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ANAIS XI SEMANA DE HISTÓRIA POLÍTICA

RELAÇÕES DE PODER: CRISE, DEMOCRACIA E POSSIBILIDADES


VII SEMINÁRIO NACIONAL DE HISTÓRIA: POLÍTICA, CULTURA E SOCIEDADE
ISSN: 2175-831X - PPGH/UERJ 2016
 
 

UNIDOS PELA DEMOCRACIA: AS ESCOLAS DE SAMBA DO RIO DE


JANEIRO E OS MOVIMENTOS DE REDEMOCRATIZAÇÃO NA POLÍTICA
BRASILEIRA (1978-1985).

Guilherme José Motta Faria


Pós-doutorando em História (USP) orientador: Dr. Francisco Carlos Palomanes
Martinho, Doutor em História (UFF), Mestre em História (UERJ);
 

Resumo: As Escolas de samba, ao demarcar espaços de fala/ação em seus enredos,


sambas, desfiles e ações políticas partidárias, atuaram nos episódios da nossa história
recente. Essa atuação aconteceu em três planos: O embate direto dos artistas com os
agentes da Censura; os sambas e enredos que revelam ações no plano discursivo visual
e linguístico; a adesão na campanha e no governo de Leonel Brizola no governo do
Estado do Rio (1982-86) e nas demais manifestações políticas do período, como o
movimento “Diretas Já!”. As Escolas de Samba, enquanto instituições culturais,
atuaram como atores políticos (coletivos e individuais) nas diversas campanhas que
movimentaram a sociedade brasileira no retorno às liberdades democráticas.

Palavras chave: Escolas de samba; democracia; censura; política;

Abstract: The schools of Samba, by demarking areas of speech/action in their plots,


sambas, parades and actions along political parties, acted in the episodes of our recent
history. This action took place on three levels: the direct confrontation of the artists
with the agents of censorship; sambas and storylines that reveal actions in the visual
and linguistic discursive level; joining the campaign and government of Leonel Brizola
in Rio state government (1982-86) and in other political events of the period, as the
movement "Direct Elections Now!". The samba schools, while cultural institutions,
acted as political actors (collective and individual) in the various campaigns that
moved the Brazilian society in the return to democratic freedom.

Key-words: Samba schools; democracy; censorship; policy;

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INTRODUÇÃO

Os desfiles das Escolas de Samba a partir dos anos 1960 foram se tornando
espetáculos grandiosos, que despertaram e continuam a despertar o interesse de
grande parte da população brasileira. Fatos pitorescos, grandes personagens e o
contexto histórico embasando cada enredo, permite as agremiações passar em
“revista” os acontecimentos importantes, as ideias, tendências artísticas,
comportamentais, que influenciaram e ainda influenciam nosso panorama cultural.
Mediados pela ação de um Estado de caráter autoritário, instalado com o
Golpe civil-militar em 1964, a sociedade buscou formas de resistência para combater
a falta de liberdade democrática e o esvaziamento dos direitos de cidadania das
organizações sociais, culturais e políticas. Os anos 1970/80 revelam, de maneira
quase holística seu sentido mais profundo de novas estratégias do fazer político,
tendo a cultura como campo fecundo.
Durante o período ocorreu grande produção de elementos e bens culturais,
que com o embricamento das questões políticas gerou vários desdobramentos nas
nossas práticas culturais, ora de contestação, ora de enaltecimento de ideologias que
se contrapunham no cotidiano. Era preciso criar espaços, brechas de intervenção e
opinião política e as artes, de maneira geral deveriam reabrir os caminhos para o
retorno da normalidade democrática, a partir de campanhas e movimentos com
efetiva participação popular.
Assim sendo, as Escolas de Samba conectadas ao período em destaque se
mostraram também engajadas. Com a adoção de temas críticos à realidade social e
política brasileira, com os embates dos agentes culturais das Escolas de Samba com
os agentes da Censura e a participação direta das comunidades das agremiações nas
campanhas e movimentos políticos posso analisar o processo histórico a partir de um
grupo de atores políticos, geralmente vistos como despolitizados, vitimados pela
“ignorância” e passíveis às ações de políticos ambiciosos e “populistas”.
A história das Escolas de Samba pode ser trabalhada como chave de
compreensão do todo histórico. Os aportes em seus enredos, o trabalho das
comunidades, a repercussão dos desfiles, sua existência cultural e a relação que se

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estabelece com os poderes públicos (municipal, estadual e federal) possibilita


compreender a História política contemporânea do país. Para construir uma narrativa
histórica e se estruturar como fonte de pesquisa, as letras dos sambas, as sinopses dos
enredos, a materialização das ideias em alegorias e fantasias tanto nos desenhos
quanto na solução final apresentada na avenida devem se constituir como fontes,
possibilidade concretas de material a ser analisado.

