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A ESCRAVIDÃO P O R DÍVIDAS N A S R E L A Ç Õ E S

DE T R A B A L H O N O BRASIL C O N T E M P O R Â N E O

R O N A L D O L I M A D O S S A N T O S ' -'

Sumário: 1. Alvores da escravidão — a Idade Anliga. 2. A servi­


dão na Idade Média. 3.A escravidão na IdadeModerna. 4.A escra­
vidão na Idade Contemporânea — Proscrição internacional. 5.
Formas de escravidão no Brasil contemporâneo. 6. A específica
escravidão por dívidas no Brasil. 7. TransindividualIdade dos
d anos decorrentes de práticas escravlzatórias. 8. Fornas de com­
bate ao trabalho escravo e propostas solucionantes

1. A L V O R E S D A E S C R A V I D Ã O — A IDADE ANTIGA

A escravidão'’1 é u m a instituição antiga n a história d a humanidade.


D a d o s históricos fornecem notícias q u e as primeiras civilizações q u e sur­
giram n a região d e Crescente Fértil (nordeste d a África, as terras do corre­
dor mediterrâneo e a Mesopotamia) já faziam grande uso d a mão-de-obra
d e indivíduos escravos.
N o s primórdios, a escravidão correspondia a u m m e i o d e subjugação
d e u m po vo por outro, c o m o conseqüência direta d a s guerras q u e ocorriam
entre as diversas tribos e povos. N a região d a M e s o p o t â m i a (berço das
primeiras civilizações — sumários, acádios, amoritas, assírios e caldeus),
por exemplo, os diversos povos c o m b a t i a m uns aos outros, sucedendo-se
n o domínio d a região, c o m a escravização dos sucedidos.

O Procurador do Trabalho d a P R T / 2 8 Região. Mestre e Doutorando e m Direito do Trabalho pela


Faculdade d e Direito d a Universidade d e S ã o Paulo (USP). Professor Universitário.
(l)Sinteticamente, a escravidão po de ser dellnida c o m o o “r e g i m e social d e sujeição d o h o m e m e
utilização d e s u a íorça, e x p l o r a d a p a r a iins e c o n ô m i c o s , c o m o p r o p r i e d a d e privada". Escravo, por
s u a ve z, ê a q u e l e q u e "está sujeito a u m senhor, c o m o p r o p r i e d a d e dele." Escravocrata é o parti­
dário d a escravatura, senhor, d o n o d e escravos.'' (Ferreira, Aurélio B u arq ue d e Holanda. N o v o
Aurélio s é c u l o X X I : o dicionário d a ifngua portuguesa. Rio d e Janeiro: N o v a Fronteira, 1999, p.
800). A C o n v e n ç ã o sobre Escravidão, da Sociedade da s Naçães, d e 1926, define a escravidão
c o m o "o e s t a d o o u c o n d i ç ã o d e u m individuo s o b r e o q u a t se e x e r c e m , tolal o u parcialmente,
a l g u n s o u t o d o s o s atributos d o direito d e p r o p r i e d a d e " {art.i* *5*).
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N a Babilônia os escravos c o m p u n h a m a última c a m a d a d a popula­


ção. O C ó di g o d e H a m u r a b i já continha n o r m a s a respeito d o trabalho es­
cravo, c o m o a limitação d o t e m p o d e trabalho dos escravizados por dívi­
das, a s s e g u r a m e n t o d o direito d o escravo esposar a filha d e u m h o m e m
livre (o q u e lhe da va direito à herança nos matrimônios e a liberdade à sua
pro!e}.(2) O episódio m a i s notável d e s u b j u g a ç ã o d e u m p o v o pelos
neobabilônicos ficou conhecido c o m o o "Cativeiro d a Babilônia”, período
n o qual, a p ó s a t o m a d a d e Jerusalém pelos neobabilônicos (caldeus), e m
5 8 6 a.C., s o b o c o m a n d o d o rei Nabucodonosor, os hebreus foram escravi­
zados.
Egito, Grécia e R o m a fizeram grande uso dessa instituição (escravi­
dão). C o s t u m a v a m , por me lo d e práticas guerreiras, aprisionar os derrota­
d o s e utilizá-los c o m o escravos n a atividade agropecuária, n a construção e
n a s funções domésticas.® E r a m t a m b é m escravos os nascidos d e pais ou
m ã e s escravas.
N o antigo Egito, a sociedade era dividida e m dois grandes grupos:
d o s d ominantes e d o s dominados. A o primeiro grupo pertenciam os n o ­
bres, os sacerdotes e os escribas: a o segundo, os artesãos, os felás ( c a m ­
p o n e s e s e os q u e trabalhavam e m obras públicas) e os escravos. O s escra­
vos e r a m c o m p o s t o s pelos prisioneiros capturados e m guerra. Viviam e m
condições precárias, m a s p o s s u í a m alguns direitos c o m o o c a s a m e n t o c o m
p e s s o a s livres, a possibilidade d e propriedade d e bens, capacidade d e tes­
t e m u n h a r e m tribunais.
N a Grécia antiga, a escravidão foi largamente utilizada, iniclando-se
já no período H o m é r i c o (séc. X V a séc. VIII a.C.) até o período Helenístico
(séc. IV a séc. I.a.C.), c o m a escravidão d e prisioneiros d e guerra. N a Grécia
desenvolveram-se as primeiras formas d e escravidão por dívida entre os
próprios m e m b r o s d a comunidade. E m Atenas, a maioria d a população era
fo rm a d a por escravos q u e trabalhavam no c a m p o , n a s m inas e n a s ofici­
nas. E m b o r a considerados propriedades d o s e u senhor, já havia leis q u e
os protegiam contra excessivos maus-tratos.
E m R o m a , cuja e c o n o m i a era b a s e a d a n o rurailsmo, as propriedades
e r a m cultivadas por escravos, estabelecendo-se u m a relação d e direito real
entre o titular d o direito — dominus — e o escravo — res.N e s s a sociedade,
o escravo n ã o era considerado sujeito d e direitos, m a s objeto d e direito,
recaindo sobre ele (coisa) o domínio do proprietário, q u e possuía o direito
d e castigá-lo, vendê-lo, alugar se us serviços, t omar decisões sobre a s u a
vida e morte. N a sociedade r o m a n a desenvoiveu-se a utilização d o s escra­
vos c o m o capatazes, professores e artesãos.
C o m o advento d o cristianismo, a escravidão fora a m e n i z a d a por
Influência d o s p e n s a m e n t o s religiosos de igualdade, fraternidade e solida­
riedade. Santo Agostinho e S ã o T o m á s de Aquino, e m b o r a n ã o condenas-

(2 )Oliveira, J o s é C é s a r de. “F o r m a ç ã o histórica d o direito d o trabalho". ln:Barros, Alice M o n t e i r o


de( Org.). “Estudos e m m e m ó r i a d e Célio Goyatá". 3 a ed. rev.ampl. S ã o Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 45.
(3)Sen/o-Sé, Jairo U n s d e A l b u q u e r q u e . “Trabalho escravo n o Brasil". S ã o Paulo: LTr, 2001, p. 29.
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 133

s e m diretamente a escravidão, r e c l a m a v a m tratamento digno e caridoso


para os escravos.'*’ E m 3 6 6 a.C., decretou-se, por lei, a proibição d a escra­
vidão por dívidas e, e m 3 2 6 a.C., a escravidão foi abolida.

2. A S E R V I D Ã O N A I D A D E M E D I A

E m b o r a n a Idade Antiga a servidão já fosse encontrada e m determi­


n a d a s regiões, c o m o n a Grécia, c o m a figura d o s ilotas'9’, foi n a idade M é ­
dia q u e es se regime d e trabalho prevaleceu. A descentralização política e
a fragilidade d o poder d o M o n a r c a possibilitaram a fixação d o poder nas
m ã o s d o s senhores feudais, detentores d a terra, q u e m a n t i n h a m servos
nas su as propriedades. A p a s s a g e m d o regime d e escravidão para o de
servidão foi lenta e gradual; a relação d e domínio transferiu-se d a p e ss o a
para a propriedade; o servo n ã o é considerado coisa c o m o o escravo (res),
m a s pessoa, e m b o r a vinculado às glebas { m a n s o servíí o u tenência}. C o n s ­
tituíam a maioria d a população c a m p o n e s a e e r a m t a m b é m d e n o m i n a d o s
d e laboratores (vocábulo latino q u e significa “trabalhadores”).
A p e s a r d e n ã o s e r e m considerados coisa (res), c o m o ocorria outrora
c o m os escravos, a situação dos servos n ã o se distanciava muito d a d a ­
queles, pois e r a m considerados acessõrios d a s terras pertencentes a o se­
nhor feudal, as quais se vinculavam e ficavam sujeitos a diversas restri­
çõ es pessoais (não p o d i a m contrair c a s a m e n t o s e m permissão ou deslo­
care m - s e para outras terras). P a s s a v a m fome, habitavam e m condições
precárias, n ã o s e b l a m ler o u escrever e ficavam sujeitos a o cumprimento
d e diversas obrigações.'9’
Havia t a m b é m , nesse período, a existência d e u m regime d e escravi­
d ã o paralelo a o servilismo; o s senhores feudais aprisionavam os derrota­
d o s n a s batalhas — principalmente os bárbaros e o s infiéis — e os
comercializavam nos m e r c a d o s d e c o m p r a e v e n d a d e escravos.
D e s s e m o d o , o q u e se nota é q u e "o trabalho servil era uma deriva­
ção do trabalho escravo, mudando apenas o eixo do domínio, eis que en­
quanto no trabalho escravo era o senhor o seu dono, no trabalho servil, o
trabalhador era o servo da gleba.'™

(A)Oliveira, J o s é C é s a r de. "Form aç ão histórica a o direito d o trabalho", op. cif., p. 54.


