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ATIVO CULTURAL: UM OUTRO PARADIGMA PARA AS


POLITICAS PÚBLICAS DE CULTURA (*)
© Joatan Vilela Berbel

A Política é um meio;
a cultura é que é o fim.
Georg Lukács.

Introdução

Se analisarmos o conjunto das políticas de cultura, explícitas ou implícitas, desde


os tempos do Brasil colônia, podemos ver traços comuns de premissas quanto ao
olhar sobre a cultura, principalmente nas questões relativas a gestão. O que
pretendo demonstrar, nos limites desta comunicação, é que praticamos hoje no
Brasil e se praticam em todos os países colonizados por Portugal e Espanha, vale
dizer ibero-americanos, políticas públicas, legislações e instituições derivadas de
conceitos e paradigmas que norteavam a visão estratégica dos colonizadores para
o futuro de suas colônias.

A Herança Colonial

Para se ter uma idéia de como nossos colonizadores tratavam as novas terras
conquistadas, basta nos reportarmos a um documento que o regente do Trono
Português, Marquês de Pombal, remeteu ao Governador Geral do Brasil em 1750,
na mesma época do Tratado de Madri, - que resolvia as questões dos limites
territoriais entre Portugal e Espanha: “encarregue Vossa Senhoria os portugueses
de tudo o que pertencer à substância do negócio, qual é a demarcação de que se
vai tratar, e encarregue aos estrangeiros o que pertencer à curiosidade e à
erudição, como são a história natural do país e as observações físicas e
astronômicas, que respeitam ao adiantamento das ciências”.
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Antes da vinda da família real para o Brasil a edição de livros, revistas ou jornais
era proibida na colônia, e a marca dessa política cultural está no fato de que a
iconografia, os estudos de flora, fauna e das etnias foram realizados por autores
estrangeiros.
A vinda da Corte Portuguesa, para o Brasil em 1808 – depois de trezentos anos de
colonização - traz, além da liberdade de publicação, um incremento na
aparelhagem cultural do Rio de Janeiro. O aparelho de estado Português é
reorganizado no Brasil e a colônia ganha um impulso cultural sem precedentes em
sua história. No período do império foram criaram aportes culturais para o Brasil,
muitos artistas receberam bolsas de estudos para o exterior, instituições de
pesquisas foram criadas, mas sem se desvincular da premissa básica de se
privilegiar os estrangeiros quando se tratava do desenvolvimento da cultura e da
pesquisa. Assim, a Princesa Leopoldina, que se casou com D.Pedro I, trouxe em
sua comitiva um grande numero de pesquisadores, engenheiros e artistas, da corte
austríaca. D.Pedro II trouxe uma “missão francesa”, encarregada de remodelar a
cidade do Rio de Janeiro.
A proclamação da República em 1889, além da ruptura com a Igreja, no que diz
respeito à educação, não mudou substancialmente a visão no que tange à cultura.

Década de 30 a Redescoberta do Brasil

A política cultural imposta pelos colonizadores portugueses teve sua eficácia ao


produzir uma mentalidade voltada para os modelos estrangeiros e uma grande
alienação dos valores da cultura autóctone.
Paradoxos dessa alienação, que leva aos modelos de visão cultural europeus, estão,
por exemplo, no fato de que Victor Meirelles, o pintor brasileiro mais conhecido,
produziu a maioria dos seus quadros quando residia em Paris. Sua obra mais
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importante, a primeira Missa do Brasil, retrata montanhas brasileiras cobertas de


