Вы находитесь на странице: 1из 12

DOI: 10.1590/1413-812320141911.

11442014 4371

Intersetorialidade e Estratégia Saúde da Família:

artigo article
tudo ou quase nada a ver?

Intersectoriality and the Family Health Strategy:


highly relevant or almost irrelevant?

Maria Socorro de Araújo Dias 1


José Reginaldo Feijão Parente 2
Maristela Inês Osawa Vasconcelos 2
Fernando Antônio Cavalcante Dias 1

Abstract In this study, the understanding of in- Resumo Neste estudo, analisou-se a compreen-
tersectoriality together with the Family Health são da intersetorialidade com a Estratégia Saúde
Strategy (FHS) was analyzed from the percep- da Família (ESF), a partir das percepções de sujei-
tions of individuals involved with the social con- tos sociais implicados com o contexto da atenção
text of primary care in the city of Sobral in the básica no município de Sobral (CE). Estudo analí-
state of Ceará. An analytical study of a qualitati- tico, de natureza qualitativa. Elegeu-se o grupo fo-
ve nature was conducted in May 2014. The focal cal como técnica de coleta de dados, com 11 parti-
group was the data collection technique with 11 cipantes, escolhidos a partir de funções chaves que
participants chosen for the key functions they per- exercem na interface direta com a ESF, realizado
form in their direct interface with the FHS. Data no mês de maio de 2014. As informações foram
were analyzed using the Lefevre and Lefevre Dis- analisadas pela técnica do Discurso do Sujeito
course of the Collective Subject technique (2003). Coletivo de Lefevre e Lefevre (2003). Utilizou-se
The “word cloud” analysis technique – a graphical também a técnica “nuvem de palavras”, criadas a
way of viewing linguistic data based on WordleTM partir do software WordleTM, uma forma gráfica
software – was also used. Five discourses on in- de visualização de dados linguísticos. Foram pro-
tersectoriality were produced: a) the understan- duzidos 5 discursos sobre intersetorialidade: o en-
ding of the group; b) its importance in the context tendimento do grupo; sua importância no contex-
of the FHS; c) actions performed in the FHS; d) to da ESF; ações realizadas na ESF; facilitadores e
facilitators or obstacles to intersectoriality in the dificultadores da intersetorialidade na ESF; suges-
FHS; e) suggestions for enhancing intersectorial tões para fortalecimento da intersetorialidade na
cooperation in the FHS. The responses highlighted ESF. As respostas evidenciaram a complexidade
the complexity of this issue, which requires health desta questão no contexto da ESF, a qual deman-
managers and professionals to overcome the re- da dos gestores e profissionais de saúde a neces-
1
Centro de Ciências da ductionist model that is derived from a biological sidade de superarem o modelo reducionista, que
Saúde, Universidade perspective on health, the polysemic nature of the tem a ver com a perspectiva biologicista em saúde,
Estadual Vale do Acaraú.
Av. da Universidade 850,
term and acknowledging that this is a project un- do caráter polissêmico que o termo apresenta e de
Campus de Betânia. der construction. reconhecerem que se trata de uma proposta em
62040-370 Sobral CE Key words Family health strategy, Intersectorial- construção.
Brasil.
socorroad@gmail.com
ity, Health promotion Palavras-chave Estratégia Saúde da Família, In-
2
Escola de Formação em tersetorialidade, Promoção da saúde
Saúde da Família.
4372
Dias MSA et al.

