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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

Faculdade de Direito de Lisboa

(2018/2019)

Princípio “para trabalho igual salário igual” - sentido, limites,


implicações

MESTRADO FORENSE

ESTATUTO PATROMINAL DO TRABALHADOR

Ana Beatriz de Almeida Simões

Nº 142718070

Índice
1
Introdução ..................................................................................................................................... 1
1. Contexto histórico português ................................................................................................ 3
2. Na Atualidade........................................................................................................................ 4
3. RETRIBUIÇÃO .................................................................................................................... 5
4. Proibição de discriminação e princípio da igualdade ............................................................ 7
5. Princípio Trabalho Igual, Salário Igual ................................................................................. 9
5.1 – O alcance da norma ............................................................................................................ 11
5. 2 – O papel das Convenções coletivas em matéria de igualdade retributiva .................... 11
Considerações finais.................................................................................................................... 13
BIBLIOGRAFIA......................................................................................................................... 15
Introdução

O tema sub judice tem como pano de fundo o próprio processo de autonomização,
redimensionamento e constitucionalização do Direito do Trabalho.

Neste contexto, é a Organização Internacional do Trabalho - doravante OIT - que


representa a primeira grande expressão da internacionalização dos direitos dos
trabalhadores, como resposta às controvérsias sociais geradas, ao longo do século XIX,
pela industrialização. Contudo, a sua capacidade de dar resposta revelou-se bastante
limitada, o que se comprovava pelo défice de implementação das suas determinações e,
por outro lado, pelo facto de que muitos Estados se revelaram bastante resistentes face à
ratificação das suas convenções.

Só pós 1945, a internacionalização do direito do trabalho é reforçada. Vendo a sua


expressão, na Declaração Universal dos Direitos do Homem, através do Pacto dos
Direitos Económicos, Sociais e Culturais e, igualmente, pela Carta Social Europeia. Esta
última, embora de força diminuta quando comparada à da Convenção, não deixa de verter
sobre o direito a uma remuneração justa e igualitária.

Quanto a isto, leia-se, nomeadamente, o disposto no artigo 4º: “Com vista a assegurar o
exercício efetivo do direito a uma remuneração justa, as Partes comprometem-se: 1) a
reconhecer o direito dos trabalhadores a uma remuneração suficiente para lhes
assegurar, assim como às suas famílias, um nível de vida decente; 2) a reconhecer o
direito dos trabalhadores a uma taxa de remuneração acrescida para as horas de
trabalho suplementar, com exceção de certos casos particulares; 3) a reconhecer o
direito dos homens e mulheres a uma remuneração igual para um trabalho de valor igual
[…]; 5) a não autorizar descontos nos salários, a não ser nas condições e limites
prescritos pelas leis ou regulamentos nacionais ou fixados por convenções coletivas ou
sentenças arbitrais […]”.

De qualquer forma, o salto qualitativo nesta matéria sucedeu com a Carta dos
Direitos Fundamentais da União Europeia, constitucionalizada pelo Tratado de Lisboa,
na medida em que “reconhece um amplo conjunto de direitos fundamentais dos
trabalhadores, desde a liberdade do trabalho à proibição do trabalho infantil, passando
pela liberdade sindical e pelo direito a condições dignas de trabalho […]. Como se vê,
trata-se de um elenco bem mais vasto do que os direitos fundamentais dos trabalhadores
1
da OIT de 1998. Compreende não somente os enabling rights (liberdade de trabalho,
liberdade de ação sindical, direito à greve) […], mas também direitos substantivos […]
quanto às condições de trabalho e quanto à remuneração”1.

Posto isto, é-nos possível constatar, citando Rui Medeiros2, numa referência à obra de
João Caupers3, que tal como sobejamente conhecido, o intervencionismo estadual, bem
como a autonomização do direito de trabalho, deve-se ao facto de milhões de
trabalhadores constrangidos pela necessidade de sobreviver, se verem obrigados a aceitar
condições de trabalho degradantes, incluindo em matéria salarial. Mas não só, também o
facto de o direito comum dos contratos – direito civil – não se demostrar “sensível” às
questões sociais, faz com que esta necessidade se tenha manifestado como premente.

