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1 INTRODUÇÃO
Este artigo tem por objetivo analisar, no projeto colonial de Portugal no Brasil, o
papel da educação jesuítica, tendo como contexto a leitura histórica do século XVI, que
marca a conquista do mundo pelo poderio militar europeu, a exploração colonial e o
período da Reforma e Contrarreforma religiosa. É nesse contexto, que buscamos
compreender o projeto colonial português para o Brasil e o papel da educação jesuítica
nesse projeto.
Tendo em vista que sociedade e educação relacionam-se dialeticamente, o
referencial teórico-metodológico fornecido pelo materialismo histórico dialético é o
norteador da análise e da crítica neste trabalho, por possibilitar a construção da história
numa visão de totalidade (MARX, 1961). Nesse sentido,a história da educação não pode
ser desvinculada da base material em que está inserida. Ainda, para a análise do papel
da educação jesuíta no projeto colonial de Portugal para o Brasil, discutimos a partir de
Gramsci (1995) que a estrutura e superestrutura formam um “bloco histórico”,
contraditório e discordante, sendo que a superestrutura é o reflexo do conjunto das
relações sociais de produção. Dessa forma, há uma necessária reciprocidade entre
estrutura e superestrutura que determina o processo dialético real.
A educação, como superestrutura, é resultado de múltiplas determinações, sofre,
no âmbito das relações sociais de produção, a interferência das forças político-
ideológicas e culturais. Nesse sentido, uma classe mantém seu domínio não só através
da força ou domínio econômico, mas exercendo uma liderança moral e intelectual e
fazendo concessões, dentro de certos limites dos interesses do conjunto de aliados
unificados no bloco histórico. Disso decorre que a hegemonia é preparada por uma
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Artigoproduzido a partir da tese de doutorado em educação defendida na Universidade Estadual de
Campinas – UNICAMP em fevereiro de 2009, intitulada “A função social do ensino secundário no
contexto de formação da sociedade capitalista brasileira”.
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classe que lidera a constituição de um bloco histórico e que ocupa os diversos espaços
da superestrutura.
Este artigo é decorrente da análise de referências crítico-analíticas sobre a
história da educação geral e do Brasil, a fim de analisar o contexto da Europa no século
XVI, a posição de Portugal nesse contexto e o papel da colônia brasileira, tendo em
vista discutir o projeto pedagógico dos jesuítas como coadjuvante de um projeto maior
engendrado pelo Estado português para a exploração da colônia.
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O Concílio de Trento, realizado de 1545 a 1564, foi o 19º concílio ecumênico. É considerado um dos
três concílios "fundadores" da Igreja Católica. No contexto da reação da Igreja Católica à divisão
provocada na Europa pela Reforma Protestante, oobjetivo do Concílio foi assegurar a unidade da fé e a
disciplina eclesiástica, razão pela qual é denominado como Concílio da Contra-Reforma.Emitiu
numerosos decretos disciplinares e especificou claramente as doutrinas católicas quanto à salvação, os
sacramentos e o cânone bíblico, em oposição ao protestantismo. Além disso, foram criados seminários
como centros de formação sacerdotal, instituído o índice de livros proibidos (Index librorum
prohibitorum)e reorganizada a Inquisição (MANACORDA, 1992).
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“A essencialidade da Igreja e o valor dos sacramentos, a eficácia das obras ao lado da intervenção da
graça” (CAMBI, 1999, p. 256).
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Conjunto de cônegos (padres seculares) pertencente ao colegiado de uma catedral ou igreja.
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normas dessa proposta de educação eram extremamente rigorosas, sobretudo para levar
os jovens à obediência e à submissão à autoridade. Importante destacar que as diretrizes
propostas de uma religião catequizadora e missionária, com o objetivo de trazer novos
fiéis para a Igreja Católica, eram coerentes com os interesses das monarquias ibéricas,
pois era o Estado, na verdade, que comandava o aparelho eclesiástico.
