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ÍNDICE
A OBRA DE ANTONIONI
da alma ................................................................. 25
«O Eclipse»....................................................................... 53
«O Deserto Vermelho»................................................ 59
ANTONIONI E O CINEMA
CRÓNICAS DA ANGÚSTIA
EM ANTONIONI
por Renzo Recz:
13
momento da representação. Este momento é o
estado de ânimo pessoal do autor quando
observa o mundo que representa: atribui
muito mais carácter às situações do que às
personagens, quaisquer que sejam os resul
tados dos factos, que seguem constantemente
uma lógica sua, respeitada; Antonioni, por
outras palavras, percebe os factos que decor
rem por conta própria. Os factos possuem uma
chave que lhe é estranha. Ele preocupa-se
somente em observá-los, no seu acontecer ine
vitável, procurando fazer compreender que a
sua sensibilidade está mais atenta num sen
tido do que noutro, mas excluindo qualquer
forma de manifesto moralismo. Eis porque,
de resto, o episódio inglês de I Vinti, resulta
uma narrativa quase perfeita: o autor mani
festou nele tudo o que angustiosamente não
compreende dos factos que o circundam, par
ticipando, como um espectro, na mudança de
um protagonista que o gela por causa da sua
impenetrabilidade, e que contudo Antonioni
sente vivo e moderno: um homem do seu
tempo, para tomar em consideração com objec-
tividade e, ao mesmo tempo, com temor.
Mas vale também, como verdadeiro, um
juízo precedente: diz ele respeito à escolha
dos factos a narrar, recolhidos aparentemente
como dados de uma crónica, que é exposta.
Contêm muitas vezes, constantemente, situa
ções de crise: um descambar de certos valores,
derrotas, culpabilidades, absurdo, sobretudo
da parte de expoentes da geração jovem em
ambientes burgueses. Assim, em conclusão,
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descobre-se que Antonioni não propõe solu
ções, não intervém nos acontecimentos, por
que se sente participante de um mundo que
não pode dominar muito activamente. Limita-
-se, pois, a documentá-lo por via psicológica.
Desta maneira a sua posição é, por um lado,
de frio afastamento; por outro, de responsa
bilidade participante. Por outras palavras,
ele está dentro da crise como um cúmplice
responsável: daqui a malograda proposta das
soluções manifestadas e, ao mesmo tempo,
a possível presença de um juízo no plano mo
ral. Enfim, um processo de dolorosa auto
consciência.
Tudo isto confere um tom particular às
suas representações. Assinala nelas uma pro
blemática não resolvida, confundida com a
recordação enervante de derrotas anteriores;
existe ainda a impressão de um provincia-
nismo fechado, que esconde — mas não pode
exprimir— os seus ímpetos demasiado sufo
cados, para isso tornados ocasiões de pesqui
sas refinadíssimas e obcecantes. Também por
esta via, de facto, Antonioni é um apaixonado
cultor da forma. Ele aceita o extremo limite
de refinamento do ambiente em que vive;
ambiente no qual sente, todavia, a presença
da crueldade. Ama os sucessos da moda e
conduz até uma polémica de gosto, exprimindo
assim, juntamente à recusa da tese demasiado
racionalmente exposta, a sua confiança nas
possibilidades de descoberta pela via do sen
timento. Nascem, desta maneira, filmes que
são sobretudo estados de ânimo em forma de
15
I
16
ua
ridade: o cuidado que Antonioni põe na es
colha do tema e na realização, descurando
instintivamente — sem razão — a fase inter
média, a planificação (que, frequentemente,
nos seus filmes, é defeituosa), o que revela
uma intolerância pela construção lógica e uma
clara preferência pelos momentos que melhor
deverão servir a intuição.
Um mundo em crise
17
V
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? •1 tes (Escândalo de Amor, A Dama sem Camé
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:
1li também da difícil relação com ela: da impos
sibilidade de uma total união.
O Grito é o reverso desta coerente meda
lha. A mulher é a causa não culpada da tragé
dia do homem que inutilmente a procura, bus
cando nela — solitário e vagamente rebelde —
o fim de si próprio. A impossibilidade do
contacto — que é o símbolo da impossibili
dade do amor, isto é, de uma vida verda
deira— está, portanto, fora da responsabili
dade deste homem, numa forma de destino
funesto. E se nos filmes anteriores Antonioni
deixava entrever o indício da denuncia de um
!•< ambiente social preciso, portador da ruína
\x\ inevitável das personagens, em O Grito a indi
cação torna-se fraquíssima, indirecta, o sim
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i ples testemunho de um tempo que não satis
! faz. Agora, precisamente, não existe mais a
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U dúvida (ou esperança) de que a situação possa
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reconhecível. Devemos antes entender esta
sua escolha como se o autor pretendesse alar
gar absolutamente os seus problemas ao com
ponente de uma classe que parece recusá-los,
para demonstrar quanto está difundido o in
fortúnio da vida que ele quer exprimir. Anto-
nioni procurou no operário o limite mais
inflamado dos impulsos de comunicação, para
demonstrar a si próprio, através de uma espé
cie de transfert 0) autobiográfico, que a sua
solidão não é certamente nem um caso pri
vado, nem a caracteristica de uma única
classe. Mas ele situou-se numa zona de colec-
tivismo para confessar a sua dolorosa incapa
cidade de aderir.
Se queremos interpretar estas declarações
implícitas como um documento sociológico,
podemos concluir que elas exprimem bem o
momento particular de desconfiança que in
fluenciou muitas forças — todavia ainda vi
vas — não só do nosso cinema, mas de todo
o ambiente cultural. Se queremos, ao contrá
rio, entender o facto como uma evolução pes
soal de Antonioni diremos que ele concretizou
desta forma, em termos claros, um existencia
lismo latente, que o conduziu sempre aos ca
minhos da angústia, num mundo que se
conhece unicamente a si próprio e que recusa
quer o deus da metafísica, quer o da história,
para se contentar com o corajoso e sombrio
reconhecimento do seu desespero 'presente.
É por causa, afinal, deste progressivo amadu
recimento que, no momento de crise mais
(*) Em francês no texto original. (N. do T.)
19
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consciente do nosso cinema, Antonioni encon
trou-se a ocupar justamente a ala mais ex
trema do alinhamento, lugar que ocupava de
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facto — pode dizer-se — desde há tempo. Tal
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vez desde o momento em que, assistindo a
Carné (e escrevendo apreciados ensaios sobre
o realizador), começava a partilhar os movi
: mentos de uma determinada cultura que de
. pois, de maneira mais clara, procurou sempre
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introduzir no nosso movimento cinemato
1 gráfico.
Por outro lado, que essas raízes fossem
! reconhecíveis confirma-o ainda uma particula
ridade de O Grito aparentemente insignifi
cante: referimo-nos à escolha de Steve Co-
chran, o protagonista, que é talvez, bem pen
sando, um erro do filme. O actor americano,
com efeito, na forma confundiu-se perfeita
mente com a imagem de um operário. Mas na
substância — isto é, nos estados de ânimo pro
fundos que cada um de nós tem inevitavel
mente— ele está bastante longe do tipo de
homem em que havia pensado Antonioni.
Cochran não consegue exprimir completa
mente — daqui a sua imobilidade, a sua sub
s I til inexpressividade — o peso do problema,
li
: aquele antecedente cívico que, por exemplo,
f um actor francês teria dado sem esforço. Ele
é verosímil no aspecto exterior, mas não o é
; •- outro tanto no espírito, se queremos que a
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verosimilhança esteja relacionada particular
mente com a natureza da representação e,
/j;! sobretudo neste âmbito, ela encontre a sua
justificação. Natureza de uma representação
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que, dentro da perspectiva dos ecos marxistas,
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prefere cultivar a presença de motivos român
ticos — amor e morte —, ilustrando os impul
sos irracionais da paixão, na tentativa de
colher uma realidade actual, moderna, literá
ria, através da intuição e do sentimento, como
um documento a propor. O obstáculo está,
precisamente, numa realidade completa, no
destino que possamos influir, visto que está
aqui, agora, na terra. Então o motivo da
crise romântica é sempre dado em termos de
consciência realista unindo-se às subtilezas
de uma morte que o autor sente ainda antes
de partilhá-la.
Õbviamente, a este propósito não é lícito
dizer que Antonioni, só por isto, tenha con
seguido sempre resultados artísticos. Os seus
filmes, de facto, mais do que obras acabadas,
constituem, cada vez mais, difíceis tentativas
pessoais por caminhos solitários, aristocrá
ticos, à procura de elaborações coléricas e
insólitas. Quando era fácil encontrar a cor
e a vivacidade no populismo ou, talvez, num
mal-entendido tema proletário, ele procurou
os ambientes nus e amortecidos da burguesia.
Quando imperavam o esquematismo e a im
provisação, ele procurou o estilo e a forma
literária. Quando se exaltavam a variedade
e a frivolidade, ele explorou a monotonia in i
tensa e os filmes tensos num único ponto.
Fiel a si próprio — entre os pouquíssimos —,
fez sempre, mau grado as dificuldades, uni
camente os filmes que sentia e que queria
fazer. Talvez por isto — por esta coerência
que é também uma força moral e uma neces
sidade — devamos então reconhecer-lhe os ca-
21
.
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I
•!
!• racteres inconfundíveis de uma personalidade
válida. Antonioni, de facto, atrai-nos para
r. uma áspera sinceridade, para uma recusa dos
slogans demasiado correntes. Ele obriga-nos
a reparar na nossa experiência e a comunicá-
: :-í % -la, ainda que a custo da impopularidade.
!!l Se agora, para comodidade de exposição,
quisermos indicar esquematicamente dois mo
iíl dos de entender a função da arte, de um lado
colocaremos os autores que partem de uma
i I concepção ideológico-política precisa, geral
; mente reconhecida, e que procuram pois o
documento — por intermédio das obras —
para confirmá-la e em seguida afirmá-la; do
i outro colocaremos aqueles que acreditam que
o contributo da arte deve ser original, como
a revelação de conteúdos ainda não codifica
dos nas várias doutrinas. Estes últimos, natu
ralmente, procurarão exactamente na desor
dem dos estados de ânimo gerais os mais per
sistentes, para indicá-los como qualquer coisa
que deve ser, em cada caso, trazida à luz da
consciência, ainda que seja na sua confusão
sentimental.
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O suicídio tentado
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Existe um filme não completamente con
seguido, na história do nosso cinema, que
1 todavia serve muitas vezes como termo de
comparação para compreender certas prefe
rências, certos métodos e certas caracterís-
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ticas de alguns dos nossos autores cinemato
gráficos. Este filme é Retalhos da Vida. Entre
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a obra mais adversa à vida que se possa ima
} }i ginar». O romance dos sentimentos torna-se,
então, o documento vivo, original, de uma
história não oficial, mas igualmente impor
tante, uma vez que prepara os movimentos
\\ conscientes de amanhã. Daqui nasce, para
! isso, também a razão cívica de Antonioni,
quer dizer, a de um autor que, permanecendo
fiel a si próprio, e exprimindo-se com a me
ií lhor sinceridade possível, nos ajuda a com
preender — recolhendo-a em imagens — uma
parte nem manifesta nem insignificante do
nosso tempo. Ajuda a exaltarmo-nos numa
consciência dolorosa: aquela que não quere
mos reconhecer por nós próprios.
Cinema Nuovo
(Maio/Junho de 1959)
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CRÓNICAS DE UMA CRISE
E FORMAS ESTRUTURAIS DA ALMA
por Guido Aristarco
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I;
ciar) a qualquer tese, a qualquer indirecta
intervenção nos acontecimentos e a qualquer
directa interpretação dos factos: não participa
e não narra; observa e descreve a vida quoti
diana monótona, igual, sem relevo. O seu ro
mance não é feito, como o de Visconti, de uma
progressão dramática e de uma narração de
«perfeito engenho»: substitui esta forma por
uma série de quadros, por uma narração «em
que o protagonista é o tempo, como elemento
que determina e anima as personagens ou
como princípio que as consome, as aniquila,
as devora... Consumimo-nos lentamente com
as nossas esperanças e as nossas ambições; é
a mais triste das realidades. Este langor gra
dual e imperceptível, que mina silenciosamente
a vida sem sequer produzir o estrondo das
grandes, imponentes, catástrofes, é a experiên
cia em que — como acentua Thibaudet no seu
Flaubert— se concentra A Educação Senti
mental e, pode dizer-se, todo o romance mo
derno».
Um tal conceito da vida e da arte, «ade
quadamente expresso pela primeira vez» no
romance de Flaubert, é pois em Antonioni o
ponto de partida para atingir, não deixando
de passar por Parese, mas sem recolher certas
iluminações suas (a intuição da «nova palavra
de ordem»: romper a crosta da solidão, a
nossa e a dos outros), as experiências da van
guarda literária: O Estrangeiroy de Camus,
por exemplo, as «crónicas da crise», as «novas
formas estruturais da alma», de Musil, de
Broch, de Dorerer. Não é por puro acaso que,
em A Noite, Valentina é apresentada a ler
27
5
Os Sonâmbulos enquanto se desencadeia a
parada dos «obcecados», dos convidados da
villa em Brianza: parada que constitui a se
gunda parte do filme e que se deve relacionar
com a festa final no San Domenico Palace, de
Taormina, em A Aventuray análogo aspecto
da mesma «noite». Não é também por puro
!i acaso que Antonioni nos mostra neste filme
Ui os livros que a «desaparecida» Anna lia: a
I !í
I:?
des; sem qualidades é, justamente na acepção
de Musil, o seu existir: «Às suas muitas quali
dades (as de Ulrich) não corresponde ne
nhuma capacidade de agir. Talvez fosse mais
exacto dizer — insinua, em certo ponto, o
I autor— que o homem sem qualidades é o
1I conjunto de qualidades sem homem.» Assim
é o arquitecto Sandro, de A Aventura} o ro
mancista Giovanni, de A Noite. E Valentina
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s
!■ i.
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não sabe com que fim deva agir; tudo lhe
agrada, está disponível para novas experiên
cias: «continua a cultivar-se e a observar os
outros; pode parecer uma indolente, mas é,
de facto, alguém que está na expectativa».
Também a sua existência é pura possibilidade,
e não realidade efectiva; também nela tudo
poderia acontecer e, justamente por isso, nada
acontece: não se transforma num «farrapo»
depois do encontro com Pontano; permanece
um «farrapo».
I!
28
H
Um semelhante nivelamento das possibili
dades em sentido puramente subjectivo tem
em Antonioni um papel de primeiríssimo plano.
A solidão identifica-se com a incomunicabili-
dade do homem, com o conceito de que, em
cada encontro, encontramos um «estrangeiro»
e de que cada um de nós é «estrangeiro» para
si próprio. Tem nas últimas obras de Anto
nioni um diverso e comum ponto de chegada,
a busca desesperada de outrem, a dificuldade,
melhor, a impossibilidade, de se ser transpa
rente tanto aos outros como a si mesmo? Para
além do facto artístico, da maturidade expres
siva e de linguagem do realizador nelas atin
gida, quais as «mudanças» do seu itinerário
nestas novas «crónicas da crise», formas es
truturais da alma? Que significam os títulos-
-chaves de A Aventura e de A Noite em rela
ção aos dos seus precedentes filmes, os quais,
como, por exemplo, o de O Grito, não são
menos emblemáticos? Não nos encontramos
perante «aventuras» em sentido comum, pe
rante o costumado «jogo do amor» mais ou
menos subtil, ainda que o início do primeiro
dos dois filmes — sete pessoas partem num
iate para um cruzeiro às ilhas Eólias, e uma
delas, Anna, desaparece— o possa fazer su
por a quem não conheça a visão do mundo
e a coerência estatística de Antonioni. O autor
fala de um «romance policial ao contrário»;
e isto é já uma precisa referência à ânsia,
à insegurança da existência: à angústia de
Claudia, primeiro pelo desaparecimento da
amiga e, depois, pelo medo de que esta volte,
irrompa, destruindo a nova experiência que
29
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k/• está a viver. O que significa imediatamente
' uma precaridade dos sentimentos, da sua du
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S í ração. «As ambições do filme — afirma Anto-
nioni — são naturalmente mais vastas do que
as de um vulgar romance policial. Ele pre
Eli tende significar, por exemplo, que os senti
II
• I-
mentos aos quais é hoje dado um peso defi
nitivo pela retórica sentimental e pela casuís
tica narrativa são, na realidade, frágeis, trai
çoeiros, reversíveis... Começa a busca por
parte dos companheiros de Anna e, sobretudo,
de um deles, Sandro, o apaixonado. E a busca
dura ao longo de todo o filme. Todavia, a par
tir do meio, o espectador deve desejar (tal
como o deseja Claudia) «que a rapariga não
mais seja encontrada. Anna deixou um vazio,
o vazio preenche-se lentamente» 0).