Sucintamente e utilizando, para tanto, uma expressão de Bernardo Lobo Xavier4: “torna-
se, assim, clara a perceção de que entre o rico e o pobre, o forte e o fraco é a lei que
liberta e a liberdade que oprime”. Ora, como bem se sabe, o princípio de trabalho igual,
salário igual consubstancia, ainda hoje, um dos domínios em que, de forma mais evidente,
se manifesta a diferença de velocidade entre a evolução da realidade laboral e a
capacidade de resposta do legislador. Crê-se, por esta razão, inevitável citar, novamente,
Bernardo Lobo Xavier: “estamos a intervir numa área em que somos hóspedes”5.

Torna-se, por isso, claro, que objetivo desta dissertação não passa por criar uma solução
inovadora ou colmatar o problema. É, aliás, sobre o Estado que recai o dever de consagrar
mecanismos adequados de tutela do direito à retribuição do trabalho. Sendo a sua
insuficiente atuação alvo de criticas, que atravessam gerações e para tanto basta referir
que João Caupers6, já na década de oitenta, do século passado, sublinhava a insuficiência
dos instrumentos de tutela consagrados na lei.

1
MOREIRA, VITAL, in Trabalho digno para todos – a “cláusula laboral” no comércio externo na União
Europeia, Coimbra Editora, 2014, p. 139-140
2
MEDEIROS, Rui, in O Direito Fundamental à Retribuição: em especial, o princípio a trabalho igual
salário igual, Universidade Católica Editora, 2016, p. 6 a 16
3
CAUPERS, JOÃO, in Os direitos fundamentais dos trabalhadores e a Constituição, Almedina, 1985, p. 8.
4
XAVIER, BERNARDO DA GAMA LOGO, in Manual de Direito do Trabalho, Verbo, 2014, p. 53
5
XAVIER, BERNARDO DA GAMA LOBO, in O despedimento coletivo no dimensionamento da empresa,
Verbo, 2000, p. 643 e 672.
6
CAUPERS, JOÃO, in Os direitos fundamentais dos trabalhadores e a Constituição, Almedina, 1985, p.
189-190
1. Contexto histórico português

Durante a década de 70, ao invés do que sucedeu na maioria dos países da OCDE,
onde a crise se traduziu na estagnação das atividades económicas e na retenção do
emprego, em Portugal não se registou qualquer perda no volume dos postos de trabalho.
Os enormes investimentos do setor público produtivo, depois das nacionalizações levadas
a cabo em 1975 e a expansão do consumo do setor público administrativo ao longo de
toda a segunda metade da década, muito terão contribuído para que assim tenha
acontecido.

Além do mais, a própria intervenção estatal traduzia-se em iniciativas de apoio à


manutenção de postos de trabalho, de viabilização económica de muitas empresas e de
alterações da relação salarial, que tiveram um impacto direto sobre o movimento criação-
supressão de emprego. Foram, para tanto, tomadas medidas como foi o caso da fixação
do salário mínimo, do subsídio de desemprego, da licença de maternidade de 90 dias e
outros direitos na gravidez, maternidade e assistência à família.

Logo após o 25 de Abril, foi instituído um conjunto de outras políticas inovadoras


de combate à discriminação social, económica, cultural e política das mulheres. Tendo
estas sido “recebidas” como uma inevitabilidade decorrente do próprio processo de
democratização do país.

Bafejado pelos ares de mudança, passa Portugal a ter uma “Lei da Igualdade”, na
sequência dos trabalhos preparatórios desenvolvidos, ao longo de uma década, por um
grupo de mulheres dedicadas ao serviço público e à emancipação feminina, que
trouxeram, nomeadamente, a necessidade de adaptar o quadro jurídico-legal à integração
na Comunidade Económica Europeia, da qual tinham emanado duas diretivas relativas à
igualdade de ambos os sexos no emprego. Sendo uma delas, a 75/117/CEE, relativa à
igualdade salarial e a outra, 76/207/CEE, relativa à concretização do princípio da
igualdade de tratamento entre homens e mulheres, em especial quanto ao acesso ao
emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho.

Um dos aspetos mais inovadores deste articulado legal, consubstancia-se na


determinação da criação daquela que viria a ser a Comissão para a Igualdade no Trabalho
e no Emprego, a CITE, que com uma composição tripartida e assento no Conselho
Económico e Social, passou a assumir posição sobre questões ligadas à discriminação das
mulheres no sistema de emprego, mais concretamente com a missão de promover a “real
igualdade de facto entre homens e mulheres no que respeita à totalidade das condições
materiais que rodeiam a prestação de trabalho”.