O Momento Político brasileiro (1978-1985):

A ditadura civil-militar, implantada no país em abril de 1964, fruto de um


golpe articulado pelas Forças Armadas, protagonizado pelo Exército, apoiado
financeiramente e ideologicamente por setores de classe média alta, empresários e
setores conservadores da Igreja Católica governou o país por mais de duas décadas.
A utilização de mecanismos de repressão aos direitos civis e políticos gerou um
quadro de tensões que resultou em enfrentamento direto de alguns grupos radicais
(ligados às forças progressistas, organizações sociais e políticas ligadas às classes
populares), leniência de alguns setores da classe média e a omissão da maior parte da
população brasileira “distraída” com o futebol, novelas e as benesses do “Milagre
Brasileiro” (1). As crises do petróleo (1974 e 1978) abriram rachaduras na edificação
do Estado autoritário e empreendedor. As dificuldades econômicas internas, advindas
das limitações externas gerou um quadro de insatisfação da população brasileira que
novamente passava a conviver com o arrocho salarial, o desemprego, a falta de
liberdade e do jogo democrático, no qual estavam todos, ou quase todos, alijados.
Com sua política econômica questionada, a ditadura civil-militar passou a ter
que administrar suas ações de controle social e repressão política para a manutenção
do regime. Durante o mandato do general Ernesto Geisel (1974-1979), pressionada
pelas organizações internacionais e sobretudo pela nova postura da política externa
do presidente dos Estados Unidos, o democrata Jimmy Carter (1977-1981), a partir
das provas irrefutáveis de casos de tortura e desrespeito aos direitos humanos dos
serviços de inteligência dos órgãos repressivos das Forças Armadas e da Polícia
Militar e civil, a orientação governamental viu-se obrigada a mudar de direção e
rever seus métodos de repressão, oferecendo uma abertura política lenta e gradual. A

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mudança de orientação do governo coadunou as pressões externas e internas e foi


fruto dessas demandas, sobretudo das forças de pressão interna que influenciaram as
novas diretrizes políticas do governo.
As mortes do jornalista Vladimir Herzog (1975) e do operário Manuel Fiel
Filho (1976), vítimas de tortura nas instalações dos órgãos de segurança do governo,
chegaram ao conhecimento público, obrigando o regime civil-militar a reconhecer,
pela primeira vez, que o uso da tortura como método de combate e repressão aos seus
opositores era uma prática usual, gerando uma situação de incômodo para os
governantes militares.
O Governo Geisel, ao extinguir em 1978 o Ato Institucional nº 5 (AI 5) (2),
possibilitou que o processo de redemocratização da vida política brasileira se
tornasse irreversível, trazendo em seu bojo a abertura, a anistia, a participação de
antigos e novos atores no centro dos debates políticos. A partir de 1978 os sindicatos
retomaram fôlego e presença no cenário nacional. As greves por melhores salários e
direitos sociais foram retomadas, assim como o movimento estudantil, amortecido
nos primeiros anos da Ditadura reconstruiu suas organizações extintas e passou a
ocupar os espaços de reinvindicação.
O processo de abertura política, iniciado por Geisel teve continuidade com o
seu sucessor, o general João Baptista Figueiredo (1979-1985). Diante do inevitável
colapso da ditadura, o principal objetivo do governo Figueiredo era trazer os
militares que estavam no poder de volta às casernas, instaurando um processo de
abertura sem que fossem imputadas culpas e responsabilidades aos agentes de
repressão que resultaram em diversos casos de tortura, mortes e prisões arbitrárias
nos porões da Ditadura.
Com o processo de anistia diversos líderes políticos e sindicais voltaram ao
país e passaram a ocupar palanques, ressuscitando as comemorações do Primeiro de
Maio (Dia Internacional do Trabalho), assim como reorganizaram ou criaram
partidos políticos e se prepararam para a retomada gradual do jogo democrático com
eleições diretas para governadores, em 1982. O processo de redemocratização se
verificou também com a retomada de experiências de liberdade de expressão e

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arrefecimento da censura aos órgãos de imprensa com a volta de jornais de esquerda


que podiam ser adquiridos nas bancas de revistas.
Enquanto políticos, artistas, intelectuais, trabalhadores e sindicalistas
aproveitavam as brechas democráticas que o sistema ia permitindo, assustados com
as manifestações livres que haviam sido silenciadas por mais de uma década, alguns
setores conservadores e ligados à ditadura passaram a promover atos de sabotagem
no processo de abertura, com ações extremistas e radicais, através de atentados
terroristas com bombas explodindo em redações de jornal (de orientação
esquerdista), em sedes de entidades representativas da luta pela liberdade, como a
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), bancas de jornais e locais onde ocorressem
apresentações de espetáculos de caráter contestatório ao regime (3).
Os atos de terrorismo, promovidos pelos grupos da ala radical do regime
tinha como principal objetivo desestabilizar o processo de abertura evitando assim a
retomada do processo democrático e consequentemente o retorno dos civis ao poder.
Entre as organizações de inteligência e repressão que mais se opunham à abertura se
destacaram os DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de
Operações de Defesa Interna), o SNI (Serviço Nacional de Informações) e o Centro
de Informações do Exército (CIE). Reunidos, eles tentavam convencer os setores
mais liberais do regime a parar o processo de abertura política, que traria como
consequência o fim do próprio regime militar.
Assim, as ações para desestabilizar o processo de “distensão” e dissuadir a ala
moderada de efetivar o processo de redemocratização e compactuar com a ala radical
que insistia na continuidade do regime ditatorial, esses órgãos e grupos extremistas
passaram a promover atos de terrorismo, com o intuito de assustar a população, atrair
a conservadora e moralista classe média e, principalmente, atribuir os atos de
violência à oposição, forjando provas e evidências da autoria das ações,
responsabilizando os grupos de esquerda, genericamente chamados de comunistas.
As ações terroristas foram efetivas, entre 1979 e 1981, onde vários atentados
à bomba foram registrados em vários lugares, causando vítimas fatais, como no
episódio da OAB (4), culminando com o atentado no show de comemoração do 1 de
maio, no Riocentro. A repercussão negativa na imprensa das ações terroristas e a

