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MATO GROSSO NOS LIVROS ESCOLARES DE HISTÓRIA NO CONTEXTO

REPUBLICANO (1930-1990). Aparecido Borges da Silva. UNESP/Marília.


cidoborges@gmail.com. Profa. Dra. Maria do Rosário Longo Mortatti. UNESP/Marília.
mrosario@marilia.unesp.br.
Linha de pesquisa: Filosofia e História da Educação no Brasil

Resumo: O objetivo desta pesquisa é investigar o processo de consolidação das identidades


sociais em Mato Grosso entre as décadas de 1930 e 1990. A delimitação histórica se justifica
por se tratar de um período de intensa produção historiográfica em âmbito estadual, tendo
como lugar de enunciação fundamentalmente o Instituto Histórico Geográfico de Mato
Grosso e inserida no contexto dos movimentos migratórios resultantes dos programas de
colonização dirigida do governo federal, que movimentaram milhares de migrantes para terras
mato-grossenses, a saber: a Marcha para o Oeste, a partir da década de 1930, e o Programa de
Integração Nacional, nas décadas de 1970 e 1980. Neste contexto, a antiga elite local, na
tarefa de redefinição das representações construídas nos livros escolares de história regional,
obrigou-se a reinventar suas tradições, tomando como matriz a cultura popular do estado de
Mato Grosso. Para o desenvolvimento desta pesquisa, tendo como objeto de estudo os livros
escolares de História de Mato Grosso, será utilizado o conceito de configuração textual
(MORTATTI, 2000), que consistirá em enfocar todos os aspectos constitutivos de sentido
destes textos. Além dos livros escolares, serão utilizados a legislação educacional, os
relatórios dos governadores do estado, os programas e relatórios da Instrução Pública e,
também, as revistas e jornais da época, para melhor compreender o momento político do
ensino destes conteúdos nas escolas do estado.

Palavras-chave: Ensino de História; Livros Escolares; História da Educação.

Introdução
Este projeto de pesquisa de Doutorado parte das indagações e reflexões que venho
fazendo, desde meu ingresso na carreira docente no estado de Mato Grosso. Graduado em
História e professor desde 2004 na Educação Básica e participando da seleção de livros
escolares pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) para o uso em sala de aula, me
instigava saber sobre a finalidade destes materiais didáticos, bem como sua utilização para
socialização de ideias nacionalistas. Para o Ensino Médio, diante da necessidade de preparar
os estudantes para o vestibular e outras formas de seleção para o ingresso na Universidade, as
leituras sobre os livros escolares de História de Mato Grosso permitiu compreendê-los não
somente como manuais escolares, mas também como um “instrumento privilegiado de
construção de identidade” (CHOPPIN, 2004, p. 553). Tal perspectiva com relação ao livro
escolar deu-se após perceber que o próprio governo do estado de Mato Grosso, através de leis
que regulamentavam o trabalho pedagógico escolar, buscou viabilizar a construção de uma
identidade regional em sala de aula. Este, com relação aos concursos de provimento de cargos
2

públicos ou de seleção de vagas para Universidade, criou a Lei Estadual n. 4.667, de 5 de abril
de 1984, que, em seu artigo 1º, dispõe:

Fica estabelecida a obrigatoriedade de que 1/3 (um terço) das questões de


Conhecimentos Gerais e/ou Estudos Sociais nos concursos organizados por
órgãos governamentais e de economia mista, deve versar sobre Geografia e
História Política e Econômica de Mato Grosso. (MATO GROSSO, 1984, p.
01).

E, com relação à prática pedagógica escolar, promulgou a Lei Estadual n. 5.573, de 6


de fevereiro de 1990, que estabelece:

Art. 1º Passa a ser obrigatório o ensino da História, da Geografia e da


Literatura de Mato Grosso nas Escolas Públicas ou Particulares, de 1º e 2º
Graus, que funcionem no Estado; Art. 2º Nos cursos de 1º Grau o ensino se
restringirá a noções de História e Geografia de Mato Grosso, como
complemento das noções gerais de História e Geografia do Brasil; Art. 3º
No 2º Grau a História, a Geografia e a Literatura de Mato Grosso
constituirão objeto de uma cadeira autônoma, com programas específicos;
Art. 4º Compete à Secretaria de Educação e Cultura baixar as normas e
programas básicos para a inclusão dessas disciplinas nos currículos
escolares, nos termos desta lei. (MATO GROSSO, 1990, p. 25, grifos do
original).

