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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

ESCOLA DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES


LICENCIATURA EM HISTÓRIA

BRUNO FRÖHLICH

A GUERRA FRIA E O HEAVY METAL: UMA ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES

HISTÓRICAS NAS COMPOSIÇÕES DO GÊNERO MUSICAL (1970-1989)

CURITIBA
2019
BRUNO FRÖHLICH

A GUERRA FRIA E O HEAVY METAL: UMA ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES

HISTÓRICAS NAS COMPOSIÇÕES DO GÊNERO MUSICAL (1970-1989)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II do
Curso de Graduação em Licenciatura em História da
Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Orientador: Prof. Dr. Alexandro Neundorf

CURITIBA
2019
BRUNO FRÖHLICH

A GUERRA FRIA E O HEAVY METAL: UMA ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES

HISTÓRICAS NAS COMPOSIÇÕES DO GÊNERO MUSICAL (1970-1989)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina de Trabalho de Conclusão de


Curso do Curso de Graduação em Licenciatura em História da Pontifícia Universidade
Católica do Paraná, como requisito à obtenção do título Licenciado.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________
Prof.° Dr. Alexandro Neundorf
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)

_____________________________________
Professor 2 (Titulação e nome completo)
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)

Curitiba, XX de XX de 2019.
AGRADECIMENTOS

Seria totalmente presunçoso afirmar que a escrita desta pesquisa é mérito apenas
meu. Obviamente, são diversos os fatores que levaram a conclusão desta monografia,
diretos e indiretos. Além disso, procuro ser realista em dizer que nem todos os que
deveriam estar presentes nesta página de agradecimentos, de fato, estão. Por isso,
procurarei me ater àqueles que tiveram um impacto mais direto neste ano de pesquisa,
com o perdão dos demais que foram tão importantes no desenrolar deste trabalho.
Primeiramente, agradeço infinitamente os meus pais, Jacó Alberto Fröhlich e Leni
Fröhlich, desde o começo de minha vida e meus estudos e, principalmente, durante a
graduação. Sem seus conselhos, ajuda e paciência, me é óbvio não ter chegado aqui.
Sei que posso contar com vocês para tudo, mesmo que, eventualmente, não concordem
com minhas escolhas. Sinto que vocês definem exatamente o papel de pai e mãe, e serei
eternamente grato por ser seu filho. Amo vocês.
Não menos importante, agradeço imensamente a minha esposa, Isabelle
Schimiguel Fröhlich. Este último ano (em que estive produzindo esta pesquisa) foi
bastante conturbado. Contudo, você sempre esteve ao meu lado e procurava me
incentivar, apoiar, acalmar, distrair e, principalmente, amar. Seu companheirismo é algo
surreal, e sou eternamente grato por te ter ao meu lado todos os dias. Sua presença foi
e é fundamental em minha vida, e sou extremamente feliz por ser seu esposo. Amo você.
Também primordialmente importante a esta pesquisa é meu irmão, Thiago Fröhlich.
Mal tenho como colocar em palavras o quanto seu apoio me ajudou durante esta
pesquisa, ademais em minha vida. Nossas conversas, seus conselhos e sabedoria me
inspiraram (e inspiram) imensamente, sendo peça essencial desse processo de
graduação. Obrigado por tudo. Amo você.
Me sinto também no dever de agradecer aos meus amigos, tanto os que possuem
relação de sangue, quanto os que fiz durante a vida: Lucas Melniski; Yan Guilherme de
Oliveira Jardim; Guilherme Alves Rosa; Rafael Souza; Tathiane Jolandek; Ramon
Machado; Matheus Oliveira; Rodrigo Rodrigues; Lilian Dias Fröhlich; Matheus Robert
Santana Schon; Vinicius Moreira; Paulo Henrique Souza; Leandro Kaminski.
Possivelmente eu tenha esquecido de algum nome, mas se você já fez parte de meu
cotidiano, saiba que também faz parte deste trecho. Não tem como medir a importância
que vocês tem e tiveram em minha vida, e neste processo de graduação também. Mesmo
passando por fases de afastamento, saibam que nunca serão esquecidos por este que
vos fala, e que cada conversa, conselho, e risada, foram essenciais para que eu seja a
pessoa que sou hoje. Agradeço-os infinitamente, e contem comigo para tudo que eu
possa ajudar, pois estarei à disposição. Amo todos vocês.
Por último, mas não menos importante, agradeço a todos os docentes que
passaram por minha vida, e ajudaram a desenvolver meu capital simbólico. Do ensino
básico ao superior, principalmente a meu orientador Alexandro Neundorf, meus sinceros
agradecimentos.
RESUMO

A historiografia desdobra-se em diversas áreas de pesquisas que envolvem a micro-


histórica, macro-história, história política, história econômica, mentalidades, história
cultural, e etc. Estando esta pesquisa inserida no campo da História Cultural, desdobra-
se na análise de músicas produzidas durante o período nomeado Guerra Fria. Tais
canções estão inseridas no gênero musical denominado Heavy Metal, e uma (das
diversas) característica estrutural do estilo é justamente a abordagem ao conflito bipolar.
Através do apoio do conceito de Representação e com a utilização da metodologia de
pesquisa Análise de Discurso, algumas das músicas desse gênero são destrinchadas
historiograficamente, buscando observá-las em sua totalidade harmônica. Sendo
produzidas por indivíduos que vivenciaram o conflito e sofreram influências diretas e
indiretas de sua temporalidade, as músicas possuem elevada importância no quesito de
representarem o imaginário social do período, tendo em sua estrutura fatores que
remontam diretamente aos acontecimentos espaço-temporais a que estão inseridos.

Palavras-chave: História Cultural. Representação. Análise de Discurso. Guerra Fria.


Heavy Metal.
ABSTRACT

Historiography unfolds in several research areas involving micro-history, macro-history,


political history, economic history, mentalities, cultural history, and so on. Being this
research inserted in the field of Cultural History, it is developed in the analysis of songs
produced during this period named Cold War. These songs are included in the genre
called Heavy Metal, and one (of several) structural characteristic of the style is precisely
the approach to the bipolar conflict. Through the support of Representation concept and
the use of the Discourse Analysis research methodology, some of the songs of this genre
are historically digested, seeking to observe them in their harmonic totality. Being
produced by individuals who experienced the conflict and suffered direct and indirect
influences of their temporality, the songs have high importance in the matter of
representing the social imaginary of the period, having in its structure factors that go back
directly to the spatio-temporal events to which they are inserted.

Keywords: Cultural History. Representation. Discourse Analysis. Cold War. Heavy Metal.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 8

1 CULTURA E A HISTÓRIA CULTURAL .............................................................................. 10

1.1 CULTURA ........................................................................................................................... 10


1.2 HISTÓRIA CULTURAL ..................................................................................................... 12
1.3 REPRESENTAÇÃO ............................................................................................................ 15
1.4 ANÁLISE DE DISCURSO ................................................................................................. 17
1.5 METODOLOGIA DE ANÁLISE ........................................................................................ 20

2 O HEAVY METAL E A GUERRA FRIA ............................................................................... 23

2.1 A MÚSICA COMO FONTE ............................................................................................... 23


2.1 O HEAVY METAL ............................................................................................................. 26
2.1.1 INFLUÊNCIAS DO HEAVY METAL ........................................................................ 31
2.1.2 CARACTERÍSTICAS DO HEAVY METAL .............................................................. 35
2.2 A GUERRA FRIA ............................................................................................................... 39

3 O HEAVY METAL E A GUERRA FRIA ............................................................................... 59


3.1 BLACK SABBATH E O FUNERAL ELÉTRICO ............................................................. 59
3.2 BLACK SABBATH - CRIANÇAS DA SEPULTURA....................................................... 63
3.3 METALLICA – COMBATA FOGO COM FOGO .............................................................. 67
3.4 EXODUS – E ENTÃO NÃO SOBROU NINGUÉM ......................................................... 70
3.5 KREATOR E A MORTE TOTAL ....................................................................................... 73
3.6 SODOM E O INVERNO NUCLEAR................................................................................. 76
3.7 MEGADETH – INCENDEIE O MUNDO ......................................................................... 80

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................... 84

FONTES ....................................................................................................................................... 86

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................... 87


8

INTRODUÇÃO

Os acontecimentos políticos, econômicos e sociais que permeiam a primeira


metade do século XX transformaram o mundo. Os conflitos mundiais proporcionaram ao
imaginário social ocidental (se não mundial) uma imagem de sanguinolência, horrores e
temores. Somadas as crises econômicas, o globo vivenciou um período conturbado
marcado por revoluções, tensões sociais e políticas, que modificaram o mundo e
tornaram-no bipolarizado por duas potências ideológicas mundiais: os Estados Unidos,
na América do Norte, antagonizando a União Soviética, nação continental que ocupou a
Ásia e uma parcela da Europa. Os dois países passaram por um intenso conflito que
gerou divergências culturais, sociais, políticas, econômicas e ideológicas.
Situado em torno da metade deste conflito chamado historiograficamente de
Guerra Fria, um novo gênero musical acaba por mostrar suas primeiras faces. O Heavy
Metal, influenciado por correntes pacifistas e pela harmonia de alguns outros gêneros
musicais, traz à tona a faceta cultural do período. Lançado no ano de 1970, o gênero
musical é composto por indivíduos que vivenciaram o momento, e procuram transformar
este imaginário social num ambiente melódico, refletindo as emoções e os sentimentos
deste intervalo. Logo, tendo em vista que estas bandas pertenceram ao espaço temporal
do conflito em questão, é possível que suas gravações refletissem, como fonte primária,
representações e discursos que se intercalavam ao período? Além disso, tanto a melodia
(em geral), quanto a letra musical, fazem referência à Guerra Fria?
Não se pode descartar que a música é um produto inserido no mercado capitalista
ocidental. Logo, apesar de seu discurso poder representar facetas do imaginário social,
há sempre de se levar em conta o valor midiático, propagandístico e fantástico presente
nas composições. Contudo, a presença de fatores diretamente relacionados ao seu
espaço temporal é inegável. Sendo assim, como produto de seu próprio tempo e,
buscando refletir culturalmente as representações das produções musicais em questão,
é certo que referências e reflexos sociais estão vinculados ao discurso musical do Heavy
Metal.
Nisto, levando em conta que esta monografia está situada no campo de pesquisa
da História Cultural, o objetivo é procurar como estão sendo representadas estas facetas
9

do conflito da Guerra Fria, inseridos no discurso musical do Heavy Metal. Quais seus
elementos principais, quais as características comuns entre as músicas, como o tema
musical é abordado e qual seu objetivo. O discurso e as representações culturais serão
pequenos reflexos e facetas que compuseram o imaginário social do conflito entre 1945
a 1991, aproximadamente.
No primeiro capítulo, justifica-se o campo de estudos e as metodologias, quais
serão utilizadas para a análise do período em questão através das fontes musicais.
Assuntos como cultura, História Cultural, conceitos de Representação e Análise de
Discurso serão aprofundados para que o campo de pesquisa presente e a metodologia
científica seja esclarecida.
Na segunda parte, serão apresentados os temas históricos desta pesquisa: o
Heavy Metal e a Guerra Fria. Através de uma análise historiográfica, os dois produtos
abordados passarão por um enfoque cultural, de forma a esclarecer suas características.
Primeiramente, o Heavy Metal será alvo da pesquisa, onde se procurará buscar suas
raízes, e, posteriormente, cristalização e diversificação, criando-se subgêneros e, entre
eles, o Thrash Metal. A partir disto, o conflito bipolar da Guerra Fria será analisado, de
forma a preencher lacunas políticas, econômicas, sociais, culturais e sociais.
O terceiro capítulo é dedicado à análise de exemplos de obras musicais presentes
no Heavy Metal e Thrash Metal. Músicas de bandas como Black Sabbath, Exodus,
Metallica, Megadeth, Sodom e Kreator serão alvo desta monografia. As canções serão
tratadas como fontes primárias da Guerra Fria, e serão destrinchadas suas
características comuns, as representações presentes no discurso e na melodia em geral
(somando-se aspectos rítmicos, sonoros, harmônicos, etc.), que remetem ao conflito.
Por fim, esta pesquisa tem como objetivo demonstrar a importância que a análise
de produtos culturais tem com a historiografia. A representação que estas podem possuir
em seus discursos são de muito valor, já que ultrapassam barreiras cujos documentos
oficiais (por exemplo) possuem, devido sua composição crua. A música, como qualquer
outro documento, possui discurso ideológico, mas consegue trazê-lo de forma que
provoque sentimentos e sensações que ampliam o caráter político do documento,
aludindo ao social e, como analisado posteriormente, de forma cultural.
10

1 CULTURA E A HISTÓRIA CULTURAL

1.1 CULTURA

Cultura é um conceito geralmente atrelado a costumes, práticas, pensamentos,


ideologias e as mais variadas ações de um povo. Usa-se “cultura” de forma corriqueira
para caracterizar e dar significados, de forma rasa ou aprofundada, à certas
representações, criações e qualquer coisa produzida (de forma material e imaterial) pelo
ser humano. Logo, fica claro que cultura não é algo objetivo e de fácil significação, pois
o mundo é composto pelos mais variados costumes, línguas, tradições e
comportamentos. Cultura está diretamente atrelada à História, onde cada civilização foi
adaptando-se e variando seus modos de ver o mundo e de como agir e pensar. Com o
choque entre as primeiras civilizações conhecidas, os costumes dos povos passaram a
se misturar e foram surgindo novos hábitos, com práticas presentes em diversas regiões.
Como por exemplo a adaptação do Cristianismo no Brasil colonial, em que padres
jesuítas adequaram o cristianismo europeu de forma que se encaixava no vocabulário e
mundo dos nativos, para uma evangelização mais fácil e pacífica dos indígenas.
Entretanto, a cultura também está atrelada ao modo com que uma civilização entende a
outra. Ou seja, por exemplo: a visão que um determinado povo ocidental tem sobre o
Islamismo ou sobre o Catolicismo Ortodoxo, e vice-versa. Esta visão é comumente
chamada de imaginário social (SILVA, 2009, p. 213).
É importante ressaltar os múltiplos significados da palavra “cultura”. Tendo sido
estudada por diversos antropólogos, filósofos, historiadores e cientistas em geral, possui
uma abrangência de significações. Para o antropólogo Edward Tylor, cultura é “o todo
complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume e outras aptidões e
hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade” (TYLOR apud BURKE,
2005, p. 43). Tendo isso em vista, percebe-se que cultura é atrelada há tudo aquilo que
compõe os valores, pensamentos e comportamentos de uma sociedade. Entretanto, o
ponto de vista de Tylor não compreende aspectos históricos, tendo cultura como algo já
imposto em uma sociedade. Criticado por Clifford Geertz, argumentando que cultura é
11

[...] um padrão, historicamente transmitido, de significados incorporados


em símbolos, um sistema de concepções herdadas, expressas em formas
simbólicas, por meio das quais os homens se comunicam, perpetuam e
desenvolvem seu conhecimento e suas atitudes acerca da vida (GEERTZ
apud CHARTIER, 2002, p. 67).

Não se pode descartar o papel histórico presente para conceituar-se cultura. Não
há civilização sem cultura, logo a cultura está constantemente em transformação e
adaptação. Cultura é algo facilmente variável de pessoa para pessoa. Ou seja, além de
ser algo visto de maneira macro e de fácil definição como “Ocidental” ou “Oriental”, há de
se levar em conta que o cotidiano de uma pessoa é influenciado pela família, pela região
em que reside e quais instituições frequenta, sua classe social, etc. Logo, um conceito
simples de cultura está presente no Dicionário de Conceitos Históricos:

[...] cultura é tudo aquilo produzido pela humanidade, seja no plano


concreto ou no plano imaterial, desde artefatos e objetos até ideias e
crenças. Cultura é todo complexo de conhecimentos e toda habilidade
humana empregada socialmente. Além disso, é também todo
comportamento aprendido, de modo independente da questão biológica
(SILVA, 2009, p. 85).

A importância funcional da cultura está em criar um ambiente comum em uma


sociedade, onde coexistem comportamentos, pensamentos e ideias que, por mais
distintas, fazem parte de um enorme complexo socialmente aceito. Ou seja, o correto e
o incorreto de uma civilização é todo um aprendizado cultural que, provavelmente, foi
adquirido por um grupo menor de indivíduos e adaptado ao ponto de vista macro de um
determinado povo. Uma ideologia pode não ter a mesma aceitação para um ou outro
indivíduo, mas está presente no cotidiano daquela sociedade e, portanto, pode ser
discutido a partir de um ponto de vista histórico. Logo, cultura não está apenas ligada ao
modo que se entende o mundo do ponto de vista de um determinado grupo ou de uma
civilização, mas a como sobreviver dentro de tal sociedade.

Existe sem dúvida um condicionamento material da vida social, mas as


condições materiais não afetam a conduta de uma maneira imediata,
fazem-no por mediação da cultura e das experiências individuais. As
ações da vida social são simbolicamente mediadas (CARDOSO;
VAINFAS, 2012, p. 16).
12

Podemos assumir que a cultura está presente socialmente e de forma complexa.


São inúmeros os fatores que contribuem para as diferentes condutas e modos de agir de
um indivíduo, podendo ser influenciado pelos mais diversos produtos, como livros,
músicas, folclore, crenças e etc. A criação de produtos voltados a um determinado grupo
social cria uma divergência, separados muitas vezes por “cultura popular” e “cultura
erudita”. Entretanto, apesar de haver esta separação de produtos, deve-se levar em conta
a impossibilidade de, socialmente falando, separar a influência de um determinado
produto destinado a um grupo social específico. Ou seja, mesmo que uma música seja
criada e voltada para um público popular, ela terá certo impacto também nos intelectuais
daquele período e, portanto, poderá estar no imaginário de grande parte de uma
população, quiçá de todo um país. Partindo disto, conclui-se que inúmeras interpretações
de visões de mundo presentes numa sociedade afetam e são afetadas pelo imaginário
dos indivíduos inseridos nela.

1.2 HISTÓRIA CULTURAL

A História cultural é o campo de pesquisa em que o historiador busca observar


suas fontes com olhar voltado à cultura. Não apenas estudando costumes de um povo,
práticas, crenças e tudo que já foi argumentado no subcapítulo anterior. Busca investigar
quais desses fatores estão associados também à economia, à política, à sociedade, etc.,
e de como a cultura pode influenciar uma civilização de forma geral. Busca analisar como
o imaginário social presente em determinado aspecto cultural, ou do objeto cultural
estudado, afeta a vida ou a visão de mundo de um povo. Observado por Roger Chartier,
um dos pioneiros da História cultural:

A História cultural, tal como a entendemos, tem por principal objecto


identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma
determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler. Uma
tarefa deste tipo supõe vários caminhos. O primeiro diz respeito às
classificações, divisões e delimitações que organizam a apreensão do
mundo social como categorias fundamentais de percepção e de
apreciação do real. Variáveis consoante as classes ou os meios
intelectuais, são produzidas pelas disposições estáveis e partilhadas,
próprias do grupo. São estes esquemas intelectuais incorporados que
13

criam as figuras graças às quais o presente pode adquirir sentido, o outro


tornar-se inteligível e o espaço ser decifrado (CHARTIER, 2002, p. 17).

Percebe-se, com Chartier, que o imaginário social em um povo é essencial para


que hajam civilizações. Ademais, é o que dá significação a uma realidade, criando-se
uma base moral para um ou mais povos.
A realidade social é criada de acordo com o imaginário social coletivo, e, por
conseguinte, vêm de campos intelectuais, econômicos, políticos, sociais, religiosos,
artísticos, éticos, morais, e, de modo geral, culturais, criando, moldando e caracterizando
tudo aquilo que está presente em seu conjunto. Logo, sendo o historiador cultural um dos
responsáveis por estudar este campo, percebe-se a necessidade de uma análise
interdisciplinar que engloba pelo menos alguns dos fatores citados. A sociedade é
composta de diversos fatores que a remodelam a todo instante. Pesquisas históricas
envolvendo apenas um campo de estudo (seja econômico, político ou social) acabam se
tornando superficiais, de maneira que ignoram inúmeros aspectos culturais que podem
afetá-las direta ou indiretamente. Logo, analisando um contexto sob a ótica cultural,
aprofunda-se ainda mais todo o complexo de um período histórico.

A revisão dos modelos explicativos disponíveis ocorreu a serviço de um


interesse crescente pela cultura, sendo possível perceber uma
insatisfação com explicações a partir da economia ou dos interesses de
classe. Na noção de cultura enfatizaram-se os mecanismos
interpretativos e os valores, e muitos agora passaram a crer que a cultura
não é mera função do material, do social, uma vez que as crenças e
atividades rituais das pessoas, por exemplo, interagem com as
expectativas socioeconômicas, e os efeitos dessas interações provém a
explicação das condutas e da origem das relações sociais (CARDOSO;
VAINFAS, 2012, p. 16).

Episódios não acontecem apenas devido a economia ou política, mas são


causadas por diversos outros fatores que estão ligados diretos e indiretamente.
Entretanto, sabendo que cultura é um objeto criado a partir de diversas influências, ela
também é responsável pela concepção de diversos produtos. Ou seja, além de ser
produzida por pensamentos, política, economia, classes sociais, artistas e etc., é
responsável pela criação dos mais diversos objetos, condutas e imaginários. Tudo que é
criado em uma sociedade de forma material e imaterial, surge a partir da cultura
14

instaurada e será responsável por transformar aquela civilização, como observado por
Carl Emil Schorske:

O historiador procura localizar e interpretar temporalmente o artefacto


num campo em que se intersectam duas linhas. Uma linha é vertical, ou
diacrónica, pela qual ele estabelece a relação de um texto ou de um
sistema de pensamento com as manifestações anteriores no mesmo
ramo de actividade cultural (pintura, política, etc.). A outra é horizontal, ou
sincrónica: através dela, determina a relação do conteúdo do objecto
intelectual com o que vai surgindo ao mesmo tempo noutros ramos ou
aspectos de uma cultura (SCHORSKE apud CHARTIER, 2002, p. 63-64).