Introdução ideia de partilhamentos de: significados, conhe-


cimentos, compromissos, valores, afetos, respon-
Nos séculos XVI e XVII, observa-se a ascensão de sabilidades e ações.
um modelo de pensamento que deu origem à ci- É necessário destacar ainda que muitas vezes
ência moderna, influenciando significativamente observam-se práticas multisetoriais que são apre-
a forma de ver e agir das gerações subsequentes. sentadas, rotuladas ou interpretadas como se fos-
Esse modelo, chamado de cartesiano ou meca- sem intersetoriais. Nas práticas multisetoriais há
nicista, teve origem na passagem do paradigma apenas a presença de vários setores dedicando-se
medieval para o moderno1. à resolução de um problema, mas não se observa
A modernidade caracteriza-se pela centrali- a questão da reciprocidade. Prevalece a lógica e o
dade do homem, que passa a acreditar no poder ritmo da serialidade, ou seja, há soma de esforços
absoluto da ciência. Por sua vez, elege-se o méto- que se sucedem mas não há sinergia. Interseto-
do científico como condição fundamental para a rialidade implica coparticipação efetiva, ou seja,
compreensão e a ação sobre a realidade. A lógica fazer parte da gestão, da produção e do usufruto
é a de tudo dividir para melhor compreender2. compartilhado de algo ou de um processo6.
Este procedimento vai produzir ao longo do tem- A Estratégia Saúde da Família (ESF) compre-
po uma série de desdobramentos reducionistas ende um modelo de atenção à saúde no contexto
sobre a concepção de mundo e sobre a forma de da Atenção Básica em Saúde, que se estrutura na
o homem lidar: consigo mesmo, com os outros perspectiva do trabalho de equipes multiprofis-
homens e com a natureza. sionais em um território adstrito desenvolvendo
Como consequência desta visão, tem-se a ações a partir do conhecimento da realidade local
fragmentação do saber, o surgimento das espe- e das necessidades da população deste território7.
cializações e a dicotomia entre as diversas áreas A ESF pretende garantir a aproximação dos
do saber e da vida. O mundo todo se departa- profissionais e dos centros de saúde da família
mentaliza. Dimensões da vida humana são con- da população, promovendo o acesso aos servi-
sideradas isoladamente, isto vale para os campos ços básicos ao possibilitar o estabelecimento de
da saúde, da educação, da economia, das artes, do vínculos entre a equipe e os usuários, bem como
trabalho. Cada coisa, segmentadamente, adquire viabilizar a continuidade do cuidado, e ainda,
vida própria como se isso fosse de fato possível3. aumentar, por meio da corresponsabilização da
A intersetorialidade representa um princípio atenção, a capacidade de resolutividade dos pro-
da Política Nacional de Atenção Básica no Brasil, blemas de saúde mais comuns, implicando me-
ao sinalizar como atribuições de todos os pro- lhores e maiores impacto na situação de saúde
fissionais que integram as equipes da Estratégia local.
Saúde da Família, o desenvolvimento de ações O modelo da ESF traz como diretrizes a inte-
intersetoriais por meio de parcerias e de recursos gralidade e a equidade da atenção, a coordenação
na comunidade que possam potencializar estas e a longitudinalidade do cuidado das famílias e
ações, além de favorecer a integração de projetos das pessoas sob sua responsabilidade. A orga-
sociais e setores afins orientados para a promo- nização do trabalho das equipes deve estar cen-
ção de saúde4. trada nas necessidades dos usuários e na busca
O exercício da intersetorialidade denota um contínua de melhoria da qualidade dos serviços
movimento de superação da visão e das práticas ofertados à população.
fragmentadas, sendo, ainda, uma estratégia de Desdobra-se desta premissa a indagação: in-
produção crescente de articulações entre diferen- tersetorialidade e Estratégia Saúde da Família:
tes segmentos, tanto no plano interno quanto no tudo ou nada a ver? Propõe-se problematizar esta
externo5. pergunta de partida a partir de um diálogo entre
Na saúde, este esforço significa reconhecer a a produção científica circulante e os atores que
complexidade da realidade sanitária e que ações vivenciam o cotidiano da ESF, orientados pela si-
isoladas e descontextualizadas não conseguirão metrização destes diferentes saberes.
produzir os resultados desejados do ponto de Objetivou-se, portanto, analisar a compre-
vista de transformação das condições de saúde ensão da (inter) relação da intersetorialidade
da população. com a Estratégia Saúde da Família a partir das
Compreende-se aqui que a intersetorialidade percepções de sujeitos sociais implicados com o
implica em reciprocidades dos atores que atuam contexto da atenção básica do município de So-
no contexto da saúde coletiva, o que sugere a bral (CE).
4373

Ciência & Saúde Coletiva, 19(11):4371-4382, 2014


Metodologia Para organização, análise e interpretação das
falas apreendidas no grupo focal, utilizamos a
Trata-se de um estudo qualitativo e analítico, no Técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC).
qual se tomou como cenário o Sistema de Saúde Este método, na prática, consiste na união, num
de Sobral (CE), com foco na Estratégia Saúde da só discurso-síntese, de vários discursos individu-
Família. A cidade de Sobral possui uma popula- ais emitidos como resposta a questões de pesqui-
ção de 203.147 habitantes, com renda per capita sa, por sujeito social e institucionalmente equi-
de R$ 13.501,81 e Índice de Desenvolvimento valente ou que faz parte de uma mesma cultura
Humano (IDH) de 0,714. Cerca de 7 mil famílias organizacional e de um grupo social homogêneo,
encontram-se na situação de extrema pobreza8. A na medida em que os indivíduos que fazem parte
ESF se organiza a partir de 32 Centros de Saúde deste grupo ocupam a mesma ou posições vizi-
da Família com 57 equipes de Saúde da Família, nhas num dado campo social10.
38 equipes de Saúde Bucal, 6 equipes de Núcleo A técnica consiste basicamente em analisar o
de Apoio à Saúde da Família, 14 tutores do Siste- material verbal coletado em pesquisas que têm
ma Saúde Escola e 52 Residentes em Saúde da Fa- depoimentos como sua matéria-prima, extrain-
mília. O Sistema Saúde Escola compreende uma do-se de cada um destes as Ideias Centrais ou
rede ampliada e descentralizada de processos de Ancoragens e as suas correspondentes Expres-
aprendizagens formais e não formais no cenário sões Chave. Com Ideias Centrais/Ancoragens e
da educação em saúde9. A taxa de cobertura da Expressões Chave semelhantes compõe-se um ou
ESF no município é de 85% da população. Os vários discursos-síntese que são os Discursos do
participantes foram escolhidos a partir de fun- Sujeito Coletivo11.
ções com interface direta com a Estratégia Saúde Outra ferramenta utilizada para auxiliar a
da Família, a saber: a coordenadora da atenção análise dos dados foi a técnica nuvem de palavras
básica; dois gerentes de Centros de Saúde da (ou “nuvem de texto”), criada a partir do softwa-
Família; a coordenadora do Núcleo de Apoio à re WordleTM. Esta pode ser compreendida como
Saúde da Família; três tutores do Sistema Saúde uma forma de visualização de dados linguísticos,
Escola de Sobral; e, os seguintes atores vinculados que mostra a frequência com que as palavras apa-
à Residência Multiprofissional em Saúde da Fa- recem em um dado contexto12. A técnica de cons-
mília: a coordenadora, um tutor e dois residentes. trução destas nuvens (tag clouds) consiste em usar
A técnica utilizada para coleta de dados foi o tamanhos e fontes de letras diferentes de acordo
grupo focal, com origem na entrevista grupal. O com as ocorrências das palavras no texto analisado,
termo grupo refere-se às questões relacionadas gerando uma imagem que apresenta um conjunto
ao número de participantes, às sessões semies- de palavras, coletadas do corpo do texto e agrega-
truturadas, à existência de um setting informal das de acordo com sua frequência, sendo que a que
e à presença de um moderador que coordena e mais aparece é alocada no centro da imagem e as
lidera as atividades e os participantes. O termo demais em seu entorno, de modo decrescente.
focal é designado pela proposta de coletar infor- Salienta-se que para as imagens geradas neste
mações sobre um tópico específico. A coleta de artigo, e também palavras como artigos, preposi-
dados ocorreu no mês de maio de 2014. As falas ções, locuções adverbiais e outras que não apre-
dos participantes do grupo focal foram gravadas sentariam relevância de conteúdo, foram excluí-
em MP3, após estes ouvirem a leitura do Termo das para a obtenção de um resultado conciso na
de Consentimento Livre e Esclarecido e darem conformação dos DSC. Acredita-se que a aplica-
sua autorização10. bilidade do método contribui para a visualização
O grupo focal foi conduzido a partir das do que é mais relevante nas falas dos participan-
seguintes temáticas: a) entendimento do gru- tes do estudo.
po sobre intersetorialidade; b) importância da Neste estudo, foram respeitados os aspectos
intersetorialidade no contexto da ESF; c) ações éticos e as implicações legais, de acordo com a Re-
realizadas na ESF compreendidas como interse- solução No. 466/201213 do Conselho Nacional de
toriais; d) elementos facilitadores e dificultadores Saúde (CNS), que aprova as diretrizes e as normas
de ações intersetoriais no âmbito da ESF; e, por reguladoras da pesquisa envolvendo seres huma-
fim, e) sugestões para potencializar a realização nos. A execução da pesquisa foi ainda respaldada
de ações intersetoriais na ESF. pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UVA.
4374
Dias MSA et al.

