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Nazismo de Esquerda?

Conceito, aplicações e debates contemporâneos


sobre o nazi-fascismo.
Resultados preliminares do projeto coletivo de pesquisa do
Grupo PET História UFPR 1939: nazi-fascismo,
stalinismo, guerra e revolução, permitida a reprodução
desde que citada a fonte, 1° volume.

Introdução
O presente resultado preliminar de pesquisa, o primeiro do Projeto Coletivo 1939:
nazi-fascismo, stalinismo, guerra e revolução1, é um dos produtos da discussão teórica
realizada pelo Grupo PET História sobre os conceitos de Fascismo e Nazismo, tendo como
base principal o debate apresentado pelo historiador e cientista político Robert Paxton em seu
clássico livro A anatomia do fascismo2. Essa discussão surge de uma necessidade latente de
nossos dias em se apresentar uma conceitualização mais precisa do termo Fascismo, muito
em voga nos debates políticos contemporâneos, tanto no contexto brasileiro, quanto no
mundial. Tendo em vista a atualidade desse tema e também o uso banalizado do termo, o
objetivo desse resultado preliminar é apresentar elementos pautados na historiografia e em
reflexões teóricas que permitam uma definição do que é o Fascismo.
Partindo dessa definição, pretendemos demonstrar as aproximações e diferenças entre
o Fascismo Italiano e o Nazismo, dois dos regimes fascistas do século XX e que são
confundidos atualmente, inclusive com relação a sua posição no espectro político. Trazer
esses debates já amplamente explorados na historiografia tem como objetivo adicional
aproximá-los de uma exposição mais didática do tema. Para tanto, o presente resultado conta
com a produção de um quadro comparativo, cujo formato possibilita a utilização em sala de
aula, tanto como material de apoio para professores quanto para alunos.

Discussão teórica
Desde a Marcha sobre Roma, marco da ascensão ao poder do fascismo na Itália, em
1922, analistas políticos e historiadores buscam formular uma teoria capaz de interpretar o
fenômeno do Fascismo, seja na busca das causas de sua manifestação específica na Europa
do século XX, ou como uma categoria analítica mais ampla (ou genérica), a fim de explicar
movimentos e regimes com características autoritárias. É, pois, justamente a partir dessa

1
Projeto 1939: nazi-fascismo, stalinismo, guerra e revolução. Disponível em:
<https://drive.google.com/file/d/10Ozfb2W6aDG08UxzysGmFH_yhcMzhBm7/view>. Acesso em: 26 mar.
2019.
2
PAXTON, Robert. A anatomia do fascismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008.
múltipla significação que surge o âmago da discussão sobre o termo: trata-se de um
fenômeno específico da Itália de Mussolini? Pode ser aplicado na análise sobre a Alemanha
nazista? Ou poderia, ainda, ser aplicado à contemporaneidade, aos regimes ou movimentos
com características autoritárias?
A dificuldade em se dar uma definição única a um fenômeno tão complexo é um dos
principais desafios apontados por Paxton em seus estudos. Elementos exclusivos de um grupo
ou movimento fascista que não se enquadram em outro são o suficiente para suscitar debates
sobre a validade da utilização do termo. A banalização que ele vem sofrendo desde os anos
90 é outro empecilho que levanta a questão se ele é realmente útil para entender esses
acontecimentos do século XX. Frente a isso, destaca-se o papel da ciência histórica como
produtora de análises embasadas sobre o assunto e, a partir destas, de lembrar e conscientizar
o debate público.
Faz-se necessário, primeiramente, o completo entendimento de que o termo Fascismo
se refere a um fenômeno exclusivo do século XX. A Primeira Guerra Mundial, apesar de não
ter sido a causa última do surgimento do fascismo, possibilitou o contexto no qual seu
nascimento ocorreu, ou seja, “abriu oportunidades culturais, sociais e políticas”3 para o
fascismo, na medida em que foi um cataclisma sem precedentes na história da humanidade. A
desolação pelas milhares de mortes e a crença em uma degeneração da cultura ocidental, o
sentimento de desprezo para com a sociedade estabelecida na Europa, assim como a perda de
fé em um governo liberal ou de esquerda e o terror causado pelo avanço do socialismo na
Rússia bolchevique constituíram, então, um terreno fértil para o surgimento desse
movimento.
Em meio a esse contexto, o fascismo despontou tendo como base a hostilidade frente
a todas as correntes políticas estabelecidas, e, principalmente, à esquerda e ao individualismo
liberal. Na medida em que o fascismo ganhou espaço e se estabeleceu politicamente,
estabeleceu-se também uma nova cultura, alicerçada na negação de aspectos fundamentais da
cultura ocidental. Elementos provenientes do Iluminismo, como a racionalidade e
intelectualidade passaram a ser contrariados; como opção, o fascismo apresentava uma nova
proposta de desenvolvimento humano, um novo ideal de homem a ser seguido.
Essa cultura teve um caráter difuso, não sendo formalmente estabelecida, mas com ela
uma série de tendências de pensamento ganhou força. Características como o despertar dos
instintos e sentimentos, a valorização da ação direta e a delegação ao líder da tarefa de

