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Daniel Borrillo

Homofobia
História e crítica de um preconceito

Tradução
Guilherme João de Freitas Teixeira

autêntica
Copyright © 2000 Presses Universitaires de France
Copyright desta edição @ 2010 Autêntica Editora

TITULO ORIGINAL

L'homophobie

TRADUÇÃO
Guilherme João de Freitas Teixeira

PROJETO GRÁFICO DE CAPA

Diogo Droschi

EDITORAÇÃO ElETRONICA
Alberto Bittencourt

REVISÃO

Cecilia Martins

EDITORA RESPONSÁVEL

Rejane Dias

7 Prefácio a esta edição


Revisado conforme o Novo Acordo Ortográfico.

Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora. Nenhuma 13 Introdução


parte desta publicação poderá ser reproduzida, seja por
meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica, sem 21 Capítulo I: Definições e questões terminológicas
a autorizaçâo prévia da Editora.
24 Homofobia irracional e homofobia cognitiva
AUTÊNTICA EDITORA 25 Homofobia geral e homofobia específica
Rua Aimorés, 981, 8° andar. Funcionários 30 Homofobia, sexismo e heterossexismo
30140-071 . Belo Horizonte. MG
Tel: (55 31) 3222 68 19 34 Racismo, xenofobia, classismo e homofobia
TELEvENDAs: 0800 283 13 22
www.autenticaeditora.com.br
43 Capítulo lI: Origens e elementos precursores
45 O mundo greco-romano
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 48 A tradição judaico-cristã
(Cãmara Brasileira do Livro. Sp, Brasil)
57 A Igreja Católica contemporânea e a condenação
Borrillo, Daniel
da homossexualidade
Homofobia : história e critica de um preconceito / Daniel Borrillo ;
[tradução de Guilherme João de Freitas Teixeira]. - Belo Horizonte: Autêntica
Editora, 2010. - (Ensaio Geral, 1). 63 Capítulo llI: As doutrinas heterossexistas e a
Título original: l'homophobie.
ideologia homofóbica
ISBN 978-85-7526-456-0
64 A homofobia clínica
1. Discriminação contra homossexuais 2. Homofobia 3. Preconceitos I.
Título. 11.Série. 73 A homofobia antropológica
10-03240 CDD- 300
76 A homofobia liberal

Indices para catálogo sistemático:


78 A homofobia "burocrática": o stalinismo
1. Homofobia : Preconceitos: Sociologia 300
82 A homofobia em seu paroxismo: o "holocaustogay"
87 Capítulo IV: As causas da homofobia

88 A homofobia como elemento constitutivo


da identidade masculina
Prefácio a esta edição
90 A homofobia, guardiã do diferencialismo sexual
94 A homofobia e o fantasma da desintegração
psíquica e social
96 A personalidade homofóbiea
100 A homofobia interiorizada
Hornofobia
105 Conclusão: Recursos para lutar contra a homofobia
Muitos fenômenos sob o mesmo nome
107 A prevenção da homofobia
Prof. Dr. Marco Aurélio Máximo Prado·
113 A punição dos comportamentos homofóbicos
120 A lei contra a homofobia e a identidade gay A homofobia como termo para designar uma forma de pre-
121 Referências conceito e aversão às homossexualidades em geral tem se lança-
do na sociedade brasileira com alguma força política, conceitual
e analítica nos últimos anos. Ainda que, do ponto de vista histó-
rico e analítico, não revele mais a complexidade das formas de
hierarquização sexual, violência e preconceito social, é um con-
ceito que hoje carrega um sem-número de sentidos e fenômenos
que ultrapassam a sua descrição conceitual primeira.
O conceito tem sido utilizado para fazer referência a um
conjunto de emoções negativas (aversão, desprezo, ódio ou
medo) em relação às homossexualidades. No entanto, en-
tendê-Io assim implica limitar a compreensão do fenômeno
e pensar o seu enfrentamento somente a partir de medidas
voltadas a minimizar os efeitos de sentimentos e atitudes de
"indivíduos" ou de "grupos homofóbicos': deixando de lado
as instituições sociais que nada teriam a ver com isso.
Desde que foi cunhado, em 1972, em referência ao "medo
expresso por heterossexuais de estarem em presença de ho-
mossexuais", o conceito passou por vários questionamentos
e ressignificações (JUNQUEIRA, 2007). No entanto, o termo,

* Coordenador do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT (lésbicas, gays,


bissexuais, transexuais, travestis e transgêneros) da Universidade Federal de Minas
Gerais. Bolsista do CNPq e da Fapemig. Professor do Programa de Pós-Graduação
em Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais.

7
a partir de meados dos anos 1970, ganhou notoriedade e co- e preconceito sexual. Ao demonstrar as particularidades da
nheceu considerável êxito, especialmente nos países do Nor- homofobia individual, social, na cultura e nas instituições, este
te, e foi adquirindo novos contornos semânticos e políticos. livro abre novas oportunidades de pesquisa e compreensão das
Além de ser empregado em referência a um conjunto de ati- lógicas de hierarquização e inferiorização social.
tudes negativas em relação a homossexuais, o termo, pouco a A homofobia tem se revelado como um sistema de humi-
pouco, passou a ser usado também em alusão a situações de lhação, exclusão e violência que adquire requintes a partir de
preconceito, discriminação e violência contra pessoas LGBT. cada cultura e formas de organização das sociedades locais, já
Passou-se da esfera estritamente individual e psicológica para que essa forma de preconceito exige ser pensada a partir da sua
uma dimensão mais social e potencialmente mais politizadora. interseção com outras formas de inferiorização como o racis-
Mais recentemente, verifica-se a circulação de uma compreen- mo e o classismo, por exemplo. Nesse ponto, Daniel Borrillo é
são da homofobia como dispositivo de vigilância das fronteiras insistente, ao evidenciar que a homofobia se alimenta da mes-
de gênero que atinge todas as pessoas, independentemente da ma lógica que as outras formas de violência e inferiorização:
orientação sexual, ainda que em distintos graus e modalidades. "desumanizar o outro e torná-Io inexoravelmente diferente".
Este livro, oportunamente traduzido para o português, Nesses termos, o livro que ora o leitor tem em mãos apresenta
acompanha o movimento de atualização do preconceito se- um debate afinado de como o acirramento das diferenças, mui-
xual na sociedade contemporânea. Para além da origem psí- tas vezes, ocupa disfarçadamente a lógica de exclusão social.
quica das fobias, Daniel Borrillo não só traz para o debate as Na sociedade brasileira ainda temos pouco conhecimento
origens históricas da homofobia, mas também enfatiza a in- sobre a homofobia. Sim, sabemos que ela existe tanto atra-
tensa relação entre a homofobia individual e as formas de ho- vés de dados empíricos, de pesquisas quanto pela lógica da
mofobia institucional, jurídica e social. Nesse ponto, cabe-nos experiência. No entanto, estamos em um momento bastante
ressaltar um dos aspectos que merecem ser sublinhados neste contraditório: sabemos que ela existe, mas sabemos tão pouco
livro: a sua atualidade, marcada por uma compreensão da com- sobre como ela funciona e quais as suas dinâmicas ao se ar-
plexa relação entre as instituições, a cultura, as leis e os indiví- ticular com outras formas de inferiorização. Compreender o
duos quando se trata de compreender a homofobia muito além funcionamento da homofobia, sobretudo quando é evidente
de qualquer sentimento de aversão individual de cunho psi- que o preconceito não só reside nos indivíduos, mas também
cológico. Aí, sem dúvida, podemos perceber a importância de se articula na cultura e nas instituições, é fundamental para
uma abordagem para o fenômeno da homofobia ao considerar aprimorar as formas de enfrentamento e desconstrução de
também que as instituições revelam-se espaços de produção, suas práticas violentas e silenciosas.
reprodução e atualização de todo um conjunto de disposições É ainda no campo do não nomeado e do não pensável que
(discursos, valores, práticas, etc.) por meio das quais a heteros- a homofobia, como mecanismo que é produto e produtor das
sexualidade é instituída e vivenciada como única possibilidade hierarquias sexuais (RUBIN, 1984), das violências e das na-
legítima de expressão sexual e de gênero (WARNER,1993). turalizações das normas de gênero (BUTLER, 2006), reside e
No Brasil, o livro de Daniel Borrillo vem sendo bastante se sustenta. Não nomeado porque sua descrição é de difícil
utilizado, mesmo sem uma tradução para o português até o apreensão e não pensável porque não refletida pelos sujeitos
momento, e ganhou importante espaço em debates entre gru- e pelas instituições.
pos de pesquisa e ativistas, exatamente pela sua atualidade ao Nossa compreensão é a de que o duplo aspecto da norma,
evidenciar as relações entre indivíduos e sociedade numa cum- discutido por Butler (2006) a partir de Foucault, evidencia o
plicidade silenciosa e perversa sobre as formas de inferiorização quanto a norma implica diretamente a formação e orientação

8 Homofobia 9
Prefácio a esta edição
das ações, mas também a normalização violenta que alimenta praticado por indivíduos, grupos e ideologias que pactuam em
a construção de coerções sociais com relação às posições se- algum nível um mundo do sensível que exclui e inclui! Exclui
xuadas. Dessa maneira, abriga aí a violência da normalização, porque o consentimento sempre pressupõe a exclusão de ou-
a qual cria o terreno do não pensável e do silêncio para a vio- tras sociabilidades. E inclui porque busca, através da política do
lência homofóbica, já que a esta corresponde certa coerência armário e do preconceito, integrar nas bases do consentimento
que se encontra implícita no cotidiano da cumplicidade entre a subalternização de alguns grupos e indivíduos.
indivíduos e instituições, como bem evidencia Borrillo neste Estamos, portanto, diante de um fenômeno pouco explo-
livro. Assim, as praticas homofóbicas se instituem como pré- rado no seu funcionamento e bastante complexo, exatamente
reflexivas, e trazer a tona esse mecanismo é urgente na socie- porque não se localiza num âmbito só, nem indivíduo nem
dade brasileira. sociedade. Ele se articula em torno de emoções, condutas,
A prática da violência homofóbica é, então, de difícil diag- normas e dispositivos ideológicos e institucionais, sendo ins-
nóstico nas sociedades atuais, o que neutraliza possibilidades trumento que cria e reproduz um sistema de diferenças para
de enfrentamentos. Aí reside outro aspecto importante da justificar a exclusão e a dominação de uns sobre os outros
obra de Borrillo, pois através da história e da categorização (PRADO;ARRUDA;TOLENTINO, 2009).
da homofobia como forma de violência e humilhação com Encarar a homofonia, nesta perspectiva, exige muito de
cumplicidade jurídica, científica, cultural e institucional, o todos nós. Um bom começo o leitor terá aqui no trabalho que,
autor nos ajuda a dar nomes no terreno do não pensável e apesar de recente, se tornou clássico. Através dele, o leitor terá
do não nomeado. Ou seja, é através do preconceito homo- recursos para nomear formas de preconceito até então resi-
fóbico como elemento de conservação cognitiva e social das dentes no terreno do impensável.
hierarquias invisibilizadas que se constrói e dinamiza o terre-
no do impensável. Portanto, se este não se revela como limite
da percepção e da cultura, mas sim como uma violência que
esconde a violência da não nomeação, elemento fundamental
na manutenção das hierarquias sociais pré-reflexivas, neces-
sário se torna o seu enfrentamento através da nomeação e da
reflexão de sua dinâmica de funcionamento.
Essa tarefa poderá ser encontrada com algumas pistas no
trabalho de Borrillo, o qual consegue, ao ir além da conceitu-
ação das fobias, descortinar ao leitor os muitos mecanismos
da homofobia nas sociedades ocidentais. Dessa forma, o au-
tor nos ajuda a pensar o preconceito como um paradoxo que
busca esconder outro paradoxo: a historicidade e a contin-
gência das relações sociais (PRADO;MACHADO,2008).
Assim, pensar a homofobia exige-nos compreender essas
práticas do preconceito não como meramente individuais, mas,
sobretudo, como consentimentos das práticas sociais, culturais
e econômicas que constituem uma ideologia homofóbica. A
homofobia pode ser pensada como um consentimento social

Prefácio a esta edição 11


10 Homofobia
Introdução
"'->

A homofobia é a atitude de hostilidade contra as/os ho-


mossexuais; portanto, homens ou mulheres. Segundo parece,
o termo foi utilizado pela primeira vez nos EUA, em 1971;
no entanto, ele apareceu nos dicionários de língua francesa
somente no final da década de 1990: para Le Nouveau Petit
Robert, "homofóbico" é aquele que experimenta aversão pelos
homossexuais;l por sua vez, em Le Petit Larousse, a "homo-
fobia" é a rejeição da homossexualidade, a hostilidade siste-
mática contra os homossexuais.2 Mesmo que seu componente
primordial seja, efetivamente, a rejeição irracional e, até mes-
mo, o ódio em relação a gays e lésbicas, a homofobia não pode
ser reduzida a esse aspecto.
Do mesmo modo que a xenofobia, o racismo ou o antis-
semitismo, a homofobia é uma manifestação arbitrária que
consiste em designar o outro como contrário, inferior ou
anormal; por sua diferença irredutível, ele é posicionado a
distância, fora do universo comum dos humanos. Crime abo-
minável, amor vergonhoso, gosto depravado, costume infame,
paixão ignominiosa, pecado contra a natureza, vício de Sodo-
ma - outras tantas designações que, durante vários séculos,
serviram para qualificar o desejo e as relações sexuais ou
afetivas entre pessoas do mesmo sexo. Confinado no papel
do marginal ou excêntrico, o homossexual é apontado pela

1 Em sua edição de 1993, ele inclui somente o termo "homofóbico'; mas não
"homofobiâ:
"Homo'; elemento de composição, antepositivo, deriva do grego homós, que signi-
fica "semelhantê; "igual"; a distinguir de seu homônimo "homo'; nominativo latino
de homo, hominis, ou seja, "o homem'; "o gênero humano'; "um homem': (N.T.).
2 Esses dois termos aparecem, pela primeira vez, na sua edição de 1998.
I-

13
norma social como bizarro, estranho ou extravagante. E no Por ser um atributo da personalidade, a homossexualidade
pressuposto de que o mal vem sempre de fora, na França, a deveria manter-se fora de qu~lquer intervenção institucional;
homossexualidade foi qualificada como "vício italiano" ou do mesmo modo que a cor da pele, a filiação religiosa ou a
"vício grego", ou ainda "costume árabe" ou "colonial". À se- origem étnica, ela deve ser considerada um dado não perti-
melhança do negro, do judeu ou de qualquer estrangeiro, nente na construção política do cidadão e na qualificação do
o homossexual é sempre o outro, o diferente, aquele com sujeito de direitos.
quem é impensável qualquer identificação. Ora, de fato, se o exercício de uma prerrogativa ou a frui-
A recente preocupação com a hostilidade contra gays e ção de um direito deixaram de estar subordinados à filiação
as lésbicas modifica a maneira como a questão havia sido real ou suposta, a uma raça, a um ou ao outro sexo, a uma
problematizada até aqui: em vez de se dedicar ao estudo do religião, a uma opinião pública ou a uma classe social, em
comportamento homossexual, tratado no passado como des- compensação, a homossexualidade permanece um obstáculo
viante, a atenção fixa-se, daqui em diante, nas razões que le- à plena realização dos direitos. No âmago desse tratamento
varam a atribuir tal qualificativo a essa forma de sexualidade. discriminatório, a homofobia desempenha um papel impor-
De modo que o deslocamento do objeto de análise para a ho- tante na medida em que ela é uma forma de inferiorização,
mofobia produz uma mudança tanto epistemológica quanto consequência direta da hierarquização das sexualidades, além
política: epistemológica porque se trata não tanto de conhe- de conferir um status superior à heterossexualidade, situan-
cer ou compreender a origem e o funcionamento da homos- do-a no plano do natural, do que é evidente.
sexualidade, mas de analisar a hostilidade desencadeada por Enquanto a heterossexualidade é definida pelos dicioná-
essa forma específica de orientação sexual; e política porque rios (Le Grand Robert, 1992; Le Petit Robert, 1996) como a
deixa de ser a questão homossexual (afinal de contas, banal "sexualidade (considerada como normal) do heterossexual" e
do ponto de vista institucional),3 mas precisamente a questão este como aquele "que experimenta uma atração sexual (con-
homofóbica que, a partir de agora, merece uma problemati- siderada como normal) pelos indivíduos do sexo oposto", por
zação específica. sua vez, a homossexualidade está desprovida de tal norma-
Independentemente de tratar-se de uma escolha de vida lidade. Nos dicionários de sinônimos, nem há registro da
sexual ou de uma questão de característica estrutural do de-
palavra "heterossexualidade"; em compensação, termos tais
sejo erótico por pessoas do mesmo sexo, a homossexualidade
como androgamia, androfilia, homofilia, inversão, pederastia,
deve ser considerada, de agora em diante, como uma forma
pedofilia, soeratismo, uranismo, androfobia, lesbianismo, safis-
de sexualidade tão legítima quanto a heterossexualidade. Na
mo e tribadismo são propostos como equivalentes ao de "ho-
realidade, ela é apenas a simples manifestação do pluralis- mossexualidade': E se Le Petit Robert considera que um hete-
mo sexual, uma variante constante e regular da sexualidade
rossexual é simplesmente o oposto de um homossexual, este
humana. Enquanto atos consentidos entre adultos, os com-
é designado por uma profusão de vocábulos4: gay, homófilo,
portamentos homoeróticos são protegidos - pelo menos, na
pederasta, veado, salsinha, michê, boiola, bicha louca, tia, san-
França - como qualquer outra manifestação da vida privada.
dalinha, invertido, sodomita, travesti, lésbica, maria homem,
homaça, hermafrodita, baitola, gilete, sapatão, bissexual. Essa
3 A banalização institucional implica que os grandes aparelhos do poder norma-
lizador - tais como a religião, o direito, a medicina ou a psicanálise - renunciem
a abordar a questão homossexual; deste modo, os gays e as lésbicas têm a pos- 4 Vocábulos citados no original: gay, homophile, pédéraste, enculé, folle, homo,
sibilidade de criar, individualmente, sua própria identidade e de negociar suas lope, lopette, pédale, pédé, tante, tapette, inverti, sodomite, travesti, travelo, les-
contribuições a uma cultura específica. bienne, gomorrhéenne, tribade, gouine, bi, à voile et à vapeur. (N.T.).

Introdução 15
14 Homofobia
desproporção no plano da linguagem revela uma operação ele é objeto da atenção dos médicos e deve submeter-se às
ideológica que consiste em nomear, superabundantemente, terapias que lhe são impostas pela ciência, em particular, os
aquilo que aparece como problemático e deixar implícito o eletrochoques utilizados no Ocidente até a década de 1960.
que, supostamente, é evidente e natural. Se algumas formas mais sutis de homofobia exibem certa to-
A diferença homo/hétero não é só constatada, mas serve, lerância em relação a lésbicas e gays, essa atitude ocorre me-
sobretudo, para ordenar um regime das sexualidades em que diante a condição de atribuir-Ihes uma posição marginal e
os comportamentos heterossexuais são os únicos que mere- silenciosa, ou seja, a de uma sexualidade considerada como
cem a qualificação de modelo social e de referência para qual- inacabada ou secundária. Aceita na esfera Íntima da vida pri-
quer outra sexualidade. Assim, nessa ordem sexual, o sexo vada, a homossexualidade torna-se insuportável ao reivindi-
biológico (macho/fêmea) determina um desejo sexual unÍvo- car, publicamente, sua equivalência à heterossexualidade.
co (hétero), assim como um comportamento social especí- A homofobia é o medo de que a valorização dessa iden-
fico (masculino/feminino). Sexismo e homofonia aparecem, tidade seja reconhecida; ela se manifesta, entre outros as-
portanto, como componentes necessários do regime binário pectos, pela angústia de ver desaparecer a fronteira e a hie-
das sexualidades. A divisão dos gêneros e o desejo (hétero) rarquia da ordem heterossexual. Ela se exprime, na vida
sexual funcionam, de preferência, como um dispositivo de re- cotidiana, por injúrias e por insultos, mas aparece também
produção da ordem social, e não como um dispositivo de re- nos textos de professores e de especialistas ou no decorrer
produção biológica da espécie. A homofobia torna-se, assim, de debates públicos. A homofobia é algo familiar e, ainda,
a guardiã das fronteiras tanto sexuais (hétero/homo), quanto consensual, sendo percebida como um fenômeno banal:
de gênero (masculino/feminino). Eis por que os homosse- quantos pais ficam inquietos ao descobrir a homofobia de
xuais deixaram de ser as únicas vítimas da violência homo- um(a) filho(a) adolescente, ao passo que, simultaneamente,
fóbica, que acaba visando, igualmente, todos aqueles que não a homossexualidade de um(a) filho(a) continua sendo fonte
aderem à ordem clássica dos gêneros: travestis, transexuais, de sofrimento para as famílias, levando-as, quase sempre, a
bissexuais, mulheres heterossexuais dotadas de forte persona- consultar um psicanalista?
lidade, homens heterossexuais delicados ou que manifestam Invisível, cotidiana, compartilhada, a homofobia participa
grande sensibilidade ... do senso comum, embora venha a culminar, igualmente, em
A homofobia é um fenômeno complexo e variado que uma verdadeira alienação dos heterossexuais. Por essas ra-
pode ser percebido nas piadas vulgares que ridicularizam o zões é que se torna indispensável questioná-Ia no que diz res-
indivíduo efeminado, mas ela pode também assumir formas peito tanto às atitudes e aos comportamentos quanto a suas
mais brutais, chegando até a vontade de extermínio, como foi construções ideológicas. O que é a homofobia? Quais são suas
o caso na Alemanha Nazista. À semelhança de qualquer for- relações com as outras formas de estigmatização? Quais são
ma de exclusão, a homofobia não se limita a constatar uma suas origens? De que modo e a partir de quais discursos fo-
diferença: ela a interpreta e tira suas conclusões materiais. ram construí das a supremacia heterossexual e a desvaloriza-
Assim, se o homossexual é culpado do pecado, sua condena- ção correlata da homossexualidade? Como definir a persona-
ção moral aparece como necessária; portanto, a consequência lidade homofóbica? Quais são os recursos à nossa disposição
lógica vai exigir sua "purificação pelo fogo inquisitorial': Se para lutar contra essa forma de violência? No decorrer dos
ele é aparentado ao criminoso, então, seu lugar natural é, na quatro capítulos deste livro, vamos tentar responder a essas
melhor das hipóteses, o ostracismo e, na pior, a pena capital, questões, e nossa conclusão é apresentada sob a forma de pro-
como ainda ocorre em alguns países. Considerado doente, posição de ação.

16 Homofobia Introdução 17
Começaremos nosso estudo pela análise das definições problematização se elabora atualmente. As citações históri-
possíveis e dos problemas terminológicos encontrados quan- cas, assim como as referências teóricas do discurso homofó-
do se trata de circunscrever o fenômeno homofóbico. Além bico, são necessariamente incompletas e suscetíveis de serem
disso, para compreender melhor o alcance da questão e de aprofundadas. A hostilidade contra todas as formas de "trans-
suas principais implicações, vamos colocá-Ia sob a perspecti- gressões sexuais" e, em particular, contra a homossexualida-
va de outras formas de exclusão, tais como o racismo, o antis- de, é tão antiga quanto a civilização judaico-cristã; o simples
semitismo, o sexismo ou a xenofobia. recenseamento de tais manifestações exigiria vários volumes.
Em um segundo momento, vamos dedicar-nos ao estudo das Os exemplos pontuais extraídos da História têm a única fina-
origens do ódio homofóbico. A relativa tolerância que o mundo lidade de ilustrar uma demonstração teórica, sem qualquer
pagão havia reservado às relações homossexuais contrasta, con- pretensão de ser um estudo exaustivo. Em vez de pesquisa
sideravelmente, com a hostilidade do cristianismo triunfante. sociológica, análise psicológica ou ensaio jurídico, esta obra
A condenação da sodomia na tradição judaico-cristã - pedra apresenta o balanço atual sobre a questão da homofobia.
angular do sistema repressivo - aparece como o elemento pre-
cursor fundamental das diferentes formas de homofobia.
Analisaremos, em seguida, a ideologia heterossexista vei-
culada pelas principais doutrinas que substituem a noção de
"vício sodomítico" pela noção de "perversão sexual" e que,
daí em diante, consideram a homossexualidade como um
"acidente na evolução afetiva", uma "regressão da cultura
amorosà: uma "simples escolha de vida privadà: um "vício
burguês" ou um "perigo para a raçà: Já não será em nome da
ordem natural, nem em nome da religião que gays e lésbicas
serão objeto das perseguições, mas em nome da psiquiatria,
da antropologia, da consciência de classe e/ou da higiene do
3° Reich, que, ao substituir a teologia, hão de reatualizar, com
eficácia, o ódio homofóbico.
A dupla dimensão da questão, rejeição irracional (afetiva),
por um lado, e, por outro, construção ideológica (cognitiva),
obriga-nos a considerá-Ia no plano individual e no social.
Assim, as predisposições psicológicas da personalidade ho-
mofóbica e os elementos do meio circundante heterossexista
serão objeto da quarta parte deste livro.
Por último, à guisa de conclusão, vamos nos interessar
pelas estratégias institucionais, preventivas e/ou repressoras,
suscetíveis de lutar contra essa forma específica de hostilidade
e de exclusão.
A única pretensão deste livro consiste em fornecer alguns
elementos de reflexão a propósito de um fenômeno cuja
)-,

18 Homofobia Introdução 19
Capítulo 1

Definições e questões terminológicas

"'-'

Foi apenas em 1998 que o termo "homofobià' apareceu,


pela primeira vez, em um dicionário de língua francesa; dez
anos antes, ele era ainda ignorado, até mesmo pelos léxicos
especializados.5 Segundo parece, a invenção da palavra per-
tence a K. T. Smith que, em um artigo publicado em 1971,
tentava analisar os traços da personalidade homofóbica; um
ano depois, G. Weinberg definirá a homofobia como "o receio
de estar com um homossexual em um espaço fechado e, rela-
tivamente aos próprios homossexuais, o ódio por si mesmo".6
Ao apresentar sempre essa hostilidade contra os homosse-
xuais, exclusivamente sob sua dimensão fóbica, diferentes
especialistas sugeriram, no mesmo período, outros termos:

5 Em seu Vocabulaire de l'homosexualité masculine, C. Courouve (1985) passa do


termo "homofilia" para o vocábulo "homossexualidade".
Em 1994, em compensação, o Dictionnaire Gay, de L. Povert, dedica um
longo artigo à homofobia. O autor cita G. Weinberg, para quem a homo-
fobia tem as seguintes origens: "a) O medo de que a própria pessoa seja
homossexual. Ao reprimir determinados desejos que estão em si, o heteros-
sexual, para realizar esse recalcamento, ergue a barreira da aversão, do pu-
dor e da moralidade contra esses desejos reprimidos e acaba por traduzi-Ios
em rejeição do homossexual. b) A religião e a moral judaico-cristã daí re-
sultante acarretam um preconceito [préjugé/pré-juízo] desfavorável contra
todas as formas de prazeres não associadas à reprodução [... ]. c) O desejo
reprimido. O heterossexual detesta o homossexual porque, à semelhança do
judeu ou do magrebino, atribui-lhe determinados aspectos que ele não tem:
no caso concreto, a possibilidade mais ou menos fantasmática de ter acesso,
com grande faCilidade, a numerosos parceiros ..:'.
6 Eis a definição de homofobia, segundo G. Weinberg (1972): "The dread ofbeing
in dose quarters with homosexuals and in the case of homosexuals themselves,
self loathing."