A cultura está em constante mudança e atualização, e é responsável pela criação


de sentimentos, de como a realidade é vista através dos indivíduos, acerca de um
determinado fator. Ou seja, o historiador cultural também analisa como o imaginário social
é sentido pela população, o que é transmitido sensivelmente e quais são os impactos
disso na população.
A palavra “cultural” distingue-a da história intelectual, sugerindo uma ênfase em
mentalidades, suposições e sentimentos e não em ideias ou sistemas de pensamento
(BURKE, 2005, p. 69). Além disso, o próprio sentimento cultural pode ser fator para a
criação de outros padrões culturais. Como por exemplo, o sentimento retratado em uma
representação artística nem sempre é associado a apenas um fator. Há um complexo
sistema entre o que motivou sua criação e como isso foi retratado, e de como o
surgimento deste produto afeta novamente a sociedade e o próprio produtor da obra. Por
exemplo, o medo do poderio nuclear desenvolvido na Guerra Fria, quando retratado em
músicas, representa, em inúmeras letras, o pavor do fim dos tempos.
Logo, o estudo inserido no campo da História Cultural, quando voltado à análise
de um objeto, consegue analisar tanto o pré contexto de uma determinada obra e qual o
imaginário que surgiu através deste processo, como isso afeta o mundo social, político,
econômico e etc. O historiador cultural busca entender a História de tendência etnográfica
(DARNTON, 1986, p. XIII). Ou melhor, busca compreender qual o imaginário social
coletivo e, através disso, proporcionar análises aprofundadas sobre um determinado
contexto e sobre uma determinada época.
15

1.3 REPRESENTAÇÃO

Analisando as formas culturais que norteiam uma sociedade, somos capazes de


perceber um valor simbólico muito presente nas mais diversas características que
compõem a mesma, através de modos de falar, pensar e, portanto, de livros, textos,
músicas, comportamentos, hábitos e opiniões. Esses símbolos são estudados de forma
coletiva em um determinado meio por diversos pesquisadores, como Roger Chartier,
Émile Durkheim, Serge Moscovici e compreendem diversas áreas científicas como
História, Psicologia e Sociologia. A representação é a relação entre um objeto presente e
um objeto ausente, em que a representação nos permite ver o “objeto ausente” (coisa,
conceito ou pessoa), substituindo-o por uma “imagem” capaz de representá-lo
adequadamente (CHARTIER, 2011, p. 17). Logo, percebe-se que determinado produto
ou personagem tem a capacidade de evocar algum outro sentido que não seja apenas o
seu literal e físico, assim representando algum outro fator simbólico envolvido em um
determinado contexto cultural. Ou seja, tanto como o conceito de representação pode ser
usado para dizer que algo está sendo representado presencialmente, indica que algo
pode estar sendo representado de forma simbólica neste mesmo objeto, ao mesmo
tempo. Representação pode ter vários sentidos em português. Trata-se de uma palavra
de origem latina, oriunda do vocábulo repraesentare que significa “tornar presente” ou
“apresentar de novo” (SANTOS, 2011, p. 28).
O mundo, como o percebemos, está cercado de representações. Contudo, tais
representações são, muitas vezes, transmitidas de forma cultural, onde vários grupos
sociais distintos acabam atribuindo as mesmas explicações e visões representativas em
determinados aspectos do mundo social tanto na imagem de reis, imperadores e
monarquistas, quanto em imagens mais comuns ao cotidiano, como simples objetos.
Argumentado por Roger Chartier:

Algumas dessas imagens são bem materiais e semelhantes, como os


bonecos de cera, de madeira ou de couro, apelidados justamente de
representações, que eram colocados por cima do féretro real durante os
funerais dos soberanos franceses e ingleses e que mostravam o que já
não era visível, isso é, a dignidade imoral perpetuada na pessoa mortal
do rei. Outras, porém, são pensadas num registro diferente: o da relação
simbólica que, para Furetière, consiste na representação de um pouco de
16

moral através das imagens ou propriedades das coisas naturais (...) O


leão é o símbolo do valor. A esfera, o da inconstância; o pelicano, o do
amor paternal (CHARTIER, 2002, p. 20).

Desta forma, pode-se observar que inúmeros grupos sociais podem ser estudados
a partir da análise das representações, através de como tais conjuntos associam uma
mesma imagem a um mesmo valor simbólico. Como já discutido anteriormente, a cultura
é algo extremamente complexa e, portanto, cabível de inúmeros objetos que podem
possuir representações semelhantes para um determinado grupo social. Ou seja, como
isso pode ser transmitido na hora de analisarmos o poder representativo dos objetos de
um rei, como a coroa, cetros e objetos que simbolizam poder. Nisto, é comum que um
símbolo seja capaz de ser analisado e compreendido para uma grande parcela de
indivíduos através de como ele é representado, usado e pensado. Isto se dá através de
mídias, livros, textos, músicas e inúmeros objetos populares que moldam uma
representação social. A música, por exemplo, é algo contemporâneo que pode carregar
consigo uma carga representativa enorme, traduzindo processos permeados de tensões
sociais, lutas culturais e clivagens históricas (NAPOLITANO, 2002, p. 49).
Entretanto, a representação também pode ser utilizada como meio de analisar a
visão de realidade de um grupo que nem sempre é maioritário ou que pode impor sua
visão de mundo à sociedade. Ou seja, através de noções de representação, podemos
ver o mundo através de grupos minoritários, que muitas vezes podem sofrer com
representações sociais violentas, em que determinado grupo se impõe através de um
exercício de dominação graças à violência simbólica (CHARTIER, 2011, p.22). Um
exemplo disso são as formas simbólicas que o homem atribui a diversos comportamentos
culturais e/ou sociais, que visam diminuir o sexo oposto ou algum outro gênero que seja
alheio ao majoritário de uma determinada sociedade. Como enfatizado por Peter Burke:

(...) com a ascensão da história dos colonizados na Ásia, África e América,


que emergiu junto com os estudos pós-coloniais e que muitas vezes
dirigiu seu foco para a “visão dos derrotados”, ou para o ponto de vista
das “classes subalternas”. De maneira semelhante, historiadoras
feministas tentaram não apenas tornar as mulheres “visíveis” na história,
mas também escrever acerca do passado sob um ponto de vista feminino.
Dessa forma, os historiadores tornaram-se cada vez mais conscientes de
que pessoas diferentes podem ver o “mesmo” evento ou estrutura de
perspectivas muito diversas (BURKE, 2005, p. 101).
17

Logo, pode-se constatar que dentro de um mesmo contexto social, há inúmeros


produtos que podem ter os mais diversos significados e, portanto, é importante assinalar
que elas não são nem verdadeiras e nem falsas, elas ocupam o intervalo entre presença
e ausência (SANTOS, 2011, p. 44). Considerando-se que o modo com que cada pessoa
enxerga o mundo pode ser diferente, abre-se um leque de representações muito amplas
com os mais diversos significados e interpretações. A ideia de representação, portanto,
mostra que imagens e textos refletem ou imitam a realidade social, mas além disso, há
uma “construção” ou “produção” da realidade (BURKE, 2005, p. 99) através daqueles que
a enxergam e relatam. Tendo isso em conta, a realidade é representada através da visão
de diversos textos, músicas, livros e etc. que podem ser influenciadas por outras diversas
influências de representação que os personagens por trás de suas criações estão sujeitos
e, portanto, não se constituem de um discurso neutro, mas identificam o modo como, em
diferentes lugares e em diferentes tempos, uma determinada realidade social é pensada
e construída (ABUD, 2005, p. 312).
As representações estão presentes em todos os produtos de uma determinada
cultura. O papel do pesquisador, no entanto, ao analisá-las, é de situá-las ao seu contexto
político, cultural e social e retirar apenas aquilo que pode ser usado como uma fonte do
imaginário social e representativo presente em uma determinada sociedade, encaixadas
em um determinado período. Assim, evitando anacronismos e, consequentemente,
entendendo como eram tratados assuntos políticos, sociais, econômicos, etc., no ponto
de vista de uma determinada cultura, ou de um determinado grupo ou classes. Além disso,
é possível observar qual o impacto dessas interpretações do imaginário coletivo presente
em representações sociais que é gerado através destas representações coletivas, e
então ter uma noção mais clara dos modos de se agir, pensar e viver em determinadas
épocas, regiões, e contextos em geral.

1.4 ANÁLISE DE DISCURSO

Independente da região, das crenças, da cultura, da classe social ou de qualquer


outro fator em que um indivíduo está inserido, é fato que qualquer pessoa é capaz de
18

produzir (e produz naturalmente) enunciados, ou seja, discursos. Tais enunciados podem


ter caráter político, social, econômico, cultural, ideológico, etc., e expressam a forma
como um personagem vê a si e o mundo, e através da fala é capaz de representá-lo a
partir de seu próprio ponto de vista. A partir dessa representação, é possível que haja
uma interpretação de uma série linguisticamente descritível de pontos de deriva possíveis,
onde a análise de discurso trabalha (PÊCHEUX, 2006, p. 53). Contudo, como dito
anteriormente e argumentado por Helena Hathsue Nagamine Brandão:

Um conceito fundamental para a AD é, dessa forma, o de condições de


produção, que pode ser definido como o conjunto dos elementos que
cerca a produção de um discurso: o contexto histórico-social, os
interlocutores, o lugar de onde falam, a imagem que fazem de si, do outro
e do assunto de que estão tratando. Todos esses aspectos devem ser
levados em conta quando procuramos entender o sentido de um discurso
(BRANDÃO, 2006, p. 6).

A partir disso, observa-se que a linguagem não é algo transparente, já que carrega
visões ideológicas da realidade. Logo, a análise de discurso pretende sopesar a
materialidade simbólica própria e significativa de um discurso, ou seja, como ele significa
(SILVA, 2006, p. 16). O discurso é uma atividade produzida entre aquele que o produz e
o que o recebe, aquele que lê ou escuta.

Podemos definir discurso como toda atividade comunicativa entre


interlocutores; atividade produtora de sentidos que se dá na interação
entre falantes. O falante/ouvinte, escritor/leitor são seres situados num
tempo histórico, num espaço geográfico; pertencem a uma comunidade,
a um grupo e por isso carregam crenças, valores culturais, sociais, enfim
a ideologia do grupo, da comunidade de que fazem parte. Essas crenças,
ideologias são veiculadas, isto é, aparecem nos discursos. É por isso que
dizemos que não há discurso neutro, todo discurso produz sentidos que
expressam as posições sociais, culturais, ideológicas dos sujeitos da
linguagem (BRANDÃO, 2006, p. 03).

O discurso pronunciado é tudo aquilo que um sujeito associou de sua realidade


social e, conferindo-lhe valores éticos e morais, passa a usá-los como sua visão de
mundo. A partir disso, todo indivíduo cria uma ideologia, a qual é influenciada de maneira
passiva e ativa de acordo com aquilo que o indivíduo acredita e usa como argumento em
seus enunciados, discursos, conversas, textos e pronunciamentos. A ideologia é
19

entendida como o posicionamento do sujeito quando se filia a um discurso, sendo o


processo de constituição do imaginário que está no inconsciente, ou seja, o sistema de
ideias que constitui a representação (CAREGNATO; MUTTI, 2006, p. 680).
Além de discursos, a ideologia está ligada aos hábitos e formas de agir e enxergar
o mundo. Ou seja, todo indivíduo é composto de uma formação ideológica na qual ele
baseia e determina suas ações cotidianas, podendo ser expressado tanto em
pensamentos, quanto em ações físicas: textos e discursos. Podemos definir formação
ideológica como o conjunto de atitudes e representações ou imagens que os sujeitos
históricos têm sobre si mesmos e sobre o interlocutor e o assunto em pauta (BRANDÃO,
2006, p. 07). Tendo isso em vista, a formação ideológica de um indivíduo é responsável
por garantir sentido à realidade que esse sujeito se encontra. Através do sentido a

AD é responsável por procurar maneiras de trabalhar sobre as


materialidades discursivas, implicadas em rituais ideológicos, nos
discursos filosóficos, em enunciados políticos, nas formas culturais e
estéticas, através de suas relações com o cotidiano, com o ordinário do
sentido (PÊCHEUX, 2006, p. 49).

O sentido que qualquer sujeito histórico produz utilizando-se da linguagem é


extremamente amplo e possível das mais diversas interpretações. É comum que frases
exatamente iguais possam produzir diversas significações, usadas para política, para
caráter jornalístico, para teatro, religião, crenças e etc., ou seja:

O sentido não está “colado” na palavra, é um elemento simbólico, não é


fechado nem exato, portanto sempre incompleto; por isso o sentido pode
escapar. O enunciado não diz tudo, devendo o analista buscar os efeitos
dos sentidos e, para isso, precisa sair do enunciado e chegar ao
enunciável através da interpretação (CAREGNATO; MUTTI, 2006, p. 681).

Através disto, o indivíduo é capaz de produzir e reproduzir aquilo que ele entende
como a realidade, ou seja, a maneira a qual o mesmo enxerga o mundo. Por meio da
linguagem, o homem transforma a realidade em que vive e a si mesmo. O homem
constrói a existência humana, ou seja, confere-lhe sentido (SILVA, 2006, p. 16). Com isto,
é importante ressaltar que todo indivíduo é um produto de seu tempo e, logo, produz um
modo de pensar compartilhado por uma determinada cultura, mesmo que esta mesma
20

possua diversas maneiras de enxergar a realidade. Entretanto, tal maneira de produção


do social é sempre muito mais próxima a uma determinada comunidade do que de uma
terceira a qual encontra-se distanciada de tal meio social e cultural. A partir disso, nota-
se que o sujeito não é individual, é assujeitado ao coletivo, ou seja, esse assujeitamento
ocorre no nível inconsciente, quando o sujeito se filia ou interioriza o conhecimento da
construção coletiva, sendo porta-voz daquele discurso e representante daquele sentido
(CAREGNATO; MUTTI, 2006, p. 681).
Logo, conclui-se que todo discurso, jornalístico, político, cultural, midiático, literário,
etc., são frutos de seu tempo, de seu contexto e de sua comunidade. Através disso, é
fundamental para que o analista do discurso tenha claro qual formação ideológica está
presente no discurso específico a ser estudado, para que possa contextualizá-lo
adequadamente, sem causar confusões de sentidos. Deve-se observar que o discurso
estará sempre entre a linguagem e a ideologia (HENRY; GADET; HAK, 1997, p. 34-35),
e, portanto, é fundamental que o discurso seja analisado culturalmente, socialmente e
politicamente, contextualizado de forma adequada.

1.5 METODOLOGIA DE ANÁLISE

O objeto de análise desta pesquisa é composto por músicas do gênero musical

Heavy Metal, o qual globalizou-se na década de 70, onde João Matheus Perelló assinala

que

O uso do termo em jornais e revistas especializadas rapidamente se


tornou massificado, logo passou a ser utilizado pelos fãs das novas
bandas que surgiam com uma sonoridade diferente e mais pesada de rock,
especialmente em associação ao Black Sabbath e as bandas de meados
da década de 1970 do movimento conhecido como New Wave Of British
Heavy Metal, em uma tradução livre é a Nova Onda do Heavy Metal
Britânico comumente abreviado pela sigla NWOBHM (PERELLÓ, 2018, p.
27).

Contemporaneamente, o estilo continua presente e influenciando diversas outras

correntes como o Punk e subgêneros, como Thrash Metal, Folk Metal, Doom Metal e etc.

Como toda representação cultural, o Heavy Metal vem carregado de ideologias sociais,
21

políticas e religiosas que, simbolizadas em imagens, são representadas através das

letras, da sonoridade, do ritmo, as imagens dos álbuns, pôsteres, cartazes, vídeos, DVD’s

e as demais características que envolvem a representação do gênero, moldando um

modo de pensar e uma visão de mundo coletiva.

Portanto, o objeto a ser analisado nesta pesquisa são músicas do gênero Heavy

Metal. Serão comparadas ao contexto da Guerra Fria, observando como o seu caráter

político, econômico e social eram representados culturalmente, através da melodia, da

letra, ritmo, tom, harmonia. Músicas como: Electric Funeral, quinta música do álbum

Paranoid, da banda Black Sabbath; War Pigs, do mesmo álbum, do Black Sabbath;

Children of the Grave, quarta música do álbum Master of Reality, também do Black

Sabbath; Fight Fire with Fire, primeira música do álbum Ride the Lightning, da banda

Metallica; Set the World Afire, segunda música do álbum So Far, So Good… So What!,

da banda Megadeth.

O estilo musical presente é caracterizado por tratar de temas sombrios em suas

letras/vocais, ambientado por uma sonoridade geralmente composta por guitarras, baixo

e bateria que delineiam um clima pesado para a melodia, acompanhados por ritmos ora

lentos, ora frenéticos que seguem uma linha de raciocínio com a letra da música. As

músicas estão situadas no recorte temporal dos anos 1970 a 1989, no decorrer do

contexto político de plena Guerra Fria, o que acaba sendo retratado nas canções que

serão analisadas posteriormente. Os objetos de estudo desta pesquisa são facilmente

encontrados na internet, em sites de letras de músicas e outros, como o Youtube, onde a

melodia é apresentada com áudio, e também é possível encontrá-las em aplicativos ou

programas que tenham a função de reproduzir conteúdo sonoro, como o Spotify, Deezer

e Soundcloud.

As músicas serão analisadas a partir de seu caráter político, social, cultural e

ideológico. A partir de referências historiográficas do contexto político e social do contexto


22

em questão, serão analisadas as representações presentes nas letras das músicas, e

como elas são inseridas no contexto melódico de cada música. É fundamental a

articulação entre “texto” e “contexto” para que a análise não se veja reduzida, reduzindo

a própria importância do objeto analisado (NAPOLITANO, 2002, p. 77-78).

A canção conterá as representações culturais que cerceiam o contexto da Guerra

Fria, estudado nesta pesquisa, e será um dos focos desta análise no quesito que

representará uma visão popular do recorte temporal, trazendo à tona um ambiente

sentimental e emotivo dos instrumentos musicais. Logo, através da análise destas fontes,

o foco é de extrair as representações culturais compostas nestas fontes musicais,

comparando-as com o contexto político e social do conflito, cujas tensões desencadeiam

problemáticas contemporâneas, atuais e articulam uma onda de simbologias. Serão

observadas as representações políticas da Guerra Fria, o seu impacto no caráter social

e como era retratado o sentimento provocado pelas tensões do conflito nestas

composições. Serão analisados componentes que fazem ligação direta e indireta entre

objetos que caracterizam o contexto, como a citação de guerras, soldados, generais,

conflitos, poderio bélico (nuclear, principalmente) e, através disso, analisadas quais são

as representações geradas e os sentimentos que são presentes nas composições como

o medo e o frenesi das batalhas e conflitos, o medo do fim do mundo devido a uma guerra

nuclear envolvendo potências do período, as tensões e a bipolarização mundial.

Sentimentos representados também através da aflição de um possível ataque massivo e

devastador, das políticas de generais e demais personagens políticos. Além disso, a ideia

de uma destruição em massa causada por um conflito nuclear, o clima de tensão

principalmente europeu e norte-americano e, de forma ampla, ocidental. E como isso

representaria um imaginário do passado e expectativas do futuro.


23

2 O HEAVY METAL E A GUERRA FRIA

2.1 A MÚSICA COMO FONTE

Sons e ruídos estiveram e estão presentes na vida humana desde sempre, e a


todo instante no cotidiano da vida de qualquer ser vivo capaz de ouvir. Mesmo
despercebidos – principalmente em ambientes urbanos – são produzidos
interminavelmente em nosso dia a dia. Quando o ser humano percebeu que pode
transformá-los em forma rítmica e harmônica, inventou uma maneira de transmitir
sentimentos e emoções e que podia dar um significado a esses sons. Logo, a música se
tornou parte do cotidiano de todas as civilizações que conhecemos, seja usada para o
lazer, para rituais, belicismo, encorajamento ou intermináveis outras razões. Observado
por Nel Souza Soares:

As mais diversas manifestações musicais estão profundamente


enraizadas na vida e no cotidiano dos homens desde tempos antigos, não
se conhece nenhuma civilização que não possua alguma forma de música,
ao longo da história essa forma de arte se desenvolveu e se elaborou
acompanhando-nos em nossos rituais, celebrações, danças ou
simplesmente, servindo para o nosso deleite (SOARES, 2014, p. 01).

Através disto, percebe-se que a música é algo que possui diversas características,
no quesito de que, apesar de sempre estar presente em toda a história da humanidade,
cada civilização produziu um (ou vários) estilos musicais diferentes, sendo representados
culturalmente e que expressam individualidades próprias, e que, entrando em contato
com outros tipos de músicas de diferentes povos, apropria-se de fatores musicais de
outros povos e estilos. Até hoje é comum o uso de canções para a religião. Costumam
utilizá-la de forma ritualística, criando ritmos e harmonias com um tom expressivo,
conectando-se ou aproximando-se de divindades. Devido a seu fator harmônico e rítmico,
tende a ser de fácil compreensão por seus ouvintes, os quais absorvem a melodia e a
mesma tem o poder de permanecer na cabeça de quem a escutou por um longo período,
sendo repetida mesmo que o indivíduo não perceba. Como observado por Lucas Taoni:

Podemos entender que a adequação poético-melódica é um processo


complexo de persuasão, no sentido mais agregador e positivo do termo,
24

à medida que ela é fundamentalmente importante do ponto de vista


histórico e estético quando se presta também como veículo de
comunicação, aliás, muito potente porque pode transgredir as fronteiras
do espaço e do tempo e dotada de fascínio, de encantamento, possuidora
da aptidão de colocar os ouvintes em sintonia com o conteúdo
artisticamente sugerido (TAONI, 2016, p. 09).

Como já dito anteriormente, toda civilização possuiu e possui seus próprios estilos
musicais diferentes. Além disso, com a globalização e a rápida transmissão de
informações que a internet proporcionou, a gama de músicas as quais podemos ouvir
estão muito mais amplas. Ou seja, um brasileiro pode ter facilmente contato com uma
música britânica, norte-americana, ou francesa, por exemplo. Logo, produtores musicais
de um certo estilo musical também podem e são influenciados por estilos diferentes,
recriando-os em seu local de origem. O Heavy Metal, estilo proposto nesta pesquisa, foi
influenciado principalmente pelo jazz e rock norte-americanos, mas teve suas primeiras
aparições no Reino Unido. Conforme esta linha de análise, o sentido das obras musicais
é o produto de convenções socioculturais, portanto, não são “efeitos naturais” e
intrínsecos à obra musical (NAPOLITANO, 2002, p. 32). Além disso, a música está
intimamente ligada a um grupo específico, a uma mentalidade, a uma realidade. Ela pode
ser usada para entender melhor uma determinada época e trazer à tona subjetividades
as quais documentos oficiais podem não deixar tão claros, abrindo um leque maior de
oportunidades de estudo acerca de uma determinada época. Dito isto, a música de uma
determinada região e de um determinado período possui as características próprias
destes, sendo expostas em forma de canção.

O grande poder de comunicação e disseminação de ideias representadas


pela canção traz à tona a reflexão sobre sua capacidade de traduzir
determinadas características de um período histórico somadas à
realidade cultural e social do mesmo período (MANOEL, 2014, p. 06).

A música, com seu poder de persuasão e sendo tão facilmente disseminada


através de rádio, televisão, computadores, celulares, aplicativos e etc., pode traduzir
realidades e ajudar historiadores a analisar um determinado período.
Sendo uma obra de seu tempo, traduz culturalmente a mentalidade de
determinados grupos, e até mesmo de uma vasta gama populacional. Pode refletir
25

tensões sociais, conflitos bélicos, fatores culturais, econômicos e políticos através de uma
pequena letra musical, um ritmo e uma harmonia sonora. A música, sobretudo a popular,
pode ser compreendida como parte constitutiva de uma trama repleta de contradições e
tensões em que os sujeitos sociais, com suas relações e práticas coletivas e individuais
e por meio dos sons, vão reconstruir partes da realidade social e cultural (MORAES, 2000,
p. 212).
Apesar da música urbana, principalmente contemporaneamente pois a informação
mundial é de fácil acesso, ter a capacidade de refletir alguma sociedade longínqua, é
impossível que ela possa traduzi-la de forma completa ou objetiva. Como a maioria das
especificidades culturais, elas representam uma determinada região, sendo esta mínima
ou ampla, como todo o Ocidente, em algumas de suas características que possam ser
efeitos de crises econômicas, tensões políticas ou sociais, legado cultural ou diversos
outros fatores. Como observado por Marcos Napolitano:

As apropriações, usos e mediações culturais tendem a se mover dentro


de um leque possível de ações, limitadas por fatores estruturais
(econômicos, sociais, ideológicos, culturais), ainda que não determinada
por eles (NAPOLITANO, 2002, p. 24).