É, ainda, de relevância salientar que após a sua entrada em vigor, em 20 de Setembro de


1979, de poucas adaptações necessitou ao longo das três décadas seguintes, à exceção da
extensão do seu âmbito de aplicação ao sector público do emprego, através do Decreto-
lei n.º 426/88, de 18 de Novembro.

Apraz-nos dizer que, olhando para a evolução histórica conforme aqui,


sucintamente, se apresenta, que nada fazia querer que continuássemos, hoje, a discutir a
desigualdade salarial enquanto problema estrutural da sociedade.

2. Na Atualidade

Afunilando agora o foco, atualmente, são os artigos 13º, 59º, número 1, alíneas b)
e c) da CRP e 23º, 24º, 25º, 26º, 27º, 28º, 30º, 31º, 32º do Código do Trabalho que
preconizam a igualdade de oportunidades quando da contratação, não deixando,
igualmente, escapar a necessidade do princípio geral da igualdade e não discriminação
perdurar durante o contrato, estabelecendo para o efeito diversos mecanismos que visam
colocar todos os trabalhadores em situação de igualdade.

Da sua análise e passados já cerca de 39 anos sobre a entrada em vigor da Lei nº 392/79,
de 20 de Setembro - a “Lei da Igualdade” - fundadora da CITE, podemos destacar as
seguintes transformações:

• O reforço da presença feminina em todos os níveis do ensino e da formação


profissional;
• O aumento da vida ativa das mulheres, de um modo mais contínuo, com menos
interrupções por motivos familiares. Em parte, devido à forte adesão das mulheres
com filhos pequenos à atividade económica e, em contrapartida, à extraordinária
quebra da fecundidade;
• A progressiva integração das mulheres em profissões das quais eram excluídas.
3. RETRIBUIÇÃO

No seguimento do supra exposto, cabe esmiuçar, em primeiro lugar, o que se entende por
retribuição.

A atividade laboral só por si, pressupõe a existência de uma retribuição para fazer nascer
a condição de emprego. É, aliás, por reconhecer que esta “condição” representa a garantia
dos direitos à subsistência e condição digna de vida, que a Constituição, bem como o
Código de Trabalho, dispõem de mecanismos que impedem que o empregador cometa
abusos contra os seus trabalhadores, imputando-lhes, por exemplo, remunerações
menores do que o “piso” salarial previsto em lei.

Contudo, é controversa, na doutrina, a questão da natureza e do alcance do direito


fundamental à retribuição. Alguns autores7, questionam a força normativa do direito
fundamental plasmado no artigo 59º, número 1, alínea a) da CRP, como tal,
aparentemente o direito à retribuição traduz-se, então, na clássica aspiração do salário
justo, sendo apenas exequível pela negativa, enquanto proibição da discriminação, ou
progressivamente, através de uma política de rendimentos adequada.

Do outro lado da barricada, e em maioria, defende-se que o direito à retribuição, enquanto


contrapartida do trabalho, se inclui na categoria dos direitos económicos, com estrutura
de direitos, liberdades e garantias8. Nesta perspetiva, embora considerem, igualmente,
que estamos perante um direito abrangido pelo regime dos direitos liberdades e garantias,
a lógica é mais subjetiva, no sentido de que “todos os trabalhadores, têm direito à
retribuição do trabalho” (artigo 59, nº 1, al. a) da CRP), sendo este um direito dirigido
essencialmente contra as entidades patronais. Ou seja, nele tem especial saliência o
princípio da aplicação direta, enquanto desnecessidade de intervenção mediadora da lei
ordinária.