neve e índios pacíficos e pasmos diante do esplendor da encenação. Um dos
nossos grandes romancistas, José de Alencar, representava o índio brasileiro a
partir dos modelos do romantismo francês, de Chateaubriand, sobretudo do ritual
católico. A produção musical, escultórica e pictórica era calcada no modelo
barroco europeu, importado pela Igreja Católica.
A grande ruptura se dá em 1922, quando um grupo de intelectuais brasileiros se
reúne em São Paulo para o grande evento conhecido como a Semana de Arte
Moderna de 1922. O Movimento Modernista, como ficou conhecido, reunia
artistas como Anita Malfati, Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, Mario de
Andrade, Heitor Villa Lobos entre outros, que proclamaram uma “redescoberta do
Brasil”.
Iniciou-se ali a busca de um Brasil pouco conhecido dos intelectuais e da elite
brasileira, a cultura popular torna-se fonte de pesquisa estética. A “antropofagia”
do movimento modernista dá um novo sentido ao paradigma da importação
cultural, pois, como nossos índios, os intelectuais e artistas eram capazes de
“devorar” a cultura estrangeira, digeri-la e produzir algo novo e formador da
identidade cultural brasileira. Essa visão que mais tarde, na década de 60, vai
influenciar o movimento tropicalista, toma corpo e provoca mudanças estruturais
na relação estado e sociedade.
A partir da década de 30, período que ficou conhecido em nossa história como a
era Vargas, a cultura, mais especificamente com Gustavo Capanema passa a
integrar de forma explícita a política de estado com a criação do Ministério da
Educação, incorporando a Cultura a seus programas e à sua estrutura
organizacional.
A criação do SPHAN-Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional,
idealizado pelos modernistas Mario de Andrade, Rodrigo Mello Franco de
Andrade e Lucio Costa, representa o primeiro passo de uma política centrada no
tombamento e na preservação do que se julgava, na época, patrimônio histórico. O
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modelo instituído, o da eleição das cidades históricas, com suas igrejas e


edificações do período colonial fundaram o paradigma de patrimônio cultural, que
norteou a criação do SPHAN, com o Decreto-lei 25, de 30 de novembro de 1937.
Na época buscava-se um sistema legal para proteger e preservar esse “patrimônio”
da faina modernizadora e destruidora das nossas elites voltadas para os modismos
importados.
O curioso é que os mesmo criadores do SPHAN (Lucio Costa e Rodrigo Mello
Franco de Andrade) abraçaram com vigor e total entusiasmo as causas e os
princípios da Arquitetura Moderna, trazidos para o Brasil por um Arquiteto Russo,
Warchavchik, contratado pelos industriais de São Paulo, e mais tarde respaldado
pelo francês Le Corbusier, como o único representante do CIAM- Congresso
Internacional da Arquitetura Moderna, na América Latina. A aparente contradição
entre conservadorismo e modernidade se encaixava muito bem no modelo
ideológico do ditador Getúlio Vargas.
O isolamento de São Paulo, com a guerra constitucionalista de 1932, uma espécie
de secessão brasileira, criou um movimento de independência no centro econômico
e industrial do país. A criação da Universidade de São Paulo na década de 30 traz
para o Brasil mais uma leva de estrangeiros, dando continuidade ao modelo criado
por Pombal no início de nossa colonização.
Apesar desse sopro modernizador materializado na emblemática arquitetura de
Lucio Costa e Oscar Niemeyer com a construção do edifício do MEC, a política
cultural manteve-se centralizadora e patrimonial, tendo o estado como o grande
cliente da cultura, por toda a década de 50, apesar do sopro desenvolvimentista e
democrático de Juscelino Kubistchek.
Nas décadas de 60 até 80, o domínio da ditadura militar sobre a vida do país
reforçou os condicionamentos anteriores e agravou ainda mais as contradições que
hoje, apesar de uma década de experiência democrática, ainda não foram superados
no campo da cultura. Pelo contrário, apesar do crescimento da economia, o
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desenvolvimento no plano social é um grande fracasso e um dos graves problemas


que persistem.
As tentativas de enfrentamento da dívida social brasileira têm sido pautadas, nesse
final de milênio, por um conjunto de questões, entre as quais podem ser
destacadas:
• A prioridade conferida pelo Estado ao ajuste macroeconômico.
• A fragilidade do pacto federativo, que resulta na concorrência de
competências e na falta de clareza quanto aos papéis da União, dos estados e
dos municípios na implementação das políticas públicas.
• As transformações tecnológicas e as profundas alterações que vêm
ocorrendo no mundo do trabalho.
• A alcance e os limites do papel do Estado em relações à promoção do
desenvolvimento sustentável do país.