Logo, a música, com todas as suas características, reflete culturalmente a


mentalidade de um ou vários grupos sociais e culturais. Pode representar a mentalidade
de todo o Ocidente ou apenas de uma regionalidade específica, como o fandango gaúcho,
o samba carioca, entre outros.

Seu poder de reflexão ideológica, cultural, social e política é um material que pode
ter uma profunda importância historiográfica, se for analisado metodologicamente, com
cuidado e sem cometer anacronismos, sendo feitas as perguntas certas a estes
documentos. É um material de fácil acesso pois, presente em diversos sites na internet e
aplicativos de celulares, podem ser acessados e encontrados sem transtornos,
representando um conjunto cultural enorme, o qual possui mentalidades, tensões,
conflitos políticos, sociais, econômicos, sendo um material historiográfico importante que
foge do tradicionalismo, podendo nos revelar visões de mundo diferentes, aprofundando-
se certos períodos e fatos históricos.
26

2.1 O HEAVY METAL

O surgimento do gênero musical conhecido popularmente como Heavy Metal data


do mês de janeiro de 1970, com o lançamento do primeiro álbum da banda inglesa Led
Zeppelin, trazendo consigo a técnica de tocar guitarra de Jimmy Page, o vocal estridente
de Robert Plant e a bateria explosiva de John Bonham (Bonzo), a banda forneceu o
caminho para outras bandas seguirem (PHILLIPS; COGAN, 2009, pg. 142) 1, dando as
primeiras indicações de um estilo que seria diferente de todos os seus antecessores.
Posteriormente, Black Sabbath lança seu primeiro álbum e decreta oficialmente as
características das quais o gênero ficou mundialmente conhecido e influente.

A História do Heavy Metal tende a variar dependendo de onde ela foi


escrita. Por exemplo, o título de quem é verdadeiramente a primeira
banda de heavy metal é uma disputa entre Led Zeppelin e Black Sabbath.
Os americanos tendem a escolher Led Zeppelin, uma banda que foi
popular nos Estados Unidos por mais de vinte anos, mas os britânicos
favorecem o Black Sabbath (WEINSTEIN, 2000, p. 14).2

É fato que, ainda anterior a Black Sabbath e Led Zeppelin, já haviam bandas que
possuíam em sua estrutura musical traços que são facilmente encontrados em bandas
consideradas Heavy Metal. São comumente chamadas de “proto metal”, por possuírem
fatores muito próximos ao gênero, mas que por algum motivo melódico não são
consideradas de fato bandas de metal. Como observado por William Phillips e Brian
Cogan:

Para as finalidades deste livro, nós estabelecemos uma linha do tempo


de quando o metal foi “fundado” e argumentamos que os verdadeiros
fundadores do heavy metal são Black Sabbath e Led Zeppelin,
respectivamente, e as bandas que vieram antes como Blue Cheer são
proto-metal porque elas não contêm alguns elementos do heavy metal

1
Tradução livre do autor. No original: With Jimmy Page’s charismatic flights of the fretboard, Robert Plant’s
highpitched vocals, and Bonzo’s (John Bonham’s) drums of thunder, the band provided the text that others
would follow.
2
Tradução livre do autor. No original: Histories of heavy metal also tend to vary according to where and
when they were written. For instance, the title for which was the first real heavy metal band is a contest
between Led Zeppelin and Black Sabbath. Americans tend to pull for Led Zeppelin, a band that has been
popular in the United States for more than twenty years, but the British favor Black Sabbath.
27

(PHILIPS; COGAN, 2009, p. 04).3

Portanto, as raízes estruturais do Heavy Metal são geralmente associadas às duas


bandas inglesas, apesar de haver divergências acerca de quem realmente foi a primeira.
Ambas possuíam um som altíssimo, guitarra lastimosa, bateria estrondosa, um baixo
pesado, e vocais gritantes que combinam-se e liberam uma energia vital poderosa que
deposita seu espírito em qualquer tema lírico (WEINSTEIN, 2000, p. 27)4.
O diferencial do Black Sabbath é o tom melódico característico e sinistro da banda,
com uma guitarra afinada em um tom muito mais pesado do que o comum da época e,
juntamente com uma letra horripilante, faz com que o ouvinte sinta uma sensação de
“desconforto” psicológico, um certo estarrecimento, e, em contrapartida, oferece um ritmo
acelerado e pulsante que proporciona euforia.

Então veio a revolução – a espontânea criação da música “Black Sabbath”.


Foi um começo crucial para a banda e fundamental para todo o heavy
metal posterior. Uma música baseada em apenas três tons, duas sendo
de notas Ré (D). Descrevendo a crise do dia do juízo final com um
suspense amedrontador o seu narrador suspira: “O que é isso, que está
diante de mim? Vestido em preto, que aponta para mim...”. Flutuando em
zumbidos experimentais, a dimensão do horror da canção rapidamente
ganha vida em seu clímax enquanto o dia do juízo final por fim consome
o protagonista relutante. Foi um conto sombrio digno de Edgar Allan Poe,
contado através das novas penas de corvo de guitarras, baterias, e
microfones estalantes (CHRISTE, 2010 , p. 16).5

O termo “Heavy Metal” associa-se a como críticas da época passaram a chamar


o estilo, sem consenso em relação ao autor deste e, posteriormente, comumente
chamado apenas por “Metal”. O surgimento de periódicos voltados a assuntos

3
Tradução livre do autor. No original: For the purposes of this book, we have set a timeline as to when metal
was “founded” and argue that the true founding fathers of heavy metal are Black Sabbath and Led Zeppelin,
respectively, and that bands that came before them such as Blue Cheer are proto-metal because they lacked
some elements of heavy metal.
4
Tradução livre do autor. No original: High volume, a wailing guitar, a booming bass drum, a heavy bass
guitar line, and screaming vocals combine to release a vital A power that lends its spirit to any lyrical theme.
5
Tradução livre do autor. No original: Then came the breakthrough—the spontaneous creation of the song
“Black Sabbath.” It was a pivotal new beginning for the band and fundamental to all heavy metal forever
after. Here was a song based on only three tones, two of them D notes. Recounting the crisis of judgment
day with fearsome suspense its narrator gasped: “What is this, that stands before me? Figure in black,
which points at me…” Floating on feedback drones, the dimensions of the song’s horror grew and galloped
into life at the climax, as doomsday ultimately consumed the unwilling protagonist. It was a grim tale worthy
of Edgar Allan Poe, told through the new raven’s quills of guitars, drum, and crackling microphone.
28

relacionados ao cenário musical do gênero analisado, transforma o uso da palavra


“Heavy Metal” na representação de todo este novo estilo musical, na década de 1970. O
termo nos dá a sensação de algo pesado, pois além da palavra “heavy” (pesado), o “metal”
também representa algo maciço, sólido. Assim, mesmo tendo uma ligação muito forte
com o Rock, o gênero ainda é marcado por seu tom mais “pesado”, o que acabou
combinando com o estilo musical e tornando-se seu signo. Logo, todas as bandas que
reproduzem as características são englobadas neste círculo que possui uma infinidade
de bandas, álbuns, músicas e estilos.

Independente de qual crítica usou primeiro o termo ou tornou-o linguagem


comum, este estava claramente em uso no começo dos anos setenta e
logo tornou-se amplamente aceitado como o nome do novo gênero de
músicas “mais pesadas” produzidas por bandas tais como Black Sabbath
e Led Zeppelin (PHILIPS; COGAN, 2009, p. 04).6

Com o decorrer dos anos 70, principalmente na segunda metade da década, a


estrutura sonora presente nas canções escritas por Black Sabbath e Led Zeppelin
tornam-se populares e começam a atrair a atenção de uma parcela da sociedade,
principalmente no Reino Unido e nos Estados Unidos e, a partir disto, impulsionada pela
influência de novas bandas como Judas Priest, Motörhead, Quiet Riot e Def Leppard,
trazem grande impacto ao gênero, possuindo aspectos de influência para outras bandas
posteriores. Logo, formados os pilares rítmicos, sonoros, melódicos e demais aspectos
da sonoridade destas bandas, é no final da década de 1970 e começo de 80 que o estilo
se transforma em “grande porte”. Com a chegada da intitulada New Wave of British Heavy
Metal (NWOBHV - “Nova Onda de Heavy Metal Britânico”), surge um aumento
significativo do número de bandas de Heavy Metal, as quais ampliam ainda mais a gama
de características musicais presentes neste estilo.

O período entre 1979-81 foi marcado por uma explosão de novas bandas
de heavy metal britânicas. O período se tornou conhecido como a Nova
Onda de Heavy Metal Britânico (NWOBHM). Nenhuma música ou estilo
lírico era associado à Nova Onda: cada banda tendia a ser única. O que

6
Tradução livre do autor. No original: Regardless of which critic first used the term or introduced it to common
parlance, it was clearly in use by the early seventies and soon became widely accepted as a name for the
new genre of “heavier” music produced by bands such as Black Sabbath and Led Zeppelin.
29

todas as novas bandas compartilhavam era uma sensibilidade geral de


heavy metal, acompanhado de juventude e uma forte ênfase em
elementos visuais (WEINSTEIN, 2000, p 44).7

Neste período é perceptível que o gênero ganha um estilo diferente, caracterizado,


principalmente, por um aumento na velocidade rítmica das músicas. As guitarras
possuem tanto riffs quanto solos rápidos, acompanhando uma bateria equipada com
várias opções de acessórios musicais, o impacto do som grave do baixo e com um vocal
sentimental, expressivo. O gênero passa a tomar os holofotes da indústria fonográfica e
cultural, tornando cada vez maiores eventos e concertos que possuíam a presença de
bandas de Metal, fazendo com que o estilo esteja presente cada vez mais no cotidiano
de artistas e ouvintes, principalmente britânicos, região que teve o papel de berço para
as primeiras bandas de Heavy Metal. Escrito por Ian Christie, em Sound of the Beast:

Em fevereiro de 1980, Iron Maiden tocou “Running Free” ao vivo no Top


of Pops (programa musical de auditório britânico) e, posteriormente, em
maio, lançou seu álbum homônimo Iron Maiden. O heavy metal britânico
estava preparado para seu tempo de ouro – uma porção de álbuns
apareceram simultaneamente. Compartilhando os holofotes estava o
álbum Wheels of Steel da banda Saxon, uma sólida e cromática
compilação de maravilhas destruidoras de pescoços. Def Leppard, um
grupo de jovens de Sheffield (cidade britânica), debutou com On Through
the Night, temperando sua exuberância crua com a melodia de guitarras
ao estilo Thin Lizzy (banda britânica). Posteriormente o Motörhead lançou
o álbum Ace of Spades, o mais notável e veloz de seus primeiros
lançamentos, revelando os segredos da imortalidade de Lemmy (vocalista
da banda) com contos de conquista sexual e da vida na estrada. Cortando
relações com o passado, esta impressionante lista de álbuns trouxe um
implacável peso com momentos de leve euforia – juntos eles formaram o
núcleo do universo do NWOBHM (CHRISTE, 2010, p. 54).8

7
Tradução livre do autor. No original: The period 1979-81 was marked by an explosion of new heavy metal
bands on the British scene. The period became known as the New Wave of British Heavy Metal
(NWOBHM).S6 No single musical or lyrical style was associated with the New Wave: each band tended to
be rather unique. What all the new bands did share was a general heavy metal sensibility, along with
youthfulness and a strong emphasis on visual elements.
8
Tradução livre do autor. No original: In February 1980, Iron Maiden performed “Running Free” live on Top
of the Pops, then, in May, released its self-titled Iron Maiden album. British heavy metal was ready for prime
time—a rush of simultaneous albums appeared. Sharing the spotlight was Saxon’s Wheels of Steel,
achrome-plated collection of solid, neck-breaking delights. Def Leppard, a group of teenagers from Sheffield,
debuted with On Through the Night, tempering their raw exuberance with melodic Thin Lizzy—style guitars.
Then Motörhead released Ace of Spades, the most essential of its early speed bursts, revealing the secrets
of Lemmy’s immortality with tales of sexual conquest and life on the road. Severing connections to the past,
this impressive slate of albums brought relentless heaviness with flashes of weightless euphoria— together
they formed the nucleus of the NWOBHM universe.
30

Desde o surgimento do Heavy Metal e a partir de seu crescimento e


amadurecimento, o número de bandas passou a se ampliar cada vez mais. Com isto,
houve a descoberta de inúmeros novos caminhos de como se produzir Metal, indicando
direções para as futuras bandas que ainda estariam por vir. Isto, somando influências de
alguns outros gêneros musicais contemporâneos a este, como, principalmente, o Punk
Rock e o Hardcore, faz com que se inicie, finalmente, um processo de ampliação
gigantesco de estilos, devido a mistura de elementos musicais presentes em diversas
outras bandas e estilos próximos.
Esta série de combinações complementam de forma extremamente significativa o
gênero, diversificando-o e tornando-o mais rico, formando os subgêneros em 1983 e
expandindo-os mais com o decorrer dos anos, como observado por Deena Weinstein em
Heavy Metal: The Music and its Culture: Este período de crescimento, finalmente, resulta
numa rica diversidade que se cristaliza em fragmentos e subgêneros após 1983
(WEINSTEIN, 2000, p. 21)9.
Esta fase, tendo como característica a criação definitiva dos chamados
subgêneros do metal, revela a infinidade de maneiras com que o metal pode soar. De
Sabbath veio o heavy metal, que dobrou de intensidade e tornou-se power metal, e então
transformou-se em thrash metal. A partir disso a música cruzou caminhos com outras
formas para o surgimento do black metal, criou o requinte inacreditável do death metal, e
fundiu-se com todos os tipos de músicas, encontrando-se perpetuamente renascido
(CHRISTE, 2010, p. 18)10.
O Death Metal, Black Metal, Doom Metal, Power Metal, Thrash Metal e Speed
Metal, entre outros, impactam com suas propriedades únicas e cada vez mais praticadas.
A diversificação de bandas e estilos torna-se tão ampla que, mesmo sendo o Death Metal
tão próximo ao Black Metal, estes possuem características próprias que são notadas
sonoramente, sentimentalmente e emocionalmente. O subgênero Thrash Metal,

9
Tradução livre do autor. No original: This period of growth, finally, results in a rich diversity that crystallizes
into fragments and subgenres after 1983.
10
Tradução livre do autor. No original: From Sabbath came heavy metal, which doubled in intensity and
became power metal, then twisted into thrash metal. From there the music crossed paths with other forms
to spawn black metal, create the unbelievable refinements of death metal, and fuse with every other sort of
music, finding itself perpetually reborn.
31

importante à esta pesquisa, surgiu na Califórnia em 1981-83 com a formação de grupos


como o Metallica em Los Angeles e Exodus em São Francisco (WEINSTEIN, 2000, p.
48)11 – e tem como característica principal a aceleração e aumento da agressividade do
vocal, dos riffs e solos da guitarra, simultâneos ao aumento da velocidade rítmica da
bateria e do baixo.

O termo thrash metal refere-se a uma versão de heavy metal acelerada


que é definida por ritmos tocados na mesma velocidade do hardcore punk
da metade dos anos oitenta. Apesar de alguns críticos argumentarem que
o thrash metal refere-se essencialmente à mesma música do speed metal,
alguns fãs de metal e algumas bandas são cautelosos em fazer algumas
distinções sobre os dois termos (assim como alguns outros termos
próximos como o black metal e o grindcore) (PHILIPS; COGAN, 2009, p.
234).12

É incontável o número de estilos diferentes presentes no Metal. Entretanto, estes


seguem uma estrutura, um esqueleto construído, modificado, improvisado e atualizado
constantemente desde o fim da década de 1960. Além de ser único em suas composições
líricas, as obras influenciaram e ainda influenciam culturalmente todo o mundo. Não
apenas o aspecto sonoro ganhou características únicas, mas também todo um modo de
se vestir, agir, pensar. Seus aspectos, letras musicais, estilos, estrutura, e, de modo geral,
características, crescem a ponto de o gênero alcançar as mais diversas regiões do mundo,
espalhando-se culturalmente do ocidente ao oriente.

2.1.1 INFLUÊNCIAS DO HEAVY METAL

O Heavy Metal, sendo produzido dentro de uma sociedade é, assim como qualquer
outro produto sociocultural, resultado de diversas influências musicais, sociais e culturais
da época. Tais influências são perceptíveis em diversos aspectos e características que

11
Tradução livre do autor: No original: erupted in California in 1981 – 83 with the formation of groups such
as Metallica in Los Angeles area and Exodus in San Francisco.
12
Tradução livre do autor. No original: The term thrash metal refers to a sped-up version of heavy metal that
is defined by beats played in much the same tempo as those played in the mid-eighties by hardcore punk.
Although some critics argue that thrash metal refers essentially to the same music as speed metal, some
metal fans and bands would be careful to make a distinction between the two terms (as well as other close
terms such as black metal and grindcore).
32

estão presentes em músicas, ilustração de álbuns de bandas, modos de se vestir dos


integrantes dos grupos musicais, dos fãs, e etc. Tudo teve alguma influência que,
misturando-se, adaptando-se e concretizando-se em uma nova maneira, formou o que
então é conhecido como Heavy Metal. O gênero possui uma ligação muito forte com o
Rock, Blues, Psicodélico, e remonta tempos até mais antigos, através da música clássica.
O rock, muito marcante devido seu famoso ritmo animado e elétrico, é uma importante
influência do estilo musical analisado. Geralmente com ideias e sentimentos conflitantes,
o rock tornou-se sinônimo de rebeldia, liberdade e independência.

Jimi Hendrix e os Beatles frequentemente escreviam músicas que


apontavam para uma quebra, uma ponte entre melodias que tentaram
resolver emoções e ideias conflitantes. O “metal” em heavy metal pôs uma
resiliência de aço à esta luta, uma temática de força inquebrável que
assegurou a tensão e emoção desinibida. Como estabelecido por Black
Sabbath, o heavy metal foi um complexo redemoinho de neurose e desejo
(CHRISTE, 2010, p. 23)13.

Além do Rock, o Blues aparece como fenômeno essencial para o surgimento do


esqueleto do Heavy Metal. Sem a influência de técnicas usadas por guitarristas de blues,
os mais famosos riffs e solos de guitarras de Heavy Metal sequer existiriam da maneira
como são conhecidos. O estilo de tocar Blues, somado a um tom “pesado”, juntamente
com distorção e, principalmente posteriormente, com a soma de pedais, fez surgir as
canções macabras, sinistras e eletrizantes do universo do metal. Suas notas graves e
também eletrizantes, características muito presentes no estilo, dão vida a um sentimento
que só pode ser observado através das músicas de Metal. É a partir delas que a canção
consegue alcançar o aspecto único, singular, que não é encontrado igual em nenhuma
outra forma musical. Por isso, sua forte ligação com os ritmos harmônicos do Blues é tão
fundamental para sua estrutura musical. Sem o Blues, muito do modo como é tocada a
guitarra no Metal seria diferente, podendo alterar os rumos de como o estilo fosse
conhecido.

13
Tradução livre do autor. No original: Jimi Hendrix and the Beatles often wrote songs that pointed toward a
heavy break, a bridge between melodies that tried to resolve conflicting emotions and ideas. The “metal” in
heavy metal put a steely resilience to that struggle, an unbreakable thematic strength that secured the
tension and uninhibited emotion. As ordained by Black Sabbath, heavy metal was a complex maelstrom of
neurosis and desire.
33

A forma de acordes primários nas músicas de blues e da maioria das


músicas de rock é o power chord (“acorde forte”), significando o acorde
cujo pronunciamento é composto pelo I (nota tônica) e o V (quinta nota)
com uma oitava da nota tônica adicionada frequentemente. Este power
chord é assim nomeado pelo som simples e poderoso que produz. Este
também soa particularmente bom quando tocado com distorção desde
que não há outros tons de acordes como as sextas, sétimas, e outras que
produziriam mais dissonância com um tom dirtocido. Enquanto o som dos
power chords distorcidos podem ser encontrados em diversos estilos de
músicas de rock, este som em si é possivelmente o foco sonoro do heavy
metal (PHILIPS; COGAN, 2009, p. 07)14.

O blues possui uma importância de se destacar pois sua influência afetou


profundamente tanto o estilo de se tocar a guitarra rítmica quanto a guitarra solo. O heavy
metal derivou sua estrutura musical básica, sua progressão de acordes primários, e seus
riffs de guitarra da tradição do blues-rock (WEINSTEIN, 2000, p. 16)15.
Observado por William Philips e Brian Cogan, as músicas clássicas também são
uma influência a ser destacada devido ao fato de que muitos de seus compositores eram
artistas que executavam suas músicas ao vivo e realizavam bastante a arte da
improvisação. Isto é uma característica muito presente em concertos de bandas de Heavy
Metal, em que é muito comum observar a utilização de improvisos por parte de qualquer
membro da banda. Tanto nas letras quanto nos outros instrumentos, ou sendo realizado
por um ou mais integrantes juntos ou em tempos diferentes.

Enquanto nossa experiência contemporânea de música clássica é em


grande parte de forma gravada e estudiosamente realizada com uma
cuidadosa tradição preservada, vários compositores de clássicos estavam
de fato em performances ao vivo que também incorporavam
improvisações em suas performances, uma tradição que músicos como
Malmsteen e Rhoads puderam ter feito mais para manter o legado do que
muitos compositores clássicos contemporâneos que podem se sentir mais
presos por uma performance conservadora de tradições clássicas

14
Tradução livre do autor. No original: The primary chord form in blues music and most rock is a barre or
power chord, meaning a chord whose voicing is composed of the I (the root) and the V (fifth) with an octave
of the root often added. This power chord is so named for the powerful and simple sound it produces. It also
sounds particularly good when played with amp distortion since it lacks the other chord tones such as sixths,
sevenths, and others that would produce more dissonance with a distorted tone. While the sound of distorted
power chords may be found in numerous idioms of rock music, that sound itself is perhaps the sonic focus
of heavy metal.
15
Tradução livre do autor. No original: Heavy metal derived its basic song structure, its fundamental chord
progressions, and its guitar riffs from the blues-rock tradition.
34

(PHILIPS; COGAN, 2009, p. 09)16.