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“esmagadora” vitória da oposição nas eleições diretas para governador em 1982


atuaram como elementos motivadores das manifestações pela retomada da
normalidade democrática. A “bandeira de luta” que sintetizou essa retomada foi a
campanha pela eleição direta para presidente da república.
O movimento batizado de “Diretas Já!” foi um dos momentos de maior
participação política popular da nossa recente história e teve seu início em março de
1983, durante o governo do general presidente, João Baptista Figueiredo. A
campanha foi conquistando o apoio dos diversos partidos da oposição e até mesmo
nos partidos mais afinados com o governo, como o PDS (formado por políticos
originários da antiga ARENA). No ano de 1984 a campanha ganhou a simpatia da
população, que foi às ruas para pedir a volta das eleições diretas, na expectativa da
votação da emenda constitucional proposta pelo deputado Dante de Oliveira
(PMDB/MT).
Sem direito ao voto direto para eleger o presidente desde a última eleição em
1960, diversos atores sociais e políticos tomaram as principais praças e avenidas pelo
país, para protestar contra o governo e exigir a retomada da normalidade
democrática. Nesse período, o governo militar contava com pequeno apoio popular,
pois a política econômica não conseguia apresentar bons resultados há mais de uma
década. Os índices econômicos eram bastante negativos, com alta inflação, enorme
dívida externa e interna, taxa de desemprego na casa dos 10%, falências e escândalos
financeiros estourando quase que diariamente evidenciavam a crise e o esgotamento
do modelo de governo ditatorial no país.
Mesmo com tantos sinais de derrocada do sistema político e econômico, os
militares, ainda firmes no poder, pregavam uma solução de compromisso, buscando
organizar uma transição democrática lenta e gradual. Sem o apoio da sociedade,
bastante insatisfeita com a situação geral, desejando o fim do regime de forma
definitiva, os militares ainda tentavam organizar um processo de “retirada honrosa”,
onde a eleição para a presidência, em novembro de 1984, aconteceria de modo
indireto, através do Colégio Eleitoral.
Depois de duas décadas vividas sob forte ação repressiva, o movimento das
Diretas trouxe novamente para as ruas o engajamento dos diversos segmentos

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sociais. Para reprimir as manifestações populares, durante o mês de abril de 1984, o


presidente Figueiredo aumentou a censura sobre a imprensa e ordenou prisões,
ocorrendo violência policial em todas as cidades brasileiras. Apesar dos sinais de
tentativa de endurecer a repressão às manifestações, a adesão popular foi
aumentando em número considerável, sobretudo nas vésperas da votação da emenda
Dante de Oliveira (5).
Mesmo com a derrota da emenda (6) e a consequente desmobilização da
campanha, o saldo foi positivo, pois o movimento trouxe a discussão política para as
ruas, para os espaços sociais públicos sem o risco de prisões, sequestros e torturas. A
politização da população brasileira sinalizava que além da retomada plena dos
direitos políticos, exigia também ampla participação enquanto cidadãos na ampliação
dos direitos e nas necessárias e urgentes mudanças sociais e econômicas.
A eleição indireta, em 15 de janeiro de 1985 garantia pelo menos uma
certeza, o próximo presidente seria um civil. Apoiado pelas mesmas lideranças do
movimento das Diretas Já, Tancredo Neves venceu a disputa. Chegava ao fim da
Ditadura Civil-Militar e o processo de redemocratização se iniciava, repleto de
incertezas, dificuldades, heranças complexas de duas décadas de autoritarismo, mas
com imenso apoio popular, desejoso de novamente ser protagonista nas decisões
políticas, econômicas, culturais e sociais da vida brasileira.

As Escolas de Samba do Rio de Janeiro:


As Escolas de samba, associações culturais com grande destaque no cenário
da vida artística e festiva da cidade do Rio de Janeiro, conquistaram ao longo do
século XX o papel de protagonistas do carnaval brasileiro. Atuando como síntese do
“reinado de Momo”, o modelo se tornou hegemônico e atualmente é difícil não
encontrar uma agremiação do mesmo molde nas principais cidades brasileiras. A
força dos desfiles, sobretudo o das “Escolas do grupo especial” atraem grande
quantidade de público e uma audiência “gigantesca” através das transmissões
televisivas. Mesmo sendo contestadas em diversos momentos dessa trajetória
histórica, as agremiações continuam centralizando as atenções e seus desfiles
impactam uma grande quantidade de pessoas pelo país.