É este ambiente que vai favorecer a atuação e consolidação do projeto
pedagógico da Companhia de Jesus, criada em 1534, considerada, de acordo com
Luzuriaga (1990), o principal órgão da Contrarreformae da contenção do movimento
protestante nos países latinos. Mesmo não sendo criada só com fins educacionais, logo a
educação se tornou uma das mais importantes atividades da Companhia. A mesma
defendeu um modelo educacional e cultural tradicional em consonância com o modelo
político e social proposto pelas classes dirigentes. Em relação à organização escolar,
fundaram inúmeros colégios humanistas, as escolas secundárias, baseadas no estudo do
latim e do grego e essencialmente voltadas para a educação das minorias.
Na Europa, os jesuítas fundaram e dirigiram colégios e universidades a fim de
proporcionar aos nobres e à alta burguesia, a mais esmerada educação humanista
baseada no estudo do latim e do grego, compatível com os interesses da Ordem e da
Igreja. Isso porque, nessas classes, estava o perigo da implantação do protestantismo.
Com esse objetivo, desenvolveram um sistema orgânico de instrução, coerente com os
princípios da Contrarreformapara a afirmação destes, que se expande em escala
mundial, visando à elaboração de uma cultura o mais próxima possível da Igreja
Católica.
Para isso, foram exímios pensadores de uma proposta coerente e unitária para os
programas de ensino, concretizada oficialmente com a publicação do RatioStudiorum,
em 1599. O ensino secundário foi a especialidade dos jesuítas e sua ação pedagógica
tem suas raízes na pedagogia humanista que se desenvolveu já no século anterior. Cabe
ressaltar que os princípios da pedagogia humanista foram adequados às formas
organizativas e concepções ideológicas da doutrina católica, no sentido de contemplar a
visão retórico-gramatical da cultura humanística, com predomínio das literaturas e
línguas. O que não é contemplado na proposta jesuítica, e que é próprio do humanismo,
é o redescobrimento da personalidade humana livre, o desenvolvimento da
individualidade, da personalidade total (não só religiosa), da capacidade e da liberdade
do homem de pensar e de atuar na realidade presente e terrena (LUZURIAGA, 1990).
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Portugal, pela via política, transplanta o “Estado português” para a colônia, mas
devidamente adaptado e afinado aos interesses da classe dominante que representa.
Essas ações tornam “possível a criação de um ‘estado no Brasil’, política e
juridicamente incorporado aos domínios da monarquia portuguesa e, por isto, ao sistema
político vigente na Europa” (WEHLING, 2004, p. 48). Dessa forma, a incorporação do
Brasil ao mundo moderno ocorre com a devida triagem do que lhe cabia econômica e
politicamente enquanto colônia.
Pela via econômica, sob o controle da metrópole, a colônia se integrou às redes
do capitalismo comercial, por meio da exploração do pau-brasil, do açúcar, do tabaco,
de couros, do ouro, de diamantes e de escravos. Estes, por sua vez, além de mercadoria
lucrativa, eram também a força de trabalho responsável pela extração e pela produção
de riquezas escoadas para a Europa. O Brasil se incorporou à economia internacional,
sob a vigilância de Portugal e através do modelo econômico agroexportador, alicerçado
em uma forma primitiva de exploração capitalista, que se sustentou em três elementos
fundamentais: economia agrária, latifundiária e escravista, visando à máxima
rentabilidade aos cofres e à classe dominante portuguesa. Dessa forma, a exploração
mercantilista se sustenta em um sistema internacional de trocas, no qual a acumulação
ocorre em um dos pontos, no caso Portugal. Por conseguinte, é um sistema de trocas
desiguais, de subordinação da colônia à metrópole, só possível pela existência de
violências, das mais diversas, que atingem e alteram não só a economia, mas todas as
instâncias da vida na colônia.
