omos uma geração privilegiada!

Digo isso não porque mantivemos

contato com Viktor Frankl, até porque muitos de nós não tivemos essa
oportunidade. E, a sabedoria logoterapêutica atesta que não importa o
condicionamento, mas nossa decisão pessoal
diante dele.

Pessoalmente, posso dizer: pela minha idade

não teria como manter um colóquio com Frankl.
Mas, frente a essa impossibilidade ainda sou livre
para conhecer e ser porta-voz de quem esteve ao lado
do fundador da Logoterapia.

Um desses grandes ícones mundiais é Elisabeth

Lukas. Nascida no ano de 1942, foi aluna de Viktor Frankl
na Universidade de Viena. Dedicou sua vida à Logoterapia
e Análise Existencial. Sendo reconhecida
internacionalmente com o Prêmio Viktor Frankl
por contribuições prestadas à ciência do
sentido da vida.
 Criou um dos instrumentais mais
utilizados em Logoterapia clínica: o
logo-teste. Publicou mais 30 livros
sobre assunto e foi convidada para
lecionar em mais de 50 Universidades.
Tivemos acesso à Dra. Elisabeth
Lukas através da Dra. Heidi Schönfeld,
que tão prontamente nos acolheu.
Nossa mais sincera gratidão a ela e à
Dra. Elisabeth Lukas por terem confiado
no trabalho da Academia do Sentido.
Percebemos em E. Lukas os frutos
de uma vida dedicada ao sentido.
Ao apresentar nosso projeto, a Dra.
Elisabeth acenou positivamente, e
ainda vi na sua atitude e resposta o
resplendor de um espírito de gratidão:
“não gostaria que o foco da entrevista
fosse sobre minha vida e trabalho. Tive
a sorte de conhecer o Prof. Frankl e
aprender com ele. O objetivo da nossa
entrevista deve ser que também os
estudiosos da língua portuguesa ainda
‘aprendam com ele’”.
Um dos maiores gestos de grandeza
que podemos ter na vida é a humildade
e o reconhecimento de que aquilo
que tenho e sou não devo apenas a
mim mesmo. Espero que possamos
extrair bons frutos dessa partilha de
experiência.
Qual é a história de Viktor Frankl
com a Logoterapia?
Viktor E. Frankl foi intensamente
envolvido com a psicologia, a
psicossomática e a filosofia desde
jovem. Quando, em 1926, recolheu
suas ideias sob o termo “logoterapia”
pela primeira vez, essas ideias tinham,
em sua maioria, o caráter de críticas e
acréscimos necessários aos sistemas
de pensamento de Sigmund Freud e
Alfred Adler, que eram extremamente
deterministas naquela época. Na década
de 1930, como psiquiatra qualificado,
adquiriu uma grande prática através
dos seus próprios pacientes e estendeu
seu sistema de pensamento para incluir
uma série de métodos psicoterapêuticos
eficazes que havia desenvolvido de
forma independente. Sua experiência
dramática em campos de concentração
no início dos anos de 1940 reforçaram
sua intenção de fornecer às pessoas
perspectivas com as quais poderiam
dominar e moldar uma vida difícil
de maneira significativa. A partir da
década de 1950, desenvolveu as bases
conceituais de sua Logoterapia, levando
a um trabalho que lhe valeu uma
reputação internacional de cientista
brilhante.
Viktor Frankl dedicou a sua vida
à Logoterapia e Análise Existencial.
Pela sua experiência pessoal, quais
são os maiores diferenciais dessa
abordagem?
O trabalho de Frankl difere de
abordagens psicológicas semelhantes
de várias formas. Por um lado, é baseado
em um conceito particularmente
respeitoso da humanidade, que
atribui liberdade e responsabilidade
aos seres humanos e busca explicá-
los de maneiras que vão além de suas
condições imediatas de vida. Frankl
também pinta uma imagem de mundo
em que o sentido está sempre presente
e pode ser encontrado em miniatura
em todas as situações de vida de cada
pessoa e em todas as configurações de
circunstâncias trágicas. Do ponto de
vista da Logoterapia, uma vida bem
sucedida é uma vida repleta de sentido.
Isso distingue a Logoterapia de todas
as teorias motivacionais egocêntricas
que definem o prazer, a vantagem
pessoal, o elogio, a autorrealização ou
algo parecido para os objetivos mais
elevados do comportamento humano.
A Logoterapia tem algumas
especificidades no atendimento
clínico. Compartilhando sua
experiência prática, a senhora poderia
explicar as principais características
da Logoterapia Clínica?
A Logoterapia não é uma coleção
de técnicas psicoterapêuticas. Frankl
alertou contra o uso de seus métodos
como “prescrições”. Como todo
paciente é uma pessoa única, o processo
psicoterapêutico requer constante
improvisação e adaptação. É preciso
adaptar métodos e, às vezes, abandoná-
los completamente, porque eles
simplesmente não são apropriados e,
ao invés disso, tentar novas abordagens.
A Logoterapia admitidamente inclui
os dois métodos clássicos de intenção
paradoxal e derreflexão, que podem
ser proveitosamente combinados
com outros métodos, como técnicas
de relaxamento, métodos naturais
de cura, arteterapia, treinamento de
comunicação, e assim por diante, bem
como todo um conjunto de métodos