Sandro deveria estar perturbado, preo
cupado, ansioso, e ao princípio está-o, mas
depois, lentamente, os seus sentimentos debi
litam-se porque não têm força. Ê ele quem
já não quer encontrar a rapariga, quem já não
quer procurá-la, quem deixa de se preocupar.
Não tem vontade de sacrificar-se: «Ê idiota
sacrificarmo-nos. Porquê? Por quem? Se Anna
estivesse aqui ainda poderia compreender os
teus escrúpulos — diz ele a Claudia. — Mas
não está. Não será melhor olhar as coisas de
frente, tal como elas são?» Passaram apenas
três dias desde o desaparecimento de Anna
e o primeiro encontro de Claudia com Sandro.
«Será possível que nada mais seja preciso
30
íj
a
para mudar, para esquecer? É triste, tão
triste que dá vontade de morrer.» Claudia
não está habituada, preparada, para a mu
dança, mas já está mudada; inúteis resultam
as tentativas, como a de sequência do com
boio, para se separar de Sandro. Também a
sua necessidade de ver «tudo claro», o seu
desejo de uma vida mais simples (tal como
surgia a Zola e como este sustentava em polé
mica com Stendhal), cede. Também para ela
a busca de Anna no itinerário siciliano, desde
a aldeia abandonada até Noto e Taormina, é
agora um pretexto, possui um bem diverso
objectivo. «Há poucos dias — confessa no fim
abertamente a Patrizia —, ao pensar que
Anna podia estar morta, também eu me sentia
morrer. Agora nem sequer choro. Tenho medo
de que esteja viva. Tudo se está a tornar mal
ditamente fácil, até o privarmo-nos de uma
dor.»
Esta denúncia da fragilidade dos senti
mentos codificados pela moral corrente insere-
-se no capítulo, caro, como se viu, a Antonioni,
da incomunicabilidade, isto é, no capítulo do
tédio em sentido moraviano ou, melhor, que
Moravia realizou no seu último romance 0):
a impossibilidade de estabelecer uma relação
concreta entre o indivíduo e a realidade, entre
o objecto e o sujeito, entre o pensamento e a
realidade; a ausência de relações concretas
com as coisas, consigo próprio e com os ou
tros. «Para muitos, o tédio é o contrário do
SI
1^
i1 .iii
t i Mi Também em Sandro o «tédio» tem como
f; consequência a esterilidade da arte, o render-
-se ao conformismo; também ele, como Dino
: I i e Giovanni, tem consciência do seu fracasso;
il! m
'• :: •
daqui a confissão a Claudia perante a fantasia
arquitectónica, o movimento, a extraordinária
liberdade da praça de Noto, daqui a humilha
ção e a irritação que sente ao encontrar os
dois jovens arquitectos que o levam a recor
dar-se de quanto havia querido fazer e não
fez. A confissão está ligada ao propósito de
«se chatear» com Ettore, de o abandonar.
Ettore recorre à mãe de Dino, essa fonte de
32
ÍIJ I
dinheiro que o pintor, tal como, aqui, o arqui-
tecto, despreza e à qual, no entanto, continua
a recorrer, sem a qual não pode passar. Em
ambos se estabelece um nexo indissolúvel
entre o tédio e o dinheiro, entre a convicção
de que a riqueza entedia e a de que o tédio
impede de construir, de criar; nem um nem
outro consegue libertar-se da obsessão de que
o tédio depende da riqueza e a esterilidade
da arte do tédio. «Já notei que o tédio con
siste principalmente na incomunicabilidade.
Ora, não podendo comunicar com a minha
mãe, de quem eu estava separado como de
qualquer objecto, era de certo modo obrigado
a aceitar o equívoco e a mentir-lhe.» Também
Sandro mente da mesma maneira a Ettore:
sabe perfeitamente que o «divertimento» que
este lhe oferece não é nem o contrário do
tédio nem o seu remédio. Daqui a confissão
que assinala a culminação positiva da sua
crise cultural, moral e psicológica; Sandro
propõe a Claudia que se case com ele; tam
bém ele, por vezes, pensa, como Dino, que
mais vale morrer do que continuar a viver
daquele modo.
Sandro e Anna não comunicam. Só o amor
físico é possível entre eles, não se estabelece
outro contacto. «Estarmos longe um do outro
é um tormento tenta explicar Anna a Clau-
dia.—É difícil manter de pé uma, ligação vi
vendo cada um para seu lado. Mas é também
cómodo. Porque pensas o que queres. Quando,
pelo contrário, sabes que ele está aí, mesmo
na tua frente, em pessoa, já não há intimi
dade.» Para tornar mais real esta intimidade
38
3
l-
i •
34
de contacto físico; é justamente então que,
com desesperada indiferença, se deixa arras
tar de novo para todas as aventuras nesse
sentido possíveis. O encontro com os dois
jovens arquitectos, logo a seguir à confissão
feita a Claudia, à proposta de casamento, im-
pele-o novamente para o tédio no que este tem
de semelhante a um divertimento de género
muito particular nos seus diversos aspectos de
«distracção» e olvido. O propósito de separar-
-se da realidade, de esquecer tudo o que havia
desejado ser, determina o seu violento e im
previsto desejo físico por Claudia no quarto
do esquálido hotel de Noto; para esquecer
a promessa de abandonar Ettore — dá-se
conta, durante a festa de San Domenico Pa-
lace, de que só em palavras se queria libertar
de Ettore — acompanha a prostituta de luxo.
O tédio serve-lhe, mais uma vez, para velar
o mundo à sua roda, para levar a realidade
à opacidade do início.
Sandro não é apenas transparente a si
próprio; torna-se também transparente, no
fim, a Claudia: comunicam. O gesto da mulher
ao acariciar, após alguns instantes de hesi
tação, a nuca de Sandro não se confunde com
um simples perdão perante a «traição»; e
parece-nos que nem sequer se pode falar sim-
plisticamente de «piedade». «Poder-se-ia viver
sem nenhuma relação com algo de real e não
sofrer com isso?» — interroga-se o Dino de
Moravia. Este é também o verdadeiro pro
blema de Sandro: o seu choro —pela pri
meira vez o vemos chorar— tem justamente
o mesmo significado; e o gesto de Claudia
35
J
.
deve ser relacionado com a compreensão do
próprio problema. Uma semelhante comuni-
cabilidade é outro elemento novo que emerge
li do conjunto da obra de Antonioni; determi
nando-se no final do filme, conclui ele todavia
a «aventura»? Ou seja, que dimensões assume
este elemento no itinerário do autor, dentro
$ de que âmbito e com que ulteriores possibili
dades se articula? É possível dizer, como
. podia parecer antes da exibição de A Noite,
!;'ii que ele parece mover-se numa perspectiva
e com dimensões mais abertas, orientadas
para a superação de uma solidão que leva ao
«vício absurdo», ao «grito» do suicida? Por
<!• outras palavras: levam-no as novidades apon
te tadas a uma efectiva «mudança» da sua visão
í ■'
do mundo? A resposta vem-nos justamente
E de A Noite. Estilística e estruturalmente,
$ A Noite acentua o carácter estático de
A Aventura. Como no romance moderno, de
eh vanguarda, Antonioni, depois de ter renun
ciado à trama, renuncia agora, ainda mais,
ao protagonista, atinge a deseroicização da
sua narrativa. Já A Aventura é o resultado,
rigorosamente prosseguido e conseguido, de
uma paisagem entendida quase como proemi
nente, e não mais apenas como indispensável:
«Senti a necessidade de fragmentar muito a
acção inserindo, em muitas sequências, enqua
dramentos que podem parecer formalísticos
e não essenciais, enquadramentos de tipo ver
dadeiramente documentário (uma tromba de
água, o mar, a passagem do golfinho, etc.),
que, na realidade, são para mim indispensá
; veis porque ‘servem’ a ideia do filme.»
!/■
jíri 86
M
mI
O fluir dos pensamentos e das associações
em vez do fluir dos acontecimentos, o fluxo
da consciência em vez dos heróis individuais,
a simultaneidade dos estados de ânimo, estão
no centro de A Noite. Que é o interminável
passeio de Lidia, primeiro no caos da vida
citadina, depois na aparente tranquilidade
da periferia, senão um longo monólogo inte
rior, senão a imagem caleidoscópica de um
mundo desintegrado que ela desencadeia den
tro de si (e não é já talvez o despertar de
Claudia no quarto do luxuoso hotel de Taor-
mina um monólogo interior igualmente belo,
artisticamente conseguido?). Aqui, tal como
em A Aventura, Antonioni demonstra a sua
completa maturidade em semelhante espécie
de análises; aqui a novidade da sua linguagem
fílmica. Depois do «cinema intelectual» de
Eisenstein, da teorização do monólogo inte
rior pelo realizador soviético feita reenla-
çando Joyce, o cinema psicológico na nova
concepção do adjectivo — onde toda a reali
dade se torna conteúdo da consciência psí
quica encontra as suas primeiras culmi-
nâncias, supera os resultados de Bresson e do
melhor Bergman. Em Chaplin, em Visconti,
na esteira da psicologia tal como era enten
dida no romance oitocentista, «alma e carác
ter contrapõem-se como pólo oposto ao mundo
e à realidade, e a psicologia não é senão a
relação antitética entre sujeito e objecto, eu
e não-eu, intimidade e mundo externo». A An
tonioni, pelo contrário, como na literatura do
novo século, a de Proust e a dos seus prede
cessores e continuadores directos ou indirec-
37
J
■
i
(tal-qual a parede invisível que separa Valen-
tina dos outros), e a ambos falta a possibi
lidade de harmonizar, de fazer ajustar os
aspectos externo e interno das suas existên
cias; também ela, já o vimos, está condenada
a viver como espectro numa realidade irreal,
isto é, absurda: a impossibilidade opulenta
e entediante da villa} como diria o Dino de
Moravia, própria dos móveis que foram esco
lhidos por serem caros; o seu pai, o rico indus
trial, que, tal como Ettore, não acredita senão
no dinheiro e, justamente por isso, vê na cul
tura conformista, em Giovanni, um bom negó
cio; os convidados, que se relacionam mais
com os «sonâmbulos» de Broch do que com os
«demónios», os «monstros», de Doderer (a
imagem, a alegorização dos monstros é ine
rente a Fellini devido às vertentes místicas
deste). Estes sonâmbulos, tanto na sua pa
rada na villa em Brianza como durante a festa
do San Domenico Palace, já não vivem: são
marionetas, autómatos, mortos como Patrizia
e Raimondo, Corrado e Giulia.
Antonioni sintetiza ainda mais todo o seu
«tempo» no conceito e na expressão «o bur
guês»; gravita em torno do burguês como um
satélite em torno do seu planeta. A época he
roica da sociedade burguesa está já definiti
vamente ultrapassada. Não haverá lugar, pos
sibilidade de existência, para a stendhaliana
Mathilde de La Mole? Tal como os de Ma-
thilde, também os belíssimos olhos de Valen-
tina, dos quais se exala o mais profundo tédio
e a desesperada convicção de não poder encon
trar a felicidade, se fixam em Giovanni; mas
39
este, ao contrário de Julien, é como os outros;
com ele a vida não deixaria de ser uma se
quência de dias todos iguais. Não é decerto
um Danton (Valentina pretende despertar um
convidado que dorme: «Acordemo-lo; as horas
passam e acontecem tantas coisas». «Não é
verdade — responde Giovanni —, nunca acon
tece nada»). Para Giovanni (e para Sandro)
o «coito é conteúdo e estilo de vida, variado,
atraente, virulento». Lukács sublinha como
um problema análogo é aflorado por Broch,
Kafka, Musil e outros, e como, apenas em
pouquíssimos casos, se trata de uma impotên
cia física, e diz respeito, pelo contrário, a
uma impotência psíquica, a uma carência
do homem na sua relação com a mulher ou,
melhor, a uma traição para com a mulher
que se pretende seja humilhada a objecto,
cujas qualidades não carnais já não são apre
ciadas. É todavia de notar que não ê Anto-
nioni quem deseja esta humilhação, mas sim
as suas «personagens»; que a mulher assume
mesmo, na concepção do autor, um peso maior,
uma vitalidade negada ao homem. Esta reva
lorização da mulher inicia-se em Antonioni
com As Amigas, com o seu encontro não
casual com Pavese. Não há dúvida de que
Claudia é mais receptiva, mais «positiva» do
que Sandro, e que Lidia e a própria Valentina
são-no mais do que Giovanni. Contràriamente
à Louise de Stendhal, a qual nunca tinha
ousado julgar o marido e nem sequer confes
sar a si própria que este a aborrecia, Lidia
sente a necessidade e tem a coragem de dizer
a Giovanni o que descobriu durante esse
40
monólogo interior que termina com a notícia
da morte de Tommaso.
Lidia é transparente tanto a si própria
como ao marido; vê nele conformismo e
egoísmo; contràriamente a Tommaso, que fa
lava sempre dela, Giovanni fala sem cessar de
si e compreende que sempre recebeu sem dar
e que, por isso, também não pode enriquecer-
-se a si próprio. A imagem que um espelho
lhe devolve já não é a de um «estrangeiro»;
é posto perante a inevitabilidade de reconhe
cer como sua a carta que havia escrito a
Lidia e esquecido, e que, agora, Lidia lhe lê
nessa mancha arenosa, árida, do grande e já
deserto parque da villa depois da festa. Frente
a este homem sem qualidades — e frente à
recordação do amor que Tommaso tinha por
ela e que confessa ao marido—, Lidia não se
sente nem fiel nem infiel. Nada pode sobre
ela a corte do «jovem cavalheiro» apaixonado
pelo desporto; diversamente de Mathilde de
La Mole, não amava o seu homem apenas
quando, todas as manhãs, pensava estar a
ponto de perdê-lo em favor de outra; e, por
conseguinte, não recorre ao expediente do
ciúme para destroçar o tédio de Giovanni,
para vivificar nele uma relação interrompida
pelo tédio, para não mais lhe surgir absurda
e irreal, isto é, inexistente (assim, Lidia não
tem ciúmes de Valentina, e podemos com
preender a sua atitude para com a rapariga,
o beijo que lhe dá antes de a deixar. «Des
cobri que já não te amo e estou desesperada»
(leiamos em Camus: «Há dias em que se des
cobre quão estrangeira é aquela que se ama-
u
va.») Lidia e Giovanni compreendem, como
diz a Agata de Musil, que estão ainda indivi
sos, mas já não unidos. Estão frente a frente,
e entre eles já não há nada, verdadeiramente
nada, «como talvez, nos espaços siderais, nada
haja entre as estrelas afastadas umas das
outras biliões de anos-luz» (Moravia). Ela
não pergunta, como Claudia a Sandro: «Amas-
-me?» E, como Sandro, Giovanni não res
ponde: «Amo-te.» Grita: «Diz-me que já não
me amas», quando o marido, seguindo o seu
«estilo de vida», recorre ao amplexo físico,
violento, para se atordoar, para se subtrair
à realidade que o rodeia. A resposta «Está
quieta, está quieta», enquanto a aperta e a
mantém deitada na areia, é a confirmação de
uma inútil tentativa e de uma não menos
inútil hipocrisia. Esta tentativa extrema está
destinada a falhar, já falhou, porque não pode
realizar um estado pleno, uma unicidade irre-
petível. «Ela está ali e eu estou aqui»: tam
bém ele sente que entre ambos não há nada;
e pensa que deve «atravessar, transpor e, em
suma, encher este nada» com o gesto do seu
corpo atirando-se sobre o dela, «como se,
tomando-a naquele momento, pudesse ter a
ilusão de possuí-la através de uma posse física
depois de ter falhado a posse psicológica».
A posse é impossível. Tentarem ainda estar
juntos, como propõe Giovanni, é, no melhor
dos casos, piedade.