(5)0 $ ilotas e r a m servos qu e trabalhavam no cultivo das terras do s cidadãos espartanos geração
a p ó s geração. P a g a v a m u m valor anual pelo uso d a terra. N ã o e r a m protegidos pelas leis da
cidade: po d i a m ser maltratados e mortos, impunemente.
(6) Entre as diversas obrigações destacavam-se: a) a Corvóla, obrigação servil d e trabalhar gra­
tuitamente, e m alguns dias d a s e man a, na s terras d o senhor feudal; b) a capitação. Imposto pe s ­
soal; c) a talha, entrega d e parte d a produção agrícola a o senhor feudal; d) a banalidade, p a g a ­
m e n t o peía utllízaçso d e e q u i p a m e n t o s e instalações d o l e u d o (celeiro, fornos etc.).
(7) Ferrah, Irany; N a s c i m e n t o , A m a u r i M a s c a r o ; Martins Filho, Ives G a n d r a . "História d o trabalho,
d o direito d o trabalho e d a justiça d o trabalho". S ã o Paulo: LTr, 1998. p. 41.
134 REVISTA D O T R T D A 15B REG I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

3. A E S C R A V I D Ã O N A I D A D E M O D E R N A

N a Idade Mode r n a , c o m o aparecimento d a s grandes n a v e g a ç õ e s e


o descobrimento d e novos territórios, seguidos d a e x p a n s ã o territorial das
potencias d a época, verificou-se a escravização d e negros trazidos d a Áfri­
ca para as novas terras da Am ér i c a e o aprisionamento d e indígenas por
portugueses e espanhóis nas terras recém-descobertas. T e m - s e o início do
mercantilismo e d o sistema colonial. Usufruíram d e s s e sistema países c o m o
Portugal, Espa n h a , França, Ho la n d a e Inglaterra.
O nascimento e o desenvolvimento d o capitalismo mercantilista c o n ­
c e d e r a m u m caráter motivacional para a escravidão n a Idade M o d e r n a to­
talmente diverso d o q u e ser verificou n a idade Antiga. N a Idade M o d e r n a a
instituição d a escravidão foi u m instrumento d e exploração para fins de
lucro, por me io d a obtenção d e mão-de-obra barata, ao p a s s o q u e n a Anti-
güidade objetivava-se excluir o labor d a s condições d e vida d o s cidadãos.16’
O uso d a mão-de-obra escrava, n a Idade Mode r n a , cumpria u m a finalidade
mercantilista: produzir para o m e r c a d o externo, e m favor d a metrópole.
Devido à grande d o m i n a ç ã o e m diversas regiões d a África, Portugal
foi o primeiro país d a Idade M o d e r n a a utilizar o comércio d e escravos
negros. Posteriormente, o tráfico negreiro foi mundialmente difundido pelos
países mercantilistas. C e r c a d e 2 0 milhões d e negros, s e g u n d o d a d o s his­
tóricos, foram abrupta e violentamente retirados d o continente Africano,
m a r c a d o s c o m ferro e brasa, e transportados para as regiões coloniais,
entre elas o Brasil, q u e recebeu cerca de 4 milhões d e negros africanos.
D e 2 0 a 4 0 % d o s negros morriam n o s porões escuros e inóspitos d o s navi­
os negreiros {por isso c h a m a d o d e tumbeiros) durante as viagens.
N o s pontos d e c h e g a d a e r a m vendidos e utilizados n a s m a i s diversas
atividades (agricultura, mineração, serviços domésticos, artesanato etc.).
E s t a v a m sujeitos às mais diversas formas d e castigo e torturas; ex ce s s o de
trabalho, péss i m a s condições de higiene e saúde; baixíssimas expectati­
vas d e vida (muitos morriam depois d e 5 a d e z an os d e trabalho e cerca de
1 0 % mo rr i a m logo n o primeiro ano).
A p e n a s n a Idade C o nt e m p o râ n e a , c o m a decadência d o sistema c o ­
lonial e o desenvolvimento d o capitalismo industrial — q u e necessitava da
e x p a n s ã o d o s m e r c a d o s consumidores, o q u e s o m e n t e seria possível c o m a
existência d e trabalho assalariado n a s nações ainda n ã o desenvolvidas — ,

(8)E nesse ponto, vale considerar as observações d e H a n n a h Arendt: ‘A opinião d e q u e o labor e


o trabalho e r a m a m b o s vistos c o m d e s d é m n a antiguidade p e t o tato d e q u e s o m e n t e o s e s c r a v o s
os e x e r c i a m á u m prec o n c e i t o d o s historiadores m o d e r n o s . O s antigos r a c i o c i n a v a m d e outra
t o rma: a c h a v a m n e c e s s á r i o ter e s c r a v o s e m virtude d a na t u r e z a servil d e t o d a s a s oc upa çõ es
q u e s e r v i s s e m à s n e c e s s i d a d e s d e m a n u t e n ç ã o d a vida. P r e c i s a m e n t e p o r este m o t i v o é q u e a
instituição d a e s c r a v i d ã o e ra ü e l e n d i d a e justificada. L a b o r a r signiticava s e r e s c r a v i z a d o p e l a
n e c e s s i d a d e , e s c r a v i d ã o esta inerente à s c o n d i ç õ e s d a vida h u m a n a . P e l o talo d e s e r e m sujeitos
à s n e c e s s i d a d e s d a vida, o s h o m e n s s ó p o d i a m c onquistar a U b e r d a d e s u b j u g a n d o outros q u e
etes, à torça, s u b m e t i a m à ne c e s s i d a d e . " { Arendt. Hannah. A c o n d i ç ã o h u m a n a . 10a e d „ Rio de
Janeiro, Forense, 2000, p. 94).
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 135

al ém d a s lutas d o s negros pela s u a liberdade, q u e teve Início a d e c a d ê n ­


cia d o regime d e escravidão das n a çõ e s africanas. N o Brasil, s u a abolição
formal ocorreu e m 1888, c o m a promulgação d a Lei Áurea.
N o entanto, a o contrário d e outras formas d e escravidão, a escravi­
d ã o d o s p ovos africanos m a r c o u profundamente suas estruturas sociais e
econômicas, q u e se fazem sentir até os dias atuais q u a n d o se c o m p a r a o
s e u grau d e desenvolvimento e c o n ô m i c o e social c o m o d o s d e m a i s conti­
nentes. O s reflexos e o estigma d a escravidão pairam sobre a população
negra e m qualquer continente e m q u e se encontrem. C o m o aponta Fábio
Konder Compáralo, “O estigma da escravidão ancestral continua, até hoje,
a marcar a alma das populações negras."{S¡

4. A E S C R A V I D Ã O N A I D A D E C O N T E M P O R A N E A
P R O S CRIÇÃO INTERNACIONAL

A Idade C o n t e m p o r â n e a t e m início s o b os influxos d a universalização


d o s ideários b u r g u e s e s d a R e volução Fran c e s a d e 1 7 8 9 e d a s Idéias
iluministas presentes na Constituição da independência d o s Estados Uni­
d o s d a América, e m b o r a a proscrição d a escravidão d o s negros, n esse
país, adveio s o m e n t e ap ós a Guerra d a S u c e s s ã o (1861-1865).
E m 2 6 d e agosto d e 1789, a Assembléia Nacional Francesa procla­
m o u a célebre Declaração d o s Direitos d o H o m e m e d o Cidadão, c o m pre­
missas referentes à dignidade d a p e ss o a h u m a n a , à liberdade e à igualda­
d e d o s cidadãos perante a lei, o direito à resistência e à opressão política,
a Uberdade d e p e n s a m e n t o e d e opinião.
O s princípios d a igualdade, fraternidade e d a liberdade, a doutrina
d o s direitos h u m a n o s e as diversas formas d e manifestação ressoaram por
todo o m u n d o e contribuíram para a proscrição internacional da escravidão
n o período contemporâneo. N o C o n g r e s s o de Viena d e 1815, es sa prática
foi contundentemente condenada. E m 1926, a S o ciedade d a s N a ç õ e s pro­
c l am o u a C o n v e n ç ã o sobre a Escravidão.
A Declaração Universal d o s Direitos d o H o m e m , p r oclamada pela
Organização d a s N a ç õ e s Unidas e m 10 d e d e z e m b r o d e 1948, estabelece
q u e “ninguém será obrigado k escravidão nem em servidão;a escravidão e
o tráfico de escravos são proibidos em todas as suas formas”(artigo 4 S).
E m s e u artigo 52, declara q u e “Ninguém será submetido à tortura,
nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”e, assinala,
n o artigo 13, q u e “todo homem tem direito à liberdade de locomoção e
residência dentro das fronteiras de cada Estado.”
N o mais, a própria Declaração consagra o livre direito a escolha do
trabalho ao dispor q u e “toda pessoa tem direitoao trabalho, a livre escolha
de seu trabalho e à proteção contra o desemprego”(art. 23, item 1).
(9)Comparato, Fábio Konder. 'A afirmação histórica d o s direitos humanos". S ã o Paulo: Saraiva,
2003, p. 198.
136 REVISTA 0 0 T R T D A 15» R E G I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

A C o n v e n ç ã o A m e r i c a n a sobre Direitos H u m a n o s , aprovada n a C o n ­


ferência d e S ã o Jo sé d a Costa Rica, e m 22.11.1969 — Pacto d e S a n Jo sé
d a Costa Rica proíbe as práticas d a escravidão e d a servidão, b e m c o m o
as d e trabalho forçado o u obrigatório.*'01
A C o n v e n ç ã o Suplementar d a s N a ç õ e s Unidas sobre a Abolição da
Escravidão, Tráfico d e Escravos e Instituições e Práticas Seme l h a n te s à E s ­
cravidão, d e 1965, considera c o m o escravidão a "situação ou condição
decorrente do empenho, por parte do devedor, dos seus serviços pessoais
ou dos de pessoas sob seu controle como garantia para uma dívida, se o
valor desses serviços, razoavelmente avaliado, não foraplicado à liquida­
ção da divida, ou se a duração e a natureza desses serviços não forem,
respectivamente, limitados e definidos"(artigo 1S).
A C o n v e n ç ã o n. 29, d a OIT, d e 1930, sobre Abolição d o Trabalho For­
ç a d o utiliza as expressões "trabalho forçado ou “trabalho obrigatório” para
designar todo trabalho o u serviço exigido d e u m indivíduo s o b a m e a ç a de
qualquer penalidade e para o qual ele n ã o se ofereceu d e e spontânea v o n ­
tade" (art. 2 a, item 1)<” >. O Brasil, c o m o os d e ma i s m e m b r o s ratlfioadores
d e s s a C onvenção, obrigou-se a suprimir o e m p r e g o d o trabalho forçado ou
obrigatório s o b todas as su as formas, n o ma is curto prazo possível (art 1s
item 1).