21
"homoerotofobià' (CHURCHILL, 1967), "homossexofobià' imigração, na França, são muito significativos, no sentido em
(LEVIT; KLASSEN, 1974), "homossexismo" (LEHNE, 1976) e que a questão da igualdade foi cuidadosamente esquivada).
"heterossexismo" (MORIN; GARFINKLE,1978). A partir da crítica do termo "homofobià' - adotado por
As primeiras críticas provêm de J. Boswell (1985), ao ob- razões de ordem prática8 -, tentaremos extrair uma definição
servar que o termo "homofobià' significaria, de preferência, mais adequada da hostilidade contra as lésbicas e os gays no
"receio do semelhante'; em vez de "receio do homossexual': contexto da França contemporânea.
Por essa razão, esse historiador prefere retomar a palavra "ho- A ideologia que preconiza a superioridade da raça branca
mossexofobià; na medida em que este termo parece-lhe mais é designada sob o termo "racismo"; a que promove a superio-
adequado do ponto de vista etimológico, apesar de seu caráter ridade de um gênero em relação ao outro se chama "sexismo':
híbrido. Todavia, essa denominação continua sendo insatisfa- O antissemitismo designa a opinião que justifica a inferiori-
tória por referir-se exclusivamente à atitude extrema de apreen- zação dos judeus, enquanto a xenofobia refere-se à antipatia
são psicológica (fobia), ocultando outras formas de hostilidade diante dos estrangeiros. Portanto, em função do sexo, da cor
menos irracionais. Ora, se existem reações virulentas contra os da pele, da filiação religiosa ou da origem étnica é que se ins-
gays e as lésbicas, a homofobia cotidiana assume, sobretudo, a taura, tradicionalmente, um dispositivo intelectual e político
forma de uma violência do tipo simbólico (BOURDIEU, 1998), de discriminação. O sistema a partir do qual uma sociedade
que, na maior parte das vezes, não é percebida por suas víti- organiza um tratamento segregacionista segundo a orienta-
mas. Nesse sentido, e a fim de circunscrever melhor a ques- ção sexual9 pode ser designado sob o termo geral de "heteros-
tão, Hudson e Ricketts (1980) propuseram a distinção entre sexismo': Esse sistema e a homofobia - compreendida como
homofobia e homonegatividade: esta última refere-se não só a consequência psicológica de uma representação social que,
ao caráter de aversão e de ansiedade peculiares à homofobia pelo fato de outorgar o monopólio da normalidade à heteros-
no sentido clássico do termo, mas também e sobretudo ao con- sexualidade, fomenta o desdém em relação àquelas e àqueles
que se afastam do modelo de referência - constituem as duas
junto das atitudes cognitivas de cunho negativo para com a
homossexualidade nos planos social, moral, jurídico e/ou an- faces da mesma intolerância e, por conseguinte, merecem ser
denunciados com o mesmo vigor utilizado contra o racisrpo
tropológico. O termo "homofobià' designa, assim, dois aspec-
ou o antissemitismo.
tos diferentes da mesma realidade: a dimensão pessoal, de na-
tureza afetiva, que se manifesta pela rejeição dos homossexuais;
e a dimensão cultural, de natureza cognitiva, em que o objeto 8 Para exprimir a complexidade do fenômeno, de maneira mais satisfatória, de-
da rejeição não é o homossexual enquanto indivíduo, mas a veríamos utilizar, em vez de homofobia específica, os seguintes termos: "gayfo-

homossexualidade como fenômeno psicológico e social. Essa bia'; para a homofobia em relação aos homossexuais masculinos; "lesbofobia",
no caso de mulheres homossexuais, vítimas do menosprezo em decorrência de
distinção permite compreender melhor uma situação bastante
sua orientação sexual; "bifobia", ao se tratar de bissexuais; ou, ainda, "travesti-
disseminada nas sociedades modernas que consiste em tolerar fobia" ou "transfobia'; em relação aos travestis ou aos transexuais que sofrem
e, até mesmo, em simpatizar com os membros do grupo estig- tal hostilidade. Por razões de economia de linguagem, adotamos "homofobia"
matizado; no entanto, considera inaceitável qualquer política para o conjunto desses fenômenos.
de igualdade a seu respeito (os debates sobre o PaCS7 e sobre a 9 A orientação sexual é uma componente da sexualidade enquanto conjunto
de comportamentos relacionados com a pulsão sexual e com sua concretiza-
ção. Se a atração sexual é dirigida para pessoas do mesmo sexo, designamos
7 Para obter mais esclarecimentos sobre o debate em torno do PaCS [Pacte civil de tal orientação por "homossexualidade"; se ela se inclina para o sexo oposto,
solidarité/Pacto Civil de Solidariedade - regulariza, na França, a união entre pessoas trata-se de "heterossexualidade"; e, ainda, de "bissexualidade'; se o sexo do
do mesmo sexo], conferir Borrillo, Fassin e Iacub (1999). parceiro é indiferente.

22 Homofobia
Definições e questões terminológicas 23
Homofobia irracional e homofobia cognitiva escárnio. A injúria constitui a injunção da homofobia afetiva
com a cognitiva na medida em que, de acordo com a observa-
Uma primeira forma de violência contra gays e lésbicas
ção de D. Éribon (I999a, p. 29),
caracteriza-se por sentimento de medo, aversão e repulsa.
Trata-se de uma verdadeira manifestação emotiva, do tipo fó- [...] as expressões "veado nojento" ("sapatão sem vergonhà')lo
bico, comparável à apreensão que pode ser experimentada em estão longe de ser simples palavras lançadas ao vento, mas
espaços fechados (claustrofobia) ou diante de certos animais agressões verbais que deixam marcas na consciência, trau-
mas que se inscrevem na memória e no corpo (de fato, a
(zoofobia). Esse teria sido o sentido original do termo "ho- timidez, o constrangimento e a vergonha são atitudes cor-
mofobiá' que, no entanto, se revelou bem depressa como ex- porais resultantes da hostilidade do mundo exterior). E uma
tremam ente limitado, abrangendo de forma bastante parcial das consequências da injúria consiste em modelar a relação
a amplitude do fenômeno. Com efeito, essa forma brutal de com os outros e com o mundo; portanto, em modelar a per-
sonalidade, a subjetividade e o próprio ser de um indivíduo.
violência corresponde unicamente a uma atitude irracional
que encontra suas origens em conflitos individuais. A violência em estado puro - destilada pela homofobia
Outras manifestações menos grosseiras, sem deixarem psicológica - nada é além da integração paradigmática de
de ser menos insidiosas, exercem suas violências cotidiana- uma atitude anti-homossexual que, aliás, permeia a história
mente. Essa outra forma de homofobia, mais eufemística e de de nossas sociedades. O medo, às vezes pueril, suscitado ain-
cunho social, enraíza -se na atitude de desdém constitutiva de da pela homossexualidade resulta da produção cultural do
um modo habitual de apreender e de categorizar o outro. Se Ocidente judaico-cristão. Dos textos sagrados às leis laicas,
a homofobia afetiva (psicológica) caracteriza-se pela conde- passando pela literatura científica e pelo cinema, a campanha
nação da homossexualidade, a homofobia cognitiva (social) de promoção da heterossexualidade não hesita em proferir
pretende simplesmente perpetuar a diferença homo/hétero; o anátema não só contra a homossexualidade, mas também
neste aspecto, ela preconiza a tolerância, forma civilizada da contra qualquer manifestação de afeto entre pessoas do mesmo
clemência dos ortodoxos em relação com os heréticos. Neste sexo. Assim, a homofobia cognitiva serve de fundamento a um
último registro, ninguém rejeita os homossexuais; entretanto, saber sobre o homossexual e a homossexualidade baseado em
ninguém fica chocado pelo fato de que eles não usufruam dos um preconceitoll que os reduz a um clichê.
mesmos direitos reconhecidos aos heterossexuais. Como é
ironicamente descrito por Fassin (1999): Homofobia geral e homofobia específica

No mundo social, toda a gente gosta dos homossexuais em Considerando a complexidade do fenômeno, se essa pri-
geral - inclusive, muitas pessoas têm amigos homossexuais meira distinção entre homofobia psicológica (individual)
em particular. Entretanto, ninguém iria ao ponto de defen- e homofobia cognitiva (social) é indispensável, ela é insufi-
der a igualdade das sexualidades, proposição radical que es- ciente. Outras classificações são necessárias para circunscre-
barra no senso comum: mesmo que nada exista de anormal ver melhor o mosaico de situações que, sob o mesmo termo,
na homossexualidade, cada um de nós sabe que o casamento
ou a filiação reconhecidos aos casais do mesmo sexo não se- agrupa diversas formas de antipatia contra gays e lésbicas.
riam considerados uma situação normal.
10 No original, "sale pédé" ("sale gouine"); "pédé" é a abreviatura, em francês, de
Presente nos insultos, nas piadas, nas representações cari- "pédéraste". (N.T.).
caturais, assim como na linguagem corrente, a homofobia des- II No original, "préjugé" [em castelhano: "prejuicio"; em italiano: "pregiudizio"; e
creve os gays e as lésbicas como criaturas grotescas, objetos de em inglês "prejudice"], literalmente: "pré-juízÔ'. (N.T.).

24 Homofobia 25
Definições e questões terminológicas
Como já descrevemos, a homofobia mostra hostilidade não implacável, fixa o indivíduo seja à masculinidade, seja à femini-
só contra os homossexuais, mas igualmente contra o conjunto lidade. E quando se profere o insulto "veado!" ["pédé!"], denun-
de indivíduos considerados como não conformes à norma cia-se quase sempre um não respeito pelos atributos masculinos
sexual. Em função da amplitude do termo, é possível estabe- "naturais" sem que exista uma referência particular à verda-
lecer uma primeira distinção entre homofobia geral e homo- deira orientação sexual da pessoa. Ou quando se trata alguém
fobia específica. como homossexual (homem ou mulher), denuncia-se sua
O sociólogo D. Welzer-Lang foi o primeiro que, na França, condição de traidor(a) e desertor(a) do gênero ao qual ele ou
ampliou a noção de homofobia a discursos e comportamentos ela pertence "naturalmente':
que, superando a mera apreensão em relação a gays ou lésbi- Ao contrário da homofobia geral, a homofobia específica
cas, articulam uma forma geral de hostilidade contra atitudes constitui uma forma de intolerância que se refere, especial-
opostas aos papéis sociossexuais pré-estabelecidos. Para esse mente, aos gays e às lésbicas. Alguns autores propuseram a dis-
autor, a homofobia geral nada é além de uma manifestação do tinção entre "gayfobia" e "lesbofobià' - noções que designam
sexismo, ou seja, da discriminação de pessoas em razão de seu declinações possíveis dessa homofobia específica. As represen-
sexo (macho/fêmea) e, mais particularmente, de seu gênero tações de cada um dos sexos, assim como as funções que lhes
(feminino/masculino). Essa forma de homofobia é definida são inerentes, merecem efetivamente uma terminologia pecu-
como "a discriminação contra as pessoas que mostram, ou às liar. A lesbofobia12 constitui uma especificidade no âmago de
quais são atribuídas, determinadas qualidades (ou defeitos) outra: com efeito, a lésbica é vítima de uma violência particular,
imputadas ao outro gênero': Assim, nas sociedades profun- definida pelo duplo desdém que tem a ver com o fato de ser
damente marcadas pela dominação masculina, a homofobia mulher e homossexual. Diferentemente do gay,ela acumula as
organiza uma espécie de "vigilância do gênero': porque a viri- discriminações contra o gênero e contra a sexualidade.
lidade deve estruturar-se em função de dois aspectos: negação Na opinião de F. Guillemaut (1994, p. 225), o que ca-
do feminino e rejeição da homossexualidade. De acordo com racteriza as lésbicas nas relações sociais baseadas no gê-
Welzer-Lang (1994, p. 20; ver também KOPELMAN, 1994), nero é o seguinte fato: em razão de sua feminilidade, elas
são invisíveis e silenciosas. A historieta atribuída à rainha
[...] a homofobiano masculino é a estigmatização[...] por Vitória, no momento da atualização, no século XIX, das
designação,repulsaou violência,das relaçõessensíveis- se-
xuaisou não - entre homens,particularmente,quando estes penas contra as relações sexuais entre homens é bastan-
são apontadoscomohomossexuaisou se afirmamcomotais. te eloquente. Tendo sido interrogada sobre a impunidade
A homofobia é, igualmente,a estigmatizaçãoou a negação das relações sexuais entre mulheres, a rainha respondeu:
das relaçõesentre mulheres que não correspondem a uma "Como punir algo que não existe?". Do mesmo modo, em
definiçãotradicionalda feminilidade.
sua obra Psychopathia sexualis, R. von Krafft-Ebing (1886)
É assim que a homofobia geral permite denunciar os des- observa que "todas as informações suscetíveis de serem
vios e deslizes do masculino em direção ao feminino e vice- obtidas na literatura especializada demonstram claramen-
versa, de tal modo que se opera uma reatualização constante te que, em relação às mulheres, trata-se raramente de uma
nos indivíduos ao lembrar-Ihes sua filiação ao "gênero corre- autêntica homossexualidade, mas sobretudo de uma pseu-
to': Segundo parece, qualquer suspeita de homossexualidade do-homossexualidade"; de qualquer modo, no pressupos-
é sentida como uma traição suscetível de questionar a identi- to de que ela venha a ser confirmada "a homossexualidade
dade mais profunda do ser. Desde o berço, as cores azul e rosa
marcam os territórios dessa summa divisio que, de maneira 12 A gayfobia é abordada, mais adiante, no primeiro título do Capítulo IV.

26 Homofobia
Definições e questões terminológicas 27
da mulher não tem as graves consequências da homosse- de uma misoginia que, ao transformar a sexualidade femini-
xualidade do homem': 13 O fato de tornar essa sexualidade na em um instrumento do desejo masculino, torna impensá-
invisível parece estar, portanto, no âmago da violência homo- veis as relações erótico-afetivas entre mulheres. A iconografia
fóbica em relação às mulheres. Se é mais difícil "detectar" a pornográfica heterossexual ilustra perfeitamente essa realida-
homossexualidade feminina, assinala H. Ellis (1895), é pre- de: os jogos sexuais entre mulheres são sistematicamente repre-
cisamente porque "estamos habituados ao fato de que a in- sentados para excitar o homem, e, mesmo que elas deem a im-
timidade é maior entre mulheres que entre homens; ora, tal pressão de ter prazer, o desfecho do espetáculo sexual é sempre
constatação impede-nos de suspeitar da existência de uma protagonizado pela penetração e pela ejaculação do homem.
paixão anormal entre elas': Alguns anos depois, ao analisar O menosprezo dos homens pela sexualidade feminina - in-
a homossexualidade, S. Freud refere-se quase exclusivamente cluindo a da lésbica, considerada como inofensiva - trans-
aos homens; o pai da psicanálise dedica um único estudo à forma-se em violência quando as mulheres contestam o sta-
homossexualidade feminina (1920) e, diferentemente do que tus atribuído a seu sexo, ou seja, quando elas rejeitam ser
ocorre com os outros analisandos, ele não chega a adotar um esposas e mães. A obra organizada por Ch. Bard (1999), Um
pseudônimo para a paciente.14 século de antijeminismo, dá testemunho do ódio contra as
Se as lésbicas foram, visivelmente, menos perseguidas que lutas libertadoras das mulheres: se rejeitam a maternidade,
os gays, tal constatação não deve ser interpretada, de modo as mulheres tornam-se um perigo para si mesmas e para a
algum, como indício de uma maior tolerância a seu respeito; sociedade porque, ao assumirem uma atitude viril, elas co-
pelo contrário, essa indiferença nada mais é do que o sinal de locam sob ameaça não só sua identidade, mas, sobretudo, o
uma atitude que manifesta um desdém muito maior, reflexo equilíbrio demo gráfico.
No momento em que as reivindicações feministas come-
13 As instâncias judiciais europeias compartilhavam o ponto de vista do psiquia- çaram a surgir, os médicos reagiram vigorosamente ao con-
tra do século XIX. Com efeito, na petição apresentada à Comissão Europeia dos siderar essas mulheres emancipadas como depravadas "que
Direitos Humanos, em 1975, por um cidadão alemão que havia sido condenado preferem o laboratório ao quarto dos filhos". Ao abandonar
por sodomia, o pleiteante evocava uma violação do princípio de igualdade entre
sua função social, essas mulheres constituíam, "do ponto de
os sexos; de fato, tratando-se de uma mulher homossexual, não havia punição
vista moral e físico, uma geração de pervertidas que, além de
para as relações com um individuo do mesmo sexo. O tribunal respondeu que "a
existência de um perigo social específico a propósito da homossexualidade mas- tudo, produzem filhos efeminados e filhas viris" (HOWARD,
culina [...] pelo fato de que os homossexuais masculinos constituem, frequente- 1900, p. 687); e se rejeitam os papéis de esposa e mãe que lhes
mente, um grupo sociocultural distinto que se empenha em um nítido proseli- são atribuídos, é precisamente por detestarem os homens.
tismo em relação aos adolescentes, que, desse modo, correm um sério risco de
Como sublinha Ch. Bard (1999, p. 28)
isolamento social [...], a questão dos atos homossexuais entre mulheres nunca foi
considerada como suscetível de criar para os jovens um dos inconvenientes seme- [...] ao desafiarem, por sua simples existência, a norma de um
lhantes àqueles que são desencadeados pela homossexualidade masculinà: Por sexo destinado "por naturezà' ao casamento e à maternidade,
essa razão é que a Comissão tirou a conclusão segundo a qual, nesse caso concreto, as lésbicas são associadas espontaneamente aos/às feministas
não existe discriminação (Petição n° 5935/72, de 30 de setembro de 1975). que contestam a rigidez exclusiva de tais "destinos': Antifemi-
14 "Essa omissão é impressionante, sublinham N. O'Connor e J. Ryan: ... deixar de nismo e lesbofobia se nutrem, portanto, reciprocamente; neste
atribuir um nome a alguém é, de algum modo, recusar-lhe o estatuto de sujeito. caso, a lesbofobia é um recurso eficaz para descrever um femi-
nismo "contra a naturezà' e "imoral':
Como efeito, esse procedimento cria um distanciamento, uma despersonaliza-
ção e uma reificação, além de representar provavelmente o primeiro indício da
dificuldade onipresente entre os psicanalistas para abordar a questão do lesbia-
Eis como a caricatura antifeminista transformou a mu-
nismo" (1993, p. 30, apud PEERS; DEMCZUK in DEMCZUK, 1998, p. 85). lher autônoma em uma lésbica e a própria lésbica em uma

28 Homofobia 29
Definições e questões termino lógicas
personagem invisível, discreta, simples vítima de um senti- A heterossexualidade aparece, assim, como o padrão para
mento necessariamente passageiro e suscetível de "reparação" avaliartodas as outras sexualidades. Essa qualidade normativa -
pela intervenção salutar de um homem "de verdade': e o ideal que ela encarna - é constitutiva de uma forma específica

Homofobia, sexismo e heterossexismo j de dominação, chamada heterossexismo, que se define como a


crença na existência de uma hierarquia das sexualidades, em
A homofobia é inconcebível sem que seja levada em con- que a heterossexualidade ocupa a posição superior. Todas as
sideração a ordem sexual a partir da qual são organizadas as outras formas de sexualidade são consideradas, na melhor das
relações sociais entre os sexos e as sexualidades. A origem da hipóteses, incompletas, acidentais e perversas; e, na pior, pato-
justificativa social dos papéis atribuídos ao homem e à mulher lógicas, criminosas, imorais e destruidoras da civilização.
encontra-se na naturalização da diferença entre os dois sexos: Outra faceta do heterossexismo - mais moderna em sua
a ordem (chamada "natural") dos sexos determina uma ordem retórica, sem deixar de ser violenta em suas deduções - carac-
social em que o feminino deve ser complementar do masculino teriza-se pela interpretação da diferença entre heterossexua-
pelo viés de sua subordinação psicológica e cultural. O sexismo lidade e homossexualidade. Nesta lógica, o tratamento dife-
define-se, desde então, como a ideologia organizadora das rela- renciado de situações distintas não constitui, de modo algum,
ções entre os sexos, no âmago da qual o masculino caracteriza- uma discriminação injustificada. Com efeito, não é em nome
se por sua vinculação ao universo exterior e político, enquanto de uma hierarquia ou de uma normatividade (consideradas
o feminino reenvia à intimidade e a tudo o que se refere à vida pelos setores liberais como valores negativos), mas em vir-
doméstica. A dominação masculina identifica-se com essa for- tude da proteção da diversidade (vivenciada, em compensa-
ma específica de violência simbólica que se exerce, de manei- ção, como uma atitude positiva) que se verifica a oposição à
ra sutil e invisível,precisamente porque ela é apresentada pelo supressão das fronteiras jurídicas entre as sexualidades. Do
dominador e aceita pelo dominado como natural, inevitável e mesmo modo que em relação às novas formas de racismo
necessária. O sexismo caracteriza-se por uma constante obje- (TAGUIEFF,1990; 1997), o heterossexismo diferencialista pa-
tificação da mulher. Como sublinha P.Bourdieu (1998, p. 73) rece descartar o princípio da superioridade heterossexual em
benefício do princípio da diversidade de sexualidades. Em ra-
[As mulheres] existem, em primeiro lugar, pelo e para o olhar
dos outros, ou seja, enquanto objetos acolhedores, atraentes
zão da diferença, e não de qualquer vontade normalizadora, é
e disponíveis. Espera-se que elas sejam "femininas'; ou seja, que foi possível justificar um tratamento diferenciado de gays
sorridentes, simpáticas, atenciosas, submissas, discretas, re- e lésbicas, privando-os, em particular, do direito ao casamen-
servadas e, até mesmo, invisíveis. E a pretensa "feminilidade" to, à adoção ou às técnicas de reprodução assistida.15
não passa, na maior parte das vezes, de uma forma de com-
placência em relação às expectativas masculinas, reais ou su-
postas, particularmente em matéria de ampliação do ego. Por 15 Como especialista do governo francês, Irene Théry problematizou a "dife-
conseguinte, a relação de dependência para com os outros (e rença homossexual" a fim de justificar um tratamento discriminatório de
não só dos homens) tende a tornar-se constitutivo de seu ser. acesso à igualdade dos direitos para os gays e as lésbicas. Para esta socióloga,
a heterossexualidade é a base do casamento e da família porque o casamento
Essa ordem sexual, ou seja, o sexismo, implica tanto a seria "a instituição que articula a diferença dos sexos e a diferença das gera-
subordinação do feminino ao masculino quanto a hierarqui- ções" e, de acordo com a autora, a diferença dos sexos é a própria heterosse-
xualidade: ''A instituição jurídica da diferença resume-se a este aspecto, cuja
zação das sexualidades, fundamento da homofobia; por con- imensidade ainda não foi avaliada em sua totalidade: reconhecer a finitude
seguinte, a evocação constante da superioridade biológica e de cada sexo, que tem necessidade do outro para que a humanidade se man-
moral dos comportamentos heterossexuais faz parte de uma tenha viva e se reproduzá' (THÉRY, 1997, p. 80; o mesmo texto é publica-
estratégia política de construção da normalidade sexual. do como Note de Ia Fondation Saint-Simon*, n° 9, 1997). Ver, também, o

30 Homofobia Definições e questões terminológicas 31


Em nome dessa pretensa pluralidade das sexualidades e a o apartheid sul-africano evoluiu para o segregacionismo ao
fim de preservar a diferença de sexos e de gêneros, o discurso criar, em 1983, urna assembleia parlamentar para cada etnia.
diferencialista atualiza a ordem heterossexista e, ao mesmo tem- A França de Vichy16 invocou e teorizou, também, a diferença
po, denuncia as mais brutais manifestações homofóbicas. Ora, o para justificar a segregação de pessoas ao instaurar, por meio
heterossexismo diferencialista é, também, urna forma de homo- da lei de 3 de outubro de 1940, o "Estatuto dos Judeus".l?
fobia - certamente mais sutil, mas não menos eficaz -, porque, Todos esses mecanismos de sujeição dos indivíduos, mo-
ao rejeitar a discriminação de homossexuais, tem corno coro- delando a maneira de pensar sobre si mesmo, estão na ori-
lário urna forma eufemística de segregacionismo. Em nome gem das formas modernas de dominação (FoucAuLT, 1976).
da diferença, a derrogação parcial do princípio de igualdade O pensamento diferencialista aparece, assim, corno o subs-
e a criação de um regime de exceção para gays e lésbicas fo- trato ideológico de certa maneira de produzir sujeitos cuja
identidade sexuada e sexual articula-se em torno das cate-
ram propostas, na França, tanto por personalidades políticas
quanto por intelectuais considerados, até então, progressistas gorias homem/mulher, hétero/homo. Essas categorias não
(BORRILLO; FASSIN; IAcuB, 1999). são autônomas e, ainda menos, inocentes: cada urna só exis-

Assim, segundo parece, qualquer tipo de problematização te em função da outra e a partir da negação de seu contrário.
exclusiva da homossexualidade só tem condições de produzir Ser homem é, em primeiro lugar e antes de mais nada, não
argumentos homofóbicos: em vez de denunciar o fato de que ser mulher; além disso, ser heterossexual implica, necessa-
um aspecto da personalidade (a orientação sexual) constitui riamente, não ser homossexual. Desde o livro do Gênesis até

um obstáculo para o reconhecimento dos direitos, o pensa- a psicanálise, passando pela literatura romântica, a mulher
mento diferencialista empenha-se em questionar e sublinhar tem sido pensada corno um homem incompleto (portanto,
a diferença. Todavia, a atenção deveria estar dirigida não para necessitando dele para atingir sua completude); do mesmo

essa diferença (real ou fantasmática), mas para o conjunto de


discursos, práticas, procedimentos e instituições que, ao pro- 16 Cidade em que, durante a ocupação dos nazistas (1940-1944),se instalou a sede
blematizar assim a "especificidade homossexual': não deixa do governo francês, chefiado pelo marechal Pétain. (N.T.).
de fortalecer um dispositivo destinado a organizar os indiví- 17 Artigo 10: "Para a aplicaçãoda presente lei, o qualificativode judeu é atribuído à
duos enquanto seres sexuados. Lembremos que a argumenta- pessoadescendentede três geraçõesde raçajudaica ou de duas geraçõesda mesma
ção diferencialista - utilizada, outrora, a fim de privar as mu- raça se o cônjuge é judeu:' Levantava-se,então, o problema da falta de indicação
para sabercomo seriadeterminado que os ascendenteseram de "raçajudaica':Essa
lheres de seus direitos cívicos - foi evocada, igualmente, pela
"lacuna"será preenchida, parcialmente,por uma lei de 2 de junho de 1941 que
Suprema Corte dos EUA, até meados da década de 1950, para
"prescreviao censo dos judeus" e, em seu artigo 10, estipulavao seguinte:"É con-
homologar a inferiorização dos negros com base na diferença siderado como judeu: l/Aquele ou aquela,pertencente ou não a uma confissão
racial (BROWN, 1954). No mesmo espírito, depois de ter ex- qualquer,descendente de três gerações,no mínimo, de raça judaica, ou de duas
cluído completamente os não brancos dos direitos políticos, gerações,somente se o cônjugeé descendentede duas geraçõesde raça judaica. O
qualificativode judeu é atribuído ao avô que tenha pertencido à religiãojudaica.
2 / Aqueleou aquela que pertence à religiãojudaica ou era seu membro em 25 de
relatório encomendado pelos ministros franceses do Emprego e da Justiça a junho de 1940,além de ser descendentede duas geraçõesde raça judaica. A não
esta socióloga (THÉRY,1998). filiaçãoà raçajudaica é estabelecidapelaprovada adesãoa outra confissãoreligiosa
*Estainstituição- a Fondation Saint-Simon(1982-1999)- exerceu,ao longo das reconhecidapelo Estado,antesda lei de 9 de dezembrode 1905:'*
últimas duas décadasdo século XX, grande influênciapolítica na França,tornan- *Suaadoção - Lei da Separação entre as Igrejas e o Estado - marca o desfecho
do-se um ponto de encontro entre representantesda universidadee do empresaria- do confronto violento que havia subsistido quase 25 anos e havia oposto duas
do que visavamreformar a sociedadepor meio de estudos críticossobreo mundo visões da França: de um lado, a clerical, favorávelao sistema de Concordata; e,
contemporâneo (cf.CORREA,2006;BOURDIEU;WACQUANT,2000).(N.T.). de outro, a republicana e laica. (N.T.).

32 Homofobia Definiçõese questõestermino1ógicas 33


modo, o/a homossexual é a prova, sempre presente, de uma na mesma lógica utilizada por outras formas de inferiorização:
personalidade inacabada, produto de uma deficiente inte- tratando-se da ideologia racista, classista ou antissemita, o
gração à sua "natureza" masculina ou feminina. objetivo perseguido consiste sempre em desumanizar o outro,
Fenômeno global, ao mesmo tempo, cognitivo e norma- em torná-Io inexoravelmente diferente. À semelhança de qual-
tivo, o heterossexismo pressupõe a diferenciação elementar quer outra forma de intolerância, a homofobia articula-se em
entre os grupos homos/héteros, reservando a este último, torno de emoções (crenças, preconceitos, convicções, fantas-
sistematicamente, um tratamento preferencial. O heterosse- mas ...), de condutas (atos, práticas, procedimentos, leis...) e
xismo é para a homofobia o que o sexismo é para a misogi- de um dispositivo ideológico (teorias, mitos, doutrinas, argu-
nia: apesar de esses conceitos serem distintos, um não pode mentos de autoridade ...).
ser concebido sem o outro.18
O profundo conservadorismo do conjunto das manifes-
Mas, antes de equiparar a homofobia a outras formas de tações de exclusão evocadas reside no fato de que todas elas,
exclusão, parece necessário resumir suas características cons- por um lado, se inspiram no fundo irracional comum de uma
titutivas a fim de não menosprezar sua especificidade. opinião particularmente orientada para a desconfiança em
A homofobia pode ser definida como a hostilidade geral, relação aos outros e, por outro, elas transformam tal precon-
psicológica e social contra aquelas e aqueles que, supostamen- ceito corriqueiro em doutrina elaborada.
te, sentem desejo ou têm práticas sexuais com indivíduos de Para analisar a intolerância, é necessário compreender
seu próprio sexo. Forma específica do sexismo, a homofobia essa convergência entre a opinião comumente aceita e a
rejeita, igualmente, todos aqueles que não se conformam com
construção intelectual da rejeição que engendra a legitima-
o papel predeterminado para seu sexo biológico. Construção
ção da intolerância.
ideológica que consiste na promoção constante de uma forma
A homofobia constrói-se a partir da atribuição de uma
de sexualidade (hétero) em detrimento de outra (homo), a
identidade consistente ao grupo estigmatizado, de uma ca-
homofobia organiza uma hierarquização das sexualidades e,
pacidade para mobilizar recursos cada vez mais ocultos e de
dessa postura, extrai consequências políticas.
uma aptidão para apoiar-se em redes mais ou menos secre-
Racismo, xenofobia, classismo e homofobia tas.19 Todavia, uma questão elementar é sistematicamente
dissimulada: como explicar que essa organização, suposta-
Enquanto violência global caracterizada pela supervalori-
mente tão poderosa, aceitou que seus membros tenham sido,
zação deuns epelo menosprezo deoutros, ahomofobia baseia -se
durante tanto tempo, discriminados e, ainda hoje, conti-
nuem desprovidos dos direitos mais elementares, tais como
18 É. Fassin estabelece uma distinção entre homofobia e heterossexismo: a primeira casamento, adoção, acesso às técnicas de reprodução, agru-
é considerada como uma manifestação psicológica, enquanto o segundo é visto pamento familiar, igualdade patrimonial dos casais, acesso
como a ideologia não igualitária das sexualidades (FASSIN in BORRILLO; LAS- aos direitos sociais, etc.?
COUMES, 1999). Na mesma ótica, Irene Demczuk (1998, p. 10) prefere o termo
"heterossexismo" a "homofobià'; em seu entender, "a homofobia remete ao senti-
mento de medo manifestado em relação às pessoas homossexuais e, mais ampla- 19 Assim, para Armand Laferrere (diplomado da École nationale d'administration
mente, em relação às pessoas dotadas de uma aparência ou de comportamentos [Instituição pública encarregada de selecionar por concurso e formar os altos
que não se conformam com os cmones da feminilidade ou da virilidade. Ora, o funcionários da administração francesa. (N.T.).], conselheiro do Tribunal de
conceito de heterossexismo afasta-se dos esquemas de explicação mais psicológica Contas): "Ao prestar auxílio ao PaCS como se tratasse de um casamento, a lei
sobre a obsessão da diferença, até mesmo, sobre o 'medo do outro em si'; ele en- anuncia que um lobbying eficaz é tão meritório quanto um compromisso de
fatiza as relações sociais e as estruturas que engendram e mantêm as crenças e as assistência mútua duradoura, a criação de um quadro estável para a educação
atitudes depreciativas, para não dizer odiosas, contra pessoas homossexuais': dos filhos e a perenidade da sociedade" (1999-2000, p. 99).