Longe de superar num movimento em
frente o anterior, este último filme de Anto-
nioni faz chegar a «aventura» a uma mísera
conclusão. As duas madrugadas que abrem e
fecham o dia de Lidia e de Giovanni confir
mam a «noite». Também eles se compreen
dem, comunicam, são transparentes a si pró
prios; mas o resultado é ainda mais triste
do que a incomunicabilidade, ainda mais sem
esperança. A dúvida expressa por um Renan
(«Quem sabe se a realidade não é triste»)
e por um Rimbaud («Aquilo que não sabemos
é talvez horrendo») revela-se em Pontano
como uma certeza. O1 grito de Lidia, a deses
perada verificação de quanto sabe, é uma
voluntária aceitação da morte que só um ho
mem já morto na alma lhe pode dar: um sui
cídio como o de um Sorel ou o de um Verdoux,
mas bem diversamente decisivo: ele não
assume aqui o vasto significado de protesto
frente ao mundo daqueles. Neste ponto se
põe de novo, mais premente do que nunca,
a pergunta: é A Aventura, antes ainda de
A Noite, um romance, um anti-romance histó
rico? Isto é, pergunta-se se o destino dos
dias-noites destes homens concentra a crítica
do presente, de todo o nosso presente, e o
torna plenamente histórico, ou se, pelo con
trário, concentra a de um particular presente
de uma determinada sociedade óu classe; ou
seja, se a solidão que nos descreve é histórica,
de um determinado momento e, portanto, con
tingente, transitória, ou se é entendida como
estável, imutável e eterna por princípio. Não
há dúvida de que, em Antonioni, o sentimento
da vida se funda na firme persuasão wolfiana
de que «a solidão não é de modo nenhum algo
de raro ou de singular, algo de peculiar apenas
a mim e a uns poucos mais, mas sim o facto
inelutável, central, da existência humana>> -
Antonioni supera em sentido laico (isto é,
recusando a graça, o «milagre») o problema
da incomunicabilidade, a teoria kierkegaar-
diana segundo a qual cada homem vive num
incógnito impenetrável aos outros homens,
imperscrutável a todas as forças humanas ;
todavia resolve este problema exclusivamente
no âmbito de poucos seres, os quais, comuni
cando, permanecem não menos desesperada
mente sós. Assim acontece com Claudia e
Sandro, Lidia, Valentina e Giovanni: eles
estão, de facto, na sua essência, todos igual
mente sós; existem puramente em função
deles próprios. É óbvio que também aqui nos
encontramos, pelo menos nas intenções do
autor, perante o «romance absurdo» de Camus,
explicado à luz de O Mito de Sísifo, e de Sartre.
Também para Antonioni o absurdo se identi
fica afinal com a condição humana. «Estran
geiro» é o homem perante o mundo: «nascido
no exilio», «morre no exílio»; e morre na
medida em que não há um amanhã num uni
verso repentinamente privado de ilusões e de
luzes (Lidia mata-se, mas o seu «suicídio»
é impotente perante o «homem absurdo» que,
como Giovanni, «quer viver sem abdicar de
nenhuma das suas certezas, sem amanhã, sem
esperança, sem ilusão, sem sequer resigna
ção». É certo que em Antonioni, tal como em
Camus, não existe uma resignação, mas sim
o reconhecimento rebelde dos limites do pen
samento humano. Ã pergunta «Como viver?»,
posta por Tchekov e, na esteira de Tchekov,
K-
kk
*
1
pelo Mann de A Morte em Veneza, também
Antonioni responde: «Não sei.» A sua não
é todavia a questão razoável de Tchekov.
A solução do problema, dizia o escritor russo,
é coisa bem diversa de uma boa maneira de
pôr o próprio problema: «só esta é obrigatória
para um artista; um artista deve ser a teste
munha apaixonada das suas personagens e
daquilo que dizem, e não o seu juiz».
Antonioni pretende ser uma testemunha
mais acrítica do que apaixonada; «impassí
vel». No seu «aristocratismo» de artista e
juntamente com os mais circunspectos e sabe
dores escritores de vanguarda, recusa a pre
tensão, considerada «arrogante», de patentear
uma perspectiva; em seu lugar, isto é, em
lugar de uma perspectiva como princípio de
selecção do essencial, coloca precisamente
uma condição humana eterna e imutável por
princípio, um nivelamento das possibilidades
abstractas, e não concretas, o divórcio entre
as aspirações do homem à unidade e o carác
ter finito da sua existência, o baldado dos seus
esforços (os de Claudia, Valentina, Lidia, San-
dro e Giovanni). Aquilo que é média, que apa
rece na média, torna-se nele típico; uma socie
dade, a sociedade; uma classe, todos os ho
mens; e, inclusivamente, nesta sua imagem da
sociedade, tudo é unívoco, não existem excep-
ções (a não ser aquelas, relativas, que já se
viram). A negação de qualquer desenvolvi
mento, de qualquer história e, portanto, de
qualquer perspectiva, torna-se marca da pene
tração da essência da realidade, de uma esta-
ticidade como forma da realidade (daqui, por
tf
.
*6 *
Shadhov e Ntoni 0), sejam vencedores-venci-
dos — e, assim, opostos aos vencidos-vencidos
de Antonioni —, ou seja, indivíduos que não
suportam o absurdo da vida burguesa, reco
nhecem a falsidade e a íntima insustentabili-
dade da ideologia capitalista e conseguem
encontrar, cada um a seu modo, uma saída
às suas antinomias: rompem no plano poético
o «falso dilema da subjectividade impotente
e da objectividade absurda e infame».
Por via da carência de tipicidade efectiva,
historicamente determinante, a «noite» de
Antonioni deixa de ser uma desgraça aciden
tal, o círculo fechado de um longo e aterrori-
zador episódio, uma etapa da vida humana.
Esta «noite» não conduz, como vimos, a ne
nhum futuro: o futuro, como escreve Flaubert
no seu epistolário, «é o que de pior existe no
presente, e todos os presentes são irrelevantes
e vazios, do mesmo modo que o foram no pas
sado, quando este era presente». Daqui, em
última instância, a angústia como entidade
atemporal absoluta, como sentimento central
do mundo, como condição, e única, do existir.
«A história universal segundo o tédio — pensa
o Dino de Moravia — baseava-se numa ideia
muito simples: a mola da história era o tédio,
e não o progresso, nem a evolução biológica,
nem o facto económico, nem nenhum dos ou
tros motivos que os historiadores das várias
escolas costumam aduzir». Viu-se que também
Antonioni está «entusiasmado por esta magní-
2 b- í*
:ííj ■:
de tais mudanças) no próprio momento em que
a intuição subjectiva e irracionalista do reali
zador parece estar, e está, virada para o
oposto. A generalização e a atemporalidade
tendem, em virtude dos pormenores realistas,
a assumir um lugar no tempo, uma autenti
cidade.
De facto, em A Aventura e em A Noite,
estes pormenores realistas referem-se — ao
recusar as «vertentes» místicas de um Fel-
lini — a uma realidade social que é a burguesa
(no segundo, mesmo, ao neocapitalismo: o in
dustrial), ao seu estado «agora e aqui»; com
põem com imagens vivas e concretas uma
galeria de «sonâmbulos», de figuras que pos
suem uma surpreendente corporalidade mesmo
onde se movem e agem com marionetas ou,
melhor, precisamente quando assim se movem.
É aqui, na psicologia estática, na indagação
psicológica destas figuras, que o «realismo»
do documentário se ajusta a um adequado
simbolismo, se transforma em climas e atmos
feras (a tromba de água, o mar, as madruga
das, os homens que «assediam» Claudia na
praça de Noto, a «demonstração» dos machos
sicilianos perante a pseudo-actriz-escritora, a
aldeia abandonada, a farmácia, o inesperado
aparecimento dos padres, em A Aventura; e,
em A Noite, o corpo-a-corpo dos teddy-boys,
os jovens com os foguetes, o parque deserto,
do fim). Antonioni, que pertence inegável-
mente à categoria dos grandes criadores de
imagens, atinge aqui um perfeito acordo entre
a descrição externa e a descrição dos senti
mentos, das suas mutações, um equilíbrio e
Jf9
uma unidade entre os ambientes e os ânimos:
o seu estilo patenteia-se tanto sob como dcn-
» • tro destas imagens num movimento interior
l?i que «adopta as suas regras e a sua ordem:
a ordem e o movimento dos próprios pensa
mentos» (Flaubert). Esta coerência estilística
ii é aperfeiçoada, mas não muda em Antonioni:
\ :j. : agora, ele diferencia o ritmo das frases, da 1
montagem sintética passa à montagem analí
tica, mas continuamos a ter a mesma impres
são de «monotonia».
II; Antonioni demonstra assim saber o que
é a arte, mesmo através da tendência na
turalista, simbólica e alegórica a que estes
!f dois filmes, mais do que os outros seus ante
: si riores, se submetem (o livro que conduz Gio-
vanni ao sucesso tem inclusivamente um título
emblemático: A Estação). Faltam nele aqui
Blit — ao contrário do que acontece com Res-
nais — os modos formalistas tecnicistas, ama-
neirados e literariamente retóricos de exposi
ção do conteúdo formal, a routine mecânica
e experimental da chamada nouvelle vague,
Godard incluído. A invenção dos meios expres
sivos ou, melhor, a elaboração, em termos
cinematográficos, dos inventados pela narra
tiva aludida, é a base poética de A Aventura
e de A Noite; e, conjuntamente, a evidência
sugestiva do mundo neles descrito; uma suges
tão que não remete ao «fascínio» do pessi (
mismo, mas sim à reflexão, e provoca ainda I
antes desta uma reacção no público atento,
1,1 activo. «Esta noite — anotava Flaubert — es- I
tt* tou tão abatido que não consigo empunhar
a pena: é o resultado do tédio que me propor-
ri*
50
í.
—t L
r
■
;
ciona a visão de um burguês. O burguês torna-
-se-me fisicamente intolerável. Dá-me vontade
de berrar.» Não é o monstruoso que assusta,
diz Adorno; é o seu carácter óbvio. O óbvio
destes homens sem qualidades (Sandro, Gio-
vanni, etc.) e destas qualidades sem homens,
da sua estrutura psíquica, dos motivos e dos
tecidos de que são feitos o dia dos «sonâmbu
los», a sua noite, os seus impulsos, compor
tamentos, inclinações; o óbvio do nexo entre
a crise da arte e o conformismo, de uma rela
ção puramente física com a mulher que não
significa possuí-la e «equivale à pintura (e à
literatura) pornográfica, isto é, a um não
possuído».
Assim, se a descrição (e, portanto, a crí
tica) da estrutura e da família burguesa não
está ligada —-nas intenções do autor— com
um «para onde», não contempla as forças no
vas e de qualquer modo vitais, algumas das
quais operam no seio da própria burguesia,
isto é, não contempla um «aqui e agora» que
é também, e sobretudo, um período de lutas
culturais, de contrastes entre concepções anta
gónicas da vida; se a imediatez da descrição
se exprime no que Antonioni vê, na sua expe
riência subjectiva, a patente recusa do mundo
e das estruturas burguesas permite-lhe nestes
dois filmes olhar para o seu «presente» não
só sem esperança e sem ilusões, como também
sem medo. O que equivale a uma cessação da
angustia «cega e pânica frente à realidade».
Ao descrever a liquidação de um presente para
além do qual o realizador nada pretendeu ofe-
recer-nos, os dois filmes postulam implicita-
51
mente a necessidade de uma superação da
angústia como entidade atemporal absoluta,
ri põem a pergunta de se o problema é o de
aproximar-se ou — realisticamente — afastar-
} -se dela. A «aventura» permanece assim ao
: P • mesmo tempo concluída e aberta, em sus
penso; e não é de excluir que Antonioni opere
mais depressa do que se possa pensar uma
qualquer reviravolta, que, numa realidade me
nos circunscrita, mais objectiva e dialéctica,
descubra um carácter, uma tendência, que pre
cisamente o conformismo combate e nós dese
jaríamos acentuar e favorecer.
' «Quando se escreve bem tem-se contra si
dois inimigos — observa Flaubert: —1)0 pú
blico, porque é constrangido a pensar, porque
é obrigado a um trabalho; 2) O governo, por
que sente em nós uma força, e o poder não
ama um outro poder.» (Tenha-se presente que,
. para Flaubert, o estilo é apenas uma maneira
de pensar, que, se a concepção é débil, não se
conseguirá nunca escrever de um modo efi
caz.) Os filmes de Antonioni são por certo par
ticularmente difíceis, e há nele a intenção de
«desagradar», de espezinhar a moral corrente,
a hipocrisia. Mas o público, uma boa parte do
público, quer hoje pensar, pelo menos quando
vai ver um filme artístico. Como se viu nestes
últimos meses e, recentemente, também com
:r >
A. Noite, o verdadeiro e mais terrível inimigo
. ■jíí é um só.
! Cinema Nuovo, n.° 149
Sl
lif
Mi
: r> I *í
Wi
« O ECLIPSE*
por Pierre Billard
56
w jl
aceita fazer batota com a vida. “É o duma
mulher lúcida, e portanto inquieta perante
tantos sinais de loucura do nosso mundo per i
58
f•
«O DESERTO VERMELHO»
por Gilles Jacob e Pierre Philippe
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i-i l
Tremendo de frio, enregelada, Giuliana não
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m
■' ■ i
’
consegue aquecer-se nem ao contacto com os
seus amigos na cabana nem com o amor de
Corrado. As paredes estão nuas, os tabiques
í ff
fl ; estão nus (arrancam-nos para os lançar ao
fogo), a loja permanecerá vazia e não passará
de um pretexto para sonhar, para preencher
o tédio. Os pássaros desapareceram, as flores
rarefazem-se, o sol não rompe: é o Inverno da
i)
alma. Nesta progressiva glaciação do mundo
moderno, o supérfluo, mesmo simbólico, é anu
lado: desapareceram os adolescentes brutais,
os cortejos de órfãos, os lançadores de fogue
tões. A substituí-los, um velho junto duma
i -fl! 1
carroça de fruta, um operário à escuta dos
murmúrios dos radares, um marinheiro cuja
linguagem é misteriosa, como em O Silêncio.
O mal-estar, nascido da dificuldade de ser
m e de comunicar, que pesava em A Noite e em
O Eclipse, era temperado por raios de humor.
Em A Aventura, o comerciante de fruta seria
pitoresco, como o camponês que dizia: «Por
que quatro horas da manhã para o senhor é
cedo?» Aqui, olha em frente sem dizer nada.
Falar para quê? Já não nos ouvimos nem nos
compreendemos. Desapareceu o humor bem
como a miséria. Os operários de O Deserto
Vermelho têm aparelhos de televisão e frigo
ríficos, mas não parecem felizes. A obra de
Antonioni traça um círculo ou, melhor, uma
espiral, e em cada revolução o filme sofre
transformações. Já nos filmes precedentes
sentíamos o que o mundo automatizado com
porta de inumano. Este vai longe: comunica-
-nos a angústia. A inquietude do futuro tor-
60
I
nou-se angústia porque o futuro tornou-se
presente. Já não se trata da angústia atómica,
mas da vida que vivemos, do ar que respira
mos, da doença que nos espreita. Sentimos que
diz respeito a todos nós. «Temos de ser todos
tratados.» 0) A angústia que o mundo actual
segrega, os ruídos lancinantes que riscam o
nosso subconsciente (sirenes, roncas de ne
voeiro), são os responsáveis pela nevrose de
Giuliana e pelos seus suicídios falhados. Seria
necessário desenvolver este tema capital do
suicídio, cuja fascinação em Antonioni é conhe
cida. Em Le Amiclie, o suicídio não oferece
dúvidas, enquanto o de Aldo em O Grito e o
de Anna em A Aventura são apenas possíveis.
Em O Deserto Vermelho a evolução é clara:
Giuliana tenta suicidar-se defronte dos nossos
olhos? Não sabemos. Mas encontramo-la ao
volante dum automóvel a alguns centímetros
da água, e o essencial reside no facto de ela
pensar imediatamente que os seus amigos vão
crer que tentou, de novo, pôr termo à existên
cia. Pela primeira vez, as tentativas de suicídio
não resultam duma incapacidade em superar
uma dor que retira todo o sentido à vida. Era,
aliás, lógico que na sequência de O Eclipse
(«talvez não seja indispensável as pessoas
amarem-se») os sentimentos passassem para
um segundo plano. A angústia agarra-a de
novo, brutal, súbita, quando ouve o grito vindo
do barco, e foge da cabana. Giuliana volta-se,
avista os amigos à frente da proa do navio.
61
,^
62
■
i,\
M
Esta atracção um pouco vertiginosa da cor
e das formas novas deveria constituir um
poderoso antídoto. Antonioni salvou-se do de
sespero: encontrou o caminho da beleza.
G. J.
68
de quase a ter roubado, a sanduíche dum ope
rário. A falha. Eis que a dúvida se infiltra.