No seguimento desta discussão, surge ainda a questão de saber se este direito à


retribuição, que vive paredes meias com o direito a uma existência condigna, é uma

7
Entre eles: CORDEIRO, ANTÓNIO MENEZES in “Manual de Direito do Trabalho” e BOTELHO, CATARINA
SANTOS in “Algumas reflexões sobre o princípio da paridade retributiva”, numa referência de
MEDEIROS, RUI in “O direito fundamental à retribuição”, p.40.
8
Entre eles: MIRANDA, Jorge in “A Constituição Portuguesa e os Direitos dos Trabalhadores” e
CANOTILHO, Gomes/ MOREIRA, Vital in “Constituição da República Portuguesa anotada I, p. 770.
obrigação programática ou não. Quanto a isto, defende Pedro Romano Martinez9 que “o
dever de pagar a retribuição não é programático, nem sequer a obrigação de o salário
ser fixado em função da quantidade, natureza e qualidade carece de conformação”. Já
“a obrigação de garantir uma existência condigna essa sim é programática. A entidade
patronal tem de pagar o salário mínimo estabelecido por lei, mas não lhe cabe
determinar qual é o mínimo que garante a existência condigna – até porque se trata de
um conceito indeterminado, dificilmente concretizável; tal dever não impende
diretamente sobre o empregador”.

Todavia, salvo a devida vénia, não nos podemos desligar da ideia de que a retribuição, no
ordenamento jurídico português, constitui um elemento essencial do contrato de trabalho,
enquanto pressuposto do contrato, isto é, sem o qual não se considera existir atividade
laboral em sentido jurídico. Daí que, o sentido da Constituição seja não tanto o de garantir
que o direito à retribuição, qualquer que ela seja, uma vez que este já é pressuposto do
Contrato de Trabalho, mas antes assegurar que a retribuição respeita as exigências de
justiça e, mais concretamente, de proporcionalidade. Refira-se, a este respeito, que a ideia
de proporcionalidade está aqui ligada à de justiça comutativa, enquanto exigência de
equilíbrio ou de relação adequada – “correspetividade entre o trabalho prestado e a
retribuição devida, entendida com a devida cautela”10

Quanto à nossa jurisprudência constitucional, vai igualmente no sentido de que


este é um direito de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias. Entendendo
que, embora não se possa ignorar a relevância do princípio da autonomia privada nas
relações de trabalho entre empregadores privados e trabalhadores, o legislador ordinário
dispõe de uma margem de liberdade de conformação quanto ao direito à retribuição.

Isto, talvez, de forma a justificar a disparidade de soluções entre o público e o privado. É


que, vejamos, ao Estado é permitido, pelo Tribunal Constitucional, diminuir o valor dos
salários unilateralmente, situação impensável no setor privado, pelo menos no que diz
respeito à diminuição unilateral dos salários11.

9
MARTINEZ, Pedro Romano in “A Constituição de 1976 e o Direito do Trabalho, p. 12-13.
10
MEDEIROS, RUI in “ O direito fundamental à retribuição”, p. 50.
11
GONÇALVES, Fernandes in “Irredutibilidade salarial: princípio – ou- em princípio?” – Prontuário de
Direito do Trabalho, nº 93 (2012), p. 87 e seguintes.
4. Proibição de discriminação e princípio da igualdade

Da conjugação do disposto no nº1 do artigo 59º com o nº2 do artigo 13º da CRP,
resulta a expressa consagração da igualdade retributiva em duas dimensões do princípio
da igualdade: a não discriminação e a igualdade. Princípios estes que no projeto de
articulado, saído inicialmente da 3ª Comissão, foram confundidos, dispondo
concretamente que “os trabalhadores têm direito (…) a uma retribuição proporcionada
à quantidade e qualidade do seu trabalho (…), sem distinção da idade, sexo, raça,
nacionalidade, religião ou ideologia, ou seja, observando o princípio “para trabalho
igual salário igual”.

A análise do conceito de retribuição enquanto proibição de discriminação e corolário do


princípio geral da igualdade, não tem apenas como destinatário o Estado (≠ do n.º 2 do
artigo 59.º) mas também os particulares.

A igualdade, por sua vez, pode ser entendida, numa perspetiva puramente formal,
com mera decorrência da generalidade e abstração das leis. Assim como, numa perspetiva
mais substancial, no sentido da regra da não discriminação. Embora aqui o que mais
releve seja a vertente da igualdade como exclusão do arbítrio; como recusa da
discriminação.

O princípio da igualdade cumpre-se independentemente do conteúdo intrínseco da


decisão jurídica:“tratar igual o que é igual e desigual o que é desigual”. Podendo, nesta
linha, descortinar, como fez Maria Glória Ferreira Pinto12, dois planos que aqui se
intersetam: “o plano que determina as situações que se devem considerar iguais ou
desiguais e o plano do tratamento uniforme ou diferenciado daquelas situações,
consoante o juízo justificativo a que as mesmas conduziram”.