Resultados e discussões trabalho, sendo necessárias mudanças na orga-


nização dos serviços, além de revisões nos pro-
A pesquisa tinha em seu escopo a pretensão de cessos de formação dos profissionais atuantes na
produzir informações a partir das vivências e das saúde.
percepções de sujeitos, com níveis distintos, mas Nesse sentido, a intersetorialidade constitui
consistentes, de engajamento na ESF em relação numa nova forma de trabalhar, de governar e de
à questão da intersetorialidade, com foco na ESF. construir políticas públicas que possibilitem a
Optou-se por organizar aqui a análise tomando superação da fragmentação dos conhecimentos
em consideração 5 pontos centrais, já identifica- e das estruturas sociais, a fim de produzir efeitos
dos na metodologia, que funcionaram como ca- mais significativos na resolução desse problema15. 
talisadores da discussão/reflexão. Como um processo coletivo e organizado, a
Percebe-se o caráter polissêmico14 e multifa- ação intersetorial não pode ser espontânea. Tra-
cetado que a categoria intersetorialidade assume ta-se de uma ação deliberada que requer o respei-
sob a perspectiva dos diferentes sujeitos envol- to à diversidade e às particularidades de cada se-
vidos na ESF. Quando perguntados sobre qual o tor ou participante. Envolve espaços comunica-
entendimento do grupo acerca da intersetoriali- tivos, capacidade de negociação e intermediação
dade, ou seja, como é que eles a compreendem, de conflitos para a resolução ou o enfrentamento
seus conceitos, ideias e percepções, observa-se final do problema principal, como também para
que as respostas proporcionaram a conformação a acumulação de forças na construção de sujeitos
do seguinte Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), e na descoberta da possibilidade de agir16.
aqui abstraído: Seguindo essa lógica, o coletivo aponta tam-
... um trabalho ligado, articulado com outros bém que cada setor compõe uma rede de ação
setores. Cada setor agregando saber ao saber do ou- social, que deve articular-se solidariamente para
tro. Vários setores que se organizam, se articulam, identificar os problemas e encaminhar soluções
cada um com sua função, com sua contribuição, integradas.
para formar um plano, montar estratégias pra al- Outra dimensão/vivência que está implícita
cançar um resultado esperado. É abrir mão daquilo no DSC “A” diz respeito ao trabalho interdiscipli-
que eu planejo isoladamente, pra planejar junto. nar, que significa a interação existente entre duas
Para que a intersetorialidade aconteça de fato é ou mais disciplinas, em contexto mais coletivo,
preciso que os setores programem juntos. É pensar no qual cada uma é, por sua vez, modificada e
a partir da dimensão da integralidade do cuida- todas passam a depender claramente das outras.
do. É a contribuição de cada setor articulado com Esse processo resulta em enriquecimento recí-
a qualidade de vida do indivíduo e da comunidade, proco e na transformação de suas metodologias
na perspectiva do conceito ampliado de saúde. de pesquisa e de seus conceitos17.
Para esse coletivo, a intersetorialidade pres- Finalmente, depara-se com a percepção bas-
supõe desenvolver ações articuladas e integradas tante pertinente acerca do planejamento que a
que produzam impactos positivos nas condições princípio poderia estranhar sua presença na dis-
de vida dos indivíduos e das comunidades. Estas cussão sobre intersetorialidade, porém as falas
ações devem envolver a articulação de saberes e sugerem a necessidade de não só adotar a ferra-
experiências diversas, objetivando planejar em menta do planejamento, mas que, ao fazê-lo, o
conjunto para intervir de maneira efetiva nas si- mesmo deve garantir a dimensão da participa-
tuações-problema que afligem as comunidades. ção, do fazer junto, do envolvimento dos diferen-
Analisando esse DSC “A”, percebe-se que para tes coletivos que participam do setor saúde como,
os sujeitos trabalharem de forma intersetorial é por exemplo: trabalhadores, usuários, gestores e
preciso o compartilhamento de conhecimentos controle social.
e ações visando à abordagem de novos conceitos O resultado gerado pela técnica “nuvem de
e, consequentemente, de diferentes práticas em palavras” corroborou as análises supracitadas.
prol da melhoria da qualidade de vida da popu- De acordo com a Figura 1, as palavras “Setores”,
lação. Além disso, é interessante observar que um “Articulado”, “Saber” e “Contribuição”, foram as
setor isolado é limitado na solução das situações mais importantes do discurso.
de adversidades e que a ação conjunta pode gerar Ao avançar sobre esse discurso plural acerca
um cuidado mais integral e resolutivo, fato que da intersetorialidade, descortina-se um universo
traz inúmeros benefícios para a população. de significados muito rico. Emprestam-se dife-
Entretanto, é importante que todos os profis- rentes metáforas na tentativa de apanhar algu-
sionais estejam dispostos a atuar nessa visão de mas das possíveis dimensões desta realidade. É
4375