(10) O artigo 6 o d a C o n v e n ç ã o está a s s i m redigido:Art. 6 ‘. Proibição d a e s c r a v i d ã o e d a servidão


§ 1 . N i n g u é m s e r á s u b m e t i d o à e s c r a v i d ã o o u servidão, e tanto e s t a s c o m o o tráfico d e e s c r a v o s
e o tráfico d e m u l h e r e s s ã o proibidos e m t o d o s a s s u a s formas. § 2 a. N i n g u é m s e r á c o n s t r a n g i d o
a e x e c u t a r trabalho f o r ç a d o o u obrigatório. N o s p a í s e s e m q u e s e prescreve, p a r a cert o s delitos
p e n a privativa d e liberdade a c o m p a n h a d a d e trabalhos forçados, esta d isposição n ã o p o d e se r
interpretada n o sentido d e q u e p r o i b e o c u m p r i m e n t o d a dita p e n a , i m p o s t a p o r juiz o u tribunal
c o m p e t e n t e . O trabalho forçado n ã o d e v e afetar a d i g n idade n e m a c a p a c i d a d e física e intelectual
d o recluso. § 3 a. N ã o s e c o n s i d e r a m trabalhos forçados o u obrigatórios p a r a efeitos d e s t e artigo:
a) trabalhos o u serviços n o r m a l m e n t e exigidos d e pessoa
reclusa e m c u m p r i m e n t o d e s e n t e n ç a
o u r e s o l u ç ã o f o r m a l e x p e d i d a p e l a a u t o r i d a d e judiciária c o m p e t e n t e . Tais trabalhos o u serviços
d e v e m s e r e x e c u t a d o s s o b a vigilância e controle d a s auto r i d a d e s públicas, e o s individuos q u e
o s e x e c u t a r e m n ã o d e v e m s e r p o s t o s à disposição d e particulares, c o m p a n h i a s o u p e s s o a s jurí­
dicas d e caráter privado: b) o serviço militare, n o s p a i s a s o n d e s e a d m i t e a i s e n ç ã o p o r m o t i v o s
o e consciência, o serviço n a c i o n a l q u e a lei esta b e l e c e r e m lugar d a q u e l e ; c) o serviço i m p o s t o

e m c a s o s d e p e r i g o o u c a l a m i d a d e q u e a m e a c e a existência o u o b e m - e s t a r d a c o m u n i d a d e e d)
o trabalho o u serviço q u e faça p a r l e d a s o b r i g a ç õ e s cívicas normais."

(11 )Pelo artigo 2', item 2, d a C o n v e n ç ã o n ã o se c o m p r e e n d e n a expressão trabalho (orçado ou


obrigatório: a) qualquer trabalho ou serviço exigido e m virtude d e leis sobre o serviço militar
obrigatório e qu e s ó c o m p r e e n d a trabalhos d e caráter pu ramente militar; b) qualquer trabalho ou
serviço q u e faça parte das obrigações cívicas normais do s cidadãos d e u m a país plenamente
autônomo; c) qualquer trabalho o u serviço exigido d e u m indivíduo c o m o conseqQência d e c o n d e ­
n a ç ã o pronunciada por decisão judiciária, contanto qu e esse trabalho o u serviço seja executado
so b a fiscalização e o controle da s autoridades públicas e q u e dito indivíduo nã o seja posto à
disposição d e particulares, c o mpa nh ias ou pessoas privadas; d) qualquer trabalho o u serviço
exigido no s casos d e força maior, isto é, e m ca so d e guerra, d e sinistro o u a m e a ç a s d e sinistro,
tais c o m o incêndios, inundações, fome, tremores d e terra, epidemias e epizootias, invasões dé
animais, d e insetos o u d e parasitas vegetais daninhos e e m geral todas as circunstâncias qu e
p o n h a m e m perigo a vida o u a s condições normais d e existência d e toda ou d e parte d a popula­
ção; e) p e q u e n o s trabalhos d e u m a comunidade, isto é, trabalhos executados n o interesse direto
d a coletividade pelos m e m b r o s desta, trabalhos que, c o m o tais, p o d e m ser considerados obriga­
ções cívicas normais do s m e m b r o s d a coletividade, contanto, qu e a própria população o u seus
representantes diretos t e n h a m o direito d e se pronunciar sobre a necessidade de sse trabalho.
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A C o n v e n ç ã o n. 105, d a OIT, sobre Abolição do Trabalho forçado dis­


p õ e q u e “Qualquer membro da Organização Internacional do Trabalho que
ratifique a presente convenção se compromete a suprimiro trabalho forçado
ou obrigatório, e a não recorrerao mesmo sob forma alguma: a) como medi­
da de coerção, ou de educação política ou como sanção dirigidaa pessoas
que exprimam certas opiniões políticas, ou manifestem sua oposição Ideo­
lógica à ordem política, social ou econômica estabelecida; b) como método
de mobilização e de utilizaçãoda mão-de-obra para finsde desenvolvimen­
toeconômico; c) como punição porparticipação em greves; d) como medida
de discriminação racial, social, nacional ou religiosa"(art.
O Pacto Internacional d o s Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
prescreve q u e os Estados-Partes r e c o n h e ç a m o direito ao trabalho, q u e
c o m p r e e n d e o direito d e toda p e ss o a d e ter a possibilidade d e g a nh a r a
vida mediante u m trabalho livremente escolhido o u aceito, e tomarão m e d i ­
d a s apropriadas para salvaguardar es se direito (art. 6 S, item 1).
T o d a s as n o r m a s internacionais a cima elencadas, al ém d e outras q u e
n ã o loram citadas, t ê m d u a s preocupações básicas: evitar a utilização de
mão-de-obra servil ou escrava diretamente pelos Estados-Membros, e i m ­
pedir q u e estes perm i t a m a a d o ç ã o d esse regime d e trabalho e m s e u terri­
tório, seja por autoridades públicas e governantes, seja por particulares e
d e ma i s cidadãos.
N o entanto, a proscrição internacional das diversas formas d e escra­
vidão, s e g u i d a d e n o r m a s internas d o s Estados, e m b o r a eficaz na
erradicação d a forma tradicional d e escravidão, a c a b o u por levar a o surgi­
m e n t o d e formas dissimuladas d e escravidão, destacando-se as situações
d e escravidão por dívidas, c o m u m e n t e verificadas n a A m é r i c a Central,
Am ér i c a Latina, África e Sul d a Ásia, cujas características s ã o s e m e l h a n ­
tes à s constatadas n o Brasil, c o m o v e r e m o s a seguir.
E m virtude do aspecto limitado d o presente estudo, deixaremos de
analisar outras formas dissimuladas d e trabalhos forçados, obrigatórios ou
d e escravidão c o nt e m p o r â n e a verificadas, atualmente, em diversos países
— escravidão tradicional, servidão, c a s a m e n t o servil, tráfico d e mulheres,
crianças e adolescentes para exploração sexual etc. — cujas necessida­
d e s d e c o m b a t e s ã o igualmente relevantes as que se verificam n a escravi­
d ã o por dívidas.
Mas, vale ressaltar que, s e m e m b a s a m e n t o legal, essas m o d e r n a s
práticas escravizatórias substituem a idéia d a propriedade juridicamente
garantida sobre a pessoa d e outrem — c o m o n a escravidão r o m a n a — pelo
procedimento d a posse tática e forçada, e m b a s a d a n a dissuasão pelo m edo,

(12)A o qu e nos parece, n u m primeiro momen to , a C o n v e n ç ã o n. 10 5 d a O I T t e m u m a preocupa­


ção imediata c o m a abolição d o trabalho escravo, forçado o u obrigatório praticado por Estados
M e m b r o s . A o prescrever medidas diretas e imediatas para a abolição de ssa espécie d e trabalho
por particulares n o âmbito desses Estados, exige a t o m a d a de providências por ca da Estado
ratificante d a C o n v e n ç ã o n o c o mba te às formas d e escravidão praticadas e m seu território t a m ­
b é m por particulares. C a s o contrário, estaria abrindo-se u m a fenda para o não-cumprimento d a
aludida n o r m a internacional.
136 REVISTA D O T R T D A 15' R E G I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

sobre o corpo e a própria p e s s o a d e indivíduos q u e se e n co n t r a m e m


manifesta posição d e inferioridade. Equivale à transformação d a antiga
figura d o h o m e m - c o i s a (escravo) — considerado a própria res — n a do
h o m e m coisificado.