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As Escolas de Samba do Rio de Janeiro foram constituídas, no final dos anos


1920, a partir de núcleos de moradores dos subúrbios e favelas cariocas. Os desfiles
nas duas primeiras décadas de existência evidenciavam um caráter “exótico” e
folclórico das agremiações. A situação, entretanto, passou a se modificar com a
política de subvenção e oficialização dos desfiles (desde 1935) e seu deslocamento
para as principais avenidas da cidade, nos anos 1950. A atenção dispensada pela
imprensa também acompanhou e alavancou esse crescimento. As Escolas desfilavam
com maior número de componentes e apresentavam mais elementos artísticos,
trabalhados com muito mais requinte em plasticidade e beleza.
Os anos 1960 apresentaram um quadro intenso de grandes transformações
políticas e culturais no Brasil. Os desfiles das agremiações do Rio de Janeiro também
estavam inseridos nesse processo. Essas transformações, sobretudo, quando se tratam
de manifestações culturais, revelam os embates, as lutas, as disputas por espaços
políticos e sociais de agentes diversos. Aos grupos formadores das primeiras Escolas
de Samba foram sendo incorporados novos elementos, ampliando as possibilidades
estéticas e temáticas dos desfiles.
Assim sendo, no início dos anos 1960, dialogando com a dinâmica da vida
política brasileira em suas questões sociais e aos debates ligados ao preconceito
racial, se verificou um processo de transformação ideológica e estética nos desfiles.
A abertura a novos temas para seus enredos permitiu uma inserção maior das escolas
nas discussões acerca da identidade nacional. Com efeito, esse processo não ocorreu
de maneira generalizante e essas transformações foram sendo percebidas em algumas
agremiações, como o Salgueiro, Império Serrano, Mangueira, Mocidade, Mangueira,
entre outras.
A grande maioria dos temas que as agremiações apresentavam, no período
anterior (1930/1950) estava sediada na chave conceitual dos personagens e fatos
históricos narrados pela historiografia “oficial”. Nos anos 1960, com a participação
de artistas de formação acadêmica, a adesão de jovens da classe média e a maior
politização das classes populares, principais agentes culturais das agremiações,
permitiu essa ampliação temática e os enredos sobre personagens negros e mulatos
(elementos marginalizados da sociedade brasileira) tornaram possível o engajamento

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de algumas agremiações nas lutas dos movimentos negros e seu caráter


reivindicativo de igualdade social.
Assim, a história dos desfiles ganharia um capítulo especial, com o
“lançamento” de histórias pouco conhecidas pelo público em geral e as agremiações
acrescentaram uma nova linguagem visual e discursiva aos desfiles. Ao apresentar
toda uma gama de representações que exaltavam a origem africana desses
personagens ressaltava a ancestralidade da própria festa carnavalesca, refletida na
trajetória das Escolas de Samba, que trouxeram para o centro das discussões as
temáticas etnográficas, raciais e o debate sobre a participação dos negros na
formação sociocultural do Brasil.
Nos anos 1980, com o prestígio consolidado, as Escolas se tornaram mais
ousadas nas propostas temáticas. Os temas tradicionais continuaram marcando
presença, mas a possibilidade de aliar uma visão mais crítica e satírica aos enredos
ampliou as possibilidades comunicativas das agremiações. As lutas pela retomada
dos direitos políticos e as transformações econômicas que o país vivenciava também
se tornaram motes explorados nos desfiles das principais Escolas de Samba cariocas.

As Escolas de Samba do Rio de Janeiro e os movimentos de


redemocratização política no Brasil:
Nas leituras realizadas para esse artigo, encontrei no texto de Francisco
Carlos Teixeira da Silva um pequeno parágrafo que me despertou a atenção (7). Ao
comentar sobre uma bomba que explodiu na quadra do Salgueiro, dentro do período
de reação da extrema direita militar que desejava impedir o processo de abertura
política, percebi que minha observação sobre a participação das Escolas de Samba
nos movimentos de retomada da normalidade da vida política brasileira tinha
fundamento. Busquei outras fontes para precisar a data do ocorrido e encontrei
diversos textos que comprovavam o fato.
No dia 27 de janeiro de 1980, explodiram bombas durante os ensaios
da Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, destruindo o
palanque onde se iria acontecer um ato de apoio à fundação do
Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), antigo
MDB (Movimento Democrático Brasileiro).(8)