Com a legislação houve a intenção de transportar para os currículos escolares e,


certamente, para os livros escolares, os fatos mais importantes da história, geografia e
literatura do estado de Mato Grosso. No entanto, no que tange à história, a legislação não
aborda que “histórias” seriam registradas em tal literatura, mas considera-se que, certamente,
seria pouco crítica e de exaltação dos vultos e personagens considerados heroicos, imitação do
modelo historiográfico escolar mato-grossense produzido desde o século XIX.
Com relação à pesquisa de mestrado, desenvolvida junto ao Programa de Pós-
graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT, campus de
Cuiabá, sob orientação do Prof. Dr. Nicanor Palhares Sá, e vinculada ao GEM - Grupo de
Pesquisa “História da Educação e Memória”, resultou na dissertação intitulada Mato Grosso
nos Livros Didáticos de História (1889-1930): imaginários e representações, concluída em 2013. Esta
teve como objetivo investigar as representações sobre o estado de Mato Grosso, em especial
nas edições da disciplina escolar História, presentes nos livros escolares produzidos durante a
Primeira República Brasileira (1889-1930).
Dando continuidade às reflexões do mestrado, neste projeto de pesquisa de
doutorado, pretendo permear a problemática da constituição de identidades regionais, assunto
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com escassos estudos até o momento. Para isso, a proposta de pesquisa considera o perfil dos
autores dos livros escolares mato-grossenses, que em um primeiro momento estavam ligados
ao Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT) e, depois, à Universidade
Federal de Mato Grosso (UFMT), ambos em Cuiabá. As representações por eles construídas
estão no cruzamento da produção historiográfica acadêmica e escolar, que transforma os
livros escolares de História de Mato Grosso em instrumentos privilegiados de disputas
políticas e de constituição de identidades, especialmente em sala de aula.
Em 1919, a fundação do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT)
assinalou o grande momento de reconstituição do passado mato-grossense, junto com vários
outros investimentos rituais e simbólicos, produzidos especialmente para as comemorações do
bicentenário da fundação de Cuiabá (1919). Estes rituais seriam transportados para os
monumentos, símbolos e festividades cívicas do estado, de modo a consolidar uma tradição 1 a
ser ensinada nas instituições escolares e disseminada nos demais segmentos sociais,
determinando as estruturas do imaginário coletivo mato-grossense. Para tal empreitada, a
escrita da História de Mato Grosso contou com a pena de ilustres intelectuais locais, a saber:
Estevão de Mendonça, José Barnabé de Mesquita e Virgílio Corrêa Filho, considerados
arautos da história local, que acabaram por estabelecer os contornos da identidade mato-
grossense (ZORZATO, 2000).
Depois deste momento de intensa produção historiográfica (1919-1954), o IHGMT
passou por um período de relativa estagnação, voltando à plena atividade a partir de 1976,
concomitante ao processo de colonização dirigida na Amazônia, promovida pelo Programa de
Integração Nacional (PIN)2, que introduziu em Mato Grosso grandes levas de migrantes
vindos das mais diferentes partes do país. Somou-se a isso a separação do sul do território
estadual, em 1977, formando uma nova unidade da federação, o Mato Grosso do Sul, que
culminou na retomada das discussões em torno das questões identitárias regionais (GALETTI,
2012).
Neste contexto, alguns intelectuais mato-grossenses ligados ao IHGMT
empreenderam esforços na produção de livros de História que reforçassem as representações
positivas sobre Mato Grosso, seu território e população, que pudessem ser apropriadas em