5. F O R M A S DE ESCRAVIDÃO NO BRASIL
CONTEMPORÂNEO

C o m o vimos, o Brasil iniciou suas atividades e c o n ô m i c a s por me io


d a utilização d a mão-de-obra escrava d o s indígenas nativos e d o s negros
africanos trazidos a o n osso território pelos portugueses, vigorando o regi­
m e escravocrata até o finai d o século passado, q u a n d o e m 1888, foi for­
m a l m e n t e abolida a escravidão.,,3>
A p ó s três séculos e m me lo d e escravidão formalmente admitida pelo
n osso o r de n a m e n t o jurídico, ainda s ã o encontradas diversas formas de
escravidão n o Brasil d o s dias atuais. N ã o d e i x a m o s d e ser u m país
escravocrata. U m a escravocracia camuflada. Hodiernamente, n ã o s o m e n ­
te os negros estão relegados à herança negativa d a escravidão oficial,
c o m o t a m b é m brancos, pobres, mulheres e crianças s ã o submetidos a
verdadeiros regimes escravocratas de trabalho n a s ma is diversas regiões
d o País; d e s d e as mais industrializadas, c o m o o Sul e o Sudeste, à s m e n o s
desenvolvidas, c o m o Norte e Nordeste.
"Em quatro séculos e m e i o d e história d o Brasil, três secutes e meio
foram marcados pela existência da escravidão", cuja influência se faz s e n ­
tir até hoje n a cultura nacional, por gerar a c o n c e p ç ã o d e trabalho c o m o
algo q u e se possa obrigar o outro a fazer e q u e possibilita tratar as p e s ­
so as c o m o mercadorias. Es sa situação nos legou "uma insensibilidade, uma
espécie de descompromisso com a sorte das pessoas que se situam fora

(13)'Te; n. 3 . 3 5 3 d e 1 3 d e M a i o d e 1888. D e c l a r a Extinta A E s c r a v i d ã o n o Brasil. A Pri n c e s a


Imperial R e g e n t e , e m n o m e d e S u a M a j e s t a d e o Imperador, o s e n h o r D. P e d r o II faz s a b e r a t o d o s
o s súditos d o i m p é r i o q u e a A s s e m b l é i a G e r a l d e c r e t o u e Èía sancionou a Lei seguinte: Ar! 12 —
È d e c l a r a d a extinta d e s d e a d a t a d e s t a lei a e s c r a v i d ã o n o Brasil. Art 2 3 -— R e v o g a m - s e a s d i s p o ­
s i ções e m contrário. M a n d a por t a n t o a t o d a s a s autoridades, a q u e m o c o n h e c i m e n t o e e x e c u ç ã o
d a referida L ei pertencer, qu e a c u m p r a m e façam cumprir e guardar tão inleiramerle c o m o nela
s e c o n t é m . D a d a n o palácio d o R i o d e Janeiro, e m 1 3 d e M a i o d e 1 8 8 8 , 6 7 d a I n d e p e n d ê n c i a e d o
Império. P r i n c e s a R e g e n t e Imperial."
Formalmente, porque s e l e m notícias qu e e m muitas regiões do Brasil a escravidão nã o loi
imediatamente eliminada, seja pela resistência dos senhores d e engenho, seja pela ausência de
perspectiva do s negros, que, s e m recursos, e r a m obrigados a trabalhar para seus anligos s e n h o ­
res. A elaboração d a bei Aurea nã o correspondeu u m a m u d a n ç a imediata d e cultura e comporta­
mento. C o m o assinala Irany Ferrari, " c o m a abolição, exigiu-se a elaboração 'de u m a nova
autoconcepção d e status e papéis sociais por parte dos negros e mestiços, a tormação d e novos
ideais e padrões d e comportamento. Ela implicava t a m b é m n a m u d a n ç a d e c o mpo rt ame nto do
h o m e m livre e branco diante d o liberto, d o negro nã o mais escravo, im punha-se u m no vo ajusta­
m e n t o interracíal. A súbita equiparação legal entre negros e brancos, e m 18S8, n ã o destruiu de
imediato o conjunto d e valores q u e se elaborara durante o período colonial. Econômica, social e
psicologicamente, os ajustamentos foram lentos." (Ferrari, irany; Nascimento, Amauri Mascaro;
Martins Filho, Ives Gandra, op. cil.. p. 34}.
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 139

das classes mais favorecidas", está, ainda, atualmente es se espírito


escravista arraigado n a cultura brasileira, seja na discriminação d a m u ­
lher, seja n a discriminação d o negro e se us tratamentos desfavorecidos.'141
N ã o s ã o raras a s vetculações de matérias na imprensa a respeito de
lesões a direitos d e trabalhadores rurais e a s u bmissão d o s m e s m o s às
mais aviltantes condições d e trabalho n o s diversos pontos d o país, c o m o
t a m b é m a denúncia d e subserviência do rurícola ao e m p r e g a d o r em fun­
ç ã o d e dívidas q u e contraiu no curso d a relação d e emprego.',S)
Atualmente, vários m o d o s d e proceder d ã o ensejo à existência do
trabalho escravo, forçado o u obrigatório no Brasil:
a) a constrição d a vontade inicial do trabalhador e m se oferecer à
prestação d e serviços, sendo, por isso, constrangido à prestação d e traba­
lhos forçados s e m sequer emitir sentimento volitivo neste sentido (geral­
m e n t e esta situação ocorre c o m os filhos d e trabalhadores sujeitos a traba­
lho escravo e se us familiares);
b) o aliciamento d e trabalhadores e m u m a d a d a região c o m p r o m e s ­
sas de b o m trabalho e salário e m outras regiões, c o m a superveniente c o n ­
tração d e dívidas d e transportes, d e equipamentos d e trabaiho, d e moradia
e alimentação, cujo p a g a m e n t o se torna obrigatório e permanente, deter­
m i n a n d o a c h a m a d a escravidão por dívidas;
c) o trabalho efetuado s o b a m e a ç a d e u m a penalidade — c o m o a m e ­
a ç a s d e m orte com armas — , geralmente violadora d a integridade física ou
psicológica d o empregador; modalidade q u e q u a s e s e m p r e s e g u e a escra­
vidão por dívidas.
d) a coação, pelos proprietários de oficinas de costuras e m grandes
centros urbanos — c o m o S ã o Paulo — d e trabalhadores latinos pobres e
s e m perspectivas e m seus paises de origem — geralmente bolivianos e
paraguaios — , q u e ingressam irregularmente no Brasil. O s e m p r e g a d o r e s
apropriam-se coativamente d e s u a d o c u m e n t a ç ã o e os a m e a ç a m d e expul­
s ã o d o pais, por meio d e denuncias às autoridades competentes. Obst a d o s
d e l o comoverem-se para outras localidades, diante d a s u a situação irregu­
lar, os trabalhadores s u b m e t e m - s e às mais vis condições d e trabalho e de
moradia (coletiva).
I n de p e n dentemente d a d e n o m i n a ç ã o adotada — "trabalho escravo
c o nt e m p o râ n e o ”, “escravidão por dívidas", “trabalho forçado”, "trabalho obri­
gatório”, " r e d u ç ã o à c o n d i ç ã o a n á l o g a à d e e s c r a v o ”, cujo estudo
diferenciador e detalhado n ã o é objeto deste trabalho — e m todas as hipó­
teses levantadas, constatamos flagrantemente a s e m p r e presença d e ví­
cios d e vontade, seja no início d a arregimentação d o trabalhador, no c o m e ­
ço d a prestação d e serviços, n o curso d a relação d e trabalho e até m e s m o

(14 ¡Maior, J o r g o Luiz Souto." O direito d o trabalho c o m o instrumento d e justiça social". S â o Paulo:
LTr, 2000. pp. 61-63.
( \ 5)Sent:-Sé, Jairo Lins d e A l b u q u e r q u e , op. d!, pp. 16-17.
140 REVISTA D O T R T D A 15a REG I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

por ocasião d o s e u término. O s mais diversos m é t o d o s d e coação, simula­


ção, fraude, dolo, indução a erro, s ã o e m p r e g a d o s para cercear a vontade
d o e m p r e g a d o e obrigá-lo à prestação d e serviços contra a sua vontade.
A l é m d a posse fática exercida sobre a própria pessoa subjugada e dos
vícios d e vontade, u m a outra característica m a r c a todos esses movimentos: a
atividade d e s e m p e n h a d a peio trabalhador n ã o transfere a q u e m dela se b e ­
neficia s o me n t e s u a força d e trabalho (laboi), c o m o sói acontecer nas tradici­
onais formas contratuais d e trabalho, m a s c o n s o m e a própria pessoa do tra­
balhador, s u a energia e seu corpo; desgasta-o; desfalece-o; retira s u a vida.
N ã o se trata, evidentemente, d e relações juridicamente caracteriza­
d a s c o m o d e trabalho, e muito m e n o s d e emprego, nelas n ã o se encontra
o homo faber, n o sentido expresso por Hannah Arendt, c o m o aquele q u e
cria, a o trabalhar sobre o s materiais, m a s algo próximo d o s e u animaI
laboraos, n a m e d i d a e m q u e o homo mistura-se c o m os materiais por ele
m e s m o utilizados, consoante o restrito e contextualizado significado c o m
o qual o e s t a m o s e m p r e g a n d o e, c o m a diferença fundamental d e q u e
para Arendt, o animai laboraos é servo d a natureza e d a terra e, n o nosso
contexto, ela apresenta-se c o m o subjugado às vontades d e outrem.