Por último, mas não menos importante, outro fator a ser destacado é a presença
de elementos do chamado psicodélico, na composição das canções de Heavy Metal,
onde os grupos procuravam dar um efeito “alucinógeno” à canção, podendo estar
presente em todos os instrumentos musicais da banda.
Fato muito perceptível também em concertos, onde muitas bandas abusavam de
luzes, imagens e fantasias para criar um ambiente psicodélico. A fonte psicodélica do
heavy metal é perceptível nos primeiros trabalhos de artistas que posteriormente
adotaram convenções do gênero heavy metal. Judas Priest, uma banda que por
unanimidade resume-se como heavy metal, começou como sendo uma banda
psicodélica. [...] Lemmy Kilmister, originalmente com a banda psicodélica britânica
chamada Hawkwind, criou o Motorhead em 1976. Motorhead é uma é banda de heavy
metal de estilo rápido que ainda continua forte17 (WEINSTEIN, 2000, p. 17)18.
É claro que seria presunçoso afirmar que estas são as únicas influências presentes
no Heavy Metal. Podem existir infinitos fatores que acabaram contribuindo para a
existência deste estilo musical, como algum fator local que influenciou determinada
banda ou integrante, situação que torna difícil a total compreensão da gama de fatores
que contribuíram para a criação de tal gênero.
Entretanto, algumas características são marcantes e mais facilmente observáveis,
as quais foram ofertados nesta monografia, procurando instigar a curiosidade dos leitores
e, possivelmente, futuras pesquisas que aprofundem o tema.

16
Tradução livre do autor. No original: While our contemporary experience of classical music is largely in a
recorded form and studiously performed in a carefully preserved tradition, many classical composers were
in fact live performers who also incorporated improvisation into their performances, a tradition that musicians
like Malmsteen and Rhoads may have done more to carry on than many contemporary classical musicians
who may feel more bound by more conservative classical performance traditions.
17
A banda Motörhead acabou em 2015, devido a morte do líder da banda, Ian Fraser Kilmister (conhecido
como Lemmy Kilmister).
18
Tradução livre do autor. No original: The psychedelic source of heavy metal is discernible in the early work
of artists who later adopted the conventions of the heavy metal genre. Judas Priest, a band that is
unanimously judged to epitomize heavy metal, began as a psychedelic band. […] Lemmy Kilmister, originally
with a British psychedelic band called Hawkwind, began Motorhead in 1976. Motorhead is a fast and very
heavy metal outfit that is still going strong.
35

2.1.2 CARACTERÍSTICAS DO HEAVY METAL

Se a única característica marcante do Metal fosse apenas o conteúdo das suas


canções, seria algo incrivelmente vago. Contudo, o gênero vai além de um estilo musical,
produzindo um estilo de vida, de se vestir, de agir e pensar, como já mencionado
anteriormente. Sendo um produto musical, possui aquele que compõe a música e
aqueles que a escutam. Tendo conhecimento que a música é um produto cultural que
possui profunda interação com seus ouvintes, é observável que o gênero é mais que um
estilo musical, podendo-se tornar um estilo de vida. Como observado por William Phillips
e Brian Cogan: “Para fãs de metal, o heavy metal não é apenas um gênero musical para
se ouvir; é também um estilo de vida, que providencia um senso de pertencimento e
sentido (PHILIPS; COGAN, 2009, p. 06)19”; e, analisado por Deena Weinstein: Quando o
heavy metal é chamado de gênero musical neste estudo, o termo “musical” é usado
amplamente para incluir não apenas arranjos de som, mas outras formas estéticas e
elementos significantes que apoiam o som, como a arte visual e a expressão verbal
(WEINSTEN, 2000, p. 22)20.
Até o final da década de 1960, era raro a produção em larga escala de
amplificadores potentes, o que acabou limitando o volume de bandas de Rock. Entretanto,
a partir dos anos 70, a produção industrial de amplificadores se alastrou, tornando
possível o aumento do volume de um concerto ao vivo. Isto marca uma importante
característica do Heavy Metal, onde o volume alto é algo intrínseco ao estilo musical.
Como analisado por Ian Christie: “Quando surgiram os Beatles, seus minúsculos
amplificadores não podiam ser ouvidos perante seu público eufórico. Pelo início de 1970,
fabricantes como Marshall, Orange, e Sunn fundaram uma indústria que ampliou a
tolerância dos tubos a vácuo, criando uma vasta possibilidade acústica através do
ensurdecedor estrondo das guitarras (CHRISTE, 2010, p. 28)21”. Logo, o volume alto é

19
Tradução livre do autor. No original: To metal fans, heavy metal is not just a genre of music to listen to; it
is also akin to a way of life, one that provides a sense of belonging and meaning
20
Tradução livre do autor. No original: When heavy metal is called a musical genre in this study the term
"music" is used broadly to include not only arrangements of sound, but other aesthetic and signifying
elements that support the sound, such as visual art and verbal expression.
21
Tradução livre do autor. No original: When the Beatles launched, their tiny amplifiers could not be heard
over the screaming crowds. By the early 1970s, manufacturers like Marshall, Orange, and Sunn founded
36

fator essencial na produção de canções de Metal. O volume alto, impulsionado por um


conjunto instrumental vibrante e um vocal expressivo, passa a sensação de poder ao
ouvinte.

O elemento sonoro essencial no heavy metal é o poder, expresso em


volume absoluto. A sonoridade é feita para sobrecarregar, para varrer o
ouvinte para dentro do som, e então emprestar ao ouvinte a sensação de
poder que o som providencia. [...] Em concertos o palco é carregado com
montes de amplificadores para que o nível decibel dos instrumentos possa
ser aumentado ao limite (WEINSTEIN, 2000, p. 23)22.

O fato de possuir um som alto, juntamente a instrumentos que produzem uma


sonoridade eletrizante, faz com que as danças ou rituais presentes em concertos ao vivo
de Metal sejam diferentes do que se é relacionado quando pensa-se em danças. A dança,
no Metal, não é algo que procura demonstrar beleza ou graciosidade em seus
movimentos. Sendo a música, geralmente, composto por uma sonoridade extrema tanto
em volume quanto em velocidade, os fãs de Metal costumam dançar à música através
do que é definido como headbanging e moshing. No primeiro caso, analisado por Phillips
e Cogan: “Headbanging refere-se a balançar para frente e para trás a cabeça junto ao
tempo do ritmo da música enquanto se escuta à músicas de heavy metal (PHILIPS;
COGAN, 2009, p. 110)23”. No segundo caso, o autor explica que: A prática consiste da
junção de membros da audiência em uma larga área na pista em frente ao palco,
usualmente chamada “the pit” (em português, o ‘moshing’ seria algo como “empurra-
empurra”), balançando-se um contra o outro de maneira ritualística remanescente do
punk, apenas ocasionalmente mais violenta (PHLLIPS; COGAN, 2009, p. 167) 24 .
Entretanto, além das características extremas nas músicas de Metal, tais fatores também

an industry that pushed the tolerances of vacuum tubes, creating vast acoustic possibilities through the
deafening roar of guitars
22
Tradução livre do autor. No original: The essential sonic element in heavy metal is power, expressed as
sheer volume. Loudness is meant to overwhelm, to sweep the listener into the sound, and then to lend the
listener the sense of power that the sound provides. [...] At concerts the stage is loaded with stacks of
amplifiers so that the decibel level of the instruments can be raised to the Iimit.
23
Tradução livre do autor. No original: Headbanging refers to the rocking back and forth motion of the head
in time to the rhythm of the music when one is listening to heavy metal music.
24
Tradução livre do autor. No original: The practice consists of members of the audience coming together in
a large area on the concert floor in front of the stage, usually called “the pit,” and ritualistically bouncing off
each other in a manner reminiscent of punk slamming, only occasionally more violent.
37

ocorrem devido a outra razão presente em grande parte das músicas do gênero: sua
composição sinistra, macabra, catastrófica, conflitante, que combinados com o alto
volume, formam a única alternativa de se apreciar a música de forma dançante.
Observado por Ian Christie:

[…] a capa frontal do Black Sabbath retrata um chalé em ruínas e coberta


de mato, parcialmente obscurecendo a imagem de uma feiticeira em
verde pálido. O interior da capa do álbum contém alguns detalhes além
de um poema gótico e sombrio inscrito em um gigante crucifixo invertido:
“ainda cai a chuva, os véus da escuridão cobrem as árvores enegrecidas,
que se contorcem com alguma violência invisível, perdem as folhas
cansadas e dobram os galhos em direção a uma terra cinzenta de asas
de pássaros cortadas. Entre as gramíneas, as papoulas sangram antes
de uma morte gesticulante, e coelhos jovens, nascidos mortos em
armadilhas, ficam imóveis, como se guardassem o silêncio que cerca e
ameaça engolir todos aqueles que ouviriam…” (CHRISTE, 2010, p. 17)25.

Tais fatores obscuros e sinistros são observados tanto nas ilustrações dos álbuns,
quanto nos nomes das bandas, seus logos, suas letras, melodia, e na canção por
completo. Uma olhada aos nomes de centenas de grupos de heavy metal mostra alguma
uniformidade de significações e sensibilidade. Uma porção significativa de nomes
evocam imagens sinistras. Temas como o caos e um mal cósmico são predominantes
(WEINSTEIN, 2000, p. 33)26.
Além disso, uma característica notável do heavy metal é a presença majoritária de
fãs do sexo masculino, onde a presença feminina é consideravelmente menor. Devido à
baixa proporção de representatividade feminina, consequentemente o ambiente em
concertos e eventos de Heavy Metal acabam por se tornarem misóginos, além de
preconceitos com outras minorias, como, por exemplo, acerca da comunidade LGBT.

25
Tradução livre do autor. No original: [...] the front cover of Black Sabbath depicted a dilapidated English
cottage overgrown with barren brush, partially obscuring the image of a pale green enchantress. The interior
of the album’s gatefold sleeve contained few details beyond a grim gothic poem inscribed in a giant inverted
crucifix: “Still falls the rain, the veils of darkness shroud the blackened trees, which contorted by some
unseen violence, shed their tired leaves, and bend their boughs toward a grey earth of severed bird wings.
Among the grasses, poppies bleed before a gesticulating death, and young rabbits, born dead in traps,
stand motionless, as though guarding the silence that surrounds and threatens to engulf all those that would
listen…
26
Tradução livre do autor. No original: A glance at the names of hundreds of heavy metal groups shows
some uniformities of signification and sensibility. A significant portion of the names evoke ominous images.
Themes of mayhem and cosmic evil are prevalent.
38

Diferente de outros gêneros como o dance music, há poucos membros de minorias na


cena do metal, poucas bandas femininas, e poucos membros abertamente gays na cena.
A misoginia é certamente um problema na cena, a homofobia, especialmente na cena do
black e death metal, levou a vários assassinatos de alto perfil (PHILIPS; COGAN, 2009,
p. 07)27. Tendo em vista que, culturalmente, o ocidente baseou-se por centenas de anos
na ideia de que o homem é caracterizado por possuir mais força, expressão e grosseria,
e a mulher apresentar um perfil frágil, delicado e passivo, o gênero agregou muito mais
ao homem hétero. Apesar disto, a presença de mulheres em eventos de Heavy Metal,
mesmo que de forma minoritária, é comum, e são (salvo exceções) respeitadas caso
estejam “de acordo” com o visual e vestimentas que fãs de Metal acreditam serem
corretos para a ocasião (obviamente, uma atitude preconceituosa, como citado há pouco).
Ou seja, geralmente roupas escuras, jaquetas de couro ou jeans, camisetas com o nome
de bandas, etc.

O apelido metalhead é muitas vezes concedido a estes fãs (por eles


mesmos ou por outros) que não apenas escutam a música o máximo que
podem mas também rotulam a si mesmos como fãs de metal por usar
roupas típicas de metal como jaquetas de couro ou jeans, muitas vezes
enfeitado com remendos exibindo nomes ou insígnias de grupos de metal
(PHILLIPS; COGAN, 2009, p. 160)28.

Entretanto, roupas diferentes podem atrair atitudes misóginas, onde mulheres que
se vestem em trajes “provocativos”, como minissaia e salto alto, são denunciadas como
vagabundas esperando para fazer sexo com a banda ou são vistas tão detestavelmente
como poderiam ser observadas pelos mais machistas trabalhadores de construções
(WEINSTEIN, 2000, p. 105)29. Apesar disto, o Metal tem em sua estrutura o senso de

27
Tradução livre do autor. No original: Unlike other genres such as dance music, there are few minority
members of the metal scene, few female bands, and few openly gay members of the scene. Misogyny is
certainly a problem in the scene, and homophobia, especially in the black and death metal scenes, has led
to several high-profile murders
28
Tradução livre do autor. No original: The metalhead moniker is often bestowed on those fans (by
themselves or by others) who not only listen to the music as much as possible but also label themselves as
metal fans by wearing typical metal clothing such as denim or leather jackets, often festooned with
embroidered patches featuring the names or insignias of metal groups.
29
Tradução livre do autor. No original: women who dress in "provocative" attire, such as miniskirt and high
heels, either denounced as sluts waiting to have sex with the band or are ogled as obnoxiously as they
might be by the most chauvinistic construction workers
39

liberdade, de não deixar que outros ditem as regras, o que é facilmente relacionado à
rebeldia. Isto atraiu certo público feminino, e além de fãs, surgiram também grupos
musicais formados apenas por membros do gênero, e também aumentou a participação
de mulheres em bandas de formação majoritária masculina. Seguindo pioneiras da
escola de garotas, esses músicos enfrentaram discriminação no mercado fonográfico,
mas lutaram através de machismo constante com a ajuda da mensagem autossuficiente
do metal (CHRISTE, 2010, p. 135)30.
Concluindo, a partir das reflexões aqui propostas, o Heavy Metal é um gênero
inconfundível, possuindo diversas características únicas que o levaram a ser da maneira
que é conhecido. Sua criação data-se em plena Guerra Fria, conflito entre as duas
ideologias das superpotências dominantes da época: a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas e os Estados Unidos da América. Este conflito, assim como o Metal, possuiu
características únicas pois moldou o mundo como ele é hoje, e, portanto, possui
resquícios muito fortes nos dias contemporâneos. E, assim como o conflito gerou
inúmeras tensões globais, as quais aparentavam a destruição mútua de ambos os lados
(ou até mesmo mundial), entre outros problemas observáveis no período, tais fatores são
muito encontrados no estilo sinistro e horripilante dessas canções.

2.2 A GUERRA FRIA

A contextualização espaço-temporal desta monografia está inserida no período


conhecido como “Guerra Fria”, tendo seu marco inicial no fim da Segunda Guerra Mundial
(1945), e seu fim relacionado a ruína da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), entre o fim da década de 1980 e seu colapso político, em 1991. Uma das
principais características deste conflito é seu caráter indireto, em que duas ideologias
estavam se enfrentando através de política, diplomacia, e usando territórios que não
envolviam os seus. A Guerra Fria consistiu num longo período de paz entre as grandes
potências, pontuado por guerras e conflitos periféricos travados indiretamente (MAGNOLI,
2004, p. 142). Com o mundo polarizado entre Comunismo e Capitalismo, Democracia e

30
Tradução livre do autor. No original: Following pioneers Girlschool, these musicians faced discrimination
in the record business, but fought through frequent chauvinism with the help of metal’s self-sufficient
message.
40

Ditadura, os integrantes desta batalha procuravam propagar uma ideia pejorativa do seu
oponente, fortalecendo a influência de sua ideologia.

A Guerra Fria entre as duas superpotências do pós-guerra não foi um


episódio como as outras guerras dos tempos modernos. A expressão
“Guerra Fria” foi inventada para descrever um estado de coisas, cujo
principal ingrediente era a hostilidade e o temor mútuos entre os
protagonistas. Essas emoções estavam enraizadas em suas várias
diferenças históricas e políticas e foram incentivadas poderosamente por
mitos que de vez em quando transformavam a hostilidade em ódio.
(CALVOCORESSI, 2011, p. 19)

Contudo, para entendimento do mundo sociopolítico em questão, é necessário


voltar algumas décadas. Portanto, esta pesquisa terá início, de modo sintético e resumido,
nos anos de 1914, com o sangrento conflito da Primeira Guerra Mundial.
A Primeira Guerra Mundial foi um conflito imperialista que acabou estourando pela
política de “Estado Vital” da Alemanha, a qual acreditava que necessitava de um território
específico que envolvia grande parte da Europa e de colônias globais. Contudo, com o
avanço de outras potências imperialistas (Grã-Bretanha, França, Portugal, etc.), tais
regiões coloniais estavam cada vez mais escassas, pois grande parte delas já haviam
sido colonizadas. Logo, não havia maneira da Alemanha avançar sua política
expansionista sem travar conflitos com outras potências, o que acabou gerando um dos
eventos mais sangrentos da história.
Sintetizando, o conflito de potências se deu entre a Alemanha e Áustria-Hungria
contra a Grã-Bretanha, França e Rússia. Esta última, inclusive, possuindo um papel muito
importante nesta pesquisa já que, um ano antes do fim da guerra, em 1917, selou um
pacto de não agressão no conflito devido às crises internas. Estes problemas do então
Império Russo acabaram por gerar uma enorme insatisfação por parte da população
russa com a guerra que, neste ano, derruba o Czar Nicolau II do poder, dando fim ao
império, graças a Revolução Russa, planejada e conduzida pelos bolcheviques, os quais
chegariam ao poder e proclamariam, alguns anos depois, o surgimento da URSS.
Contudo, mesmo com a saída da URSS do conflito, a entrada dos Estados Unidos
acabaria por virar o jogo para a Tríplice Aliança (Grã-Bretanha, França e, agora, EUA).
Com todos os exércitos europeus da Frente Ocidental da Europa cansados da guerra,
41

era apenas questão de tempo para que a potência do Oeste empurrasse as defesas
alemãs de volta à sua terra natal, derrotando o Império Alemão em 1918.

Assim que os aliados começaram a avançar, no verão de 1918, o fim era


apenas uma questão de semanas. As Potências Centrais não apenas
admitiram a derrota, mas desmoronaram. A revolução varreu o Sudeste e
o Centro da Europa no outono de 1918, como varrera a Rússia em 1917.
Nenhum dos velhos governos ficou de pé entre as fronteiras da França e
o mar do Japão Mesmo os beligerantes do lado vitorioso ficaram abalados,
embora seja difícil acreditar que Grã-Bretanha e França não
sobrevivessem inclusive à derrota como entidades políticas estáveis; a
Itália não, contudo. Certamente nenhum dos países derrotados escapou
da revolução. (HOBSBAWM, 1995, p. 30)

O fim da Primeira Guerra foi marcado por dois fatores: o surgimento do


anticomunismo e o injusto Tratado de Versalhes. O Tratado de Versalhes ficou conhecido
como uma “paz punitiva” à Alemanha, considerada culpada pelo conflito e obrigada a
assinar os termos. Através deste, as potências vitoriosas da guerra viram a necessidade
de enfraquecer a nação alemã para evitar uma futura guerra que poderia devastar toda
a Europa novamente. A Alemanha não teve um tratado de paz, e sim um tratado de
punição, cujo Estado que já estava devastado devido sua derrota no conflito, viu-se
incapaz de poder crescer novamente, independente de qual governo tomasse os rumos
do país. Nisto, as potências vencedoras impuseram um valor monetário absurdo que a
Alemanha deveria pagar como indenização de guerra através dos anos, além de restringir
seu exército, tomar seu território colonial e algumas de suas regiões.

O Tratado de Versalhes representou a humilhação nacional da


Alemanha. Ela foi responsabilizada pela guerra e obrigada a pagar
indenizações financeiras e materiais. A França recebeu de volta a
Alsácia e a Lorena, e adquiriu direitos de exploração do carvão do Sarre
por quinze anos. As forças armadas alemãs foram quase dissolvidas e
a fronteira franco-germânica foi desmilitarizada sob supervisão
francesa. Consolidou-se a independência polonesa e vastos territórios
habitados por alemães foram transferidos à Polônia. Finalmente, a
Alemanha perdeu as possessões coloniais, que se tornaram mandatos
administrados pelas potências vencedoras em nome da Liga das
Nações (MAGNOLI, 2004, p. 81).
42

Já o anticomunismo é perceptível pelo envio de forças ocidentais para tentar


combater a Revolução Russa, junto de forças contrarrevolucionárias russas. Entretanto,
apesar de inesperado, os bolcheviques saíram vitoriosos, criando um clima tenso entre
as políticas externas. Contudo, apesar da vitória, o novo Estado ainda estava num total
caos econômico, social e político, totalmente desequilibrado e sem poder contar com um
aliado no exterior, já que não foi reconhecido como um Estado por nenhuma outra
potência do globo. Os mesmos viram-se isolados, com uma economia devastada por
guerras, tensões sociais enormes e uma nova ideologia que era rejeitada pela maior
potência mundial, os EUA, surgida devido a Primeira Guerra Mundial e isolando-se como
o maior mercado credor da Europa, a qual também se encontrava em um estado crítico
devido os danos causados pelo conflito.

Quanto à URSS, os Estados vencedores teriam preferido que não


existisse, e, tendo apoiado os exércitos da contrarrevolução na Guerra
Civil russa e enviado forças militares para apoiá-los, não mostravam
entusiasmo algum pelo reconhecimento dessa sobrevivência. Seus
homens de negócios chegaram mesmo a descartar as ofertas das
maiores concessões a investidores estrangeiros feitas por Lenin,
desesperado por qualquer forma de reiniciar a economia quase
destruída pela guerra, a revolução e a guerra civil. A Rússia soviética
foi obrigada a desenvolver-se no isolamento, embora para fins políticos
os dois Estados prescritos da Europa, a Rússia soviética e a Alemanha,
se juntassem no início da década de 1920. (HOBSBAWM, 1995, p. 34)

Com isto, duas regiões importantes do mundo passam a ser vistas de maneira
duvidosa para com as potências do ocidente. O antigo império russo, transformado em
União das Repúblicas Sovietes em 1922, pelos bolcheviques, e a Alemanha, que criaria
um sentimento de vingança contra os tratados impostos à sua derrota.
Após o fim da guerra, os Estados Unidos acabaram por aumentar ainda mais seu
poder político e econômico mundial. Credor das potências que sofreram diretamente com
os danos da guerra, tornou-se uma nação desigual no mundo. Como potência distante
dos conflitos, o país pôde fornecer material bélico, alimentos e matérias-primas para os
aliados europeus (MAGNOLI, 2006, p. 359). O que não era esperado foi que, com um
poder econômico enorme, a potência americana pudesse quase vir ao colapso em 1929,
e menos esperado ainda foram as suas consequências. O período foi marcado pelo fim
da ideologia do Liberalismo econômico, devido à quebra da bolsa de valores de Nova
43

Iorque. Resumidamente, o país se encontrou num excesso de produção gigantesco, o


qual levou a total desvalorização da moeda americana. Em suma: entre as guerras, a
economia mundial capitalista pareceu desmoronar. Ninguém sabia exatamente como se
poderia recuperá-la (HOBSBAWM, 1995, p. 74). E, sabendo que a potência norte-
americana era responsável por um mercado mundial, este fato foi sentido por todo o
mundo, principalmente pela Europa, a qual estava profundamente ligada aos EUA no
período pós-guerra. Devido à crise de 1929 e ao Tratado de Versalhes, viu-se na
Alemanha, contra o imaginário russo de que seria a provável próxima nação vítima de
uma revolução social, o palco do surgimento de uma das mais (se não a maior)
horripilantes ideologias contemporâneas. O surgimento de um grupo da extrema direita
radical acaba ganhando espaço, onde o Fascismo, surgido na Itália e o Nazifascismo, da
Alemanha, são os principais exemplos.