1
Conforme Hobsbawn (1984), quando uma determinada memória obtida do passado é institucionalizada e
tomada como oficial, acaba por tornar-se história. Daí em diante, passa a ser cultuada com intuito de preservar
uma pretensa memória coletiva, assumindo, assim, a forma de uma “tradição inventada”.
2
Criado pelo Decreto-Lei nº 1.106, de 16 de junho de 1970, o Programa de Integração Nacional, constituído sob
os lemas “integrar para não entregar” e “uma terra sem homens para homens sem terra”, implantou grandes
projetos de colonização na região amazônica, porém seus resultados objetivos foram a concentração de terras nas
mãos de grandes grupos econômicos e conflitos sociais pela posse de terra, sobretudo às margens das rodovias
federais. (MORENO, 1999).
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sala de aula e que viabilizasse a construção de uma identidade regional entre as novas
gerações de mato-grossenses.
Com o objetivo de contribuir com a produção sobre a história da literatura didática
no Brasil, venho desenvolvendo pesquisa, mediante abordagem histórica, centrada em
pesquisa documental e bibliográfica, desenvolvida por meio da utilização dos procedimentos
de localização, recuperação, reunião, seleção e ordenação de textos, sobre os principais títulos
de livros escolares de História de Mato Grosso (autores, editoras e o momento de produção)
produzidos ao logo de um século (1906-2008).
Essas referências de textos estão contidas no instrumento de pesquisa intitulado
Livros Didáticos de História de Mato Grosso (1906-2008): Autores, Produção e Circulação
(SILVA, 2015). Até o momento, foi possível localizar, recuperar e reunir 32 títulos de livros
escolares de História de Mato Grosso, considerando as diferentes edições de um mesmo título.
Nas referências de textos que reuni, pude identificar um total de 13 autores de livros
escolares de História de Mato Grosso. São eles: Estevão de Mendonça, Amélia de Arruda
Alves, Rubens de Mendonça, Octayde Jorge da Silva, Lenine de Campos Póvoas, Elizabeth
Madureira Siqueira, Lourença Alves da Costa, Cathia Maria Coelho Carvalho, Else Dias de
Araújo Cavalcante, Maurim Rodrigues Costa, Marcos Amaral Mendes, Laura Antunes Maciel
e Pedro Carlos Nogueira Félix.
Entre as décadas de 1990 e 2000, é possível identificar oitos títulos de livros
escolares de História de Mato Grosso (totalizando 17 edições de diferentes títulos), sendo dois
deles produzidos em coautoria. São livros escritos por professores e/ou ex-alunos do
Departamento de História da Universidade Federal de Mato Grosso, predominando mulheres
como autoras, que somam 75% (setenta e cinco por cento) da produção. São livros escolares
que inseriram em suas linhas documentos dos mais variados (manuscritos, depoimentos orais,
fotografias, pinturas, entre outros) e a produção acadêmica sobre a História de Mato Grosso, a
saber: dissertações de mestrado e teses de doutorado.
O que se busca aqui, em nível de doutorado, é entender o processo de consolidação
dos livros escolares de História de Mato Grosso como instrumentos privilegiados de disputas
políticas e de constituição de identidades. Para além da instrumentalização pedagógica, os
livros escolares apresentam-se como “produtos de grupos sociais que procuram, por
intermédio deles, perpetuar suas identidades, seus valores, suas tradições, suas culturas”.
(CHOPPIN apud BITTENCOURT, 2004, p. 69). No entanto, os interesses dos grupos sociais
que forjaram as representações presente nos livros escolares de História de Mato Grosso, bem
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como as intencionalidades dos discursos por eles construídos, entre as décadas de 1930 e
1990, apresentam-se como territórios a serem melhores explorados.