34 Homofobia Definições e questões terminológicas 35


Do mesmo modo que os estrangeiros, os/as homossexuais, às classes populares e que somente a burguesia havia atingi-
em decorrência de suas "práticas bizarras': vivem sob a suspeita do o senso do pudor e da moderação. G. Chauncey mostra
de que ameaçam a coesão cultural e moral da sociedade; o perfeitamente como a teoria da degenerescência permite ex-
discurso homofóbico serve-se desse fantasma como principal plicar a imoralidade dos pobres e a própria pobreza, a partir
arma de seu combate. E até mesmo quando consegue superar a de uma degradação peculiar a essa classe.
hostilidade, a fala homofóbica não pode deixar de assumir um
Alguns alienistas do século XIX defendiam que, tanto a mo-
tom paternalista. Como acontecia, outrora, com as mulheres
ralidade quanto a saúde mental eram construções sociais e
ou, ainda hoje, com as crianças ou com os portadores de de- uma função de classe: a emergência de um comportamen-
ficiências físicas, tenta-se submeter os/as homossexuais a uma to próprio às classes populares (imorais) em uma pessoa da
espécie de vigilância protetora, reservando-Ihes um tratamen- classe superior era sintoma de uma perturbação psicológica.
to destinado a uma classe inferior: incapazes de empreender Outros afirmavam que as classes populares eram mais atin-
um projeto conjugal ou parental, de transmitir seu patrimônio gidas por distúrbios e doenças sexuais em decorrência de
seus excessos libidinais (CHAUNCEY, 1985).
livremente ou, ainda, suscetíveis de serem submetidos a tera-
pias para obter a guarda dos próprios filhos... Nesses casos, o Os intrusos da classe operária nos lares burgueses, tais como
tratamento desigual de que os/as homossexuais são vítimas é os empregados domésticos, foram suspeitos de introduzir per-
justificado por um mecanismo de dominação que consiste em versões no seio de famílias respeitáveis,a tal ponto que os médi-
ocultar as práticas discriminatórias impostas pelo grupo domi- cos da época advertiam seus pacientes contra eventuais práticas
nante e em enfatizar a ideia de uma "deficiência estrutural" dos
masturbatórias de que os filhos poderiam ser vítimas; aliás, tais
dominados: aliás, esta pode ser identificada com a cor da pele, a práticas estariam na origem da futura homossexualidade desses
ausência de pênis e determinados traços psicológicos atribuídos jovens. Na mesma ordem de ideias, a suspeita de lesbianismo
a homossexuais - por exemplo, narcisismo, incapacidade afe- visava, em particular, as prostitutas, que eram obrigadas a satis-
tiva e não reconhecimento da alteridade, ou seja, produtos de fazer às "demandas perversas" dos clientes.
uma estagnação na evolução normal do aparelho psíquico. O conjunto das categorias evocadas constitui uma forma
De qualquer modo, por meio de uma retórica moralizado- de poder gerador de desigualdades: tratando-se das catego-
ra ou de uma linguagem erudita, a lógica discriminatória fun- rias de raça, classe ou gênero e sexualidade, todas elas têm o
ciona segundo uma dialética de oposição entre nós-civilizados objetivo de organizar, intelectualmente, a divergência ao na-
e eles-selvagens.2o No início do século XX, numerosos artigos turalizá-Ia. Durante muito tempo, a diferença de sexos serviu
de antropologia dedicados à moral sexual dos indígenas ten- de justificativa para o tratamento discriminatório (tutelar) das
taram demonstrar que a tolerância da homossexualidade nas mulheres, assim como a diferença de raças havia legitimado a
comunidades autóctones deveria aparecer como um traço escravidão e o colonialismo (GUILLAUMIN, 1995). Apesar dos
comum das culturas primitivas (cf., em particular, SELIG-
progressos realizados na matéria, o problema da desigualdade
MANN, 1902). A exuberância de uma sexualidade selvagem,
está longe de ter encontrado uma solução: as mulheres conti-
mais próxima do bestialismo que da afeição, obcecava as nuam recebendo salários inferiores aos dos homens, além de
mentes coloniais. Na mesma época e de acordo com a mes-
terem de desempenhar tarefas do lar e a educação dos filhos,
ma ordem de ideias, os médicos pressupunham que a liberti-
não obstante suas atividades profissionais. Por outro lado, na
nagem sexual e a sensualidade eram características próprias
França, as pessoas de origem africana ou magrebina é que,
sobretudo, encontram a maior dificuldade para obter um em-
20 Essas expressões são utilizadas por P.-A. Taguieff (1997). prego (BATAILLE, 1997).

36 Homofobia Definições e questões terminológicas 37


Na interação das diferentes formas de opressão que aca- inscrevendo-se na mesma lógica de intolerância que, em
bamos de evocar, é possível discernir a lógica da dominação diferentes momentos da História, produziu a exclusão tan-
que consiste em fabricar diferenças para justificar a exclusão to dos escravos e dos judeus quanto dos protestantes; até
de uns e a promoção dos outros. Disposição de um poder que mesmo os comediantes haviam sido, outrora, excluídos do
vai do individual ao social, as categorias evocadas organizam direito ao casamento.
um critério de acesso desigual aos recursos econômicos, polí- À semelhança do que ocorre em relação à diferença cul-
ticos, sociais e/ou jurídicos. tural entre nacional e estrangeiro (espécie de eufemismo do
No plano pessoal, um processo mental de subjetivação - racismo), a diferença sexual entre homem e mulher, assim
que consiste em levar o indivíduo discriminado a aceitar a como a diferença das sexualidades entre heterossexual e ho-
natureza essencial de sua diferença - é o que torna possível mossexual, é apresentada como um indicador objetivo do sis-
alimentar regularmente a resignação dos dominados ao status tema desigual de atribuição e de acesso aos bens culturais, a
atribuído pelos dominantes. O fato de constatar a sub-repre- saber, direitos, capacidades, prerrogativas, alocações, dinhei-
sentação das mulheres nas instâncias de decisão política, eco- ro, cultura, prestígio, etc. E, embora o princípio da igualdade
nômica ou administrativa, implica apenas reações bastante tí- seja formalmente proclamado, é efetivamente em nome das
midas e limitadas a círculos restritos (FASSIN; FEHER, 1999). A diferenças e ao dissimular precavidamente qualquer intenção
persistência das práticas discriminatórias no mundo do traba- discriminatória, que os dominantes entendem reservar um
lho contra pessoas de origem estrangeira não suscita a menor tratamento desfavorável aos dominados. A construção da di-
indignação (BATAILLE, 1997; ver, igualmente, GIUDICE, 1989). ferença homossexual é um mecanismo político bem rodado
O entusiasmo provocado pela criação de uma forma es- que permite excluir gays e lésbicas do direito comum (univer-
pecífica de união conjugal, concebida (de maneira inconfes- sal), inscrevendo-os(as) em um regime de exceção (particu-
sável) para casais do mesmo sexo,21mostra perfeitamente até lar). O fato de que nenhum país no mundo tenha reconhecido
que ponto, enquanto grupo dominado, alguns homossexuais aos casais homo os direitos conjugais atribuídos aos casais hé-
acabaram integrando o discurso heterossexista dominante, tero ilustra perfeitamente a generalização dessa política "se-
que apresenta, como confirmado e legítimo, o abandono do gregacionistà' que consiste em atribuir determinados direitos
princípio da igualdade em relação ao casamento e à filiação. (excepcionais) sem atingir a igualdade total desses direitos.
A memória é, infelizmente, bastante curta: os argu- Se conseguimos constatar a existência de similitudes entre
mentos adotados, atualmente, contra o casamento homos- as diversas formas de intolerância, torna-se necessário, po-
sexual veiculam preconceitos semelhantes aos que haviam rém, assinalar algumas diferenças significativas; nesse sentido,
sido utilizados nos EUA para proibir os casamentos inter-
raciais.22 O problema da homofobia supera a questão gay,
à Constituição dos EUA. Vinte e seis anos depois, a Suprema Corte do Estado
do Havaí considera, no processo Baehr v. Lewin, que a negação do direito de se
21 Como é o caso, na França, em relação ao Pacte civil de solidarité (PaCS), forma casar para um casal do mesmo sexo constitui uma discriminação contrária à
de subcasamento que homologa a segregação dos casais do mesmo sexo. Constituição; aos argumentos que consistem em dizer que não existe discrimi-
22 ''A fim de justificar a aplicação de uma lei que proíbe o casamento entre pessoas nação porque o casamento entre pessoas do mesmo sexo não é aplicável a um
de raça diferente, o Tribunal de Instância do Estado da Virgínia considerava, homem ou a uma mulher, o Tribunal de Havaí responde que esses mesmos ar-
em 1966, que 'Deus Onipotente criou as raças branca, negra, amarela, malásia gumentos haviam sido rejeitados pela Suprema Corte ao serem evocados para
e vermelha, além de colocá-Ias em continentes separados [...]. O fato de que a questão racial. De fato, até essa decisão, nenhum negro podia casar-se com
Ele as tenha separado demonstra que Ele não tinha a intenção que as raças se uma branca, tampouco uma negra com um branco" (BORRILLO, "Le mariage
misturassem: Em 1967, a Suprema Corte Federal considerou essa lei contrária homosexuel..:', in FEDIDA, 1999).

38 Homofobia Definições e questões termino1ógicas 39


parece ser pertinente o exemplo de uma minoria religiosa, monoteístas, a maioria dos políticos, numerosos intelectuais,
mencionado por J. Boswell. De acordo com esse historiador, a maior parte das associações familiares e até o ex-presidente
da República Prancesa23 têm manifestado atitudes e falas des-
[o judaísmo] é transmitido pelos pais aos filhos; ora, com
seus preceitos morais, ele legou, de geração em geração, uma denhosas em relação a gays e lésbicas, sem que essa postura
verdadeira sabedoria política, extraída no decorrer de séculos tenha suscitado a menor reação da sociedade civil.
de opressão e perseguição [...]. Além disso, ele conseguiu ofe- Atualmente, é inimaginável proferir, sem risco, afirmações
recer, pelo menos, aos membros da comunidade, o reconfor- injuriosas contra outras minorias - tal como ocorre em relação
to da solidariedade diante da opressão. [...] A maior parte dos aos homossexuais -, entre outros motivos, porque tal atitude é
homossexuais não são oriundos de famílias de homossexuais.
Eles sofrem uma opressão dirigida contra cada um deles, punida por lei. Essa ausência de proteção jurídica contra o ódio
isoladamente, sem se beneficiar dos conselhos nem sequer, homofóbico posiciona os gays em uma situação particularmen-
frequentemente, do apoio afetivo dos pais e amigos. Eis o que te vulnerável, 24 tanto mais grave quanto a homossexualidade
torna sua situação mais comparável, em determinados aspec- usufrui do triste privilégio de ter sido combatida, durante os úl-
tos, à dos cegos ou canhotos que estão, também, dissemina- timos dois séculos, simultaneamente, enquanto pecado, crime
dos na população, não reunidos por uma herança comum,
e doença: mesmo escapando à Igreja, ela acabava caindo sob
além de serem, igualmente, em um grande número de civi-
lizações' vítimas da intolerância (BOSWELL, 1985, p. 37-38). o jugo da lei laica ou sob a influência da clínica médica. Essa
crueldade deixou marcas profundas nas consciências de gays
Diferentemente de outras formas de hostilidade, o que ca- e lésbicas, a tal ponto que eles(as) integram, frequentemente, a
racterizaria a homofobia, portanto, é o fato de que ela visa, violência cotidiana - de que eles(as) são as primeiras vítimas -
sobretudo, indivíduos isolados, e não grupos já constituídos como se fosse algo normal e, de algum modo, inevitável.
como minorias. O homossexual sofre sozinho o ostracismo
associado à sua homossexualidade, sem qualquer apoio das
pessoas à sua volta e, muitas vezes, em um ambiente familiar
também hostil. Ele é mais facilmente vítima de uma aversão
a si mesmo e de uma violência interiorizada, suscetíveis de
levá-Io até o suicídio. 23 A propósito do debate sobre o reconhecimento da união entre pessoas do
mesmo sexo, o ex-presidente francês J. Chirac declarou: "Não se deve correr
Sublinhemos, também, que a orientação sexual, por si só, o risco de desnaturar o direito do casamento, nem de banalizá-Io, ao colocar
é ainda evocada oficialmente como empecilho legítimo ao no mesmo plano outras realidades humanas de nosso tempo que se afastam
reconhecimento de direitos; ou, dito por outras palavras, a claramente dos valores fundamentais da família" (6 de junho de 1998). Citado

homossexualidade permanece como a única discriminação por Fourest e Venner (1999).

inscrita formalmente na ordem jurídica. Nenhuma outra "ca- 24 A primeira proposta de lei contra as afirmações homofóbicas foi registrada
na Assembleia Nacional francesa, sob o n° 1.893, em 9 de novembro de 1999,
tegoria" da população é excluída da fruição dos direitos funda-
pelo deputado liberal François Léotard. Inspirado pelo "Manifeste pour une
mentais em razão de sua filiação a uma raça, religião, origem stratégie contre l'homophobiê' [Manifesto em favor de uma estratégia contra
étnica, sexo ou a qualquer outra designação arbitrária. Além a homofobia], publicado pelo periódico parisiense de esquerda Libération, em
disso, enquanto o racismo, o antissemitismo, a misoginia ou 3 de dezembro de 1999, o Partido Comunista francês apresentou, em 1° de
fevereiro de 2000, uma proposta de lei com o objetivo de combater a incita-
a xenofobia são formalmente condenados pelas instituições,
ção ao ódio homofóbico. Um mês depois, adotando o mesmo procedimento, o
a homofobia continua sendo considerada quase uma opinião
grupo socialista do Senado apresentou uma proposta "no sentido de sancionar
de bom senso. Praticamente, o conjunto da doutrina jurídi- as afirmações de caráter discriminatório"; e com o mesmo intuito, os Verdes
ca (BORRILLO, "Pantasmes des juristes ..:: 1999), as religiões apresentaram, igualmente, a proposição nO2.376.

40 Homofobia Definições e questões terminológicas 41


Capítulo 11

Origens e elementos precursores

C"-'

Não é fácil falar de homofobia em períodos da história oci-


dental durante os quais a homossexualidade não se apresentava
da mesma forma, além de suscitar reações diferentes, das que
ocorrem nos dias de hoje.25 Desenvolvida no final do século
XIX, sua problematização teria provocado a maior surpresa aos
espíritos gregos ou romanos, para quem o próprio termo "ho-
mossexualidade" estava desprovido de qualquer significação.
A sexualidade que caracterizava o universo antigo outorgava,
na vida social, toda a legitimidade às relações entre homens e
entre mulheres.26 Os elementos precursores de uma hostilidade
contra lésbicas e gays emanam da tradição judaico-cristã. Para
o pensamento pagão, a sexualidade entre pessoas do mesmo
sexo era considerada um elemento constitutivo, até mesmo in-
dispensável, da vida do indivíduo (sobretudo, masculino). Por
sua vez, o cristianismo, ao acentuar a hostilidade da Lei judaica,
começou por situar os atos homossexuais - e, em seguida, as
pessoas que os cometem - não só fora da Salvação, mas tam-
bém e, sobretudo, à margem da Natureza.27 O cristianismo

25 Sobre o debate entre "essencialistas" e "construtivistas'; ver o artigo de R.


Halwani (1998).

26 "Plutarco relata que, em Esparta, as mais destacadas mulheres da elite amam


as moças; além disso, quando duas têm afeição pela mesma moça, elas empe-
nham-se em aperfeiçoá-Ià' (SPENCER, 1998, p. 57).
27 Será tempo perdido procurar, nos documentos religiosos, as palavras "ho-
mossexual" ou "homossexualidade': A noção aparece sob os termos latinos
ou gregos, tais como arsenokoites, catamiti, elicatus, cincedus, eifeminatus,
ephebi, gemelli, malakos, molles, pathici, pcederastes, pcedicator, pcedico, poido-
phthoros, etc.

43
triunfante28 transformará essa exclusão da natureza no ele- o homossexual em um pária suscetível de comprometer os
mento precursor e capital da ideologia homofóbica. Mais próprios alicerces da sociedade (FOUCAULT, 1999). Ao enfa-
tarde, se o sodomita é condenado à fogueira, se o homosse- tizar a condenação da homossexualidade e ao dissimular as
xual é considerado um doente suscetível de ser encarcerado narrativas em que personagens bíblicos manifestam, aber-
ou se o perverso acaba seus dias nos campos de extermínio, tamente, seus sentimentos para com pessoas de seu sexo, a
é porque eles deixam de participar da natureza humana. A Igreja organiza uma censura dos textos sagrados a fim de
desumanização foi, assim, a condi tio sine qua non da inferio- promover, incessantemente, a heterossexualidade monogâ-
rização, da segregação e da eliminação dos "marginais em mica. Além de ser obrigatório lembrar o castigo impiedoso
matéria de sexo". infligido a Sodoma e Gomorra, conviria silenciar as intensas
Além disso, se a origem do androcentrismo deve ser relações - sinal de uma homofilia latente - entre as figuras bí-
procurada no pensamento pagão, como é ilustrado pelo es- blicas, tais como Davi e Jônatas (Primeiro Livro de Samue118,
tudo de F. Valdes (1996), as fontes do heterossexismo e da 20,41; Segundo Livro de Samuel, 1,23 e 1,26), Rute e Noemp!
homofobia encontram-se, sem qualquer dúvida, na concep- ou ainda Jesus e João, seu discípulo bem-amado.32
ção sexual do pensamento judaico-cristão. Segundo esse
autor, as elites judaico-cristãs, assim como as do universo o mundo greco-romano
greco-romano, acreditavam na superioridade do masculino A Grécia Antiga reconhecia oficialmente os amores mas-
e na ordem patriarcal que é sua consequência. Mas elas in- culinos; se as relações sexuais entre homens desempenha-
troduziram, igualmente, um elemento novo que modificará vam uma função iniciática, nem por isso tais ritos estavam
radicalmente o paradigma da sexualidade: a abstinência. desprovidos de desejo e prazer. Assim, impregnada por essa
A única exceção a esse ideal asceta que, ao mesmo tem- atmosfera de erotismo viril, a sociedade grega considerava a
po, permite confirmar seu status é o ato sexual reprodutor homossexualidade como legítima. Com efeito, embora a re-
no âmbito do casamento religioso. A sexualidade não re- lação entre o adolescente (eromenos) e o adulto (erastes) as-
produtora - e, em particular, a homossexualidade, forma sumisse o caráter de uma preparação para a vida marital, os
paradigmática do ato estéril por essência - constituirá, daí atos homossexuais usufruíam de verdadeiro reconhecimento
em diante, a configuração mais acabada do pecado contra social. O termo "pederastià' - do grego pais, paidós (meni-
a natureza. no) e éros, érotos (amor, paixão, desejo ardente) - implicava
Ao apoiar-se em uma leitura incompleta e preconceitu- a afeição espiritual e sensual de um homem adulto por um
osa dos textos bíblicos,29 o cristianismo - desde os Padres menino. Um diálogo apócrifo do escritor grego Luciano de
da Igreja30 até a teologia moderna, passando pela Escolás- Samósata (atualmente, cidade da Síria), nascido por volta de
tica e pela tradição canônica - não deixou de transformar 120 de nossa era, relata que

28 Ao tornar-se religião oficial do Império Romano, em 380. O imperador Cons- 31 "Mas Rute respondeu: 'Não insistas comigo para que te deixe e me afaste de ti!
tantino havia concedido aos cristãos - em 313, com a publicação do Edito de Porque aonde fores, irei contigo; onde pousares, lá pousarei eu; teu povo será
Milão - o direito de praticar livremente sua religião. meu povo e teu Deus será meu Deus. Onde morreres, ali morrerei e serei sepul-
29 J. Boswell (1985) elaborou uma crítica radical contra a leitura proposta pelas au- tada onde estiver tua sepultura. Que o Senhor me trate como quiser; somente
toridades religiosas sobre a sodomia e os sodomitas (d. VALLE, 2006; LIMA, a morte me separará de ti!" (Livro de Rufe, 1,16-17). Cf. Bíblia Sagrada. Edição
2007; 2009; FERNANDES, 2008; LONGO, 2009; SILVA, 2009). da Família. Petrápolis: Editora Vozes, 2001.

30 Referência aos bispos, do Ocidente e do Oriente, que se distinguiram, antes do 32 "Um deles, a quem Jesus amava [...] inclinando-se sobre o peito de Jesus [...]"
século V, na defesa da verdadeira doutrina cristã. (N.T.). (Evangelho de João, 13,23-25). Ver Frontain, 1997.

44 Homofobia Origens e elementos precursores 45


[...] o casamento é, para os homens, uma necessidade e um homem não constituía uma escolha fora da norma, mas
algo de precioso se esse homem é feliz; por sua vez, o amor fazia parte da vida; além disso, na maior parte do tempo, as
pelos efebos (adolescentes, geralmente, de 16 a 18 anos) é, experiências homossexuais alternavam com as relações hete-
em minha opinião, efeito da verdadeira sabedoria. Assim,
rossexuais. De Safo a Anacreonte, de Teógnis a Píndaro,33 as
o casamento destina-se a todos, enquanto o amor pelos efe-
bos é um privilégio reservado aos sábios (SAMOSATENSIS, paixões entre pessoas do mesmo sexo inspiraram belíssimas
1867, p. 403). páginas da literatura na Antiguidade. Por outras razões e sob
formas diferentes, os romanos e os gregos consideravam to-
A relação entre o Erastes e o Eromenos foi uma institui- talmente normal que homens tivessem relações sexuais com
ção das cidades gregas. Paralelamente à pederastia, existiam outros homens e, também, com mulheres. A regra segundo
práticas homossexuais entre adultos que correspondiam a a qual a virilidade consiste em assumir o papel ativo na re-
uma necessidade, de preferência, do tipo militar: em vários lação sexual era comum à moral das duas civilizações.34As
Estados gregos, o amante e o amado eram posicionados lado dicotomias "macho/fêmea", "ativo/passivo" definiam os pa-
a lado no campo de batalha, para que essa proximidade lhes péis sociais, o acesso ao poder e a posição de cada indivíduo
inspirasse um comportamento heroico. Convém, todavia, segundo seu gênero e sua classe.
sublinhar que a pederastia era extremamente regulamen- O sistema de dominação masculina do tipo patriarcal
tada; assim, aqueles que mantinham práticas homossexuais consolida-se com a tradição judaico-cristã; no entanto, esta
exclusivas constituíam uma minoria não aceita. Sólon, o cé- introduziu uma nova dicotomia, "heterossexual/homosse-
lebre legislador de Atenas, normatiza a pederastia, por volta xual", que, desde então, serve de estrutura, do ponto de vista
do ano 600 a.c., ao proibir as relações sexuais entre escravos psicológico e social, à relação com o sexo e com a sexualidade.
e meninos livres. A oposição pagã "atividade/passividade': assimilando a virili-
Na Roma Clássica, a homossexualidade era tolerada sob dade, de preferência, ao papel ativo, e não ao sexo do parceiro,
as seguintes condições: não afastar o cidadão de seus de- aparecia daí em diante como contrária à nova moral sexuaL O
veres para com a sociedade; não utilizar pessoas de estrato cristianismo, herdeiro da tradição judaica, transformará a he-
inferior como objeto de prazer e, por último, evitar abso- terossexualidade no único comportamento suscetível de ser
lutamente de assumir o papel passivo nas relações com os
subordinados. Evidentemente, o cidadão romano deveria, 33 Safo: poetisa grega (nascida na ilha de Lesbos [hoje, Mitilene] entre os sécu-
sobretudo, casar-se, tornar-se pater famílias, assim como los VII e VI a.c.], cujas poesias formavam, na Antiguidade, nove livros que
zelar pelos interesses não só econômicos, mas também da compreendiam epitalâmios, elegias e hinos, dos quais só restam fragmentos.
Teógnis: poeta lírico grego (Mégara, segunda metade do século VI a.C.) de
linhagem. Na realidade, somente a bissexualidade ativa era
quem a tradição conservou uma coleção de cerca de setecentos versos elegi-
bem vista e aceita em Roma.
acos em que predominam poemas gnômicos e de conotação política, além
Embora as sociedades gregas e romanas tenham sido de temática homossexual. Anacreonte: poeta lírico grego (segunda metade
agressivamente sexistas e misóginas, elas nunca caíram no do século VI a.c.), cujas obras, de que restam apenas fragmentos, celebram
o amor, a boa mesa, os prazeres da vida; elas inspiraram a poesia da Renas-
heterossexismo peculiar da tradição judaico-cristã. No pró-
cença denominada anacreôntica. Pindaro: poeta lírico grego (entre os séculos
prio âmago da instituição familiar, a pederastia situava uma
VI e V a.c.), cujas poesias pertencem a todos os gêneros do lirismo coral,
forma específica de homossexualidade, ao outorgar, por esse tais como hinos, ditirambos e odes; elas constituem a expressão máxima do
fato, uma importante função social às relações entre homens. lirismo grego. (N.T.).
O reconhecimento do termo "homossexualidade" mostra até 34 Assim, o homem adulto que continuasse assumindo o papel passivo em uma
que ponto os clássicos integravam esse tipo de práticas. Amar relação homossexual era vítima de zombarias.