Porém, embora frequente a afirmação de que o princípio da igualdade constitui um dos


valores primeiros do modelo constituição de relações laborais, a sua aplicação prática,
neste contexto, é muito escassa, pois defronta-se com outros princípios de idêntica ou
superior relevância, nomeadamente com o da liberdade e da iniciativa privada. Sendo

12
PINTO, Maria Glória Ferreira in “Princípio da igualdade fórmula vazia ou fórmula carregada de
sentido?”, p. 19-20
que, como é bom de ver, não basta aplicar, para tanto, regras como a do 18º, número 1 da
CRP.

Por esta razão, se lê na doutrina que “o atentado à igualdade se tornou (…) um argumento
‘passe-partout” para contestar a validade das leis e das atuações concretas do poder
político”13.

A proibição da discriminação, por sua vez, assume, na generalidades dos


ordenamentos, um lugar central na concretização do princípio da igualdade.
Discriminação, no sentido de proibição de estabelecimento de diferenças entre as pessoas
com fundamento, não num juízo, mas num pré-juízo sobre aquilo que as distingue e sobre
as caraterísticas que formam a sua identidade.
Numa primeira vertente, temos a discriminação direta que se consubstancia na
atitude do empregador que visa de maneira proposital e não desculpável favorecer um
trabalhador em detrimento de outro, como serve de exemplo, o empregador que toma a
liberdade de não contratar mulheres para exercer determinado cargo, tendo em vista que
poderão necessitar de ausências mais alongadas em virtude da maternidade ou por
considerar não serem aptas a exercer determinada atividade, com fundamento na
descrença pelas suas capacidades.
Por outro lado, temos a discriminação indireta que pressupõe que o empregador
atue de forma a que determinada situação não aparente uma hipótese de diferenciação
proposital, contudo quando analisada no seu todo/contexto, verifica-se o propósito
desigual adotado. Para tanto, imaginemos o caso de um empregado, de uma rede de
televisão com transmissão por toda a Europa e sede em Portugal, que somente contrata
empregados estrangeiros. De maneira escamoteada esse empregador contrata negros,
pessoas em situação financeira desfavorável, mulheres e homossexuais, não se
vislumbrando aparentemente nenhuma diferenciação na sua atuação empresarial, no
entanto tendo em consideração que existe transmissão de programas voltados ao público
Português, há discriminação indireta em relação aos profissionais nacionais, uma vez que
estes são os únicos aos quais se encontra vedada a hipótese de contratação.

Neste contexto, é relevante referir a questão da identificação das categorias


suspeitas, que é bastante controversa, uma vez que podem existir suspeitas em geral que

13
PINTO, Maria Glória Ferreira in “Princípio da igualdade fórmula vazia ou fórmula carregada de
sentido?”, p. 54 e seguintes.
não tenham uma carga negativa no mundo laboral, ou que não se encontrem elencadas no
número 1 do artigo 59º da Constituição. É o caso da discriminação em razão da orientação
sexual. Embora o artigo 59º tenha “permanecido no silêncio”, mesmo depois da revisão
constitucional de 2004, em especial do artigo 13º nº2, não impede que se reconheça o
caráter suspeito de uma discriminação laboral14.

Conclui-se, assim, que a não discriminação se traduz na afirmação de igualdade jurídica


entre grupos, e respetivos membros, visando a proibição de discriminação impedir
diferenciações injustificadas com base em certos critérios suspeitos – ou, noutra
perspetiva, impondo a proibição de discriminação uma igualdade tendencial de
tratamento entre grupos de pessoas que diferem em virtude de determinadas caraterísticas.
Pelo predito, se compreende a atenção que o Código do Trabalho confere às
discriminações suspeitas nos artigos 23º e seguintes.

5. Princípio Trabalho Igual, Salário Igual

As considerações supra levam-nos diretamente ao preceito contido na alínea a) do


nº 1 do artigo 59º da Constituição, alvo principal desta dissertação, nos termos do qual
“todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de
origem, religião ou convicções políticas ou ideológicas, têm direito (…) à retribuição do
trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que
para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna”.