Vigio Monica, não deixo passar nada. Tentam
apanhar-me, explicam-me que ela teve um aci
dente de automóvel, um choque terrível. - -
admitamos. Quem é, ainda assim, esta bela
mulher que caminha com tanta sedução numa
lixeira deslumbrante de valores (Soulages,
evidentemente) ? Mais ninguém, temo, além
da Sr.n Vitti, a tentar representar às mulheres
de engenheiros e que se parece, «colada» sobre
harmonias de fazer desmaiar, com essas infe
lizes torturadas pelos fotógrafos «de arte» dos
semanários femininos, em visão branca sobre
fundo de lixo. Não acredito nesta loja aber
rante, nesta ruela desértica 0), e não acredito
nas reptações de Monica ao longo das paredes
brancas. Mas eis que ela fala. Que diz? Nadas,
que juntos uns aos outros exprimem uma das
ideias mais néscias que conheço: a inadapta
ção do homem ao mundo «fantástico» que está
a nascer, o seu medo e a sua angústia perante
os «monstros» que despertou. Tudo isto não
é nem muito sério nem muito reflectido vindo
dum cineasta que se diz «moderno». Será
necessário, uma vez mais, crer que o cinema
se arrasta penosamente a cem léguas das ou-
tras artes e que um homem como Antonioni
trata sem pestanejar um «tema» tão falso
quanto gasto, um tema que mesmo um candi
dato ao Goncourt evitaria, ridículo para um
■» i
esta decepção de agora, sugerir-lhe que in
m dubitavelmente se engana quando pretende
abranger o mundo. O mundo defende-se e ridi
I
cularizará, por todos, enxaquecas distintas de
intelectuais romanos antes que passe muito
tempo. Perante semelhantes vacilações como
deixar de evocar o entusiasmo de Fernand
Léger em face da beleza das paisagens indus
triais, mesmo no que têm de mais contestável,
como não recordar a filmagem directa dos
documentaristas, dum Menegoz, dum Resnais,
e ainda doutros, dum universo que produz
menos ansiedade ao nosso conforto que os pri
meiros caminhos-de-ferro à quietude dos ho
mens do século xrx.
66
liíl:;
I
tesoura, extrair um tal diamante duma ganga
tão evidente: nunca, apesar de numerosas ten
tativas, Antonioni tinha pintado com tanta
felicidade este erotismo doente e corrosivo que
tanto o interessa 0).
67
a ■>.
:
• i
anda à volta no fundo dum beco sem saída já
classificado de monumento histórico. Ao longe,
as fábricas, o mundo, o amor, tudo isso vive,
i canta e ruge. Os pássaros que atravessam as
3 belas e terríveis nuvens de fumo amarelas já
não são os melancólicos pardais que um alaúde
anacrónico lamenta — e procuram um cineasta
-
1
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para os cantar.
P. F.
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Cinéma 6%, n.° 91
n.
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«BLOW-UP» OU A APARÊNCIA
DAS COISAS
por Mareei Martin
69
.—I
I
r. situações e de efeitos de linguagem que nem
» sempre parecem ser evidentes. Com certeza,
tr í
í
pode pensar-se que o filme é a imagem do
mundo moderno, sobre a qual Antonioni en
tende testemunhar, brutal e colorida, à ma
neira de um Godard. Mas articula-se sobre
: M a aventura individual de um fotógrafo de
modas colocado em primeiro plano num qua
dro da juventude inglesa moderna, sem que
estes dois termos cheguem a interpenetrar-se
1. e a integrar-se de uma maneira inteiramente
satisfatória; introduz-se um elemento ié-ié,
iji!: um factor erótico e um suspense dramático
que são susceptíveis de reter a atenção de
todos os públicos e explicam sem dúvida o
enorme sucesso que o filme teve em Nova
^4 li Iorque.
No centro da história, um fotógrafo de
Ui "{W
fíi * :! i: modas dans le vent, personagem tipicamente
1
' i ' '•••' ? ; J-
Na manhã seguinte, o próprio cadáver tam
bém se volatilizou... Entretanto, o fotógrafo
passou uma parte da noite numa boite de ié-iés
e num party onde se fuma marijuanay deitado
com duas «queridinhas» vindas ao seu estúdio
70
iu
para posar. De manhã cedo, perplexo diante
da desaparição do cadáver, encontra um grupo
de mascarados que começam a mimar um jogo
de ténis: e como um dos jogadores lhe dá a
entender que uma bola acaba de cair aos seus
pés, apanha a bola, lança-a aos jogadores e
acaba por «ouvir» (e o espectador com ele)
o barulho da bola fictícia sobre as raquetas
inexistentes...
Vê-se a intenção, que não está tão longe
da de O Deserto Vermelho: do mundo visto
pelos olhos de uma nevrótica passa-se aqui a
um jogo entre o sonho e a realidade. É este
cadáver (e toda esta história) real?, ou então
é o rapaz que a sonha, tal como imagina o
barulho das bolas de ténis? Contudo a objecti-
vidade das suas fotografias demonstra a rea
lidade do cadáver, mas a fotografia nunca
captou outra coisa senão a aparência das
coisas? E o cinema, no fim de contas, não é
uma excelente arte do fugaz e da aparência?
E não é isto o drama fundamental do mundo
moderno?; somos agredidos pela aparência
das coisas (a publicidade e as suas imagens)
e já não temos tempo, nem mesmo o desejo,
de conhecer outra coisa senão as imagens
rápidas e superficiais com que a televisão e o
cinema nos enchem.
Assim, A História de Um Fotógrafo está
longe de ser desinteressante ou gratuita. Mas
não só me posso interrogar sobre a originali
dade e capacidade desta «mensagem», como
me parece que esta fica constantemente ao
nível da demonstração sem verdadeiramente
se transformar num êxito dramático e plástico
71
v convincente. Antes de ser a imagem do mundo
vista pelos olhos de uma esquizofrénica,
\ O Deserto Vermelho era uma visão artística
coerente e conseguida: ao contrário, A Histó
ria de Um Fotógrafo procura demonstrar-nos,
um pouco laboriosamente, que a fronteira en
tre o real e o imaginário é mais ilusória do que
se pode pensar, mas recorre a situações cujo
íi: simbolismo grosseiramente apoiado (a par
tida de ténis imaginada) surpreende da parte
de um realizador cujo génio tem sido sempre
V !H
o de fazer surgir do real mais simples, e mais
simplesmente filmado, significações tanto
mais convincentes quanto elas permanecem
subjacentes.
«Para que serve isto?», pergunta a Tho-
mas um dos seus modelos a propósito de uma
hélice de avião vista no estúdio. «Isto não
serve para nada, é belo!» Pode-se dizer a
mesma coisa do filme? Seria sem dúvida um
pouco injusto, e contudo... Não creio que
A História de Um Fotógrafo tenha um grande
conteúdo social nem que abra perspectivas
sobre a condição humana num domínio onde
Godard, bem ou mal, já quase disse tudo. Fica
uma obra interessante e original pela sua
forma, ambiciosa pelo seu propósito, uma
criação que é ao mesmo tempo atraente como
um cartaz e fria como uma peça de mármore.
Cinéma 67 (Junho de 1967)
72
7
!
.
ANTONIONI
I
E O CINEMA I
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mc
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I
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A DOENÇA DOS SENTIMENTOS 5
76
li'
-
I
-guerra, mesmo um pouco depois, por volta
de 1950, quando iniciei a minha actividade;
as segundas eram de carácter mais estrita
mente técnico, diziam de perto respeito ao
cinema. Em relação às primeiras posso afir
mar que é verdade que aquilo que se costuma
chamar os filmes neo-realistas italianos,
entre os quais se incluem verdadeiras obras-
-primas, era talvez, nesse preciso momento, a
única, a mais genuína e mais válida forma de i!
expressão cinematográfica, a mais justa. Atra
vessava-se um período em que tudo o que !
acontecia à nossa volta era anormal, a reali
dade queimava; existiam factos e situações
excepcionais, e por isso a relação indivíduo-
-ambiente, indivíduo-sociedade, constituía o
facto mais interessante, aquele que merecia
ser examinado. É essa a razão por que (e já
o escrevi muitas vezes, mas não me desagrada
repeti-lo, porque é uma coisa de que estou
profundamente convencido) tomar como per
sonagem de um filme, por exemplo em Ladrões
de Bicicletas, um operário a quem roubaram
a bicicleta e que por isso não pode trabalhar,
um filme cujo único tema é este, em que isto
é o assunto principal, em redor do qual todo
o filme se organiza, isto, digo, era naquele
momento o essencial, e para nós bastava-nos.
Não interessava saber quais eram os pensa r
mentos, qual a natureza, o carácter, dessa per
sonagem, quais as suas relações mais íntimas
— no sentido mais lato da palavra— com a
mulher; era possível ignorar tudo isso: o im
portante era definir as relações homem-socie
dade. Era esse o objecto predominante dos fil-
77
■
)
.1
I
■
!
formas e as técnicas de narrativa normais e
convencionais do cinema. Essa relação entre
o assunto e a técnica comecei a senti-la intui
tivamente logo com os meus primeiros do
cumentários, sobretudo a partir de N. U., que
tinha filmado de uma maneira bastante dife
rente da da até à data utilizada. (Lembro-lhes
que começara a filmar o meu primeiro do
cumentário em 1943 e o terminara depois em
1947. Principiara já a preocupar-me com as
pessoas de uma maneira muito mais quente,
muito mais directa, muito mais interessada,
do que era costume, em vez de me preocupar
com as coisas, ou com as paisagens, ou com
os sítios, como era hábito suceder em Itá
lia.) Quanto ao que diz respeito à forma do
documentário, sobretudo de N. U.f sentia a
necessidade de eludir determinados esquemas
que se tinham formado e que então nin
guém punha em dúvida. O próprio Paolucci
— que na altura era um dos documentaristas
:
79
1.;
m
í í 1: ■ -me com determinado material entre mãos,
procurei fazer uma montagem absolutamente
livre (estou talvez a pronunciar uma palavra
demasiado grande; a ideia era mais patente
| i nas minhas intenções do que nos resultados;
m
jyi
os resultados, não os quero julgar), livre poè-
ticamente, procurando determinados valores
expressivos não tanto através de uma ordem
de montagem que conferisse, com um princí
uiv 1 pio e um fim, segurança às cenas, mas sobre
tudo baseando-me numa montagem que se
poderia classificar «por relâmpagos», a partir
de enquadramentos senarados, isolados, a par
tir de cenas que não tivessem a mínima rela
ção umas com as outras, mas que apesar disso
conseguissem dar uma ideia mais mediata
danuilo aue eu aueria exnrimir, daouilo que
constituía a própria substância do documen
tário: no caso de N. Ua vida dos varredores
de ruas numa grande cidade. Quando me
decidi a fazer EscândaJo de Amor estas
ideias já tinham amadurecido, assimilara-as
já como experiência interior. Ora, como já
80
!'
6
81
i'
l
: l:
de encontrar no écran movimentos espontâ
neos e que de outra maneira não teria conse
Íli-Í guido provocar (sobretudo no caso da Bosè,
uma rapariga que não possui extraordinários
t
i f ;t
dotes de actriz, ou que pelo menos não tinha
ainda a experiência e a técnica suficientes
■ :
:
para a frio poder chegar a determinados
i: : fins). Todo este trabalho está na base dos
i! resultados de A Noite (La Notte). Daí para
: diante (é outra coisa que também só agora
]
posso afirmar, porque só hoje me apercebo de
facto daquilo que foi o caminho que percorri,
bom ou mau que ele seja) parece-me ter con
seguido libertar-me de um sem-número de coi
sas que então constituíam preocupações cons
tantes, até no campo formal. Digo formal não
no sentido de que eu quisesse absolutamente
\ atingir determinados resultados figurativos.
.
Não é assim; isso nunca me preocupou. Pelo
!
contrário, procurei sempre tentar dar, através
de um particular cuidado com a forma, uma
maior sugestão à imagem, para conseguir,
isso sim, que uma imagem construída de uma
determinada maneira me ajudasse a dizer
aquilo que com esse enquadramento pretendia
dizer e ajudasse a própria personagem a ex
primir aquilo que devia exprimir, além de me
servir para criar uma determinada relação
entre personagem e fundo, quer dizer, aquilo
que está por detrás da personagem. Julgo,
dizia, ter-me verdadeiramente liberto de todas
essas preocupações. Num certo sentido, o meu
último filme, A Noite, foi para mim revelador.
Numa entrevista que dei a um jornal francês
perguntaram-me: «Que é que o levou a tratar
82
esse tema?» Devo confessar nunca ter pen
sado porque é que tinha feito A Noite. Porque
nunca se pensa porque é que escolhemos um
determinado argumento; o argumento escre
ve-se, vem à lembrança. No entanto, reflec-
tindo sobre a pergunta, fiz uma pequena mas
muito pessoal descoberta. Esta: comecei a !
pensar todos os meus argumentos muito antes
de começar a realizá-los. Por exemplo, o argu
mento era inicialmente um assunto intitu
lado A Casa à Beira-Mar (La Casa sul Mare),
,1
escrito quando estava na Scalera, ainda antes
de ter ido para França, com Carne, em 1942. 1
Realizei-o em 50. O argumento de O Grito
escrevi-o ainda antes de realizar Le Amiche,
mas deixei-o numa gaveta e só o filmei muito
tempo depois. O argumento de A Noite escre
vi-o antes de UAvventura, mas não fiquei
muito convencido com ele. Era um argumento
coral. Aliás, antes desse argumento tinha
escrito uma outra história; a de uma festa.
Era, ligeiramente modificada, a história de
uma festa a que por acaso tinha ido. Cha
mava-se Pândega (Baldoria) e Ponti queria
comprá-la. Mas recusei cedê-la, precisamente
porque era uma história que não me conseguia
convencer; e deixei-a na gaveta. Voltei a esse
argumento só alguns anos depois, e entretanto
escrevi então aquilo que depois se deveria
transformar em A Noite. A personagem cen
tral desse argumento era também uma mu
lher, mas uma mulher feia, a quem sucedia
mais ou menos aauilo que acontecia à prota i
gonista de A Noite. Mas o facto de ser feia
— e só reparei nisso mais tarde — modificava
83
j
completamente as relações entre as persona
gens, porque deixava supor que a mudança
dos sentimentos do marido era causada pre
cisamente pela fealdade da mulher. Existiam,
além disso, demasiadas histórias marginais.
í§ ii i Tudo isso não me convencia, de modo que dei
: : ; xei ainda o argumento na gaveta. Depois fiz
I UAvventura, que tinha escrito muito antes,
durante um cruzeiro. Era também um argu
mento imaginado antes da sua realização,
precisamente porque eu testemunhara o desa
i ; :| : ! parecimento de uma rapariga que nunca mais
i\:\ fora encontrada. O facto, mesmo não me dando
então nenhum motivo para a partir dele fazer
8Jf
l-i
85
maior simplicidade. Ainda agora me permito =
fazer, e faço, certos erros de gramática. Faço-
-os de propósito, porque penso que posso assim
atingir uma maior eficácia. Por exemplo, um
certo uso não ortodoxo do «campo» e do «con-
tracampo», certos erros na direcção dos olha
res ou dos movimentos dos actores. Eliminei
portanto muitas preocupações e superstrutu-
ras técnicas, eliminei tudo aquilo que pudesse
.•, constituir os nexos lógicos da narrativa, os
í.t! saltos de sequência para sequência através
•« • .1 dos quais uma servia de trampolim à que
N'j se lhe seguia, e isso precisamente porque
me pareceu, e me continua a parecer, que
H p! hoje o cinema deve estar mais ligado à ver
} fj! dade do que à lógica. E a verdade da nossa
iikííi vida quotidiana não é mecânica, convencional
e artificial como geralmente ela aparece nas
: Pi||P histórias tal como são construídas no cinema.
i
5 . I
87
•1
h>
f
> .
estavam guardados, conseguindo chegar às
massas. E devo dizer que muitas vezes quanto
: mais profundamente o filme penetra melhor
é compreendido. (Ê o que está a suceder, por
] exemplo, com UAvveyitura, quanto mais pro
Mi.1; fundamente penetra na província maior inte
ím
■
lir
? ■ i' iilU
julgo que isso é o importante. Agora, se al
guém quiser fazer perguntas terei muito pra
zer em responder-lhe.
ti
íiiv.i;j L. Finravanti: Agradecemos-te muito, An-
tonioni, pela sinceridade com que falaste, pelo
exame crítico-histórico que fizeste das tuas
actividades e que me parece corresponder a
uma confissão profissional de opiniões muito
meditadas. Parece-me que os nossos alunos,
que te seguiram com enorme interesse, terão
com certeza aprendido muito contigo. Pode
mos portanto iniciar o nosso pequeno colóquio.
Enzo Bataglia, aluno de realização: Queria
•il falar do enquadramento do muro branco da
Noite, ao longo do qual, a determinada altura,
a protagonista se move, parecendo esmagada.
Foi pensado e previsto na planificação ou foi
improvisado durante as filmagens? Queria
saber até que ponto é que os seus enquadra-
88
4
mentos são previstos, até que ponto se deixa
guiar pelo ambiente.