Em Versalhes encontram-se as raízes da ascensão do nazismo, em


meio à dissolução moral e desordem econômica da Alemanha de
Weimar. O nacionalismo alemão fertilizava-se sob a humilhação
imposta pelos vencedores. A geopolítica do espaço vital ressurgia
fortalecida, reclamando as terras povoadas por alemães na Polônia,
Tchecoslováquia e Ucrânia. A ascensão fulminante de Hitler, em 1933,
a destruição da frágil ordem republicana e a proclamação do Terceiro
Reich anunciavam o novo conflito (MAGNOLI, 2004, p. 81).

Além disso, foi uma época em que o anticomunismo tornou-se ainda mais forte, já
que que todas as potências capitalistas se encontravam, no mínimo, estagnadas, e a
potência comunista mostrava-se forte, com um avanço industrial significativo. O trauma
da Grande Depressão foi realçado pelo fato de que um país que rompera
clamorosamente com o capitalismo pareceu imune a ela: a União Soviética. Enquanto o
resto do mundo, ou, pelo menos, o capitalismo liberal ocidental estagnava, a URSS
entrava numa industrialização ultrarrápida e maciça sob seus novos Planos Quinquenais
(HOBSBAWM, 1995, p. 81).
A ascensão do fascismo na Europa caracterizou uma época de profundo
descontentamento com as políticas econômicas liberais e um crescente anticomunismo.
Além disso, no caso da Alemanha, o nazifascismo, devido principalmente ao sentimento
44

de vingança em relação à paz punitiva que a nação foi vítima, estabeleceu e desenvolveu
uma série de preconceitos étnicos, raciais e de gênero.
Logo, com o aparecimento fascista no poder de certas regiões da Europa, o mundo
também logo foi tomado por uma onda antifascista que denunciava o sistema político. O
maior exemplo destes foi a União Soviética, que tratou de combater os fascistas,
financiados principalmente pela Itália de Mussolini e a Alemanha de Hitler, de derrubarem
a República da Espanha, na Guerra Civil Espanhola (1936-1939). Neste período, apesar
de paradoxal, as democracias ocidentais não fizeram muitos esforços para impedir o
avanço da ideologia fascista, e o comunismo viu-se como a principal ideologia antifascista.
Entretanto, o fracasso em combater as forças fascistas acabou por gerar o Pacto
Molotov-Ribbentrop, um tratado de não-agressão com cláusulas secretas de divisão da
Polônia e dos Estados Bálticos (MAGNOLI, 2004, p. 86) entre as duas potências, sendo
uma vantagem enorme para a Alemanha quando, no mesmo ano, estoura a Segunda
Guerra Mundial, já que esta não precisaria se importar com um inimigo em sua frente
oriental, podendo focar todo seu poder bélico no ocidente. Seus principais marcos, muito
bem apontados pelo historiador Eric Hobsbawm, devem-se a:

[…] a invasão da Manchúria pelo Japão em 1931; a invasão da Etiópia


pelos italianos em 1935; a intervenção alemã e italiana na Guerra Civil
Espanhola em 1936-9; a invasão alemã da Áustria no início de 1938; o
estropiamento posterior da Tchecoslováquia pela Alemanha no mesmo
ano; a ocupação alemã do que restava da Tchecoslováquia em março de
1939 (seguida pela ocupação italiana da Albânia); e as exigências alemãs
à Polônia que levaram de fato ao início da guerra. Alternativamente,
podemos contar esses marcos miliários de um modo negativo: a não-ação
da Liga contra o Japão; a não-tomada de medidas efetivas contra a Itália
em 1935; a não reação de Grã-Bretanha e França à denúncia unilateral
alemã do Tratado de Versalhes, e notadamente à reocupação alemã da
Renânia em 1936; a recusa de Grã-Bretanha e França a intervir na Guerra
Civil Espanhola (“não-intervenção”); a não-reação destas à ocupação da
Áustria; o recuo delas diante da chantagem alemã sobre a
Tchecoslováquia (o “Acordo de Munique” de 1938); e a recusa da URSS
a continuar opondo-se a Hitler em 1939 (o pacto Hitler-Stalin de agosto
de 1939) (HOBSBAWM, 1995, p. 36).

Com isto, e com uma inovação na política de guerra alemã com o uso da chamada
“blitzkrieg” (guerra relâmpago), a potência nazista viu-se com um poderio militar superior
45

às demais potências europeias, conquistando facilmente praticamente todo o território


europeu e o norte da África, em defesa aos avanços britânicos.
Até 1942, a Alemanha viu-se extremamente superior e estagnou o conflito europeu,
momento em que o único inimigo não conquistado era a Grã-Bretanha, devido seu
poderio militar naval e aéreo. Contudo, a mesma não estava em condições de abrir
acesso terrestre na Europa Continental, tomada pelos exércitos alemães. Com isto, os
conflitos só voltam a ocorrer em duas importantes datas: a declaração de guerra dos
nazistas aos Estados Unidos, que, apesar de formalmente neutro, ajudava os países
europeus visando o enfraquecimento da ideologia fascista; e a declaração de guerra
nazista à URSS, provavelmente pelo interesse de Hitler na grande massa de mão-de-
obra escrava/servil que obteria se derrotasse a nação vermelha, além do poder industrial
soviético.
A declaração de guerra aos EUA teve seu marco devido ao conflito entre o Japão
(nação aliada dos nazistas) e os norte-americanos, principalmente devido à Batalha de
Pearl Harbor, em 1941. Contudo, o Estado Nazista viu-se realmente em sérios problemas
com a invasão da União Soviética que, apesar do rápido avanço nazista nos primeiros
meses de guerra, o exército alemão não estava preparado para uma longa guerra, ponto
negativo da guerra relâmpago. A União Soviética, por outro lado, abusou disto e,
conseguindo defender a cidade de Stalingrado, interrompeu o avanço nazista e passou
a tomar a ofensiva. Do fim de 1942 em diante, ninguém duvidou de que a Grande Aliança
contra o Eixo ia vencer. Os aliados começaram a concentrar-se no que fazer com sua
previsível vitória (HOBSBAWM, 1995, p. 40). O fim da guerra foi marcada com a total
derrota do exército nazista, e, posteriormente, com a horripilante demonstração de poder
nuclear da potência americana, a qual lançou as duas primeiras bombas nucleares contra
uma população. O choque foi enorme, e acarretou na rendição japonesa.
Com o previsto fim do conflito, as potências vencedoras já começavam a discutir
os pactos do pós-guerra através de conferências entre os líderes de cada nação. As
conferências de Yalta e Potsdam reuniram os vencedores da Segunda Guerra Mundial e
redefiniram a organização geopolítica do continente europeu. Os Três Grandes
começaram a delinear, nesses encontros, a bipartição do espaço europeu em zonas de
influência antagônicas (MAGNOLI, 2004, p. 98). Estas duas conferências tiveram como
46

função determinar os novos regimes políticos que seriam implantados nas regiões
derrotadas, e também eliminar qualquer resquício de política e propaganda nazista na
sociedade. Como esclarecido pelo historiador Demétrio Magnoli sobre Potsdam e Yalta,
respectivamente: “O centro das discussões foi a organização da administração da
Alemanha derrotada. Decidiu-se a divisão provisória da Alemanha em quatro zonas de
ocupação militar, administradas pelas potências vencedoras (Estados Unidos, Grã-
Bretanha, França e União Soviética). Os ocupantes deveriam cumprir um programa de
erradicação completa das estruturas nazistas e realizar reformas voltadas para a
democratização da sociedade alemã. As medidas concernentes ao conjunto do território
seriam tomadas em comum acordo (MAGNOLI, 2004, p. 88). Nessa reunião histórica,
reorganizaram-se fronteiras soviéticas e foram estabelecidas as bases dos novos
regimes políticos a serem implantados nos satélites nazistas e países ocupados pela
Alemanha, na Europa centro-oriental (MAGNOLI, 2004, p. 87).
Para a URSS, a guerra teve como consequência um grave desastre econômico.
Apesar de ter representado uma peça fundamental para a derrota das forças nazistas,
sendo responsável por enfraquecer o poderio bélico na frente ocidental já que, após a
Batalha de Stalingrado, Hitler viu-se obrigado a enviar grandes números de suprimentos
e tropas para o lado oriental, a posição de URSS nesses anos era de grande fraqueza.
Para o país, a guerra foi um imenso desastre econômico acompanhado de uma perda de
vidas tão penosa que sua extensão total não foi divulgada (CALVOCORESSI, 2011, p.
21). A invasão nazista em seu território acabou por destruir grande parte da eficiência de
suas indústrias, além de que o principal objetivo da industrialização soviética estava
voltado à produção bélica, produto que não mais serviria para o enriquecimento da
mesma. O efeito econômico líquido da guerra foi inteiramente negativo.

Em 1945, a agricultura do país estava em ruínas, assim como a


industrialização dos Planos Quinquenais pré-guerra. Tudo que restava,
eram uma imensa e inteiramente inadaptável indústria de armamentos,
um povo morrendo de fome e em declínio, e maciça destruição física
(HOBSBAWM, 1995, p. 45).

Nisto, a URSS via-se ameaçada pela sua rival ideológica, os Estados Unidos.
Estes, ao contrário dos soviéticos, tiveram seu poder econômico pós-guerra
47

extremamente enriquecido, pois, assim como na Primeira Guerra, além de não estarem
ligadas territorialmente à guerra, serviram de principal credor bélico para as nações
europeias que estavam diretamente ligadas ao conflito. Sua taxa de crescimento nas
duas guerras foi bastante extraordinária, sobretudo na Segunda Guerra Mundial, quando
aumentou mais ou menos 10% ao ano, mais rápido que nunca antes ou depois
(HOBSBAWM, 1995, p.45). Logo, a nação vermelha viu-se extremamente perturbada
pela sua rival ideológica, e sua melhor resposta a estes fatos seria um isolacionismo,
fazendo ligações econômicas importantes apenas com sua própria região de influência.
Do ponto de vista soviético, a vitória na guerra era a oportunidade para erguer uma
poderosa muralha geopolítica ao longo da fronteira ocidental do “império vermelho”. A
criação da esfera de influência no Leste Europeu pouco tinha que ver com a ideia da
expansão do comunismo, embora esse pretexto pudesse ser utilizado com vantagens
perante a opinião pública comunista (MAGNOLI, 2004, p. 101). Os EUA, receosos do
avanço revolucionário comunista além do centro e leste da Europa, adotaram medidas
para barrar a influência ideológica da URSS. Essas medidas são caracterizadas pela
ajuda econômica que a superpotência norte-americana daria às nações europeias, para
a reconstrução de seus domínios.

Embora Truman tivesse de aceitar ser praticamente excluído da Europa


Central e do Leste, ele garantiu, por meio da Doutrina Truman, de março
de 1947, uma base de operações nos Bálcãs e no Oriente Médio na época
em que se preparava para consolidar o anticomunismo e as posições
antirrussas na Europa Ocidental, combinando ajuda econômica e aliança
militar – concretizadas no Plano Marshall e no Tratado do Atlântico Norte.
Esses foram os primórdios da política de contenção, que visava a conter
o poder russo e mudar a sua disposição (CALVOCORESSI, 2011, p. 34)

Nesta ocasião, a Europa se viu dividida. O único país que ainda não possuía esta
clareza de divisão era a Alemanha, dividida em suas quatro partes geopolíticas que
ligavam diretamente a URSS com as potências ocidentais. Contudo, era apenas questão
de tempo. A Alemanha Ocidental, controlada pelas potências vitoriosas do ocidente, seria
de maior vantagem caso fosse reunificada e tivesse sua economia voltada ao caráter de
mercado transnacional, movimentando seu capital. Já para a URSS, sua política
econômica seria muito mais vantajosa caso fosse ligada ao império vermelho. Logo, sua
48

unificação, principalmente de Berlim cuja importância econômica era enorme, gerou o


principal conflito da época, a Crise de Berlim. A crise envolvia a reforma monetária do
país, que se destinava a viabilizar a adesão da Alemanha Ocidental ao Plano Marshall.
Mas ela funcionou como a gota d’água para o desencadeamento da crise do Bloqueio de
Berlim. O trânsito de trens e caminhões para Berlim foi interrompido em 24 de julho de
1948. Ao mesmo tempo, Moscou exigia o cancelamento da reforma monetária e da
aplicação do Plano Marshall nas zonas ocidentais. A reação ocidental constituiu uma das
maiores façanhas técnicas de sustentação logística em tempos de paz. Por meio de uma
ousada ponte aérea, americanos e britânicos conseguiram assegurar o abastecimento
de Berlim Ocidental durante 11 meses (MAGNOLI, 2004, p. 108).
Outro fator desmoralizante para a URSS era a incontestável superioridade bélica
dos EUA por causa de seu poderio nuclear. Diante de um poder devastador, a URSS viu-
se incapaz de ameaçar a política norte-americana, tanto economicamente quanto de
caráter belicoso. O melhor que Stalin poderia fazer era representar uma ameaça à Europa
Ocidental, que pudesse impedir os norte-americanos de atacar seu país
(CALVOCORESSI, 2011, p. 23). Com isto, os soviéticos poderiam ao menos se
manifestar como uma ameaça aos países aliados da ideologia norte-americana. Contudo,
os EUA logo criaram uma maneira de prevenir-se deste constrangimento e, devido a esta
tensão soviética, somado às tensões desencadeadas pela crise berlinense, adensaram
o conteúdo militar da contenção 31 , resultando na criação, em abril de 1949, da
Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN - Organisation du Traité de l'Atlantique
Nord). A Otan reuniu, aos Estados Unidos e ao Canadá, todos os Estados da Europa
Ocidental, com exceção dos países neutros de economia capitalista (MAGNOLI, 2004, p.
113). Através da OTAN, formalmente foram criadas as alianças entre os países que
compunham a liga antissoviética e anticomunista. Os soviéticos, diante disto, acabaram
por firmar oficialmente sua corrente de aliança política, o chamado Pacto de Varsóvia,
criado em 1955 pela União Soviética, que agrupou o conjunto de países-satélites da
potência vermelha.
A União Soviética, vendo o poder nuclear norte-americano, viu-se obrigada a
desenvolver seu poder bélico o mais rápido possível, ou estaria em profunda

31
Política norte-americana contra a expansão soviética.
49

desvantagem caso algum conflito direto contra os EUA viesse a surgir. A primeira bomba
atômica soviética foi testada apenas em julho de 1949, após o encerramento do Bloqueio
de Berlim (MAGNOLI, 2004, p. 114). Isso gerou pavor no lado ocidental, o qual viu-se
necessitado de ampliar ainda mais seu poder nuclear, gerando uma corrida armamentista
entre as duas superpotências.

Em 1952-1953, os Estados Unidos e a URSS explodiram suas primeiras


bombas termonucleares e de hidrogênio com espaços de nove meses
entre si. Ambos rapidamente desenvolveram os meios para lançá-las e,
em 1961, ambos enviaram um homem ao espaço – sendo que o russo
Yuri Gagarin levou seis meses de vantagem sobre o norte-americano
John Glenn. Os estoques norte-americanos sempre foram muito maiores
do que os russos, e a superioridade dos Estados Unidos foi aumentada
no início dos anos de 1960, quando mísseis Polaris e Minuteman entraram
em operação. Os temores infundados por parte dos norte-americanos de
que a URSS assumisse a liderança em termos de mísseis fizeram com
que os Estados Unidos ampliassem o que já era uma liderança em seu
favor (CALVOCORESSI, 2011, p. 46).

Logo, duas potências antagônicas viam-se agora com um poder devastador, o qual
poderia, pelo menos sob os olhos amedrontados da época, destruir uma vasta região, ou
até mesmo causar a destruição mundial. Gerações inteiras se criaram à sombra de
batalhas nucleares globais que, acreditava-se firmemente, podiam estourar a qualquer
momento, e devastar a humanidade (HOBSBAWM, 1995, p. 178). No entanto, apesar do
medo do ataque massivo causado pelo poder nuclear que ambas as superpotências
possuíam, nenhum dos dois lados realmente desejava arriscar um ataque à outra, visto
que resultaria apenas numa contraofensiva e na devastação destas, criando um equilíbrio
de terror. A situação do equilíbrio do terror não requer a paridade, mas a capacidade de
resposta devastadora ao primeiro golpe desfechado pelo inimigo (MAGNOLI, 2004, p.
115). Contudo, estas tensões políticas levaram a um debate sobre a restrição de testes
nucleares, devido a fatualidade de seus riscos que, além de extremamente destrutivos,
poderiam causar grandes problemas radioativos. Como observado pelo historiador Peter
Calvocoressi:

Entretanto, havia alguma inclinação mútua a restringir os testes nucleares.


O desenvolvimento de variedades de armas nucleares, pequenas e
grandes, evidenciou a necessidade de testes, que geraram alarme em
50

nível mundial sobre os efeitos de um conflito radioativo, principalmente


depois de testes norte-americanos no Pacífico em 1954, que mataram
alguns pescadores japoneses, envenenaram grandes quantidades de
peixes e infectaram uma área de 18.000 km2 (CALVOCORESSI, 2011, p.
48).

Isto, somado a conflitos que já estavam acontecendo indiretamente entre as duas


potências, como a Guerra da Coréia (1950-1953), acabavam por preocupar o mundo
acerca da questão nuclear. Além de que, na maioria destes conflitos, as potências
usavam de seu poder nuclear para pressionar politicamente as regiões que se
encontravam em conflito com elas, claramente por estarem em um nível de superioridade
bélica incomparável. Não haveria como um país de menor importância política conseguir
se opor a uma potência econômica e bélica, que poderia utilizar seu poder de guerra para
liquidar qualquer nação que pudesse, pelo menos, tentar construir algum resquício de
ameaça a esta. Entretanto, se realmente possuíam a intenção de fazer um ataque nuclear,
é difícil de dizer. Os danos causados pela explosão de uma destas bombas já eram
conhecidos, e as potências sabiam que não seria vantagem alguma que estas fossem
realmente utilizadas para travar um conflito físico. Como analisado pelo historiador Eric
Hobsbawm:

Não está muito claro se chegaram a considerar seriamente a possibilidade


de uma ação nuclear contra terceiros — os EUA na Coréia em 1951, e
para salvar os franceses no Vietnã em 1954; a URSS contra a China em
1969 —, mas de todo modo as armas não foram usadas. Contudo, ambos
usaram a ameaça nuclear, quase com certeza sem intenção de cumpri-la,
em algumas ocasiões: os EUA para acelerar as negociações de paz na
Coréia e nó Vietnã (1953, 1954), a URSS para forçar a Grã-Bretanha e a
França a retirar-se de Suez em 1956. Infelizmente, a própria certeza de
que nenhuma das superpotências iria de fato querer apertar o botão
nuclear tentava os dois lados a usar gestos nucleares para fins de
negociação, ou (nos EUA) para fins de política interna, confiantes em que
o outro tampouco queria a guerra. Essa confiança revelou-se justificada,
mas ao custo de abalar os nervos de várias gerações. A crise dos mísseis
cubanos de 1962, um exercício de força desse tipo inteiramente supérfluo,
por alguns dias deixou o mundo à beira de uma guerra desnecessária, e
na verdade o susto trouxe à razão por algum tempo até mesmo os mais
altos formuladores de decisões (HOBSBAWM, 1995, p. 181).

Além disso, outro conflito trouxe a ameaça de um conflito nuclear, a separação


física entre a Alemanha Oriental e Ocidental. O episódio, caracterizado como o símbolo
51

da Guerra Fria, é composto pela divisão entre os dois lados, mostrando assim o drama
real da “cortina de ferro”, a qual Churchill já havia feito declarações anteriormente, mas
relacionando-se à zona de países satélites que faziam fronteira entre a Europa ocidental
e oriental. A separação física gerou o símbolo mais dramático da Guerra Fria, o Muro de
Berlim, e da divisão da Europa em blocos geopolíticos antagônicos. A “Cortina de Ferro”
ganhava uma representação material extraordinariamente adequada, que dirigia os
holofotes para a bipartição da antiga potência da Europa central (MAGNOLI, 2004, p.
118). Todos estes acontecimentos acabaram por gerar uma enorme preocupação acerca
do real uso destas armas. Não seria vantajoso para nenhum dos lados a real utilização
de uma bomba nuclear, já que provocaria apenas destruição em massa de qualquer um
dos lados, direta ou indiretamente. Com isso, a diplomacia mundial fez uma série de
encontros visando o controle destes equipamentos, sugerindo propostas como parar sua
produção para evitar catástrofes. Além disso, a corrida armamentista das superpotências
foi uma catástrofe econômica sustentada pela psicologia da Guerra Fria
(CALVOCORESSI, 2011, p. 65). Logo, os dois países viram a necessidade de tratados
que viessem a controlar o poderio nuclear uma da outra. Durante vários anos foram feitos
acordos, os quais visavam sempre a vantagem de uma potência sobre a outra, e, ainda
mais, sobre outras nações de menor influência política mundial, para que estas não
pudessem chegar a um nível diplomático de respeito (ou temor) na geopolítica mundial.

Os anos 60 e 70 na verdade testemunharam algumas medidas


significativas para controlar e limitar as armas nucleares: tratados de
proibição de testes, tentativas de deter a proliferação nuclear (aceitas
pelos que já tinham armas nucleares ou jamais esperaram tê-las, mas não
pelos que estavam construindo seus próprios arsenais nucleares, como a
China, a França e Israel), um Tratado de Limitação de Armas Estratégicas
(SALT) entre os EUA e a URSS, e mesmo alguns acordos sobre os
Mísseis Antibalísticos (ABMs) de cada lado (HOBSBAWM, 1995, p. 191).