Tombamento e Memória: Premissas e Paradigmas

A visão patrimonial, herança portuguesa que nos remete à famosa Torre do Tombo,
onde se guardavam os livros com os “saberes” e o segredo de estado, contamina as
premissas da legislação relativa ao patrimônio histórico brasileiro. O tombamento
como instrumento básico da preservação, na maioria das vezes, como ficou
provado, impede o usufruto do bem tombado e a exigüidade de recursos dificulta a
sua restauração e manutenção. Nesse dilema vive até hoje o atual IPHAN, com
uma estrutura e orçamento aquém de suas atribuições legais, mas com a postura
arquetipal dos velhos tempos a sobreviver tal e qual o castigo que os Deuses
impuseram a Sísifo.
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A legislação que baliza as ações do Ministério da Cultura, que atua através do


IPHAN-Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ainda remete ao
Decreto-Lei nr.25 de 30 de novembro de 1937.
Não é surpreende que a Assembléia Constituinte de 1988, que criou a nova
Constituição brasileira, tenha passado ao largo da questão cultural e da
regulamentação relativa aos símbolos pátrios, até hoje regida por um Decreto
editado pela ditadura militar. A mentalidade construída ao longo dos séculos está
arraigada em todos os setores da sociedade e é um dos elos invisíveis entre
esquerda e direita no Brasil, bem demonstrada por Carlos Guilherme da Motta em
seu livro A Ideologia da Cultura Brasileira.

O Império da Lei

Sob o império do decreto-lei nr. 25 de 30 de novembro de 1937, elaborado numa


época em que se pretendia “salvar” o patrimônio cultural brasileiro, ou seja “o
conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no País e cuja conservação seja
de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da História
do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico,
bibliográfico ou artístico”, criou-se o IPHAN- Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional, autarquia cuja estrutura e abrangência esteve sempre aquém de
garantir condições para um cumprimento de tamanha missão.
Os “bens”, para serem considerados “patrimônio”, devem ser inscritos num dos
quatro “Livros do Tombo” conforme previsto no Art.4 do citado decreto.
Não há dúvida de que a vontade do legislador era a de pôr sob o manto protetor do
Estado uma lista de bens, propriedades, sítios e paisagens naturais, com intuito de
“preservá-las” tal como os museus de ciência natural europeus procediam com
peças, objetos, animais empalhados, múmias etc.
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Assim, cumpriu-se uma de nossas grandes tradições institucionais: Dá-se a missão


mas não se fornecem os meios.

O Sentido da Instituição

A visão dos modernistas e a ideologia do estado centralizador fundaram e


moldaram o sentido do IPHAN, que após mais de sessenta anos de existência,
ainda mostra os espasmos do autoritarismo que o criou. A postura da preservação a
qualquer preço, o tombamento como princípio isolado do contexto econômico e
social ainda orientam as ações da Instituição.
Do triunfalismo dos anos trinta restou o fatalismo e a decadência institucional na
última década. Hoje a IPHAN sofre de todos os problemas institucionais que
dificultam sua ação num país de dimensões continentais e de recursos ínfimos para
a cultura. Uma instituição sem força e sem articulação com os demais setores
produtivos do país, que mereceu uma desaprovação grave como unidade gestora do
Programa Monumenta BID, fundo de recursos com empréstimo do Banco
Interamericano do Desenvolvimento para a restauração de sítios históricos.

A Noção de Ativo na Dinâmica da Produção Cultural

Para introduzir o conceito de ativo na dinâmica da produção cultural, vale lembrar


a definição de cultura consagrada pela UNESCO na Declaração do México, sobre
as Políticas Culturais, em 1997:
“Em seu sentido mais amplo, pode-se considerar a cultura como o conjunto
dos traços distintivos, espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que
caracterizam uma sociedade ou um grupo social. Alem disso, ela engloba as
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artes e a literatura, os modos de vida, os direitos fundamentais do ser


humano, os sistemas de valores, as tradições e as crenças”.
Quando utilizo a palavra ativo, quero me referir a sua definição como: “que exerce
ação; que age, funciona, trabalha se move”, mas também como “a totalidade dos
bens de uma empresa, ou pessoa, inclusive os direitos suscetíveis de avaliação” ao
aproximar o conceito de ativo da definição de cultura da UNESCO pretendo assim
propor um novo paradigma para a formulação e gestão das políticas culturais.
Dessa forma serão considerados ativos culturais todas as expressões culturais de
um povo, independente da forma como foram ou estão sendo produzidas, com
seus valores tangíveis e intangíveis, tal e qual se contabilizam os ativos de uma
empresa, onde estão incluídos os bens patrimoniais, sua participação no mercado,
o valor de suas ações, que é variável, e o valor de sua marca (good will), que é um
valor intangível, porém valorável.
Isto nos remete ao universo da economia que hoje predomina sobre as estratégias
de governo e nos nossos países – ditos em desenvolvimento – condicionam o
cotidiano de nossas sociedades.