Antonioni: Parece-me que no facto artís
tico existe sempre, antes de qualquer outra
coisa, uma escolha. Essa escolha que o autor
faz é, como dizia Camus, a revolta do artista
contra o real. Assim, todas as vezes que
começo a filmar um determinado ambiente I
real, determinadas sequências em cenários ;
naturais, faço o possível por chegar ao sítio j
escolhido para filmar naquilo que se poderia
chamar um estado de «virgindade». Porque :.
me parece que é do choque entre o ambiente :
e o meu particular estado de espírito nesse
momento que nascem os melhores frutos. Não
gosto de pensar nem de estudar uma cena na
noite anterior às filmagens, ou no dia ante
rior. Gosto de ficar sozinho no local onde irei
filmar, começar a sentir o ambiente vazio de
personagens, de pessoas. É para mim o modo
mais directo de conseguir recriar um determi
nado ambiente, de estabelecer uma relação com
o próprio ambiente, o modo mais simples de
deixar que o ambiente nos sugira qualquer
coisa. É claro que estamos desde início pre
dispostos de uma maneira favorável em rela
ção ao local, visto que o escolhemos e que
portanto sabemos que existem possibilidades
de nele se ambientar uma determinada cena. t.
Trata-se apenas de inventar — porque é uma
fase de invenção— a sequência, adaptando-a
precisamente às características do ambiente.
Por isso (falo, claro, apenas do meu método
de trabalho) procuro ficar sempre uma meia
hora no local onde irei filmar tanto interiores
..
89
•i ii
\ ;•
■
92
fy
começou a descrever. Ora, todo o esforço de
criação reside precisamente nessa descrição,
assim como a dificuldade em figurar uma de
terminada cena está precisamente no filmá-la.
Ora há inúmeras maneiras de eu fazer Anna
entrar num quarto e dar um estalo em Giulio.
Uma dessas maneiras é a justa, e as outras
cinquenta mil são erradas. Trata-se de des
cobrir qual é a justa. Por isso entrar em con
tacto com um ambiente novo é para mim o
mesmo que para um escritor ter à sua frente
uma folha em branco, porque não sei por onde í
é que hei-de começar. E as dúvidas continuam ■
! 1$
renta e três, quarenta e quatro mil. O que não
é muito. Para UAvventura filmei muito mais
i ri do que era necessário, mas porque filmava em
condições absolutamente loucas. Consegui for
■i: i :■ mar uma ideia do filme enquanto à minha
volta sucediam coisas violentíssimas, e além
i
disso interessantíssimas, o que me exigia um
enorme esforço de concentração, um esforço
para recusar essas coisas e conseguir que a
1 história tivesse apenas uma direcção, a direc-
\! ção e o desenvolvimento prèviamente estabe
lecidos. Isso foi o que durante as filmagens
de UAvventura maior esforço me exigiu; tudo
i V isso contribuía para me criar uma série de
dúvidas, e por causa delas via-me obrigado
a filmar muitas mais coisas, coisas que sabia
HM que talvez não me servissem, mas que, por
ib.rl garantia, procurava ter dans la boite, como
|'ií dizem os franceses.
Castello: Gostaria de fazer uma outra per
’ ' ift 4
' í gunta, de carácter mais geral. Dando como
assente que tudo o que fizeste foi porque
quiseste, porque nunca chegaste a compro
missos com os produtores, há na tua obra
alguma coisa que recuses, de que te sintas
descontente, não digo descontente na medida
em que qualquer artista tende sempre a estar
insatisfeito com aquilo que faz, mas alguma
coisa que não devesses ter feito, ou que deves
ses ter feito diversamente?
Antonioni: Não é que esteja contente com
aquilo que fiz; o facto de me sentir descon
tente é natural e é lógico. Mas parece-me que
não encontro um filme que em bloco me deixe
mais descontente do que os outros; de facto,
. ' . ’’: ;
i !# u
-I r
I-
95
;
i
« Í: Í
Depois, determinadas coisas da ilha, por exem
,j ]! ;í plo, certas coisas com o padre, com o helicóp
tero. Não sei se viram a versão integral, se a
que tinha cortes; se não tinha a cena do heli
ií’
cóptero, era a cortada: na francesa faltam
cerca de cinquenta e cinco minutos.
Krystyna Stypulkowska, aluna de arte de
representar: Queria falar sobretudo de UAv-
]; ventura; mais exactamente, do significado fi
nal de ÚAvventura. Sei muito bem que a um
i i
realizador nunca se deveriam fazer tais per
\Ú ! guntas, e peço desculpa de as fazer; mas pas
m\ sámos muitas horas, até noites inteiras, a
discutir o assunto, porque cada um de nós via
o problema de maneira diferente. Alguns di
zem que se trata de uma concepção quase que
i !} ’'••• ■ 1
pascaliana da vida e do homem, pondo a nu
a solidão de cada homem, o seu perpétuo fali-
í ).!■ i mento, a sua humilhação, o caminho sem saída
iii-s: > que percorre. Outros, pelo contrário, encon
tram no final de UAvventura, apesar de per-
turbante, uma concepção que talvez seja a
mais optimista de todos os seus filmes. Que é
que acha? Quanto à segunda pergunta, ape
sar de ser bastante banal, interessa-me muito
porque sou aluna de representação. Como é
que trabalha com os actores? Por exemplo,
citando o nome de três actrizes bastante dife
rentes umas das outras que trabalharam con
sigo: Lucia Bosè, Jeanne Moreau, Monica
Vitti.
Antonioni: Parece-me que será útil ler-vos,
porque o trouxe precisamente pensando que
poderia vir a ser necessário, aquilo que disse
96
O ECLIPSE: Alain
' Delon e Monica Vitti
(Foto de Filmes Lu-
som undo)
O DESERTO VER
MELHO: Richard
Harris e Monica Vitti
(Foto de Doperfilmc)
•31 ■;:!:
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BLOW-UP: Vanessa Redgravc e David Hemmings (Foto de
Vida Mundial)
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i
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BLOW-UI
David Hei
mings ( F o
de Vida- Mu
dial)
O GRITO: Betsy Blair
e Steve Cochran (Foto
de Mundial Filmes)
A NOITE Marco
Masti<fianni e Jcanr
M o i »■ a 11 ( FotO Ú
Ftunk Fihnps)
O ECLIPSE: Moni
Vitti (Foto de F
mr.fi Lusom undo )
■
■ •
4
ou superados, porque são apenas desadapta-
dos, e que condicionam sem ajudarem, com
V! plicam tudo sem sugerirem uma solução.
íl :M E apesar disso o homem não se consegue
desembaraçar desse peso. Impelido por forças
|i 1 J e mitos morais, que hoje, em vésperas de se
alcançar a Lua, não deveriam continuar a ser
V: t)s do tempo de Homero, mas que no entanto
t!
:l
ainda o são, o homem ama, odeia e sofre.
Sente-se disposto a desembaraçar-se imediata
mente dos conhecimentos técnicos ou cientí
ficos, que se verificam errados: nunca, como
m
\
hoje, a ciência foi tão humilde. E no entanto
é o quietismo mais absoluto que continua a
reinar no campo dos sentimentos. Estudámo-
-los, analisámo-los, dissecámo-los durante os
últimos anos até à saturação. Disso fomos
capazes, mas não conseguimos achar outros
que os substituíssem, nem sequer fomos capa
zes de tentar colmatar o desequilíbrio cada
vez mais grave que se cavava entre o homem
moral e o homem científico. Claro que eu não
quero, nem posso, resolver o problema; não
sou um moralista, nem o meu filme é um ser
mão ou uma denúncia: é apenas uma narra
tiva feita com imagens, de que espero que
resulte não o nascimento de um novo tipo de
MU
\m sentimento, mas, sim, a maneira como hoje se
íi
adulteram os sentimentos. Porque, repito-o,
í existe uma moral velha, velhos mitos, velhas
i!
convenções. E todos nós sabemos que são
íí velhos e superados; mas todos os respeitamos.
i
Porquê? As minhas personagens não concluem
; por uma anarquia sentimental, quanto muito
atingem uma forma de piedade recíproca.
m m 98
$
/
99
■ í;
\y:\
Isto foi o que li em França. Parece-me que
.1
"■ \
ESCOLA £ * ;
BI8LI0T -
I
1
tura comunicam apenas entre si através do
trait d’union que é a piedade; não falam.
Enquanto em A Noite as personagens falam,
comunicam, têm a consciência do que lhes
sucede. Mas o resultado nem por isso se modi
fica. Por parte do homem encontramos a hi
pocrisia (e aqui o discurso podia alargar-se):
recusa o colóquio precisamente porque sabe
que se naquele momento aceitasse falar seria
o fim. O que é também uma maneira de que
rer que a relação continue; e sobressai então
o aspecto optimista da história.
Castello: Parece-me um pouco ridículo
querer-se estabelecer à viva força se um de
terminado final é optimista ou pessimista.
No entanto, notei uma certa divergência de
opiniões. Parece-me que o final de UAvven-
tura é muito mais optimista do que o de
A Noite. Mas há pessoas que têm precisa
mente a opinião contrária.
Antonioni: Uma vez em que Pirandello se
encontrava numa situação semelhante à minha
bombardearam-no com perguntas sobre as
suas personagens, as suas peças, as suas
comédias. E ele respondeu: «Como é que hei-
-de saber? Sou o autor.» A segunda pergunta,
a que ainda não respondi, é sobre a represen
tação. Em relação ao trabalho dos actores
tenho determinadas ideias, as quais não sei
se serão justas ou erradas mas que, no en
tanto, são minhas. Koje, fazendo o balanço
daquilo que constitui o meu trabalho com os
actores, posso dizer que trabalhei de uma
determinada maneira porque não me apetecia
trabalhar de outra, porque sentia que tinha i
101
I- ■ i: '•«
=
í i razão em utilizar o método que praticava por
que verificava que trabalhando dessa maneira
i\
ÍU V
obtinha determinados resultados que com ou
tro sistema diferente não poderia obter. E tam
! ■:
f!• i|i bém porque não pertenço ao tipo de realizador
: como, por exemplo, Visconti e De Sica, que
• íi conseguem fazer «ver» a cena ao actor, que
'B 5 conseguem representá-la. É uma coisa que
! nunca conseguiria fazer, porque não sei repre
,
i 1 •> sentar. Mas parece-me que mesmo assim sei
13.il1 -1■; :! muito bem o que pretendo, quais as minha*;
iU ; ideias. Parece-me que um actor não deve com
Ui ; preender aquilo que está a fazer. Nos meus
1. i : li primeiros contactos com os actores, sobretudo
com certos actores estrangeiros, é sempre essa
a maior dificuldade que encontro. Mas se
fosse verdade que um actor deve perceber o
que está a fazer, o melhor actor seria então
o mais inteligente: o que não sucede, e a rea
lidade encarrega-se muitas vezes de demons
trar precisamente a inversa. Quanto mais um
actor se esforça por compreender o signifi
cado de uma determinada cena, quanto mais
procura aprofundar um diálogo, ou uma se
quência, o próprio filme, maiores danos sofre
a sua natural espontaneidade e por consequên
. í :!1 cia a realização da cena. Ã parte o facto de
II j V
que, se age dessa maneira, transforma-se por
assim dizer no realizador de si próprio. O que,
além de não constituir uma vantagem, se
II i{ transforma num factor negativo. Não me
I: parece que se deva exigir a um actor que tra
balhe com o cérebro, mas sim que ponha o
instinto a trabalhar. Eu, que sou o realizador,
í não devo perder tempo a tentar descobrir
ii
!
102
:
/
i
quais são os meus planos em relação ao actor.
Se lhos revelo, ele transforma-se imediata
mente numa espécie de cavalo de Tróia, um
cavalo de Tróia que penetra na minha praça
forte, que é só minha, porque só eu é que
sei o que pretendo, porque só eu é que sou
capaz de avaliar se o que o actor me dá me
convém ou não. Eu vejo-o, porque para mim
o actor é um dos elementos de um determi
nado enquadramento, precisamente como uma
arvore, um muro, uma nuvem, e se a sua po
sição se modifica, todo o enquadramento se
modifica com ele. E só eu é que posso saber
se essa modificação é oportuna ou não; não
o actor. E, como disse há pouco, um diálogo
dito com a máquina alta possui um signifi
cado determinado, diferente do que se diz
com a máquina baixa, de lado, de perfil ou
de frente. São tudo coisas que só o realizador
pode julgar, porque só ele consegue ver a
cena no seu conjunto. O actor não.
O mesmo se pode dizer da entoação. A en
toação, antes de ter um significado, de se
transformar num diálogo, é um ruído. É um
barulho que se deve fundir com os outros
ruídos da imagem; ora são barulhos que
na imagem, na altura em que o actor repre
senta, ainda não existem — tudo factos que
o actor ignora, mas que o realizador sabe.
Mas de maneira nenhuma excluo a improvi
sação de um método como o meu. Porque, se
o actor, ao representar uma determinada cena,
seguindo as indicações que lhe sugeri, se en
gana, deixo-o sempre continuar. Deixo-o con
tinuar a enganar-se, porque quero ver, antes >-
103
I
I II. 1.
■í> ■:
=
\
i i ; ». de o corrigir, se os erros que faz me poderão
j|_ ser úteis. Porque eles, nesse momento, são
j:: i h
aquilo que de mais espontâneo o actor me
n
mk ' \
oferece. E é isso de que eu tenho necessidade,
da sua espontaneidade, mesmo se a obtenho
enganando-o. Muitas vezes experimento de
u; | terminadas reacções, com diálogos que nada
11m
j têm a ver com eles, e sinto-me embaraçadís-
simo quando os actores me pedem explicações.
Precisamente porque eu só lhes posso dizer
i determinadas coisas, nada mais. Quando fil
- 3 U mei O Grito, essa óptima actriz que é Betsy
ttl \ \M
1 ;■ 2
Blair quis ler o argumento comigo, pedia-me
explicações a cada instante. Passei as duas
horas mais infernais da minha vida, porque
fui obrigado a inventar significados que não
existiam, mas coincidiam perfeitamente com
aquilo que ela achava que devia ser. E tam
bém é necessário ter em conta o que os actores
querem que uma determinada coisa seja.
Existe ainda uma outra razão para o meu
método de trabalho. Se de facto fosse sempre
necessário explicar a um actor a cena que se
vai filmar, seria também lógico que a expli
cação dessa cena se mantivesse a mesma,
qualquer que fosse o actor que a interpre
; ,n '!
tasse. O que não sucede. Porque sei que a de
i I
terminados actores devo dizer certas coisas
para obter um determinado resultado, a outros
: ?s Íi outras, para obter esse mesmo resultado. Por
que conheço o seu temperamento, porque com
S: ' !
' preendi a sua maneira de reagir, porque sei
que se tocar em determinadas cordas reage
2 de uma maneira, se noutras doutra; e pare
1 ■
ui
:
mfi;
104
. ' ■■;:
;t
não é possível utilizar sempre o mesmo sis
tema. Para mim a cena permanece sempre
a mesma, mas para obter de cada actor deter
minados resultados vejo-me obrigado, a mu
dar de método, a mudar as explicações.
Stefano Satta, aluno de arte de represen
tar: Apesar de UAvventura e de A Noite ter
minarem com dois encontros (o senhor falou
de piedade) e de O Grito terminar com um
suicídio, a mim parece-me que tanto UAvven
tura como A Noite estão mais eivadas de
desespero e de angústia que O Grito. Gostaria
de saber a que é que isso se deve, se não é
devido ao diferente ambiente social.
Antonioni: É uma pergunta a que os crí
ticos poderão responder muito melhor do que
eu. Não me está a fazer uma pergunta, está
a fazer-me uma observação. Diz-me que em
A Noite e UAvventura se obtiveram determi
nados resultados que em O Grilo não se con
seguiram alcançar. Quando me diziam — a
propósito de O Grito — que era frio, cínico,
desumano ate, parece-me que não estavam
a ter em linha de conta as pesquisas formais
que eu tentava viver num filme intuitivamente
claro, e que depois deram os seus frutos nos
outros meus filmes. Talvez esses dois filmes
expliquem um pouco 0 Grito, filme que, se
hoje fosse de novo projectado em Itália, talvez
£/btivesse maior êxito do que o que teve.
/ ' Íq entanto, a mim parece-me que 0 Grito era
\ftlme mais pessimista, mais desesperado,
do^ qu£"xo,^ outros dois que mencionou, talvez
até porque eu, nesse preciso momento da
minha vida, au-avessava uma grave crise de
105
f
. í it:í I
depressão. Não sei, de facto, que é que lhe
; poderei dizer mais.
Satta: Gostaria de precisar a minha per
\ gunta. Em O Grito encontrei um maior calor
! i': humano, mais do que em UAvventura ou em
*
:r A Noite; quer dizer, O Grito termina com um
suicídio, portanto de uma maneira mais dra
mática e trágica; mas na realidade esse filme
é, sob certos aspectos, mais optimista do que
UAvventura ou A Noite} que me parecem
U ,! mais frios, apesar de neles se aperceber um
certo vislumbre de esperança.