46 Homofobia Origens e elementos precursores 47


qualificado como natural e, por conseguinte, como normal. do Mar Morto, e Gomorra permaneceram célebres como ar-
Ao outorgar esse caráter natural, em conformidade com a lei quétipos de comunidades dominadas pelo pecado: menos-
divina, às relações sexuais entre pessoas de sexo diferente, o prezo pelas regras da hospitalidade, orgulho e, sobretudo,
cristianismo inaugurou, no Ocidente, uma época de homofo- homossexualidade são as características de seus habitantes,
bia, totalmente nova, que ainda não havia sido praticada por que foram aniquilados por enxofre, sal e cinzas, em uma ter-
outra civilização. ra completamente queimada. O Dictionnaire des mots de ia
foi chrétienne (1989) define a sodomia como o "pecado, cujo
A tradição judaico-cristã nome deriva da cidade de Sodoma, designando qualquer re-
Sob a influência do cristianismo, o Império Romano em- lação homossexual ou contra a natureza. Vício".
penha-se na repressão das relações entre pessoas do mesmo Preocupado em garantir uma progenitura prolífica, o
sexo.35 A crença na qualidade natural e a moralidade das povo de Israel condenará, com vigor, qualquer comporta-
relações heterossexuais monogâmicas - e, correlatamen- mento sexual que não tenha o objetivo da procriação. Base-
te, a percepção da homossexualidade como prática nociva ado na ideia de filiação biológica, o povo eleito transformará
para o indivíduo e para a sociedade - levam o imperador o esperma em um elemento quase sagrado, cuja dissipação
Teodósio 1°, em 390, a ordenar a condenação à fogueira de era passível da mais firme condenação. A reprovação - além
todos os homossexuais passivos. De acordo com o Código da masturbação e das relações com uma mulher durante os
Teodosiano (Teodósio lI, 438), a atitude passiva, associada períodos não fecundáveis - atingiu ainda mais as relações
necessariamente à feminilidade, implicava uma ameaça entre homens: "Não dormirás com um homem como se dor-
para o vigor e a sobrevivência de Roma. A fim de justificar me com mulher. É uma abominação", prescreve o Levítico,
tal severidade, foi necessário apoiar-se nos fundamentos 18,22. A punição para essa atrocidade é prevista dois capí-
bíblicos da condenação: o Antigo Testamento fornecerá as tulos mais adiante: "Se um homem dormir com outro como
narrativas de Sodoma e Gomorra; o Novo Testamento, pelo se fosse com mulher, ambos cometeram uma abominação
viés das epístolas paulinas, vai permitir a renovação da in- e serão punidos com a morte: seu sangue cairá sobre eles"
veterada hostilidade contra os homossexuais. Com efeito, a (20,13). O contexto histórico em que tais prescrições foram
história terrificante de Sodoma no livro do Gênesis (cf. ca- enunciadas permite compreender melhor sua severidade:
pítulos 18,20 e 19),36assim como as prescrições lapidares do após sua libertação do Egito, o povo de Israel foi obriga-
Levítico, constitui a prova incontestável do ódio manifesta- do a editar normas estritas, destinadas a garantir sua so-
do na Bíblia contra os homossexuais masculinos e femini-
brevivência demo gráfica e cultural. Os alicerces patriarcais
nos. Sem sombra de dúvida, Sodoma, cidade situada no sul do povo judeu encontrar-se-iam, efetivamente, em perigo
se viessem a disseminar-se outras práticas além da relação
35 A primeira lei contra os homossexuais foi promulgada, em 342, pelo imperador com mulheres. Essa dupla necessidade - preservação bio-
Constâncio II; no entanto, as Novellce 77 e 114 do imperador Justiniano (527-565) lógica da comunidade dos eleitos e conservação cultural da
é que representam as primeiras condenações penais, baseadas na teologia cristã. sociedade patriarcal- explica a hostilidade contra as práti-
36 Na citada Bíblia Sagrada, encontra-se o seguinte comentário ao versículo 20 cas homossexuais.
(cap. 18): ''A ruina de Sodoma e Gomorra foi provocada por sua iniquidade que
Em nossos dias, o que parece particularmente surpreen-
se tornou típica no Antigo Testamento. O pecado aqui é caracterizado como dente não é tanto a hostilidade anti -homossexual no contex-
homossexualismo (cf. Gênesis, 19,4-6) ou sodomia. IsaÍas (1,9; 3,9) o qualifica
como injustiça social; Ezequiel (16,46-51) como maus-tratos aos pobres; e Jere- to sociopolítico de emergência do Levítico, mas seu uso cons-
mias (23,14) como imoralidade geral". (N.T.). tante e repetido pelas autoridades na época contemporânea:

48 Homofobia Origens e elementos precursores 49


várias leis atuais contra a sodomia nos EUA baseiam-se nes- Não sabeis que os injustos não herdarão o Reino de Deus?
ses trechos bíblicos. Além disso, uma carta recente da Sagrada Não vos iludais: os fornicadores [imorais/BSFV; libertinosl
BSCB; impuros/BJFA], idólatras, adúlteros, depravados
Congregação para a Doutrina da Fé [instância vaticana], diri-
[efeminados/BSFV e BJFA], sodomitas [pederastas/BSFV],
gida aos bispos católicos, lembra que a condenação levítica assim como os ladrões, avarentos, beberrões, caluniadores
faz precisamente referência aos comportamentos homosse- ou estelionatários, nenhum desses herdará o Reino de Deus
xuais. A Suprema Corte dos EUA justifica, em uma decisão de (Primeira Epístola aos Coríntios, 6,9-10).
1986 (BOWERS), a constitucionalidade de uma lei do Estado
Enquanto os outros discípulos de Cristo ignoravam a ho-
da Geórgia ao reprimir a sodomia com base nos valores judai-
mossexualidade, Paulo retomava sistematicamente a questão
co-cristãos que amparam tal proibição. Do mesmo modo, na
ao compará-Ia com a lei mosaica.
França, o procurador do Supremo Tribunal evocava a "moral
tradicional" para rejeitar direitos aos casais do mesmo sexo.37 Sabemos que a Lei é boa (diz o apóstolo), contanto que dela
Contrariamente à moral sexual rabínica, a doutrina de se faça uso legítimo e tendo em vista que ela não se destina
aos justos, mas aos transgressores da Lei e rebeldes, ímpios
Cristo deixou de colocar no centro de suas preocupações a
e pecadores, sacrílegos e profanadores, parricidas e matri-
reprodução e a multiplicação do povo de Israel; ele chega, cidas, assassinos, fornicadores [devassos/BSFV; dados à
até, a ordenar a seus discípulos que deixem as esposas para prostituição ou libertinos, devassos/BSCB; impuros/BJFA],
se consagrarem ao celibato. Mesmo que, em momento al- sodomitas [pederastas/BSFV] [...] (Primeira Epístola a Ti-
móteo,1,8-1O).39
gum, Jesus mencione o pecado de sodomia ou faça referência
a qualquer condenação das paixões entre pessoas do mesmo A Patrística [acervo das obras dos Padres da Igreja] pro-
sexo, o apóstolo Paulo não hesita em condenar, com firmeza, longa o pensamento paulino ao condenar a voluptuosidade
os amores sáficos. Na Epístola aos Romanos, ele lembra: "Por
de uma sexualidade julgada como efeminada, tais como a
isso, Deus os entregou a paixões vergonhosas: entre eles, as masturbação, o adultério e, em particular, as relações homos-
mulheres mudaram o uso natural em uso contra a naturezâ'
sexuais. Clemente de Alexandria, um dos grandes apologis-
(1,26). E, ao fazer referência aos homossexuais masculinos, tas do século lU, articula a condenação da homossexualidade
o apóstolo acrescenta: "Os homens, também, abandonando a em torno da noção de ato contra a natureza, noção com-
aliança dos dois sexos que é segundo a natureza, arderam em preendida segundo a acepção platônica das Leis. Todavia,
um desejo brutal de uns pelos outros, o homem praticando Agostinho de Hipona (354-430), um dos principais repre-
torpezas detestáveis com homem, e recebendo, assim, em si sentantes da Patrística, é que marcará, sobretudo, a doxa ca-
mesmos a merecida punição por sua cegueira (1,27)". tólica. Em sua obra Confissões ele fala da sodomia como se
A velha tradição judaica de excluir os marginais da Salva- tratasse de um crime detestável, contrário à lei natural e à lei
ção é reatualizada, vigorosamente, por Paulo quando ele lem- divina.40 As primeiras condenações formais não tardaram a
bra, com veemência, aos cristãos de Corint038:

39 Assinalemos que a tradução francesa da Bíblia de Jerusalém utiliza o termo


37 Conclusões do jurista Mareei Dorwling-Carter, procurador do Supremo Tribunal, "homossexuais" em vez de "sodomitas"; por sua vez, a tradução ecumênica,
JO [Diário Oficial], 14 de abril de 1990, Jurisprudência, p. 217-228. em francês, prefere o termo "pederastas". Em várias outras versões francesas,

38 Tradução literal do original. Entre colchetes, os termos utilizados em três versões o termo "efeminados" precede o de "sodomitas" ou "pederastas".

da Bíblia, em português: BSFV [Bt'bliaSagrada, Edição da família, Editora Vozes, 40 De acordo com a observação de Colin Spencer (1998), o próprio Agostinho
2001]; BSCB [Bt'bliaSagrada, tradução da CNBB, 2001]; e BJFA [Bíblia traduzi- tinha vivido uma ardente paixão com um homem, exprimindo seu profundo
da por João Ferreira de Almeida, Sociedade Bíblica do Brasil, 2004]. (N.T.). sofrimento pela morte do amigo: "Parecia-me que nossas duas almas (escreve

50 Homofobia Origens e elementos precursores 51


ser pronunciadas: o Concílio de Elvira, reunido na Espanha A tradição homofóbica da Igreja encontra seus mais
em 305, prevê a excomunhão; por sua vez, o Concílio de importantes alicerces no pensamento da Escolástica e, em
Ancira (hoje, Ancara), em 314, organiza as punições para o particular, em Tomás de Aquino (1225-1274). Em sua Suma
pecado sodomítico (LEROY-FoRGEOT, 1997, p. 26).41 Teológica - síntese do cristianismo com a visão aristotélica do
No início do ano 1000, Pedro Damião (1007-1072) - ere- mundo que procede a uma sistematização do conhecimen-
mita italiano e bispo de Óstia - escreve um tratado, intitulado to teológico e filosófico de sua época -, o doutor da Igreja
Liber Gomorrhianus (Livro de Gomorra), dedicado à análise questiona-se para saber se qualquer ato voluptuoso constitui
e à condenação das relações homossexuais e, em particular, um pecado. Da resposta a essa questão pode deduzir-se o tra-
àquelas praticadas entre os membros do clero. A fim de sen- tamento moral que o teólogo reserva à sodomia:
sibilizar as autoridades eclesiásticas para esse "flagelo': o teó-
Um ato humano é um pecado, assinala Tomás de Aquino,
logo não poupa seu ódio contra um fenômeno que, segundo
quando é contrário à ordem estabelecida pela razão. Ora,
parece, ele conhece perfeitamente. essa ordem consiste na adaptação dos meios ao fim; por-
tanto, não há pecado em utilizar, segundo a razão, as coisas
Nenhum outro vício poderá ser razoavelmente compara-
para seu próprio fim, ao respeitar a ponderação e a ordem,
do com esse que, no tocante à impunidade, prevalece em
contanto que esse fim seja um verdadeiro bem. Mas a con-
relação a todos os outros. Com efeito, esse vício traz em
servação da espécie é um bem não menos excelente que o
seu bojo a morte do corpo e a destruição da alma; ele COllS-
do indivíduo; ora, do mesmo modo que este serve-se da ali-
purca a carne, embaça a luz da inteligência, lança o Espí-
mentação como meio, aquela utiliza a volúpia. O que os ali-
rito Santo fora de seu templo - o coração do homem - e
mentos são para o homem, diz santo Agostinho, o comércio
instala o diabo em seu lugar, despertando-o para desejos carnal o é para a humanidade. Portanto, do mesmo modo
malvados; obstrui absolutamente o espírito para a verdade;
que o uso dos alimentos pode ser isento de pecado, se ele
engana e induz à mentira; coloca armadilhas no caminho é adequado para a saúde dos corpos, assim também o uso
e, quando um homem cai na fossa, impede-lhe qualquer da volúpia pode sê-Io, se observar a ponderação e a ordem
fuga; ao abrir as portas do Inferno, ele encerra as do Para- capazes de garantir seu fim que é a propagação humana (To-
íso; transforma o cidadão da Jerusalém celeste em herdei- MÁSDEAQUINO, II a II ae, q. 153, a. 2).
ro da Babilônia infernal (PEDRODAMIÃO,capo XVI apud
BOSWELL,1985). A resposta moral é clara: o prazer sexual é legítimo so-
mente na medida em que não é acompanhado de um ato sus-
Luca da Penne considera a sodomia mais grave que o ho-
cetível de entravar a reprodução. Com efeito, a masturbação é
micídio, porque este destrói somente uma vida individual,
vigorosamente condenada, assim como qualquer comporta-
enquanto aquela aniquila a raça humana ao impedi -Ia de
mento sexual com a espécie errônea (bestialismo), o sexo er-
reproduzir-se (DYNES,1990, p. 957),42
rôneo (homossexualidade) ou o órgão errôneo (sexo oral ou
anal) (11a 11ae, q. 154, 11). A Escolástica vai construir, assim,
são Agostinho) eram uma só em dois corpos; eis por que minha vida tornou -se uma norma que continua modelando a ideologia sexual oci-
um horror porque eu não queria viver como uma metade".
dental: o coito heterossexual do tipo conjugal e a submissão
41 No entanto, convém sublinhar que o Concílio de Ancira condenava o bes-
da mulher na relação sexual, cujo único objetivo consiste na
tialismo, e não a sodomia. Uma interpretação posterior, em decorrência de
uma tradução equivocada do grego, é que vai ampliar a punição aos atos
inseminação procriadora. Mas, sobretudo, ela dará forma a
sodomíticos. uma homofobia, difusa na época, ao comparar as relações ho-
42 Observemos que os mesmos argumentos foram utilizados, recentemente, na Fran- mossexuais aos pecados mais abjetos, tais como canibalismo,
ça, para rejeitar o reconhecimento legal da união entre pessoas do mesmo sexo. bestialidade ou ingestão de imundícies (11a 11ae, q. 142,4,3).

52 Homofobia Origens e elementos precursores 53


A grande peste negra de 1348-1350 - que dizimou mais de Ainda mais impressionante, o direito consuetudinário
um terço da população europeia - reanimará a velha hostilida- da região de Orléans [Coutume d'Orléans] prescreve que "o
de anti-homossexual. No futuro, haverá quem considere a sodomita comprovado deve perder os bagos e, ao tornar-se
sodomia uma ameaça direta ao repovoamento; a partir des- recidivista, deve perder o membro; e, se cometer o ato pela
se momento, sobretudo, é que se instalou uma verdadeira terceira vez, deve ser queimado". A pena capital pelo fogo
caça aos sodomitas, de modo que centenas de homossexuais corresponde à prescrição bíblica, estabelecida no Apocalipse
acabaram na fogueira. Ora, a condenação à morte pelo fogo (21,8): "o lugar deles é o lago ardente de fogo e enxofre':
não é, entretanto, um fenômeno novo. O edito do imperador Em 10 de outubro de 1783, ocorrerá, na França, a última
Teodósio já enunciava na época: "Todos aqueles que aviltam condenação à morte de um homossexual: nesse dia, Jacques-
vergonhosamente seus corpos ao submetê-Io, como se fos- François Pascal foi jogado nas chamas da fogueira, sob a ins-
sem mulheres, ao desejo de outro homem, e dedicando-se crição "devasso contra a natureza e assassino". A Revolução
assim a relações sexuais estranhas, esses devem expiar tal Francesa pôs termo à condenação da sodomia: inspirado na
crime nas chamas vingadoras, diante de todo o povo". Ape- filosofia das Luzes, o Código Penal de 1791, assim como o de
sar das condenações formais, as aplicações da punição per- 1810, cessam de incriminar os costumes contra a natureza.
maneceram rarÍssimas. Durante os séculos XIII a Xv, é que A liberdade individual aparece, desde então, como um valor
a perseguição dos homossexuais vai acentuar-se; até o final fundamental que deve ser preservado; em nome dessa liber-
do século XVIII, todas as disposições penais, sem exceção, dade é que o Estado abstém-se de interferir na vida privada
fazem referência ao mito de Sodoma para justificar a puni- dos indivíduosY No entanto, esse espírito de tolerância
ção de gays e lésbicas. A morte pelo fogo aparece como uma continua sendo precário. Com efeito, em duas oportunida-
forma específica e necessária de purificação, não só do in- des, a ordem jurídica francesa voltou atrás no tocante a essa
divíduo - queimando-lhe a carne para salvar a alma -, mas decisão de ignorar a homossexualidade dos cidadãos: em 6
igualmente da comunidade, extirpando assim o mal que a de agosto de 1942, alguns meses depois da lei sobre o "Esta-
corrói em seu âmago. A tradição teológica organiza, ideo- tuto dos Judeus", o regime do marechal Pétain modificará o
logicamente, essa forma radical de perseguição contra os Código Penal ao introduzir o delito da homossexualidade;44
homossexuais. Eis a razão pela qual estes são considerados, e, em 1960, por ocasião do debate parlamentar a propósito
daí em diante, como indivíduos extremamente perigosos, na da implementação dos recursos destinados a lutar contra
medida em que eles se opõem ao que há de mais precioso na
ordem da criação: a lei natural, expressão da vontade divina.
43 O liberalismo do século XIX deve ser diferenciado, porque, de acordo com a
Impregnado do espírito canônico, o poder régio não tar- demonstração de J. Danet (1997), o silêncio dos Códigos Penais - de 1791 e,
dará, por sua vez, a instalar um sistema de repressão brutal em seguida, de 1810 - é acompanhado tanto por uma jurisprudência particu-
em relação aos sodomitas. Em meados do século XIII, o di- larmente repressiva contra os homossexuais quanto por um aparato médico-
reito consuetudinário da região de Touraine-Anjou [Coutu- psiquiátrico extremamente violento.

me de Touraine-Anjou] estabelece o seguinte: "Se alguém é 44 Do ponto de vista penal, a maioridade era de 13 anos para os atos heterossexuais
e de 21 anos para os atos homossexuais. A decisão do governo de Pétain tem a
suspeito de devassidão [bougrerie] contra a natureza, a justiça
ver com a política eugenística do poder nazista. De acordo com a observação
deve prendê-Io e enviá-Io ao bispo; e se for comprovado seu
de J. Danet (1977, p. 82), "para proteger a raça com eficácia, para salvar o povo
ato, ele deverá ser queimado; todos os seus bens móveis são da França de si mesmo, o marechal protege sua juventude e deve, evidentemen-
entregues ao suserano. E deve-se adotar esse procedimento te, protegê-Ia dos perversos". Sobre a história da penalização e despenalização,
em relação aos heréticos". ver o artigo de Lascoumes (1998).

54 Homofobia Origens e elementos precursores 55


alguns flagelos sociais, uma emenda será votada a fim de tanto os juristas quanto os políticos obstinam-se em fazer
incluir a homossexualidade ao lado do alcoolismo, proxe- apelo à tradição e à ordem natural para se oporem à igual-
netismo e do tráfico de mulheres.45 Daí em diante, em vez dade dos direitos em relação a gays e lésbicas. Nesse aspec-
de "pecado" contra a natureza, competência das autoridades to, uma obra recente dedicada à noção jurídica de casal dá
religiosas, a lei laica vai punir o "crime" e a "doença homos- o tom da reflexão ao proceder, desde a primeira página, à
sexual': Apenas em 1982, ao eliminar a diferença de idades seguinte proclamação: "Há urgência em definir o casal, por-
para o consentimento sexual, é que a França vai pôr termo à que Sodoma reivindica a plenitude de direitos" (BRUNET-
discriminação penal dos atos homossexuais.46 TI-PONS,1998).48Os exemplos são, portanto, numerosos e
No outro lado do Atlântico, as disposições bíblicas do ilustram perfeitamente as relações estreitas existentes entre
Levítico foram adotadas, ao pé da letra, pela lei penal. Em as raizes bíblicas do ódio contra os homossexuais e os dis-
1786, a Pensilvânia tornou -se o primeiro Estado a aplicar a cursos político-judiciais contemporâneos.
pena de morte para os sodomitas; a última execução ocor-
reu na Carolina do Sul, em 1873. Atualmente, um terço dos A Igreja Católica contemporânea
Estados norte-americanos continuam considerando as rela- e a condenação da homossexualidade
ções entre homens como um delito, e, em uma decisão de
Embora tenha demonstrado certa coragem ao pedir, pu-
1986, a Suprema Corte dos EUA julgava que a condenação
da sodomia não estava em contradição com a Constituição blicamente, perdão por algumas de suas vítimas no decor-
estadunidense, já que ela está enraizada nas normas morais rer da história - tais como Galileu, a comunidade judia ou
e éticas da tradição judaico-cristã.47 Ainda hoje, na França, os descendentes dos escravos -, a Igreja não se arrependeu
das atrocidades cometidas contra os homossexuais; muito
pelo contrário, ela persiste em justificar as discriminações
45 o autor da emenda, deputado Mirguet, defendia sua opinião com o seguinte argu-
de que eles ainda são vítimas. Em um documento recente
mento: "Penso que é inútil insistir detalhadamente porque todos nós temos plena
consciência da gravidade desse flagelo que é a homossexualidade, flagelo contra o
da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, o Vatica-
qual temos a obrigação de proteger nossos filhos': no lembra que as condenações tanto do Levítico, quanto do
46 Após a Libertação, em 1945 - ano em que os aliados derrotaram os nazistas que apóstolo Paulo mantêm-se atuais; a Igreja considera, efeti-
haviam ocupado a França, desde 1940 -, e até 1974, foi mantida a incriminação. vamente, que
A lei penal foi modificada apenas uma vez, pelo artigo 15 da Lei de 5 de julho de
1974, fixando a idade da maioridade civil aos 18 anos, o que levou a suprimir, na [...] esse julgamento da Sagrada Escritura não permite con-
definição da menoridade, a menção de 21 anos. Pela Lei de 23 de dezembro de cluir que todos aqueles que sofrem dessa anomalia sejam
1980, estabelece-se que os atentados ao pudor sem violência, qualquer que seja pessoalmente responsáveis, mas ele confirma que os atos
a natureza do ato, são todos aqueles cometidos com crianças e adolescentes com de homossexualidade são intrinsecamente desordenados e,
idade inferior a 15 anos. Portanto, ainda persistia a discriminação relativa à incri- qualquer que seja a circunstância, exclui-se a possibilidade
minação de homossexualidade a propósito de atos cometidos com adolescentes de aprová-Ios.49
de 15 a 18 anos, até mesmo com seu consentimento. Ao ab-rogar a 2a alínea do
artigo 331 do Código Penal, a Lei n° 82-683 de 4 de agosto de 1982 - na vigência
do primeiro mandato do presidente socialista, F. Mitterrand, eleito em 1981 -, 48 Para a crítica dos argumentos apresentados pelos juristas, ver "Fantasmes des
pôs fim à discriminação penal da homossexualidade. juristes ..:' (BORRILLO, 1999).

""Proibições contra a conduta (homossexual) têm raizes antigas [...] a condenação 49 Documento romano - Declaração "Persona humanà' - de 1976 sobre algumas
dessas práticas está firmemente enraizada nos padrões morais e éticos da tradição questões de ética sexual; cf. Théo - EEncyclopédie eatholique pour tous, 1989,
judaico-cristã [...] a invocação do requerente do Levítico e dos Romanos [...] é uma p. 823; cf. ALISON, 2008; BOFFO, 2009; BENTO XVI, 2010; SCOFIELD JR.,
afirmação de que os valores judaico-cristãos proíbem tal condutà' (BOWERS, 1986). 2010.

56 Homofobia Origens e elementos precursores 57


Além disso, a última versão do Catecismo da Igreja Católi- [...] eles devem ser acolhidos com respeito, compaixão e de-
ca (1992) estabelece o seguinte, na alínea 23575°: licadeza. Evitar-se-á, para com eles, qualquer sinal de dis-
criminação injusta. Essas pessoas são chamadas a realizar a
A homossexualidadeS! designa as relações entre homens, vontade de Deus em suas vidas e, se forem cristãs, a unir,
ou entre mulheres, que sentem atração sexual, exclusiva ao sacrifício da cruz do Senhor, as dificuldades que podem
ou predominante, por pessoas do mesmo sexo. Ela assume encontrar por causa de sua condição (alínea 2358).
formas muito variáveis ao longo dos séculos e das cultu-
ras. Sua gênese psíquica continua amplamente inexplicada. E como conclusão, o Catecismo acrescenta:
Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como
As pessoas homossexuaiss2 são chamadas à castidade. Pe-
depravações graves [cf. Gênesis, 19,1-29; Epístola aos Ro- las virtudes de autodomínio, educadoras da liberdade in-
manos, 1, 24-27; Primeira Epístola aos Coríntios, 6,9-10;
terior, às vezes, pelo apoio de uma amizade desinteressada,
Primeira Epístola a Timóteo, 1,10] a tradição declarou in-
pela oração e pela graça sacramental, elas podem e devem
cessantemente que "os atos de homossexualidade são in- aproximar-se, gradual e resolutamente, da perfeição cristã
trinsecamente desordenados". Eles são contrários à lei na-
(alínea 2359).
tural. Fecham o ato sexual ao dom da vida. Não procedem
de uma verdadeira complementaridade afetiva e sexual. Apesar da mudança de tom, subsiste a homofobia cató-
Em caso algum, podem ser aprovados".
lica. E, em vez de lançar os sodomitas na fogueira, trata-se,
A tolerância compassiva em relação a indivíduos homos- agora, de acolhê-Ios com compaixão a fim de que, na melhor
sexuais, assim como a condenação inapelável de qualquer das hipóteses, eles fiquem curados e, na pior, possam viver
política tendente a banalizar a homossexualidade, articula o na abstinência. A hostilidade da Igreja é, atualmente, muito
discurso da autoridade eclesiástica do Vaticano: "Um número mais sutil: já não é a homossexualidade enquanto fenômeno
não negligenciável de homens e mulheres apresentam ten- individual que será objeto da condenação eclesiástica, mas
dências homossexuais profundamente enraizadas", constata o sobretudo o indiferencialismo subjacente ao liberalismo
mesmo Catecismo. "Eles não escolhem sua condição homos- contemporâneo que, pela renúncia a problematizar a "dife-
sexual; ela constitui, para a maioria, uma provação:' Por con- rença homossexual", vai situá-Ia em um nível semelhante ao
seguinte, a Igreja Católica considera que da heterossexualidade; ora, é precisamente essa equivalência

"Chamada para a alínea 2347 (subtítulo: A integralidade da doação de si mes-


50 Essa alínea está incluída no subtítulo Castidade e Homossexualidade, que, por mo)': "A virtude da castidade desabrocha na amizade. Mostra ao discípulo
sua vez, se encontra na 3" Parte - A vida em Cristo; artigo 6° - Sexto Manda-
como seguir e imitar Aquele que nos escolheu como seus próprios amigos
mento; 11. A vocação à castidade. (N.T.).
[Evangelho de João 15,15: 'Já não vos chamo servos; com efeito, o servo não
51 Chamada para a alínea 2333*: "Cabe [referência à alínea 1603: O matrimô- sabe o que faz o seu Senhor. Eu vos chamo amigos porque vos dei a conhecer
nio na ordem da criação] a cada um, homem e mulher, reconhecer e aceitar tudo o que ouvi de meu Par], que se doou totalmente a nós e nos faz participar
sua identidade sexual. A diferença e a complementaridade físicas, morais e de sua condição divina. A castidade é promessa de imortalidade. A castidade
espirituais estão orientadas para os bens do casamento e para o desabrochar exprime-se, principalmente, na amizade ao próximo. Desenvolvida entre pes-
da vida familiar. A harmonia do casal e da sociedade depende, em parte, da soas do mesmo sexo ou de sexos diferentes, a amizade representa um grande
maneira como se vivem, entre os sexos, a complementaridade, a necessidade bem para todos e conduz à comunhão espiritual':
e o apoio mútuos': * Chamada para a alínea 374 (1" Parte; 2" Seção - A profissão dafé cristã; Capítulo
*Subtítulo: I. "Homem e mulher os criou..." e referência às alíneas 369-373 (cf. ra 1 - Creio em Deus Pai; Parágrafo 6 - O homem; IV. O homem no paraíso): "O
Parte; 2" Seção - A profissão da fé cristã; Capítulo 1 - Creio em Deus Pai; Parágrafo primeiro homem não só foi criado bom, mas também foi constituído em uma
6 - O homem; m. "Homem e mulher os criou": 369-370 - Igualdade e diferença amizade com seu Criador e em tal harmonia consigo mesmo e com a criação que
queridas por Deus; 371-373 - "Um para o outro" "Uma unidade a dois"). (N.T.) o rodeava que só serão superadas pela glória da nova criação em Cristo': (N.T.).