3
Ibidem, p. 58.
interpretar a realidade e guiar a nação são aspectos importantes dessa nova cultura. Em
conjunto, eles deram novos contornos à militarização, à violência e a luta experienciadas na
Primeira Guerra.
Em meio a esse processo, o fascismo caracterizou-se também pela introdução das
massas na política, de forma rápida e assombrosa, a partir do primeiro terço do século XX.
Sem isso, como afirmam autores consagrados que escreveram sobre o tema, como Gentile4,
Payne5 e o próprio Paxton, ele não poderia ter se desenvolvido. A grande adesão popular,
com as massas sendo energizadas pelos primeiros fascistas, e as grandes manifestações
públicas, como marchas e pronunciamentos do líder mostram esse caráter profundamente
massificado dos regimes. O fascismo transformou a política em estética, não transmitindo e
nem se baseando em um sistema filosófico complexo, mas no sentimento popular6. Não é por
acaso que, muitas vezes, a ideia comum sobre o movimento fascista se resume a propagandas
e imagens que demonstram manifestações populares de grande magnitude. Contudo, o fato de
não terem existido grandes teóricos fascistas, não significa que ele se resumiu a essas
demonstrações.
Essas manifestações são muito importantes pois materializaram uma série desses
sentimentos, os quais devem ser observados com mais profundidade. O pânico gerado pela
desordem, pela degeneração e pelo avanço do socialismo são exemplos importantes. A perda
da crença em uma sociedade alicerçada em valores liberais ou de esquerda fica claro, por
exemplo, com a leitura de Remarque7, cujos personagens não acreditam mais em um mundo
guiado pelas políticas anteriores, pois “só se acredita na Guerra”8. A exaltação da violência
passa a ser uma virtude dos movimentos fascistas, tendo como primeiros filiados aos partidos
os veteranos de guerra. O medo do comunismo é, então, mais exacerbado. A destruição de
um modo de viver ocidental, ameaçado pelo Bolchevismo russo a partir de 1917, onde a
degeneração era mais um terror a ser enfrentado em uma sociedade pós-guerra, mostra a
faceta mais latente em qualquer movimento fascista: não só o anticomunismo, mas o anti-
esquerdismo radical. Esse é o cerne da “revolução” fascista, o que garante a intensa
mobilização popular contra a onda comunista que se alastrava pela Europa, com a Rússia

