparam o Maranhão em nome da Coroa francesa, legitimados, em sua ação,
não por cartas de corso, mas por cartas patentes régias que os nomeavam lugares-
tenentes-generais. A França, nos séculos XV, XVI e XVII, não reconhecia a
exclusividade concedida pela Santa Sé aos ibéricos para a exploração e domínio das
terras descobertas ou ainda por serem descobertas no Novo Mundo, a América. Dito de
outra forma, não acolhia a tese do mare clausum, afirmada no Tratado de Tordesilhas
(1494) e em várias bulas papais de partição do Mar-Oceano. O comentário espirituoso
do Rei francês Francisco I de que gostaria de tomar conhecimento da cláusula do
testamento de Adão que o excluíra da partilha do mundo ficou célebre.
É curioso observarmos como a autora, sempre tão crítica e incisiva, não questiona
o que estava por trás da desqualificação dos gauleses como invasores por cronistas e
historiadores ibéricos e brasileiros no passo dos séculos.
A propósito, não obstante a irrelevância do ponto, La Touche pertencia a uma
família da pequena nobreza, porém aparentemente dotada de expressivos recursos
financeiros.
Após consignar que o “culto às origens francesas do Maranhão data do final do
século XIX, como reforço à idéia de singularidade da Província”, 196 Lacroix apregoa
que as elites maranhenses decadentistas, “influenciadas pelas idéias e práticas francesas
sopradas durante todo o século XIX, edificavam seus tempos de glória, delineando uma
identidade assentada no orgulho de ser superior e singular, com ênfase ao traço cultural
literário”, tendo como resultado a invenção, em São Luís, “de tradições, fenômeno
comum na última década do século XIX e mais acentuadamente nas primeiras décadas
do século XX”.197 Diz que, no cerne do discurso de louvação, “constituindo a
comunidade maranhense como a mais erudita, elegante, gentil e hospitaleira, surgiu a
construção de uma outra distinção: a da fundação de sua capital pelos franceses”, pois
aquele momento histórico caracterizado por céleres transformações sociais teria
demandado “dispositivos confirmatórios de uma identidade e coesão social”. 198 E,
assumindo o velho tom de exaltação da figura de Jerônimo de Albuquerque e de
desqualificação de Daniel de la Touche, tão cultivado em Olavo Lima e outros antes
dele, decreta:
No Maranhão, La Ravardière, suposto fidalgo francês, transformado em
novo herói, passou a fundador da cidade, sendo subtraída de Jerônimo de
196
Ibidem, p. 76.
197
Ibidem, p. 82.
198
Ibidem, p. 82.
Albuquerque Maranhão, o valente mestiço de português com índia –
símbolo da incivilidade – a honra da fundação de São Luís.199
Sintomaticamente, admite que não é possível ignorar “o marco fincado pelo
gaulês e as primeiras habitações levantadas pelos comandados de Daniel de La Touche,
que serviram de balizas para a futura cidade de São Luís”, mas frisa que “são frágeis
marcos, aproveitados pelos portugueses quando da fundação, organização e
planejamento da cidade de São Luís, capital da Colônia.” 200 Reconhece, por outro lado,
que o núcleo selecionado pelos gauleses para a sua instalação “corresponde à Avenida
D. Pedro II e adjacências, centro dos atuais poderes Executivo, representado pelo
Palácio dos Leões, o Paço Municipal e o Judiciário maranhense, com seu Tribunal de
Justiça localizados na referida Avenida”.201 Admite, ainda, que foram preservados “os
marcos iniciais da parte urbana da Ilha, alguns núcleos religiosos”, originados nas
“improvisadas capelas, melhoradas pelos missionários portugueses”, e a denominação
do Forte São Luís, “trasladada pelos portugueses à capital do Maranhão”.202
Insurge-se contra a comparação da fundação de São Luís com a de Québec, “onde
a colonização francesa deixou raízes profundas na forma arquitetônica, no traçado, no
idioma predominante.”203 Realmente, há grandes diferenças entre a fundação de Québec
e a de São Luís, pois no Maranhão os gauleses não tiveram tempo de deixar marcas
equivalentes às encontradas no Canadá; mas também há algumas semelhanças: ambas,
próximas no tempo (1608 e 1612, respectivamente), resultaram do esforço francês de
expansão ultramarina, de tentativa de implantação de colônias duradouras em pontos
estratégicos da América.