Estes tratados vieram a amenizar o perigo e ofensiva soviética perante conflitos


ao redor do globo. A política de distensão norte-americana, que visava justamente
distensionar esta guerra política entre as duas potências, ganhou grande força devido a
estes pactos. Esta política exprimiu-se em várias frentes, mas, antes de tudo, na esfera
dos tratados de limitação de armamentos nucleares. Durante a década de 1970, a partir
52

da administração Nixon, ergueram-se os pilares do edifício de tratados que regularam o


equilíbrio do terror (MAGNOLI, 2004, p. 126).
Apesar de os tratados terem diminuído a tensão nuclear, os conflitos nas regiões
do então chamado “Terceiro Mundo” (regiões as quais viam-se sob influência direta das
duas potências) vieram trazer outras grandes alterações no quesito de influência política,
principalmente pelo lado norte-americano, que se encontrava engajado em diversos
conflitos de interesse próprio, e cada vez mais isolado e com novas tensões sociais. Um
dos exemplos mais visíveis disto é a Guerra do Vietnã, observado por Hobsbawm:

A Guerra do Vietnã desmoralizou e dividiu a nação, em meio a cenas


televisadas de motins e manifestações contra a guerra; destruiu um
presidente americano; levou a uma derrota e retirada universalmente
previstas após dez anos (1965-75); e, o que interessa mais, demonstrou
o isolamento dos EUA. Pois nenhum de seus aliados europeus mandou
sequer contingentes nominais de tropas para lutar junto às suas forças
(HOBSBAWM, 1995, p. 192)

Este conflito passa então a desmoralizar a até então tão disparada potência norte-
americana. Tendo reflexos diretos em sua economia e em sua população, a qual sofria
com a perda de diversos de familiares em uma guerra sangrenta, e que, a cada ano,
evidenciava a impossibilidade de vencer a guerra nas condições geopolíticas existentes
que restringiam a ação das forças terrestres americanas e sul-vietnamitas ao território do
Vietnã do Sul. As perdas humanas crescentes erodiam o apoio popular à guerra nas
selvas distantes da Indochina, impulsionando o movimento pacifista nos Estados Unidos
(MAGNOLI, 2004, p. 121). Um fato curioso é que este movimento tomou tamanhos
expressivos na população norte-americana, e geraram a intensificação da promoção de
produtos musicais que traduziam o sentimento de tensão provocado, principalmente, nos
jovens, durante este período. Os acontecimentos políticos mais dramáticos sobretudo
nas décadas de 1970 e 1980, foram as mobilizações da etária que em países menos
politizados, fazia a fortuna da indústria fonográfica, que tinha de 70% a 80% de sua
produção — sobretudo de rock — vendida quase inteiramente a clientes entre as idades
de catorze e 25 anos (HOBSBAWM apud HOBSBAWM, 1995, p. 253)
A longa duração do conflito e a derrota das tropas norte-americanas acabou por
enfraquecer os EUA, politicamente, socialmente e economicamente. Tendo em suas
53

mãos um poderio bélico que poderia gerar uma destruição em massa, não pode enfrentar
com êxito os adversários vietcongues, que dispunham de um poder militar industrial muito
mais fraco que o americano, apesar de possuírem suporte soviético no conflito. Tal fato
é observado na baixa do crescimento industrial americano e no enfraquecimento
econômico desta, como observado por Calvocoressi:

Nos anos de 1970, o crescimento industrial dos Estados Unidos ficou


atrás do japonês, do alemão e do francês, e mesmo do italiano, com os
grandes aumentos no preço do petróleo em 1973 e 1979 – coincidindo
com a conversão dos Estados Unidos em importador de petróleo em cifras
líquidas e chocando com o hábito de ter energia barata – aumentando o
desgaste do dólar e o colapso do sistema (CALVOCORESSI, 2011, p. 73).

Diplomaticamente, é facilmente observável o enfraquecimento da política dos EUA


a partir da guerra do Yom Kipur, entre Israel e forças do Egito e Síria. Respectivamente
apoiados pelas superpotências EUA e URSS, levou a uma tensão cuja nação israelense
encontrava-se necessitando urgentemente de armamento norte-americano. Entretanto,
quando Israel, duramente pressionado, com poucos aviões e munição, apelou aos EUA
para mandarem suprimentos depressa, os aliados europeus, com a única exceção do
último bastião do fascismo pré-guerra, Portugal, se recusaram até mesmo a permitir o
uso das bases aéreas americanas em seu território para esse fim (HOBSBAWM, 1995,
p. 192). Estes conflitos gerariam um grande enfraquecimento da força norte-americana,
que acabou gerando alguns fatos importantes. Um deles é o relaxamento entre a
Alemanha Ocidental e Oriental, que através da Ostpolitik alemã passou a promover um
maior diálogo entre as duas. Em consequência, os Estados alemães trocaram
embaixadores e ingressaram na ONU. Com isso, puderam ser relaxadas as restrições
para contatos entre cidadãos das duas Alemanhas. Ao mesmo tempo, cidadãos da RDA,
em certos casos, foram autorizados a visitar Berlim Ocidental (MAGNOLI, 2004, p. 163).
E, como também observado pelo historiador Demétrio Magnoli, o diálogo com a RDA, no
fundo, introduzia elementos de desestabilização do regime comunista e revelava, prática
e publicamente, a força econômica e a coesão social da RFA. De certa forma, a Ostpolitik
lançou as sementes da revolta popular que, quase duas décadas depois, conduziu à
queda do Muro de Berlim (MAGNOLI, 2004, p. 163). Contudo, a URSS ainda não se via
54

párea para a economia capitalista dos EUA, gerando então um enfraquecimento


diplomático entre ambas as partes.
Apesar da política de distensão dos EUA e dos tratados que visavam o controle do
poderio nuclear, a utilização deste não foi usada apenas para interesses econômicos e
territoriais, mas ideológicos. Na política norte-americana, começou a ser fortemente
usada para gerar medo à população, por parte de políticos que desejavam se eleger.
Logo, muito da ideia da ameaça nuclear por parte da União Soviética era nada mais que
publicidade política, como observado por Hobsbawm: “Os febris roteiros de ataque
nuclear que vinham da publicidade governamental e dos mobilizados adeptos da Guerra
Fria ocidentais, no início da década de 1980, eram gerados por eles mesmos
(HOBSBAWM, 1995, p. 194)”. Entretanto, a realidade era que a URSS estava à beira do
colapso. Com a ascensão de Mikhail Gorbachev ao poder do império vermelho, este já
se encontrava enfraquecido e mal podia se manter como uma potência mundial.

Nessa época, a URSS não tinha mais qualquer aspecto que a colocasse
à altura dos Estados Unidos. Seu império na Europa Central e Oriental
era insustentável, e a própria União estava ameaçada de desintegração
em todos os lados de seu núcleo eslavo. Ela não estava sem recursos
materiais, mas, mal-administrados e subequipados (com exceção de
algumas indústrias pesadas), eles não eram suficientes para alimentar o
povo nem para proporcionar um padrão de vida, satisfatório tampouco
para transformar a URSS em uma potência mundial (CALVOCORESSI,
2011, p. 79).

Gorbachev, diante de uma profunda crise que ameaçava seriamente a política e a


economia soviética, viu-se obrigado a promover reformas pois, além disto, a URSS sofreu
com a tensão promovida pelo desastre nuclear de Chernobyl, onde a explosão de um
dos reatores e o consequente incêndio causou danos que marcariam a região por
décadas. O Estado soviético procurou abafar o caso, contudo a população passou a
protestar e pressionar o governo para que algo fosse feito. A União Soviética que já se
encontrava em profunda crise, acaba por passar por mais um episódio social
traumatizante, afetando ainda mais sua já fragilizada política, e não conseguindo mais
manter a censura perante o mundo e a sua própria sociedade.
55

Diante de uma crise internacional que só se acentuou como resultado de


um típico silêncio soviético nos primeiros dias do acidente e dos protestos
irados da Suécia, o regime de Gorbachev adotou a política de liberar
informações ao público em etapas. Pode-se supor que, em algum
momento imediatamente após a liderança soviética receber a notícia do
acidente, tomou duas decisões: primeiro, reter alguns detalhes sobre o
acidente, a fim de diminuir o impacto de um acontecimento extraordinário
evento; segundo, montar uma intensa campanha de propaganda
ilustrando acidentes nucleares análogos e supostamente mais frequentes
que ocorriam no Ocidente, evidentemente para colocar Chernobyl “em
perspectiva” e evitar qualquer tipo de pânico entre os cidadãos soviéticos,
que estariam cientes de alguns detalhes mais cedo ou mais tarde de
transmissões de rádio estrangeiras32 (MARPLES, 1986, p. 03).

O governo soviético encontrava-se necessitando urgentemente de reformas


políticas. Estas vieram com o planejamento da chamada glasnost e da perestroika. Essa,
observada por Hobsbawm, significava a introdução, ou reintrodução, de um Estado
constitucional e democrático baseado no império da lei e no gozo de liberdades civis
como comumente entendidos. Isso implicava a separação de partido e Estado, e (ao
contrário de todo acontecimento desde a ascensão de Stalin) a mudança do lócus de
governo efetivo de partido para Estado. Isso, por sua vez, implicaria o fim do sistema
unipartidário e do “papel condutor” do partido. Também, obviamente, significaria
revivescência dos sovietes em todos os níveis, em forma de assembleias eleitas
genuinamente representativas, que culminariam num Soviete Supremo, uma assembleia
legislativa genuinamente soberana, que concederia poder a um Executivo forte, mas
seria capaz de controlá-lo (HOBSBAWM, 1995, p. 369). Já a perestroika veio com a
intenção de recuperar a economia soviética, introduzindo elementos de mercado à esta.
Entretanto, a mudança econômica não sairia como o planejado, trazendo uma
instabilidade cada vez maior ao gigante vermelho.

32
Tradução livre do autor. No original: Faced with an international crisis that only became accentuated as a
result of a typical Soviet silence in the first days of the accident and Sweden’s angry protests, the Gorbachev
regime adopted the policy of releasing information to the public in stages. One can surmise that at some
point immediately after the Soviet leadership received news of the accident, it made two decisions: first, to
hold back some of the details about the accident, in order to lessen the impact of an extraordinary event;
second, to mount an intensive propaganda campaign illustrating analogous and allegedly more frequent
nuclear accidents that had occurred in the West, evidently to place Chernobyl “in perspective” and to prevent
any sort of panic among Soviet citizens, who would be aware of some details sooner or later from foreign
radio broadcasts.
56

A Perestroika, contudo, era um conceito mais ambíguo porque significava


mudanças sem especificar o ritmo em que elas aconteceriam nem definir
o novo sistema pelo qual o antigo seria substituído Entre os primeiros
passos, estavam uma maior independência para cooperativas e para os
administradores de empresas estatais, e a introdução de regulamentação
por forças de mercado em alguma medida. Mesmo que houvesse o
consenso de que um sistema era certo e outro era errado (o que não
havia), ainda haveria dificuldades para se passar de um para outro
(CALVOCORESSI, 2011, p. 80).

Com isto, o enfraquecimento político e econômico da URSS era evidente. Não


mais poderia suportar sua influência global, e seu sistema foi se mostrando cada vez
mais insustentável. Com isso, a Guerra Fria chega ao fim quando as potências, abaladas
por crises econômicas, assinam dois tratados que visam, oficialmente, destruir seus
armamentos nucleares (ou grande parte dele). Para fins práticos, a Guerra Fria terminou
nas duas conferências de cúpula de Reykjavik (1986) e Washington (1987) (HOBSBAWM,
1995, p. 37).
A Guerra Fria representou um conflito entre duas superpotências capazes de
destruir de forma extremamente massiva uma a outra, ou alguma região. Tudo isto gerou
uma tensão social, política e econômica de maneira global. Contudo, as consequências
do conflito foi o claro enfraquecimento de ambas as partes, principalmente por parte da
URSS, cuja permanência política se extinguiu alguns anos após o fim do conflito. O
colapso da gigante vermelha é muito bem observado pelo historiador Peter Calvocoressi,
em seu livro intitulado Política Mundial a Partir de 1945:

As dificuldades eram imensas: falta de moeda estrangeira, déficit


orçamentário de um terço do PIB, quase todos os setores da economia
perdendo dinheiro, a eterna presença opressiva dos monopólios estatais
ainda em vigor, pouca ajuda estrangeira, muitos, mas maus, assessores
estrangeiros. Depois da derrota, em março de 1991, de suas propostas
para uma nova URSS de repúblicas soberanas, através do voto popular
em seis delas (as três repúblicas bálticas, a Moldávia, a Geórgia e a
Armênia), divulgou-se uma nova Constituição soviética com poderes
restritos para o governo central, que foi recebida com um golpe contra
Gorbachev por parte dos militares, da KGB e reacionários civis, quando
ele estava afastado, na Crimeia. O golpe se desarticulou em três semanas.
Os conspiradores eram incompetentes, mas tinham um objetivo. Eles
haviam perdido a fé em Gorbachev, a quem responsabilizavam por
permitir que a URSS se desintegrasse ao reagir de forma frágil às
perturbações no Cáucaso e nas repúblicas na Ásia e no báltico, e por
permitir que a Rússia e outras repúblicas centrais roubassem poder
57

demais da União. Seu objetivo era usurpar a autoridade de Gorbachev ou


forçá-lo a lhes obedecer. Eles aceleraram sua queda, mas também a
ascensão de Yeltsin e da Rússia e, portanto, a descentralização que
deploravam. Antes que terminasse o ano, Gorbachev foi eliminado,
renunciando à presidência da URSS, que (foi criada em 1922, cinco anos
depois da Revolução Bolchevique), deixou de existir (CALVOCORESSI,
2011, p. 87).

Os Estados Unidos, mesmo saindo da guerra como vencedores ideológicos, não


estavam em uma posição econômica muito brilhante. As duas superpotências
estenderam e distorceram demais suas economias com uma corrida armamentista
maciça e muito dispendiosa (HOBSBAWM, 1995, p. 196). Apesar de o império soviético
ter sido dissolvido praticamente por sua própria culpa, mostrando-se insustentável devido
a falta de capital que pudesse manter sua economia ativa e diversos outros fatores que
alargaram uma crise econômica, política e social, o grande triunfo norte-americano (e,
consequentemente, capitalista) estava na dispersão da sua nação rival, o que
representava um teórico prevalecimento do capitalismo, da democracia e da “liberdade”,
bandeiras erguidas que serviam como contraponto à ideologia soviética.

Por um lado, o fim da Guerra Fria foi uma vitória do capitalismo sobre o
comunismo, deixando o primeiro sem rival, mas o capitalismo estava
triunfante sem estar em boa saúde, e a destreza dos Estados Unidos em
um sistema capitalista era ambígua. Durante o período pós-guerra, houve
uma falha ou armadilha oculta na posição norte-americana. Uma recusa
firme a voltar ao isolacionismo e a combater o comunismo em escala
mundial tinha acarretado operações e gastos no estrangeiro em escala
não prevista, que só poderiam ser financiados por meio de uma expansão
proporcional das receitas estrangeiras: daí a insistência dos Estados
Unidos no desmantelamento da proteção imperialista e no livre comércio,
geralmente nos melhores termos que o dólar pudesse conduzir
(CALVOCORESSI, 2011, p. 76).

Outro fator importante da Guerra Fria foi o fim da antiga política imperialista que
sobreviveu devido às antigas potências europeias. O surgimento de uma nova ordem
política mundial, pós Segunda Guerra Mundial, enfraqueceu os laços do colonialismo,
gerando movimentos nacionalistas em diversas regiões do Terceiro Mundo e modificando
ainda mais o sistema político mundial. A Guerra Fria funcionou como moldura para o
processo de descolonização, que dissolveu os impérios coloniais erguidos entre os
séculos XVI e XIX. Esses impérios refletiam o poder e a influência de antigas potências
58

mercantis (Holanda, Espanha e Portugal) ou, principalmente, das potências industriais


do século XIX (Grã-Bretanha, França, Alemanha, Itália e Bélgica). O deslocamento dos
eixos mundiais de poder, no pós-guerra, destruiu os pilares de sustentação do
colonialismo. (MAGNOLI, 2004, p. 155).
Por fim, fica claro que a Guerra Fria gerou uma profunda tensão psicológica social,
observada no mundo ocidental através da sua presença cultural. As artes do período,
como músicas de Heavy Metal, não deixaram de evidenciar uma mentalidade catastrófica
que se formava na psique dos indivíduos que vivenciaram o conflito, e como este período
representou-se no imaginário de toda uma geração de pessoas que vivenciaram estas
tensões. Suas raízes foram firmadas em forma musical e, portanto, podem ser analisadas
historiograficamente no próximo capítulo.
59

3 O HEAVY METAL E A GUERRA FRIA

O presente capítulo inicia a análise das fontes selecionadas para esta monografia.
No quesito organização, as músicas serão destrinchadas uma a uma e estudadas de
modo mais completo possível, ou seja: a letra da música; seu ritmo; refrão; sua harmonia
instrumental e quais sentimentos ou sensações transmitem ao ouvinte. Muitas das
características presentes nas músicas serão comuns entre elas, justificando, então, que
partam de uma sintaxe geral presente no estilo musical.

3.1 BLACK SABBATH E O FUNERAL ELÉTRICO

A primeira canção a ser estudada é intitulada Electric Funeral. Foi produzida pela
banda Black Sabbath e lançada em 1970 no segundo álbum do grupo, intitulado Paranoid,
através da gravadora Vertigo Records. No nome da música é possível perceber uma
representação de uma das principais características da Guerra Fria: a bomba nuclear.
Electric Funeral, traduzido para o português seria algo como “Funeral Elétrico”, onde o
“elétrico” faz referência às bombas e toda a tecnologia bélica nuclear desenvolvida na
época.
A música é iniciada com o som extremamente distorcido da guitarra, gerando um
clima sinistro, perturbador, e seguido de forma lenta e rítmica pela bateria e baixo, que
trazem peso à melodia. Logo após isto, o vocalista, Ozzy Osbourne (1948 - hoje), começa
a cantar os primeiros versos da letra musical:

Reflexo no céu
Lhe avisa que você vai morrer
Vem a tempestade, é melhor você se esconder
Da onda atômica
Clarões no céu
Transformam casas em pocilgas
Transformam pessoas em barro
Mentes radioativas decaem
60

Com a entrada do vocalista na canção, sua voz junta-se ritmicamente aos outros
instrumentos musicais, mudando forma, porém mantendo seu tempo, acompanha o clima
sombrio e estranho introduzido logo aos primeiros segundos da música. Nascidos e
contemporâneos ao conflito bipolar, misturam de forma artística o imaginário social da
época com a melodia, representando-o através do estresse que o medo de um conflito
nuclear que parece aproximar. O primeiro verso da canção faz claramente uma referência
ao estouro de uma bomba, narrado em discurso de primeira pessoa, onde o indivíduo
conta o intenso brilho de imensa explosão causada pela bomba jogada a centenas de
metros acima da superfície terrestre. O segundo e terceiro verso mostram o nível
amedrontador que a canção quer impor ao ouvinte: um ambiente de vida ou morte. A
partir da quarta estrofe é que a referência clara a uma bomba nuclear é apresentada,
mostrando qual a razão de todo o clima gerado pela canção. Os versos a seguir procuram
mostrar a efetividade do poder destrutivo da bomba nuclear, a qual consegue eliminar
completamente tanto edifícios quanto indivíduos e possui um risco imenso à todo o
mundo se usada de forma muito intensa. O último verso também faz uma referência à
bomba, devido a seu alto poder radioativo e seus riscos irreparáveis, como já foi proposto
nos capítulos anteriores. Durante toda a estrofe permanece um ritmo sombrio de todos
os instrumentos musicais utilizados (guitarra, bateria, baixo e vocal), sem que nenhum
esteja se sobrepondo ao outro.
Com o fim desta primeira parte volta-se ao primeiro ritmo apresentado na música.
Contudo, com uma maior intensidade, mais agressiva, intensificando o clima tenso e
ligando a primeira estrofe com a segunda. A guitarra aparenta estar com o volume mais
alto, assim como a bateria, fazendo com que o ouvinte se sinta cada vez mais preso ao
ambiente sonoramente destrutivo e sinistro. Após isto, o vocalista torna à canção,
voltando o mesmo ritmo harmônico e melódico entre os quatro instrumentos, observado
na primeira estrofe:

Mentes robóticas de robôs escravos


Leva-os à sepultura atômica
Flores de plástico, sol de derreter
A lua desvanecida cai sobre
Um mundo morrendo pela radiação
Vítimas da frustração do homem
Globo ardente de fogo obsceno
61

Como uma pira elétrica funerária

Neste trecho é possível perceber uma crítica à guerra, demonstrando um discurso


anti-guerra do contexto estudado. Mostra uma indignação à produção de armamentos
tão destrutivos à sociedade, procurando mostrar as horripilantes consequências que o
uso intenso de material bélico nuclear geraria. O movimento pacifista tornou-se
extremamente forte nos EUA devido aos danos sociais causados pela Guerra do Vietnã.
Milhões foram às ruas protestar contra a continuação da guerra que durou mais de uma
década. Os versos presentes neste trecho são de característica extremamente abstrata
e poética, mas que demonstram fortemente uma crítica aos avanços nucleares
promovidos pelo conflito da Guerra Fria. Além disso, fica claramente perceptível, tanto no
som como na letra, um medo profundo da destruição global causada pelo estouro destas
bombas e pela alta concentração radioativa que geraria. Tanto os instrumentos musicais
quanto o vocal continuam a manter uma harmonia, como foi apresentada na primeira
parte.
Com o fim desta estrofe, a mesma coisa acontece como no fim da primeira estrofe:
volta o ritmo do começo da música, mas com presença forte da guitarra, da bateria, e do
baixo, intensificando o som e o ambiente sinistro. Entretanto, o som da guitarra começa
a desvanecer e a bateria começa a aumentar o ritmo da música, proporcionando maior
agitação à música. Logo após isto, a guitarra e o baixo tornam à música com alguns
pequenos toques, que vão se tornando cada vez mais presentes, dando um clima
frenético e servindo de introdução a uma outra face da música, demonstrando um clima
caótico. Nisto, os três instrumentos mudam novamente seu estilo, tornando-se ainda mais
agitados que antes. Logo após esta mudança no ritmo e som da guitarra, o baixo e a
bateria se unem a este ritmo e, criando um novo, sustentam a próxima estrofe:

Edifícios ruindo
No chão rachado da terra
Rios viram lama
Olhos derretem em sangue

A Terra deita em leito de morte


Nuvens choram pelos mortos
Lágrimas em forma de chuva
Amenizam a dor queimante
62

Funeral Elétrico
Funeral Elétrico
Funeral Elétrico
Funeral Elétrico

Este trecho representa o imaginário sociocultural presente na Guerra Fria. A


tensão provocada devido a antagonização das duas superpotências mundiais EUA e
URSS, principalmente devido a especificidades do conflito: O medo do “avanço
comunista”, utilizado de forma política principalmente nos EUA de forma partidária, para
obtenção de votos; A divisão da Alemanha e o Muro de Berlim; A clara bipartição do
mundo, com o isolamento econômico da potência oriental e seus países satélites e a
realização do Plano Marshall e Doutrina Truman, além da criação da OTAN e do Pacto
de Varsóvia; Crise dos mísseis em Cuba; Conflitos em geral, como a Guerra da Coreia,
Guerra do Vietnã, Guerra do Afeganistão, etc. Tudo isto gerou um contexto de “Bem
contra o Mal” antagonizando ideologias, pelo menos no mundo ocidental e, mais
especificamente, nos Estados Unidos. A criação de um inimigo global, cujo objetivo era
especialmente a guerra e dominação mundial, que possuía um imenso arsenal nuclear
capaz de subjugar toda a humanidade. Isto, possivelmente, contribuiu para uma versão
apocalíptica que é apresentada na composição desta estrofe, em que cada palavra é
citada com o acompanhamento de um ritmo intenso proporcionado pela guitarra, baixo e
bateria. Qualquer conflito ou antagonização diplomática, política ou econômica, poderia
causar uma guerra nuclear que deixaria cicatrizes profundas no mundo, ou podendo
provocar o fim de como o conhecemos. Afinal, os últimos versos compostos pela frase
“Funeral Elétrico” representam o que seria o clímax do conflito em questão: o apocalipse
nuclear que provocaria ao mundo esse ambiente tenso, sinistro e caótico presente na
música.
Com o fim da estrofe, apenas os instrumentos continuam em sua forma agitada de
antes, mas que vai diminuindo e torna-se novamente ao ritmo do começo da canção,
voltando àquele ambiente macabro, sinistro, e não frenético e caótico, trazendo consigo
a última estrofe:

E então, no céu
Brilha o olho elétrico
Rei sobrenatural
63

Põe a terra sob suas asas


Do céu, o coro dourado canta
Anjos do inferno batem suas asas
Almas do mal caem no inferno
Presas para sempre em celas de fogo

Novamente, como na primeira e segunda estrofe, o vocalista torna a canção


mantendo o ritmo com a guitarra, baixo, e bateria, num clima tenso e macabro. A estrofe
em questão possui tanto características provocadas pela Guerra Fria quanto aspectos
religiosos. Os primeiros quatro versos podem representar tanto o apocalipse nuclear,
onde a imagem do “cogumelo” da bomba nuclear (“E então, no céu / Brilha o olho
elétrico”), quanto realmente a um “ser superior” que subjugaria toda a imensidão de almas
vítimas da explosão. O mais provável é que seja as duas representações, paralelamente,
onde, de certa forma, a bomba nuclear fosse o próprio “rei sobrenatural que põe a terra
sob suas asas”. E, com isto, os últimos versos contam, a partir de um discurso religioso
e apocalíptico, como seria o juízo final. Com o fim dos versos líricos, a música volta ao
seu principal ritmo - o do começo -, que serve de ponte a várias partes da música. Por
fim, segue um ritmo menos intenso, mais tranquilo, mas não menos perturbador, que vai
diminuindo até sumir.