4
GENTILE, Emilio. Fascism, totalitarianism and political religion: definitions and critical reflections on
criticism of an interpretation, Totalitarian Movements and Political Religions, 2004.
5
PAYNE, Stanley G. Fascism: Comparison and definition. London: University of Wisconsin Press, 1983.
6
Ibidem, p. 38.
7
Erich Maria Remarque, pseudônimo de Erich Paul Remark, escritor alemão que lutou na Primeira Guerra
Mundial e viveu o sentimento de degeneração da sociedade causado pela guerra. Seus livros foram perseguidos
pelo Nazismo, já que o culto a violência era uma virtude nesse regime, e os escritos de Remarque criticavam
severamente a romantização dos conflitos.
8
REMARQUE, Erich M. Nada de Novo no Front. São Paulo: Abril Cultural, 1981. p. 76.
sendo seu epicentro. A luta contra o comunismo é então o principal elemento e o alicerce
central do fascismo.
Outro importante elemento a ser considerado é o nacionalismo. Com a política das
massas, a disciplinarização do eleitorado se fez necessária, assim como sua
mobilização/energização a fim de um objetivo comum. Para isso, a nação foi elevada ao
patamar de mito mobilizador: a vitória do povo seria a vitória da nação. Por isso, essas ideias
baseadas no coletivismo, materializado na ideia de nação, se opuseram ao individualismo
liberal; por outro lado, o esquerdismo e suas tendências internacionalistas, foram tratados
como inimigos da nação. Essa série de fatores que impulsionaram os movimentos fascistas
consistem no que Paxton chama de “paixões mobilizadoras”: um sentimento de crise
catastrófica (Primeira Guerra Mundial ou Bolchevismo); a primazia de um grupo; crença de
que o grupo é uma vítima; o pavor da decadência do grupo pelo individualismo; beleza da
violência e o direito do povo eleito dominar9.
Depois de elencadas essas características gerais de qualquer movimento fascista,
ficam evidentes algumas semelhanças destes com movimentos autoritários de direita. De fato,
o fascismo se enquadra na extrema direita, contudo contém características específicas que o
diferem dos demais movimentos desse espectro político.10 Como afirma Payne, quando se
tem como objetivo estabelecer uma perspectiva comparativa, as especificidades dos regimes
fascistas devem ser ressaltadas bem como aquelas dos movimentos autoritários; divididos em
direita autoritária radical e direita autoritária conservadora.11
Os grupos autoritários de direita fizeram oposição a muitos grupos também
combatidos pelo fascismo, especialmente o marxismo e o liberalismo, além de partilharem de
algumas características tais como o militarismo, o imperialismo e a violência como
instrumento da ação política. Contudo, tiveram também diversas diferenças, a exemplo da
cultura: enquanto o fascismo se pautava pelo sentimento anti-racionalista, de uma nova
mística cultural, por exemplo, os movimentos autoritários se apoiaram nas bases culturais
tradicionais, como os valores religiosos. No caso do Nazismo, como abordaremos
posteriormente, essas diferenças ficam ainda mais evidentes, com a adoção das doutrinas
biologizantes e pseudo-científicas do Darwinismo social.

9
PAXTON, Robert. op. cit, pp. 78-79.
10
GRIFFIN, Roger. A Fascist Century. Palgrave Macmillan: Reino Unido, 2008. p. 136.
11
PAYNE, Stanley G. Fascism: Comparison and definition. London: University of Wisconsin Press, 1983. p.
14.
Mesmo quando apontamos algumas características comuns entre esses regimes, é
possível detectar algumas diferenças em sua constituição. O militarismo presente tanto no
fascismo quanto nos regimes autoritários é um exemplo disso. No caso do autoritarismo
radical de direita, a mobilização dos militares e do sistema militar é intrínseca, o que se
manifesta pelo governo exercido pelos próprios militares. O fascismo, apesar do culto ao
militarismo contido no seu ideário, teve dificuldades em conseguir o apoio do exército, o que