Ciência & Saúde Coletiva, 19(11):4371-4382, 2014


Figura 1. Nuvem de palavras elaborada com base no DSC “A” sobre o conceito de intersetorialidade. Sobral, maio
de 2014.

nesse sentido que, ao serem indagados sobre a de maneira integrada e de identificar soluções
importância da intersetorialidade, no contexto colaborativas adequadas à realidade social. A
da Estratégia Saúde da Família, as respostas leva- população passa a não ser objeto de intervenção,
ram ao DSC “B” a seguir abstraído: mas, sim, um sujeito ativo assumindo um papel
A intersetorialidade é indispensável na Estra- decisivo. Assim, muda-se a lógica da política so-
tégia Saúde da Família, considerando que o fazer cial, saindo da visão da carência, da solução de
saúde não se faz só. Para desenvolver a promoção necessidades para a de direitos a uma vida digna
da saúde e prevenção de doenças, tudo perpassa e com qualidade18.
outras secretarias, outros espaços, outros setores, le- Essa reflexão remete as discussões no âmbi-
vando em consideração os determinantes sociais do to da promoção da saúde, quando entre outros
processo saúde-doença. A intersetorialidade convi- aspectos coloca-se no debate da saúde a questão
da as políticas públicas, os setores, as pessoas a irem dos determinantes sociais e a necessidade de se
além daquilo que imaginam que possam contribuir adotar uma perspectiva ampliada de saúde19.
para a saúde integral da população. É um convite Vemos também a percepção acerca da ne-
à ação para ir além do mínimo. Para tanto, enten- cessidade de se trabalhar de forma conjunta em
der e conhecer o território, é condição indispensável contraposição ao modelo hegemônico de se fazer
para agir de forma intersetorial. Além disso, man- sozinho. Evidencia-se nas falas a compreensão da
ter um diálogo permanente e se responsabilizando importância do envolvimento de vários atores e
pelo cuidado do sujeito/comunidade. É entender segmentos na resolução dos problemas de saúde.
que juntos somos mais fortes e potentes que isola- Estes não competem apenas aos profissionais da
dos. Então, hoje em dia, o trabalho intersetorial é saúde. Outros setores e profissionais precisam
fundamental para a Estratégia Saúde da Família. envolver-se para que soluções satisfatórias sejam
A intersetorialidade se concretiza nessa rede de possíveis.
apoio, nesse segurar de mãos, pra que a gente possa O resultado gerado pela técnica “nuvem de
realmente enfrentar dificuldades. palavras” ratificou as análises supracitadas. De
Observa-se que a intersetorialidade constitui acordo com a Figura 2, as palavras que gravita-
uma concepção que deve desencadear uma nova ram em torno da palavra intersetorialidade com
maneira de planejar, executar e controlar ações e mais destaque foram: “Indispensável”, “Saúde”,
serviços para garantir acesso e qualidade da aten- “Estratégia” e “Família”.
ção à saúde de modo integral. Para isso, admi- Em relação a como o grupo identifica na sua
nistradores, gestores, profissionais e até mesmo rotina de trabalho, no contexto da Estratégia
a população passam a ser considerados sujeitos Saúde da Família, ações intersetoriais, obteve-se
com a capacidade de perceber seus problemas o DSC “C”.
4376
Dias MSA et al.

Figura 2. Nuvem de palavras elaborada com base no DSC “B” sobre a importância da intersetorialidade no
contexto da Estratégia Saúde da Família. Sobral, maio de 2014.