A historiadora insiste na suposta existência de um mito que retirou dos
portugueses a autoria da fundação de São Luís, propagado pelas elites decadentistas do
Maranhão, citando como modelo a ser seguido, na linha de Olavo Correia Lima, o
reconhecimento, pelo carioca, de Estácio de Sá como fundador do Rio de Janeiro:
Por que no Maranhão, essa influência [determinada pelo ambiente de
efervescência da Paris do século XIX] levou ao culto da fundação de São
Luís pelos franceses? O maranhense faz questão de conservar na memória
coletiva a fundação de sua capital pelos franceses, mesmo sabendo que
aqui só passaram três anos, um dos quais após a derrota de Guaxenduba.
Em 1555, mais de seiscentos franceses, na maioria calvinistas, aportaram
no Brasil, ocasião em que Villegagnon fundou a França Antártica, sendo
expulso em 1560. Os remanescentes da França Antártica, confiantes em sua
fortificação, permaneceram no morro da Glória até 1567, ocasião em que
Estácio de Sá tomou de assalto a região. Contudo, o carioca não valorizou
as pegadas francesas naquelas plagas, fazendo questão de ressaltar que o
Rio de Janeiro foi fundado por Estácio de Sá, apesar de sua chegada ter
ocorrido pouco mais de dois anos após Villegagnon ter erguido a
fortificação na ilha que hoje tem o seu nome.
De quando data este orgulho de São Luís ter sido fundada pelos franceses?
Já foi mostrada a ausência dessa afirmativa em diversas obras escritas nas
199
Ibidem, p. 83.
200
Ibidem, p. 44.
201
Ibidem, p. 29.
202
Ibidem, p. 37, 75.
203
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
29, set. 2010.
épocas colonial e imperial. Trabalhos contemporâneos baseados nas fontes
primárias não fazem alusão à fundação de São Luís, sempre referindo-se à
fundação da França Equinocial, da Colônia francesa, que extrapolaria a
Ilha, caso fosse consolidada.
Por que, quando e como foi se reproduzindo a idéia de excluir a ação
lusitana da fundação de São Luís? Parece que a decisão portuguesa de
transpor para a cidade o nome de São Luís, primeiramente atribuído pelos
franceses ao Forte, foi muito vigorosa a ponto de impor o desconhecimento
do planejamento urbano e construção da cidade e de sua organização
jurídico-administrativa pelos portugueses. Por que, na concepção de alguns
intelectuais do fim da época imperial e do período republicano, as palhoças
francesas foram mais perenes que o casario de pedra e cal dos lusos?
Aquele frágil núcleo, quase restrito ao forte, foi histórica e culturalmente
mais incisivo que toda a expansão urbana, nas diversas etapas da
construção da cidade de São Luís. E prepondera até hoje.
[...]
Continua-se a lembrar que [o Maranhão] já teve fortuna, todo um
esplendor tangível e, sobretudo intelectual e já foi diferente das outras
províncias. Para acentuar esse suposto atributo, as elites decadentistas
apontaram a breve e frágil passagem francesa pelas terras maranhenses
como o fator diferenciador de uma identidade singular, apesar da evidente
lusitanidade de suas origens e tradições.204
Revela que a sua preocupação tem como foco “a formação da identidade
maranhense, ora trabalhada como Atenas, fortalecida pela singular origem francesa de
São Luís e presentemente identificada como a Jamaica brasileira”, acrescentando que,
quando “o maranhense quer criar uma imagem de si, se projeta na imagem de outro”, de
modo que ele “é ateniense, francês ou jamaicano”, diferentemente da atitude do carioca,
que “não nega a autoria de sua cidade a Estácio de Sá”, embora a permanência dos
gauleses no Rio de Janeiro haja sido “mais duradoura, assim como suas construções
perenes”, no que repercute, uma vez mais, a posição de Olavo Lima. 205
A obsessão em rebaixar o fato histórico da fundação de São Luís pelos franceses a
uma mera condição de mito estimulado pelas elites decadentistas maranhenses leva a
pesquisadora a desconsiderar que a interpretação em prol do reconhecimento da
“fundação” portuguesa da cidade nasceu em um contexto de afirmação da legitimidade
da conquista lusa do Maranhão e do poder colonial português, de interesse da Coroa e
das elites que a apoiavam na metrópole e no Maranhão Colonial.