demandou a criação das milícias do partido. Estas competiram desde o início com as forças
do exército, em uma tensão permanente no interior dos regimes.
Em termos políticos, as diferenças entre a própria direita autoritária, radical ou
conservadora, ficam também evidentes: enquanto os conservadores defendiam mudanças
moderadas e parciais no sistema parlamentar, as facetas mais radicais do autoritarismo
visavam destruir inteiramente o sistema político. Mesmo a ala radical desses movimentos
hesitou, contudo, em colocar essas mudanças em prática voltando-se a formas de legitimação
política tradicionais. Em outras palavras, um líder autoritário governa por estruturas
preexistentes, seja com o apoio do Legislativo ou do Judiciário, incrementando o Executivo
através do suporte dos outros poderes.
Outro aspecto fundamental, que difere diametralmente o fascismo destas duas formas
da direita autoritária é a participação das massas. Os regimes autoritários, tanto conservadores
quanto radicais, não contam com a participação ativa das massas, ou seja, de um grande
eleitorado heterogêneo. Os movimentos fascistas se pautam justamente pelo contrário. As
massas são necessárias para a disciplinarização e energização em busca dos objetivos de
engrandecimento da nação e do povo escolhido. A figura do líder é sempre exaltada, e ele
governa por um partido único, que se forma por veteranos de guerra desiludidos e
ultranacionalistas. O Partido não reconhece, então, os limites entre ele e o Estado,
redesenhando todos os limites entre público e privado, além de praticar a violência em prol de
seus objetivos. Em suma, pode-se dizer que todo regime fascista tem características
autoritárias, mas nem todo governo autoritário é fascista.
O líder tem, por sua vez, grande importância no entendimento do fascismo.
Recorrentemente, o Nazismo é resumido a Hitler, assim como Mussolini resume o Fascismo
italiano. Essa imagem deve ser tratada com cuidado, pois, como ressalta Paxton, essa foi
justamente a ideia central dos propagandistas fascistas. A figura do líder é exaltada como
aquele que levará a nação ao triunfo, mas ela não resume os regimes. As interações entre
Líder e Nação é que devem ser enfatizadas. A nação não pode ser eximida da
responsabilidade por ter permitido e participado da ascensão do fascismo.12
Os líderes fascistas passaram, de fato, a representar os ideais de vitória e de
engrandecimento do povo. E essa união mística do líder com o destino histórico de vitória
dos povos escolhidos demonstra algumas características importantes do fascismo, como, por
exemplo, que eles não são internacionalistas, mas dramaticamente nacionais, o que acarreta
na impossibilidade da mística do movimento fascista ser “importada” por outro. Desta forma,
os regimes e movimentos fascistas, a exemplo do Nazismo e do Fascismo italiano, são
diferentes em essência, assim como todos os outros movimentos que não conseguiram tomar
o poder, como na França e na Hungria.
Em diversos países da Europa, e também fora dela, surgiram movimentos que
tentaram imitar a política fascista, sem obter, contudo, sucesso significativo a ponto de
instaurar regimes. Payne explica esse fato apontando para a ausência das condições
determinantes para o surgimento deste: 1 - Competição imperialista intensa entre países
vizinhos; 2 - Sistemas liberais-democráticos sob influência de uma elite ou oligarquias; 3 -
Oportunidade para a mobilização do nacionalismo de massas, não restrito às oligarquias e
elites institucionalizadas; 4 - Uma nova orientação cultural, que suportasse mudanças
intelectuais radicais.13 Em suma, os regimes fascistas têm em comum o fato de terem sido
formados no pós Primeira Guerra Mundial, a partir do sentimento de crise sem soluções dos
primeiros anos do século XX. Trata-se, portanto, de um fenômeno europeu.