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Uma pesquisa mais aprofundada no Acervo Digital do JB me ampliou a


percepção e maior compreensão deste fato (9). Dessa forma, me apropriei dessa
evidência, que se constituiu como uma preciosa pista para nortear minhas convicções
de historiador do campo cultural, que elegeu as Escolas de Samba como objeto de
pesquisa. As agremiações cariocas, tidas como espaços culturais ligadas ao lazer e
estereotipadas por parte dos intelectuais como “organizações alienadas” também
participaram e estavam inseridas nas lutas pelo retorno da democracia no Brasil.
Assim, as Escolas de Samba, enquanto instituições públicas, tiveram participação no
desenrolar dos movimentos contestatórios ao regime militar e podem ser comparadas
como outras instituições culturais e políticas como os Sindicatos, a UNE, a OAB, aos
partidos, aos artistas e intelectuais.
A pesquisa inicial sobre a “atuação política” das agremiações cariocas me
permitiu perceber três planos de estratégias de ação que foram se desenhando durante
o período: O embate direto dos artistas com os agentes da Censura; os sambas e
enredos que revelam ações no plano discursivo visual e linguístico; a adesão na
campanha de Leonel Brizola para o governo do Estado do Rio, em 1982 e nas demais
manifestações políticas do período.
No primeiro plano são analisados os embates diretos dos artistas
(carnavalescos, dirigentes e compositores) com os agentes da Censura e órgãos de
repressão, revelando momentos de tensão e negociação. O segundo plano, que
denomino de discursivo-visual e linguístico apresento as sinopses de enredos, os
registros dos desfiles e as letras dos sambas de enredo, cujos temas buscavam
discutir as questões em jogo no período (democracia, igualdade, cidadania, abertura
política, liberdade). No terceiro e último plano, o foco está centrado na participação
direta das Escolas nos atos políticos, nas campanhas para governo do estado do Rio
de Janeiro em 1982 e nas lutas pela anistia, abertura política e Diretas Já!.
Sobre o primeiro plano temos como exemplos alguns episódios, anteriores ao
período em análise, que são reveladores das tensões que os artistas das Escolas de
samba passaram a vivenciar neste enfrentamento com as autoridades brasileiras. Ao
propor como enredo “A História da Liberdade no Brasil” tanto o Salgueiro (1967),
liderado pelo carnavalesco Fernando Pamplona, os compositores do Império Serrano

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(1969) e do compositor Martinho da Vila (1972) sofreram com a ação direta ou


indireta da censura e órgãos de repressão do regime militar. Intimados a depor na
delegacia ou procurando convencer sobre a “ausência” de intenções políticas, esses
agentes culturais tiveram que administrar as suas criações e ceder as imposições de
cortes ou alterações nas obras propostas.
Várias vezes os ensaios do Salgueiro foram interrompidos com corte da
energia elétrica e a desconfiança da presença de homens estranhos na comunidade,
provavelmente policiais pertencentes ao DOPS, que acompanhavam os passos dos
sambistas para apontar qualquer tipo de conotação política na preparação para o
desfile. Era de fato, uma demonstração de coragem por parte da agremiação escolher
o tema liberdade num momento crítico de nossa história recente, onde o aparato
militar montou um rígido esquema de repressão aos opositores do regime
identificados, ou melhor, genericamente chamados de comunistas, procurando fechar
todos os meios de comunicação para não informar sobre as arbitrariedades cometidas
pelos militares no poder.
No caso do Império Serrano, os compositores tiveram que negociar suas
posições e fazer pequenas concessões para não ter problemas com os militares, onde
os compositores Silas de Oliveira, Mano Décio da Viola e Manuel Ferreira tiveram
que mudar um verso do samba-enredo Heróis da Liberdade, no carnaval de 1969.
Eles foram obrigados pelos censores a realizar essa mudança, lembrando que esse
carnaval foi o primeiro depois do AI-5.
Os jornalistas Chico Otávio e Aloy Jupiara destacaram que Em plena
ditadura, a escola de Madureira cantava a Inconfidência Mineira, a Independência e
a Abolição, mas a letra podia ser entendida como um protesto contra o regime: E
fizeram a citação literal do trecho final do samba de enredo: Ao longe soldados e
tambores/Alunos e professores/Acompanhados de clarim/Cantavam assim/Já raiou a
liberdade/A liberdade já raiou/Essa brisa que a juventude afaga/Essa chama/ Que o
ódio não apaga pelo universo/É a revolução em sua legítima razão. Para que o
samba fosse liberado, os compositores tiveram que alterar o último verso que se
transformou em É a evolução em sua legítima razão (10).