A primeira delas é o Programa Saúde na Es- ticulado com a educação. O torneio de futebol que
cola, que dialoga saúde e educação. Outra são os está acontecendo, ... Tem o grupo de farmácia viva
Projetos Terapêuticos Singulares que se fazem nas e terapia comunitária com o CAPS. A semana do
situações de risco, especialmente com gestantes, bebê foi uma articulação intersetorial protagoniza-
crianças, idosos, onde a gente conta com os CRAS, da pelo Trevo de Quatro Folhas, em parceria com
escolas, Secretaria de urbanismo. A política local hospitais, com o Conselho Tutelar, com o Ministé-
de combate à extrema pobreza trabalha na pers- rio Público, com os CRAS, com o CREAS.
pectiva intersetorial. Existe um comitê técnico que Interessante neste momento da pesquisa,
envolve saúde, educação, urbanismo, saneamen- que remete necessariamente a certa objetividade,
to básico e a Estratégia Saúde da Família... Uma quando se demanda a identificação de ações in-
atividade muito importante e que teve muita ação tersetoriais, é ter por parte dos sujeitos o relato
intersetorial foi a caminhada da paz, para discutir de várias situações percebidas como que se encai-
a questão da violência. Foram feitas reunião com xam no perfil previsto para a intersetorialidade.
vários setores, as escolas, os grupos comunitários, O discurso dos sujeitos indica uma com-
o comércio, as igrejas. A gente sentou, reuniu e foi preensão da intersetorialidade enquanto prática
uma articulação de rede... Em período chuvoso, as inserida no fazer dos mesmos no contexto da
pessoas ficam em situação de risco, a gente preci- ESF. Observa-se que as falas trazem com bastan-
sa de um trabalho muito próximo da secretaria de te propriedade essa prática. Várias situações são
educação, com a defesa civil. Tem um projeto onde indicadas denotando que as colaborações entre
são realizadas feiras nos bairros pra valorização diferentes segmentos é algo observável no am-
das potencialidades locais. Outro ponto é a questão biente do sistema de saúde de Sobral. Dentre os
dos mutirões da dengue. Então, a gente se articu- contextos institucionais onde se pôde constatar
la bastante com a secretaria do meio ambiente. E práticas colaborativas, verificam-se, aqui com
também ultimamente os setores de infraestrutu- certa regularidade, os setores da educação e da
ra e urbanismo e saneamento também estiveram assistência social. Outros segmentos aparecem de
presentes nas unidades de saúde... Outra iniciativa forma mais pulverizada, mas não menos impor-
foi pra trabalhar a coleta seletiva do lixo, ... Outra tante em termos de contribuição para um fazer
ação são os grupos de idosos e de gestantes desen- que tenta romper com ações isoladas.
volvidos de maneira intersetorial, principalmente Outro ponto a ser observado é que, quando
com os CRAS, ... E tem grupos de adolescente ar- se fala em ação intersetorial, as parcerias firmadas
4377

Ciência & Saúde Coletiva, 19(11):4371-4382, 2014


permeiam desde setores/instituições públicas, até facilita o desenvolvimento de ações intersetoriais
igrejas e associações comunitárias e as partici- no âmbito da ESF de uma forma mais efetiva,
pações comunitárias, embora a ênfase esteja no onde se chegou ao DSC “D”, a seguir:
âmbito do setor público. A gente percebe que estas ações intersetoriais
Entretanto, uma questão que precisa ser co- elas funcionam de forma muito pontual, a cada
locada é até que ponto tais ações colaborativas, ação se chama, se convida, tem uma participação,
de cunho multisetorial, se constituem de fato existe um apoio. Todas as pessoas dos setores, eles
em práticas intersetoriais? Estas entendidas en- têm essa boa vontade de cooperar e de apoiar. Mas
quanto fluxo de ação-reflexão que implicam re- assim, a gente não percebe algo mais efetivo e siste-
ciprocidade e planejamento, desenvolvimento e mático, como por exemplo, avaliar junto uma ação.
avaliação conjunta. Se foi intersetorial, por que que não existe essa
O resultado gerado pela técnica “nuvem de corresponsabilização de planejar junto, de avaliar
palavras” traz mais elementos que contribuem junto, de fazer junto? Outra coisa é a questão da
para ajudar a reconhecer que o cenário de análise burocracia. Às vezes você liga pro setor, ai tem que
aqui desenvolvido é de fato um território multi- mandar um ofício, tem que ligar não sei pra quem,
facetado e semanticamente muito rico. De acor- tem que pedir a autorização de outra pessoa, tem
do com a Figura 3, a seguir, as palavras com mais que encaminhar o caso para outro setor e aí você
destaque foram: “Educação”, “Urbanismo”, “Gru- fica aguardando retorno que às vezes nunca chega.
pos”, “CRAS”, “Secretarias”, “Idosos”, “Gestantes”, Muito também é a falta de diálogo, de conversa. Eu
“Escolas”, sendo estes os setores e segmentos que acho que essa reflexão me parece que ela foi muito
mais aparecem nas ações ditas intersetoriais. sufocada até pelos próprios gestores. Eu penso que
Considerando as contradições e os tensio- o ideal de sociedade de mostrar resultado, infeliz-
namentos para a implementação da interseto- mente isso acaba minando um pouco algumas pos-
rialidade, o grupo foi convidado a refletir num sibilidades de trabalho intersetorial. Outra grande
mesmo movimento sobre o que dificulta e o que dificuldade é essa questão da fragmentação dos

Figura 3. Nuvem de palavras elaborada com base no DSC “C” sobre as ações intersetoriais no contexto da
Estratégia Saúde da Família. Sobral, maio de 2014.
4378
Dias MSA et al.