3.2 BLACK SABBATH - CRIANÇAS DA SEPULTURA

A próxima música alvo de análise desta pesquisa também foi produzida pela banda
britânica Black Sabbath. Children of the Grave, música que integra o terceiro álbum do
grupo (Master of Reality), foi lançada em julho de 1971 e gravado pela Record Plants em
Los Angeles - EUA. O título da música significa “Crianças da Sepultura”.
A canção inicia com a participação de um ritmo tocado pelo baixo e pela bateria.
Um som grave cujo ritmo permanece dominante durante os primeiros catorze segundos,
precedendo a introdução do som distorcido e pesado da guitarra que se junta
ritmicamente aos dois instrumentos musicais, cujo som se transforma num diálogo entre
os três instrumentos, provocando um clima de tensão, confusão e apreensão. Finalmente,
os três instrumentos unem-se num mesmo ritmo, onde o vocalista começa a narrativa de
uma história em discurso de primeira pessoa:
64

Revolução em suas mentes


As crianças começam a marchar
Contra o mundo que têm de viver
E todo ódio que está em seus corações
Elas estão cansadas de serem empurradas
E apenas ouvir e obedecer
Elas enfrentarão o mundo até que vençam
E o amor venha fluir
Yeah!

Esta primeira estrofe apresenta uma crítica à guerra, e tendo em mente que foi
gravada e lançada durante o período da Guerra do Vietnã, representando o discurso anti-
guerra e os movimentos pacifistas que ficaram populares nos Estados Unidos na década
de 1960. O movimento teve grande impacto e foi engrandecido pela cultura hippie, que
reflete um crescimento na desaprovação social em relação ao conflito e demonstrava um
profundo sentimento de oposição ao mesmo. Inovando pautas sociais e representando
uma nova esquerda política, defendiam pautas ambientais, anti-guerra, e de indistinção
de minorias na sociedade, entre outras. O segundo verso faz uma analogia entre o
marchar dos soldados com os atos de protestos que ocorreram, que foram capazes de
reunir uma grande camada populacional e enfraquecer pautas políticas que promoviam
o belicismo e, posteriormente, atingindo um forte descontentamento com o conflito,
contribuiu para a retirada das tropas norte-americanas do território vietnamita. O
movimento reunificava tudo aquilo que representava guerra e conflito sob a bandeira do
amor, procurando promover um sentimento de uma sociedade mais justa, igualitária,
empática, pensamento que apresentou uma grande oposição às políticas imperialistas
norte-americanas do recorte político e cultural pesquisado.
Pouco tempo após o vocalista entrar em um hiato, os demais instrumentos
retornam àquele ritmo confuso onde a bateria vem de todos os lados, acompanhando o
diálogo entre a guitarra e o baixo, promovendo um clima tenso e pesado para a música.
É interessante como o ritmo da música assemelha-se a galopes, cuja frequência evoca
a ideia de marchas, de movimentação. Novamente os três instrumentos se juntam no
mesmo tempo musical da primeira estrofe, antevendo a segunda:

As crianças do amanhã vivem


65

Nas lágrimas que caem hoje


Irá o nascer do sol de amanhã
Trazê-los paz de alguma forma?
Deve o mundo viver
Na sombra do medo atômico?
Conseguirão eles vencer a batalha pela paz
Ou eles desaparecerão? Yeah

A segunda estrofe sugere a influência que estas ideias citadas nos parágrafos
anteriores promoveram à sociedade da época, defendendo a luta social como forma de
protesto e oposição. Com isso, o cantor entra num estado de preocupação caso estas
pautas falhassem, sugerindo -assim como outras músicas do estilo são comuns em
descrever em suas letras- uma dúvida perante o futuro próximo da humanidade, pois o
imaginário social da época estava dominado pela apreensão em relação aos desastres
nucleares que já haviam acontecido e que pareciam cada vez mais próximos de
novamente aparecer. As décadas de 60 e 70, no auge da cultura hippie e o surgimento
do Heavy Metal respectivamente, despopularizaram fortemente o discurso que defendeu
a utilização das bombas nucleares de Hiroshima e Nagasaki, ao fim da Segunda Guerra
Mundial, sob a ideia de preservar soldados norte-americanos dos temores da guerra.
Contemporâneos a diversos conflitos promovidos pela política imperialista norte-
americana que interferiram diretamente nas nações do terceiro mundo, os quais minaram
e desmoralizaram, posteriormente, a política externa dos EUA e acabou gerando uma
grande indignação popular, quando finalmente em 1973 a impopularidade da guerra era
tanta que Richard Nixon, então presidente da potência ocidental, deu fim ao conflito da
Guerra do Vietnã, um ano depois de assinado um tratado limitando o número de mísseis
balísticos, contra um possível ataque de míssil com carga nuclear. Contudo, seis meses
após o acordo, os EUA se retiraram deste. Durante os versos “Deve o mundo viver / Na
sombra do medo atômico?” é possível analisar novamente o imaginário social que
pairava sob grande parte da população norte-americana do período, ainda que não
apenas limitado a estes. A corrida armamentista promovida pelas duas superpotências
globais gerou um sentimento anti-guerra, assim como instigou políticas que visassem o
desenvolvimento nuclear em diversos outros países, como a nacionalista França de
Charles de Gaulle, na segunda metade da década de 60.
66

O fim da estrofe representa a perda de força midiática da cultura hippie, que após
o Festival de Woodstock, em 1969, começou a limitar-se a ambientes mais reclusos,
saindo dos holofotes da mídia e provocando um clima de desilusão, um sentimento de
dúvida.
Outra vez em hiato do cantor, a guitarra e o baixo tornam a seu diálogo misterioso,
acompanhados pelo ritmo frenético da bateria, antecedendo um ritmo profundo e
melodicamente sinistro. A distorção da guitarra, o peso do baixo e o ritmo lento, mas
agressivo da bateria antecedem a terceira estrofe, narrada por Ozzy Osbourne:

Então, vocês, crianças do mundo


Ouçam o que eu digo
Se vocês querem um lugar melhor para viverem
Espalhem as palavras hoje
Mostrem ao mundo que o amor
Ainda se mantém vivo e vocês devem ser valentes
Ou vocês as crianças de hoje
Serão as crianças da sepultura
Yeah!

Nesta terceira estrofe está a mensagem que a banda passou diretamente aos seus
ouvintes e fãs. O discurso presente demonstra o imaginário anti-guerra, cujo temor maior
era o apocalipse nuclear, fator observado nas outras canções analisadas nesta pesquisa.
Fortemente influenciado por pautas sociais reformadoras e revolucionárias, o Heavy
Metal de Black Sabbath mostrava em sua estrutura um ritmo tenso e sinistro, que
demonstra em sua essência o terror causado pela guerra. Climas obscuros, tensos,
frenéticos, confusos e eufóricos misturam-se em uma canção intensa, expressiva e
sentimental. Dito isto, é de se esperar que muitas de suas mensagens são, geralmente,
de pessimismo, mostrando um futuro apocalíptico e destruído por guerras. Um dos
principais elementos que sustentam a estrutura do Heavy Metal é a sensação medonha
que acompanha diversas músicas, mesmo que abordando outros temas. Digo isto pois,
ao fim da mensagem de Ozzy nesta última estrofe, a música se encaminha para um clima
de iminência, onde o baixo e bateria mantém um diálogo rítmico acompanhados por uma
guitarra veloz, chegando a um estado agudamente frenético que, por fim, precede um
estouro de uma bomba, ao fundo. Após o som abafado o qual a bateria acompanha, todos
os instrumentos saem de cena, sobrando apenas um clima fantasmagórico que sussurra
67

“Children of the grave (Crianças da sepultura)”, representando o tão temido fim da


humanidade. Quando faz referência a conflitos nucleares, o Heavy Metal geralmente
introduz um elemento apocalíptico à canção, mesmo que, como observado, mantenha o
discurso pacifista e não se junte ao elemento destrutivo dos demais instrumentos.
Contudo, mesmo que a letra contenha esta característica oposta, é acompanhada por
um tom sinistro e medonho exposto pelo vocalista de forma emocional.

3.3 METALLICA – COMBATA FOGO COM FOGO

A terceira música analisada nesta pesquisa foi produzida pela banda norte-
americana Metallica, formada em Los Angeles no ano de 1981, como já mencionado
anteriormente. O título da canção é “Fight Fire With Fire” que, traduzido para o português,
significa “combata fogo com fogo”. A canção faz parte do segundo álbum do grupo,
chamado Ride the Lightning, e lançado em 1984 pela gravadora Sweet Silence Studios,
em Copenhague, na Dinamarca. O nome da música representa uma crítica ao conflito
bipolar do período, em que cada potência fornecia o material bélico para nações que
estavam inseridas fisicamente no conflito, promovendo regimes de interesse ao governo
norte-americano ou soviético, mantendo um constante embate de ofensivas e
contraofensivas. Além disso, é uma referência ao nível destrutivo e mortal dos conflitos,
que alimentavam um conflito diplomático, cultural, científico, tecnológico, econômico,
político e bélico. Portanto, ataque seria a única opção, e por isso a expressão “combata
fogo com fogo”. Além disso, é observável o paralelo que a frase tem com o
desenvolvimento do poder de fogo composto no arsenal nuclear produzido pela corrida
armamentista, tendo em vista o caráter extremamente ofensivo destes equipamentos
militares.
A melodia começa de forma calma, sem distorção. Contudo, antes de apontar o
primeiro minuto de música, a guitarra entra como um estrondo introduzindo um ritmo
frenético que é logo seguido pela bateria e baixo. Os três instrumentos juntam-se num
ritmo caótico e extremamente veloz, revelando a verdadeira face da música. Pouco
depois, o vocalista entra em cena acompanhando o ritmo dos demais instrumentos
musicais:
68

Faça aos outros


O que eles fizeram pra você
Mas em que diabos
Está o mundo se tornando?

Reduzindo o universo
A nada
Guerra nuclear
Nos fará todos descansar

Combata fogo com fogo


O fim está próximo
Combata fogo com fogo
Explodindo com medo

Nós todos devemos morrer

Nestes primeiros versos podemos analisar alguns elementos que refletem


algumas das características do imaginário social perante a Guerra Fria. Na primeira
estrofe pode-se perceber uma crítica ao conflito, em que as duas potências não
aceitavam uma ação da outra sem dar uma resposta, como é observável, por exemplo,
na Crise dos mísseis. Os EUA com seus mísseis situados na Turquia, cujo governo
soviético reage transferindo mísseis ao território cubano. Logo, a instalação de mísseis
intermediários na ilha, equipados com ogivas nucleares, pareceu a Kruschev (Primeiro
Secretário do Partido Comunista Soviético entre 1953 a 1964) a resposta adequada à
ameaça de ofensiva, mas constituía, também, uma reação à presença dos mísseis
americanos Júpiter na Turquia (MAGNOLI, 2004, p. 106). Na segunda estrofe é
perceptível como o imaginário da época era composto pela ideia de que a guerra nuclear
poderia causar a destruição global, “reduzindo o universo a nada”. Na terceira estrofe e,
presente em diversos outros versos da música, observamos o título “combata fogo com
fogo”. A presença desta frase, além de representar o que já foi analisado no parágrafo
anterior, também pode nos remeter à corrida armamentista que as duas potências globais
se colocaram, pois, para que uma pudesse combater a outra, deveria incessantemente
produzir material bélico para isto e, na música, a repetição desta frase pode representar
este fator. No fim da terceira estrofe observa-se o verso “explodindo com medo”, podendo
refletir tanto o imaginário social da época -de medo perante possíveis conflitos nucleares-,
69

tanto a política usada pela parte ocidental para a demonização da potência oriental. Como
já visto, era comum que políticos contemporâneos à Guerra Fria utilizasse o argumento
de que a nação vermelha possuía também seu armamento nuclear, porém somando isto
a uma ilusória expansão soviética. Ilusória pois, apesar de a URSS apoiar movimentos
soviéticos que se levantavam ao mundo, a mesma não procurava expandir seu próprio
território e não atingia estes territórios de forma economicamente imperialista. Logo, não
existia um expansionismo da própria União Soviética, mas de sua ideologia. Além disso,
remete ao equilíbrio de medo citado pelo historiador Demétrio Magnoli, no capítulo
anterior. Esta parte tem seu fim com a frase “nós todos devemos morrer”, mais uma vez
demonstrando resquícios de um imaginário social temente da destruição global que um
conflito militar direto entre as duas potências poderia causar.
Após isto o cantor faz uma curta pausa, porém os demais instrumentos continuam
de forma frenética, quando novamente o vocalista se junta a estes:

O tempo é como um pavio


Curto e queimando rápido
Armagedom está aqui
Como dito no passado

Combata fogo com fogo


O fim está próximo
Combata fogo com fogo
Explodindo com medo

Com a primeira estrofe é observado novamente a tensão que pairava sobre os


indivíduos que observavam os acontecimentos do conflito. Parecia iminente que o conflito
envolveria militarismo nuclear, e que estava cada vez mais próximo, pois o equilíbrio de
terror mostrava-se cada vez mais intenso e difícil de acreditar que a paz pudesse existir.
Logo, a apreensão tomava conta e acreditava-se que o fim do mundo, como conhecemos,
era inevitável. Na segunda estrofe em questão, mais uma vez observa-se o medo do fim
por conflitos incessantes e o desenvolvimento cada vez mais veloz de armamentos e
ogivas nucleares, que eram impulsionados por políticas de demonização do inimigo,
argumentos comuns usados entre partidos para buscar votos.
Com o fim destas estrofes, o vocalista novamente se ausenta e dá lugar a um solo
de guitarra, o qual se mostra de acordo com o ritmo anterior da música: veloz, frenético
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e intenso. A bateria, com seu bumbo duplo, não deixa o clima de tensão cessar. Nisto, o
cantor torna novamente à canção, juntando-se ao ritmo dos demais instrumentos:

Prestes a encher nossos pulmões


Os ventos quentes da morte
Os deuses estão rindo
Então respire pela última vez

Fight fire with fire


Ending is near
Fight fire with fire
Bursting with fear

Fight fire with fire (8x)

Fight!

A primeira estrofe desta última parte representa a iminência daquilo que causaria
a destruição massiva do globo, fator de medo que ronda toda a canção, representando
novamente o fim da humanidade, caso o conflito nuclear viesse a ocorrer. A música vai
encaminhando-se ao seu fim, e com a repetição do verso “combata fogo com fogo” de
modo cada vez mais intenso, o vocalista fortalece o sentimento de tensão presente em
toda a música, que chega ao seu fim com a sonora explosão de uma bomba nuclear.
Toda a música é tocada de forma intensa, frenética e veloz, onde cada instrumento
consegue passar ao ouvinte a essa sensação de tensão, mantendo-a sempre de acordo
com a mensagem presente na letra. O vocalista narra, em primeira pessoa, fragmentos
de um imaginário social, traduzindo o sentimento que é comum em todos os elementos
e instrumentos da canção: um imaginário de medo, intensificado pela possível destruição
causada por um conflito cuja única consequência parecia ser a aniquilação global.

3.4 EXODUS – E ENTÃO NÃO SOBROU NINGUÉM

And Then There Were None é o título da quarta música que integra o primeiro
álbum da banda Exodus, chamado Bonded by Blood. Gravado pela Prairie Sun Studios
e lançada em 25 de abril de 1985, acaba por se tornar um dos mais influentes álbuns de
Thrash Metal da história. A canção apresenta um som extremamente agressivo, capaz
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de narrar cenas horripilantes e tocar de maneira tão brutal que leva uma energia frenética
ao ouvinte, cuja euforia é comumente vista em concertos da banda. O clima sinistro e
extremo que a banda produz, somado às narrações de letras como “And Then There
Were None” que, traduzido, significa “E Então Não Sobrou Ninguém”, remonta às
crueldades e horrores causados por conflitos militares.
A música começa com a introdução de uma guitarra pesada e distorcida que
mantém um ritmo acelerado. Após alguns segundos deste ritmo, a bateria e o baixo
juntam-se ao ritmo da guitarra, dando sustentação. Finalmente, dentro de pouco tempo,
o vocalista se integra aos demais instrumentos, narrando uma terrível história fictícia que,
infelizmente, possui reflexos de realidade:

Guerras vindo a começar a ocorrer


Olhos cegados pela explosão nuclear
Corações batendo em retirada
Tudo em volta são corpos queimados em cinzas
Crianças chorando e pessoas morrendo
Não há salvação deste holocausto
Corpos queimando e agora eles aprenderão
Na guerra a morte dolorosa é seu preço sangrento

Vidas terminam em pecado


Deus chora, o mundo morre

E então não sobrou ninguém


O mundo começa a queimar
As potências mundiais aprendem
Que o trabalho de Satã está feito

Formando uma melodia agressiva expressada por todos os componentes do grupo,


o vocalista anuncia a iminência de uma guerra nuclear. Os Estados Unidos, recentemente
envolvidos em diversos conflitos que geraram tanta dúvida acerca do destino da
humanidade, ainda mantinha uma onda de incerteza e antagonização ideológica à União
Soviética. Mesmo com o enfraquecimento cada vez maior da sua rival, a URSS, o diálogo
anticomunista tornou-se cultural na política e na sociedade estadunidense.
Criando um clima tenso e macabro, a banda narra a destruição causada pelo
conflito nuclear em diversos aspectos: morte; desespero; fogo; cinzas; choro. O discurso
anti-guerra promovido na canção busca mostrar a perversidade nua e crua da guerra,
72

suas consequências, seus horrores, e enfatizar que ninguém sai ganhando ou perdendo:
no final, não sobra ninguém. O cantor mostra as faces do apocalipse nuclear, tema
comum em diversas músicas deste gênero e enraizado no imaginário social daqueles
que vivenciaram as tensões desta temporalidade.
Na terceira estrofe é cantado um verso que conta sobre a destruição total de um
local, representando a camada terceiro mundista onde a belicosidade foi promovida pelas
duas superpotências mundiais. Contudo, o vocalista enfatiza, no segundo verso, que as
consequências serão globais, pois todo o mundo passa a ser afetado pela perversidade
nuclear. No terceiro verso, a história torna-se ambígua, porém acaba representando a
mesma coisa: o fim da humanidade. Pode-se interpretar que o apocalipse chegou a todos
e os poderosos perceberam isso no pós-vida, ou seja, no inferno. Porém também pode
significar que, mesmo sendo a destruição bélica distante do território das potências
mundiais, as consequências catastróficas seriam mundiais.
Nisto, o vocalista entra num pequeno hiato enquanto o ritmo é mantido pelos outros
instrumentos presentes na música e, poucos segundos depois, interceptam uma ponte
para o retorno da narração:

Moagem das rodas, o brilho está cegando


Balas voando por toda parte
Tanques esmagando e soldados correndo
Se você vive, você desejará estar morto
Pare de rezar, não há salvação
Nenhuma salvação da sua sepultura em chamas

Cérebros inchando e corpos fedendo


E Satã vem ver que ninguém está salvo

Vidas terminam em pecado


Deus chora, o mundo morre

E então não sobrou ninguém


O mundo começa a queimar
As potências mundiais aprendem
Que o trabalho de Satã está feito

Esta segunda e última parte da letra remete apenas ao horror das guerras,
mantendo um discurso anti-guerra que procura chocar e trazer à tona os horrores
causados por políticas de guerra. Protagonizando as políticas externas globais, a ameaça
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de mais episódios horripilantes causados pelo uso de armamento nuclear pairava sobre
o imaginário social. A música procura utilizar deste medo e, misturando-o com um temor
religioso, fornece uma harmonia elétrica, macabra e intensa que produz euforia, energia,
ou desconforto, dependendo do momento ou do indivíduo. A letra, sendo uma história de
terror apocalíptico, somada ao ritmo acelerado e a harmonia intensa entre os
instrumentos, procuram mostrar da maneira mais crua e significativamente possível as
consequências desastrosas que mais uma imprudência nuclear poderia significar para o
mundo. Eis outro fato culturalmente comum no Heavy Metal e Thrash Metal: a sequela
de um confronto atômico.
Saindo o vocalista de cena, os três demais instrumentos continuam mantendo o
mesmo ritmo frenético anterior e acabam no estrondo de uma explosão. Perto de chegar
ao fim, a música volta a um ritmo veloz e apresenta a um solo tão intensamente frenético
quanto o resto da composição, que chega a seu fim ao mesmo tempo do fim do solo.