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Episódios narrados por Fernando Pamplona, carnavalesco do Salgueiro


durante os anos 1960 e início dos anos 1970 também revelaram os embates
constantes com os censores. Em entrevistas, prefácios de livros e na sua
autobiografia (11), o artista narrou os momentos que teve que se defrontar com os
agentes da repressão. Segundo a historiadora Tamara Cruz, em sua dissertação de
mestrado, todas as agremiações tinham que enviar suas sinopses, desenhos de
fantasias, alegorias e letras dos sambas enredos para serem liberados pela censura
(12).
O compositor Martinho da Vila, que compôs o samba da Vila Isabel Onde o
Brasil aprendeu a liberdade (1972) também sofreu problemas com o mesmo órgão
durante o período. Na disputa de samba-enredo da Unidos de Vila Isabel (1974), teve
sua composição desclassificada, por forte pressão dos agentes da censura que com a
truculência habitual consideraram a letra com extremo grau de mensagem
subversiva. O enredo da agremiação, intitulado Aruanã Açu, versava sobre a tribo
indígena dos Carajás e na visão dos censores pesava no tom crítico.
O trecho do samba de Martinho apontava a ação predatória das elites da
região amazônica, em conivência com os órgãos governamentais que deveriam
proteger os índios: Estranhamente o homem branco chegou/Para construir/Para
destruir/Para desbravar/E o índio cantou/O seu canto de guerra/Não se
escravizou/Mas está sumindo da face da Terra. (13) Dessa forma, o samba com seu
forte teor crítico desagradou os militares e a solução foi eliminá-lo da disputa. A
intervenção, entretanto, não terminou com essa censura:

Além de excluir o samba de Martinho, a escola teve que mudar o


desenvolvimento do enredo, que passou a exaltar a Transamazônica: A
grande estrada que passa reinante/Por entre rochas, colinas e serras /Leva o
progresso ao irmão distante/Na mata virgem que adorna a terra”, diz o
samba cantado no desfile. (14)

No segundo ponto de análise, o plano discursivo visual e linguístico aponto


alguns desfiles cujos enredos, sambas e em alguns momentos a própria confecção da
parte visual propunha um questionamento ou afirmativa de posicionamento político.

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As tensões presentes nas propostas de enredos das Escolas de Samba podem ser
percebidas, antes mesmo de iniciado o processo de abertura política.
A agremiação do bairro de Cavalcante, zona norte da cidade, apresentou em
seu desfile de 1976 o enredo Os Sertões, uma homenagem ao jornalista e escritor
Euclides da Cunha e sua obra de maior destaque, onde descreveu a última investida
do exército brasileiro sobre os sertanejos, liderados por Antônio Conselheiro no
Arraial de Canudos. O tema, extremamente polêmico que descreve uma ação
violenta do exército em um dos maiores massacres populares de nossa história
poderia ser taxado de “subversivo”. Não consta, na literatura do carnaval uma
narrativa sobre ação da censura na letra do samba ou na proposta estética da
agremiação. O rebaixamento para o segundo grupo foi, segundo os analistas do
desfile, em decorrência da “chuva torrencial” que desaguou na hora da apresentação
da Escola (15).
Outro exemplo a ser analisado é o desfile da Unidos de Vila Isabel (1980)
com o enredo O sonho de um sonho. A partir da poesia de Carlos Drummond de
Andrade, Martinho da Vila compôs um inspirado samba e conseguiu, no ano
seguinte à promulgação da Lei da Anistia, levar para a avenida uma composição que
tocava em questões complicadas para o período, como a liberdade, a tortura, a
clausura e as relações de poder estabelecidas pelo princípio do autoritarismo. E a
avenida cantou: Um sorriso sem fúria entre o réu e o juiz/A clemência e a ternura
por amor da clausura/A prisão sem tortura, inocência feliz/Ai meu Deus/Falso sonho
que eu sonhava (16). Segundo Chico Otávio e Aloy Jupiara, Foi a vez mais direta
que, naqueles tempos, uma escola de samba clamou pela liberdade, sobretudo na
ousadia contida no verso “a prisão sem tortura”. (17)
Outro desfile que merece ser analisado é o do Salgueiro (1983) Traços e
Troças. A partir de um enredo sobre as caricaturas foi apresentado em tom de ironia
a ação da censura e a proibição de “certos assuntos”, citados na letra do samba:

Eu sou o Rio e rio à toa/Só rio de quem me impede de sorrir/A minha pena
não tem pena nem perdoa/Mexe com qualquer pessoa/Ela quer se
divertir/Será que a política não vai me censurar?/Já sei, certos momentos