Quadro comparativo: diferenças entre o Fascio Italiano e o Nazismo


Alemão

Buscamos até aqui traduzir os esforços de conceituação do fascismo como um termo


amplo, aplicável a fenômenos europeus durante o século XX. Para tanto, apresentamos
características gerais dos movimentos fascistas, enfatizando a questão apresentada por
Paxton, acerca das “paixões mobilizadoras”. Destacamos, então, suas especificidades,
elencando também suas diferenças com relação aos movimentos e regimes autoritários de
direita. Ao ressaltar esses aspectos, buscamos justamente viabilizar o uso analítico e mais
preciso do termo, não como uma definição estanque e essencialista (o que permite com que
ela seja retirada de seu contexto), mas viabilizando uma análise comparativa, atenta aos

12
Ibidem, pp. 23-24.
13
PAYNE, Stanley G. Op. Cit. p. 175.
processos históricos de formação dos regimes fascistas, e que seja, ainda, inteligível para
alunos do Ensino Básico.
Um exemplo de aplicação dessa perspectiva é a comparação entre o fascismo italiano
e o nazismo, os quais são, por muitas vezes, confundidos pelos alunos. Apesar de
enquadrados no sentido amplo do termo fascismo, apresentado acima, eles contêm diferenças
importantes, as quais não são exploradas com a profundidade necessária em sala de aula.
Essas diferenças se delinearam, evidentemente, a partir do desenvolvimento histórico desses
dois regimes, especialmente por conta do fato de o fascismo não ter sido “aplicado” a partir
de um sistema previamente estabelecido. No entanto, nosso esforço não se concentrará na
reconstituição desses processos em si, discutidos amplamente pelos autores presentes na
bibliografia deste trabalho, mas em um resumo das características que resultaram deles,
justamente por sua finalidade didática.
Quadro comparativo:
Como já esclarecido, a falta de fé em modelos de governo estabelecidos anteriormente
é uma das características fascistas. A criação de inimigos internos e externos é inerente
também a esses regimes; o comunismo é perseguido e demonizado, considerado o principal
inimigo da civilização ocidental, com os partidos de esquerda sendo proibidos e
criminalizados. A perda de fé na liberdade individual, na razão e no progresso, desde o fim
do século XIX, explicam também a negação do liberalismo individual. Ser contra um
conservadorismo burguês era negar o establishment, mesmo que o discurso tenha diferido da
prática fascista.
Como dito, os primeiros fascistas eram jovens que lutaram na Primeira Guerra
Mundial. Com a crise do pós-guerra, a perda de fé em políticos que não resolviam os
problemas das sociedades europeias foi acentuada. Os jovens, que não tinham perspectiva no
futuro, se encantaram então com a antipolítica fascista.14 O descontentamento com as
políticas da esquerda e da direita, além do ressentimento pelos desfechos da Primeira Guerra
ajudam, assim, a entender a juventude dos primeiros fascistas.
Nenhum regime fascista foi concebido sem a utilização do terror. A violência foi
valorizada como uma virtude, sendo a ação mais importante que o discurso. Essa violência
era praticada contra os inimigos da nação, ou seja, a qualquer um que se opusesse às ideias do
regime. Porém, essa violência era seletiva. A esquerda sofreu muito mais com as
perseguições políticas, a exemplo de Rosa Luxemburgo, ainda durante a República de
Weimar15. Essas perseguições foram toleradas pela direita da época, que utilizava-se desta e a
via com bons olhos na medida em que impedia a ascensão da esquerda e a favorecia
economicamente. A união dos fascistas com o establishment será tratada melhor
posteriormente. Além disso, os ápices de perseguição foram os campos de concentração de
Hitler, como em Auschwitz. A força e a disciplina eram valorizadas, e o militarismo era um
elemento recorrente, estando atrelado ao uso de simbologias. A militarização, as milícias
criadas principalmente no Nazismo bem como a utilização de símbolos, a exemplo da
suástica.
O caráter de classe dos movimentos fascistas é evidenciado depois dessas explicações.
A inércia contra o grande capital e o empresariado, assim como a defesa a propriedade
privada e a luta baseada no anticomunismo mostram o lado para qual o fascismo pendia.
Nenhuma medida contra o empresariado foi tomado, e a atuação junto a esse grupo, mesmo
que de forma conflituosa, ocorreu durante a grande parte do Fascismo Italiano e o Nazismo

14
Ibidem, p. 92.
15
RICHARD, Lionel. A República de Weimar: 1919-1933. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
alemão. Enquanto isso, assassinatos políticos eram estimulados, como aconteceu com Rosa
Luxemburgo. A violência contra a esquerda não era só reproduzida, mas estimulada, com
penas aos agressores muito mais brandas que qualquer militante comunista.
Por fim, as diferenças entre o Fascismo Italiano e o Nazismo são auto explicativas. O
único ponto que pode gerar maiores dúvidas é a questão da normalização e da radicalização
dos movimentos. Paxton apresenta que os fascismos possuem cinco estágios: a criação dos
movimentos, o enraizamento no sistema político, a tomada do poder, o exercício do poder e a
radicalização ou entropia.16 Somente o Nazismo chegou à última fase, o que levou a sua
destruição. Isso porque, nesta fase, cujo catalisador é a guerra, o regime nazista passou a
negar a própria nação, o cerne do fascismo. Era preferível a destruição da Alemanha do que a
aceitação da derrota do Eixo.
Já a Itália conviveu com momentos de radicalização e normalização das relações
políticas. Um exemplo de radicalização italiana foi a invasão da Etiópia. Por outro lado,
Mussolini não tinha a mesma força de Hitler para levar a cabo seus ideais. O próprio
reconhecimento da figura do Rei Vitor Emanuel III como monarca é uma prova disso. As
relações políticas na Itália eram mais tensionadas, e as disputas internas por poder mais
acentuadas. Com isso, Mussolini sempre se via num jogo de poderes no qual radicalizar e
normalizar foi a tônica. Quando radicalizou foi tarde demais, pois a Itália já estava devastada
e humilhada na Segunda Guerra Mundial, e o Duce acabou sendo morto por membros da
Resistência Italiana.17

O Fascismo no espectro político

Depois de elencadas todas essas características do Fascismo, é preciso posicionar esse


fenômeno no espectro político. Principalmente no Brasil, discussões realizadas fora do
âmbito acadêmico afirmam que o fascismo, e mais especificamente o Nazismo, foram
movimentos de cunho “esquerdista”. Essa percepção começou a ganhar repercussão a partir
das respostas a um pronunciamento de Heiko Mass, Ministro das Relações Exteriores da
Alemanha. O ministro sustentou, através de um vídeo publicado na página da Embaixada
Alemã, que o regime nazista é pertencente extrema-direita.18 Diversos comentários de
brasileiros surgiram afirmando que o Nazismo teria sido um regime de esquerda, o que