Sobre a preocupação da autora com a formação da identidade maranhense, é
reveladora a constatação de que Lacroix aparentemente não julgaria também uma
projeção na “imagem de outro” se o maranhense se visse como português. Aliás, é bom
lembrarmos que um dos epítetos de São Luís é “Cidade dos Azulejos” e que este
fenômeno não é exclusivo destas paragens. Quem nunca ouviu falar da Paris do Oriente
e da Veneza Brasileira?
Flávio Reis, com Guerrilhas, uma reunião de artigos, a maioria publicados na
imprensa maranhense, no rol dos trabalhos diretamente influenciados por A fundação
204
LACROIX. A fundação francesa de São Luís e seus mitos, p. 75-78.
205
LACROIX. A reconquista do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, p.
29, set. 2010.
francesa de São Luís e seus mitos, é um dos mais autênticos porta-vozes do
entendimento da historiadora. Na obra, mais exatamente nos itens “Franceses,
atenienses e historiadores no Maranhão”, “O mito francês e a dança dos historiadores”,
“O Maranhão bárbaro e sua miséria historiográfica”, “Mito e fundação (réquiem para
historiadores)” e “O mito fundador”, o autor tece considerações laudatórias sobre o livro
de Lourdes Lacroix e o prefácio deste, de autoria de Flávio José Silva Soares, e incide
na mesma abordagem reducionista da professora, empregando o mesmo discurso, com
semelhante nível de sofisticação cientificista, para reafirmar a suposta existência do
mito francês da fundação de São Luís. Na sua jornada contestatória, sem suporte nos
fatos históricos conhecidos, escreve mais um capítulo da reprodução do mito da
“fundação” portuguesa de São Luís.
Alguns trechos são reveladores dessa realidade. No primeiro, é patente o
propósito de desqualificação da maior parte da historiografia maranhense (somente a
que apoia os franceses como fundadores de São Luís):
Acho que o mito gaulês pode ser olhado no bojo da constituição da
historiografia maranhense. Compostos, em sua maior parte, de trabalhos
laudatórios e repetitivos, preocupados em inscrever determinados fatos e
personagens, os estudos históricos considerados clássicos no Maranhão
ainda não foram objeto de reflexão historiográfica no sentido estrito.
Afinal, como se escreve a história do Maranhão? [...] História onde não se
pergunta, perdida na afirmação e na repetição canônica de autores. A
própria universidade, com uma produção de mais de vinte anos, entre teses,
dissertações e monografias, não conseguiu superar essa estrutura
afirmativa. As duas academias, a de letras e a universitária, comungaram
do pacto silencioso em que a verborragia elogiosa fechava os olhos à
realidade a que se reportava e a ‘crítica científica’, arremedo da
historiografia pretensamente moderna desenvolvida em outros centros, não
conseguia se perguntar como essa história era tecida.206
Na segunda passagem, a investida é contra as realizações dos gauleses
colonizadores, absurdamente subestimadas:
De todo modo, a julgar pelas indicações disponíveis, os franceses mais
parecem ter partilhado locais de convívio com os índios, muitos vivendo
mesmo em aldeias próximas ao forte, que tentado definir uma organização
mínima de cidade.207
O autor, tão crítico da historiografia que apenas repete, acriticamente, o assentado
anteriormente, cai na tentação que tanto reprova acidamente, ao reafirmar um equívoco
propalado por Lourdes Lacroix:
Entretanto, o problema interessante é quando nos damos conta de que a
ideia de uma fundação francesa era estranha aos trabalhos históricos, pelo
menos até o final do séc. XIX, e mesmo ao que se costuma chamar de
informação geral.208
Ao propor que a indagação principal mora não sobre a autoria da fundação de São
Luís, mas sobre o motivo pelo qual os gauleses passaram a ser vistos como fundadores
da cidade a partir do começo do século XX, quando antes eram acoimados de invasores,
206
REIS, Flávio. Guerrilhas: artigos. São Luís: Pitomba/Vias de Fato, 2011. p. 16-17.
207
Ibidem, p. 19.