Cultura e Economia: A Riqueza das Nacões

O termo economia, que vem do grego, significa em sua origem “aquele que
administra o lar”, mas para nosso entendimento das relações entre economia e
cultura vamos utilizar a definição proposta por N. Gregory Mankiw: “Economia é
o estudo da forma pela qual a sociedade administra seus recursos”, Isso
deveria compreender todos os recursos, mas na verdade, quando se apresenta o
indicador básico PIB-Produto Interno Bruto, o valor da cultura é excluído.
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Assim, a base monetária, incluindo as reservas cambiais, a produção agrícola, a


produção industrial, os recursos naturais, os recursos tecnológicos e a força de
trabalho, são considerados em seu conjunto: a riqueza das nações, seu PIB. Até
mesmo, indicadores mais amplos como o Índice de Desenvolvimento Humano,
exclui os ativos culturais de um país como fator de verificação de seu
desenvolvimento humano.

Os Indicadores do IDH-Indice do Desenvolvimento Humano

Além dos indicadores da educação, emprego, saneamento e renda per capita, um


dos indicadores para a formação do IDH, é o Sistema de Contabilidade Integrada
do Ambiente e da Economia- SEEA, banco de dados gerenciado pela ONU, que é
composto dos seguintes indicadores:
a) Contas de ativos de recursos naturais: registram estoques e mudanças nos
estoques de recursos naturais como terra, peixe, floresta, água e minerais,
permitindo uma monitorização mais efetiva da riqueza de uma nação.
Também permitem o cálculo de indicadores tais como o valor total de
capital natural e os custos econômicos do esgotamento de recursos naturais;
b) Contas de fluxos para poluição, energia e materiais: fornecem informações,
no plano da indústria, sobre o uso de energia e de materiais como inputs
para a produção e sobre a criação de poluentes e lixos sólidos. Produzem
indicadores de eco-eficiência e poluição e de intensidade material, que
podem ser utilizados para avaliar a pressão sobre o ambiente e analisar
opções alternativas para reduzir esta pressão;
c) Contas de despesas de proteção ambiental e gestão de recursos: identificam
despesas em que incorrem a indústria, governo e famílias para proteger o
ambiente ou para gerir recursos naturais. Podem ser utilizados para avaliar o
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impacto econômico da regulamentação e impostos ambientais e o seu efeito


na redução da poluição;
d) Avaliação de fluxos não mercantis e de agregados ajustados
ambientalmente: este componente apresenta técnicas de avaliação não
mercantil e a sua aplicabilidade em responder a questões específicas de
política. Discute o cálculo de vários agregados macroeconômicos ajustados
aos custos de esgotamento e de degradação bem como suas vantagens e
desvantagens.

Se, é possível um banco de dados com um sistema onde se contabilizam os ativos


naturais como formador da riqueza de um país, por que não podemos criar um
Sistema de Contabilidade dos Ativos Culturais?
Concluiremos mais adiante que estamos muito perto disso, se soubermos utilizar o
paradigma do ativo cultural para modelarmos os itens e a arquitetura dos bancos
de dados de uma Cartografia Cultural.
Aqui vemos como, nas relações entre economia e cultura, se formam as
mentalidades: se de um lado os economistas não vêem a cultura como um fator
importante na construção dos indicadores da riqueza das nações, por outro os
artistas e formuladores de políticas culturais, à guisa de proteger a cultura das
vicissitudes do mercado, desenvolvem uma postura auto-excludente e um lugar
em que a exemplo do tombamento do patrimônio a produção cultural fica
delimitada, passiva e dependente, como numa redoma protetora.