58 Homofobia Origens e elementos precursores 59


que se torna insuportável para as autoridades teológicas. A di- reprodução, imbuída de uma "violência desorganizadora da
ferença entre as orientações sexuais (hétero/homo) é a pedra relação humana e do tecido social" (p. 267).
angular da própria diferença sexual (masculino/feminino) Com um discurso renovado em sua forma, mas veicu-
(LACROIX, 1996). Nesse sentido, sem deixar de mostrar-se lando a mesma ideologia essencialista, a doutrina católica
sensível às discriminações de que os homossexuais são víti- permanece fiel ao princípio da autoridade e confirma sua vo-
mas no plano individual, a Igreja nos adverte contra a "rei- cação tradicionalista. Portanto, o tratamento teológico con-
vindicação homossexual" enquanto manifestação política. Ao temporâneo da homossexualidade não está, de modo algum,
servirem-se de um jargão psicanalítico e antropológico, os em ruptura com o pensamento da Escolástica, na medida em
teólogos católicos falam da homossexualidade como se tra- que ele se inscreve facilmente na lógica tomista. Ou, dito por
tasse de uma situação problemática resultante do acúmulo de outras palavras, segundo a Igreja, se é possível pressupor que
um duplo obstáculo: por um lado, a incapacidade de reco- os atos homossexuais consentidos não prejudicam a pessoa,
nhecer a alteridade (em que esta é reduzida sistematicamente comete-se um profundo equívoco, porque eles são contrá-
à dimensão sexual, na medida em que ela é, necessariamente, rios a algo muito mais precioso que a liberdade de outrem,
do sexo oposto) e, por outro, a impossibilidade de aceitar a a saber: tais atos opõem-se à ordem natural dos sexos e das
finitude do ser (a "esterilidade fenomenológicá' dos casais do sexualidades, assim como à vontade divina, que, ao criar-nos
mesmo sexo é interpretada como uma denegação de nossa homens e mulheres, atribuiu uma posição preeminente, no
condição mortal). Enquanto comportamento sexual adequa- âmago dessa ordem, à heterossexualidade.
do, somente a heterossexualidade seria suscetível de permi-
tir aos indivíduos a superação narcísica original (pecado) e
o impulso para avançar ao encontro do outro. Segundo essa
doutrina, a diferença sexual pode concretizar-se unicamente
na heterossexualidade. "O reconhecimento da diferença se-
xual é apresentado perfeitamente na Bíblia como o apogeu
da ordem da criação': observa o teólogo X. Thévenot (1992,
p. 266), que acaba deduzindo o seguinte: "Uma vez que o
reconhecimento em ato da diferença sexual condiciona o
próprio surgimento do sujeito humano, é "a-normativa"
qualquer conduta sexuada ou sexual que seja construída com
base em uma denegação do movimento de diferenciação': Eis
por que é necessário, para a Igreja, resistir às reivindicações
igualitárias dos/as homossexuais, sob pena de colocar em
perigo o próprio processo de humanização; assim, o padre
Thévenot lembra-nos que "o aspecto moral não está separado
do aspecto teológico" e, em seguida, acrescenta que, "se o mau
uso da diferença sexual é considerado grave, deve-se ao fato
de ser, antes de mais nada, o sintoma de uma perversão teo-
antropológicà' (p. 268). Desde então, qualquer reivindicação
igualitária aparece como uma ameaça à ordem da criação e da

60 Homofobia Origens e elementos precursores 61


Capítulo III

As doutrinas heterossexistas
e a ideologia homofóbica
""

Neste capítulo, vamos analisar as principais construções in-


telectuais que, na qualidade de condicionamentos cognitivos,
têm definido os contornos da homossexualidade como uma
manifestação específica da sexualidade humana. A elabora-
ção dessa diferença, longe de permitir uma compreensão mais
aprofundada das sexualidades que teria facilitado sua aceita-
ção, constituiu, em compensação, um instrumento temível de
repressão, em primeiro lugar, dos "vícios contra a naturezà'
e, em seguida, das "transgressões do instinto sexual normal':
Convém examinar, separadamente, os dois grandes mo-
mentos da concepção e do desenvolvimento da homofobia. No
capítulo precedente, empenhamo-nos em compreender as ori-
gens teológicas das atitudes anti-homossexuais; forma embrio-
nária das futuras teorias sobre o "desejo gay': a tradição canô-
nica limitava-se a condenar atos contrários à ordem divina sem
que, por isso, tivesse outorgado uma significação específica ao
que constituía uma falta moral. Ao condenar o adultério, o rou-
bo, a idolatria, a hipocrisia ou a sodomia, a tradição teológica
não tentou construir, a partir dos atos contrários à Lei de Deus,
uma personalidade adúltera, criminosa, idólatra, hipócrita ou
sodomita; tratava-se de uma proibição geral, enunciada sob di-
ferentes formas do pecado da carne (FOUCAULT, 1976-1984). E
se, em algum momento, foi mencionado o "vício contra a na-
turezà' para fazer referência à homossexualidade, essa nature-
za foi interpretada, sobretudo, como uma ordem moral, e não
como um dado científico neutro. Ora, essa passagem da con-
denação do vício sodomítico para a interpretação "científicà'
da atração sexual e afetiva por pessoas de seu próprio sexo, pa-
rece-nos capital. Com efeito, nesse momento, algumas formas
secundárias da heterossexualidade, tais como a sexualidade

63
infantil, a masturbação, o fetichismo e a sodomia, assumem ver- mas sobretudo do discurso na área da medicina. A própria
dadeira autonomia. Começando por estar a serviço da medicina noção de homossexualidade é o resultado de uma tentativa de
e, em seguida, das ciências sociais (e em detrimento do direi- medicalização da velha ideia de sodomia; seus precursores fo-
to e da moral), os prazeres homossexuais tornam-se o objeto ram Karl Heinrich Ulrichs53 (1825-1895), assim como Károly
privilegiado de uma nova tentativa de normalização dos indi- Mária Kertbeny54 (1824-1882). Com efeito, eles consideram
víduos e da subjugação das consciências. A antiga hostilidade que a ausência de desejo pelas pessoas do sexo oposto impele
religiosa contra os sodomitas encontra nova vitalidade em um a relações necessariamente estéreis, situação considerada for-
discurso que, revestido de linguagem científica, torna legítima çosamente patológica, sobretudo, em um momento em que
a inferiorização e, às vezes, até mesmo o extermínio dos indi- a teoria darwiniana sobre a evolução das espécies - ampla-
víduos considerados, daí em diante, não mais como pecadores, mente disseminada nas esferas científicas - confere posição
contrários à ordem divina, mas como perversos (ver FOUCAULT, de destaque à reprodução sexual. Outros médicos e psiquia-
1976-1984, t. I, p. 59) e perigosos para a ordem sanitária. tras da época propõem uma interpretação mais diferenciada.
A ideologia homofóbica está contida no conjunto das Em particular, nos escritos de Carl Friedrich Otto Westphal
ideias que se articulam em uma unidade relativamente sis- (1833-1890), Ríchard Freiherr von Krafft-Ebing (1840-1902)
temática (doutrina) e com finalidade normativa (promover e Arrigo Tamassia (1849-1917), foi possível ler que a atra-
o ideal heterossexual). Forma sofisticada das concepções ção de pessoas por outras de seu próprio sexo constitui uma
populares e cotidianas sobre a homossexualidade, as teorias forma de "monomania afetivà' que, entretanto, não afeta, de
homofóbicas, através de suas diferentes vertentes, propõem modo algum, o resto da personalidade do homossexual. Em-
uma forma de considerar os gêneros e as sexualidades pela bora esses autores tivessem tido a intenção de lutar, pelo viés
construção de um sistema de valores (a promoção da heteros- da medicalização, em favor de uma descriminalização dos
sexualidade monogâmica) e pela proposição de um projeto comportamentos homoeróticos, uma forma moderna de hos-
político (a diferenciação, a cura, a segregação ou a eliminação tilidade começou a desenhar-se, desde o final do século XIX,
dos/as homossexuais). As doutrinas heterossexistas permitem desencadeada por essa patologização da homossexualidade.
fortalecer a dominação dos "normais" sobre os "anormais", Do mesmo modo que a teoria contemporânea do darwinismo
além de ter em comum - da medicina à sexologia, passando social serviu, conforme sublinha G. Chauncey (1985), para
pela psicanálise e pela antropologia - essa formidável capaci- legitimar o racismo e o colonialismo, ao defender a ideia de
dade para produzir discursos sobre a homossexualidade; aliás, uma hierarquia racial do desenvolvimento social baseada na
tais discursos estão na origem da justificativa das políticas biologia, assim também as primeiras teorias sexológicas jus-
discriminatórias. Vamos abordar, aqui, as principais opiniões tificaram a subordinação das mulheres ao afirmar seu cará-
(apresentadas em sua linguagem científica), agrupando-as em ter biologicamente determinado; e, paralelamente, em razão
função da ideia central, articuladora de uma forma proble-
mática de analisar o desejo pelas pessoas de seu próprio sexo. 53 Ele próprio homossexual, K. Ulrichs publicou numerosos artigos sob o pseudô-
nimo de "Numa Numantius" ao popularizar o termo "uranismo" para referir-se
A homofobia clínica à homossexualidade provocada por uma anomalia hereditária que produzia
uma "alma feminina presa no corpo de um homem'; mais tarde, Carl Westphal
No decorrer do século XIX, a força normativa do casal retoma as teses de Ulrichs para afirmar a existência de um "terceiro sexo': no
heterossexual culmina na rejeição do celibatário e do homos- qual ele coloca os homossexuais.
sexual. Essa normatização deixará de emergir - como ocorria 54 Esse escritor húngaro de expressão alemã teria sido, segundo T.-C. Feray (1989,
durante os séculos precedentes - da lei divina ou do direito, p. 24), o inventor da palavra "Homosexualitiit':

114 llomofobia As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 65


de seu destino anatâmico, os homossexuais acabaram sendo procurada com o objetivo de integrá-Ia em uma teoria plu-
situados em uma posição marginal no âmago da "hierarquia ralista da sexualidade normal, mas, exatamente o contrário,
sanitárià' dos sexos e das sexualidades. A crença nas relações vai situá-Ia nas categorias da doença, neurose, perversão ou
estreitas que se estabelecem entre o físico e o moral incentiva excentricidade.
a forjar uma imagem feminina da nova espécie: o apreço por Enquanto a homossexualidade masculina é claramente
joias, o balanço dos quadris, a maquiagem e os perfumes equi- medicalizada, por sua vez, a figura da lésbica assume con-
param o "pederastà' à mulher. Aliás, com esta, ele compartilha tornos mais equívocos, de acordo com a observação de H.
os defeitos: tagarelagem, indiscrição, vaidade, inconstância e Corbin (1964): "O imaginário de Safo, elaborado pelos ho-
duplicidade. Ao pretender desmascarar a personagem, a me- mens desta época, permanece ambíguo; ela traduz o vaivém
dicina legal esboça, a seu respeito, um retrato extravagante, co- entre o fasCÍnio exercido pela profusão feminina e o temor
lando-lhe todas as marcas de infâmia do século XIX. Em 1857, que inspira o prazer da mulher ao manifestar-se na ausência
o perito médico-legal, A.-A. Tardieu (1995), escreve que do homem'. O desaparecimento da mediação do masculino
[...] o pederasta transgride a higiene e a limpeza, além de transforma a lésbica em uma personagem subversiva. Assim,
ignorar a lustração que purifica. A própria morfologiaper- as primeiras explicações psicoanalíticas do lesbianismo falam
mite seu reconhecimento:a configuraçãodas nádegas,o re- de uma rejeição dos homens e de uma recusa da feminilidade
laxamentodo esfíncter,o ânus afunilado ou, então, a forma
(O'CONNOR; RYAN apud PEERS; DEMczuK, 1998, p. 86).
e a dimensão do pênis confirmama filiaçãoà nova espécie. A feiticeira e o xamã foram investidos, outrora, pelo
Monstrona nova galeriados monstros, o pederastamantém
uma estreitarelaçãocom o animal;em seus coitos,eleevoca imaginário popular dessa inversão dos papéis. Da exclusão
o cão.Sua natureza acabapor associá-loao excremento;ele à qual esses personagens foram submetidos durante o Anti-
vai à procura do fedor das latrinas... go Regime, passa-se, com o triunfo da burguesia, para uma
qualificação mais racional, mais "científicà' dos invertidos;
Mesmo que, mais tarde, a justificativa discriminatória
daí em diante, em vez de excluí-los, trata-se de endireitá-
tenha tendência a girar em torno das "anomalias psíquicas"
em vez das causas somáticas, estas nunca foram totalmen- los, corrigi-los e curá-los a fim de adaptá-los melhor à nor-
te abandonadas na explicação da homossexualidade. 55 A ma imposta pelo modelo monogâmico heterossexual, único
detentor da sexualidade legítima, insígnia exibida por uma
interpretação proposta pela medicina - e, em sua esteira,
classe ascendente.
pela psicanálise - a respeito da homossexualidade será, por
Na tentativa de fornecer uma explicação para a questão
si só, uma forma de homofobia, já que a diferença nunca é
"como alguém se torna homossexual?", todas as teorias na área
da medicina pressupõem que tal situação deve ser evitada; e é,
55 O Dr. E. Bérillon (1859-1948), médico-inspetor dos asilos públicos franceses para
justamente, por essa razão que, em vez de se limitarem a uma
alienados, sublinha que, "se a primeira condição para ser um bom heterossexual e
o objeto da atração do sexo oposto consiste em ter um bom odor, de modo que o
tarefa puramente hermenêutica, elas empenham-se em um
estado contrário predispõe certamente à homossexualidade. [...] para um homem, verdadeiro empreendimento terapêutico do tipo normativo.
a transgressão do instinto genésico tem seu ponto de partida em uma atenuação Eis por que - a fim de livrar os moralistas e, em particular, a
das percepções olfativas e gustativas; na mulher, as anomalias da atração sexual Igreja, dessa questão - convinha, em primeiro lugar, demons-
encontram sua causa primitiva em uma ampliação das mesmas percepções sen-
trar que a homossexualidade constituía uma patologia susce-
soriais. Portanto, feitas as contas, a inversão sexual, ou a homossexualidade, em
um ou outro sexo, não passaria de uma inversão sensorial. Dessa noção, deriva,
tível de ser diagnosticada e tratada pelas ciências médicas. No
no tratamento da homossexualidade, a indicação formal de situar a reeducação do
entanto, a medicina nunca conseguirá desvencilhar-se da re-
sentido olfativo na base de qualquer intervenção terapêuticá' (1909, p. 46). ferência à ordem natural, entendida simultaneamente como

As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 67


66 Homofobia
ordem moral 56 e ordem jurídica. As ciências médicas do final blenorragia retal, a sífilis, os corpos estranhos introduzidos
do século XIX qualificam, sistematicamente, as relações entre no ânus [...] dimensão exagerada do pênis [ou, ainda], um
pessoas do mesmo sexo como atos "contra a natureza"; ora, pênis encurvado [eis alguns dos sinais característicos do ho-
mossexual] (TARDIEU,1996, p. 177 e 189).
não é anódino se a questão é abordada, em primeiro lugar,
pela medicina legal (Dictionnaire encyclopédique, 1886, p. Ora, esses estigmas físicos não passam do testemunho mate-
239). Todavia, para os teólogos, o vício se encontra na alma, rial de uma depravação profunda inscrita no espírito dos inver-
enquanto para os médicos ele tem de ser procurado no corpo: tidos. No decorrer do século XX, desenvolve-se um verdadeiro
a genitália, o pênis, o escroto, a ranhura bálano-prepucial, as empreendimento de investigação das origens psicológicas da
coxas, o ânus, a boca, os dentes ... por toda parte, no físico do inversão sexual. Ao transformar a sexualidade na chave her-
sodomita, é possível encontrar as marcas de sua perversão. menêutica do comportamento humano, a teoria psicanalítica
Os cabelos frisados, a tez maquiada, o colarinho aberto, a cin- interessa-se, particularmente, pela homossexualidade. Em sua
tura apertada de maneira a fazer sobressair as formas, além de célebre obra Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905),
dedos, orelhas e peito carregados de joias, toda a personalidade S. Freud apresenta a hipótese da bissexualidade original: ideia
exalando o odor dos mais penetrantes perfumes e, na mão, um audaciosa que lhe permite abordar a questão da homossexua-
lenço, flores ou algum tipo de bordado; tal é a fisionomia estra-
lidade sem condená-Ia. No entanto, ele não escapa à sua época;
nha, repugnante e, com toda a razão, suspeita, que atraiçoa os
pederastas. Um traço não menos característico - e, inúmeras com efeito, se a bissexualidade é algo de peculiar à organização
vezes, observado por mim - é o contraste dessa falsa elegância psíquica humana, a heterossexualidade permanece a referên-
e desse culto externo da pessoa com uma imundície sórdida cia em função da qual deve ser analisada a homossexualidade.
que, por si só, bastaria para ficar afastado desses miseráveis. Desde as primeiras páginas de seu livro, o médico austríaco
empenha-se em proceder a uma análise aprofundada do que
É assim que A.-A. Tardieu (1995, p. 173)57 define o pede-
rasta passivo. Em relação à "devassidão felatória", o médico ele designa por inversão: esta pode ser congênita ou adquirida,
ocasional ou absoluta, "limitar-se a um episódio que leve a uma
observou o seguinte: "Uma boca de través, dentes muito cur-
evolução normal; e pode, até, exteriorizar-se tardiamente, após
tos, lábios espessos, entornados, completamente deformados,
um longo período de sexualidade normal" (FREUD, 1963, p.
em relação com seu uso infame" (Dictionnaire encyclopédi-
que, 1886, p. 250), assim como 24). A inversão permite, assim, definir a normalidade, porque,
se é possível admitir uma forma de bissexualidade subjacente
[...] o desenvolvimento excessivo das nádegas, a deformação em todos os indivíduos, um espírito constituído saudavelmente
infundibuliforme do ânus, o relaxamento do esfíncter, a su-
deve tender apenas para a heterossexualidade exclusiva. Freud
pressão das dobras, as cristas e carúnculas em volta do ânus,
a dilatação extrema do orifício anal, a incontinência das ma- e, ainda mais, seus discípulos, consideram a homossexualida-
térias, as ulcerações, as rágades, as hemorroidas, as fístulas, a de como um "contratempo" na evolução sexual; sem ser um
crime ou um pecado propriamente dito, tampouco uma do-
ença, a homossexualidade torna-se um acidente no percurso
560 qualificativo "vício" - utílízado, regularmente, nos textos da área da medi-
relacional da criança com os pais. Fixado em uma fase autoeró-
cina - mostra o posicionamento moralizante adotado pelos médicos.
tica (narcisismo), assustado pela ideia de perder o pênis (teoria
57 A terceira parte dessa obra é dedicada à pederastia e à sodomia: "Durante muito
da castração), incapaz de resolver convenientemente a relação
tempo, hesitei em introduzir, neste estudo, o quadro repugnante da pederastià;
sublinha o autor. E cita a afirmação daquele que é considerado como o pai da com a mãe (teoria do complexo de Édipo), identificado com
medicina legal, E-E. Fodéré (1764-1835): "O que eu não daria para livrar-me de ela e invadido pelo ciúme em relação ao pai, o homossexual é
conspurcar minha pena com a infame torpeza dos pederastasl" (p. 155). descrito como um deficiente no plano da afetividade que não

68 Homofobia 69
As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica
pôde ou não soube superar os conflitos capitais da infância. A A homossexualidade - sublinha Lacan - não deixa de ser o
ideia segundo a qual uma "boà' solução dos conflitos culmina que ela é: uma perversão" (LACAN,1991, p. 42-43).59
necessariamente na heterossexualidade exclusiva encontra-se As explicações propostas pela psicanálise têm a ver com a
no âmago da teoria psicanalítica. A preeminência de uma forma ideologia. Os gays e as lésbicas são oriundos de famílias dota-
de sexualidade em relação a outra aparece como uma concessão das de tipos semelhantes às dos heterossexuais ou bissexuais; o
intelectual à sociedade conservadora do início do século XX. desejo por pessoas do mesmo sexo ou por pessoas mais idosas
Ao ser formulada a questão para saber se um homosse- ou mais jovens, a atração por louros ou morenos, por intelec-
xual podia tornar-se psicanalista, tanto S. Freud quanto S. tuais ou artistas, assim como a preferência pelo tipo asiático
Ferenczi - que, em sua época, não deixavam de ser bastante ou mediterrâneo poderiam ser explicados de várias maneiras
progressistas58 - dobraram-se às exigências de E. ]ones, que, e no contexto de cada história pessoal. Afinal de contas, "qual é
no âmago da International Psychoanalytical Association, re- prova de que a heterossexualidade não é tão complexa quanto
cusou categoricamente considerar a questão ao assinalar que, a homossexualidade e não é também o produto de lutas na pri-
na percepção das pessoas, a homossexualidade era "um cri- meira infância e na infância para superar, entre outros aspectos,
me repugnante: se um de nossos membros viesse a cometê- traumatismos, conflitos e frustrações?" (STOLLER, 1989,p. 135).
10, seríamos gravemente desacreditados por sua presença, ele Se pode parecer legítimo questionar-nos sobre nossos
iria atrair para nós um grave descrédito': Mais tarde, Anna próprios desejos ou procurar conhecer as razões que condi-
Freud há de empreender uma ardente luta contra o acesso cionam nossas preferências sexuais, a problematização de um
dos homossexuais à profissão psicanalítica. Sendo ela própria tipo de desejo, em detrimento de todos os outros, pressupõe
lésbica, a filha do pai da psicanálise "teve sempre o objetivo que os únicos seres a serem considerados "normais" sejam
de transformar seus pacientes homossexuais em bons pais aqueles que amam as pessoas do sexo oposto, além de terem
de família heterossexuais, no decorrer de sua prática clínicà' a mesma cor de pele, a mesma idade, serem oriundas do mes-
(PLON;ROUDINESCO, 1996, verbete "Homosexualité", p. 450). mo meio social, praticarem a mesma religião e pertencerem
a uma cultura comum. Na realidade, esse pressuposto não
Do mesmo modo, J. Lacan, figura progressista da nova
psicanálise, não escapará aos preconceitos homofóbicos. possui qualquer apoio racional, mas baseia-se em um postu-
lado arbitrário que consiste em acreditar na superioridade das
De fato, ele vai ainda mais longe que Freud ao lembrar o
tendências heterossexuais e na doxa etnocêntrica segundo a
caráter fundamentalmente perverso da homossexualidade,
qual é preferível permanecer entre pessoas do mesmo meio,
tanto na Antiguidade quanto em nossos dias: "Apretexto de
em vez de expor-se às diferenças, sejam elas sexuais, culturais,
ser uma perversão aceita, aprovada, até mesmo, festejada,
sociais, de geração e/ou políticas.
não nos venham dizer que não se trata de uma perversão.
A busca das causas da homossexualidade constitui, por
si só, uma forma de homofobia (DORAIS,1994), já que ela
"Em 1903, Freud defende publicamente, no diário Die Zeit, um homem pro- se baseia no preconceito que pressupõe a existência de uma
cessado judicialmente por práticas homossexuais. Em 1935, em carta enviada sexualidade normal, acabada e completa, a saber: a heterosse-
a uma mãe que lhe havia pedido conselho em relação ao filho, ele escreve o
xualidade monogâmica em função da qual se deve interpretar
seguinte: "De acordo com sua carta, fiquei com a impressão de que seu filho é
homossexual [...]. A homossexualidade não é, evidentemente, uma vantagem,
e julgar todas as outras sexualidades. Partindo da ideia de que
mas não há qualquer motivo para sentir vergonha: não se trata de um vício,
as diversas formas de sexualidade entre adultos conscientes
nem de um aviltamento, tampouco seria possível qualificá-Ia como doença;
nós a consideramos como uma variação da função sexual, provocada por uma
espécie de interrupção do desenvolvimento sexual". 59 Sobre a homofobia psicanalítica, ver Éribon, 1999b.

70 Homofobia As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 71


merecem o mesmo respeito e considerando que a pluralidade A homofobia antropológica
constitui um valor das democracias modernas, trata-se de abor-
Baseada em uma figura específica do darwinismo social, a
dar a questão relativa à origem não da homossexualidade, mas,
homofobia antropológica surge do recurso à teoria da dege-
de preferência, da homofobia. Ora, foi apenas há pouco que a nerescência das culturas a fim de explicar a inversão sexual.
psicanálise começou timidamente a problematizar a violência
Assim, o processo de evolução psicossexual do indivíduo e o
homofóbica quando, afinal, a questão homossexual nunca che-
da civilização estão estreitamente associados. De fato, Krafft-
gou a ser abandonada. Qualquer classificação ou hierarquiza-
Ebing afirmava que a sociedade primitiva aceitava práticas
ção das orientações sexuais deve ser considerada arbitrária, por
sexuais que a civilização considera como contrárias à ordem
estar destituída de um fundamento legítimo; trata-se de simples
moral e jurídica. Ao prazer sem freios dos selvagens, a so-
juízo moral, de um preconceito e de uma recusa do pluralismo ciedade vitoriana (que o autor considera como a civilização
das sexualidades. Mas, como observa D. Éribon (1996):
mais avançada) opõe a ordem das relações sexuais humanas
Esse inconsciente homofóbico é, sem dúvida, o aspecto mais fundadas no amor heterossexual monogâmico; por conse-
bem compartilhado no mundo dos psicanalistas; até mesmo guinte, qualquer outra forma de sexualidade - e, em particu-
os mais abertos procuram manter não só uma diferença en- lar, a homossexualidade - é considerada uma regressão a um
tre as sexualidades e entre as orientações sexuais, mas uma
estágio inferior da evolução e, nesse sentido, um perigo para
hierarquia, que reserva sempre uma posição inferior e su-
bordinada à homossexualidade.60 a própria civilização.
O antropologismo moderno deixa de se basear na hierarquia
Recentemente, foi ainda pelo viés da psicanálise que várias das sexualidades e até condena o discurso que reenvia certas
personalidades - com o apoio público dos representantes dessa práticas sexuais às margens da civilização. A homossexualidade
disciplina - opuseram-se, na França, à igualdade dos direitos deve ser não só tolerada, mas também reconhecida, com a con-
para gays e lésbicas.6l O antigo "senso comum homofóbico" vol- dição de que ela não elimine a divisão entre masculino e femini-
tou a aparecer sob as aparências retóricas da psicanálise - a "ne- no, considerada como estruturante do indivíduo, do casal e da
gação do outro': a "recusa da alteridade': a "estagnação narcísica" sociedade. O antropologismo contemporâneo postula, assim, a
ou a "denegação da realidade da castração" -, que foram evoca- diferença entre os sexos como um dado universal e a transforma
das como causas possíveis do desejo homossexual. No entanto, em pedra angular do regime das sexualidades. Enquanto reivin-
essas teorias foram, há muito tempo, vigorosamente desmenti- dicação individual (e na medida em que ela permanece confi-
das no próprio âmago das disciplinas psicomédicas, a tal ponto nada à privacy ou a uma forma limitada de reconhecimento), a
que, em 1974, a American Psychiatric Association, suprimiu a homossexualidade pode ser integrada, sem qualquer problema,
homossexualidade da lista das doenças mentais62 - decisão con- à ordem da diferença dos sexos. Em compensação, se ela supera
firmada, mais tarde, pela Organização Mundial da Saúde. a liberdade individual ou o reconhecimento no âmbito de deter-
minados limites para situar-se em um plano político e jurídico
semelhante à heterossexualidade, a homossexualidade é, então,
60É impressionante constatar que a Bncyclopédie Universalis (1994, t. lI, p. 621)
confirma essa inferiorização ao designar a homossexualidade como uma "per-
versão" com incidências "essencialmente conservadoras':
distúrbio mental constitui a primeira etapa na desmedicalização dos comporta-
61 Com exceção, por exemplo, de S. Prokhoris, É. Roudinesco, G. Delaisi de Par- mentos homoeróticos. Mas, apenas em 1987 é que o processo chegará a seu termo,
seval e M. Tort. Ver, em particular, os artigos de S. Prokhoris e G. Delaisi de quando a homossexualidade egodistônica (uma forma de nosologia que permite
Parseval em Borrillo, Fassin e Iacub (1999). atribuir o qualificativo "patológico" às tendências homossexuais daqueles ou da-
62 A retirada da homossexualidade do Diagnostic Statistieal Manual (DSM) enquanto quelas que têm dificuldade em vivê-Ias) desaparece também da lista.

72 As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 73


Homofobia
percebida pela ideologia antropologista como uma ameaça à di- permite que esta seja erigida como princípio político. Ora, a
ferenciação dos sexos, elemento indispensável para a estrutura- ausência de atração erótica pelas pessoas do outro sexo não
ção psíquica do indivíduo e para a sobrevida da civilização. As- implica, de modo algum, uma recusa ou qualquer negação
sim, a reivindicação homossexual corre o risco de embaralhar da alteridade, a não ser que o outro seja reduzido à sua pura
essa necessária diferenciação e de colocar em perigo a própria dimensão sexuada. Mesmo que essa diferença fosse facilmen-
sobrevivência da ordem heterossexual. Além disso, te constatada, nada permitiria transformá-Ia em um critério
qualquer de organização social e política.
[...] a banalização do sexo, assim como a exploração erótica,
Devemos nos precaver não da homossexualidade, mas da
a mudança frequente de parceiros, a atividade sexual solitária
da masturbação ou o sexo indiferenciado da homossexuali- homofobia. Longe de se preocupar da preservação da diferença
dade dão testemunho de um profundo desencantamento e dos sexos, os países que haviam estabelecido a igualdade dos
deixam de ser o sinal de originalidade: através de todas essas direitos em favor de gays e lésbicas são, também, aqueles que
práticas, o indivíduo não tem outra saída além da solidão e da garantiram, muito antes da França, a igualdade das mulheres.
busca de ser seu inencontráve1 (ANATRELLA, 1990).
Em compensação, o discurso que enfatiza a divergência sexual
Essa paixão pela dessimbolização é, assim, denunciada como encontra-se na origem da legitimação das desigualdades. Do
um deslize em direção à insensatez individual e à loucura social. mesmo modo que a diferença das raças ou a das classes, a
A homofobia antropológica não se satisfaz em constatar a distinção dos sexos permitiu organizar uma distribuição de-
diferença anatômica dos sexos. Ao transformar esse dado bio- sigual dos papéis sociais. A organização da sociedade em fun-
lógico em um princípio fundamental ao qual a sociedade deve ção unicamente de dois sexos e o fato de ver "naturalmente",
em cada indivíduo, um homem ou uma mulher, constitui o
submeter-se - sob pena de provocar uma importante catástrofe
antropológica -, os partidários dessa variante do heterossexis- suporte "objetivo': "evidente" e "anistórico" da atribuição do
mo, ao pretenderem respaldar a ordem social em princípios status e dos papéis em função unicamente do critério sexual.
universais e imutáveis, reatualizam o pensamento naturalista. O "consenso cognitivo"63 da diferença entre os sexos oposto
aos homossexuais a fim de limitar a amplitude de suas rei-
A igualdade dos direitos para gays e lésbicas é considerada, por
conseguinte, uma ameaça para a essencial divisão dos sexos; vindicações é semelhante ao que serviu para tornar natural e
normal, na ordem social, a subordinação das mulheres.
além disso, em nome dessa divisão é que as uniões homossexuais
Contrariamente a essa "evidência antropológica': a diferen-
devem ser deixadas à margem do direito da família. Apresenta-
da como científica, essa doutrina representa uma forma parti- ça entre os sexos não constitui um atributo dos indivíduos, mas
cularmente dissimulada de militância anti-homossexual, já que uma informação construída e concretizada sempre na relação
com os outros. Como é ilustrado por C. West e S. Fenster-
a diferença dos sexos torna-se não só a justificativa da exclusão,
maker (1995), muito mais que um papel ou uma característica
mas também o critério em função do qual gays e lésbicas são
do indivíduo, a dicotomia masculino/feminino é um meca-
denunciados enquanto responsáveis pela destruição dos prin-
cípios fundamentais da civilização. nismo pelo qual determinada situação social contribui para a
O fantasma segundo o qual o reconhecimento igualitário reprodução da estrutura social. De tal modo que a reação an-
do casal homossexual colocaria em perigo a diferença dos se- tropológica à igualdade de direitos em favor de gays e lésbicas
contribui para a reprodução da ordem social das sexualidades,
xos é alimentado por um duplo preconceito heterossexista: por
um lado, que o desejo sexual pelas pessoas do mesmo sexo im-
plica, necessariamente, a recusa dos indivíduos do sexo opos- 63 Para uma análise mais aprofundada sobre a construção cognitiva dos sexos, ver
to e, por outro, que a verificação biológica da dessemelhança Zimmerman,1978.