208
Ibidem, p. 19.
deixa de perquirir, convenientemente, a razão pela qual eles foram, em primeiro lugar,
tachados de invasores:
Discutir a questão proposta pela profª Maria de Lourdes Lacroix no
polêmico A Fundação Francesa de São Luís e Seus Mitos, implica
fundamentalmente em perceber a modificação efetuada na formulação da
pergunta. O livro não tenta responder a uma indagação sobre quem fundou
São Luís. A pergunta colocada é por que os franceses passaram a ser
olhados como fundadores da cidade a partir do início do século XX, se até
então eram tratados como invasores e a própria França Equinocial não
passava de um intento malogrado?209
Idêntica “visão de espelho” pode ser encontrada em Alteré Bernardino. No artigo
“A mentira sobre os 400 anos da fundação de São Luís”, citando João Mendonça
Cordeiro na asserção de que “atenienses alienados, em busca de um presente glorioso
como fora no passado a Atenas Brasileira, dominados pelo galicismo, criaram, em 1912,
o mito da fundação francesa da cidade de São Luís”, ele enfatiza que essas pessoas
“trocaram o verdadeiro e único fundador de nossa cidade, o brasileiro pernambucano,
mameluco Jerônimo de Albuquerque – fruto das etinias (sic) portuguesa e indígena –
pelo pirata francês La Ravardière.” 210 Uma vez mais, La Touche é representado como o
vilão pirata e estrangeiro que não apenas invadiu o Brasil, como usurpou de um
brasileiro (sozinho, como de costume, porque Razilly não é referido) a honra da
fundação de São Luís. E outra vez a historiografia que propugna o reconhecimento dos
gauleses como fundadores da cidade é pintada como “não científica”, ou,
explicitamente, neste caso, “alienada”.
Não há dúvidas, portanto, sobre a existência de um mito lusitano a respeito das
origens de São Luís. Todavia, não há mito gaulês no sentido que lhe atribui Lacroix e os
seus seguidores, de “tradição inventada”, de “criação fantasiosa de algo que desconhece
o real”. A atribuição da autoria da fundação de São Luís aos franceses encontra sólida
justificação nos fatos conhecidos, revelados pelas fontes primárias. Ao contrário do que
é frequentemente propalado, não é uma interpretação criada pelos Novos Atenienses,
não está adstrita a um tempo (século XX) ou a um espaço (Maranhão). Neste sentido, o
único mito possível é o da fundação “portuguesa” da cidade. Daí a constatação de que a
controvérsia sobre a fundação de São Luís é uma falsa polêmica, em que um mito
(luso), travestido de “ciência”, é contraposto à verdade histórica autorizada nas fontes
disponíveis, inadequadamente transformada em mito (francês).
Por outro lado, todo acontecimento humano, todo fato relevante na história da
humanidade, ocorrido em um tempo primordial, admite interpretações míticas, o que
significa que a fundação de São Luís promovida por Daniel de la Touche e François de
Razilly admite mitificações, entre francófilos e lusófilos indistintamente, por razões
distintas, sobre a atuação dos gauleses em aspectos raramente percebidos pelos
estudiosos, como aquela que obscurece a figura de Razilly e o converte em um fundador
constantemente esquecido, apesar de sua posição de “senhor da colônia”, 211 participante
209
Ibidem, p. 33.
210
BERNARDINO, Alteré. A mentira sobre os 400 anos da fundação de São Luís. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico do Maranhão, Edição eletrônica, São Luís, v. 1, n. 38, p. 141, set. 2011.
Disponível em: <http://issuu.com/leovaz/docs/>. Acesso em: 9 out. 2011.
211
A própria autora Maria de Lourdes Lauande Lacroix anota, mas apenas com a intenção de reforçar o
seu argumento da construção do mito da fundação francesa da cidade, que os “documentos não apontam
La Ravardière como o sócio proeminente da empresa, como foi projetada sua imagem por intelectuais
maranhenses contemporâneos.” LACROIX. A fundação francesa de São Luís e seus mitos, p. 154.
de todos os eventos preparatórios e implementadores da fundação e responsável pelo
batismo do próprio forte que daria o nome à cidade, em favor da onipresente
supervalorização da figura de La Ravardière, pois, afinal, é mais fácil e mais simbólico
destacar os feitos de um único herói ou concentrar as críticas em um único vilão.