Nesse sentido, o outro elemento fundamental para a incorporação do Brasil à
sociedade moderna constituiu-se pela via religiosa, através da atuação, por dois séculos,
da Companhia de Jesus. Num primeiro momento, através das missões e da catequese
aos indígenas, como meio de conter o avanço da reforma protestante e garantir a
hegemonia do espírito católico. Nesse sentido, “a catequese é, então, um esforço
racionalmente feito para conquistar homens; é um esforço para acentuar a semelhança e
apagar as diferenças” (NEVES, 1978, p. 45), ou seja, incorporar os indígenas à
cristandade e fazê-los cristãos. Num segundo momento, o ensino destinado à formação
de religiosos, fundamentais ao projeto colonizador e evangelizador, bem como a
educação dos filhos dos colonos e, de certo modo, dos indígenas, como base da
formação do cristão. A fundação de Colégios, sob a orientação do RatioStudiorum,
consolida a expansão dos jesuítas na instrução da aristocracia, não mais só para a
formação de padres, mas também de burocratas e de profissionais liberais.
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O batismo é considerado, sem dúvida, o mais importante dos sacramentos do catolicismo, reafirmados
pelo Concílio de Trento. O batismo é o sacramento que dá a cristandade a quem o recebe. Marca o
nascimento social, espiritual e religioso do indivíduo. Para o missionário é o sinal de conversão – a marca
de que sua missão atingiu o sucesso e o paganismo foi vencido. Sem o batismo a pessoa não morre cristão
e isso era uma preocupação dos padres jesuítas (NEVES, 1978). É o rito de entrada na igreja que confere
um nome ao batizado. Por uma imposição da ideologia religiosa cristã, um nome português, em língua
cristã (PAIVA, 1982).
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jesuítas, no Brasil, foram autores de uma pedagogia especial, que se diferencia daquela
desenvolvida na Europa. Como destaca Madureira (1927), essa diferenciação diz
respeito à catequização dos índios, em que foram notáveis as adaptações 7 da pedagogia
jesuítica para dar conta da realidade singular com que se depararam. Também se aplica
ao estabelecimento da tradição do ensino secundário no Brasil, que sofreu alterações
para garantir o êxito da missão catequética. Como exemplo, a adaptação curricular que
substituiu o grego pelo Tupi, não com o intuito de preservação da cultura autóctone,
mas com o objetivo de garantir a evangelização. Além disso, a preocupação em
reproduzir material sobre a língua, a fim de preparar melhor outros jesuítas para a
missão.
A influência dos jesuítas estende-se ao período Pombalino, pois os seus
pressupostos educacionais de formação humanista, clássica e europeizante têm
continuidade nas aulas régias e na atuação da maioria dos professores que eram padres
formados nas escolas jesuíticas.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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O artigo “A evangelização jesuítica e a adaptação”, de Célio Juvenal Costa (2005), discute a adaptação
como um elemento da racionalidade jesuítica, que contribuiu para a definição de estratégias de catequese
e educação nas terras de missão. A adaptação é um recurso para o processo de conversão e evangelização
nos diferentes espaços de atuação missionária.
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REFERÊNCIAS
LUZURIAGA, Lorenzo. História da educação e da pedagogia. 18. ed. São Paulo: Ed.
Nacional, 1990. (Atualidades Pedagógicas – v. 59).
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Idelogia Alemã I: crítica da filosofia alemã mais
recente.3.ed.Portugal: Editorial Presença; Brasil: Livraria Martins Fontes, s.d, v. 1.
NEVES, Luiz Felipe Baêta. O combate dos soldados de Cristo na terra dos
papagaios: colonialismo e repressão cultural. Rio de Janeiro: Forense-Universitária,
1978.
NOVAIS, Fernando A. O Brasil nos quadros do antigo sistema colonial. In.: MOTA,
Carlos guilherme (Org.). Brasil em perspectiva. 7. ed. São Paulo: DIFEL, 1988.
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PAIVA, José Maria de. Igreja e educação no Brasil colonial. In.: STEPHANOU, Maria;
BASTOS, Maria Helena Camara (Orgs.). Histórias e memórias da educação no
Brasil, Vol I: séculos XVI –XVIII. Petrópolis: Vozes, 2004. p. 77-92.
PONCE, Aníbal. Educação e Luta de Classes. 10. ed. São Paulo: Cortez; Autores
Associados, 1990.