Indicadores Para a Cultura

A dificuldade, pelo menos no Brasil, de se construirem indicadores para a cultura


está diretamente vinculada a um comportamento histórico que molda as
mentalidades do que chamamos “o povo da cultura”. As pesquisas em torno da
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economia da cultura, apresentam, quase sempre, apenas um conjunto de dados que


contabilizam os gastos do estado com a manutenção da aparelhagem cultural e o
financiamento de projetos.
A idéia de se construir indicadores a partir da cadeia produtiva da música começa
timidamente a ser esboçada no Rio de Janeiro por um grupo interdisciplinar
liderados pelo pesquisador Luis Carlos Prestes, com apoio de instituições ligadas
ao comércio e a indústria.
Na área de cinema, por exemplo, o corporativismo dos produtores e cineastas
impede a construção de indicadores de desempenho do cinema brasileiro no
mercado, com a simples argumento de que a produção cinematográfica é cultural
e, sendo assim, se justifica por si mesma.
A oposição cultura/mercado esconde, na maioria das vezes, uma condição
bastante cômoda para aqueles que vivem dos subsídios para a produção, sem o
compromisso com os resultados no mercado.
Com isso criam-se as falsas dicotomias que alimentam as relações no universo
cultural brasileiro: cultura x mercado; industria cultural x criatividade e pureza;
globalização x cultura nacional; investimento x despesa, cultura popular x cultura
erudita.
Essas dicotomias alimentam falsos dilemas intergrupais e, principalmente,
fortalece o interesse dos grupos organizados que atuam corporativamente para
manter seus privilégios nos guichês de atendimento das agências governamentais
que financiam projetos culturais.
Criar indicadores e sistemas para avaliar as políticas, os programas e as ações de
investimento em cultura, tendo por base os objetivos definidos no planejamento
estratégico e não no cumprimento de metas físicas ou na quantificação do
atendimento de demanda, é um desafio de início de um novo governo que
habitualmente é deixado de lado ao longo da gestão.
Descentralizar a execução dos programas e ações e estimular a organização dos
produtores e criadores culturais através de Organizações Não-Governamentais
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(Lei do Terceiro Setor), desmontando a política de atendimento de demanda e o


corporativismo, é sempre uma promessa nunca levada adiante.
Valorizar a cultura em todas as suas vertentes e potencialidades como eixo do
desenvolvimento humano, como fator estratégico no fortalecimento da identidade
nacional, sem com isso eliminar a possibilidade das trocas simbólicas e
principalmente respeitando a diversidade cultural interna e externa, é uma
promessa que fica nos textos programáticos das campanhas eleitorais.

Quem Tem Medo da Indústria Cultural

Se para os ingleses o termo “creative industries” resume o conjunto da produção


cultural, abrangendo as atividades de entretenimento, museus e centros culturais,
para nós a idéia de industria cultural muitas vezes se opõe à cultura em seu sentido
mais puro. Ao conceito de entretenimento, que corresponde ao carro-chefe da
industria cultural americana, opõe-se à idéia de criação artística, produção
independente, produção autoral etc.
À idéia de uma produção cultural sustentável, com orientação para um mercado
consumidor, se opõe a de uma infraestrutura de proteção ao artista para que ele
possa desenvolver, sem as limitações do mercado, sua expressão e criatividade.
Essa infraestrutura protetora é sempre cobrada dos organismos de estado em todas
suas instâncias. A idéia de mecenato cultural apoiado em incentivos fiscais para as
empresas patrocinadoras é rechaçada como um mecanismo neoliberal e contrario à
liberdade de criação dos artistas.
À visão de uma produção cultural pura, sob a proteção do estado, oposta à
impureza da produção de mercado e do entretenimento, se agrega a idéia de uma
cultura popular e folclórica que deve ser protegida de qualquer possibilidade de
mudança e transformação.
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A verdade é que em toda a história da humanidade em seus vários estágios de


desenvolvimento a produção cultural acompanhou a sociedade e desempenhou um
papel fundamental nos relacionamentos e nas trocas intergrupais.
Se encararmos dessa forma e definirmos como indústria cultural todas as
atividades produtivas na cultura de um povo, da produção cultural que envolve a
mais avançada tecnologia à manufatura com materiais básicos dos indígenas e
artesãos, poderemos estabelecer uma rede de produção cultural com ativos
mensuráveis e, em conseqüência, criaremos um sistema de contabilidade dessa
produção, uma verdadeira e eficaz Cartografia Cultural.