Discussão conceitual

Os livros escolares são objetos culturais múltiplos em significados, instrumentos


privilegiados de disputas políticas e de constituição de identidades. Neles estão impressas
diferentes personagens e modelos de interpretações em jogo: “o jogo das identidades”
(RIBEIRO, 2004, p. 11). Assentado na realidade material, os livros escolares participam do
universo cultural sobressaindo-se da mesma forma que “a bandeira ou a moeda, na esfera do
simbólico”. (CHOPPIN, 2002, p. 14). E sendo, por vezes, usado para veicular,

[...] de maneira mais ou menos sutil, mais ou menos implícita, um sistema de


valores morais, religiosos, políticos, uma ideologia que conduz ao grupo
social de que ele é a emanação: participa, assim, estreitamente do processo
de socialização, de aculturação (até mesmo de doutrinamento) da juventude.
(CHOPPIN, 2002, p. 14).

Os aportes teórico-metodológicos que serão utilizados durante o desenvolvimento


desta pesquisa são: as noções de representação e apropriação, propostas por Roger Chartier
(1990, 2002), e o conceito de imaginário, desenvolvido por Bronislaw Baczko (1985), a partir
dos quais será possível dialogar com o corpus documental (livros escolares, programas
curriculares, legislação educacional, periódicos de relevância para pesquisa entre outros).
Representação, para Chartier (1990, p. 20), apresenta-se como um discurso que
permite “ver uma coisa ausente” ou, também, manifesta-se como a “exibição de uma presença
[...] de algo ou de alguém”; processo de articulações simbólicas através do qual se estabelece
uma acepção do real, uma significação da realidade. Para este pesquisador, as representações
produzem esquemas intelectuais que criam imagens mentais “graças às quais o presente pode
adquirir sentido, o outro tornar-se inteligível e o espaço ser decifrado”. (CHARTIER, 1990, p.
17).
A noção de representação apresenta-se como uma categoria fundamental da História
Cultural. Para Pesavento (2005, p. 39),

As representações construídas sobre o mundo não só se colocam no lugar


deste mundo, como fazem com que os homens percebam a realidade e
pautem a sua existência. São matrizes geradoras de condutas e práticas
sociais, dotadas de força integradora e coerciva, bem como explicativa do
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real. Indivíduos e grupos dão sentido ao mundo por meio das representações
que constroem sobre a realidade.

Pedra angular da História Cultural, as representações manifestam padrões, normas,


instituições, imagens, cerimônias; construção que abriga ordenamento, identificação,
legitimação e exclusão. Embora pareça construir uma apreciação universal do real, as
representações “[...] são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as forjam. Daí,
para cada caso, o necessário relacionamento dos discursos proferidos com a posição de quem
os utiliza”. (CHARTIER, 1990, p. 17).
Ainda segundo Chartier (1990), “[...] a realidade é contraditoriamente construída
pelos diferentes grupos que compõem uma sociedade” através das suas distintas apropriações
dos símbolos ou das suas práticas culturais comuns. São as práticas comuns que fazem “[...]
reconhecer uma identidade social, a exibir uma maneira própria de estar no mundo, a
significar simbolicamente um estatuto e uma posição”. Porém, como não há uma prática
cultural universal e, sendo as apropriações do simbólico diferenciadas, as disputas pelo
domínio da representação tornam-se institucionalizadas e objetivadas, produzindo uma
verdadeira “luta de representações”, marcando de “modo visível e perpetuado a existência do
grupo, da comunidade ou da classe”. (CHARTIER, 2002, p. 73).
Por luta de representações entende-se que são disputas que centram a atenção sobre
as “estratégias simbólicas que determinam posições e relações e que constroem, para cada
classe, grupo ou meio, um ‘ser-percebido’ constitutivo de sua identidade”. (CHARTIER,
2002, p. 73). Nesse contexto, concebe-se que as representações construídas estão “[...] sempre
colocadas num campo de concorrências e de competições cujos desafios se enunciam em
termos de poder e de dominação”. (CHARTIER, 1990, p. 17).
Sobre a noção de apropriação, Chartier (1990) define como sendo o “consumo”
cultural ou intelectual das representações produzidas. Assim, a cultura estaria na articulação
entre a produção (representação) e o consumo (apropriação) dos bens simbólicos, gerando
usos e significações diferenciadas (práticas). As apropriações seriam social, institucional e
culturalmente determinadas, produzindo maneiras diferenciadas de interpretação da realidade.
Nessa medida, as apropriações suscitariam práticas que “nunca são idênticas as que o
produtor, o autor ou o artista, investiram na sua obra”. (CHARTIER, 1990, p. 59).
A apropriação, segundo Chartier (1990), aponta para uma “liberdade criadora” que
possibilita uma negação, mesmo que regulada, dos sentidos impostos pelo polo produtor,
visando a uma “história social das interpretações, remetidas para as suas determinações
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fundamentais e inscritas nas práticas específicas que as produzem”. (CHARTIER, 1990, p.