processos de trabalho. Uma situação dessas, que é res, que envolvem acesso a recursos financeiros,
muito clara, é a do Agente Comunitário de Saúde informação ou poder. Portanto, a intersetoriali-
e do Agente de Controle de Endemias quando um dade é um processo complexo, que implica em
diz: não isso aqui não é meu papel, esse aqui é papel enfrentar “contradições, restrições e resistências”.
do outro. A intersetorialidade exige uma mudança da “ló-
O grupo traz uma série de questões que, de gica de governo, de organização do trabalho para
forma direta e indireta, acabam comprometen- a prevenção ou solução de problemas existentes
do o conceito e o desenvolvimento da interse- em um território geográfico, e não em setores es-
torialidade. Entre estas questões, destacam-se pecíficos como vem ocorrendo [...]”21.
ações pontuais que são desenvolvidas de forma Quando você tem um profissional comprome-
assistemática e, portanto, acabam comprome- tido e ele sai do individualismo e amplia a visão
tendo, a médio e longo prazos, o envolvimento pro coletivo, se responsabiliza com o território, e vai
e a corresponsabilidade dos diversos atores e ins- muito além. Seria o planejar junto, seria o consenso
tituições. Nesta mesma direção, sinalizam ainda que é importante, o que é que é o nosso objetivo. É
a forte tendência ao isolamento dos setores que conhecer o que é o papel do outro, o que é o meu pa-
se acomodam nesta organização, fato que re- pel, até onde eu posso entrar no espaço do outro e o
força a fragmentação das ações. Outra questão outro no meu, pra que não haja esses conflitos e nem
fundamental passa pelo corporativismo de pes- o egocentrismo de eu ficar no meu espaço olhando os
soas e organizações, fato que não contribui para meus problemas e resolvendo somente os que acho
a construção efetiva de uma visão e de práticas que são meus. Dialogar, chegar a consensos, plane-
pautadas na colaboratividade, na reciprocidade jar, avaliar junto o impacto dessas estratégias, desse
e na corresponsabilidade, enfim, no fomento da diálogo, desse trabalho junto. Os conselhos locais
intersetorialidade. podem ser estratégicos, uma vez que muitas articu-
Além desses aspectos, foi relatada como obs- lações são feitas neste âmbito. O orçamento partici-
táculo, a falta de respostas dos setores aos proble- pativo, momento que o prefeito foi até às comunida-
mas ou solicitações que lhes são encaminhados, des levando vários setores pra ouvir as demandas da
entendendo como desinteresse às suas solicita- comunidade. Por isso, que eu falo muito no diálogo.
ções. A excessiva burocracia também foi consi- É também estar indo atrás e não ficar só esperando
derada um fator dificultador para o processo de que eles venham até a gente e que as coisas vão acon-
trabalho intersetorial na ESF. tecer, sem a gente ir atrás e conversar.
Sobre este aspecto, Inojosa20 se posiciona Por outro lado, quando se examina as falas
que a forma como o aparato governamental se que indicam os possíveis elementos facilitadores
estrutura “é um elemento determinante para a em relação à intersetorialidade no âmbito da ESF,
qualidade dos produtos ou serviços que o Estado constata-se a presença em destaque dos seguintes
entrega à sociedade [...]”. Para esta autora, as es- fatores: compromisso do profissional com a ESF,
truturas organizacionais se apresentam de forma visão do coletivo e não apenas da parte, respon-
“piramidal”, com “vários escalões hierárquicos”, sabilização com o território, conhecimento das
“departamentalizados por áreas de especialida- atribuições dos outros setores e profissionais, a
des”, desenvolvendo-se neste contexto diversas capacidade de dialogar e, ainda, a experiência vi-
formas de organizar o trabalho, tais como: “cen- venciada na prática do orçamento participativo
tralização decisória, planejamento normativo, no cenário do município de Sobral.
dicotomia entre planejamento e execução, sigilo Foi observado a partir das facilidades relata-
e ocultação de informações, formalização exces- das, que, mesmo a intersetorialidade dependen-
siva, e distanciamento do cidadão e mesmo do do de uma política mais geral, existem algumas
usuário, dificultando o controle social”. iniciativas que funcionam, quando estas ações
Percebe-se, portanto, que o discurso acerca são desenvolvidas permeadas pelo diálogo e con-
da intersetorialidade, a exemplo do que acon- sensos, sobressaindo as realizadas com a partici-
tece com a interdisciplinaridade, tem sido mais pação popular a exemplo dos Conselhos Locais
desenvolvido que sua prática, havendo muita de Saúde e do Orçamento Participativo.
dificuldade em mudar o modelo de gestão21. O O resultado gerado pela técnica “nuvem de
discurso da colaboração defende que os atores, palavras” confirma as análises supracitadas. De
por serem iguais, podem exercitar uma colabora- acordo com a Figura 4, as palavras que gravitam
ção mútua, porém “a lógica da parceria”, implica entorno da palavra intersetorialidade com mais
na ideia de “conflito”, devido à existência de uma destaque foram: “Gente”, “Educação”, “Grupos”,
diversidade de condições estruturais destes ato- “Articulação”, “Diálogo”, “Individualismo”.
4379

Ciência & Saúde Coletiva, 19(11):4371-4382, 2014


Figura 4. Nuvem de palavras elaborada com base no DSC “D” e “E”. Dificultadores e Facilitadores para
desenvolver ações intersetoriais no contexto da Estratégia Saúde da Família. Sobral, maio de 2014.