7~ As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 75


Homofobia
permitindo que, uma vez mais, seja legitimada a inferioriza- independentemente da orientação sexual dos indivíduos. For-
ção dos homossexuais e dos casais do mesmo sexo. ma de expressão específica, a homofobia liberal confina os ho-
mossexuais no silêncio da vida privada; as dicotomias privado/
A homofobia liberal
público, dentro/fora, interior/exterior organizam a hierarquia
A vida privada não pode ser fonte de direitos; para o libe- das sexualidades, reservando a posição visível para um aspecto,
ralismo, a garantia das liberdades individuais é algo distinto mantendo o outro em segredo. O pudor e a discrição devem
da outorga efetiva de direitos. Considerada uma manifesta- orientar os atos homossexuais, sempre taciturnos, ao passo que
ção íntima, a sodomia foi descriminalizada na França, ime- a heterossexualidade exibe-se livremente, sem necessidade de
diatamente após a Revolução Francesa, porque o novo Estado qualquer justificativa. As práticas homossexuais e suas mani-
abstinha-se de interferir na esfera privada; mas, na realidade, festações são de natureza privada e permitidas com a condição
a supressão do crime de sodomia não impediu que os juízes de permanecerem circunscritas a esse espaço. Em compensa-
ção, ao assumirem a forma heterossexual, as mesmas condutas
continuassem a punir os atos eróticos entre pessoas do mes-
mo sexo (cf. DANET, 1977). tornam-se expressão do amor e se desenvolvem livremente no
espaço público: os heterossexuais beijam-se e dançam juntos
Uma dupla ideia organiza o discurso dos liberais sobre os
na rua, mostram publicamente as fotos dos/as parceiros/as,
homossexuais: por um lado, eles consideram a homossexuali-
declaram em público amor eterno e nunca fazem o coming-
dade uma escolha, cuja natureza é semelhante a de uma opinião
out heterossexual, já que o espaço público lhes pertence. Mas,
política, de uma confissão religiosa ou de um compromisso in-
quando um gay ou uma lésbica têm a ousadia de empreender
telectual; por outro, tal opção estaria relacionada exclusivamen-
uma dessas manifestações, eles/as são imediatamente conside-
te à vida íntima do indivíduo. Em função desses pressupostos é
rados/as militantes ou provocadores/as.
que a homofobia liberal preconiza a tolerância para com os ho-
Essa forma de homofobia pode ser considerada liberal no
mossexuais, mas considera que a heterossexualidade é a única
sentido que ela pretende garantir o respeito pela intimidade
a merecer o reconhecimento da sociedade e, por conseguinte, o
e por suas manifestações privadas sem que seja reconheci-
único comportamento sexual suscetível de ser institucionaliza-
da qualquer garantia aos indivíduos homossexuais perante a
do. Em compensação, relativamente a gays e lésbicas, o Estado sociedade. Com efeito, o aspecto em que a liberdade se dife-
deve simplesmente assegurar o respeito por suas vidas privadas rencia do direito é o seguinte: ela não implica qualquer dever
no sentido estrito do termo, ou seja, garantir o respeito da esfera em contrapartida. Enquanto não há direito sem obrigação, a
íntima do indivíduo; no entanto, além dessa esfera, não se deve,
liberdade exige apenas o respeito por sua manifestação. É as-
em nenhuma hipótese, ceder às reivindicações de igualdade. sim que, para a ideologia liberal, o Estado deve simplesmente
Baseada na dicotomia vida privada/vida pública, a homofobia garantir o exercício da liberdade homossexual, exclusivamente,
liberal remete a homossexualidade a uma escolha de vida priva- nos limites da intimidade; em compensação, tratando-se dos
da, círculo Íntimo em que toda intervenção externa é condená- indivíduos heterossexuais, sua vida íntima - em particular, a
vel (é por essa razão que os liberais são a favor da descriminali- vida de casal e de família - supera amplamente a esfera privada,
zação da homossexualidade), mas, igualmente, a partir do qual obtendo o reconhecimento e a proteção específica do próprio
é proscrita qualquer outra reivindicação além do respeito pela Estado, que assume o dever de sua garantia. Enquanto os casais
intimidade. A tolerância é a palavra de ordem da homofobia li- heterossexuais tornam-se verdadeiros beneficiários dos direi-
beral, mas convém distinguir entre tolerar e reconhecer: para tos conjugais, sociais, patrimoniais, sucessórios, extrapatrimo-
essa doutrina, é impossível tentar passar da tolerância dos com- niais, familiares ..., as uniões entre pessoas do mesmo sexo são
portamentos Íntimos ao reconhecimento dos direitos iguais, convidadas a permanecer na discrição de sua intimidade.

'111 I-Tomofobia As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 77


Ao inventar o mito da "escolhade vida privadà: a homofobia comunismo foram incapazes de escapar à doxa homofóbica.64
liberal encontrou a justificativa para sua lógica de exclusão. As- Em uma carta enviada para K. Marx, em 22 de junho de 1869,
sim, se os/as homossexuais não usufruem de direitos, é porque F. Engels escrevia o seguinte:
eles/as situaram-se, pela escolha de suas práticas sexuais,volun- Os pederastas já são numerosos e estão descobrindo que cons-
tariamente fora do contrato social e,por conseguinte, do direito. tituem um poder no Estado. Só lhes falta a organização, mas,
Apesar de seu caráter contestável, baseado no pressuposto de segundo parece, ela já existe em segredo; além disso, contam
que os homossexuais escolhem sua sexualidade, nada permite com homens importantes em todos os partidos mais antigos
excluir, neste caso, que os heterossexuais escolhem sua hete- e, até mesmo, nos mais recentes, desde Rõsing até Scheweitzer.
Daqui em diante, vai virar moda dizer "guerra às xoxotas, paz
rossexualidade: mas então, por que uma escolha privaria umas
para os fiofós" [guerre aux cons, paix aux trous-de-cul]. Que
pessoas dos direitos atribuídos a outras a não ser pelo fato de sorte a nossa, por sermos demasiado idosos; assim, não tere-
que tal opção é a da homossexualidade? Com efeito, ou nin- mos a obrigação de pagar tributo com nosso corpo à vitória
guém escolhe sua sexualidade e o Estado garante os mesmos desse partido. Mas e a jovem geração! Diga-se de passagem,
direitos para todos, ou todo o mundo faz sua própria escolha apenas na Alemanha é que um tipo semelhante (Ulrichs) pode
manifestar -se e transformar tal obscenidade em teoria [... ].
e tal opção não condiciona, de modo algum, o exercício dos
Infelizmente, ele ainda não tem coragem de confessar aberta-
direitos. O aspecto inaceitável é a política de dois pesos e duas mente o que é [... ]. Mas está aguardando somente que o novo
medidas preconizada pela homofobia liberal. Código Penal da Alemanha do Norte reconheça os "direitos da
A noção de vida privada, exibida contra o reconhecimento sacanagem" e a situação vai mudar completamente (COUROU-
das uniões entre pessoas do mesmo sexo é, além de anacrôni- VE; KOZERAWSKI,Fragments 2, 1980-1981).
ca, unilateral. De acordo com a observação de O. de Schutter,
Engels considera que a emergência da homossexualidade na
a vida privada, enquanto simples garantia da confidenciali-
Grécia Antiga seja o resultado da desintegração moral dos ho-
dade de algumas informações ou preservação de uma esfera
mens. Em seu livro publicado em 1884- A origem da família, da
íntima circunscrevendo o indivíduo, deve ser completada por
propriedade privada e do Estado -, o filósofoalemão sublinha que
uma dimensão que, para além dessa esfera, consiste em garan-
tir "o direito a cada um para procurar, em suas relações com [...] o aviltamento das mulheres refluiu sobre os próprios ho-
outrem, as condições de seu pleno e livre desabrochamento" mens e, também, acabou por aviltá-Ios ao ponto de levá-Ios às
repugnantes práticas da pederastia e a desonrarem seus deuses
(SCHUTTER,1999, p. 64). Tal concepção da vida privada per-
e a si próprios pelo mito de Ganimedes [único amor homoe-
mitiria sair do impasse em que a vulgata da liberdade sexual rótico de Zeus com um jovem mortal] (ENGELS,1983, p. 140).
se encontra confinada. A referência à intimidade preconizada
pela ideologia liberal subentende a ideia de que, na homos- O povo alemão é apresentado como preservado das práti-
sexualidade, existe algo de nefasto que deve ser dissimulado. cas homossexuais:

A homofobia "burocráticà': O stalinismo Em suas migrações - observa Engels -, particularmente para


o Sudeste, em direção às estepes do Mar Negro, povoadas
Se, para a corporação dos médicos do início do século
XX, a explicação das degenerescências sexuais (entre as quais
64 A homofobia pré-revolucionária da Rússia czarista era muito mais violenta. A
aparece a homossexualidade) encontra-se do lado das clas-
homossexualidade masculina constituía um crime grave: o artigo 995 do Código
ses populares, em compensação, para os porta-vozes políti- Penal de 1832 proíbia o muzhelozhsfvo (sodomia entre homens); além disso, seus
cos do movimento operário, ela resulta do caráter decaden- praticantes perdiam os direitos cívicos e eram deportados para a Sibéria por qua-
te das sociedades capitalistas e burguesas. Os ideólogos do tro ou cinco anos (MILLER, 1995, p. 201).

711 Homofobia As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 79


por nômades, os germanos sofreram sensível decadência do em caso de desordem psíquica. [...] Nos países burgueses, a
ponto de vista moral, adquirindo desses povos, além da arte homossexualidade, sinal da decomposição moral das clas-
da equitação, vergonhosos vícios contra a natureza [...] (p. ses dirigentes, é, efetivamente, deseriminalizada.65
146; cf. CARNEIRO, 2007, p. 101).
Em vez de terem sido o produto da revolução bolchevique,
Para a ideologia comunista da época, a homossexualidade a repressão da homossexualidade e as campanhas homofó-
deve ser tratada como um fenômeno político, resultante da bicas foram a consequência da tomada do poder por Stalin.
decomposição moral própria ao sistema capitalista. Em uma Com efeito, o primeiro Código Penal Revolucionário de
sociedade "saudável" - cuja manifestação mais acabada é o 1922 - até mesmo após sua reforma, em 1926 - não conti-
comunismo em sua versão stalinista -, tais comportamentos nha qualquer incriminação concernente às relações homos-
desaparecerão naturalmente: como a ordem social se confun- sexuais a partir dos 16 anos. A política soviética da década
de com a ordem moral, uma vez restaurada a primeira a partir de 1920 afastou-se da condenação moral do marxismo tra-
do comunismo, há de emergir uma nova moral individual, dicional e, daí em diante, considerou a homossexualidade
isenta de homossexualidade. Na primeira edição da Gran- como uma afecção. Em uma obra de vulgarização, A vida
de Enciclopédia Soviética, de 1930, a homossexualidade não sexual da juventude contemporânea, publicada pelo Comis-
constitui um crime contra a moralidade nem um ato contra sariado para a Saúde Pública, em 1923, a homossexualidade
a natureza; por sua vez, sua edição de 1952, impregnada de é designada como uma forma de alienação da atração sexual
stalinismo, enuncia que normal; em virtude dessa postura, ela deixou de ser aborda-
da como um crime para ser considerada uma enfermidade.
[...] a homossexualidade é uma inclinação antinatural por
pessoas do mesmo sexo; ela ocorre entre homens e entre No mesmo ano, ao publicar A revolução sexual na Rússia, o
mulheres; pode coexistir com uma vida sexual normal, mas Dr. G. Batkis, diretor do Instituto de Higiene Social de Mos-
frequentemente as tendências normais foram rechaçadas. cou, sublinhava o seguinte:
Os cientistas burgueses consideram a homossexualidade
como uma genuína manifestação psicopatológica. Em prin- No que diz respeito à homossexualidade, à sodomia ou a di-
cípio, os psiquiatras e os médicos legistas é que se ocupam versos outros atos sexuais, considerados na legislação euro-
da homossexualidade: eles julgam que se trata de uma ano- peia como ofensas contra a moralidade pública, a legislação
malia congênita, de uma variante biológica [...]. Ao negar o soviética aborda tais comportamentos de forma semelhante
papel e a importância da influência do meio social e ao re- às relações sexuais chamadas naturais [...].
duzir a questão a fatores biológicos, essa concepção foi sub-
metida a uma crítica impiedosa por parte dos cientistas so- Essa relativa tolerância desaparecerá com a consolidação
viéticos. [...] Na sociedade capitalista, a homossexualidade política de Stalin: numerosos homossexuais foram detidos
é um fenômeno frequente; basta indicar que a prostituição na sequência da promulgação da Lei de 7 de março de 1934,
homossexual tornou-se uma profissão. O alcoolismo e as segundo a qual as relações homossexuais por consentimen-
impressões sexuais da primeira infância têm grande im-
to são punidas com cinco anos de trabalhos forçados. Nes-
portância no desenvolvimento da homossexualidade. Sua
sa ocasião, em um texto difundido pela imprensa soviética,
origem está associada às condições de existência social: na
esmagadora maioria das pessoas que praticam a homosse- M. Gorky escreverá que a condenação da homossexualidade
xualidade, essas desnaturações cessam desde que o sujeito constitui uma vitória do humanismo proletário por ser por
esteja posicionado em um quadro social favorável. A exce- intermédio dela que se produz o fascismo. Por uma triste
ção é constituída por personalidades psicopatas e por do-
entes mentais [...]. Na sociedade soviética, que usufrui de
uma moralidade saudável, a homossexualidade é reprimi- 65 Extrato do verbete "Homosexualisme'; publicado na 2" edição da Grande Encyclopédie
da enquanto depravação sexual e sancionada pela lei, salvo soviétique, 1952. Para uma análise mais aprofundada, ver Besnard-Rousseau, 1979.

80 Homofobia As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 81


ironia da História, a Alemanha Nazista instalava, na mesma autoridade do 3° Reich. Qualquer desvio sexual foi percebido,
época, um plano de perseguição e de extermínio dos homos- daí em diante, como um atentado contra o principal valor do
sexuais ao equipará-Ios aos comunistas (KARLINSKY,1989). Estado, a saber: a raça. A mestiçagem66 e a homossexualidade
foram consideradas, desde então, como as principais causas
A homofobia em seu paroxismo: do declínio biológico: a primeira colocava em perigo a pureza
o "holocausto gay" racial, enquanto a segunda ameaçava seu crescimento.
"Um Estado que zele ciosamente pela conservação dos O ministro Hans Frank julgava a homossexualidade uma
melhores elementos de sua raça deve tornar-se, um dia, o se- atitude "contrária à perpetuação da espécie" (BOISSON,1988, p.
nhor da terrà' (HITLER in BorSSON, 1988, p. 31). Essa frase do 51). Desde 1930, as experimentações médicas para "curar" a ho-
Führer resume perfeitamente a política implantada pela Ale- mossexualidade não cessam de se multiplicar: enquanto ariano,
o homossexual deveria ser recuperado para a função reprodu-
manha Nazista. Max von Grüber (1988), especialista em higie-
tora. Com esse objetivo, o Dr. Vrernet submeteu 180 indivídu-
ne sexual, solicitava que "os homens procurassem aprimorar a
os a um tratamento hormonal e, em troca do fornecimento de
raça humana': uma vez que, sublinha o expert nazista, "se reali-
deportados-cobaias de que ele dispunha com toda a liberdade,
zarmos uma criação seletiva bastante rigorosa no domínio hu-
o cientista teve de ceder a patente do "tratamento" que, suposta-
mano, obteremos, em um período limitado, tudo o que existiu
mente, eliminava o "desejo anormaf' (BURLEIGH;WIPPERMANN,
de melhor até o presente, tanto pela beleza da raça quanto pela
1991, p. 195-196). A fim de recuperar "produtores de crianças':
sua força e suas qualidades': A crise de decrescimento demo-
os gays e as lésbicas67 ariano(a)s foram submetidos, igualmen-
gráfico após a derrota na Primeira Guerra Mundial foi apresen-
te, a "estágios de reabilitação': Em uma crônica terrificante, um
tada pelas autoridades do 3° Reich como o principal obstáculo
sobrevivente de campo de concentração, Heinz Heger (1981),
para a realização da política nazista; por isso, seja no âmbito do
relata como ele próprio e os outros deportados homossexuais
casamento, seja no âmbito extramatrimonial, os membros da
eram obrigados, pelos integrantes da 55 (Sehutztaffel- organiza-
raça ariana deveriam reproduzir-se para garantir a supremacia ção altamente disciplinada, encarregada da proteção pessoal de
alemã. Assim, H. Himmler - chefe da Gestapo, da polícia do Hitler), a copular com prostitutas. Todavia, esses procedimentos
3° Reich e ministro do Interior - não deixou de proclamar sua terapêuticos não produziram os resultados pretendidos, e a con-
felicidade sempre que nascia uma criança, independentemen- sequência dessa constatação de fracasso foi tão brutal quanto a
te da maneira como tivesse sido concebida (BorSSON, 1988, p. solução proposta: diante da impossibilidade de curar os homos-
45). A reprodução da "boa raça" tornara-se uma obsessão do sexuais, foi necessário castrá-Ios para privá-Ios, daí em diante,
Estado; desse modo, uma lei de "prevenção" prescrevia a este- de qualquer prazer.68 Um projeto de lei que preconizava a cas-
rilização de todas as pessoas consideradas deficientes, de ma- tração dos homossexuais já havia sido apresentado em 1930 por
neira a evitar que elas viessem a reproduzir novas anomalias. aquele que, mais tarde, seria o ministro do Interior do 3° Reich,
A política de crescimento do povo ariano e a expansão o deputado Wilhelm Fiek (MossE, 1985, p. 158).
demográfica da nação alemã articulavam a resposta nazista
para a questão homossexual; é evidente que, em tal contex-
66 Uma lei de setembro de 1935 sobre "a proteção do sangue alemão e da honra
to, esta era absolutamente incompatível com os objetivos ofi- alemã' proibe as relações sexuais entre judeus e não judeus.
ciais. Com efeito, a reprodução da espécie não dependeria, de
67 Sobre a questão específica da perseguição das lésbicas, ver Schoppmann, 1996.
modo algum, da esfera privada dos indivíduos, mas constituía
68 Essa solução foi proposta pelo próprio Himmler diante do fracasso de seu programa
uma verdadeira questão de Estado. Assim, o fundamento bio- de reabilitação. Em uma declaração de 30 de junho de 1934, ele vociferou: "Temos
lógico do Volk deveria ser cuidadosamente preservado pela de abater essa peste com a morte" (BURLEIGH; WIPPERMANN, 1991, p. 177).

1\2 Homofobia As doutrinas heterossexistas e a ideologia homofóbica 83


o
horror era inimaginável, em particular, para aqueles que entre mulheres são nossos inimigos" (HAEBERLE, 1989; ver,
haviam conhecido a Berlim de outrora, cosmopolita e gay.69 também, a excelente obra de GRAU, 1995).
No final do século XIX, duas revistas homófilas eram exibi- Foi somente em 1935 que as punições contra a homos-
das nos quiosques da cidade: Der Eigne e Sapho und Soerates. sexualidade se tornaram mais duras: daí em diante, o artigo
Além disso, em 1897, o médico Magnus Hirschfeld e o edi- 175 do Código Penal Imperial Alemão previa até dez anos de
tor Max Spohr criaram a primeira organização em favor dos prisão e até mesmo as manifestações afetivas sem relação se-
direitos dos gays: o Comitê Científico- Humanitário (Wissens- xual seriam punidas; a simples suspeita de homossexualidade
ehaftlieh-humanitiires Komitee, WhK). Alguns anos depois, era suficiente para condenar alguém (WERRES, 1973). Um ano
em 1919, Hirschfeld fundou o Instituto para a Ciência Sexual depois da reforma desse Código Penal, Himmler cria a Agência
(Institut für Sexualwissensehaft), que, em pouco tempo, abri- Central do Reieh para Combater a Homossexualidade e o Abor-
gará a maior biblioteca sobre a questão gay. Em 6 de maio de to, cuja atividade revela-se particularmente eficaz: se no de-
1933, o Instituto foi atacado de forma brutal: 12.000 publica- correr de 1934 foram pronunciadas apenas 766 condenações,
ções e 35.000 fotografias relativas à homossexualidade foram estas atingirão a cifra de 4.000 após a criação da Agência e, em
queimadas. Nesse momento, seu diretor encontrava-se no ex- 1938, o número de gays detidos elevar-se-á a 8.000 (BURLEIGH;
terior e não conseguiu voltar para a Alemanha; destituído de WIPPERMANN,1991, p. 192). Em um célebre discurso de 18 de
sua nacionalidade, M. Hirschfeld morreu no exílio, dois anos fevereiro de 1937, Himmler afirmava que "a homossexualidade
depois. Nesse mesmo ano, Hitler elimina, em circunstâncias provoca o fracasso de qualquer desempenho [...] ela destrói o
misteriosas, R6hm e outros líderes da AS (Sturmabteilung, Estado em seus alicerces': porque somente "um povo que dis-
milícia paramilitar nazista).7o De acordo com uma tese, foi a põe de um grande número de crianças pode ter a pretensão
partir do assassinato de R6hm que começou a perseguição de conseguir a hegemonia geral':n Em torno da aptidão repro-
dos homossexuais pelo nazismo; até então, havia reinado dutiva, a ideologia nazista organiza a condenação biológica e
um clima de tolerância. O principal estudo sobre a questão moral dos comportamentos homossexuais. Com efeito, ainda
(LAUTMANN,1977 apud HAEBERLEin DUBERMAN, 1989) re- de acordo com Himmler, "a destruição do Estado começa no
futa vigorosamente essa hipótese, ao lembrar que o Partido momento em que intervém um princípio erótico [...] um princí-
Nacional Socialista tinha tomado posição, bem cedo, sobre pio de atração do homem pelo homem" (BOISSON,1988, p. 219).
esse assunto: com efeito, desde 1928, ele declarava que o inte- Combater essa "praga" torna-se, então, uma obrigação capital
resse geral prevalece em relação ao interesse individual; além para a nação e um gesto de sobrevivência.
disso, "aqueles que são favoráveis ao amor entre homens ou
Devemos compreender - acrescenta o dignitário nazista -
que a disseminação crescente desse vício na nossa nação,
sem que possamos combatê-Io, decretará o fim da Alema-
69 Comumapopulaçãode 2,5 milhõesdehabitantes,Berlimcontava,no finaldo nha, o fim do mundo germânico. [E ele tira a seguinte con-
séculoXIX, com40 baresgayse 320 publicaçõessobrea questãoda homosse- clusão:] Dizer que nos conduzimos como animais seria um
xualidade,verNorton,1975. modo de insultar os animais. Uma vida sexual normal cons-
?OEm30 de junho de 1934, ErnestRõhm,homossexualnotório,e outras 200 titui, portanto, um problema para todos os povos.
pessoasforamassassinados.No dia seguinte,um comunicadoda agênciade
imprensanazistapublicavaa seguinteinformação:"[...] algunsdesseschefesss No editorial de 4 de março de 1937, o semanário da SS -
estavamcom'garotosdeprogramâ [...]. O Führerdeu ordemparaexterminar, Das Sehwarze Korps - denuncia a existência de dois milhões
sem qualquerescrúpulo,essapeste.Elejá não permitiráque,no futuro,mi-
lhõesde pessoashonestassejamimportunadase aviltadaspor seresanormal-
menteconstituídos"(BOISSON,1988, p. 76). 71 Otextointegraldaconferência
encontra-senosanexosdaobradeBoisson,1988.

11'1 Homofobia Asdoutrinasheterossexistas


e aideologiahomofóbica 85
de homossexuais e preconiza, ardentemente, seu extermínio.
Todavia, os criminosos nazistas não tinham aguardado essa Capítulo IV
proposta para desencadear a perseguição de gays e lésbicas:
As causas da homofobia
desde 1936, eles foram enviados em massa para os campos de
concentração; aliás, foi mínimo o número de sobreviventes.
~
Se existe a estimativa de que 15.000 homossexuais tenham
sido vítimas desses campos, de acordo com F. Rector (1981),
parece razoável considerar que, no mínimo, 500.000 homosse-
xuais tenham sido mortos nas prisões, nas execuções sumárias,
por suicídio ou por ocasião de tratamentos experimentais. Enquanto fenômeno psicológico e social, a homofobia en-
Em uma narrativa pungente, H. Heger lembra a sorte dos raíza-se nas complexas relações estabelecidas entre uma estru-
homossexuais que terminaram seus dias nas pedreiras de Sa- tura psíquica do tipo autoritário e uma organização social que
chsenthausen ou no campo de Flossenbürg. O testemunho de considera a heterossexualidade monogâmica como ideal no
Pierre Seel (1994) mostra, igualmente, até que ponto o ódio plano sexual e afetivo. A interação do psicológico e do social
contra os homossexuais chegou a atingir dimensões terrifi- é que deve ser questionada para se compreender melhor os
cantes. "Entre os milhões de homens e de mulheres que Hitler elementos constantes que facilitam, incentivam ou banalizam
havia decidido eliminar em função de critérios racistas, houve a homofobia. Se, em cada um de nós, existe um homofóbico
centenas de milhares de homens perseguidos e torturados até enrustido, é porque a homofobia parece ser necessária à cons-
a morte, unicamente por amarem pessoas do mesmo sexo" tituição da identidade de cada indivíduo. Ela está tão arraiga-
(HEGER,1981, p. 159-160). da na educação que, para superá-Ia, impõe-se um verdadeiro
As pessoas que traziam o triângulo cor-de-rosa72 nos cam- exercício de desconstrução de nossas categorias cognitivas. A
pos de concentração nunca chegaram a ser reconhecidas como despeito de sua estreita relação, a homofobia individual (re-
vítimas do nazismo e, por conseguinte, elas não receberam jeição) e a homofobia social (supremacia heterossexual) po-
dem funcionar distintamente e existir de maneira autônoma.
qualquer indenização: a base legal de sua perseguição - o arti-
go 175 do Código Penal Imperial Alemão - subsistiu até 1969. Assim, é possível não experimentar qualquer sentimento de
A possibilidade oferecida às vítimas, no final da Segunda rejeição em relação a homossexuais (e até mesmo ter simpatia
Guerra Mundial, de solicitar uma espécie de asilo ao governo por eles/as) e, no entanto, considerar que eles/elas não mere-
dos EUA foi expressamente recusada aos homossexuais em cem ser tratados/as de maneira igualitária. O mesmo ocorre
razão de sua "doençà' (RECTOR,1981, p. 110).73 com a misoginia: quantos homens desejam e amam mulheres,
Essas razões explicam o silêncio a que as vítimas haviam sem que essa atitude os impeça de tratá-Ias como objetos?
sido submetidas. Uma forma de homofobia é possível fora da hostilidade
manifestada contra homossexuais. Ou, dito por outras pala-
vras, alguém pode ser objetivamente homofóbico e, ao mes-
n Cada vítima tinha sua cor: o rosa para os homossexuais homens; o amarelo
mo tempo, considerar-se amigo de gays e lésbicas: o heteros-
para os judeus; o vermelho para os politicos; o preto para os associais e as lés-
sexismo manifesta-se sem ter necessidade, de modo algum,
bicas; o malva para as testemunhas de Jeová; o azul para os imigrantes e o cas-
tanho para os ciganos.
da hostilidade irracional ou do ódio contra os "pédés': bas-
73 Se alguém, depois de ter obtido o direito de permanência nos EUA, viesse a
tando-lhe justificar, intelectualmente, essa diferença que situa
ser identificado como homossexual, era passível de expulsão; tal situação foi a homossexualidade em um patamar inferior. Quando se faz
confirmada pela Suprema Corte, em 1967 (ver HAEBERLE, 1989, p. 378-379). apelo à diferença, esta nunca é evocada em favor de gays e

llll Homofobia 87
i
lésbicas; ninguém pensa em enfatizar a especificidade homos- com os colegas, os homens demonstram um incômodo parti-
sexual para reconhecer outros direitos aos gays ou para imple- cular para manifestar seus sentimentos em tais relações.
mentar dispositivos de discriminação positiva em seu favor. Essa barreira em relação à intimidade parece encontrar
Os dados históricos e ideológicos descritos nos capítulos sua origem na socialização masculina: a competição, a forte
precedentes delimitam a esfera em que nossas imagens so- apreensão relativamente à demonstração de vulnerabilidade,
bre a homossexualidade foram construídas. Para além dessa o controle dos sentimentos e a homofobia constituem os ele-
moldura, existem outros elementos de explicação que, even- mentos que modelam o jeito de ser homem. De acordo com
tualmente, nos permitem circunscrever melhor a hostilidade J. Tognoli (1980), o ódio contra homossexuais aparece como
contra os gays e as lésbicas. Ao preconizar a divisão dos sexos o mais importante desses elementos na (auto)construção da
e ao radicalizar a diversidade dos gêneros, a ideologia diferen- masculinidade. Com base em 24 estudos empíricos que mos-
cialista transforma a repulsa (ou a segregação) relativamen- travam maior tolerância das mulheres e, correlatamente, hos-
te a homossexuais em um elemento central capaz, ainda por tilidade mais marcante dos homens heterossexuais contra os
cima, de garantir o equilíbrio individual e a coesão social. gays (KITE, 1984), o medo de ser considerado "pédé" consti-
tui uma importante força na composição do papel masculino
A homofobia como elemento constitutivo
tradicional. Segundo o processo de socialização masculina, a
da identidade masculina
aprendizagem desse papel efetua-se em função da oposição
No primeiro capítulo, foi enfatizado o modo como a ho- constante à feminilidade. Como observa É. Badinter: "Em
mofobia geral manifesta hostilidade não só a gays e lésbicas, vez de ser obtida automaticamente, a virilidade deve ser
mas também a qualquer indivíduo que não se adapte aos pa- construí da, digamos, fabricada. O homem é, portanto, uma
péis, supostamente, determinados pelo sexo biológico. A lógi- espécie de artefato e, como tal, ele corre sempre o risco de ser
ca binária que serve de estrutura para a construção da identi- defeituoso': A carência mais grave do maquinismo destinado
dade sexual funciona por antagonismo: assim, o homem é o a fabricar a virilidade é a produção de um veado [pédé]. Ser
oposto da mulher, enquanto o heterossexual opõe-se ao ho- homem significa ser rude (e até mesmo grosseiro), competiti-
mossexual. Em uma sociedade androcêntrica como a nossa, os vo, bagunceiro; ser homem implica menosprezar as mulheres
valores apreciados de forma especial são os masculinos; neste e detestar os homossexuais. O caráter mais evidente da mas-
caso, sua "traição" só pode desencadear as mais severas con- culinidade permanece a heterossexualidade: "Após a dissocia-
denações. Portanto, o cúmulo da falta de virilidade consiste ção da mãe (não sou seu neném) e a dissociação radical em
em assemelhar-se à feminilidade, "disfarçar-se de drag-queen", relação ao sexo feminino (não sou uma moça), o rapaz deve II