3.5 KREATOR E A MORTE TOTAL

Endless Pain, álbum de estreia da banda de Thrash Metal alemã Kreator, lançado
em 1985 e gravado pela CAT Studio em Berlim, possui como segunda música integrante
do conjunto a intitulada Total Death, cuja tradução para o português significa “Morte Total”.
Possuindo um teor altamente macabro, intenso e veloz, este primeiro álbum do grupo
influenciou diversas outras músicas do estilo, e, além disto, foi a inspiração musical de
diversas bandas de outros subgêneros do Heavy Metal, como o Death Metal e o Black
Metal.
A música começa com a aparição da guitarra cujo som produzido mantém-se num
riff veloz, repetindo-se algumas vezes. Poucos segundos depois, a bateria e baixo entram
em cena quase que juntamente a uma mistura de grunhido e grito do vocalista, criando
um clima perturbador e, com o diálogo rítmico entre a guitarra, baixo e bateria, intensifica
e aumenta a velocidade da melodia. Num ritmo frenético que mantém uma sensação
tensa e macabra, o vocalista volta à canção narrando uma história macabra e utiliza do
canto gutural, combinando-se à letra musical pavorosa:
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Chegou a hora, a paz não pode resistir


Mestres do interruptor agora comandam a terra
Acionem seu interruptor e enviem a morte
Políticos porcos de guerra tem apenas merda em suas cabeças

Tente correr ou se esconder da morte


Você vai queimar e sangrar em sua cabeça

Total Death (4x)

O primeiro verso deixa claro a iminência de um conflito, num ritmo musical tão
frenético que provoca uma característica ritmicamente caótica na melodia. Após isto, a
estrofe toda representa um sentimento de profunda insatisfação com a política externa
mundial. A crítica é voltada diretamente aos líderes políticos de nações que possuem
caráter agressivo, belicoso ou invasivo. Como já mencionado em análises anteriores, o
discurso anti-guerra presente nas letras de músicas de Heavy Metal procura chocar o
ouvinte através da narração de uma história medonha cujo objetivo é expor as
atrocidades que conflitos bélicos produzem para a humanidade e para a todos os seres
vivos, conclusivamente. A partir do quarto verso da primeira estrofe, onde o vocalista
promove um insulto àqueles que incentivam a guerra, a história passa então a representar
uma narração medonha e apavorante, como já explicado do discurso anti-guerra do Metal.
Por fim, o vocalista clama por quatro vezes a frase “morte total”, fazendo surgir o tom
apocalíptico presente tão fortemente neste gênero musical.
A guitarra traz de volta o riff que serviu de introdução à música, fazendo uma ponte
entre a segunda parte da letra, cujo discurso mantém seu caráter horripilante:

Ninguém pode escapar das chamas ardentes


A carne e a pele decaem do seu rosto
Cem megatons estão em todas as almas
Destruir a raça humana é seu objetivo

Tente correr ou se esconder da morte


Você vai queimar e sangrar em sua cabeça

Total Death (4x)

Esta segunda parte da música continua a narração de uma história de apocalipse


nuclear. Fazendo referência a seu poder devastador e destrutivo no primeiro e segundo
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verso, produz uma referência direta à bomba nuclear no terceiro verso, cujo termo
“megatons” significa a unidade de medida usada para calcular o poder de destruição de
um armamento nuclear. O desenvolvimento rápido do arsenal nuclear promovido pela
corrida armamentista foi capaz de produzir armas nucleares que possuíam uma
capacidade de destruição extremamente alta, onde países inteiros poderiam ser
dizimados pelo uso de apenas um de estes equipamentos. Isto ajuda a desenvolver um
imaginário apocalíptico acerca de conflitos bélicos. Por fim, novamente o vocalista canta
o refrão da música e, após isto, entra em hiato, enquanto os demais instrumentos
continuam a manter o clima tenebroso da canção. Algum tempo depois, a guitarra entra
em frenesi total tocando um solo de guitarra muito rápido e frenético que, durando em
torno de meio minuto, torna a melodia ao ritmo das estrofes já tocadas e a narração do
vocalista:

Destruam as armas nesta terra


Ou será o fim do mundo
Se eles ordenarem a morte ganha vida
E não há deus algum que nos ajuda quando morremos

Tente correr ou se esconder da morte


Você vai queimar e sangrar em sua cabeça

Total Death (4x)

Esta última estrofe começa novamente com um claro discurso anti-guerra. A


destruição de armamentos faz referência aos diversos acordos feitos entre as potências
nucleares que visavam a diminuição dos efeitos que tais armamentos poderiam produzir.
Tratados para controlar e limitar armas nucleares eram comuns entre as superpotências,
porém raramente efetivos. Destarte, o principal objetivo dos tratados não era apenas
evitar ou amenizar os efeitos físicos destrutivos que o arsenal nuclear continha, mas de
impedir o avanço tecnológico, ideológico ou diplomático do rival, ou até de dificultar o
avanço de potências menores cujo objetivo de se tornar uma potência nuclear era
previsto. A guerra diplomática entre EUA e URSS envolveu um profundo embate por meio
de tratados, visando controlar políticas externas de seus respectivos rivais e de outras
nações que pudessem vir a se tornar uma ameaça à política mundial. A partir disto, a
letra musical presente nesta última parte da música possui um discurso cujo objetivo é a
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necessidade da destruição do armamento nuclear, senão a destruição mundial será a


consequência ao globo. A música chega ao fim, ecoando as palavras “morte total”.

3.6 SODOM E O INVERNO NUCLEAR

Um ano após o lançamento do primeiro álbum do Kreator, outra banda alemã viria
a se tornar um ícone de influência para o Metal. Lançando seu primeiro álbum em 1986
e o consecutivo em 1987, utilizando-se de um ritmo veloz, Sodom lança o intitulado
Persecution Mania, estreando a música nomeada Nuclear Winter. Para o português
brasileiro: “Inverno Nucelar”. A música traz consigo referências à Guerra Fria, utilizando-
se de temas como bomba nuclear e radiação, inserindo o ouvinte num ambiente de
desesperança e profundo desgosto com a política nacionalista, somando isto ao horrível
universo criado pela letra musical, demonstrando um sentimento caótico e apocalíptico,
refletindo o imaginário social perante os conflitos do período entre 1945-1991, ou algo
em torno disto.
Veloz do começo ao fim, a música inicia num ritmo frenético e distorcido da guitarra,
mantendo-se em diálogo com o baixo e a bateria. Aumentando a velocidade e fazendo
intervalos mais lentos e pesados, um clima rápido e macabro já começa a ser projetado
quando, com a entrada do vocalista, que se mantém junto ao ritmo dos demais
instrumentos musicais, narra a letra musical apresentando uma pura história de
apocalipse nuclear:

Suba a escada espiral até a aniquilação


Abandonados e negligenciados no escuro
Almas devastadas mutilam o planeta em ganância
Prossiga até sermos absorvidos em sangue
Causando o enterro prematuro da natureza
Com uma faísca ao barril de pólvora
Fixando seus brinquedos nos ombros da nação
Transformando a morte em herdeira universal

Faça-nos morrer lentamente


Inverno nuclear
Nuvens de poeira esconderão o sol para sempre
Comemorem o inverno nuclear
No dia de amanhã que passaremos
Faça seu testamento
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Inverno nuclear

Luminárias tornam-se a únicas estruturas de pé


Cataclismo atmosférico é o resultado
Desgraça epilética do canibal lacerado
Embrulhando a terra numa mortalha
Na escuridão total da luminosidade artificial
Possessão exclusiva da morte
Crânios desconfigurados de radiação
Reconhecimento do passado mutilado

Introduzindo uma iminente chegada ao fim da vida, no primeiro verso, a música


narra o futuro apocalíptico a qual o mundo caminharia. Fazendo um paralelo entre a
destruição do mundo e explosão, a primeira estrofe demonstra uma crítica ao discurso
político usado principalmente pelos EUA durante a Guerra Fria, que buscava criar medo
na população de um possível conflito nuclear, de forma a adquirir de duas, uma: o apoio
da parcela anti-guerra da sociedade, a qual acreditava que o problema deveria ser
enfrentado através de tratados e pactos entre as potências nucleares, ou da camada
apoiadora de políticas bélicas, os quais acreditavam que a melhor resposta seria um
aprofundamento nas táticas do conflito, utilizando-se do arsenal nuclear para limitar
outras nações e “justificar” atitudes imperialistas no terceiro mundo. Independente de qual
razão o discurso de medo causado por supostos ataques nucleares, seu uso político
garantiu que políticas que buscassem a ampliação de armamento nuclear mantivessem
força na cultura norte-americana.
Contudo, a segunda estrofe, introduzindo o refrão da música ao ouvinte, conta-nos
a teoria do “Inverno nuclear” que surge na década de 1980. A teoria remonta às
consequências que diversas explosões de bombas nucleares poderiam causar à Terra,
gerando a formação de nuvens de poeira e a proliferação gigantesca de material
radioativo ao ambiente terrestre, aquático e aéreo, que poderiam contaminar e causar a
morte de qualquer ser vivo deste planeta. Além disto, as nuvens de poeira não permitiram
a entrada de luz solar, inibindo a fotossíntese de plantas e bactérias, além de esfriar a
temperatura terrestre. Tal evento assemelha-se ao choque de um ou vários meteoritos à
Terra.
Na terceira estrofe desta primeira parte, o vocalista traz consigo todo o horror e
aspecto apocalíptico que é comum em letras do gênero. Promovendo um discurso
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macabro e assustador e utilizando-se de diversas representações culturais do período,


com a manutenção de todos os instrumentos por um ritmo de alta velocidade e
intensidade, a música mantém um clima horripilante e elétrico que, após a terceira estrofe,
passa novamente pelo refrão da música. Após isto, a bateria, baixo e guitarra fazem uma
ponte que conduz o ritmo musical um pouco mais lento, porém cria um clima mais pesado,
que continua a aterrorizante história:

Uma morte lenta é o que podemos esperar


Um ataque terá apenas este efeito
Condenado à pena de morte
Pela espada nuclear de Dâmocles
Desapareceu sem deixar vestígios
A dignidade e graça masculina
Infectado por um organismo intruso
Transformados em sujeitos de vontade fraca
Misantropia inerradicável
Nos limitamos a nada
O instinto de autopreservação
Propagando doenças venéreas
Deuses da guerra e da vingança
Comandantes com boa consciência
Usam nossa alma para pesquisas
Em favor da tecnologia nuclear

Chegando no final da escada espiral


Na porta para a imortalidade
Não chegou ao destino de nossos sonhos
Decidido na luta pela existência
A vida perdeu, a morte ganhou o jogo
A quantidade de nosso anseio
Será a força de nossa glória
Dâmocles, orgulhoso e poderoso entre os homens

(Refrão)

A primeira estrofe desta segunda parte faz referência à alta concentração de


radiação que a explosão nuclear libera. Radiação que pode infectar o ar, água e
principalmente o solo. Um exemplo disto é o acidente nuclear de Chernobyl, catástrofe
que envolveu mais de 500 mil trabalhadores e desabitou a cidade. A URSS, cujo estado
econômico já estava longe de seus melhores dias, ainda teve de arcar com este prejuízo
bilionário.
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Na quarta estrofe, há uma referência ao conto moral da espada de Dâmocles, onde


este seria um cortesão na corte de Dionísio. Dâmocles bajulava a fortuna de Dionísio,
que então ofereceu esta vida de luxúria ao cortesão para que ele pudesse sentir como
seria. Contudo, ordenou que pendurassem uma espada sobre o pescoço de Dâmocles,
sustentada apenas por um fio de rabo de cavalo. Devido ao perigo iminente de morte,
Dâmocles desistiu de todo o luxo. A moralidade presente reflete a insegurança de perder
tudo de quem possui muito poder econômico e/ou político. A referência deste conto na
música faz ligação às políticas militares da Guerra Fria, no quesito que, a partir da
insegurança de os políticos que se sentiam (ou diziam-se sentir) ameaçados por um
possível conflito nuclear, apoiavam a corrida armamentista nuclear que, apesar de gerar
lucro, contém alto risco ao mundo. Esta parte da música possui teor de indignação com
os discursos e pautas políticas do período, criticando, principalmente, o desenvolvimento
de pesquisas para o melhoramento do uso de equipamentos nucleares, tornando-os cada
vez mais perigosos, além de colocar em risco a saúde mundial. Como já citado no caso
de Chernobil, observa-se que acidentes podem ocorrer e que suas consequências
deixam cicatrizes profundas na vida de milhares de pessoas, e cicatrizes na Terra,
tornando o ambiente inabitável por anos.
Com o vocalista entrando novamente em hiato, a música acelera seu ritmo,
mantendo um clima frenético. Logo depois, abaixando a velocidade e intensificando o
peso da música, a guitarra, o baixo e a bateria preparam a canção para um solo de ritmo
novamente veloz e intenso, dando a sensação de que está presente a todo instante, em
todos os lugares, desenvolvendo um sentimento eufórico e intenso. Chegando ao fim, a
guitarra encontra-se sozinha e, distorcida ao máximo, cria um clima sinistro, servindo de
ponte entre a sonora destruição de duas grandes sonoras explosões.
Chegando perto do final da música, a penúltima estrofe remonta, finalmente, ao
iminente apocalipse nuclear narrado durante toda a letra musical. Fazendo uma crítica
anti-guerra, argumenta contra o discurso de que a tecnologia bélica nuclear demonstra
qualquer bonança, tanto para a nação quanto para o mundo. O maior preço a ser pago
continua sendo a vida humana. A última parte desta estrofe faz novamente referência a
Dâmocles, porém, desta vez, como se o personagem não tivesse desistido de manter o
80

poder, mesmo que se custa sua vida. Contudo, obviamente de forma irônica, onde o
iminente apocalipse nuclear é cantado durante intensos 5 minutos de música.
A canção termina passando uma última vez por seu refrão, narrando os danos
mais lentos que a radiação poderia causar ao mundo se comparados ao dano imediato
da explosão de equipamentos nucleares bélicos, porém que podem representar um meio
de subjugar o mundo a um ambiente profundamente caótico.

3.7 MEGADETH – INCENDEIE O MUNDO

Voltando à cena do Thrash Metal norte-americano, temos a banda Megadeth.


Formada em 1983, e publicando seu terceiro álbum “So Far, So good… So What!”,
representa um dos pilares musicais do subgênero. Lançado em 1988 pela gravadora
Capitol Records, contém a segunda faixa musical intitulada “Set The World Afire”, cujo
significado em português seria algo como “Coloque o mundo em chamas” ou “Incendeie
o mundo”.
Interessante observar a diferença entre as duas correntes do subgênero: norte-
americano e alemão, em seu contraste rítmico. Todos os instrumentos musicais
americanos encontram-se numa velocidade inferior ao ritmo alemão, perceptível
principalmente na velocidade em que a música é cantada. Contudo, a velocidade rítmica
altamente veloz, comparando-se ao ritmo alemão (de forma generalizada, porém não
regrada), é vista nos solos de guitarra de grupos musicais norte-americanos, as vezes
até mais célere, em bandas como Megadeth, Slayer, Exodus, Anthrax, entre outras.
Começando com um pequeno trecho da música “I Don’t Want To Set the World on
Fire” da banda The Ink Spots, a sonora explosão de uma bomba nuclear acaba com o
clima pacífico do pequeno trecho musical, introduzindo um clima caótico, intenso e veloz,
que apesar de manter um ritmo frenético, muda seu estilo melódico constantemente.
Após quase 2 minutos instrumentais, o ritmo desacelera, porém, se mantém igualmente
pesado, e logo o vocalista exerce sua função na música: narrar, em primeira pessoa, de
forma sentimental e emocional, um apocalipse nuclear.

Flash vermelho, nuvens sufocando o céu da manhã


Eles falavam que isso nunca chegaria, nós sabíamos que isso era mentira
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Todas as formas de vida mortas agora, todos os humanos sucumbem


Hora de dizer adeus, o fim apenas começou

Figuras distorcidas andam pelas ruas, é 1999


As ervas daninhas de outrora debaixo de nossos pés transformam-se em
vinhas
Corpos derretidos como velas, uma terra sem face
Não há tempo de mudar seu destino, não há tempo sobrando, é tarde
demais

O arsenal do Megadeth não pode ser abolido, eles disseram


E se ele vier os vivos invejarão os mortos
Na corrida pelo poder, todos estão em último

O primeiro verso já coloca em evidência o tema que é comumente representado


neste gênero musical: a explosão de uma bomba nuclear, seguido pela nuvem de fumaça
que se forma. A estrofe segue tratando o tema no quesito apocalíptico que poderia se
transformar, mostrando também um discurso de “nós contra eles” - Eles falavam que isso
nunca chegaria, Nós sabíamos que isso era mentira -, possivelmente sendo uma alusão
à camada social anti-guerra cuja desaprovação ao desenvolvimento de tecnologia de
guerra nuclear contrastava discursos e ações políticas que relativizavam ou apoiavam a
ampliação, tanto científica quanto numérica de equipamentos. Entrando num clima
apocalíptico, a canção conta a história do fim da pluralidade de formas de vida num
mundo destruído, sem alguma forma de voltar atrás.
A segunda estrofe narra como seria o mundo sobrevivente de bombardeios
nucleares, falando de formas distorcidas, desfiguradas. Um mundo onde as vinhas
tomam conta da paisagem urbana (pois são comumente vistas em cidades
abandonadas), expondo um irreversível mundo de poucos contrastes. Além disto, faz
referência ao medo culturalmente cristão do fim do mundo no final do milênio,
representado pelo início do segundo milênio.
O primeiro verso da terceira estrofe faz referência ao termo “Megadeth” (também
nomeando a banda), que representa um milhão de mortes humanas (associado ao
possível uso de muitas bombas nucleares, ou de bombas de caráter imensamente
destrutivo, desenvolvidas no período temporal da Guerra Fria). O verso em questão faz
referência a um panfleto espalhado por um senador da Califórnia, Alan Cranston, dizendo
“Não é simples se livrar do arsenal de Megamorte, disseram, não importa o que os
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tratados de paz chegaram”, mostrando um discurso pessimista em relação à extinção do


armamento nuclear. Segue-se a narração de um apocalipse nuclear causado pela
explosão deste arsenal e continuam as críticas a países que aplicam políticas de
desenvolvimento nuclear.
Acelerando a velocidade rítmica, o vocalista continua um discurso anti-guerra e
narra o mundo em ruínas:

Nenhum vencedor declarado


Essa falsidade de paz mundial
Seus tratados cessarão em breve
Não restará ninguém que prove que humanos existiram
Talvez, em breve, as crianças nascerão de punhos abertos
Todos nós vivemos em um planeta que virará fumaça

Que pena eles não preverem esta energia letal


E agora a cena final, um escurecimento global

Cave fundo as pilhas de escombros e ruínas


Uma sobrecarga violenta em toda parte
Sobraram as ferramentas desconhecidas da Terceira Guerra Mundial
Einstein disse: “Nós usaremos pedras no outro lado”
Nenhum sobrevivente!

Incendeie o mundo!

Sem sobreviventes, incendeie o mundo!

Esta segunda parte começa com um claro discurso de desacreditação em relação


à paz mundial. É interessante ressaltar que, na data em que esta música foi gravada e
lançada, tanto o capitalismo norte-americano quanto – e principalmente – o comunismo
soviético vivenciavam uma profunda crise econômica. Crises econômicas geralmente
tendem a criar tensões sociais, que pensadas num contexto de Guerra Fria, podia
facilmente representar uma ameaça nuclear comunista. Além disso, é notável a frase “as
crianças nascerão de punhos abertos”, fazendo uma alusão ao gesto de implorar,
suplicar, contrastando o gesto do punho fechado, cuja imagem remete a conflito, e
referenciando como será a vida daqueles que sobreviverem ao apocalipse como
coitados, sofrendo um mundo devastado. A música segue em uma pequena estrofe cujo
discurso demonstra a falta de compromisso que as nações tinham em realmente extinguir
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o armamento nuclear, mesmo sendo um instrumento que realmente possa significar um


desastre incalculável à sociedade humana e, de forma geral, à vida mundial.
Entrando em hiato, o vocalista dá vaga a um ritmo extremamente veloz e agressivo
da guitarra, que gera um clima ainda mais intenso e caótico na melodia, sendo
acompanhado pela agressividade do baixo e da bateria. Voltando o cantor, a letra musical
torna aos demais instrumentos em companhia de gritos estridentes da guitarra, narrando
o final apocalíptico da guerra nuclear. Chegando perto do final da música, é observável a
referência a uma famosa frase de Albert Einstein: “Não sei com que armas a Terceira
Guerra Mundial será lutada, mas a quarta será lutada com paus e pedras”. Esta sentença
demonstra o poderio bélico devastador atribuído aos equipamentos nucleares,
observados pelo importante cientista, falecido logo no começo do conflito bipolarizado,
em 1955. Com o vocalista gritando “nenhum sobrevivente”, a guitarra torna ao ritmo
intensamente veloz e caótico, seguido pela amedrontadora frase “coloque o mundo em
chamas”, orações repetidas ao final da canção, que mantém um clima tenso, frenético e
eufórico até o fim.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estando inserida na cultura de diversas civilizações do mundo, a música possui a


característica de trazer à tona o imaginário social de sua temporalidade. Observando o
discurso presente na canção e no todo harmônico das composições, é possível analisar
diversas referências à temas que tenham relação ao período de disputa entra as duas
superpotências mundiais no período de 1945 – 1991, aproximadamente. Conflito que se
mostrou extremamente prejudicial a toda vida terrestre, visto que os danos causados no
ambiente em geral (seu efeito ao ambiente e aos seres vivos) são devastadores. O
desenvolvimento de bombas que, graça a uma ampliação larga de pesquisa e produção
de material bélico, multiplicaram seus efeitos destrutivos durante a corrida armamentista.
Além disso, a disputa geopolítica externa das duas potências apoiava um governo
antagônico à sua rival. Com o suporte econômico dos Estados Unidos na Europa,
majoritariamente nos países do centro, norte e oeste, estes governos integraram-se ao
mercado mundial capitalista. No outro lado, recebiam apoio econômico da URSS, apesar
de mais tímido. Contudo, o suporte militar proporcionado pelas potências aos estados
aliados era notável nos dois lados. Conflitos como a Guerra da Coreia (1950 - 1953),
antagonizando a comunista República Popular da China e a capitalista República da
Coreia, produto que marcou uma divisão territorial que permeia o contemporâneo. A
Revolução Húngara (1956 – 1962) promoveu um levante popular da Hungria contra a
União Soviética, apesar de não se aliar aos EUA, e, seis anos depois, tendo o governo
popular derrubado pelo governo soviético. Além disso, a Guerra do Suez, a Crise dos
Mísseis, Guerra do Vietnã e diversos outros conflitos terceiro-mundistas ocuparam a
mídia, tensões que são representadas nas canções. Estas, sendo compostas pela
geração que amadureceu junto ao imaginário aflito da época, utilizavam de palavras,
acontecimentos, propaganda política, e temas em geral que envolviam o conflito
bipolarizado. A cultura antagônica presente no globo é representado através de um
discurso cujo teor sentimental e emocional é claramente demonstrado ao longo da
duração das composições musicais de Metal. Além de naturalmente provocarem uma
sensação conflituosa, sinistra e tensa de um possível apocalipse nuclear, seu discurso
também se mistura a características religiosas, relacionando-se com discursos como
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inferno, demônios, juízo final, milenarismos, etc.

Transformações políticas, econômicas, culturais, etc., aconteceram nas duas


superpotências. Com esta evolução, o discurso musical acompanha o ciclo de
transformações, englobando temas temporais e sua memória. Demonstrando, assim,
representações diretas ao período em que as fontes estão inseridas, compõem
fundamental importância sociocultural, de maneira historiográfica. Adquirindo suporte das
ciências humanas e sociais, é possível analisar reflexos sociais, políticos, ideológicos e
culturais, presentes nas composições. As marchas pela paz e seus discursos anti-guerra,
o desenvolvimento militar, o discurso extremista, a propaganda das mídias e o surgimento
de produtos propagandísticos como - além de músicas de Heavy Metal – filmes,
panfletos, animações, revistas, quadrinhos, charges, literatura, etc.

Pode-se notar que a influência da Guerra Fria ao Heavy Metal é enorme. Contudo,
é apenas um produto cultural criado no período. É interessante notar como cada
civilização acaba por reproduzir culturalmente o que está passando pelo seu imaginário
e memória, acompanhando as transformações e, conclusivamente, transformando-se.
Visto isso, esta pesquisa incentiva a pesquisa cultural, tanto da História Cultural, quanto
outros campos científicos que abordem o campo. A representação política, social e
ideológica é fortemente presente na produção cultural do período, permeando todo um
imaginário social que, obviamente, pertence a seu tempo. O intervalo de tempo desta
pesquisa apresenta um intenso conflito ideológico que é ligado ao extremismo em
diversos discursos da época, assim como sua memória causa influência em períodos
posteriores.
86

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