É claro que o culto às origens francesas do Maranhão do final do século XIX
ofereceu condições propícias a que um grupo de intelectuais maranhenses do século XX
resgatasse do limbo do esquecimento importantes fatos históricos relacionados à
história de São Luís. É claro que a origem francesa da cidade tem mais apelo turístico,
pela sua singularidade. E pode servir a diferentes interesses e fins, de diferentes grupos
e diferentes elites. Mas não é por isso que defendemos os franceses como fundadores de
São Luís. Fazer ciência “honesta”, primar pela “honestidade histórica”, não significa
neutralidade, porque esta é um mito; no entanto, implica investigar todos os principais
aspectos e implicações de uma questão, e não desconsiderar como acrítico, alienado ou
não científico a priori todo o entendimento que não navegue pelas mesmas águas.
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FUNDAÇÃO MÍTICA DE CIDADES:
Elementos para a ritanálise da Bigfesta dos 400
anos de São Luís.
Pensatempos.
Mia Couto
212
Professor Associado III – Antropologia – PGCult/UFMA. Coordenador do CRISOL - Grupo de
Pesquisas e Estudos Culturais: http://crisol-gpec.com.br/site/
maranhense, situada na periferia do sistema-mundo (Wallerstein, 1974), oferece uma
oportunidade interessante para observarmos aspectos elementares desse processo
simbólico fundamental. Realizamos diversas pesquisas empíricas, nesses últimos anos -
entrevistas, estudos e levantamentos mais pontuais, além da observação de eventos e
reuniões públicas -, que corroboram a importância hermenêutica dos fenômenos
mitológicos na sociedade atual.
A construção social das comemorações do IV Centenário é mais uma chance de
avançarmos nesse sentido. Para além do estudo sociográfico particular dos ritos locais, é
antes de tudo importante enquanto ponto de comparação com os ritos do passado
histórico, e de outras regiões e sociedades. Caso recuperemos da história exemplos mais
ou menos eloquentes de grandes cerimônias públicas pautadas nas fundações míticas de
cidades, - com antecedentes de grande alcance civilizatório e expressão universal -,
nossa lista seria vasta. Mas o caso mais exuberante de uma listagem rápida pode ser
ilustrado com a lembrança da fundação mítica da cidade de Roma: a cidade eterna.
Todos nós temos profunda atração pelos enunciados discursivos que invocam as
origens dos núcleos urbanos antigos; e mais especialmente os centros urbanos
patrimonializados no decorrer do século XX. É o que ouvimos recorrentemente
enunciado, abrindo discursos de autoridades, políticos, intelectuais, artistas, escritores
etc.: “Desde a fundação da cidade...”. E o caso de Roma vem a mente porque trás
consigo a recalcitrante pergunta; quem fundou: Rômulo ou Remo? Em busca dessa
resposta entra-se no labirinto do maravilhoso reino da lenda! Diferentes versões já
foram formuladas, em séculos de especulações, através de pesquisas arqueológicas e
históricas na região do Lácio. Todavia, é o mundo da Mitologia que não nos deixa
escapar da imaginação, da fábula, dos sonhos e das quimeras.
Sabemos através do legado que nos deixaram, - acumulando séculos de
narrativas, em versões variadas -, que uma loba fabulosa criou os dois irmãos-
fundadores, vivendo posteriormente em lutas e combates; terminando por disputar o
fatal embate fraticida. Rômulo assassina Remo; como nos narram Virgílio e Tito Lívio.
Rômulo, o vencedor, toma Roma para si... Não obstante, Rômulo não constrói Roma
sozinho. Junto com ele quem constrói a nova cidade: os latinos ou os sabinos? E
para além dos latinos ou dos sabinos, teriam sido os vênetos? Ou teve a coparticipação
dos umbros, oscos, tadiates, tadinates, ausônios, saminitas, lucanos, rútulos, picenos,
bretões etc.; ou ainda, os sículos, sicanos e elimos? Quem saberá a resposta mais
verdadeira, mais exata, mais científica? É certo que considerando o fato de todos terem
formado um agrupamento sociocultural denominado itálico, ou italiota, e de suas
línguas derivar o latim, os futuros moradores da Cidade Eterna possuem origens
comuns.