"assumir trejeitos femininos", "maquiar-se para frequentar ca- provar (a si mesmo) que não é homossexual, portanto, que
sas noturnas" ou "falar com uma vozinha aguda e efeminadà' evita desejar outros homens ou ser desejado por estes" (BA- ~II
(ver a pesquisa de DURET, 1999, p. 52; d. LOURO,2008, p. 84). DINTER, 1992, p. 149). Fortalecer a homofobia é, portanto, um
Um estudo efetuado com uma população heterossexual mecanismo essencial do caráter masculino, porque ela permi-
masculina por uma equipe de psiquiatras mostra a estreita liga- te recalcar o medo enrustido do desejo homossexual. Para um
ção entre a homofobia e a impossibilidade de estabelecer rela- homem heterossexual, confrontar-se com um homem efemi-
ções de intimidade entre pessoas do gênero masculino. Várias nado desperta a angústia em relação às características femini-
pesquisas dão testemunho da grande dificuldade experimen- nas de sua própria personalidade; tanto mais que esta teve de
tada pelos homens para exprimir sua intimidade. Em rela- construir-se em oposição à sensibilidade, à passividade, à vul-
ção às mulheres, apesar de travarem mais facilmente amizade nerabilidade e à ternura, enquanto atributos do "sexo frágil':

BB Homofobia As causas da homofobia 89


Nesse sentido, um grande número de homens que assumem objetiva e factual (MATHIEU, 1977). Nesse aspecto, não se
um papel ativo na relação sexual com outros homens não se trata, de modo algum, de questionar os dados fisiológicos
consideram homossexuais; na realidade, em vez do sexo do relacionados com a existência de machos e fêmeas entre os
parceiro, a passividade é que, para eles, determina o pertenci- mamíferos humanos; tampouco de negar as diferenças físicas
mento ao gênero masculino. O fato de ser penetrado aparece, entre os sexos. Apesar disso, existe outra maneira de abordar
assim, como o caráter próprio do sexo feminino; essa passivi- a questão, precisamente, ao desconfiar dessa evidência "na-
dade, vivenciada como uma feminização, é suscetível de tor- tural'~ As dúvidas que se opõem a essa certeza incidem sobre
nar o sujeito efetivamente homossexuaL Em compensação, ao o modo como a dicotomia masculino/feminino, considerada
adotar o papel ativo, o indivíduo não atraiçoa seu gênero e, por o estorvo do pensamento, organiza uma consciência de si e
conseguinte, não corre o risco de tornar-se "pédé'~No entanto, uma relação com o mundo totalmente peculiares.
é insuficiente ser ativo: ainda é necessário que essa penetração Convém, então, interrogar-se sobre a pertinência desse
não seja acompanhada de afeto, porque essa atitude poderia dado fisiológico na elaboração da lei.
colocar em perigo a imagem de sua própria masculinidade. Eis, A opinião sobre a diferença entre os sexos baseia-se na
portanto, por um efeito de denegação, como vários homens, ideia de que a natureza biológica dos seres determina uma
sem deixarem de ter relações homossexuais regulares, podem forma específica de atribuição social, de tal modo que a posse
rejeitar qualquer identidade gay e sentir ódio homofóbico. Tal de órgãos genitais, masculinos ou femininos, legitimaria um
ódio serve, neste caso, à reestruturação de uma masculinidade tratamento jurídico diferenciado; assim, a mulher é definida
frágil que, constantemente, tem necessidade de se afirmar pelo como radicalmente distinta do homem, além de ser pensada
menosprezo do outro-não-viril: o maricas e a mulher. através de sua função reprodutora. Se a equivalência entre os
Sexismo e homofobia aparecem, portanto, como as duas órgãos de um e do outro sexo é frequentemente evocada, apa-
faces do mesmo fenômeno sociaL A homofobia - e, em par- rece como prova de uma complementaridade e, até mesmo, de
ticular, a masculina - desempenha a função de "policiamento uma subordinação. Essa estranha operação intelectual permi-
da sexualidade" ao reprimir qualquer comportamento, gesto te ordenar um dispositivo de papéis e status no âmago do qual
ou desejo que transborde as fronteiras "impermeáveis" dos os indivíduos haveriam de se inserir naturalmente. O ser bio-
sexos. Segundo Ch. Gentaz (1994, p. 219): lógico declina-se, assim, como homem ou mulher com uma
Em razão de sua função sociopsíquica, a homofobia prote- naturalidade semelhante à da noite que vem após o dia ou à
ge - à semelhança de um preservativo - os heterossexuais sucessão das estações. Por conseguinte, é muito naturalmente
de serem atingidos pela feminilidade ao impedir qualquer que nos submetemos ao destino da natureza (macho/fêmea)
forma de intrusãomasculina externa: trata-se de uma espé- e assumimos nossa vocação antropológica, masculina ou fe-
cie de alfândega do gênero masculino. Poderíamos, então,
minina. O pensamento diferencialista tenta, assim, enraizar a
pressupor que a homofobia é constitutiva da psicogênese de
diferença entre os sexos, seja no biológico, seja no cultural: as
qualquer indivíduo masculino.
mulheres, em decorrência de suas capacidades maternas, se-
riam mais altruístas, mais amáveis e menos ambiciosas que os
A homofobia, guardiã do diferencialismo sexual homens; elas mostrariam maior sensibilidade e seriam muito
A crença social na existência exclusiva de dois sexos, as- mais atenciosas para com os outros. Por sua vez, os homen§,
sociada à atribuição - correlata e lógica - a cada indivíduo de de natureza mais agressiva, estariam mais bem dotados para
uma natureza, essencialmente masculina ou feminina, per- a vida fora de casa, o comércio e a política. Eis outras tantas
mite a reprodução de uma ordem sexual apresentada como ideias preconcebidas que articulam a doxa. No entanto, em

90 Hornofobia As causas da hornofobia 91


vez de serem atribuições individuais, o masculino e o feminino Se a reivindicação do direito ao casamento e à filiação por
se constroem na relação com os outros; longe de representarem parte de gays e lésbicas desencadeia um número tão grande
categorias naturais ou universais, o masculino e o feminino são de reações negativas é porque ela questiona a dicotomia mas-
o resultado de uma forma específica de socialização (FERRAND, culino/feminino, suporte da atual ordem sexual. As categorias
1991). A distinção entre os sexos constitui um mecanismo po- "homem" e "mulher" continuam sendo operacionais em direi-
lítico de ação e reprodução social que permite a legitimação to, servindo de justificativa para a desigualdade de tratamento
tácita das desigualdades. Apresentada como antropologica- do gênero masculino em relação ao feminino. Nesse sentido,
mente inevitável, essa diferença serve de estrutura para nossa a defesa da ordem sexual baseada na diferença entre os sexos
concepção normativa sobre as propriedades dos seres "neces- (macho/fêmea) pressupõe, igualmente, a manutenção da dife-
sariamente" sexuados. De algum modo, somos reféns de um rença de sexualidades (homossexual/heterossexual). Em com-
sistema cultural que nos impele à adesão cega a uma lógica bi- pensação, se a diferença dos sexos deixasse de ser um elemento
nária em matéria de gênero e de sexualidade: cada um de nós é pertinente na qualificação do sujeito de direitos, se o fato de ser
homem ou mulher, homossexual ou heterossexual; além disso, homem ou mulher já não afetasse o exercício dos direitos, in-
quando se é homem, deve-se ser masculino e sentir atração por clusive no domínio do casamento e da filiação, as reivindicações
mulheres femininas, e vice-versa.
de gays e lésbicas poderiam inscrever-se, pacificamente, no pro-
A alternativa para pensar a diferença entre os sexos con- cesso de abstração do sujeito de direitos. Eis por que a igualdade
siste em considerá-Ia não como uma realidade biológica, mas das sexualidades é percebida como uma iniciativa subversiva,
como uma elaboração política ou, para retomar uma palavra suscetível de ameaçar a ordem estabelecida dos sexos.
forjada por Foucault, como um dispositivo, ou seja, A preservação do dispositivo político da distinção entre os
[...] um conjunto heterogêneo de discursos, instituições, prá- sexos implica, igualmente, a conservação da diferençà entre as
ticas e procedimentos, permeado por relações de poder; nesse sexualidades. A crença em uma "naturezá' feminina e em ou-
conjunto, indivíduos e coletividades são constituídos como tra "naturezá' masculina, dessemelhantes e complementares,
objetos passíveis de intervenção e, simultaneamente, como encontra-se na origem de uma opinião disseminada segundo
sujeitos que se pensam em relação com as categorias do dis-
positivo (ef. LOURO, 2007, p. 11-12; WEEKS,2007, p. 44). a qual as relações heterossexuais são as únicas a desempenhar
o verdadeiro encontro dos seres que, por sua diferença sexuada,
Sob essa perspectiva, a divisão entre os sexos, longe de teriam a vocação para se completar. Nessa lógica, as uni-
constituir um dado natural, representa um empreendimen- ões homossexuais são aceitas sob a condição de que elas não
to político de sujeição dos indivíduos. A maneira pela qual ameacem, por um "igualitarismo desenfreado'; o modelo de
representamos o "modelo de dois sexos" é uma invenção re- casal heterossexual como espaço simbólico no âmago do qual
cente, como é demonstrado por T. Laqueur (1992, p. 10-20): se realiza a diferença entre os sexos enquanto valor político e
cultural. A segregação dos casais aparece, assim, como uma ne-
Desde o século XVIII, a ideia predominante - sem ser, de
modo algum, universal - havia consistido em defender que cessidade antropológica, a fim de preservar essa diferença. À
existiam dois sexos opostos, estáveis, incomensuráveis; semelhança da velha doutrina da Suprema Corte dos EUA, ou
além disso, a vida política, econômica e cultural dos ho- seja, "separate and equal" - que servia para justificar o regime de
mens e das mulheres, seus papéis enquanto gêneros são ba- apartheid em relação aos negros (PLESSY,1896) -, a homofobia
seados, de uma forma ou de outra, nesses "fatos". A biologia
diferencialista pretende afastar os homossexuais do direito co-
- o corpo estável, anistórico, sexuado - é compreendida
como o fundamento epistêmico das afirmações normativas mum (em particular, o direito ao casamento), a fim de salva-
relacionadas com a ordem social. guardar a supremacia normativa da heterossexualidade.

92 Homofobia As causas da homofobia 93


A homofobia e o fantasma do vínculosociale do consenso,em poucaspalavras,de uma
da desintegração psíquica e social sociabilidade[00']'

Se a homossexualidade desperta, ainda, um número tão ''A economia da homossexualidade': para não falar de sua
grande de reações de hostilidade é porque ela é percebida repressão, encontra-se na própria base da socialização. Legi-
como uma etapa suplementar do processo de decadência psi- timar a homossexualidade equivale a colocar em perigo a so-
cológica e moral em que estariam soçobrando as sociedades ciedade. O amor por si e a sexualidade primitiva atribuídos ao
contemporâneas: ao confundirem a liberdade com um narci- desejo homossexual devem ser mantidos a distância, sob pena
sismo egoísta, estas se encontrariam instrumentalizadas por de implicar a desintegração cultural da sociedade. Esse racio-
um individualismo desenfreado. Semelhante tentativa indi- cínio baseia-se em uma teoria da defesa da sociedade (hete-
vidualista estaria na origem da legalização da contracepção, rossexual) a partir da qual - no pressuposto de que a ordem
do aborto e da banalização da multiparceria, apresentadas antropológica (heterossexual) é ameaçada pelo indivíduo - é a
como práticas nocivas para a integridade do tecido social; heterossexualidade que deve necessariamente prevalecer.
todavia, nessa evolução, a homossexualidade representa a Se o fortalecimento da diferença entre os sexos e o incen-
etapa mais acabada da desintegração civilizacional. A manei- tivo à heterossexualidade são imperativos relevantes para o
ra dos antropólogos do final do século XIX que não hesita- desenrolar adequado do processo civilizacional, a inferioriza-
vam em assimilar a homossexualidade a práticas selvagens, ção e a estigmatização da homossexualidade aparecem como
os ideólogos modernos consideram o desejo por pessoas do as consequências lógicas do dever moral que é a defesa da
mesmo sexo o sinal de uma adolescência afetiva, impregnada sobrevivência comunitária. Por essa dialética, que consiste
de narcisismo. Eis por que as "sexualidades contemporâneas" em estabelecer a oposição entre dois polos, basta determinar
- e, particularmente, a homossexualidade - são denunciadas arbitrariamente o que pertence ao "bem comum" para tirar
como se estivessem orientadas exclusivamente para a realiza- a conclusão de que este deve necessariamente prevalecer ao
ção egoísta do indivíduo, ao excluir sua dimensão relacional "interesse individual"; em caso de contradição, a sobrevi-
(ANATRELLA, 1990, p. 131). Por isso é que a heterossexualida- vência de um desses polos pode justificar o desaparecimento
de é vislumbrada como a única forma de sexualidade capaz do outro. Ora, além da imoralidade de tal raciocínio, nada
de associar prazer individual e coesão social, no sentido em permite considerar a homossexualidade como um compor-
que ela está a serviço dos fins da espécie: "Transmitir a vida tamento nocivo para a sociedade. No entanto, a fim de justi-
é, também, um ato social, e não unicamente uma gratifica- ficar a exclusão, é enfatizada, sem hesitação, a incapacidade
ção narcísica que fornece o sentimento de estar libertado da reprodutora dos casais homossexuais. Mas então, se a repro-
impotêncià' (p. 134). Assim, qualquer forma de sexualidade dução qualifica o interesse social de uma sexualidade (hete-
dissociada da reprodução aparece como suspeita, por fazer rossexual) em detrimento de outra (homossexual), por que
preceder a sobrevivência do indivíduo à da espécie. não impor, por um lado, a obrigação de casamento para os ce-
A repressão da homossexualidade é justificada, nessa libatários heterossexuais e, por outro, a reprodução aos casais
ideologia, como uma espécie de "legítima defesà' social. De heterossexuais? E por que não impor aos estéreis a obrigação
acordo com o padre-psicanalista T. Anatrella (1990, p. 211): de se curarem ou de adotarem crianças? E, finalmente, por
Quando a tendência homossexual não foi precocemente que continuar autorizando a contracepção ou a interrupção
erotizada,elatransforma-seem sentimentossociais:a partir voluntária da gravidez? Eis outras tantas situações que nos
dela, constrói-sea relaçãosocial.Ao impelir à aproximação levam a nos interrogar se, por trás do argumento da reprodu-
com "o mesmo",essa tendência permite o estabelecimento ção, não se dissimularia certa hostilidade anti-homossexual.

94 Homofobia As causas da homofobia 95


Foi dito, igualmente, que os gays e as lésbicas encontrar- cultural e social, comparável ao racismo ou ao antissemitismo.
se-iam na impossibilidade de reconhecer o outro, já que, para Parece-nos, no entanto, que os aspectos puramente psicológicos
a vulgata psicanalítica, eles seriam impedidos de reconhecer, da questão merecem ser abordados a fim de compreendermos
por sua estrutura psíquica, a diferença entre os sexos e, por melhor os efeitos da interação entre uma socialização heteros-
conseguinte, a alteridade. Ora, o pressuposto segundo o qual sexista e uma integração acentuada das normas culturais hostis
a alteridade é necessariamente o oposto sexual parece ser não a gays e lésbicas.
só falso, mas também, e sobretudo, ideologicamente perigo- As reações homofóbicas mais violentas provêm, em geral,
so: o outro é amado enquanto tal, de modo que limitá-Io à sua de pessoas que lutam contra seus próprios desejos homossexu-
dimensão anatômica constitui uma forma de materialismo ais. Nesse sentido, chegou a ser proposta uma explicação sobre
reducionista. Além disso, a heterossexualidade nunca foi ga- a dinâmica psicológica segundo a qual a violência irracional
rantia de consideração e de respeito por outrem. As mulheres, contra gays é o resultado da projeção de um sentimento insu-
apesar de representarem o "sexo oposto" dos homens, podem portável de identificação inconsciente com a homossexualida-
ser o testemunho da opressão de que têm sido, e continuam de, de tal modo que o homossexual colocaria o homofóbico
sendo, vítimas por parte dos heterossexuais; no entanto, su- diante de sua própria homossexualidade experimentada como
postamente, estes possuem todas as qualidades psicológicas intolerável. A violência contra os homossexuais é apenas a ma-
necessárias para reconhecer a alteridade ... nifestação do ódio de si mesmo ou, melhor dizendo, da parte
O fantasma da desintegração cultural - pretensa conse- homossexual de si que o indivíduo teria vontade de eliminar. A
quência do reconhecimento social da homossexualidade - homofobia seria uma disfunção psicológica, resultado de um
provém, no fundo, do temor relativo ao fim da continuidade conflito mal resolvido durante a infância e que provocaria uma
genealógica. Em algumas pessoas, a mera evocação das uni- projeção inconsciente contra pessoas, supostamente, homosse-
ões do mesmo sexo provoca uma ansiedade que não passa da xuais. Esse mecanismo de defesa permitiria reduzir a angús-
angústia de morte e manifesta-se sob a forma de uma hosti- tia interior de se imaginar em via de desejar um indivíduo do
lidade contra os homossexuais, desde então, julgados como mesmo sexo (SUSSAL, 1998). Presente unicamente nos homens,
responsáveis pelo risco imaginário do desaparecimento da segundo L.Bersani (1998, p. 99-100), essa disposição irracional
espécie. Tal dimensão fantasmática é que instaura e alimenta à homofobia "poderia ser a expressão odiosa de um fantasma,
a homofobia. Ora, nada nos permite pensar, com seriedade, mais ou menos disfarçado, de participação - principalmente,
que os homossexuais colocariam em perigo a sobrevivência sob a forma de penetração anal - na experiência imaginária
da espécie; constata-se que eles existem desde sempre, o que terrificante da sexualidade femininà: Entre os homens heteros-
não impediu o povoamento do Planeta (até mesmo, a super- sexuais, um elemento considerado igualmente como facilita-
população). Considerando o estado atual das técnicas de pro- dor da homofobia parece ser a inveja inconsciente em relação
criação, quem pode ainda supor que a reprodução da espécie aos gays,percebidos como desvencilhados da obrigação de cor-
dependa unicamente do coito heterossexual? responder ao ideal masculino e como se tivessem sido bene-
ficiados com maior liberdade sexual. Mas, na impossibilidade
A personalidade homofóbica cultural de realizar tal desejo, este se transforma em hostilidade
A interpretação restritiva da homofobia como temor irra- contra os entes invejados.
cional de tipo patológico foi amplamente criticada, por limitar- Numerosos estudos psicológicos conseguiram demonstrar
se a uma consideração parcial do fenômeno analisado. Eis por que alguns fatores - tais como idade, sexo, nível de estudos,
que preferimos aprofundar a homofobia como manifestação meio social, além de filiação religiosa ou política - constituem

96 Homofobia fiM CtlUStls <I" hlllTwli>hltl Wi'


variáveis para a compreensão do problema. Assim, os homens Como sinal de uma personalidade rígida de tipo autori-
manifestam, mais facilmente que as mulheres, sua antipatia tário, alguns homofóbicos manifestam sintomas próprios a
em relação aos gays (KITE, 1984, p. 79); além disso, as pessoas qualquer forma de fobia.75 Vários fatores psicológicos podem
que têm uma imagem clássica dos papéis sexuais (feminino/ desencadear uma hostilidade contra os/as homossexuais. A
masculino) mostram maior hostilidade contra os/as homos- necessidade imperiosa de se sentir como integrante da norma
sexuais (BLACK; STEVENSON,1984). Os homens conservado- social heterossexual, considerada como natural, e a obsessão de
res consideram mais facilmente os gays como indivíduos que não ser reconhecido como tal pelo discurso dominante levam
rejeitam seu gênero e, por isso mesmo, colocam em perigo a um grande número de indivíduos a desenvolver uma rejeição
norma heterossexual, ou seja, a masculinidade e os privilégios irracional contra tudo o que é percebido como diferente, fora
que lhe são inerentes (CONNELL, 1987). Ao rejeitar os gays, da norma. Vivendo pelo olhar do outro, esse tipo de personali-
um grande número de homens heterossexuais menosprezam, dade integra mais facilmente o preconceito; desse modo, acaba
na realidade, algo diferente, que está indissociavelmente as- por apropriar-se da percepção estereotipada do homossexual.
sociado, em suas mentes, à homossexualidade masculina, a Em outros casos, a homofobia funciona como um mecanismo
saber: a feminilidade. de defesa contra conflitos inconscientes. Nos últimos vinte

I11
Do mesmo modo, o racismo é acompanhado, frequente- anos, as mais prestigiosas publicações científicas consideram a II

homofobia como um distúrbio da personalidade76 e um pro- II1


mente, por misoginia e homofobia (FICARROTTO, 1990). Em
blema de saúde psicológica de primeira ordem. Na década de I
uma pesquisa empreendida com 714 estudantes universitá-
1940, o célebre psicanalista S. Ferenczi já sugeria que a aversão
rios, os psicólogos Johnson, Brems e Alford-Keating (1997) I1I

e o asco provocados pelos homossexuais em alguns indivíduos


analisaram suas atitudes em relação aos/às homossexuais. O

'111
não passam de reação sintomática de defesa contra a atração
estudo mostra que existe uma relação direta entre adoles- III

por pessoas do próprio sexo. Uma relação problemática com il


cência e homofobia: quanto mais se eleva suas idades, tanto I,

sua própria sexualidade, ou um importante sentimento de cul-


menor é o grau de sua homofobia. Além disso, o nível de III

pa em relação à sexualidade em geral, pode igualmente estar na


religiosidade da população analisada é diretamente propor-
origem das reações homofóbicas (SORENSON,1973).
Ili

cional à homofobia: as pessoas que declaram ser praticantes I1I

A personalidade homofóbica, enquanto estrutura psíquica


de uma religião monoteísta revelaram-se menos favoráveis II

de tipo autoritário, funciona com categorias cognitivas extre-


que as outras a qualquer reconhecimento de direitos para
mamente nítidas (estereótipos), permitindo-lhe organizar in- II

os homossexuais (ALSTON, 1974, p. 479-481). Por sua vez, telectualmente o mundo em um sistema fechado e previsível. II

os indivíduos oriundos dos meios rurais estão mais incli-


Os gays são, assim, sistematicamente apresentados como frí-
nados a tomar atitudes homofóbicas que os habitantes das volos que se submetem à promiscuidade sexual, solitários ou
grandes cidades (WHITEHEAD; METZGER, 1981, p. 295-296). narcísicos; por sua vez, as lésbicas são percebidas como agres-
A possibilidade de conviver com gays e lésbicas e a abertu- sivas e hostis para com os homens. Eis por que o homofóbico
ra para o outro, constituem igualmente importantes fatores
que impedem o desenvolvimento de sentimentos homofóbi-
75 Somenteuma parceladas pessoasque se consideravamcomohomofóbicas
coso Finalmente, a crença em uma base genética da homos-
reagiramfisicamenteaos testesde detecçãodas manifestaçõeshomofóbicas
sexualidade favorece a emergência de um sentimento mais (verSHIELDS;HARRIMAN,1984).
acentuado de tolerância; em compensação, ao considerarem
76 Assim,M.Freedman(1978, p. 320) falade''graveperturbaçãoquecausadanos
a homossexualidade como uma escolha, as pessoas têm ten- tantoahomossexuaisquantoaheterossexuais" e B. Voeller(1980, p. 21) conside-
dência em condená-Ia. ra a homofobia"umaquestãodesaúdementaldeprimeiragrandeza':

98 Homofobia As causas da holtloi'ohlu f)fl


mostra-se menos violento em relação aos/às homossexuais transformar-se em ódio a si mesmo à maneira do personagem
identificados/as aos estereótipos da "bicha-louca" ou da "ma- proustiano Charlus, que, na obra Em busca do tempo perdi-
chonà' do que em relação àquelas ou àqueles que não osten- do, menospreza violentamente os outros sodomitas. Em uma
tam sinais evidentes de homossexualidade. Ao manter certa sociedade em que os ideais de natureza sexual e afetiva são
distância, o estereótipo permite ao homofóbico ganhar con- construÍdos com base na superioridade psicológica e cultural
fiança; no entanto, tendo desaparecido o clichê, a angústia de da heterossexualidade, parece difícil esquivar os conflitos inte-
se imaginar como homossexual desencadeia o medo e o asco. riores resultantes de uma não adequação a tais valores. Além
Como observa M. Dorais (1999): "O fato de confinar a homos-
disso, os gays e as lésbicas crescem em um ambiente que de-
sexualidade àqueles e àquelas que já são gays e lésbicas é uma senvolve abertamente sua hostilidade anti-homossexual.77 A
forma de sentir-se protegido"; em compensação, imaginar
interiorização dessa violência, sob a forma de insultos, injú-
que todo mundo pode ter desejos ou relações homossexuais
rias, afirmações desdenhosas, condenações morais ou atitu-
suscita uma profunda inquietação, em particular, naqueles
des compassivas, impele um grande número de homossexuais
que integraram os códigos que, supostamente, pertencem
a lutar contra seus desejos, provocando, às vezes, graves dis-
a seu gênero. Nesse sentido, o estereótipo desempenha um
importante papel psicológico, já que ele permite apaziguar a túrbios psicológicos, tais como sentimento de culpa, ansieda-
angústia identitária de que, um dia, venha a abandonar seu de, vergonha e depressão. O estereótipo ainda disseminado
status ou ser rejeitado por seu grupo de filiação, sobretudo sobre o homossexual incapaz de ter uma vida afetiva plena-
quando este aparece como o modelo a ser imitado. mente desenvolvida, sem família nem filhos, e sendo levado
A representação estereotipada determina a relação en- a terminar seus dias em uma solidão insuportável - aliviada,
tre uma maioria dominante e uma minoria estigmatizada, às vezes, pelo suicídio - obceca a mente de numerosos gays
no âmago da qual o dominado é considerado sempre como que, para evitar esse "destino trágico", envolvem-se em uma
membro de um grupo homogêneo e unitário, enquanto o do- tentativa de rejeição de sua própria sexualidade. A American
minante considera seu grupo de filiação como heterogêneo Psychiatric Association reconhece que os principais agentes
(SIMON;GLASSNER-BAYERL; STRATENWERTH, 1991). A manei- de predisposição à homofobia interiorizada são os preconcei-
ra exemplar adotada pelo dominante produz uma espécie de tos individuais e a intolerância social em relação à homosse-
legitimação "litúrgicà' para os membros do grupo estigmati- xualidade (MEYER;DEAN,1998). Na origem dessa intolerân-
zado. Os atributos outorgados por uma maioria heterossexual cia encontra-se o que M. Dorais não hesita em designar por
dominante a uma minoria homossexual dominada produzem "integrismo identitário" que pretende prescrever-nos com-
uma consciência e uma identidade autoestereotipadas. Efetiva- portamentos em função de nosso sexo biológico. De acordo
mente, um número importante de homossexuais integram - na com esse autor, tal integrismo é
maior parte das vezes, inconscientemente - as características e
as atitudes predeterminadas pelo discurso heterossexista; ou, [...] tão perigoso quanto o fundamentalismoreligiosoou o
dito por outras palavras, a maneira como os/as homossexuais totalitarismo:ele impõe um modelo de conduta único, rí-
são "rotulados/as" pelo olhar dos dominantes modela a manei- gido e opressor.Além disso,ele chega a transformar-seem
obsessãoquando a combinaçãode misoginia,sexismoe ho-
ra como os gays e as lésbicas se percebem a si mesmos/as. mofobialevaos terapeutasa pretender corrigiresseserros da
A homofobia interiorizada
77 Quarenta e quatro por cento dos gays adolescentes são vítimas das víolências
Os gays e as lésbicas não estão imunes a sentimentos ho- homofóbícas por parte dos colegas de escola, e 14%, por membros da própria
mofóbicos. O ódio da sociedade contra os homossexuais pode família (MASON;
PALMER,
1996, p. 29).