Os dados sugerem, como se vem descobrindo trução, inacabada. E que a vivência da mesma
neste e em outros estudos, que a intersetoriali- não é simples por vir acompanhada de contra-
dade é algo que remete a um novo paradigma. dições e tensionamentos, por envolver diferentes
Tradicionalmente tem prevalecido o modelo segmentos e atores sociais.
fragmentado e dicotômico bastante característi- Por fim, procurou-se levantar sugestões/indi-
co da visão mecanicista da saúde. Mas, quando cações do grupo no sentido de melhorar ou po-
se pensa numa dimensão ampliada de saúde e tencializar as práticas intersetoriais no contexto
na questão da integralidade, é necessário passar da Estratégia Saúde da Família, a partir da expe-
do paradigma tradicional para o sistêmico. Por- riência e conhecimento do mesmo. O que deverí-
tanto, implica adotar-se uma nova perspectiva de amos fazer? Obteve-se o seguinte DSC “F”:
trabalhar e enfrentar os problemas que passam, Acho que a primeira coisa era: se a gente dentro
entre outros, por assumir uma das premissas da de cada território tivesse um comitê intersetorial
intersetorialidade que seja, o de trabalhar junto, que trabalhasse dentro desse comitê as prioridades
envolvendo os diferentes segmentos no enfrenta- daquele local. Um colegiado intersetorial, de for-
mento dos problemas de saúde. ma que a gente tivesse representantes de todas as
É, portanto, fundamental avançar para o potencialidades, que tinham dentro daquele terri-
desenvolvimento de projetos intersetoriais, que tório para discutir as prioridades daquele bairro,
tragam de fato o compromisso com ações de daquele território e planejar junto e fazer junto. Eu
promoção da saúde e melhoria da qualidade de acho que aí sim, talvez a gente conseguisse sucesso,
vida para a lógica da corresponsabilização, que bem mais sucesso nas ações. Inclusive dentro dessa
articulem além da saúde, outros setores das po- ação intersetorial envolver a comunidade, por que
líticas públicas22. ela também tem potencial e precisa ser envolvida,
Reconhece-se aqui que outros estudos21-23 dentro desse comitê. Então, assim, eu acho impor-
apontam para uma compreensão da intersetoria- tante que a gente comece a pensar nesses pactos,
lidade como algo ainda em movimento, em cons- nesses colegiados intersetoriais. Mas que eles não
4380
Dias MSA et al.

sejam somente aquele momento, que ele também política de gestão pública, não só no âmbito da
tenha um direcionamento de gestão. A gestão devia saúde, mas de outros ambientes da gestão pública.
trazer um posicionamento desta opção pela inter- Percebe-se nas falas dos profissionais da ESF
setorialidade e que isso configurasse como uma di- que estes reconhecem que sozinhos não conse-
retriz nas políticas públicas. As ações para se torna- guirão promover as mudanças desejadas rumo à
rem intersetoriais elas precisam se capilarizar, pra efetivação da intersetorialidade na ESF, visando à
que a gente possa difundir mais a ideia do que cada promoção da Saúde. Esta constatação vem confir-
setor está trabalhando e se aproximar realmente. mar o já previsto por Mendes24, que as equipes da
A intersetorialdade diz respeito a uma prática Estratégia da Saúde da Família, por estarem hie-
e a uma visão que remetem a dimensão do com- rarquicamente em um nível inferior dos setores
plexo4, isso quer dizer que são múltiplos os deter- implicados na resolução dos problemas identifi-
minantes presentes como, por exemplo, questões cados, teriam seus esforços integrativos limitados,
sociais, políticas e culturais. Tradicionalmente, o pois estes estariam na dependência das “capaci-
paradigma baseado na fragmentação da realida- dades de condução de níveis superiores”, daí que
de tem sido hegemônico. Entretanto, quando se torna-se necessário que se configure como políti-
pensa hoje na própria definição de saúde cons- ca de governo e não de um setor específico.
tata-se que, a partir do conceito ampliado, não é O resultado gerado pela técnica “nuvem de
possível apenas ao setor saúde isoladamente dar palavras” confirma as análises supracitadas. De
conta dos muitos desafios. acordo com a Figura 5, as palavras que gravitam
Ao analisarmos as sugestões apresentadas entorno do conceito intersetorialidade com mais
pelo grupo, indicando possíveis estratégias que destaque são: “Gente”, “Gestão”, “Comitês”, “Junto”.
potencializam a intersetorialidade no campo da
saúde, destacam-se os seguintes aspectos: a cons-
tituição de um comitê ou colegiado para gestão Conclusão
e promoção da intersetorialidade, a prática do
planejamento participativo, o envolvimento da A questão da intersetorialidade potencializa e se
comunidade, que seja algo permanente e não relaciona de muitos modos com os propósitos
apenas pontual em função de algum projeto, que da ESF, ao adotar como princípios a integração
se assuma a intersetorialidade como uma diretriz de vários saberes e setores, proporcionando uma

Figura 5. Nuvem de palavras elaborada com base no DSC F. Sugestões para potencializar ações intersetoriais no
contexto da Estratégia Saúde da Família. Sobral, maio de 2014.
4381

Ciência & Saúde Coletiva, 19(11):4371-4382, 2014


percepção mais abrangente da realidade e dos cular da saúde, o próprio conceito ampliado desta
processos de saúde. passa a ser um incentivador para o trabalho coo-
Este estudo pôde reconhecer as dificuldades perativo entre diferentes setores, tanto no plano
e os potenciais das iniciativas que buscam traba- interno dos serviços de saúde quanto no envol-
lhar a saúde a partir de uma nova agenda, com vimento de outros segmentos para além do tra-
um fazer colaborativo e solidário envolvendo dicional setor saúde, como é o caso da educação.
distintos segmentos e pessoas. Dando sinais, bem Finalmente, conclui-se que a intersetoriali-
relevantes, de que a intersetorialidade é possível. dade é uma prática em construção, que não se
De fato, os dados colhidos e analisados neste restringe à ESF, assim como o contrário também
estudo confirmam que a intersetorialidade tem é verdadeiro. Porém, há uma relação de interde-
tudo a ver com a ESF, ao considerar entre as prio- pendência entre estes dois campos.
ridades desta a reorientação das práticas de saú- Compreende-se que dificilmente a ESF se
de, a centralidade do território, o agir focado nas viabilizaria sem a visão e as práticas interseto-
necessidades de saúde, a promoção de ações in- riais, ou seja, a intersetorialidade não é apenas
tegrais, o avaliar e o pesquisar contínuo25 e o fo- uma realidade transversal à ESF, mas inerente a
mento às estratégias de fortalecimento da gestão ela. Detecta-se aqui, a partir dos achados deste
local e do controle social. Portanto, compreende- estudo introdutório, que é na ESF que a interse-
se que a intersetorialidade é e será determinante torialidade encontra as melhores oportunidades
para uma vivência efetiva da ESF. para contribuir com o desenvolvimento de algo
Pode-se afirmar sobre a intersetorialidade fundamental, isto é, um novo modelo de fazer e
que, apesar do reconhecimento de sua potência, promover saúde.
ainda enfrenta muitos obstáculos. Estes passam Entretanto, o exercício da intersetorialidade
principalmente pela fragmentação e isolamento exige não apenas o desempenho dos profissionais
das ações no campo da saúde. A superação e o da ESF, sendo requerida uma política municipal,
consequente fortalecimento da intersetorialidade na qual todos os setores, governamentais e não
residem, entre outros aspectos, na adoção de uma governamentais, e a sociedade civil estejam dire-
visão sistêmica acerca da realidade. No caso parti- cionados ao seu cumprimento.