6. A E S P E C Í F I C A E S C R A V I D Ã O P O R DÍVIDAS N O B R A S I L

O m o d o peculiar e ma is conhecido d e forma escravizatória n o Brasil


c o nt e m p o r â n e o é a d e n o m i n a d a escravidão por dfvidas, instituto h á muito
conhecido n a história d a h u m a n i d a d e e largamente utilizado nas diversas
é p o c a s d a história d o nosso país.
A escravidão por dfvidas é conhecida d e s d e a Babilónia. N a Grécia
Antiga, ela desenvolveu-se, no período Homérico, a o lado d a escravidão
d o s prisioneiros d e guerra, para atingir diretamente os próprios m e m b r o s
d a c o m u n i d a d e . E m A t e n a s foi largamente utilizada. A conc e n t r aç ã o
fundiária n a s m ã o s d o s nobres atenienses empobrecia os p e q u e n o s pro­
prietários e a u m e n t a v a a s su as dfvidas. Diante d a insuficiência d e recur­
s o s d o s devedores, os nobres p a s s a r a m a apoderar-se d a s próprias p e s ­
s o a s d o s devedores, tornando-se se us proprietários e transformando-os
e m escravos. Para sanar dívidas, t a m b é m era c o m u m os pais v e n d e r e m
se us filhos o u filhas considerados rebeldes, ato c o m u m e m sociedades
patriarcais. S o m e n t e c o m a legislação d e Sólon, os cidadãos transforma­
d o s e m escravos foram oficialmente libertados.
N a R o m a Antiga, tornou-se c o m u m a escravização d o s plebeus {ho­
m e n s livres, s e m status d e cidadãos, q u e s e d e d i c a v a m a o comércio, ao
artesanato e a o trabalho agrícola) por dívidas contraídas junto a o s Patrícios
(cidadãos roma n o s , grandes proprietários d e terras, reba n h o s e escra­
vos). S u a proibição oficial ocorreu por volta de 3 6 6 a.C., q u a n d o foi edita­
d a u m a lei q u e proibia a escravidão d e r o m a n o s por dívidas.
N o Brasil, a escravidão por dívidas t e m existência n o período do
colonato; o s colonos q u e c h e g a r a m ao Brasil e m 1 8 5 3 e r a m sujeitos à
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 141

escravidão por dívidas. C o n f o r m e a descrição q u e Irany Ferrari extrai d a


obra M e m ó r i a s d e u m C o lo n o n o Brasil, d o suíço Thomaz Davatz, o proce­
dimento ocorria d e m o d o semelhante ao abaixo-transcrito:
“os colonos recebiam dinheiro adiantado para a v i a g e m d e H a m b u r ­
g o a Santos e deste porto à F a z e n d a Ibicaba, no Município d e Limeira, de
propriedade d e Vergueiro & Cia. E s s e adiantamento já era o c o m e ç o de
u m a dívida q u e deveria ser reembolsada, acrescida d o s juros legais.
A es sa primeira dívida acrescentava-se u m a segunda, relativa à c o ­
missão q u e tinham os colonos, su as mulheres e seus filhos q u e pagar pelo
contrato e pelo q u e n e m sequer constava no contrato. C o ns t a q u e tai c o ­
missão s e destinava a pagar os agentes d a empresa, n a Europa.
Ao desembarcarem, eram trancados em um pátio enorme. Depois de
paga ou garantida a dívida dos colonos (dinheiro da passagem mais co­
missão), o colono era destinado a outroproprietário, caso não ficassepara
trabalharna firma Vergueiro & Cia. Aí, então, compreendia que tinha sido
comprado, como se fosse uma mercadoria. E quando o colono era destina­
do a outro proprietário? Exatamente quando não tinha podido saldar sua
dívida com Vergueiro& Cia.”1'*1
N o s dias atuais, a escravidão por dívidas t e m sido a vitrina mais visível
dos diversos m o d o s d e escravidão presente e m nossa sociedade. Jairo Lins
d a Albuquerque Sento-Sé descreve minuciosamante1'71 c o m o se verifica a
escravidão por dívidas e m nosso país. S e g u n d o sua narrativa, a qual sinte­
tizamos e simplificamos, o procedimento, e m geral, ocorre d o seguinte modo:
a) o e m p r e g a d o recebe u m a proposta d e e m p r e g o bastante tenta­
dora para trabalhar e m u m determinado local, n o rm a l m e nt e m u i ­
to distante d e s u a cidade natal;
b) são-lhe oferecidos salários atraentes e feitas p r o m e s s a s d e m e ­
lhores condições d e vida;
c) a tarefa d e arregimentação e recrutamento d a mão-de-obra é
realizada por empreiteiros, "gatos’’, “z a n g õ e s ” o u “turmeiros”,
via d e regra, m e r o s prepostos d o s e m p r e g a d o r e s rurais;
d) os “gatos” n ã o e x ig e m qualquer d o c u m e n t o d e identificação ou
Carteira de Trabalho d o s Trabalhadores, m a s q u a n d o apresen­
tado a l g u m documento, eles retêm, para criar u m víncuio d e d e ­
pendência entre o trabalhador e o suposto empreiteiro;
e) o arregimentador geralmente adianta u m a p e q u e n a quantia e m
dinheiro para o trabalhador satisfazer as su as necessidades b á ­
sicas e as d e s u a família. Este n ã o s a b e q u e é a s u a primeira
dívida perante o empregador; início d o débito q u e o reduzirá à
escravidão; 16
(16) Ferrari, Irany; N a s c i m e n t o , A m a u r i M a s c a r o ; Martins Filho, Ives G a n d r a , op. dl., p. 39.
(t7 ) S e n t o - S é , Jairo U n s d e A l b u q u e r q u e , op. cif., passim.
142 REVISTA D O T R T D A 15“ REGI Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

f) q u a n d o inicia o trabalho, o trabalhador percebe o e n g o d o e m


q u e foi envolvido, o e m p r e g a d o r lhe s u b m e t e a u m a jornada de
trabalho insuportável; o p a g a m e n t o é q u a s e todo feito in natura
— alimentos e vestuário adquiridos nos barracões d o e m p r e g a ­
dor — e o débito para c o m o patrão vai a u m e n t a n d o d e tal m a ­
neira q u e o valor q u e eie t e m a receber n ã o é suficiente para
saldar a s u a dívida;
g) muitas vezes, c o m o forma d e aiiciar os trabalhadores, o futuro
e m p r e g a d o r quita a dívida desses c o m as p e n s õ e s o n d e p e r m a ­
n e c e m n o s períodos d e entressafra;
h) a dívida a u m e n t a vertiginosamente n o local d e serviços. A o c h e ­
gar a o seu destino, os trabalhadores r e c e b e m os equipamentos
essenciais para realizar o s e u trabaiho ( c o m o facão, facas, b o ­
tas, c h a p é u etc.), juntamente c o m aqueles fundamentais para a
s u a sobrevivência (rede d e dormir, panelas, mantimentos, lonas
para barraca e outros), todos cobrados pelo empregador, a pre­
ços superiores aos d o mercado;
i) os gêneros alimentícios d e primeira necessidade s ã o vendidos
pelo próprio proprietário rural e m s u a fazenda a preços acima
d o s d e m e r c a d o e descontados d o salário d o obreiro a o final do
mês. E o c h a m a d o sistema d e barracão ou truck-system. Por ser
u m a p e ss o a d e p o u c o discernimento, muitas vezes analfabeta, o
trabalhador perde totalmente o controle d o valor d a dívida e é
facilmente ludibriado pelo credor;
j) s o b a justificativa d e n ã o ter sido quitado todo o débito, o e m p r e ­
g a d o é coagido pelo fazendeiro e obrigado a prestar serviços
m e s m o contra a s u a vontade;
k) q u a n d o decide a b a n d o n a r o emprego, o trabalhador é coagido a
manter a relação d e trabalho;
l) a d v é m c o a ç ã o física e detenção ilegal de documentos.

C o m o se percebe, apesar d e o Brasil ter u m a d a s legislações mais


a v a n ç a d a s n o concernente à proteção d o salário e d a r e mu n e r a ç ã o d o tra­
balho, dedicando todo o capítulo II d o título IV d a Consolidação d a s Leis do
Trabalho para a disciplina d a matéria, al ém d e outras n o r m a s esparsas1'8',
a constrição d o salário d o s trabalhadores e o seu controle por m e i o das
dívidas por estes contraídas constituem a s f o r m a s preferidas peios
escravagistas para coagi-los à prestação forçada d e serviços.18

(18) S ã o a l g u m a s delas: Portaria n. 3.281, d e 7.12.198*1, qu e dispõe sobre o p a g a m e n t o d e


salários e férias por m e i o d e cheque; Lei n. 3.030, d e 19.12.19561 determina os percentuais
d e desconto a título d e alimentação; Lei n. 5.725, d e 27.10.1971, regulamenta descontos a
título d e pr estação para aquisição d e imõveis pelo S i s t e m a Financeiro d a Habitação; Lei
n. 7.06*1, d e 6.12.1982, possui n o r m a s específicas sobre o p a g a m e n l o d e salário e r e m u n e r a ­
çã o d e trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços n o exterior; Lei n. 6.019,
d e 3.1.197*1, assegura a isonomia salarial entre o trabalhador temporário e os e m p r e g a d o s da
e m p r e s a tomadora.
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 143