A simples alusão a quantidade, natureza ou qualidade do trabalho não habilita o aplicador


da regra com um critério diretamente praticável para as situações concretas. Torna-se, por
esta razão, necessário indagar qual é o concreto tipo, ou nível, de igualdade que se
pretende e qual a forma de determinar a quantidade, natureza e qualidade do trabalho.

É que, vejamos, não existe verdadeiramente “trabalho igual”, existe, sim, trabalho
comparável a outro e passível de um juízo de equiparação em função de certos critérios
(penosidade, requisitos profissionais, produtividade, assiduidade, etc.), como tal, é
necessário estabelecer mecanismos concretizadores dos critérios que facilitem esta

14
Acórdão do TJUE de 30 de abril de 1998 (Processo nº C-13/94) relativo a um caso de discriminação de
um transexual.
comparação, para que o igual possa ser tratado igualmente e o que não é igual tratado de
outro modo.

Controversa é, ainda, a questão de saber se a enunciação do princípio de que para


trabalho igual salário igual, veda apenas as diferenciações ao nível da retribuição do
trabalho que não estejam justificadas num “fundamento material bastante” ou, pelo
contrário, pretender circunscrever, neste domínio os critérios de diferenciação atendíveis,
só admitindo as diferenças ao nível de retribuição fundadas na diferente quantidade,
natureza e qualidade do trabalho ou, para utilizar a fórmula do artigo 23º, número 1, alínea
c) e d) do Código do Trabalho, na inexistência de trabalho igual ou de trabalho de igual
valor”15.

Quanto a isto, e num entendimento mais restrito, defende-se que tais diferenças,
nomeadamente as baseadas em mérito, produtividade, assiduidade, só são legítimas e
podem ser praticadas pelo empregador desde que justificadas por razões conexas com a
diferente qualidade, quantidade e natureza do trabalho prestado, tornando-se, assim, o
princípio da paridade na necessidade, um fundamento material para a diferença.

Todavia, uma parte significativa da doutrina e da jurisprudência mais recente sustenta que
o princípio da igualdade não impede a diferenciação de tratamento, mas apenas a
discriminação arbitrária e irrazoável16, não devendo considerar-se violadoras da
Constituição certas diferenciações retributivas com base em critérios que não se
reconduzem à quantidade, natureza e qualidade do trabalho, pelo que apenas se encontram
vedadas as situações em que, perante um trabalho igual ou de valor igual, a retribuição
seja diferente, sem uma causa de justificação objetiva.

A conclusão alcançada parece significar, no essencial, que o princípio da paridade


retributiva acaba por não introduzir nada de substancialmente novo, por referência à
proibição de discriminação e ao principio geral da igualdade, aqui entendido como
proibição, por outras palavras uma vez, em larga medida, serem esvaziados de conteúdo,
torna-se remota a possibilidade de o trabalho invocar com sucesso o princípio da
igualdade, nesta aceção.

15
MEDEIROS, RUI, anotação ao artigo 59º da CRP in “Constituição Portuguesa anotada I” (ed. Jorge
Miranda/Rui Medeiros), p. 1152
16
NETO, Abílio in “Conteúdo e alcance do princípio constitucional “para trabalho igual, salário igual”, p.
375
5.1 – O alcance da norma

Quanto à questão de saber que entidades se encontram abrangidas pelo preceito


constitucional, há na doutrina portuguesa quem considere que os particulares não são
destinatários diretos do princípio trabalho igual, salário igual, o que implica dizer que,
este princípio, não é diretamente aplicável às relações laborais contratuais estabelecidas
entre trabalhadores e empregadores privados. Desta forma, mesmo que a igualdade do
trabalho se aferisse apenas em função da sua quantidade, natureza e qualidade, tais
requisitos careciam sempre de concretização pela via legislativa.

Por esta razão, e segundo este entendimento, “um intérprete minimamente atento e
descomprometido não pode deixar de concluir que a aplicação do principio da igualdade
da retribuição, como determinante constitucional positiva e forma de resolução de
litígios concretos, passa necessariamente pela concretização do que deva entender-se
pelos conceitos supra e pelo enunciado dos demais critérios objetivos que viabilizem a
avaliação do desempenho das funções inerentes às diversas categorias profissionais,
quer essa concretização e definição passe por uma intermediação legislativa que
estabeleça ela própria, o respetivo quadro classificativo, quer se limite a incluí-la no
objeto, eventualmente, obrigatório, da regulamentação coletiva”17.