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não se pode criticar!/Gozar, traçar, ferir/Fazendo de novo meu povo
feliz/Riscando aquilo que ele não diz... (18)
Um caso interessante que também merece análise se trata de uma ação de
“autocensura” que ocorreu no Império Serrano (1984). O enredo, Foi, malandro é,
em sua parte final tinha como proposta “cutucar” os militares, mas a própria direção
da Escola, “escaldada” com os acontecimentos da década de 1960, preferiu não
arriscar e decidiu cortar a parte proposta por Fernando Pamplona ao carnavalesco
Renato Lage que desenvolveu o enredo (19).
Os enredos sociais da São Clemente (1984-1994) e em especial da
Caprichosos de Pilares (1983-1985) trouxeram para o ampliado leque de
possibilidades temáticas a verve crítica e satírica dos problemas políticos e
econômicos do país. O enredo sobre a Feira Livre (1983), Sobre Chico Anísio e seus
personagens (1984) e o aclamado E por falar em saudade (1985), uma viagem
nostálgica e crítica sobre as décadas anteriores a Ditadura Militar, foram momentos
marcantes onde o desejo de debater os acontecimentos políticos se tornava
necessidade dos artistas e sambistas. A mensagem, na letra do samba da agremiação
do bairro de Pilares, Diretamente o povo escolhia o presidente era objetiva e
utilizava o espaço temporal do carnaval para demonstrar a insatisfação com a
negativa da emenda Dante de Oliveira, na campanha das Diretas Já.
O terceiro plano proposto analisa as estratégias de atuação direta das Escolas
de Samba do Rio de Janeiro nos movimentos que ocorreram no período em questão e
que representaram as lutas pela redemocratização política brasileira. As campanhas
pela Anistia, a expectativa pela Abertura, a eleição de governador e as manifestações
nas Diretas Já! envolveu as agremiações, ora em seus espaços físicos, ora com os
sambistas agindo como agentes políticos.
O que posso perceber nesta investigação preliminar é que os integrantes das
Escolas de Samba e as próprias agremiações, enquanto instituições culturais atuaram
como atores políticos (coletivos e individuais) nas diversas campanhas que
movimentaram a sociedade brasileira na busca de nova redefinição de cidadania e no
retorno as liberdades democráticas.
Uma das evidências desta atuação se verifica na participação de sambistas na
campanha política do gaúcho Leonel de Moura Brizola para governador do Estado

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em 1982. Com grande apelo popular, o político contou com o apoio de várias
agremiações, realizando comícios em suas quadras e espaços culturais (20). O jingle
da campanha, composto por Noca da Portela (21), um dos mais respeitados
compositores da agremiação de Madureira foi interpretado pela sambista Beth
Carvalho, muito identificada com o “brizolismo” e com sua Escola “de coração”, a
Estação Primeira de Mangueira. O samba extrapolou o ambiente político e se tornou
um grande sucesso popular:
O que adianta eu trabalhar demais, se o que eu ganho é pouco/se cada dia
eu vou mais pra trás, nessa vida levando soco/e quem tem muito tá
querendo mais, e quem não tem tá no sufoco/vamos lá rapaziada, tá na hora
da virada vamos dar o troco/ Vamos botar lenha nesse fogo, vamos virar
esse jogo que é jogo de carta marcada/o nosso time não está no degredo
vamos à luta sem medo que é hora do tudo ou nada.(22)

A participação de grupos ligados aos partidos de oposição nos desfiles das


Escolas de Samba também merece análise. As situações de tensão e criatividade
resultaram em acontecimentos que demarcaram a junção de espaços entre atores
políticos e agentes culturais mesclados num mesmo cenário. Haroldo Costa nos
relata algumas dessas situações, como o exemplo do grupo de militantes do PT
(Partido dos Trabalhadores) que exigiam participar do Desfile da Unidos da Tijuca,
mesmo não estando devidamente fantasiados, alegando ter sido convidados pelo
carnavalesco da Escola, Renato Lage (COSTA, 1984, p.215).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Revisitar um momento riquíssimo de acontecimentos e debates, onde o


ambiente cultural estava extremamente revitalizado será de grande valia para
acrescentar novas abordagens a historiografia sobre os anos 1970/80 em nosso país.
Período intenso onde nos mais diversos segmentos culturais os artistas sofreram
ações de censura e exílio e procuraram encontrar estratégias de ação para comunicar
suas críticas ao regime militar.

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As agremiações do Rio de Janeiro, durante o período da Ditadura civil-militar


(1964-1985) também sofreram com a vigilância dos órgãos de repressão e censura e
muitas delas conseguiram criar estratégias para se contrapor ou aderir ao sistema
imposto, demonstrando que as agremiações estavam articuladas e participantes na
esfera pública onde as restrições e lutas pelos direitos políticos estavam sendo
disputados.
A utilização de elementos simbólicos e conceitos políticos (liberdade,
democracia, cidadania, anistia, povo e nação) nas letras dos sambas de enredo, nas
sinopses e nos elementos de visualidade dos desfiles despertavam nos espectadores
sentimentos de pertença as manifestações que estavam ocorrendo. Dessa forma, os
desfiles e a sua recepção por uma imensa massa de espectadores se tornava um
potente canal de comunicação de ideias e ideologias.
A participação direta dos sambistas (carnavalescos, compositores, dirigentes e
componentes) nas diversas campanhas e movimentos pela retomada dos direitos
democráticos permitiu uma ampliação de protagonismo desses agentes sociais que
passam a reivindicar sua inserção como legítimos atores políticos, criando lideranças,
tanto para cargos públicos quanto no aumento das associações de moradores das
comunidades das agremiações.
A participação direta de agentes sociais ligados às Escolas de Samba na
campanha e consequente vitória de Leonel de Moura Brizola ao governo do estado
do Rio de Janeiro nas eleições de 1982 estabeleceu um “pacto” de governabilidade
entre o Poder público e os moradores das comunidades base das agremiações. A
construção de um espaço fixo para os desfiles na Avenida Marquês de Sapucaí,
popularizada como Sambódramo, e a ampliação do reconhecimento da legalidade das
lutas pelo recebimento de direitos dos sambistas (direito de arena, justa arrecadação
no ECAD, gerência do evento para a LIESA) reforçaram os laços de reciprocidade
entre o governo e o povo carioca.