Essas perguntas revelando oposições e polaridades operam e ativam o poder dos
mitos; o qual não podemos contornar, nem nos livrarmos, com fórmulas científicas e
racionais salvadoras. Em Roma, tal qualquer cidade, - com narrativas sobre fundação ou
origem de povoados, vilas, lugarejos, grupos, pessoas etc., - os mitos ocupam o lugar de
articulação dos símbolos e do imaginário, recolhendo-se do real os signos adequados a
sua movimentação e eficácia.
Em São Luís assistimos igualmente a um embate parecido, numa disputa mítica
peculiar, quando encontramos a oposição de duas versões narrativas rivais. Essas duas
versões invocam as origens europeias. Por que só europeias? Por que não se atribui a
fundação da cidade aos indígenas: Tupinambás vindos da Bahia, após expulsarem os
Timbiras/Tapuias para o continente (Lopes, 1970)? Ora, como é sabido, esses indígenas
não construíam cidades, viviam em aldeias. Também não se atribui a fundação aos
africanos; porque ainda não habitavam a região, já que não transcorria ainda o tráfico de
escravos. Resta para o embate dramático a presença dos franceses e dos portugueses,
representados pelo confronto das personagens heroicas de Daniel de la Touche, do lado
franco; e Jerônimo de Albuquerque, do lado luso (-brasileiro).
Esse breve texto de apresentação no presente Seminário Comemorativo, focamos
elementos estruturais e histórico-culturais dos ritos festivos a partir das configurações
mitológicas características a efeméride em tela. Trata-se de aspectos elementares de
uma ritanálise avançada (Maertens, 1987), desenvolvida simultaneamente com a
mitanálise a qual está intrinsecamente vinculada e imbricada.
Simulacros e Reflexividade
Para nos guiarmos nessa aventura interpretativa, no intuito de decifrar as
particularidades e os sentidos da virada da produção atual de significados dos mitos e
ritos comemorativos históricos e das festas públicas correspondentes; nos apoiamos,
entre outros autores, em Jean Baudrillard (1991), especialmente no texto Simulacros e
Simulação. E o parágrafo abaixo, cai como uma mão na luva; dissipando dúvidas
quanto as transformações virtuais as quais estamos testemunhando. Assim:
Quando o real já não é o que era, a nostalgia assume todo o seu sentido.
Sobrevalorização dos mitos de origem e dos signos de realidade.
Sobrevalorização de verdade, de objetividade e de autenticidade de
segundo plano. Escalada do verdadeiro, do vivido, ressurreição do
figurativo onde o objeto e a substância desapareceram. Produção
desenfreada de real e de referencial, paralela e superior ao desenfreamento
da produção material: assim surge a simulação na fase que nos interessa -
uma estratégia de real, de neo-real e de hiper-real, que faz por todo o lado
a dobragem de uma estratégia de dissuasão (1991, p. 14).
Levar a frente os alcances interpretativos dessa análise penetrante, não é fácil, no
contexto atual de uma recalcitrante resistência à crítica cultural (MARCUS &
FISCHER, 2000). Reluta-se em compreender a importância desse processo de
"sobrevalorização" dos mitos, dos signos, da verdade, da objetividade, da
autenticidade... Trata-se de uma resistência subjetiva que configura um obstáculo
epistemológico difícil de superar, sem um trabalho de escavação semiológica. É como
estar diante do espelho e não acreditar no que se vê: é preciso dissimular, fingir,
disfarçar... Estratégias de simulação e dissimulação, nos mínimos detalhes: nos
discursos, nas ações, nas encenações.
Como nos apontou Henri-Pierre Jeudy (1990, 1995), estamos testemunhando a
ativação do "princípio de reflexividade", enquanto base de todo um processo de
patrimonialização das identidades em escala global. Nesses espelhos das cidades os
patrimônios culturais, as memórias sociais e monumentos históricos tornam-se
simulacros; já não há mais tradição, real, objeto, substância. Já não faz mais sentido
agarrar-se na "historiografia" científica garantidora de uma suposta "verdade histórica",
respondendo cientificamente a pergunta aflita: - quem fundou a cidade de São Luís: os
seguidores de Daniel de la Touche ou Jerônimo de Albuquerque? Constata-se: "A
história é o nosso referencial perdido, isto é, o nosso mito" (Baudrillard, 1991, p. 59).