Colaboradores

MAS Dias, JRF Parente, MIO Cavalcante e FAC


Dias participaram igualmente de todas as etapas
de elaboração do artigo.
4382
Dias MSA et al.

Referências

1. Gleiser M. A dança do universo: dos mitos de criação ao 16. Campos GWS. Um método para análise e co-gestão de
big-bang. São Paulo: Cia das Letras; 2001. coletivos. São Paulo: Hucitec; 2000.
2. Capra F. As conexões ocultas: ciência para uma vida sus- 17. Torres SJ. Globalização e interdisciplinaridade: o currí-
tentável. São Paulo: Cultrix, Amana-Key; 2009. culo integrado. Porto Alegre: Artmed; 1998.
3. Morin E. Os sete saberes necessários à educação do fu- 18. Junqueira LAP. Descentralização, intersetorialidade e
turo. 3ª ed. São Paulo, Brasília: Cortez, Unesco; 2001. rede como estratégias de gestão da Cidade. Rev FEA-
4. Cristina AM, Fabrício F, Teixeira FMB, Suss JAC, Law- PUC-SP 1999; 1:57-72.
der LSM, Lima RE, Bueno SJ, Moysés ST. Intersetoria- 19. Rabello LS. Promoção da Saúde, a construção de um
lidade nas ações de promoção de saúde realizadas pelas conceito em perspectiva comparada [tese]. Rio de Janei-
equipes de saúde bucal de Curitiba (PR). Cien Saude ro: Fiocruz; 2010.
Colet 2010; 15(1):1827-1834. 20. Inojosa RM. Intersetorialidade e a Configuração de um
5. Inojosa R. Sinergia em políticas e serviços públicos: de- novo paradigma organizacional. Rev Administração
senvolvimento social com intersetorialidade. Cadernos Pú­blica 1998; 32(2):35-48.
Fundap 2011; 22:102-110. 21. Westphal MF, Mendes R. Cidade saudável: uma expe­
6. Bordenave JD. O Que é Participação? São Paulo: Editora riência de interdisciplinaridade e intersetorialidade.
Brasiliense; 1983. Rev Administração Pública 2000; 34(6):47-61.
7. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria da Aten- 22. Portes LH, Campos EMS, Teixeira MTB, Caetano R, Ri-
ção Básica à Saúde. Departamento de Atenção Básica. beiro LC. Ações voltadas para o tabagismo: análise de
Política Nacional de Atenção. 4ª Ed. Brasília: MS; 2007. sua implementação na Atenção Primária à Saúde. Cien
(Série Pactos pela Saúde 2006, v.4) Saude Colet 2014; 19(2):439-448.
8. Sobral. Secretaria da Tecnologia e Desenvolvimento 23. Papoula SR. O processo de trabalho intersetorial das
Econômico. Anuário Estatístico. Sobral: Secretaria da Equipes de Saúde da família no município de Petró-
Tecnologia e Desenvolvimento Econômico; 2013. polis-RJ: fatores restritivos e facilitadores [dissertação].
9. Soares CHA, Pinto VPT, Dias MSA, Parente JRF, Cha- Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública; 2006.
gas MIO. Sistema saúde escola de Sobral (CE). Sanare 24. Mendes EV. Uma Agenda para a Saúde. 2ª ed. São Pau-
Revista de Políticas Públicas 2008; 7(2):7-13. lo: Editora Hucitec; 1999.
10. Flick U. Uma introdução à pesquisa qualitativa. Porto 25. Magalhães R, Bodstein R. Avaliação de iniciativas e pro-
Alegre: Bookman, 2004. gramas intersetoriais em saúde: desafios e aprendiza-
11. Lefevre F, Lefevre AMC, Marques MCC. Discurso do dos. Cien Saude Colet 2009; 14(3):816-868.
Sujeito Coletivo, complexidade e auto-organização.
Cien Saude Colet 2009; 14(4):1193-1204.
12. Mcnaught C, Lam, P. Using wordle as a supplementary
research tool. The Qualitative Report 2010; 15(3):630-
643.
13. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Conselho Nacional
de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de
2012. Diário Oficial da União 2013; 13 jun.
14. Canada. Public Health Agency. Crossing sectors - Expe-
riences in intersectoral action, public policy and health.
Ottawa: Public Health Agency; 2007.
15. Comerlatto D, Matiello A, Colliselli L, Renk EC, Kleba
ME. Gestão de políticas públicas e intersetorialidade: Artigo apresentado em 30/06/2014
diálogo e construções essenciais para os conselhos mu- Aprovado em 12/08/2014
nicipais. Rev Katálysis 2007; 10(2):265-271. Versão final apresentada em 13/08/2014

Вам также может понравиться