NOTAS

1 - Expressão cunhada para representar o surto de crescimento econômico que se instalou no Brasil na
virada dos anos 1960-70, momento de fortalecimento do regime militar e ampliação dos instrumentos de

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legitimação do regime (tanto de forma repressiva, quanto na propaganda nos meios de comunicação)
junto à população.
2 - A lei passou a vigorar em 1 de janeiro de 1979.
3 - Em 1981, na noite de 30 de abril, um desses shows realizava-se nos palcos do Riocentro, no Rio de
Janeiro, quando uma bomba explodiu no estacionamento. Meia hora depois, uma segunda bomba
explodia na casa de força quando a cantora Elba Ramalho fazia a sua apresentação. Além de ícones da
MPB, como Chico Buarque, Gal Costa, Gonzaguinha, Zizi Possi e muitos outros, uma plateia de vinte mil
pessoas assistia ao espetáculo.
4 - Em 27 de agosto de 1980, na sede nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro,
Lyda Monteiro, funcionária da OAB há mais de quarenta anos, ao abrir uma carta endereçada ao
presidente da ordem foi surpreendida pela explosão de uma bomba. Sua sala foi totalmente destruída.
Lyda teve o antebraço e a mão lançados na marquise do andar de baixo. Inconsciente, foi levada ao
hospital, onde faleceu.
5 - Foram realizadas várias manifestações públicas. Dois grandes comícios marcaram e deram a real
dimensão da participação popular na campanha: O do Rio de Janeiro, no dia 10 de abril de 1984, que
reuniu cerca de 1 milhão de pessoas e o de São Paulo, em 16 de abril, com a participação de 1,5 milhão de
manifestantes.
6- Em 25/4/1984, o Congresso Nacional se reuniu para votar a emenda Dante de Oliveira. Não foi
permitida a entrada de populares para acompanhar a votação. Temendo manifestações, os militares
reforçaram a segurança ao redor do Congresso Nacional, com tanques, metralhadoras e muitos soldados,
sinalizando que a proposta de eleição direta para presidente não era bem-vinda. Para que a emenda fosse
aprovada, eram necessários 2/3 dos votos. A expectativa popular foi frustrada e a derrota foi por pequena
margem de votos.
7 - TEIXEIRA DA SILVA, Francisco Carlos. Crise da Ditadura Militar e o Processo de Abertura Política.
In FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil Republicano – Vol. 4 - o tempo
da ditadura: regime militar e movimentos sociais em fins do século XX. 1. ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2003.
8 - http://virtualiaomanifesto.blogspot.com.br/2010/04/atentado-do-riocentro-mpb-sob-bombas.html,
pesquisado em 10/04/2016.
9 - Jornal do Brasil, 28/01/1980, capa e pg.12.
10 - http://oglobo.globo.com/brasil/sambas-enredo-enfrentaram-regime-militar-10304313.
11 - PAMPLONA, Fernando. O Encarnado e o Branco. Rio de Janeiro: Nova Terra, 2013.
12 - CRUZ, Tamara Paola dos Santos. As Escolas de samba sob vigilância e censura na ditadura militar:
memórias e esquecimentos. Dissertação de Mestrado. UFF. Niterói, 2010.
13 - http://www.vagalume.com.br/unidos-de-vila-isabel/samba-enredo-1974.html, pesquisado em
11/04/2016.
14 - 1OTAVIO, Chico e JUPYARA, Aloy. Sambas enredos enfrentaram o regime militar in
http://oglobo.globo.com/brasil/sambas-enredo-enfrentaram-regime-militar, pesquisado em 3/4/2016.
15 - Jornal do Brasil, 3/3/1976. Caderno B, pg.4.
16 - https://www.letras.mus.br/vila-isabel-rj/474029/, pesquisado em 05/04/2016.
17 - OTAVIO, Chico e JUPYARA, Aloy. Sambas enredos enfrentaram o regime militar in
http://oglobo.globo.com/brasil/sambas-enredo-enfrentaram-regime-militar, pesquisado em 3/4/2016.
18 - COSTA, Haroldo. Salgueiro: Academia do Samba. Rio de Janeiro: Record, 1984. P.293.
19 - PAMPLONA, Fernando. O Encarnado e o Branco. Rio de Janeiro: Nova Terra, 2013. P. 153.
20 - A cobertura da campanha de Leonel Brizola se encontra no acervo JB e demais jornais pesquisados.
21 - Segundo Ricardo Cravo Albim, o samba Virada foi composto em 1982, em parceria com seu filho
Noquinha (Gilmar Vilela Pereira, usando o pseudônimo Gilpert) e interpretado por Beth Carvalho. In
http://www.dicionariompb.com.br/noca-da-portela/dados-artisticos, pesquisado em 13/04/2016.

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