16
PAXTON, Robert. op. cit. p. 50.
17
Movimento de resistência a ocupação fascista e nazista na Itália.
18
Disponível em: <https://www.facebook.com/EmbaixadaAlemanha/videos/1658739200897794/>. Acesso em:
23 mar. 2019.
provocou uma reação extremamente negativa. Outros episódios conferiram ainda mais
visibilidade a essa polêmica; o atual ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto
Araújo, afirmou, mais de uma vez, em entrevistas e em seu blog pessoal, que acredita que na
tese do nazismo de esquerda.19 No dia desta publicação, o atual Presidente da República, Jair
Bolsonaro, reproduziu também a ideia de que não há dúvidas de que o Nazismo foi de
esquerda.
Na iminência desta tese academicamente aberrante, e com base nos principais pontos
elencados nesse resultado de pesquisa, faz-se necessário afirmar que é impossível ter sequer a
mais remota impressão de que o Fascismo, ou o Nazismo, foram de esquerda. Por isso, é
importante analisar os discursos, mas essencialmente a prática desses regimes. O fascismo
nunca alterou a hierarquia vigente, mesmo se propondo a ser um regime de Revolução
Permanente. A cumplicidade com o establishment, ou seja, a um sistema prévio de governo é
notável, tanto com Mussolini, quanto com Hitler. E mais: além do extremo nacionalismo, a
principal luta destes governos era contra o comunismo.
O discurso anti-burguês, entendido como crítica ao individualismo, mas nunca à
propriedade privada dos meios de produção, se tornou central para a retórica desses
movimentos (fascista italiano e nazismo), na medida em que seus partidos tiveram que
participar de um espaço político já definido. Enquanto o anticomunismo era exacerbado, não
apenas no discurso, mas também na prática, o anticapitalismo fascista se mostrava cada vez
mais seletivo. A prática diferiu muito do discurso, com nenhuma medida contra o capital ou a
propriedade privada, mostrando mais uma vez a tendência anti-esquerdista dos regimes.
Segundo Paxton, a própria instauração do fascismo vem como uma reação a tentativa da
instauração do comunismo, principalmente no caso alemão20, pois isso gerava pânico aos
países europeus, sendo impossível ser este, então, um movimento de esquerda.
Outro aspecto a ser ressaltado é o de que as nações que adotaram esse tipo de governo
não podem ser eximidas de responsabilidade. Essa violência anti-esquerdista foi tolerada em
todos os meios políticos e judiciários, ou seja, o status quo estava disposto a dividir o poder
com os fascistas para evitar o “mal maior”, o comunismo. Os políticos da velha geração e o
empresariado desses países aceitaram essas condições em troca de um eleitorado disciplinado
aos moldes fascistas, e distantes do marxismo. As hierarquias econômica e social

19
Disponível em: <https://noticias.r7.com/brasil/ernesto-araujo-volta-a-identificar-o-nazismo-como-de-
esquerda-30032019>. Acesso em: 02 abril. 2019.
<https://www.metapoliticabrasil.com/blog/pela-alian%C3%A7a-liberal-conservadora>. Acesso em: 02. abril.
2019.
20
PAXTON, Robert. op. cit, p. 140.
continuaram as mesmas, com interesses capitalistas e fascistas sendo convergentes. A
dominação da economia por qualquer partido fascista entrava em congruência com o
interesse do empresariado, e as práticas violentas contra seus opositores eram toleradas.
Portanto, é possível concordar com a afirmação de Mass: o Fascismo foi um
movimento de extrema direita que nunca levou o materialismo como centro, mas sim as
ideias de elevar a nação ao seu local de vencedor. A manutenção dos interesses econômicos,
aliada ao ultranacionalismo, repudiando fortemente as liberdades democráticas e sendo
profundamente anticomunista não deixam espaços abertos para revisionismos históricos que
tentam justificar os atos tomados nesse período como sendo culpa da esquerda. O fascismo,
em última análise, foi um alento para um empresariado capitalista que sofria com sucessivas
crises, como a Primeira Guerra Mundial e a Crise de 1929, que manteve as hierarquias sociais
e econômicas intocáveis enquanto seguia ideais que levaram os próprios movimentos a se
autodestruirem.