26).
O conceito de imaginário será também instrumento fundamental para o
desenvolvimento da análise sobre as imagens construídas sobre Mato Grosso nos livros
escolares de História. Neste caso, o referencial teórico aproximou-se das proposições lançadas
pelos estudos de Bronislaw Baczko (1985) que, ao pensar o imaginário, sugere que este
constitui referência no sistema simbólico pelo qual uma dada sociedade se percebe, divide e
elabora seus próprios objetivos. Para Baczko (1985, p. 309), é

[...] através dos seus imaginários sociais, [que] uma coletividade designa a
sua identidade; elabora uma certa representação de si; estabelece a
distribuição dos papéis e das posições sociais; exprime e impõe crenças
comuns; constrói uma espécie de código de “bom comportamento”,
designadamente através da instalação de modelos formadores.

Uma definição mais sintética, mas não menos objetiva, considerara o imaginário
como “[...] um sistema de ideias e imagens de representações coletivas que os homens, em
todas as épocas, construíram para si, dando sentido ao mundo”. (PESAVENTO, 2005, p. 43).
O imaginário, segundo Baczko (1985), é parte constitutiva e de legitimação de
poder, principalmente do poder político, que sempre se cercou de representações coletivas –
isso explica por que, para a manutenção do poder político, “o domínio do imaginário e do
simbólico é um importante lugar estratégico” (BACZKO, 1985, p. 297). Desse modo, em
qualquer conflito social, o imaginário sempre terá papel determinante, pois, por meio dele os
agentes sociais produzem as representações de si próprios e dos outros (seus inimigos, que
poderão ser de classe, religião, raça, nacionalidade etc.), que definirão suas práticas coletivas.
Segundo Baczko (1985), o imaginário social tornou-se lugar e objeto dos conflitos
sociais, porque é “[...] uma peça efetiva e eficaz do dispositivo de controle da vida coletiva e,
em especial, do exercício da autoridade e do poder” (BACZKO, 1985, p. 310). O controle do
imaginário pelos grupos sociais dominantes tem a função de preservar, por meio de um
sistema simbólico, o lugar privilegiado que estes atribuem a si próprios. Com isso, tais grupos
produzem seu sistema de representações, traduzindo e legitimando sua ordenação, manejando
os símbolos e definindo sua direção e orientação política.
Portanto, na constituição das representações do outro por meio do imaginário,
elabora-se uma imagem desvalorizada do adversário, invalidando sua legitimidade política.
Mas, nas representações de si próprio exalta-se a memória, história, origens e tradições
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perante os poderes instituídos. Desse modo, o campo do imaginário constitui-se em um


espaço de luta pelo controle do poder.
A discussão conceitual acima apresentada reflete a relevância da proposta de
pesquisa, pois evidencia a contribuição que pretende trazer no preenchimento de lacunas
historiográficas e da complementação das trilhas abertas por recentes estudos sobre os livros
escolares, especialmente de História de Mato Grosso. Outro aspecto que justifica a realização
desse projeto é a importância que as identidades regionais constituídas, ao longo do século
XX, nos livros escolares tiveram no imaginário coletivo mato-grossense. Pois, as elites locais,
temendo perder seu status político para os migrantes, considerados forasteiros, buscaram
reforçar os laços culturais que os uniam dentro de um passado comum e, deste modo,
desenvolveram uma noção de identidade regional baseada na imagem de uma “tradição
inventada” que concebia a cidade de Cuiabá como o polo irradiador da verdadeira cultura
mato-grossense ao restante do Estado.

Objetivos

O objetivo geral é analisar o processo de consolidação das identidades sociais em


Mato Grosso, a partir das representações construídas, sob a tutela das antigas elites locais, nos
livros escolares de história regional, entre as décadas de 1930 e 1990, período em que o lugar
legítimo de enunciação da História de Mato Grosso era o IHGMT.
Como objetivos específicos estabeleci:
 Comparar as representações sobre Mato Grosso, seu território e população,
apresentadas na literatura histórica escolar regional nos diferentes períodos da história
republicana brasileira
 Apresentar os livros de História de Mato Grosso mais bem sucedidos na tarefa de
apropriação de um imaginário social em sala de aula.
 Relacionar os discursos presentes nos livros escolares sobre a História de Mato Grosso
com a posição político-social de quem os proferia.
 Compreender o processo recente de apropriação da cultura popular cuiabana e sua
inserção na literatura histórica escolar regional.