Várias s ã o as normas, d e proteção a o trabalho, violadas pelas práti­


cas a c i m a enunciadas. O p a g a m e n t o a o e m pr e g a d o, q u a n d o feito, o é c o m
drástica redução, e m virtude d o s descontos peio fornecimento d e instru­
m e n t o s d e trabalho, moradia e gêneros alimentícios; isto, q u a n d o ele n ã o é
direcionado díretamenle para os d o n o s d e p e n s õ e s para p a g a m e n t o da
estada d o s trabalhadores no período entressafras, d e m o d o q u e nada, ou
q u a s e nada, sobra, verdadeiramente, a o e mpregado.
Tais procedimentos ferem os princípios d a pessoalidade d o salário
(arf. 4 6 4 d a CLT), d a intangibilidade d o salário (art 462, caput, d a CLT), da
irredutibilidade d o salário (art.72, inciso VI, d a Constituição Federal) e, prin­
cipalmente, a v e d a ç ã o à prática d o trucksystem (§ 2 2 e 32 d o artigo 4 6 2 da
CL T) e a determinação d o p a g a m e n t o d a prestação e m espécie d o salário
e m m o e d a corrente do país (art. 4 6 3 d a CLT).
N o ca so específico d a escravização no me io rural, h á ainda víoíação
a o s dispositivos d a Lei n. 5.889, d e 08.6.1973, q u e estatui n o r m a s regula­
doras d o trabalho rural, que, mutatis mutandis, consagra os m e s m o s prin­
cípios d a legislação consolidada. T e m sido c o m u m , proprietários rurais,
c amuflarem o regime d e trabalho forçado ou d e redução à condição análo­
g a a d e escravo c o m a figura d o arrendamento. Esta dissimulação possui
u m a justificativa histórica, pois o arrendamento, juridicamente previsto e m
n osso ordenamento, é a forma contratual q u e mais se aproxima d o regime
d e servidão, s e n d o e xatamente o regime d e trabalho q u e p a ss o u a ser im­
posto aos servos d a gleba n o início d a decadência d e s s e regime.
A l é m das n o r m a s trabalhistas infligidas, as condutas descritas tipificam
os crimes definidos n o Código Penal, e m seus artigos 1 4 9 (redução de
a l g u é m à condição análoga à d e escravo); art. 2 0 3 (frustração d e direitos
trabalhistas mediante fraude o u violência); art. 132, parágrafo único, (expo­
sição d a vida o u d a s a ú d e d e outrem a perigo direto e iminente decorrente
d o transporte e m condições ilegais); e 2 0 7 (aliciamento d e trabalhadores,
c o m o fim d e levá-los d e u m a para outra localidade d o território nacional).
E s s a famigerada prática t a m b é m afronta os preceitos d a C o n v e n ç ã o
n. 95, d a OIT, sobre Proteção a o salário, d e 1949, aprovada n o Brasil, por
m e l o d o Decreto Legislativo n.24, d e 29.5.1996.(,9)

(19 )Enlre outras disposições, a C o n v e n ç ã o n. 95, d a O I T dispõe: “Art. t- Paca o s iins d a p r e s e n t e


C o n v e n ç ã o , o t e r m o 'salário'significa, q u a l q u e r q u e seja a d e n o m i n a ç ã o o u o m o d o d e cálculo, a
r e m u n e r a ç ã o o u o s g a n h o s suscetíveis d e s e r e m avaliados e m e s p é c i e o u fixados p o r a c o r d o o u
p e l a legislação nacional, q u e s ã o d e v i d o s e m virtude d e u m contrato d e aluguel d e serviços,
escrito o u verbal, p o r u m e m p r e g a d o r a u m trabalhador, seja p o r trabalho aletuado, o u p e l o q u e
d e v e r á s e r efetuado, seja p o r serviços p r e s t a d o s o u q u e d e v a m s e r prestados. Art. 3 - 1. O s
salários p a g á v e i s e m e s p é c i e s e r ã o p a g o s e x c l u s i v a m e n t e e m m o e d a d e c u r s o legal: o pagamen­
to s o b a l o r m a d e o r d e m d e p a g a m e n t o , bônu s , cupons, o u s o b q u a l q u e r outra f o r m a q u e s e
s u p o n h a repre s e n t a r a m o e d a d e c u r s o legal, s e r á proibido.2. A a u t o r i d a d e c o m p e t e n t e p o d e r á
permitir o u p r e s c r e v e r o p a g a m e n t o d o salário e m c h e q u e o u vale postal, q u a n d o e s s e m o d o d e
p a g a m e n t o l o r d e prática corrente o u necessária, e m r a z ã o d e circunstâncias especiais, q u a n d o
u m a c o n v e n ç ã o coletiva o u u m a s e n t e n ç a arbitrai o determinar, o u quancío, a p e s a r d e lais d i s p o ­
sições, o trabalhador inter e s s a d o consentir. “Art. 4 - ‘N o s c a s o s e m q u e o p a g a m e n t o parcial d o
salário e m es p é c i e é autorizado, s e r ã o t o m a d a s m e d i d a s a p r o p r i a d a s p a r a qu e : as
prestações
e m espécie sirvam p ara o
u s o p e s s o a ! d o trabalhador e d e s u a fam/tia e l h e s t r a g a m benefício: b)
144 REVISTA D O T R T D A 15® R E G I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

O trabalhador envolvido n e s s a situação é privado d a s u a condição


d e ser h u m a n o , deixa de ser u m destinatário dos b e n s e produtos por eie
produzidos para assumir a condição d e instrumento d e trabalho. Perde
s u a dignidade, s u a i m a g e m e, n ã o raramente, s u a própria identidade, u m a
vez q u e s e vê desprovido até d e laços d e família e d o s valores d e cidada­
nia. S e u trabalho perde o valor sociai e h u m a n o e s t a m p a d o no artigo 1a d a
Constituição Federal de 1988.
E s s a prática viola várias cláusulas pétreas asseguradoras d e direitos
fundamentais contidas n a n o s s a Carta Política, específicamente a não-per­
missão d a imposição d e p e n a d e morte, de caráter perpétuo, d e trabalhos
forçados, d e banimento e tratamento cruéis (artigo 5 a, inciso XVII), e u m
Estado q u e permite e s s a prática por particulares, está, d e toda forma,
desc u m p r in d o o preceito constitucional, a cuja observância ele está, indu­
bitavelmente, obrigado.
E m decorrência d a m u d a n ç a radical d e localidade, desenvolve-se u m
processo d e desesiruturação das famílias d o s trabalhadores submetidos a
estas condições, pois, guardadas as devidas proporções, d a m e s m a m a ­
neira q u e h o u v e o deslocamento d e escravos negros africanos para as ter­
ras americanas, h á u m deslocamento d e trabalhadores rurais d e u m esta­
d o para o outro dentro d o território brasileiro, o u dentro d e E s t a d o s
territorialmente grandes c o m o Pará, A m a p á , M a t o G r o s s o d o Sul, etc. Alici­
a d o s c o m propostas d e e m p r e g o s e moradia, eles d e i x a m se us locais d e
residência e su as famílias para estabelecerem-se nas propriedades dos
contratantes, terminando c o m o escravos destes.<20)

o valoi atribuido a es sas prestações seja justo e razoável. Art. 5 - 0 salário será p a g o diretamen­
te a o trabalhador interessado, a m e n o s q u e a legislação nacional, u m a co nve nç ão coletiva ou
u m a sentença arbitrai disponha diferentemente, ou qu e o trabalhador Interessado aceite outro
processo. Art. 6 - Fica o e m pre ga dor proibido d e restringir a liberdade d o trabalhador d e dispor de
se u salário d a maneira qu e lhe convier. Art. 7' — 1. Q u a n d o e m u m a e m p r e s a forem Instaladas
lojas para vender mercadorias a o s trabalhadores o u serviços a ela ligados e destinados a fazer-
lhes fornecimentos, n e n h u m a pressão será exercida sobre os trabalhadores interessados para
qu e eles f a ç a m uso dessas lojas o u serviços. "2. Q u a n d o o acesso a outras lojas o u serviços não
for possível, a autoridade competente tomará m e did as apropriadas n o sentido d e obter q u e as
mercadorias sejam fornecidas a preços justos e razoáveis, ou q u e as obras o u serviços estabele­
cidos pelo e m pre ga dor nã o sejam explorados c o m fins lucrativos, m a s sim no interesse do s traba­
lhadores, Art. 8 1. Descontos e m salários nã o serão autorizados, s e n ã o so b condições e limites
prescritos pela legislação nacionaf o u fixados por co nvenção coletiva o u sentença arbitrai.2. O s
trabalhadores deverão ser informados, d e maneira q u e a autoridade competente considerar mais
apropriada, sobre condições e limites nos quais tais descontos p u d e r e m ser eietuados. Art. 9. -
Fica proibido qualquer desconto do s salários cuja finalidade seja assegurar p a g a m e n t o direto ou
indireto d o trabalhador a o empregador, a representante deste o u a qualquer intermediário (tal
c o m o u m agente encarregado d e recrutar mão-de-obra, c o m o fim d e obter ou conservar u m
emprego."
(20)0 jornal F o l h a d e S ã o Paulo, 16 nov. 2001, noticiou o “Ministério d o Tra b a l h o já localizou e
libertou, d e janeiro a s e t e m b r o d e s t e ano, 1.812 e m p r e g a d o s rurais e s c r a v i z a d o s e m fazendas do
interior d o pais. S e g u n d o o c o l a b o r a d o r d o jornal, "a m o d a l i d a d e m a i s c o m u m n a s l a z e n d a s b r a ­
sileiras á a es c r a v i d ã o p o r dívida - guando o e m p r e g a d o r obriga o s t r abalhadores a p a g a r p o r
transporte, c o m i d a e ferramentas. H ã t a m b é m c a s o s d e p e õ e s m a n t i d o s n o trabalho p o r m e i o d a
r e t e n ç ã o d e d o c u m e n t o s o u d e a m e a ç a s físicas.'’
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 145