Antonioni: Mas, visto que esse calor hu
mano não serve ao protagonista para se sal
var, não lhe serve para evitar a sua perda,
parece-me que a conclusão do filme se torna
mais desesperada que a dos outros. Não sei.
Apesar de tudo esse calor não serve para
«ligar» o protagonista de O Grito a qualquer
coisa. É uma pessoa que já não «liga» com
a vida.
Satta: Gostaria de fazer outra pergunta: •*
a propósito da cena final de A Noite tive a \
:) sensação de que o filme se transformava,
abandonava um pouco aquilo que se poderá
chamar o seu estilo: enquanto foi sempre
acusado de fazer falar pouco as suas perso
nagens, no final de A Noite sucede quase o ?
106 i
3
l;•
I
»;
i
íoi
II '
■'íl ' I
*fj || ;
para dizer, se o senhor, como julgo que sucede
a quase todos, já esqueceu. O problema do
esquecimento é-lhe muito caro, parece-me tê-lo
ff íjl
i <
reencontrado em UAvvcntura como um tema
fundamental. Queria precisamente perguntar-
-lhe se, perante um jovem que o olha, ou lhe
pergunta qualquer coisa, fica calado ou se
n [ 1 sente que lhe pode dar qualquer coisa.
Antonioni: Podia responder à sua per
gunta de várias maneiras. Posso, no entanto,
iiiif ^ dizer-lhe desde já que não sou nem um mora
*
108
‘'v-
■
>
I
então o discurso mudaria, deveria ser posto
noutros termos. Mas parece-me que pôs a
pergunta em termos bastante vagos. E sinto-
-me bastante embaraçado para lhe responder.
Christa Windisch-Gràtz, aluna de arte de
representar: Entre O Grito, UAvventura e
A Noite agradou-me sobretudo O Grito. Agra-
dou-me o final de O Grito, porque esclarece ;;
qualquer coisa, porque chega a uma meta;
mesmo se é uma meta demasiado cruel, que
não deveria ser o que é, mas que o é. En
quanto A Noite e L’Avventura me deixam
fria, porque não apresentam uma conclusão
definida.
Antonioni: Diz Lucrécio, que é sem dúvida
um dos maiores poetas de sempre: «Nada se
assemelha a si próprio neste mundo em que
nada é estável. De estável existe apenas a
secreta violência que tudo subverte.» Pense
nisso. Lucrécio dizia isto no seu tempo, mas o
que disse continua de uma actualidade descon
certante, porque me parece que a incerteza
de que ele fala faz hoje parte integrante do
nosso mundo, continua um tema filosófico
actualíssimo. Ora não me parece justo que me
peça a mim a resolução do problema, que pre
tenda que seja eu a propor determinadas solu
ções; e uma das razões por que não me pode
exigir isso é porque sou um burguês, que trata
de dramas burgueses e não possui os meios
necessários de lhe dar o que me pede. Porque í ;
a burguesia não me dá os meios para resolver
os problemas burgueses. Por isso limito-me
apenas a indicar determinados problemas, e
não a propor soluções. O facto de os indicar
109
IP
M'i
tv
)
-lhes
como & cfoa-r~
- importante
parece-me já ta.o 1 * Gosta-
pode
soluções. oiuno de r ealí|aiuc<idez
Baruj-Hai/isen, ^ Qnto é que
ria de saber até qu hvaCão. ão é urna
ser uma forma de ~ a lucidez , ca uma.
Aníoíziorií/ pv,ep1ie Veralmente difícil POI~"
solução. Diria ate que mais
pessoa numa situaç a escala- afcí - ^ T, e
que onde existe "ff" razão de exisdr e
habitual perde toda r-iaro que sou a
portanto, é pior a minha posição de
da lucidez, porque e es sentido smiO in-
homem laico; mas em verem todos os
veja daqueles que, .Pf^^^iar na fé.
problemas da sua vida, s- p -À me ner-
Mas nem todos podem ^ fazer isso. Faz-me pex
gimtas de tal maneira grandes que me sinto
demasiado pequeno para lhe responder.
Pualo 'Todisco, aluno de arte de represen
tar: Voltando à sua maneira de trabalhar coni
os actores, disse há pouco que o realizador
procura criar no actor a sua personagem,
dando-Lhe algumas indicações, e que denois
observa as suas reaccões ~ 1 oepois
A^nton ion i : IV ã o nàn A
que o actor faça 'aquilo b 1SS° . iNTa.o deixo
tudo o que deve fazer ° que q^r. Digo-lhe
Tod isco : Está h>e *
Há três nomes de arJ*1' ^ Pergunta
Bosè, steve Cochr^0^ no seu fpJf esta. :
perieneias. três tiPo<?’ ^onica Vitt!”1^ Lu<=ia
nes: Lucia Rosi tnuito Hif ^ ttl- Três
Cocb° pouco a«tes 5°rque tinehentes de acto
Cochran por ter -T o tlnha trahoii, L°“
muito diferente ^Perjfc1' Consigo^A^3^
°Ssa hCia de u£°* SteVe
’ M°nica Vittf escola
tt:i» prove
i:
i
»
niente do teatro. Qual deles lhe deu maiores
dificuldades?
Antonioni: Steve Cochran. Porque é o me
nos inteligente.
Castello: Um momento. Há pouco disseste
que não queres actores inteligentes; este, ti-
veste-o como o querias, de que é que te quei
xas?
Antonioni: Deixem-me explicar. Era o me
nos inteligente no sentido que, quando lhe
dizia para fazer alguma coisa, ele recusava-se
a fazê-la. Se queria que seguisse à letra as
minhas instruções, que fizesse determinados
movimentos, certas deslocações pensadas em
função de um particular ângulo de filmagens,
ele respondia apenas: «Não.» «Porquê?» —
perguntava-lhe. «Porque não sou uma mario-
neta.» Ora quando se chega a este ponto...
Há um limite para tudo.
Tinha então de o dirigir com truques, sem
nunca lhe dar a entender que é que queria
dele.
Guião Cincotti: Mas das duas uma. Ou
Cochran se resignava a seguir as tuas instru
ções ou então esse teu método especial não
funcionou: Mas como os resultados foram efi
cazes, que é que sucedeu?
Antonioni: Acabou sempre por fazer aquilo
que eu queria: apenas nunca deu por isso.
Quanto ao que diz respeito a Lucia Bosè,
quase que tinha de usar a violência para a
conseguir pôr antes de cada cena no estado de
espírito que ela pedia. Se era uma cena dolo
rosa tinha de a fazer chorar, mas fazê-la cho A
rar por motivos que nada tinham a ver com
i
111 ■
! í;
parece-me já tão importante como achar-lhes
1
; soluções.
111
‘ I:
s a cena; outras vezes, se era uma cena alegre,
tinha de a fazer rir. Quanto a Monica Vitti,
I é uma actriz muito conscienciosa. Vem da
I! i'1 Academia, está portanto de posse de uma téc
nica extraordinária. Mas sucedeu também ter
v :i
mos diferentes ideias sobre uma determinada
cena; tinha então de lhe pedir que não se
metesse naquilo que era o meu campo.
: Todisco: Diz-se que o actor de teatro —
1
1! í
falo do actor com experiência — cria dificul
dades ao realizador que o dirige. Encontrou
essas dificuldades com Monica Vitti, por
exemplo, que é uma actriz proveniente do
'•'ifi i teatro ?
li Antonioni: Não, não me parece. Porque
Monica Vitti é uma actriz muito moderna
’
e no teatro nunca usou essas atitudes que se
íliíi costumam classificar de «teatrais». Por isso
ir não senti nenhuma dificuldade. E além disso
Monica Vitti é extraordinariamente expres
siva, o que para o actor de cinema é uma
■
113
8
í
à música que criasse no espectador uma deter
i minada atmosfera, através da qual as imagens
;
pudessem chegar mais fàcilmente até ele.
1 f Ji
I •
O que de resto era a função do velho piano
dos filmes mudos, que servia, antes de qual
• j quer outra coisa, para cobrir o ruído da má
quina de projecção, depois para sublinhar e
dar um maior impacte às imagens que silen
ciosamente se sucediam no écran. Apesar de a
Jb ' V;
função da música ter evoluído muito desde
então, ela continua a ser a mesma em muitos
filmes. Uma função de comentário exterior,
br ; de um comentário que tende a estabelecer
<
uma ligação música-espectador, e não música-
rit; -filme. Fazem-se ainda hoje filmes, sobretudo
americanos, em que se se vê uma batalha se
I ir .
ouve uma espécie de sinfonia em crescendo;
se, pelo contrário, se trata de uma cena paté
im tica, então há os violinos, porque se acha que
os violinos criam uma atmosfera patética, uma
atmosfera que naturalmente resulta adoci
cada e artificial. Ora parece-me que isso é um
erro, que é qualquer coisa que nada tem a ver
com o cinema, precisamente porque se man
tém voluntàriamente à margem do fenómeno
cinematográfico; é uma relação que se esta
belece entre a música e o espectador, fora da
imagem. Mas há, pelo contrário, filmes nos
quais, muito logicamente, a música se consti
tui mais naturalmente como complemento da
imagem, em que contribui para lhe aumentar
; m o significado, para lhe conferir maior impacte.
Então vê-se, como em determinadas cenas de
I/Avventura9 ou como em Hiroshima, Mon
I Amour —para citar um filme musicado pelo
: )A
'y m
i •
• íi ■ *8 »; i
•l
ui
sarnentos, os seus estados de espírito, Depois,
com o tempo (e devo dizer que isso também
sucedeu intuitivamente) verifiquei que talvez
esse não fosse o melhor método para contar
uma história da maneira que a queria contar,
porque podia suceder que a atenção do espec ■
'A
:: { tador apenas se dirigisse para os aspectos
:
u. exteriores da acção, para os aspectos exterio
res de um determinado estado de espírito, não
1
'!
sobre o estado de espírito em si. Era necessá
rio construir a cena, inventar os movimentos
:u
ij i
i
da máquina e a montagem de uma maneira
diferente, de tal modo que da aproximação
de uma determinada panorâmica e de um de
terminado enquadramento, precedente ou pos i
terior, conseguisse obter os resultados que
li }:
queria. Afinal de contas, apercebi-me de que
a técnica que usava não era suficiente para
obter o tipo de narrativa específico que pre
tendia, que era necessário ir mais fundo na
própria narrativa, que era necessário traba
lhar mais a matéria escolhendo os enquadra
mentos de maneira diferente.
Francesco Bronzi, aluno de cenários: Por
vezes, falando com os alunos realizadores, en
contramo-nos perante ideias que nos parecem
um pouco estranhas. Muitos alunos realizado
res, ou jovens realizadores, julgam que o cená
K1
i!
m \b íij
rio não tem importância. Parece que para
eles, tendo em conta os resultados formais,
filmar uma cena sobre uma parede real ou
uma outra reconstruída no estúdio é precisa I
!
que se declara, embora ironicamente, em
crise. Gostaria de saber se estas três persona
gens, semelhantes entre si também no campo
intelectual, foram concebidas por si como pro
| j) 1
curando uma personagem que pudesse resu
mir a situação de um determinado homem em
H UM
sí \ : crise, ou se isso é uma simples coincidência.
Antonioni: Parece-me estranho que possa
il‘ pensar haver uma coincidência. Evidente
mente, quando escolho a profissão das perso
j:U:
> ■
nagens dos meus filmes sei muito bem que é
r•/ que estou a fazer. Escolho intelectuais, sobre
úví tudo, porque são aqueles que têm mais cons
ciência daquilo que lhes acontece; uma intui
ção mais subtil através da qual posso filtrar a
realidade que me interessa exprimir, quer i
IH/íí (
ção do intelectual em crise, ou se cada uma
é diferente da outra.
Antonioni: Não, não me parece que tenda
para uma personagem que possa constituir o
resumo de todas as outras. É claro que hei-de
fazer um filme que conclua este ciclo dedi
cado, por assim dizer, aos sentimentos. No \
filme que preparo, apesar de nele se analisar
sobretudo o problema das relações sentimen
tais, a determinado momento, por exigências
da narrativa, esse tema perde a preponderân
cia que até aí, e nos outros meus filmes, tinha,
deixando o campo livre a outros problemas.
Bronzi: Gostava de fazer uma pergunta
relacionada com o filme a cores que pensa
fazer. Julga poder, de qualquer maneira, reno
var aquilo que hoje é o cinema a cores?
Antonioni: É impossível sabê-lo já, mas
espero consegui-lo. Mas façamos antes assim:
voltamo-nos a encontrar no próximo ano,
quando o filme estiver feito. Então respon-
der-lhe-ei.
)
r.
«L'AVVENTURA»
por Michelangelo Antonioni
m
M: : ; ' ■
m
l:-Slilt
íi
de perceber, da doença que sofrem os senti
mentos.
Não seríamos eróticos, isto é, não teríamos
a doença de Eros, se Eros estivesse de boa
saúde. E, dizendo de boa saúde, quero dizer
justo, adequado à medida e à condição do
homem.
Há, pois, uma doença. E, como lhe sucede
sempre que está doente, o homem reage. Mas
reage mal e é infeliz.
Em UAvveyitura, a catástrofe é um im
pulso erótico deste género: barato, inútil, infe
liz. E não basta saber que é assim. Pois o
herói (que palavra ridícula) do meu filme
tem perfeita consciência da natureza gros
seira do impulso erótico que o invade, da sua
inutilidade. Mas isto não basta.
Eis um outro mito que cai, esta ilusão que
basta conhecermo-nos, analisarmos minucio
samente a parte mais recôndita da alma.
Não, isto não basta. Cada dia vive-se
UAvventura, seia ela uma aventura sentimen- *
tal, moral ou ideológica.
Mas se sabemos que os velhos códigos não
oferecem mais do que um ensinamento dema
siado conhecido, porquê ficarmos fiéis a eles?
Eis uma obstinação que me parece triste-
mente comovente.
O homem, que não tem medo do desconhe
cido científico, tem medo do desconhecido
moral.
.
Cinéma 60
(Outubro de 1960)
íj
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*
íT> ;
125
!
!
• i
m
\
! i\
í !: sobre o mundo total, e não só sobre o mundo
dos outros, mas alguma coisa de mais pleno
e de mais completo: é um filme sobre o mundo
•\ã b
total, e não só sobre o mundo de hoje...
A: É-me muito difícil falar agora deste
filme. É demasiado recente. Estou ainda muito
ligado às «intenções» que me levaram a fazê-
-lo, não tenho a lucidez nem o distanciamento
i l necessários para poder julgá-lo. Creio poder
íi-f dizer no entanto que desta vez não se trata
i de um filme sobre os sentimentos. Os resul
tados (sejam eles bons ou maus, belos ou
n \r\
feios) obtidos nos meus filmes precedentes
y; • estão aqui ultrapassados, caducos. A intenção
ij n
il ■
vi
131
I
>■ .
estes raciocínios nada têm que ver com a «in
í tenção» de um filme.
í G: Por exemplo, a presença do autómato
no quarto do rapazinho é benéfica ou malé
fica?
1 A: Em minha opinião, benéfica. Porque a
i.
criança, brincando com este género de brin
; quedos, adaptar-se-á muito bem à vida que a
espera. Mas eis que voltamos à conversa de
\ há momentos. Os brinquedos são produzidos
V : pela indústria, que desta maneira influencia
i a própria educação das crianças.
í'í •i
i! «Estou ainda estupefacto com uma con
versa que tive com um professor de ciber
: nética da Universidade de Milão, Silvio Gec-
cato, que os Americanos consideram como
;!:! i uma espécie de Einstein. Um tipo formidável,
m ; que inventou uma máquina que olha e des
creve o que vê, uma máquina que pode con
duzir um carro, fazer uma reportagem de
\yí 11
um ponto de vista estético, ou ético, ou jorna
lístico, etc. E não se trata de televisão: é um
cérebro electrónico. Este homem, que dá pro
vas, por outro lado, de uma lucidez extraor
dinária, não pronunciou nunca, no decorrer
da nossa conversa, quaisquer termos técnicos
que eu me arriscaria a não compreender. Pois
bem, fiquei doido. Passado um momento não
compreendia mais nada do que me dizia. Es-
forçava-se por empregar a minha linguagem,
mas encontrava-se num outro mundo. Perto
dele estava uma rapariga de vinte e quatro
i ou vinte e cinco anos, bonita, de origem pe
queno-burguesa — a sua secretária. E ela
= compreendia-o perfeitamente. Em Itália, são
if 182
-
geralmente as raparigas muito novas e muito
simples, e que não têm senão um modesto
diploma, que tratam do estabelecimento dos
programas para os cérebros electrónicos: para
elas é muito simples e muito fácil fazer um
raciocínio para um cérebro electrónico, em
bora seja bastante complicado, pelo menos
para mim. ■
j
!/
|!!l
ii ;F ) para muitas gerações como a minha, a sua, a
do imediato pós-guerra.