Até porque considerando que, neste domínio, e como “necessário contraponto” ao


princípio da igualdade retributiva, há que tomar em consideração o papel da livre
iniciativa e liberdade de empresa, pelo que se impõe, mesmo nas relações laborais, a
necessidade de fazer diferenciações em função do tipo de situações e das circunstancias
que em concreto sejam reveladas.

5. 2 – O papel das Convenções coletivas em matéria de


igualdade retributiva

A liberdade sindical desempenha, entre outras, a função de garantir aos trabalhadores o


acesso a um instrumento suscetível de potenciar a eficácia das suas reivindicações, por
forma a que ele recupere, ao nível coletivo, o défice de capacidade de negociação de que
enferma no plano individual.

17
CARVALHO, Nunes de/ XAVIER, Bernardo da Gama Lobo – “Princípio da igualdade: a trabalho igual,
salário igual” – revista nº 4 (1997)
Nesta linha, na lógica de que a vocação primordial do princípio “trabalho igual, salário
igual” se dirige à limitação da liberdade contratual das partes, por forma a concretizar o
programa de valores constitucionalmente estabelecido, não fica possível descortinar o
mero confronto entre a liberdade negocial de cada uma das partes e os limites que lhes
são impostos pela lei. Ou seja, este princípio não opera da mesma forma quando na
contratação coletiva o trabalhador deixa “nas mãos” das estruturas representativas.
Passando as suas vontades individuais a coletivas, acaba por, por um lado, perturbar o
simplismo do esquema dualista, retirando força às premissas em que assenta a
desigualdade material entre as partes do contrato de trabalho e, por outro, retira espaço
de atuação aos instrumentos emanados por essas premissas.

É, por estas razão, caraterizado pela doutrina como o “novo fôlego” da liberdade
negocial e da vontade das partes, no plano da atuação coletiva. O que, atenção, não pode
ser desvalorizado, uma vez que a vocação primordial deste princípio não pode atuar da
mesma forma pois, o trabalhador tem, agora, estruturas representativas por si criadas, cujo
objetivo é o de recuperar a sua capacidade de negociação, estando, para tal, dotadas de
prerrogativas específicas e constitucionalmente reconhecidas.

É, ainda, relevante que referir esta proteção supra, atribuída pela aplicação das
convenções coletivas, se destina apenas aos filiados no sindicato outorgante, conforme
disposto no artigo 7º da LRCT e e embora se discuta se estamos perante uma hipótese de
desigualdade, crê-se que está longe de envolver qualquer discriminação, representando,
pelo contrário, um verdadeiro corolário da liberdade sindical, cuidando o legislador de
dispor de meios para assegurar a concordância prática deste princípio com a regra da
igualdade de tratamento.

Para além disso, a eventual queda do princípio da filiação, pela ideia de igualdade,
roubaria sentido ao funcionamento da autonomia coletiva e à própria adesão ao sindicato,
pondo em causa o desenho constitucional do sistema pluralístico de relações coletivas de
trabalho.
Desta forma, a melhor retribuição auferida pelos trabalhadores filiados nos sindicatos que
outorgam a convenção coletiva, surge como contrapartida de um benefício concedido ao
empregador: a paz social.

Considerações finais

Definir trabalho igual, tendo como resultado a obrigação de pagar idêntica remuneração,
não é das tarefas mais fáceis.

Vale, para tanto, transcrever a crítica do Professor Júlio Gomes18, “O princípio da


igualdade ou paridade de tratamento retributivo – a trabalho igual salário igual –
sempre foi, no seu fundamento e no seu alcance prático, extremamente polémico.”

Como já vimos amplamente no presente trabalho, definir o que tem idêntico valor, ou em
sentido contrário, o que possui diferentes motivos razoáveis para justificar uma diferença
na hora de definir/pagar remuneração, não é conceito pacífico na doutrina, pelo contrário,
a citação acima do Professor Júlio Gomes, bem retratar a posição controvertida que existe
na aplicação da lei.