O s trabalhadores submetidos a es sa forma d e trabalho forçado, al ém


d o desprezo d a s u a vontade, ficam submetidos a o s mais diversos tipos de
castigos físicos e psicológicos: a) eles e se us familiares, principalmente
s e u s filhos, s ã o privados d o acesso às escolas; b) desfazimento d o s víncu­
los conjugais e familiares; c) sujeição à contração d e moléstias contagio­
sas e d o e n ç a s endémicas, al ém daquelas decorrentes d a prestação de
serviços e m condições s u b u m a n a s ; d) jornadas d e trabalho sobre-hu­
m a n a s , s e m alimentação condigna; e) inexistência d e repousos sema n a i s
remunerados; f) a p reensão d e se us d o c u m e n t o s e d o s se us familiares; g)
d e s a m p a r o a o sofrer a l g u m acidente d o trabalho o u d o e n ç a profissional
q u e os d e i x e m incapacitados, transitória ou permanentemente, para o tra­
balho; h) n ã o adaptação a o clima ou condições d e alimentação d o s luga­
res para os quais foram levados para trabalhar; i) condições s u b u m a n a s
d e higiene e d e habitat; s e m alo/amenfos dignos, inexistência d e á g u a
potável, ausência d e serviços médicos; j) d e s a m p a r o d a família e m ca so
d e morte o u d o e n ç a d o trabalhador; I) perda d a identidade c o m o p e ss o a
h u m a n a ; i) baixa expectativa d e vida; m ) escravização d e filhos e familia­
res; n) punições e maus-tratos físicos e psicológicos; o) altos índices d e
acidentes d e trabalho, muitas vezes, c o m ocorrência d e mutilações e/ou
mortes.
A descrição d o trabalho escravo c o n t e m p o r â n e o s e a s s e m e l h a e m
muito a o trabalho escravo d a é p o c a colonial. A o trocar-se a figura d o s e ­
nhor d e e n g e n h o pela d o fazendeiro e a do feitor pela d o gato o u capataz,
a s similaridades s ã o gritantes, c o m o se extrai d a descrição d e Gilberto
Cotrim:
“sob a fiscalização do feitor, o negro era obrigado a trabalhar, em
média, 15 horas por dia. Além disso, caso desobedecesse a ordens, sofria
vários tipos de castigo e torturas: chicotadas, queimaduras, prisão e m ca­
labouço etc."O “excesso de trabalho, a má a/imenfapão, as péssimas con­
dições de higiene, os castigos acabavam deteriorando rapidamente a saú­
de do escravo. A maioria morria depois de cinco a dez anos de trabalhò.’v')

7. TRANS1NDIVIDUALIDADE D O S D A N O S D E C O R R E N T E S
DE PRÁTICAS ESCRAVIZATÓRIAS

Escravizar u m indivíduo equivale à escravização d e toda a nação.


D e s s a simples e profunda assertiva exírai-se a natureza difusa d a s práti­
c a s escravizatóhas. A proibição d a escravidão é u m direito de toda a socie­
d a d e e, quiçá, d a huma n i d a de , c o m o e x p r e s s a m as declarações interna­
cionais. O s titulares d e s s e direito s ã o indeterminados e, espraiam-se por
toda a sociedade — a m e r a circunstância fática d e se localizar n o território
brasileiro deixa o indivíduo protegido contra a escravidão — proteção erga
omnes. S u a natureza é indivisível, o usufruto por u m indivíduo n ã o obsta o
g o z o por outros, e a violação e m relação a u m a pessoa, equivale a viola-

(21 )Cotrim, Gilberto. "História global”:Brasil e geral. 5® e d . S â o Paulo: Saraiva, 1999. p. 212.
14$ REVISTA D O T R T D A 15* R E G I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

ç ã o total d o direito. É insuscetível, por Isso, d e disposição coletiva o u indivi­


dual, d e sorte q u e a ninguém, ainda q u e voltivamente, é d a d o submeter-
se a práticas escravizatórias, pois s u a esfera d e repercussão atinge a toda
a sociedade, isto é, transcende a m e r a esfera individual.122»
Escravizar é violar direitos fundamentais e difusos da sociedade, c o n ­
sagrados n a Constituição Federal d e 1988, entre a quais se destacam: a
proteção à dignidade d a p e s s o a h u m a n a (art. 1®, lll); os valores sociais do
trabalho e d a livre iniciativa (artigo 1B, IV); a inviolabilidade d o direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à s e gurança (art. 5®, capuí); a construção d e
u m a sociedade livre, justa e solidária (art. 3®. I); o princípio d a legalidade
(art. 5®, II); n ã o s u bm i s s ã o à tortura o u a tratamento d e s u m a n o o u degra­
dante (art. 5®, lil); a inviolabilidade d a intimidade, d a vida privada, d a honra
e d a i m a g e m (art. 5®, X); a liberdade d e exercício d e trabalho, ofício ou
profissão (art. 5®, XIII); a liberdade d e l o co m o ç ã o (art. 5®, XV); a função
social d a propriedade (art. 5 a, XXIil); a proibição d e imposição d e p e n a de
trabalhos forçados e cruéis (art. 5®, XLVI); a proibição d e prisão civil por
dívida (art. 5®, LXVil).
Torna-se evidente que, se a própria p e s s o a subjugada a e s s a s práti­
cas n ã o t e m reconhecidas s u a liberdade e dignidade, todas essas formas
d e trabalho forçado v ê m a c o m p a n h a d a s d a s u b m i s s ã o d o s trabalhadores
à s ma is vis e d e s u m a n a s condições d e trabalho. Por elas t a m b é m s ã o vio­
lados direitos coletivos123» d o s trabalhadores c o m o a salubridade d o meio
ambiente e a proteção à saúde, dentre outros, al ém d e diversos interesses
individuais h o m o g ê n e o s 124», posto que, a c o m p a n h a m esses m é t o d o s a n ã o
satisfação d e u m a série d e direitos trabalhistas d o s trabalhadores, que, por
decorrerem d e u m a origem c o m u m , revestem-se d e h o mo g e n e id a d e , de
m o d o a propiciar a s u a tutela processual conjunta. Entre os diversos direi­
tos individuais lesados destacam-se: o n ã o p a g a m e n t o d o s salários inte­
grais; n ã o p a g a m e n t o d o 13® salário, d a s férias e d o s repousos sema n a i s
remunerados, e a su as respectivas concessões, e todos os d e m a i s títulos
decorrentes d e u m a relação d e trabalho.
A l é m desses efeitos, essas práticas d ã o ensejo à reparação por d a ­
n o s morais e m três esferas distintas: d a n o moral difuso (à i m a g e m da
sociedade); d a n o moral coletivo (do grupo globalmente considerado) e d a n o 234*

(22) A inalienabilidade da pessoa h u m a n a já era normativamente expressa na Declaração d e Di­


reitos d o H o m e m e d o Cidadão da Consliluiçào Francasa d e 1793. “Art. 18. T o d o h o m e m p o d e
e m p e n h a r s e u s serviços e t e m p o ; m a s n ã o p o d e v e n d e r a si próprio n e m s e r vendido; s u a pessoa
n ã o ê p r o p r i e d a d e aiienâvei. A lei n ã o r e c o n h e c e a d o m e s t i c i d a d e ; s o m e n t e p o d e existir u m a
o b r i g a ç ã o d e c u i d a d o s e d e r e c o n h e c i m e n t o , entre o h o m e m q u e trabalha e o q u e emprega.".

(23) Legalmente, o s interesses coletivos são definidos c o m o os "transíndiviüuais d e n a t u r e z a indi­


visível d e q u e seja titular grupo, categoria o u clas s e d e p e s s o a s ligadas entre si o u c o m a parte
contrária p o r u m a relação jurídica C a s e ” (artigo 81, li, da Lei n. 8.078/90).
(24) O s interesses individuais h o m o g ê n e o s s ã o interesses individuais d e pessoas determinadas,
c o m u m e n t e disponíveis e d e fruição singular, m a s decorrentes d e u m a origem c o m u m , q u e lhes
c o nce de h o m o g e n e i d a d e e possibilita o seu tratamento processual conjunto e unilorme, s e m que,
por tal fato, p e r c a m a nota d a su a individualidade. S A N T O S , Ronaldo Lima. A tutela p r o c e s s u a l
sindical do s direitos metaindividuais — oilusos, coletivos e individuais h o m o g ê n e o s — p e r a n t e a
Justiça d o Trabalho. 2002. pp. 84-5. Dissertação d e mestrado. Faculdade d e Direito, Universidade
d e S ã o Paulo, S ã o Paulo.
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 147

moral individual h o m o g ê n e o (correspondente aos d a n o s sofridos d e forma


pessoal por c a d a trabaihador encontrado na situação e m comento); cujas
reparações p o s s u e m finalidades distintas e independentes, sendo, por isso
específicas e, assim, passíveis d e s e r e m exigidas concomitantemente.