A empresa anunciada à rosa dos ventos, de desmitificar a fundação da capital do
Maranhão, revelando a "verdade histórica e científica" de sua fundação, - elegendo
critérios "autênticos" de averiguação do ato fundador - carece de razoabilidade e
aceitação. Em resposta encontramos a mofa, o riso e a ironia. Mais uma vez, é o mito
que invade, como conteúdo imaginário, a cena midiática, teatralizada e
dessubstancializada; mais um capítulo na longa noite da nostalgia do referencial
histórico perdido.
213
Acesso a Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão:
http://issuu.com/leovaz/docs/revista_ihgm_36_-_mar_o_2011b
Desenvolvemos duas linhas de pesquisa paralelas, porém simultâneas e
concomitantes; separadas aqui por razões didáticas: a) Mitanálise; b) Ritanálise. Essa
segunda linha de pesquisa, enfatizada aqui, sustenta a hipótese das rupturas e
descontinuidades (mudanças e permanências) no longo ciclo festivo e comemorativo
invocado, a partir da proliferação de mega-eventos recentes na sociedade brasileira,
indicando mudanças e variações no modelo colonial barroco herdado. Com a entrada na
alta modernidade, observamos os impactos de novos elementos, transformando e
abalando a gramática litúrgica convencional; para além das bases econômicas e sociais,
que já sofrem recentes modificações estatísticas. Mega-eventos como Panamericano,
Encontro Mundial da Juventude Católica, Olimpíadas, Copa do Mundo e outros, estão
transtornando as bases de produção e re-produção desses rituais litúrgicos na
atualidade.
214
Noção empregada por MacCannel e referida por Silvana Araújo no texto “Artifício e autenticidade:
o turismo como experiência antropológica” (Banducci Jr, 2001).
215
Uma análise mais especifica desse aspecto, ver o texto O labirinto dos significantes na cultura
barroca (Corrêa, 2009).
cotidiano hierárquico e desigual, e dos conflitos acerca da cultura política e da mitologia
da ‘fundação’, se confirmam mais uma vez. Processo que se dá pela via estratégica da
enunciação triunfalesca do poder laico e religioso; tudo isso em busca de afirmação e de
hegemonia. Metaforização de um discurso de poder através da festividade elevada a
última potência; como prometem os organizadores oficias do grande evento, já
designado de bigfesta: Pra Entrar para a História! No fenômeno da festa, como se
sabe, há a motivação buscada do prazer; o ensejo lúdico, proporcionando a fuga do
‘horror ao vazio’. É a eficácia do artifício político de fazer prender e submeter todos à
magia admoestadora do brilho e da glória do poder. Como escreveu João Francisco
Lisboa, sobre a Festa de N. S. dos Remédios, ilustrando nossa tese:
Um dos maiores benefícios que dispensa a Virgem com sua festa (...) é este
prazer universal, tantas classes confundidas, tantas dores adormecidas,
tantos escravos deslembrados de seus ferros. Inda mal, que é tudo tão
fugaz! Não importa, é um momento de repouso nesta lida que só tem a
morte por termo, é um conforto para recomeçar-se com mais vigor a tarefa
do dia seguinte. Mil ferventes e gratas orações à compassiva e
misericordiosa Virgem (1992, p. 61).
Para nós, nos limites desse texto, a hipótese com a qual estamos trabalhando
assenta-se na continuidade do modelo de festividade, ou festival, seguindo a linha
temporal da festa maior da história colonial, qual seja o Triunfo Eucarístico de 1733,
ocorrida em Vila Rica (Tinhorão, 2000). Nela aglutinam-se, numa só imagem coletiva,
as desinências culturais do sagrado e do profano, escrevendo uma primeira metáfora do
êxito sociológico da miscigenação e do sincretismo místico que alimenta até hoje, em
pujança tropical e dionisíaca, a resistência das classes dominadas contra a coerção de
uma estrutura hierarquizada e desigual, e historicamente perversa, consolidada na
sociedade brasileira permanecendo inalterada em diversos torrões. E no torrão
maranhense esse processo se dá de forma extraordinariamente semelhante e
persistente216.