Metodologia
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Com base nos conceitos apresentados e de acordo com a abordagem histórica


proposta neste projeto, será desenvolvida pesquisa documental e bibliográfica, mediante
procedimentos de: localização, recuperação reunião, seleção, ordenação, leitura e análise das
fontes documentais a partir do método da análise da configuração textual.
Para Mortatti (2000), o método da análise da configuração textual consiste em
compreender o conjunto dos aspectos que constituem o sentido de um texto, a saber:

[...] às opções temático-conteudísticas (o quê?) e estruturais-formais


(como?), projetadas por um determinado sujeito (quem?), que se apresenta
como autor de um discurso produzido de determinado ponto de vista e lugar
social (de onde?) e momento histórico (quando?), movido por certas
necessidades (por quê?) e propósitos (para quê), visando a determinado
efeito em determinado tipo de leitor (para quem?) e logrando determinado
tipo de circulação, utilização e repercussão. (MORTATTI, 2000, p. 31).

Os programas de ensino de História de Mato Grosso e manuais para esse ensino


serão considerados fontes privilegiadas para os desenvolvimento da pesquisa. Como
auxiliares na análise, serão utilizados a legislação educacional, os relatórios dos governadores
do estado, os programas e relatórios da Instrução Pública e, também, as revistas e jornais da
época, para melhor compreender o momento político do ensino destes conteúdos nas escolas
do estado.
De acordo com a delimitação histórica proposta neste projeto, prevê-se a seleção e
análise das fontes documentais – programas de ensino de História de Mato Grosso e manuais
para esse ensino – referentes ao período entre 1930 e 1990.
Essas fontes documentais selecionadas serão analisadas em sua configuração textual,
que incidirá sobre os aspectos constitutivos de seu sentido, a saber: os temas e conteúdos e a
forma e estrutura em que se apresentam; a atuação profissional dos autores e instituições
responsáveis e o lugar social em que se inserem; as necessidades e os objetivos a que atendem
e o público a quem se destinavam; a relação entre as concepções neles defendidas e o
contexto histórico educacional de sua produção.

Cronograma

Durante os 48 meses da pesquisa de doutorado (março de 2015 a março de 2019),


serão desenvolvidas as seguintes atividades:
 Março/2015 a Julho/2016 - cumprimento de créditos em disciplinas de Programa de
Pós-Graduação;
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 Março/2015 a Julho/2015 - elaboração da versão final do projeto de pesquisa;


 Março/2015 a Julho/2016 - leitura da bibliografia especializada;
 Março/2015 a Dezembro/2016 - desenvolvimento da pesquisa documental e
bibliográfica;
 Janeiro/2017 a Dezembro/2017 - complementação de pesquisa documental e
bibliográfica;
 Janeiro/2017 a Dezembro/2017 - leitura das fontes documentais;
 Janeiro/2018 a Agosto/2018 - a análise da configuração textual das fontes
documentais selecionadas;
 Julho/2015 a Dezembro/2018 - elaboração de artigos e textos para apresentação em
eventos científicos parciais e finais;
 Janeiro/2018 a Agosto/2018 - redação do texto para exame geral de qualificação;
 Setembro/2018 - Exame Geral de Qualificação;
 Outubro/2018 a Janeiro/2019 - redação da versão final da tese de doutorado; e,
 Março/2019 - defesa pública da tese.

Referências

BACZKO, Bronislaw. A imaginação social. In: ROMANO, Ruggiero (dir.). Antropos-


Homem. Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional; Casa da Moeda, 1985, p. 296-
332.

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(Org.). O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2004, p. 69-90.

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CHOPPIN, Alain. O Historiador e o livro escolar. Revista História da Educação, Pelotas, v.


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11

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