8. F O R M A S D E C O M B A T E A O T R A B A L H O E S C R A V O
E PROPOSTAS SOLUCIONANTES

A realidade d o trabalho escravo, forçado ou e m condições análogas


a d e escravo é integralmente complexa, d e m o d o a exigir u m a série
diversificada d e procedimentos para a s u a devida solução. A necessidade
p r e m e n t e d e alijamento d e s s a forma d e exploração h u m a n a Invoca u m a
plena m o v i m e n t a ç ã o d a sociedade n o c o m b a t e a o seu desenvolvimento
e m nosso território.
N ã o t ê m sido p o uc a s as atuações d o Ministério Público d o Trabalho,
d a Polícia Federal e d o s Auditores do Ministério d o Trabalho1251 na batalha
contra a proliferação d o trabalho escravo n o Brasil, c o m a propositura de
a ç õ e s civis públicas, fiscalizações e fechamento d e fazendas, detenção de
escravagislas e outras m e d i d a s q u e ainda n ã o se tornaram suficientes, e m
virtude d a extensão territorial d o n osso país e d a dificuldade d e ss e s ór­
g ã o s d e adentrar a o s cantões e m q u e se verificam e ssas práticas odiosas.
N o c a m p o específico d a tutela processual, é p l en a m e n te possível,
paralelamente às atividades d o Ministério Público d o Trabalho, q u e já v ê m
se desenvolvendo, a participação d a s entidades sindicais n o c o m b a t e a
esta f orma d e exploração d o trabalho h u m a n o , e aqui, e n t e n d e m o s cabível
a utilização d o s diversos instrumentos jurídicos d e tutela d o s direitos meta-
indivlduais d o s trabalhadores (Leis n. 7.345/85 e 8.078/90), p o d e n d o as
entidades sindicais fazer u s o d a a ç ã o cíví! pública e m face d e certo
“escravizador'' (empregador) para a c e s s a ç ã o d a s práticas escravizantes
e m determinada localidade, b e m c o m o d o s atos d e aliciamento, al ém da
responsabilidade pelos d a n o s morais ocasionados à coletividade, como,
outrossim, ingressar, cumulativamente, n a m e s m a lide o u d e forma autôno­
m a , c o m aç ão coletiva para a defesa d e direitos individuais h o m o g ê n e o s
d o s trabalhadores, c o m o o p a g a m e n t o d o s seus haveres trabalhistas e dos
d a n o s morais individualmente sofridos, s e m prejuízo d a reparação pelos
d a n o s morais coletivos.
N a esfera processual trabalhista, deveria ser elaborada u m a legisla­
ç ã o q u e disciplinasse o trâmite das ações coletivas e individuais decorrente
d e situações c o m o as descritas neste trabalho, dando-se preferência d e trâ-

( 2 5 ) C o m a criação d o G r u p o Móvel do Trabalho e m 1995, o s Audilores Fiscais do Trabalhos co n ­


seguiram, até abril de 2003, a liOerlaçâo de. a p r o x i m a d a m e n t e , 5.993 trabalhadores e o p a g a ­
m e n t o d e mais d e 6.3 milhões d e reais d e verbas trabalhistas. (Jornal Folha d e S ã o Paulo, 6 de
abril d e 2003, C a d e r n o Brasil, p. A 15.)
146 REVISTA D O T R T D A 15» R E G I Ã O — N. 24 — JUNHO, 2004

mite processual, c o m maior celeridade e simplificação, posto q u e a liberta­


ç ã o d o s trabalhadores geralmente é seguida d e u m d e s a m p a r o social e
financeiro q u e lhes obsta até d e retornarem aos seus locais d e origem,1261
N o c a m p o d a tutela penal, h á necessidade d e u m a punição mais
presente e ma is eficaz, pois, atualmente, observa-se u m desinteresse do
Judiciário e m relação a o s delitos praticados n a s diversas c o n d u t a s
escravaglstas. N a Justiça Federal, até abril d e 2003, registrava-se s o m e n t e
u m único ca so d e c o n d e n a ç ã o e m sentença definitiva d e u m fazendeiro,
cujo resultado foi m e r a m e n t e simbólico: E m Fevereiro d e 1998, u m fazen­
deiro, c o n d e n a d o por trabalho escravo, foi punido c o m a obrigatoriedade
d e doar, mensalmente, durante u m semestre, cinco cestas básicas à C o ­
m i ss ã o Pastoral d a Terra.127* A atribuição d e competência penal a o Ministé­
rio Público d o Trabalho, cuja sensibilidade decorrente d o contato c o m es sa
realidade é ma is notável, traria maior eficácia à tutela penal, principalmen­
te c o m a conjugação d a s provas obtidas n o âmbito d o inquérito civil público
trabalhista c o m a investigação criminal, tornando o conjunto probatório mais
consistente.
A l é m d a punição penal, d e v e m ser sujeitas à expropriação as propri­
e d a d e s o n d e se constate a utilização d e m ã o- d e - o b r a nos termos aqui
estudados.
A o lado d a s c o n d u t a s fiscalizatórias e d a tutela processual d o s
órgãos e entidades legitimadas para agir e m juízo para a imediata liber­
tação d o s trabalhadores, imprescindível a a d oç ã o d e me di d a s pós-liberta-*20

(26 Experiência legislativa extrajudicial nesse c a min ho adveio c o m a edição d a Lei n. 10.608, de
2 0 d e D e z e m b r o d e 2002, q u e alterou a redação d a Lei n. 7.998. d e 11 d e janeiro d e 1990, para
assegurar o p a g a m e n t o d e seguro-desemprego a o trabalhador resgatado da condição análoga à
d e escravo: "Faço saber qu e o Presidente d a República adotou a Me d i d a Provisória n. 74, de
2002, q u e o Co ngresso Nacional aprovou, e eu, R a mez Te bet , Presidente d a M e s a d o Co ngr es so
Nacional, para o s efeitos d o disposto n o art. 6 2 d a Constituição Federal, c o m a redação d a d a pela
E m e n d a Constitucional n. 32, d e 2001, promulgo a seguinte Lei: Art. 1“ O art. 2» d a Lei n. 7.998,
d e 11 d e janeiro d e 1990. pa ssa a vigorar c o m a seguinte redação: Art. 2’ . . . . . . . . . . . I —
prover assistência linaneeira temporária ao trabalhador d e s e m p r e g a d o e m virtude d e dispensa
s e m jusia causa, inclusive a indireta, e a o trabalhador c o m p r o v a d a m e n i e resgatado de regime de
trabalho forçado ou d a condição análoga à d e escravo;.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .”
(NR) Art, 2' A Lei n. 7.998, d e 1990, passa a vigorar acrescida d o seguinte art. 24-C:” Art. 2'-C O
trabalhador qu e vier a ser identificado c o m o submetido a regime d e trabalho forçado o u reduzido
a condição análoga à d e escravo, e m decorrência d e aç ão d e fiscalização d o Ministério d o Traba­
lho e Emprego, será dessa situação resgatado e terá direito à percepção d e três parcelas d e
se guro-desemprego n o valor d e u m satárlo mí n i m o cada, conforme o disposto n o § 2 o deste arti­
go. § 1® O trabalhador resgatado nos termos d o capuf deste artigo será encaminhado, pelo Minis­
tério d o Trabafho e Emprego, para qualificação profissional e recolocação n o m e r c a d o d e traba­
lho, por me io d o Sistema Nacional d e E m p r e g o — SINE, na forma estabelecida pelo Conselho
Deliberativo d o F u n d o d e A m p a r o a o Trabalhador — C O D E F A T . § 2° Ca b e r á a o C O D E F A T , por
proposta d o Ministro d e Estado d o Trabalho e Emprego, estabelecer os procedimentos n e ces sá­
rios a o recebimento d o beneficio previsto no capul deste arligo, observados os respectivos limi­
tes d e c o mpr om eti men to do s recursos d o FAT, ficando ve d a d o a o m e s m o trabalhador o recebi-
mento.do beneficio, e m circunstâncias similares, no s do ze m e s e s seguintes à pe rcepção d a últi­
m a parcela." (NR) Art. 3 “ Esta Lei entra e m vigor n a data d e su a publicação. Congr es so Nacional,
e m 2 0 d e d e z e m b r o d e 2002; 181* d a Independência e 114' d a República S e n a d o r R a m e z T e b e t
Presidente d a M e s a d o Co ngr es so Nacional."
(27)Jornal Folha d e S ã o Paulo, 6 de abril de 2003, C a der no Brasil, p. A 15.
E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 149

ç ã o voltadas para a garantia d e moradia provisória, alimentação, cuida­


d o s m é d i c o s e q u e propiciem o retorno d o s trabalhadores libertados a o s
s e u s locais d e origem, al ém d a s u a imediata proteção, c o njugadas c o m
p r o g r a m a s d e desenvolvimento profissional e educacional, c o m o bolsa
escola, f o m e zero, erradicação d o trabalho infantil (PETI) e políticas fo-
mentatórias d e empr e g o .
N o entanto, o primeiro plano deveria ser a a d oç ã o d e me di d a s sociais
que, conseqüentemente, previnam o desenvolvimento d e s s a forma d e ex­
ploração h u m a n a e m nosso território, c o m o a elaboração d e u m a a m p l a e
profunda reforma agrária para a democratização d a s formas d e a c es s o às
propriedades rurais d e produção, políticas d e fomento e apoio às p e q u e ­
n a s propriedades rurais, c o n c e s s ã o d e créditos c o m taxas diferenciadas,
fomento à criação d a s cooperativas agrícolas entre os p e q u e n o s agriculto­
res. T u d o d e m o d o a alijar definitivamente as condições fáticas q u e forne­
c e m o p o r t u n i d a d e a p e r p e t u a ç ã o d o Brasil c o m o u m a s o c i e d a d e
escravocrata internacionalmente conhecida e denunciada perante os orga­
n i sm o s internacionais d e defesa d o s direitos h u m a n o s .

O B R A S CITADAS

Arendt, Hannah. “A condição humana". 10a ed., Rio d e Janeiro, Forense,


2000.
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Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. “N o v o Aurélio século XXI: o dicioná­
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