Quanto à definição das situações que consubstanciam paridade salarial, continua a ser
uma tarefa difícil, uma vez que não estão assentes em clara discriminação, designando
ainda, a questão, como matéria vazia.

Como, também, vimos nos pontos anteriores, a lei deixou uma enorme escala de
subjetividade na definição dos parâmetros salariais, sendo certo que tal dispositivo em
âmbito geral, tem o escopo de impedir a discriminação e garantir a suficiência retributiva
mínima entre trabalhadores.

Nas lições do Professor Júlio Gomes19, é apresentado quanto à definição da isonomia


retributiva: “A Constituição ao estabelecer no seu artigo 59º, que se deve observar o
princípio de que a trabalho igual, salário igual, não proscreve ou impede as diferenças

18
GOMES, Júlio in “Em torno da retribuição”, p. 171 e seguintes.
19
GOMES, Júlio in “Direito de Trabalho I”.
retributivas. Tais diferenças são legítimas e podem ser praticadas pelo empregador desde
que justificadas por razões conexas com a diferente qualidade, quantidade e natureza do
trabalho prestado. Não se desemboca assim numa conceção opressiva da igualdade,
sendo inteiramente válidas as diferenças relacionadas com o mérito.”. Ou seja, definir
de forma rigorosa os critérios, díspares, em matéria retributiva é um grande desafio, ante
a subjetividade da norma já destacada.

Da leitura dos ensinamentos esposados acima, entre outros, não decorre nenhuma regra
de natureza objetiva, que defina, efetivamente, requisitos para que o trabalhador possa
exigir as diferenças salariais, a partir da noção de trabalho e salário igual.

É por todas estas razões, que a doutrina tem vindo a caracterizar o princípio do salário
igual para trabalho igual, como um princípio vazio e de pouca aplicabilidade prática,
deixando ao crivo da subjetividade a análise efetiva do caso concreto. É que a igualdade,
de que aqui se fala, não é assegurada só e apenas com a introdução de novas normas, leis
ou princípios que são teoricamente bem promulgados, é necessário assegurar mecanismos
para que sejam bem aplicadas e cumpridas.

É, por isso, necessário quebrar as indiferenças, respeitar as diferenças, pois, como escreve
Jorge Miranda20: “a igualdade não é uma ilha, é parte do continente, encontra-se conexa
com outros princípios, tem de ser entendida – também ela – no plano global dos valores,
critérios e opções da Constituição”.

20
MIRANDA, Jorge in “A Constituição portuguesa e os Direitos dos Trabalhadores”, p. 90 e seguintes.
BIBLIOGRAFIA

• Acórdão do TJUE de 30 de abril de 1998 (Processo nº C-13/94)


• CARVALHO, Nunes de/ XAVIER, Bernardo da Gama Lobo – “Princípio da
igualdade: a trabalho igual, salário igual” – revista nº 4 (1997)
• CAUPERS, JOÃO - Os direitos fundamentais dos trabalhadores e a Constituição
• GONÇALVES, Fernandes - “Irredutibilidade salarial: princípio – ou- em
princípio?” – Prontuário de Direito do Trabalho, nº 93 (2012);
• MARTINEZ, Pedro Romano - “A Constituição de 1976 e o Direito do Trabalho
• MEDEIROS, Rui - O Direito Fundamental à Retribuição: em especial, o
princípio a trabalho igual salário igual.
• MEDEIROS, RUI, anotação ao artigo 59º da CRP - “Constituição Portuguesa
anotada I” (ed. Jorge Miranda/Rui Medeiros)
• MIRANDA, Jorge - “A Constituição Portuguesa e os Direitos dos Trabalhadores”
e CANOTILHO, Gomes/ MOREIRA, Vital in “Constituição da República
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• MOREIRA, VITAL - Trabalho digno para todos – a “cláusula laboral” no
comércio externo na União Europeia.
• NETO, Abílio - “Conteúdo e alcance do princípio constitucional “para trabalho
igual, salário igual”,
• PINTO, Maria Glória Ferreira - “Princípio da igualdade fórmula vazia ou fórmula
carregada de sentido?”
• XAVIER, Bernardo Da Gama Lobo, in Manual de Direito do Trabalho
• XAVIER, Bernardo Da Gama Lobo, in O despedimento coletivo no
dimensionamento da empresa;

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