Um Sistema de Contabilidade dos Ativos Culturais

Um dos pontos cruciais na questão do desenvolvimento, em seu sentido mais


amplo, é apontada por Javier Perez de Cuellar, no informe da Comissão Mundial
de Cultura e Desenvolvimento: Nossa Diversidade Criativa, quando afirma: “... en
muchos proyectos (de desarrollo) se habia subestimado la importância del factor
humano, la compleja trama de relaciones y creencias, valores y motivaciones que
es la médula de una cultura”. Pode-se acrescentar também que aqui não se levou
em conta a noção de cultura como ativo, como conjunto formador da riqueza de
um país.
Para se pensar a cultura como fator de desenvolvimento social e humano é preciso
que se entenda o complexo sistema de produção cultural como:
•base essencial na formação da identidade de um povo
e na manutenção de sua motivação e autoestima;
• obrigação constitucional e direito do cidadão;
• impossível de ser copiada ou desenvolvida em outro país;
• aliada ao turismo, sendo uma das indústrias que mais se desenvolve no mundo;
• um fator de desenvolvimento econômico e social: um ativo da nação.
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Com esses princípios podemos desenvolver uma metodologia para uma


Cartografia Cultural, assentada nos melhores recursos que a atual tecnologia
digital nos permite. Os sistemas de banco de dados interligados e randômicos
permitem o armazenamento de infinitos dados e informações, além de uma
recuperação de informação com fácil acesso e navegação.
Para isso a Cartografia Cultural não pode ser entendida como um simples
cadastro, mas como um grande Mapa de Navegação e um grande espelho da
diversidade cultural. Cada povo, cada grupo social ou étnico terá meios de
catalogar, mensurar e valorar sua riqueza cultural em condições de diálogo e
trocas com os demais.
As experiências de desenvolvimento de Programas de Cartografia cultural em
andamento revelam que não basta o cadastramento e o armazenamento de dados
na memória de computadores. A tecnologia e a linguagem dos programas podem
facilitar ou dificultar o acesso às informações armazenadas.
Ao desenvolver um programa de Cartografia Cultural, deve ser levado em conta
não só o levantamento de dados, mas também a forma como serão
disponibilizados para acesso dos usuários. A
A ausência de dados tem sido um dos pontos fundamentais na dificuldade de
inserção da cultura como fator de desenvolvimento econômico e social. A
produção cultural é quase sempre vista pelos economistas e planejadores como
algo intangível, de caráter subjetivo e por isso impossível de mensurar, valorar e
por fim avaliar.
Um breve exame na atual estrutura do Ministério da Cultura, confirma a pouca
importância que se deu e que se dá à criação de banco de dados e de indicadores
sobre a produção cultural.
Ao contrario do mercado financeiro que se movimenta a partir da precisão e da
velocidade das informações, a cultura navega num mar de imprecisão, de
empirismo e de subjetividade.
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Por fim quero congratular-me com os organizadores deste Congresso por terem
inserido a economia e desenvolvimento como eixo dos encontros e me permitirem
apresentar o tema que espero, citando o brilhante artigo de Cristina Padilla Dieste,
encontre “nuestro espacio común” “do pensar la utopia”, e pela persistência e a
prática, tornar realidade nossos sonhos.
(*) Texto publicado em Patrimonio Cultura Y Turismo, Cuadernos 5 – Congresso
Iberoamericano sobre Patrimonio Cultural, Desarrolo y Turismo. (pg. 89-101)
Morelia, Michoacán. 2003. – CONACULTA – México – DF.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Castells, Manuel. La era de la información. Economía, sociedade y cultura. La


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Callado Antonio. Entre o Deus e a Vasilha. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985.
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Cultrix/Amana-Key. SP- 2002.

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whith Displaced Indigenous Peoples – South African San Institute in co-operation
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Geertz Clifford. The Interpretation of Cultures, Basic Books, Inc – N.Y., 1973.

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quarta edição revista e atualizada. 1994.

Obras citadas no texto.

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