: «Penso que haverá, nos anos que estão
para vir, transformações muito violentas, não
í ; só no mundo como no interior do indivíduo.
A crise actual vem desta confusão espiritual,
j ;'i desta confusão das consciências, da fé, da polí
tica; eis outros tantos sintomas das transfor
iíii mações que se avizinham. Então disse para
;lt
d mim próprio: ‘O que se conta hoje no cinema?’
E tive desejo de narrar uma história baseada
i :!
ros, fazem parte desse mundo...
A: Nem todos. A personagem de Richard
Harris é quase romântica; pensa fugir para
t : a Patagónia e não tem qualquer ideia sobre
o que há a fazer. Foge, e julga resolver assim
m
n?
\ : ■
o problema da sua vida. Mas este está dentro
dele, e não fora. É tanto mais verdade quanto
$ lhe basta o encontro com uma mulher para
provocar uma crise, e já não sabe se parte ou
não, esta história transtorna-o. Gostaria de
assinalar um momento no filme que é uma
acusação ao velho mundo: quando esta mu
lher em crise precisa de alguém que a ajude,
encontra um homem que se aproveita dela
e dessa crise. Encontra-se frente às coisas
velhas, e são essas coisas velhas que a saco
dem e a arrastam. Se tivesse encontrado al
guém como o marido, este teria agido de
forma diferente: procuraria primeiro tratá-la,
depois, talvez... Ao passo que aí é o seu pró
prio mundo que a atraiçoa.
ii m
íí
ST 1
135 f
1
I
:i
tos?
G: E será preciso conservar os sentimen
F
íf A: Que pergunta! Julga que é fácil res
ponder? Tudo o que posso dizer a propósito
t de sentimentos é que é preciso que mudem.
•* I
* «É preciso» não é o que quero dizer. Mudam.
Já mudaram.
i • G: Nos romances de ficção científica nunca
i há personagens de artistas, de poetas...
.1
A: Sim, é curioso. Talvez pensem que se
Irti pode passar sem a arte. Talvez sejamos os
; últimos a produzir coisas tão gratuitas, apa
i ti rentemente, como são as obras de arte.
!l; G: Será que Deserto Vermelho o ajuda
■
também a resolver problemas pessoais?
'f: A: Ao fazer-se um filme vive-se, e portanto
resolvem-se problemas pessoais. Problemas do
)í ■t:
nosso trabalho, mas também da vida parti
!: P
cular. Se as coisas de que falamos hoje não
Mllf
M \ são as de que falávamos logo a seguir à guerra
mi é porque, realmente, o mundo à nossa volta
mudou, mas nós também mudámos. As nossas
exigências, as nossas intenções, os nossos te
mas. Logo a seguir à guerra as coisas que era
preciso dizer eram muito numerosas; era inte
ressante mostrar a realidade social, a condi
ção social do indivíduo. Hoje tudo isso está
feito, está visto. Os temas novos que se podem
tratar hoje em dia são os que acabámos de
citar. Ainda não sei como podem ser aborda-
dados, apresentados. Tentei desenvolver um
desses temas no Deserto Vermelho, e não
penso que o esgotei. Não é senão o começo de
uma série de problemas e de aspectos da nossa
sociedade moderna e desta maneira de viver
136
N
1SH
! !
:
i .
' :
U •5'
contar histórias diferentes com meios diferen
tes. Tudo o que foi feito, tudo o que fiz até
aqui, já não me interessa, aborrece-me. Talvez
mi .
sinta também a mesma coisa?
G: Rodar a cores foi uma mudança impor-
tante ?
; i ;:
y
A: Muito importante. Tive de mudar a téc
nica por causa disso, mas não somente por
causa disso. Tinha já necessidade de mudar de
Í!
i1 r '
técnica, pelas razões de que já falámos.
«As minhas exigências já não eram as mes
mas. O facto de me servir da cor acelerou essa
I! mudança. Com a cor não se empregam as mes
mas objectivas. Ao mesmo tempo apercebi-me
de que certos movimentos do aparelho nem
sempre se adaptavam ao seu emprego: uma
:?j V: i panorâmica rápida é eficaz sobre um verme-
lho-vivo, mas sobre um verde-escuro não dá
iíp
< V- / .. |
i-'
nada, a não ser que se busque um novo con
traste. Creio que há uma ligação entre os mo
vimentos da câmara e a cor. Um só filme não
chega para estudar o problema a fundo, mas
é um problema que é preciso examinar. Fiz,
sobre este assunto, ensaios em dezasseis milí
metros muito interessantes, mas não me foi
possível pôr em prática, durante o filme, al
guns efeitos que tinha descoberto. Está-se
demasiado apertado nesses momentos. Sabe
que existe uma psicofisiologia da cor; estudos,
experiências, foram feitos sobre este assunto.
Pintou-se o interior da fábrica que se vê no
filme de vermelho; quinze dias mais tarde, os
! V: operários lutavam entre si. Tornou-se a pintar
! de verde-pálido, e toda a gente passou a viver
I em paz. O olhar dos operários deve descansar.»
íj.
r: 188
'*■» .
; I .
>
i|!íi
é agora tomada pela cor?
A: Sim, creio que é verdade. Digamos que
estão aqui reduzidos ao mínimo indispensável,
5
e nesse sentido estão ligados à cor. Por exem
plo, nunca teria feito a cena na barraca, onde
i 1 ' se fala de drogas, de excitantes, sem empregar
o vermelho. Não o teria feito a preto e branco.
í O vermelho põe o espectador num estado de
:j.: espírito que lhe permite aceitar estes diálogos.
A cor está certa para as personagens (que são
iíi■h\ justificadas por ela) e também para o espec
tador.
m G: Sente-se mais próximo das procuras dos
pintores que das dos romancistas?
ri:! A: Não me sinto longe das procuras do
«novo romance», mas elas ajudam-me menos
que as outras: a pintura e a procura científica
interessam-me mais. Não creio que me in
Ri:. R fluenciem directamente. Não há neste filme
qualquer procura pictórica; estamos, parece,
longe da pintura. E, naturalmente, estas exi
gências, que não têm na pintura qualquer
conteúdo narrativo, encontram um no cinema.
Eis onde as procuras do romance se juntam
às da pintura.
G: Tornou a trabalhar a cor no laboratório,
como o permite o technicolor?
A: Não tive confiança no laboratório du
rante a filmagem. Quer dizer, tentei, durante
I as filmagens, pôr as cores que queria, nas pró
prias coisas, nas paisagens. Pintei directa
i mente, em vez de modificar a cor no labora-
llfO
r
i
i
. í
dutor que me deixe fazê-lo.
ií! (Declarações recolhidas em fita magnética, reli
ri: das e corrigidas por Michelangelo Antonioni.)
í * •'
II Cahiers du Cinéma, n.° 160
i
!|;i : '
u >
Vi -
-J:
i I.
í;'
H2
i
I
AS IDEIAS DE ANTONIONI
entrevista de Pierre Billard
Preparação
1
Hl; é outro: é o de restringir a acumulação des
sas imagens, procurar reconhecer as que coin
cidem com o que no momento nos interessa.
É um trabalho instintivo, quase automá
i s:jl tico, que no entanto exige uma grande tensão.
Somos nós que estamos em jogo; é uma esco
lha moral muito precisa.
-• I
O que, ordinàriamente, se entende por «li
i nha dramática» não me interessa. Um meca
nismo nunca é a priori superior a um outro.
i Ijl E não me parece que as antigas leis que regu
lavam a representação dramática continuem
ainda válidas. Hoje as histórias são aquilo que
são, se necessário sem princípio nem fim, sem
cenas-chaves, sem curva dramática, sem ca-
tarsis. Podem construir-se com farrapos, frag
mentos: serem desequilibrados como a vida
que vivemos.
; Familiarizar-me com as personagens? Mas
as personagens não são desconhecidos com os
quais possamos estabelecer uma intimidade.
m Saem de nós, são a nossa própria intimidade.
P. — Que é que trabalhar em colaboração
com outras pessoas, na criação de um argu
mento, representa para si?
R. — Sempre que tentei que outros escre
vessem partes da planificação, o fruto desse
trabalho, mesmo que objectivamente fosse
excelente, era-me estranho. Qualquer coisa
que se aproximava do que eu desejava, sem
nunca coincidir totalmente. E isso dava-me
uma terrível sensação de impotência: come
çava então um trabalho de correcção, de selec-
ção, de adaptação, tão difícil como inútil,
I porque desembocava sempre num compro-
I
m
u
U5
10
!
Filmagens
■ *
I
que riem. Pessoas aparentemente sem proble
1
ífl mas. Problemas, são suficientes os meus.
No entanto parece-me que sou muito exi
gente. Não tolero que alguém que esteja perto
de mim, que trabalhe comigo, não saiba o seu
í ofício. Ou que trabalhe de má vontade. Existe
: sempre nas equipas cinematográficas uma
; ! certa indolência; é qualquer coisa de inevi
tável, de natural. Mas é isso que acima de
: i tudo detesto. Se chego a gritar com alguém
6
(o que acontece a todos os realizadores, pare
i í ce-me), é contra a resignação que grito.
.! I íj í P. — Que relações mantém com os actores,
qual é a sua concepção sobre a sua direcção?
R. — Com os actores mantenho sempre ex
:• I celentes relações, por vezes até demasiado
Generalidades
i!!
tos continentes e raças humanas, para não
I dizer nações.
P. — Qual a fase da criação cinematográ
fica que lhe parece apresentar maiores difi
culdades, requerer maiores esforços?
R. — Cada filme tem a sua história. Um
exige esforços sobre-humanos durante as fil
magens; um outro uma enorme tensão inte
lectual no momento da planificação, da dobra-
gem, da pós-sincronização, quando parece que
o material que possuímos é totalmente dife
rente daquilo que queríamos.
E depois há também a nossa história pes
soal, que não se interrompe durante as filma
gens, que, pelo contrário, se torna mais aguda,
conferindo ao nosso trabalho uma função esti
mulante ou não, moderadora, etc.
P. — Considera que o cinema, e os seus
filmes em particular, constitua um reflexo da
evolução da sociedade moderna?
R. — O homem foi sempre um reflexo da
sociedade. É, portanto, o reflexo mais antigo
da sociedade moderna. E como os filmes,
quando representam o fruto de uma sincera
exigência de comunicar, de mostrar, são
expressões do homem, reflectem sempre, de
qualquer modo, a evolução da sociedade actual. i
Este raciocínio desenvolve-se, mas ao de
senvolver-se de uma maneira essencialmente i:
lógica tenho a impressão de que acaba por
obscurecer uma verdade bem mais complexa:
a de que o homem nada mais reflecte do que
a sua própria imagem, a sua eterna luta na
sociedade. Mas não me compete a mim teo
rizar.
153
i ■■ ,
:
U'•rt: ■i
P. — Parece-lhe ter-se processado uma evo
ii lução da linguagem cinematográfica? Em que
medida contribuiu para essa evolução?
R. — A minha contribuição para a forma
h ção de uma nova linguagem cinematográfica
é um assunto que diz respeito aos críticos.
:; :
:! ; ! E não aos críticos de hoje, mas aos de ama
:i!i- nhã, se o cinema durar entretanto como arte
e se os meus filmes resistirem à usura do
1 ■i1H tempo.
Cinéma 65, n.° 100
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BIOFILMOGRAFIA V.
.
.1 I I varo, Umberto Barbaro, Tulio Pinelli (1947).
O Sheik Branco (Lo Sceicco Bianco), de
í I Federico Fellini; argumento de M. Antonioni,
Federico Fellini e Tullio Pinelli (1952).
■
n», Na sua actividaáe de documentarista, Mi- I
■
chelangelo Antonioni realizou:
í
ií;
líl 1943-1947 — Gente del Po — Realização: M.
Antonioni; fotografia: Piero Porta-
lupi; música: Mario Labroca; produ-
U;
dução: I. C. E. T.
: 1948 — N. U. (Netteza Urbana) — Realiza
ção: M. Antonioni; fotografia: Gio-
vanni Ventimiglia; música: arranjo
de jazz de Giovanni Fusco e prelúdio
de J.-S. Bach; produção: I. C. E. T.
1949 — L’Amorosa Menzogna — Realização:
M. Antonioni; fotografia: Renato Del
Frate; música: Giovanni Fusco; pro
dução: Filmus.
Superstizione — Realização: M. Anto
nioni; fotografia: G. Ventimiglia; mú
sica: Giovanni Fusco; produção: I. C.
E. T.
La Funivia del Faloria Realização:
M. Antonioni; fotografia: Goffredo
156
Bellisario e Ghedina; música: Teo
Usuelli; produção: Teo Usuelli.
Sette Canne, Un Vestito — Realiza
ção: M. Antonioni; fotografia: G. Ven-
timiglia; música: de reportório; pro
dução: I. C. E. T.
1950__La Villa dei Mostri — Realização: M.
Antonioni; fotografia: Giovanni de
Paoli; música: Giovanni Fusco, pro
dução: Filmus.
1955 — Uomini in Piu — Realização: M. An
tonioni; produção: Comité Intergo-
vernamental para as Emigrações Eu
ropeias (C. I. M. E.).
157
í í:
í
;J. ■ Ji Novembro de 1950; estreia em Por
Si
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■A
tugal: Cinema Tivoli, a 11 de Maio de
1952; distribuidora: Filmitalus.
1952__7 Vinti — Realização: M. Antonioni;
argumento e diálogos: M. Antonioni,
Suso Cecchi D’Amico, Diego Fabbri,
>r
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'
Turi Vasile; fotografia: Enzo Serafin;
cenografia: Gianni Polidori; musica.
Giovanni Fusco; intérpretes: a) epi
=
I
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zati; E. N. I. C.; lh. e 35 m.; filma
gens: Roma, Veneza e Milão, entre
Dezembro de 1952 e Fevereiro de
1953; estreia: Roma, 27 de Fevereiro
de 1953; estreia em Portugal: Cinema
Eden, a 7 de Maio de 1954; distribui
dora: Filmitalus.
1953_Tentato Suicidio — episódio do filme
em sketclies Retalhos da Vida
(UAmorc in Città) — Realização: M.
Antonioni; argumento, planificaçao e
diálogos: M. Antonioni, Aldo Buzzi,
Luigi Chiarini, Luigi Malerba, Tullio
Pinelli, Vittorio Veltroni, Cesare Za-
vattini; fotografia: Gianni di Venan-
zo; cenografia: Gianni Polidori; mú
sica: Mario Nascimbene; interpreta
ção de actores não profissionais; pro
dução: Faro Film; filmagens: Roma;
estreia: Roma, 27 de Novembro de
1953; estreia em Portugal: Cinema
S. Luiz, a 28 de Julho de 1959; distri
buição: Filmitalus.
1955 — Le Amiclie — Realização: M. Anto
nioni; argumento: M. Antonioni, se
gundo Tre Donne Sole, de Cesare Pa-
vese- planificação e diálogos: M. An-
tonióni, Suso Cecchi D'Amico, Alba
de Cespedes; fotografia: Gianni di
Venanzo; cenografia: Gianni Polidori;
música: Giovanni Fusco; intérpretes.
Eleanora Rossi Drago, Valentina Cor-
tese, Gabriele Ferzetti, Franco Fa-
brizi, Ettore Manni, Madeleine Fis- í
cher,' Yvonne Furneaux, Anna Maria
159
I
, -
yi
:!í
Pancani; produção: Trionfalcine; fil
magens: Turim, 1955; estreia: Festi
I
i | li val de Veneza, 7 de Setembro de 1955.
Inédito em Portugal.
;!' ■ ;í 1957 — o Grito (11 Grido) — Realização: M.
Antonioni; argumento: M. Antonioni;
planificação e diálogos: M. Antonioni,
160
T:
vanni Danesi, Rita Mole, Renato Pin-
cirolli, Angela Tommasi di Lampe-
dusa, Vincenzo Tranchina, etc.; pro
dução: co-produção Cino del Duca,
Produzioni Cinematografiche Europee
(Roma), Société Cinématographique
Lyre (Paris); filmagens: Roma, Sicí
lia (ilhas Lipari, Milazzo, Catana,
Taormina); estreia: Festival de Can-
nes Maio de 1960. Inédito em Por-
tugal.
1961 _ A Noite (La Notte) — Realizaçaoj M.
Antonioni; argumento, planificação e
diálogos: M. Antonioni, Ennio Flaiano,
Tonino Guerra; fotografia: Gianni di
Vennanzo; cenografia: Piero Zuffi;
música: Giorgio Gaslini; intérpretes.