A consagração festiva do Triunfo Eucarístico premonitório nos tem preparado
para entender a contradição brasileira e em especial as aberrações e incongruências
regionais e locais. Além de servir para compreender a festa brasileira (Perez, 2011), e os
fenômenos ligados à liminaridade e ao excesso, como processos vinculados à gênese e à
transformação de nossa cultura e de seus agentes sociais; assim como ajuda também a
apreender a lição moderna de liberdade e interação que ainda nos é presentificada pelo
espetáculo cíclico do Carnaval, alegria eufórica programada, agendada, ritualizada e
cada vez mais frugal, prometendo um estado permanente de festa e efervescência
coletiva, como bálsamo fugaz em meio a tantos infortúnios.
Palavras Finais
216
Utilizamos o termo torrão no sentido de torrão natal (homeland), terra natal, empregado pelo
geógrafo maranhense Raimundo Lopes que aos 17 anos de idade publicou livro famoso no Maranhão, O
Torrão Maranhense. Obra que hoje compõe publicação reeditada conhecida como Uma Região Tropical
(Lopes, 1970). A expressão adquiriu grande repercussão no imaginário regional, surgindo
recorrentemente em toadas de bumba-boi e em diversas canções e poemas populares e eruditos. Em
breve, vamos desenvolver estudos sobre possíveis paralelos literários entre o torrão natal (homeland) dos
poetas brasileiros e a waste land (tierra baldia) do poeta T. S. Eliot (1888-1965). Sobre a obra Waste Land
de Eliot, ver as análises do antropólogo mexicano Roger Bartra, em Culturas Liquidas (2008).
Como desfecho de minha fala sobre o entrelaçamento entre mito, rito e festa,
recupero trechos do poema de Jorge Luís Borges (1899-1986) intitulado Fundación
Mítica de Buenos Aires, em que o escritor portenho lapida com precisão e
síntese sutil o alcance parcial de nossas palavras mais prosaicas. O verso a
destacar do poema em tela, - “los hombres compartieron un pasado ilusório” -, nos
insita a enfrentar a dimensão positiva, não negativa, da ilusão mítica fundacional
projetada sobre as nossas origens. Ilusão no sentido de que não há possibilidade de
certezas, definições definitivas ou sólidas, das imagens ou configurações simbólicas
originais. Buenos Aires é eterna para o poeta, porque suas projeções imaginárias são
líquidas e etéreas, como a água e como o ar, referidos no verso final do poema.
Roland Barthes (1972) colocava que toda fala é uma fala mítica, e é sob esse
prisma que ressaltamos outro aspecto presente no verso borgeano destacado,
concernente ao sentido do verbo compartilhar: “los hombres compartieron un
passado...”. Esse ponto é importante, e é o que merece nossa reflexão final. Creio que
com o passar do tempo poderemos avaliar melhor os trabalhos concluídos de celebração
do IV Centenário, nesse sentido do compartilhamento, isto é, da fala em comum.
Muito embora, seja possível adiantar nesse momento um olhar distanciado e
admitir que Roberto da Matta (1979; 1984) foi feliz, e nos parece ter razão, quando
apontou para o traço melancólico do crítico brasileiro (Chauí, 2001), que confunde
geralmente, crítica com flagelação 217. É o que observamos em muitos textos produzidos
nesse período preparatório. A persistência nesse trajeto queixoso talvez signifique que o
que nos distingue seja realmente muito frágil, sendo obscurecido por uma recalcitrante
fantasmagoria nostálgica. Resulta desse estado de espírito a sensação de que afinal
deixamos escapar mais uma vez outra boa oportunidade de avançar na compreensão das
potencialidades de nossa singularidade, no mosaico sociocultural brasileiro.
Por fim, atravessando estas veredas interpretativas, e aludindo a pergunta título
do Seminário 6 – São Luís foi fundada por quem? Peço licença ao parodiar o verso
borgeano: “para mim, só na lenda começou São Luís”!
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LANÇAMENTOS DE LIVROS NO PALÁCIO
CRISTO REI
DILERCY ADLER
Que mais TINKUYs aconteçam em nossas vidas, em nossa São Luís, no nosso
Maranhão, no nosso Brasil, na nossa América do Sul e no nosso mundo inteiro!!!!
Saudações Gonçalvinas,
Dilercy Adler