Conclusão
O objetivo principal desse resultado preliminar era realizar um debate teórico,
analisar e definir melhor o conceito de fascismo, e não necessariamente analisar contextos
atuais de seu uso. Apesar disso, não podemos deixar de mencionar, mesmo que brevemente,
esses fatos, principalmente tendo em vista o contexto das eleições brasileiras de 2018 e a
grande discussão acerca do termo. Como discutimos ao longo do texto, o Fascismo deve ser
visto como um fenômeno exclusivo, sim, do século XX. Entretanto, isso não quer dizer que
não seja possível enxergar traços desse movimento na atualidade. De acordo com o
historiador brasileiro João Fábio Bertonha21, aproximando-se do que é defendido por Paxton,
o que ocorre atualmente é uma recombinação de elementos desse fascismo clássico com
elementos do cenário atual, já que os elementos, hoje associados à extrema direita, e que
formataram o fascismo não desapareceram. O historiador dá alguns exemplos do que podem
ser essas recombinações, como a xenofobia presente em alguns movimentos atuais ao invés
do ódio aos judeus e ao comunismo.
Outro aspecto interessante a ser ressaltado é a banalização desse termo, já comentada,
que passa a ocorrer a partir da década de 1990. Também de acordo com Bertonha 22, tal

21
BERTONHA, João Fábio. Fascismo: Um risco real para o mundo de hoje? Revista Espaço Acadêmico,
Maringá, v. 12, n. 137, p. 106-108, out. 2012. Mensal. Disponível em:
<http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/18227/9891>. Acesso em: 26 mar.
2019.
22
BERTONHA, João Fábio. Fascismo de esquerda?: Sobre a necessidade de revisão conceitual de um termo
perigoso. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 12, n. 142, p. 69-76, mar. 2013. Mensal. Disponível em:
banalização se deve à redução da definição de Fascismo à qualquer sentimento e prática
política antidemocrática, violenta e intimidadora. Tal reducionismo tornaria, então, possível
enquadrar o termo fascismo tanto na direita quanto na esquerda, visto que temos exemplos de
experiências políticas e mesmo de ações individuais de ambos os lados que se encaixam
nessa definição. Essa banalização, por fim, mascara a realidade do fenômeno clássico -
italiano e alemão - e o torna difícil de ser identificado. Por trás disso, vemos a ausência de
uma reflexão teórica profunda, como a que se buscou fazer ao longo deste texto, e esforços
eminentemente políticos e propagandistas.
Em suma, em tempos em que a polarização política no Brasil se tornou tão acirrada,
que permite que teses como nazismo de esquerda sejam vinculadas, é dever do Grupo PET
História, como historiadores em formação, traçar a diferença entre verdade histórica e
revisionismo. A tentativa de deslocar o fenômeno nazi-fascista para o campo da esquerda não
possui credibilidade científica. O esforço que a extrema-direita imprime para se afastar desses
movimentos ocorrem desde o final da Segunda Guerra Mundial, num artifício político
insustentável na materialidade dos fatos. A repressão aos trabalhadores, aos sindicatos, a
defesa pela propriedade privada e a parceria, mesmo que conflituosa com os políticos
conservadores e a elite empresarial, além da perseguição política violenta contra a esquerda
da época, mostram o viés de extrema-direita do Fascismo, como explicitado no decorrer
dessa primeira publicação de resultados da pesquisa coletiva de 2019.

<http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/20041/10506>. Acesso em: 26


mar. 2019.
Bibliografia

BERTONHA, João Fábio. Fascismo de esquerda?: Sobre a necessidade de revisão conceitual


de um termo perigoso. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 12, n. 142, p. 69-76, mar.
2013. Mensal. Disponível em:
<http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/20041/10506>.
Acesso em: 26 mar. 2019.
____________. Fascismo: Um risco real para o mundo de hoje?. Revista Espaço
Acadêmico, Maringá, v. 12, n. 137, p.106-108, out. 2012. Mensal. Disponível em:
<http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/18227/9891>.
Acesso em: 26 mar. 2019.
GRIFFIN, Roger. A Fascist Century. Palgrave Macmillan: Reino Unido, 2008.
PAXTON, Robert. A anatomia do fascismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008.
PAYNE, Stanley G. Fascism: Comparison and definition. London: University of Wisconsin
Press, 1983.
REMARQUE, Erich M. Nada de Novo no Front. São Paulo: Abril Cultural, 1981.
RICHARD, Lionel. A República de Weimar: 1919-1933. São Paulo: Companhia das Letras,
1988.

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