que podem ser coletados sob o título
de mudança de atitude, mas o que
realmente alcança a cura é o pano
de fundo antropológico e ideológico
subjacente que é transmitido na
conversação mais indiretamente do
que diretamente.
Por que Viktor Frankl disse que
a Logoterapia é uma abordagem
metaclínica? O que isso significa?
Embora a Logoterapia seja uma
disciplina médica e psicoterapêutica
específica, ela também cruza o
domínio metaclínico. Uma mente
triste não é necessariamente uma
mente adoecida. Quando as pessoas
sofrem perdas amargas, acidentes,
incapacidades, traumas, culpa pessoal
ou a aproximação da morte, estes não
são sintomas de doença que podem
ser eliminados, mas sim fenômenos
humanos básicos com os quais todos
têm que lutar. A tarefa do “ministério
médico” de Frankl é ficar ao lado das
pessoas nessas dificuldades. Além
disso, quando as pessoas experimentam
a frustração existencial, quando se
encontram no vazio existencial, ou
se envolvem em agressões mútuas,
precisam de estratégias que as
guiem de volta ao modo de vida
orientado para o sentido. Assim, a
Logoterapia está aberta a estratégias
de prevenção, descalonamento (nota
do entrevistador: redução na utilização
de fármacos), gerenciamento de
crises e, não menos importante, a uma
consolação significativa.
 Existe diferença entre Logoterapia
e Análise Existencial?
Estritamente falando, não há
diferença entre Logoterapia e Análise
Existencial. Frankl cunhou a expressão
“análise existencial” para distinguir
e demarcar seu modelo teórico em
relação à Psicanálise. Por se relacionar
com o modelo teórico, ele tendeu a
usar o termo “análise existencial” para
o aspecto teórico e antropológico de
seu trabalho, enquanto “logoterapia”
foi utilizada para o aspecto
terapêutico. O próprio Frankl não
ficou completamente satisfeito com
o termo “análise existencial” porque
a existência, como ele entendeu, não
pode ser analisada. Por essa razão,
nos anos 60 e 70, ele preferiu usar os
termos “logoteoria” e “logoterapia”
para descrever esses dois aspectos. A
pedido de vários de seus alunos, mais
tarde ele retornou ao termo “análise
existencial”, que ele também usou no
título de um de seus livros. Mas, quando
percebeu que a tradução inglesa desse
termo estava sendo confundida com a
Daseinsanalyse de Ludwig Binswanger,
ele evitou o termo mais uma vez.
A senhora desenvolveu o logoteste,
um dos instrumentais que foram
mais utilizados nas intervenções em
Logoterapia. Na sua opinião, qual é
a importância do teste no processo
logoterapêutico?
Todos os resultados dos testes
psicológicos devem ser interpretados
com cautela. Eles são apenas
“instantâneos” e podem ser invalidados
por muitos fatores. Além disso, as formas
espirituais de expressão, em particular,
são impossíveis de serem definidas e
medidas. O logoteste que desenvolvi na
Universidade de Viena há quase meio
século é agora obsoleto. Naquela época,
permitiu que se fizesse uma avaliação
aproximada para saber se o sujeito
reconhecia muitos ou poucos elementos
significativos em sua vida e os afirmava
como tal (como elementos de sentido).
Apesar de todas as dúvidas sobre o
teste, demonstrou-se uma correlação
de 99% entre o sujeito que identificou
muitos elementos significativos em sua
vida e a sua estabilidade psíquica, o
que também poderia ser avaliado por
meio de testes (projetivos). Havia 365
sujeitos participando do teste, de idade
e gênero variados. Na minha opinião,
testes deste tipo são adequados apenas
para fins de pesquisa.
Contamos com vários leitores
que ainda frequentam a os cursos
de graduação em medicina ou
psicologia. Alguns deles já têm um
grande carinho pela Logoterapia.
Que conselho a senhora daria a
estes jovens que estão começando
a trilhar um caminho dentro dessa
abordagem?
Não basta “ler” a Logoterapia.
Ser capaz de usar a Logoterapia
profissionalmente e com sucesso
requer vários anos de treinamento
de alta qualidade. Eu mesma daria
informações detalhadas a qualquer
um que estivesse interessado em
saber onde poderia receber o melhor
treinamento possível. Se necessário,
valeria a pena viajar longas distâncias
para se tornar um especialista neste
campo. Estou ciente de que ainda não
existem professores verdadeiramente
excelentes em Logoterapia, mas tenho
esperança de que a próxima geração
diminuirá essa lacuna. Os ensinamentos
de Frankl são mais relevantes agora
do que nunca, e as pessoas de hoje
têm muitos problemas para lidar. Em
muitos casos, sofrem não de sofrimento
material, mas de sofrimento existencial,
e isso é agravado pelas influências
sedutoras das tendências modernas
patologizantes. Cabe aos jovens do
nosso tempo moldar o curso futuro do
mundo. Nossas esperanças estão em
seus ombros, e em seus corações se
move o “espírito que pode tornar novas
todas as coisas”. Frankl acreditava nos
jovens, e eu também.