Jeanne Moreau, Marcello Mastroianni,
Monica Vitti, Bernard Wicki, etc.;
produção: co-produção Nepi-Film Sil
va Film (Roma); Sofitedip (Paris);
filmagens: Milão; estreia: Milão, 24
de Janeiro de 1961; estreia em Por
tugal: Janeiro de 1964 (I Festival de
Arte Cinematográfica da Cidade de
Lisboa); distribuição: Rank Filmes de
Portugal.
1962 — O Eclipse (UEclipse) —Realizaçao:
M. Antonioni; argumento, planifica
ção e diálogos: M. Antonioni, Tonino
Guerra, Elio Bartoloni, A. Ottiri; fo-
tografia: Gianni di Vennanzo; ceno
grafia: Piero Poletto; música: Gio-
vanni Fusco; intérpretes: AlainDelon,
Monica Vitti, Francisco Rabal, Louis
161
4
11
I
il I;; Seigner, Lila Brignone, etc.; produ
I\n
I Úi
ção: co-produção Paris Film Produc-
tion (Paris) e Interopa, Cineriz
(Roma); filmagens: Milão; estreia:
Festival de Cannes, 2 de Maio de
1962; estreia em Portugal: Cinema
. 5
Império, 4 de Dezembro de 1963; dis
;\\r; tribuição: Lusomundo.
iii;
■
1
cenografia: Piero Poletto; música.
Giovanni Fusco; música electrónica:
Vittorio Gelmetti (voz: Cecilia Fusco);
montagem: Eraldo da Roma; intér
im 1
pretes: Monica Vitti (Giuliana), Ri-
chard Harris (Conrado), Cario Chio-
netti (Ugo), Kenia Valderi (Linda),
Rita Renoir (Emília), Aldo Gnotti
(Max), Lili Rheims, Valerio Barto-
leschi, Emmanuela P o 1 a , Carboni,
Bruno Borghi, etc.; produção: Anto-
nio Cervi-Films Duemila-Francoriz;
1 h. e 55 m.; filmagens: Ravena, Sar
denha; estreia: Festival de Veneza,
7 de Setembro de 1964; estreia em
Portugal: Maio de 1965 (II Festival
de Arte Cinematográfica da Cidade
! de Lisboa); distribuição: Doperfilme.
1965__As Três Faces duma Mulher (I Tre
Volti) — Realização: M. Antonioni;
. fotografia: Cario di Palma (techni-
color-écran panorâmico); música: Pie-
r 162
ro Piccioni; intérprete: Soraya; pro
dução: Dino de Laurentiis Cinema
tográfica (apenas o «prefácio» foi
dirigido por Antonioni; os dois epi
sódios foram realizados por Mauro
Bolognini e Franco Indovina); es
treia: Roma, 1965; estreia em Portu
gal: Cinema Império, 20 de Outubro
de 1965; distribuição: Lusomundo.
1966_História dum Fotógrafo (Blow-Up) —
Realização: M. Antonioni; argumento,
planificação e diálogos: M. Antonioni,
Tonino Guerra; fotografia: Cario di
Palma; cenografia: Asheton Gorton;
música: Herbert Hancock; monta
gem: Frank Clarke; intérpretes: Da-
vid Hemmings (Thomas); Vanessa
Redgrave (Jane), Sarah Miles (Patrí
cia), Verushka (Verushka), Jill Ken-
nington (Models), Peggy Moffitt, Ro-
saleen Murray, Ann Norman, Melame
Hampshire, etc.; produção: Cario
Ponti (para a M. G. M.); 1 h. e 50 m.;
filmagens: Londres; estreia: Festival
de Cannes, Maio de 1967; estreia em
Portugal: cinemas Condes e Roma, a
9 de Janeiro de 1968; distribuição:
Filmes Castello Lopes (divisão M.
G. M.).
1968_Prepara Zabricski Point (nos E.U.A.).
•)
163
u
ív-;
1:
»
■
h-
DOCUMENTAÇÃO
organizada por António Ruivo Mouzinho
I — BIBLIOGRAFIA DE ANTONIONI
|| — HEMEROGRAFIA DE ANTONIONI
a) ARTIGOS
1) M. Antonioni—Prefácio a Sei Film (trad. fran
cesa: Positif, n.° 69, Maio de 1965, pp. 82 a 91;
165
V í
1
sobre su obra», Nuestro Cine, n.° 47, 1965, pp. 4
a 10; e trad. portuguesa, com o título «Notas de
um Cineasta», Plano 5, Julho de 1967, pp. 18 a 25).
2) «Qui est Michelangelo Antonioni?». Cinéma 58,
n.° 30. Setembro-Outubro, pp. 64 a 76.
‘i;
3) Tommaso Chiaretti — «Antonioni ou le refus de
n
í 4)
la banalité». Cinéma 60, n.° 50. Outubro, pp. 12
a 21.
Guido Aristarco — «Les 4 phases du cinéma ita-
lien de 1’après-guerre». Cinéma 61, n.° 36. Maio.
.
.
: -1 pp. 4 a 14 e 122-123.
*r :
j
166
v
b) DEPOIMENTOS
c) ENTREVISTAS
167
I
t
I
liÚ : 29) Julio Diamante — «Selecção de entrevistas com
Antonioni». Nuestro Cine, n.° 1. Julho de 1961.
■li
pp. 13 a 16.
ii': 30) Oriana Fallaci — «Visite à Antonioni» — Positif,
i n.° 44. Março de 1962. pp. 28 a 35.
31) Franco Berutti — «A situação de O Eclipse na
obra de Antonioni»—Jornal de Letras e Artes,
.!
• %
I n.° 38. 20 de Junho de 1962. pp. 1 e 16.
32) Jean-Luc Godard — Cahiers du Cinéma, n.° 160.
Novembro de 1964. pp. 8 a 17.
33) «O aborrecimento é um fenómeno de sugestão».
Jornal de Letras e Artes, n.° 179. 3 de Março de
• Í! 1965. p. 11.
: 34) «O homem corre o risco de não mais se com
preender a si próprio...», Jornal de Letras e Ar
tes, n.° 184. 7 de Abril de 1965, p. 14.
35) Pierre Billard — «Voix Off» — Cinéma 65, n.° 100.
■.
l\vi Novembro, pp. 50 a 57. ]■
IJiii
III — «O GRITO»
1: h ■
!
8) Adelino Cardoso — Imagem, n.° 24. Novembro de
1958. p. 444.
9) Avelino Dias — Celulóide, n.° 12. Dezembro de
1958. pp. 13 a 17.
10) Jean d’Yvoire — Téléciné, n.° 80. Janeiro-Feve
reiro de 1959.
168
:
— !
*
IV — «L'AVVENTURA»
169
I
:
ji.j;
!-
■ !
6) René Gilson — Cinéma 60, n.° 51. Novembro-De
zembro. pp. 119 a 121. I
;|V !!
1?
7) Marie-Claire Wuilleumier — Esprit. Dezembro de
1960.
8) Jean Domarchi — «Cannes 1960», Cahiers du Ci
néma, n.° 108. p. 40.
j; 9) Jacques Chevalier — Image et So?i, 135. 1960.
p. 15.
10) Guy Allombert — La Saison Cinematographxque
.i 60. pp. 399 e 400.
3
iln 11) Jacques Doniol-Valcroze — «Le Facteur Rhésus et
le Nouveau Cinéma». Cahiers du Cinéma, n.° 113. i
r ;i p. 47-
12) Arlette El-Kaim — Les Temps Modernes. Feve
* .
1 • 1 ! reiro de 1961.
i* 13) Louis Seguim— «La Fin de l’Êté avec Monica».
Positif, n.° 38. Março de 1961. pp. 12 a 31.
14) Henri Crespi — «Je, UAvventura, Jamais le Di-
manche et les autres». Positif, n.° 38. Março de
1961. pp. 32 a 35.
15) Madeleine Garrigou-Lagrange— «Ficha n.° 378».
Téléciné, n.° 95. Abril de 1961.
16) Gilbert Salachas — «Réticences». Téléciné, n.° 95.
Abril de 1961.
17) René Gilson — «Une question inquiète et chaleu-
reuse sur la vie intérieure». Cinéma 61. Maio.
pp. 116 a 121.
18) Luciano C. Egido — Nuestro Cine, n.° 1. Julho de
1961. pp. 34 a 56 (com largo extracto da planifi
cação e diálogos).
19) José Lino Griinewald — Jornal de Letras, n.os 145-
-146. Setembro-Outubro de 1961. Rio de Janeiro,
p. 9.
20) Parker Tyler — Classics of the Foreign Film.
Spring Books. Londres, 1962. pp. 222 a 225.
21) Jacques Chevalier — Regards Neufs sur le Ci
néma. Ed. du Seuil. Paris, 1963. pp. 224 a 231.
22) Jacques Chevalier — «Ficha Filmográfica». Image
et Son, n.° 184. Maio de 1965. pp. 73 a 92.
V — «A NOITE»
170
\
'
171
I
li 23) Manuel Pina — Seara Nova, n.° 1422. Abril de
1964. pp. 121 e 122.
24) Lauro António — Seara Nova, n.° 1422. 20 de
li:; Abril de 1964. pp. 9 e 12.
25) Carlos Morais — Cadernos de Cinema, n.° 1. Maio
VI — «O ECLIPSE»
e 72.
7) ítalo Calvino — Cinéma 62, n.° 67. Junho. pp. <2.
! e 73.
.
8) Philippe Durand — Image et Son, n.° 152. Junho
i de 1962. pp. 8 e 9; ou La Saiso7i Cinematographi-
que 62. pp. 106 a 109.
9) Robert Benayoun — Positif, n.° 47. Julho de 1962.
pp. 72 a 74.
_
m
10) Jean-Louis Boris — Jornal de Letras e Artes,
n.° 51. 19 de Setembro de 1962. p. 16.
11) André S. Labarthe— Cahiers dn Cinéma, n.° 136.
Outubro de 1962.
12) José Augusto França — Jornal de Letras e Artes,
n.° 57. 31 de Outubro de 1962. p. 13.
13) Gilbert Salachas — Téléciné, n.° 107. Outubro-
-Novembro de 1962.
14) José Lino Griinewald — Jornal de Letras, n.° 159.
Novembro de 1962. Rio de Janeiro, p. 6.
15) «Os 58 Planos Finais do Filme». Nuestro Cine,
n 0 17. Fevereiro de 1963. pp. 2 e 3.
16) Enzo Paci e Giairo Daghini — Cinéma 62, n.° 70.
Novembro, pp. 75 a 88 (trad. do texto do primeiro
em Nuestro Cine, n.° 18. Março de 1963. pp. 4 a 7,
com o título «Intorno a la Dialectica de la Inter-
subiectividade»).
17) Pierre Gay — Cinéma 62, n.° 70. Novembro, pp.
100 e 101.
18) Robert Benayoun — Positif, n.° 49. Dezembro de
1962. pp. 63 a 66.
19) Parker Tyler—Clossics of the Foreign Film.
Spring Books. Londres, 1962. pp. 248 e 249.
20) Victor Erice — Nuestro Cine, n.° 18. Março de
1963. pp. 8 a 11.
21) André Glucksmann — «La Vacuité du Sentiment».
Artsept, n.° 3. Outubro-Dezembro de 1963. pp. 90
a 97.
22) José Vaz Pereira — Jornal de Letras e Artes,
n.° 116. 18 de Dezembro de 1963. p. 11.
23) António Lopes Ribeiro — «Crónica de Retarda
dor». Diário Popular. 18 de Dezembro de 1963,
pp. 24 e 27, e 8 de Janeiro de 1964, pp.^20 e 23.
24) Armando Servais Tiago — Plateia, n.° 171. 20 de
Dezembro de 1963. p. 55.
25) João Pais — O Tempo e o Modo, n.° 11. Dezembro
de 1963. pp. 92 e 93.
26) Leonardo Ferraz de Carvalho — Rumo, n.° 83.
Janeiro de 1964. p. 77.
27) Luís de Andrade Pina — Filme, n.° 58. Janeiro de
1964. pp. 30 e 31.
28) Álvaro Luz e Silva — Vértice, n.°" 244-245. Ja
neiro-Fevereiro de 1964. pp. 87 a 93.
173
I.
I : ■ri:
n: ! [Í.ÍÍI
y 29) Manuel Machado da Luz — Seara Nova, n.° 1420.
' :' !■
Fevereiro de 1964. pp. 57 a 59.
30) Francisco Xavier Pacheco — Jornal de Notícias.
28 de Fevereiro de 1964. p. 9 («Palco»).
' ;
■
!
! II. 9) José Augusto França — Jornal de Letras e Artes,
n.° 164. 18 de Novembro de 1964. p. 3.
10) Jacques Chevalier — Image et Son, n.° 179. De
=. zembro de 1964. pp. 91 a 93.
11) Gilles Jacob e Pierre Philippe —• Cinéma 6it, n.° 91.
Dezembro, pp. 119 a 122.
i:
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175
■i,
I
l Vil i
4 2) «Antonioni english spoken». Cinéma 66, n.° 111.
Dezembro, pp. 46 a 55.
3) «Le Triomphe de Michelangelo». Cinéma 6«.
n.° 114. Março. pp. 14 e 15.
4) Garey Harrison — Siglit and Sound. Primavera
de 1967.
5) Triunfo, n.° 259. 20 de Maio de 1967.
6) Jean Clair — «Le Chemin de Damas». Positif,
n.° 84. Maio de 1967. pp. 1 a 6.
7) Claire Clouzot — Cinéma 67, n.° 116. Maio. pp. 60
a 75.
8) Mareei Martin — «La Surface des Choses». Ci
néma 67, n.° 117. Junho. pp. 37 a 39.
9) Jean Delmas — Jeune Cinéma, n.° 24. Junho-Julho
de 1967. pp. 9 a 11.
10) César Santos Fontenla — «Una imagen es algo
mas y algo menos que una imagen». Nucstro
Cine, n.° 63. Julho de 1967. pp. 66 e 67.
I 11) Robert Benayoun — Positif, n.° 86. Julho de 196 <
pp. 26 e 27.
12) Use Losa — Diário Popular («Quinta-Feira n
1 i! ■ Tarde», n.° 550). 10 de Agosto de 1967. pp. 1 e 4.
13) Gilbert Salachas — Téléciné, n.° 134. Agosto-Se
•T. tembro de 1967. pp. 145 e 146.
!1
176
i
■
■
ii
i 33) Jorge da Silva Melo —«Da Critica e de Seu Ci- _
nema» O Tempo e o Modo n.°* 57-58. Fevereiro-
-Março de 1968. pp. 285 a 288.
34) Vários — Movimento, n.° 1. pp. 8 e 18 a 20.
35) Manuel de Sousa — «História de um fotógrafo
sem história». Jornal de Notícias. 8 de Março de —
A 1968. pp. 17 e 18 («Palco»). _
36) Mário Dionísio — «Segunda Vida». A Capital. 13
y de Março de 1968. p. 3 do suplemento «Literatura
:
r- ; e Arte».
37) Agustina Bessa Luís — «I Back Britain». Diário
i ■ Popular («Quinta-Feira à Tarde». n.° 581). 21 de |
Março de 1968.
í!: 38) José Vaz Pereira — «O Funcionamento da Ver
I!
SUi
dade». Seara Nova, n.° 1469. Março de 1968.
i: 39) Carlos de Pontes Leça — Rumo, n.° 133. Março
de 1968. p. 157. _ ..
1 40) António Augusto Sales — Vértice, n.° 2^5. Abnl
de 1968. pp. 286 e 287.
11; jil:1
j'
í• i' v.
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178
i
I
CADERNOS
DE
CINEMA
2. NOVO CINEMA EUROPEU
Uma panorâmica que lança luz sobre
um «cinema» pràticamente desconhe
cido do público português.
ASSINE
: CADERNOS
DE
CINEMA
I
.•S
r
ti\
r-
í CADERNOS
t
i
DE
LITERATURA
V 1. Mário Sacramento
;;
HÁ UMA ESTÉTICA NEO-REALISTA?
,
Um dos nomes mais destacados da crítica e
i ensaística literária em Portugal interroga-se,
e interroga-nos, sobre as coordenadas estéti
nL • cas do neo-realismo português. Preço 15$
■
2. levtuchenko
ili) •i
PEARL HARBOR
CADERNOS
DE
§ »
LITERATURA
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5m í
coI ecção
ÍESJ
DIÁLOGO
1. A RESPONSABILIDADE
DOS INTELECTUAIS
de Noam Chomsky
Neste ensaio, Chomsky ocupa-se
das intervenções americanas na Re
pública Dominicana, em Cuba e prin
cipalmente no Vietname.
2. AMÉRICA LATINA
de Miguel Angel Asturias
com prefácio de Josué de Castro
ASSINE
DIÁLOGO 1
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