100 Homofobia As causas da hornofobia 101


natureza que seriam os rapazes femininos, as moças masculi- Diante de tal carência de referências culturais, parece
nas e os adolescentes que, pretensamente, encontrar -se- iam a compreensível a aflição em que se encontram numerosos
caminho de uma orientação homossexual ou bissexual
adolescentes gays e lésbicas: a manifestação pública de sua
(DORAIS, 1999, p. 84-85).
homossexualidade (coming-out) constitui, nesse sentido, um
Em tal contexto de violência, não é surpreendente que os momento libertador; por esse gesto, um grande número de
jovens homossexuais sejam atingidos, em particular, por de- gays e lésbicas entendem acabar com uma forma de clandes-
pressão, hospitalização psiquiátrica e tentativas de suicídio. tinidade em que haviam sido confinados. O coming-out pode,
Nesse aspecto, T. Hammelman (1993; ver, também, DORAIS, assim, tornar-se uma situação particularmente salutar ao pôr
2001) demonstra que a homossexualidade é uma das principais um fim na socialização heterossexista e, por conseguinte, per-
causas de tentativas de suicídio entre os adolescentes: o isola- mitir restaurar a própria auto estima e a de seus semelhantes.
mento social, o assédio e os numerosos riscos de violências, as- Sem negar essa dimensão afirmativa, outra leitura parece
sim como a rejeição familiar, acentuam a perda de auto estima ser, igualmente, necessária: o coming-out pode também repre-
(ver CDPDJ, 1994).Uma pesquisa norte-americana mostra que sentar uma espécie de justificação social e de inscrição em
mais de 40% dos 500 gays e lésbicas entrevistados haviam con- uma identidade sexual. Nenhum heterossexual sonha em fa-
siderado seriamente a possibilidade, ou feito uma tentativa, de zer seu coming-out, uma vez que ele já se encontra no univer-
suicídio (KAY;YOUNG,1979;ver, também, GARNETS; KIMMEL, so público; em razão de sua "normalidade", ele usufrui desde
1993). Os adolescentes gays põem termo à vida em uma pro- sempre da presunção de heterossexualidade. Por sua vez, o
porção três vezes maior que seus pares heterossexuais (Report homossexual, em decorrência de sua diferença, deve apre-
on Secretary's Task Force on Youth Suicide, 1989). Além disso, sentar-se, solicitar autorização e prevenir os "normais" de sua
a epidemia de AIDS veio fortalecer o sentimento de culpa e a entrada em um território que não é naturalmente destinado
perda de auto estima a tal ponto que a homofobia interiorizada a ele. Mas essa demanda não será o sinal do reconhecimento
torna-se um verdadeiro problema de saúde pública (WAGNER; dessa forma de dominação heterossexista?
BRoNDoLO;RABKIN,1996;cf. WEEKS,2007; ALMEIDA,2009).
A aceitação da própria homossexualidade é tão difí-
cil que um número considerável de gays encontram-se em
uma situação de isolamento e de angústia particularmente
insuportável. A educação sexual e afetiva de gays e lésbicas
efetua-se na clandestinidade, enquanto as referências literá-
rias, cinematográficas e culturais são quase inexistentes; além
disso, evoca-se o personagem homossexual, na maior parte
das vezes, sob a forma do escárnio ou da tragédia (PHILIBERT,
1984; VARLET,1999)/8 Basta observarmos à nossa volta para
percebermos que não existe publicidade para os casais do
mesmo sexo e praticamente nenhum filme encena o amor en-
tre homossexuais, ao passo que as paixões heterossexuais são
incessantemente exibidas.

78 Sobre a imagem da homossexualidade no cinema de Hollywood, ver Russo, 1987.

102 Homofobia As causas da homofobia 103


Conclusão

Recursos para lutar contra a homofobia


~

A semelhança do racismo, do antissemitismo ou da miso-


ginia, a hostilidade contra os gays e as lésbicas é, antes de mais
nada, o resultado da impossibilidade vivenciada por alguém
para se representar a diferença,79 sobretudo, quando esta é
percebida como ameaçadora ou, simplesmente, incômoda. Há
dezenas de anos, a homossexualidade deixou de ser considera-
da como uma conduta desviante; se, por outro lado, aceita-se
que a "diferença homossexual" é desprovida de qualquer sen-
tido político, neste caso, nenhum motivo justifica que lhe seja
reservado um tratamento jurídico de exceção. Com efeito, os/
as homossexuais não constituem uma comunidade e, menos
ainda, um tema político. A homossexualidade, sem dúvida,
marcou profundamente a vida de numerosas pessoas; apesar
disso, sua única significação é aquela que lhe é atribuída, indi-
vidualmente, por cada gay e por cada lésbica. Se não há comu-
nidade homossexual, em compensação, existe uma verdadeira
"comunidade heterossexista" instituída pela homofobia. A ho-
mossexualidade inexiste no sentido em que ela nada é, na rea-
lidade, além da invenção impessoal de uma homofobia social
que fabricou uma espécie de "natureza homossexual': baseada
em um postulado extremamente simples: um heterossexual é

79 Tal representação não é necessariamente da ordem da hostilidade. Ela pode as-


sumir, às vezes, as formas opostas da celebração da diferença, mas o objetivo
permanece o mesmo: a pessoa designada como diferente é excluída do direito
comum. Assim, a negação da diferença e sua afirmação absoluta participam da
mesma lógica de exclusão. A busca das causas da homossexualidade - cuja forma
mais bioligizante é representada pela controvérsia sobre o gene "homossexual" -
e as interpretações essencialistas da diferença homossexual fortalecem a ideia de
uma especificidade do grupo da qual nenhum membro seria capaz de escapar.

105
o contrário de um homossexual. Esse poderoso sentimento de como uma disfunção psicológica, ou até mesmo uma doen-
filiação, de participação natural e espontânea à heterossexuali- ça. O debate em torno do reconhecimento legal dos casais
dade tem o efeito de provocar uma adesão imediata, irrefletida, do mesmo sexo, na França, desencadeou numerosas reações,
a uma identidade experimentada como originária que serve de entre as quais uma passeata no centro da capital, em 31 de
referência para o reconhecimento dos "normais" (heterosse- janeiro de 1999, no decorrer da qual milhares de manifestan-
xuais) de todos os círculos da sociedade. Ora, essa construção tes vociferavam o slogan "veados para a fogueirá', sem que tal
social da normalidade nada tem de natural; centenas de trata- postura tivesse suscitado a menor indignação. Ora, a tomada
dos teológicos, enciclopédias médicas, recomendações morais, de consciência da gravidade do fenômeno homofóbico parece
códigos e regulamentos, assim como de contos de fadas, filmes uma condição prévia indispensável a qualquer ação repres-
e romances, foram necessários para enraizar esse sentimento sora: caso contrário, esta será necessariamente experimenta-
no mais recôndito das consciências. Estigmatizar o outro para da como unilateral, a serviço exclusivo dos interesses de um
se justificar, eis a lógica do mecanismo psicológico bem rodado segmento da população. Na realidade, a homofobia é não só
que já deu provas de sua eficácia em grande número de outros uma violência contra os homossexuais, mas igualmente uma
domínios (racismo, antissemitismo, xenofobia, etc.). agressão contra os valores que fundamentam a democracia.
Previamente à repressão, a luta contra a homofobia exige, Em seu livro Espírito das leis, Montesquieu (1689-1755) es-
portanto, uma ação pedagógica destinada a modificar a du- creveu o seguinte: "Eu me sentiria o mais feliz dos mortais se
pla imagem ancestral de uma heterossexualidade vivenciada pudesse contribuir para que os homens conseguissem curar-
como natural e de uma homossexualidade apresentada como se de seus preconceitos':8oMenos ambiciosos, devemos tomar
uma disfunção afetiva e moral. consciência da violência destilada pelos preconceitos; ora, é
A homofobia é um preconceito e uma ignorância que con- somente se essa iniciativa vier a revelar-se ineficaz que convi-
siste em crer na supremacia da heterossexualidade. Em nome rá fazer apelo aos instrumentos repressores do direito.
de que princípio e em virtude de que tese será possível ainda
A prevenção da homofobia
continuar defendendo que a heterossexualidade é preferível à
homossexualidade? Pode-se aceitar a evocação das exigências A violência e a discriminação em relação a homosse-
da reprodução da espécie para fundamentar tal julgamento? xuais ocorrem, frequentemente, diante da maior indiferença
A tradição poderá ainda justificar o tratamento de favor de da população. Com certa regularidade, ficamos sabendo que
que se beneficia a heterossexualidade? numerosos gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais vi-
As razões que levaram a crer na preeminência da união vem com temor de serem agredidos simplesmente por causa de
heterossexual são, atualmente, contestadas. sua orientação sexual. Em um relatório terrificante, a Amnes-
Na realidade, a homofobia constitui uma ameaça aos va- ty International (1998) denuncia os assassinatos, as execuções
lores democráticos de compreensão e respeito por outrem, no legais, as .torturas, os estupros, as terapias forçadas, os despe-
sentido em que ela promove a desigualdade entre os indiví- dimentos abusivos e os insultos de que os homossexuais con-
duos em função de seus simples desejos, incentiva a rigidez tinuam sendo vítimas. Ainda é reduzido o número de países
dos gêneros e favorece a hostilidade contra o outro. Enquanto que descriminalizaram a homossexualidade, a qual, na maior
problema social, a homofobia deve ser considerada como um
delito suscetível de sanção jurídica; todavia, a dimensão re-
80 Entre nós, Paulo Autran afirma o seguinte: "Todo preconceito é fruto da burrice,
pressora é destituída de sentido se ela não for acompanhada da ignorância, e qualquer atividade cultural contra preconceitos é válida". E, ain-
por uma ação preventiva. Com efeito, um número importan- da, este desabafo de Albert Einstein "Triste época! É mais fácil desintegrar um
te de pessoas continuam considerando a homossexualidade átomo que um preconceito': (N.T.).

10(; Homofobia ( :OIll'it,sil" 107


parte dos casos, é punida com detenção: no Afeganistão, no Irã, agressões físicas e verbais contra os/as homossexuais conti-
na Mauritânia, na Tchetchênia e no Sudão, os homossexuais nuam sendo numerosas83 e contribuem para a culpabilização
são passíveis de dilapidação ou de flagelação e, até, podem ser das pessoas que julgam que sua homossexualidade constitui
condenados à morte. As afirmações recentes do aiatolá Musava uma deficiência difícil de superar.84 Essa "homofobia introje-
Ardelsili na Universidade de Teerã reconduzem-nos ao passa- tada': essa hostilidade interiorizada representa a forma mais
dissimulada das violências heterossexistas.
do inquisitorial da Idade Média na Europa:
O conjunto das situações evocadas demonstra o desco-
Para os homossexuais, o islã prescreve as mais severas puni- nhecimento generalizado da "questão gay e lésbica': Entre os
ções ... Depois de ter sido estabelecida a prova em conformidade insultos mais correntes, atualmente, são utilizados os termos
com a charia, convirá prender a pessoa, segurá-Ia de pé, dividi-Ia
ao meio com uma espada e cortar-lhe a cabeça ou rachá-Ia ao
"pédé" ou "enculé",85 que ilustram a banalização dessa agres-
meio de cima abaixo. Ele (ou ela) vai desabar no chão ... Depois são, ou seja, dessa forma de violência simbólica que veicula o
de verificar sua morte, convirá fazer uma pira, em cima da qual ódio contra aqueles que se afastam da norma heterossexual;
deve ser colocado o cadáver para ser queimado, ou, então, trans- cada insulto proferido evoca, assim, a existência de uma or-
portá-Ia para um monte e lançá-Ia no precipício. Em seguida, dem sexual e de sua hierarquia. Portanto, a primeira tarefa
os pedaços do cadáver deverão ser reunidos e queimados. Ou,
pedagógica consistiria em questionar essa ordem heterosse-
então, convirá escavar um buraco, acender uma fogueira e Ian-
xista e em enfatizar que a hierarquia de sexualidades é tão
çá-Io(a) vivo (a) dentro desse buraco. Não existem tais punições
para outros crimes (AMNESTY INTERNATIONAL, 1998, p. 32-33). detestável quanto a de raças ou de sexos.
Trata-se de um amplo empreendimento, considerando o
Até mesmo nos Estados em que a lei não proscreve a ho- caráter difuso da homofobia. À semelhança do racismo, ela
mossexualidade, gays e lésbicas são, muitas vezes, vítimas do constitui, em primeiro lugar, uma experiência vivida. Nesse
assédio policial. Assim, "no Reino Unido, alegações relativas aspecto, vamos retomar a observação de A. Memmi (1982):
a maus-tratos contra homossexuais foram levadas ao conhe- "Nós a ingurgitamos com nossos primeiros biscoitos ou com
cimento de Amnesty lnternational" (p. 40). No Brasil e na Co- nossos primeiros pastéis': Esse a priori é, posteriormente,
lômbia, esquadrões da morte têm praticado centenas de assas- consolidado pelos discursos e pelas teorias.
sinatos de gays e travestis (LEAL; CARVALHO,2008; VENTURI, O processo pedagógico deverá começar pela denúncia do
2009). Vários chefes de Estado africanos proferem, com certa conjunto de códigos culturais e de estruturas sociais que, ao
regularidade, injúrias homofóbicas: o presidente do Zimbá- transmitirem seus valores, fortalecem os preconceitos e a discri-
bue declarou, recentemente, que "os homossexuais são piores minação contra gays e lésbicas. Deve-se, em primeiro lugar, abor-
que os porcos e os cães";81 por sua vez, Sam Nujoma, presi- dar as famílias, a fim de que os pais sejam capazes de compreen-
dente da Namíbia, lançou um apelo, em 19 de março de 2001, der que um filho gay ou uma filha lésbica não constituem, de
para prender e deportar os/as homossexuais.82 Na França, as modo algum, um problema; em vez disso, os verdadeiros temas

83 Para ter uma ideia geral das agressões perpetradas contra os homossexuais, ver
81 "Un postapartheid encore plus gay" [Um pós-apartheid ainda mais gay*], no
SOS Homophobie, 1999.
periódico parisiense de esquerda Libération, 22 de novembro de 1999, p. 13.
*À semelhança do original inglês, a palavra homófona "gai': em francês, sig- 84 "Tenho 22 anos, já fiz uma tentativa de suicídio aos 19 anos e, ao deixar o hospital,
nifica "alegre"; por exemplo, na expressão familiar, "être gai comme un pinson voltei a tentar suicidar-me. Sinto desejos homossexuais, mas não posso aceitar tal
[pintassilgo]" = ser/estar muito alegre. (N.T.). situação; é algo diferente de mim" - testemunho de um jovem da região parisiense
(PARLONS D'AZUR, 1999, p. 11; d. HERNÀNDEZ, 1999; SMIGAY, 2002).
82 Em 5 de abril de 2001, o Parlamento Europeu condenou essa tomada de posi-
ção, cf. Resolução BS-0264. 85 Literalmente, o indivíduo que é penetrado pelo ânus. (N.T.).

108 Homofobia Conclusão 109


de preocupação devem ser a rejeição ou a não aceitação dos fi- medidas que permitam "garantir uma sensibilização adequada
lhos/as em decorrência de sua orientação sexual, assim como a e aprofundada à vivência de gays e lésbicas, além de uma cons-
violência traumatizante implicada em tal atitude. O anúncio des- cientização dos intervenientes relativos a seus preconceitos
sa diferença às pessoas conhecidas e, principalmente, aos mem- homofóbicos"; são propostas, também, campanhas de sensibi-
bros da família, constitui, de fato, a principal fonte de angústia de lização, programas de informação e formação relativamente à
homossexuais adolescentes (PARLONSD'AZUR,1999). orientação sexual nos espaços de trabalho, nos serviços sociais,
A escola, igualmente, deve desempenhar um papel capital no meio universitário e judicial. Uma atenção particular é pres-
na luta contra a intolerância, levando a compreender que o tada à educação pública contra o heterossexismo e a homofo-
reconhecimento da igualdade de gays e lésbicas é uma ques- bia; a imprensa, as estações de rádio e as redes de televisão são
tão que diz respeito a todos. Nos cursos e livros didáticos, a convidadas a eliminar os clichês e estereótipos que se baseiam
homossexualidade e a bissexualidade deveriam ser apresenta- na ignorância e nos preconceitos, além de apresentarem uma
das como manifestações da sexualidade tão legítimas e bem- imagem positiva dos homossexuais. Por último, medidas espe-
sucedidas quanto a heterossexualidade (JUNQUEIRA, 2009; cíficas são empreendidas para apoiar o acompanhamento das
vítimas da violência homofóbica.
KAMEL, 2008). Finalmente, a homossexualidade dos perso-
nagens da história, da literatura ou das ciências poderia ser Com o mesmo intuito, as autoridades europeias têm reno-
vado incessantemente, nos últimos vinte anos, o convite aos
evocada com uma naturalidade semelhante à que se utiliza
Estados-Membros no sentido de tomarem medidas no senti-
para falar do casamento de determinada rainha ou das aven-
turas amorosas de determinado revolucionário. do de eliminar as discriminações e violências que continuam
sendo perpetradas contra os homossexuais. Duas diretrizes
A melhor integração da ideia da diversidade sexual, assim
comunitárias e uma decisão do Conselho implementam um
como da importância dos valores de igualdade e não discri-
programa europeu para avaliar o grau de tolerância em rela-
minação em relação a homossexuais, deveria fazer parte da
ção às minorias, a fim de combater eficazmente as manifesta-
formação dos profissionais encarregados de abordar determi-
ções discriminatórias no conjunto dos países-membros.87 En-
nados aspectos da vida privada dos cidadãos e, em particular,
tre os atores-alvo a associar na luta contra as discriminações,
de sua orientação sexual. Durante muito tempo, a polícia, os
a União Europeia apresenta, como exemplo,
juízes, os médicos e os psiquiatras, entre outras corpo rações,
participaram ativamente na repressão de gays e lésbicas; ape- [...] os decididores políticos das administrações nacionais,
sar disso, é no seio dessas profissões que convirá, principal- regionais e locais, os organismos independentes, as ONGs,
mente, promover ações pedagógicas.86 os parceiros sociais, os institutos de pesquisa, a mídia, os for-
madores de opinião, os prestadores de serviços sociais, o sis-
Em um relatório de 1994, o CDPDJ do Québec elaborou
tema judicial e os serviços encarregados da aplicação da lei.
proposições destinadas a lutar contra a violência e as discri-
minações em relação aos homossexuais (ver, também, CDPDJ, Na mesma ordem de ideias, um relatório da Associação
1996). Esse Comitê recomenda que sejam tomadas todas as Stonewall de Londres (MAsoN, 1996) propôs um plano de

86 Ver Bruner, 1981; nesse relatório, as medidas propostas levam em consideração 87 Diretrizes do Conselho da Europa relativas ao artigo 13 do Tratado de Amsterdã:
as relações entre a polícia, por um lado, e, por outro, os gays e as lésbicas em l/diz respeito à criação de um quadro geral em favor da igualdade de tratamento
Toronto, Canadá. Um relatório do CDPDJ [Comitê dos Direitos da Pessoa e em matéria de emprego e trabalho; 2 / relativa à implantação do princípio de
dos Direitos da Juventude] do Québec recomenda, entre outros aspectos, que igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de raça ou origem étnica;
os responsáveis pela formação dos policiais garantam informação adequada 3/ decisão do Conselho que estabelece um programa de ação comunitária foca-
sobre a realidade de gays e lésbicas. lizado na luta contra a discriminação (2001-2006), Bruxelas, 2000.

110 Homofobia Conclusão 111


ação que, em particular, se refere aos domínios da polícia, da transeuntes determina o conjunto de gestos carinhosos entre
educação, do direito e da justiça penal. Trata-se de facilitar parceiros homossexuais, enquanto essas mesmas manifesta-
os vínculos entre os homossexuais e as instituições a fim de ções são incentivadas e festejadas quando assumem a forma
favorecer a compreensão das dificuldades e violências a que heterossexual. "Nunca sinto a mínima hesitação - responde
eles são submetidos. Esse documento propõe, também, um uma mulher heterossexual - se tenho vontade de pegar na
guia sobre a violência homofóbica, assim como sessões de mão do meu amigo ou beijá-Io em público:' A apropriação do
sensibilização nas escolas, nas universidades e com a opinião espaço público é o sinal da desigualdade cotidiana em função
pública. Aconselha-se, vigorosamente, a modificação da lei da qual os homossexuais não podem manifestar abertamente
para eliminar todas as formas de discriminação, além de pu- sua afeição, e - quando chegam a superar esse olhar repro-
nir os discursos de ódio homofóbico. Por último, um orça- vador - eles não podem deixar de pensar que, no fundo, sua
mento específico é solicitado com o objetivo de financiar os atitude é provocadora, militante ou exibicionista.
estudos científicos sobre a homofobia e suas consequências A educação relativa à luta contra a homofobia consistiria,
psicológicas e sociais. afinal de contas, em sensibilizar a população heterossexual de
Certamente, a lei pode facilitar a mudança social relativa- maneira que esta deixe de considerar sua sexualidade como
mente à imagem dos homossexuais e da homossexualidade, incontestável ou seu comportamento como necessariamente
mas ela continuará sendo ineficaz se não for acompanhada compartilhado por todos; ou seja, essa educação teria o ob-
por um trabalho pedagógico. jetivo de mostrar que outras formas de sexualidade podem
A simples pressuposição da heterossexualidade constitui, coexistir com a heterossexualidade, sem que esta seja preju-
por si só, uma violência simbólica cotidiana contra aqueles que dicada ou venha a constituir o objeto de provocação por parte
dos homossexuais.
não compartilham esse sentimento, supostamente, comum.
Vejamos alguns exemplos: o médico que se dirige a um pacien- A punição dos comportamentos homofóbicos
te do sexo masculino mencionando sua companheira como se
a heterossexualidade fosse evidente e a única forma de sexua- A fim de compreender melhor o alcance efetivo da repres-
lidade; a enfermeira escolar que aconselha, sistematicamente, são legal, parece útil distinguir as duas formas específicas de
as meninas a utilizar contraceptivos sem imaginar que possa hostilidade contra os/as homossexuais, a saber: os atos de dis-
haver lésbicas na turma; ou, ainda, os compêndios de sexua- criminação (fatos materiais) e os "discursos de ódio"88(provo-
lidade masculina ou feminina que fazem referência exclusiva cação à discriminação ou à violência).
a práticas heterossexuais. Pensemos, enfim, nas propagandas No primeiro caso, além do Código Penal francês, várias
que pressupõem sempre a atração erótica pelo sexo oposto a normas jurídicas preveem sanções contra qualquer distinção
fim de promover a comercialização de determinado produto, injustificada baseada na orientação sexual (costumes). Esse de-
nos trailers de cinema, nas canções de amor e nas alusões de lito é constituído desde que exista uma ação ou omissão discri-
toda a espécie que celebram constantemente o desejo heteros- minatória contra a pessoa ou o grupo visado; ele implica a uti-
sexual; em suma, outras tantas situações que constituem uma lização do preconceito com a intenção de prejudicar a vítima.
violência ao serem apresentadas como evidentes e exclusivas. Por suavez,o segundo caso,relativo ao discurso do ódio, éde-
A maior parte dos casais do mesmo sexo rejeitam manifes- finido pela lei como qualquer expressão injuriosa, difamatória
tar em público sua ternura, beijar-se na rua ou pegar na mão
do companheiro ou da companheira. O medo do julgamento 88 E8sa expressão foi consagrada pelo Conselho da Europa (1997), em particular,
reprovador e, até mesmo, de violências físicas por parte dos relativamente ao ódio racial, xenófobo e antissemita.

112 Homofobia COIlciuHiío 11:1


ou que seja um incentivo à violência, sabendo, todavia, que comportar disposições que lesem os salariados, particular-
esse caso ainda não abrange os discursos homofóbicos. Com mente, em razão de seus costumes.92 No plano europeu, o Tra-
efeito, apenas recentemente é que propostas de lei foram apre- tado de Amsterdã introduziu no direito comunitário, pela pri-
sentadas na Assembleia Nacional francesa a fim de que os de- meira vez, as discriminações baseadas na orientação sexuaJ.93
litos de injúria, difamação e ódio, já previstos para o racismo Entretanto, fora desses quadros estabelecidos pela lei, os
ou o antissemitismo, sejam estendidos à homofobia.89 homossexuais continuam sofrendo numerosas discriminações
Para além da proteção geral de que se beneficia a popula- consideradas legítimas pelo Estado francês. Pensemos, em par-
ção inteira,90os gays e as lésbicas começam a ter seus direitos ticular, na exclusão do casamento para a união entre pessoas
salvaguardados contra os procedimentos discriminatórios. do mesmo sexo; com efeito, apesar de terem sido resolvidas al-
Desde a lei n° 85-772, de 25 de julho de 1985, relativa às dis- gumas situações de precariedade pelo Pacte Civil de Solidarité
criminações baseadas nos costumes,91 diversos dispositivos (PaCS), numerosas desigualdades subsistem no direito francês,
foram implementados a fim de evitar as eventuais exclusões especialmente em matéria de filiação, direito social ou direito
a que estão expostos os indivíduos em decorrência de sua da nacionalidade. Os argumentos contra a liberdade matrimo-
orientação sexual. Nesse sentido, o Código Penal francês es- nial da união entre pessoas do mesmo sexo, apresentados pelas
tabelece, no artigo 225-1, um princípio geral que proíbe qual- autoridades políticas, religiosas ou intelectuais, constituem a
quer forma de discriminação baseada em sexo, situação de prova da desconfiança suscitada, ainda, pelos casais homosse-
família, estado de saúde, deficiência, opinião política, raça, xuais. A semelhança do que havia ocorrido outrora com judeus,
pertencimento a uma nação, religião ou sindicato; nesse mes- protestantes, colonizados ou comediantes que eram excluídos
mo artigo, e sempre sob a categoria "costumes': é prevista uma do sacramento matrimonial, assim também, atualmente, os
proteção contra as discriminações em relação aos homosse- gays e as lésbicas estão privados do direito ao casamento.
xuais. Por sua vez, o Código do Trabalho francês estabelece A ampliação do casamento foi, sistematicamente, reivin-
que "nenhuma pessoa deverá ser descartada de um proces- dicada pelas associações gays, mas a questão não foi debatida
so de recrutamento, nenhum salariado pode ser sancionado na França, erarossão aqueles que aevocaram. Para alémdo alcan-
e ninguém poderá ser despedido em razão de sua origem, ce simbólico implicado em tal reconhecimento, o PaCS- ao ins-
sexo, costumes [...]" (Art. L. 122-45). Do mesmo modo, os tituir uma espécie de subcasamento para os/ as homossexuais -
regulamentos internos das empresas francesas não podem se beneficia do triste privilégio de instaurar uma forma sutil de
segregaçãocontra uma categoria de casais.Impedida de ter aces-
so ao casamento, a união entre pessoas do mesmo sexo deve,
89 Para abrir o debate sobre a incriminação da homofobia, a Associação ArDES
com efeito, contentar-se com um status inferior, desprovido de
organizou um colóquio em 19 de junho de 1999, em Paris (cf. Atas in BOR-
RILLO; LASCOUMES, 1999).

90 Ver o artigo 9 do Código Civil francês, o artigo 10 da Declaração dos Direitos 92 Em 12 de outubro de 2000, a Assembleia Nacional Francesa votou uma lei so-
do Homem e do Cidadão de 1789, o Preâmbulo da Constituição francesa de 27 bre a "modernização social'; mediante a qual são condenadas as discriminações
de outubro de 1946, o artigo 8 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos fundadas na orientação sexual (Art. L. 122-35).
e o artigo 2 da Constituição francesa de 4 de outubro de 1958. 93 Assim, o artigo 13 enuncia: "Sem prejuízo das outras disposições do presen-
91 Este termo ["mreurs"] é um eufemismo adotado pela lei para referir-se, de ma- te Tratado e nos limites das competências que este confere à Comunidade, o
neira pudica, à homossexualidade. A expressão "orientação sexual" parece mais Conselho, estatuindo por unanimidade com base na proposição da Comissão
apropriada e já é utilizada pelas principais constituições modernas, assim como e após consulta do Parlamento Europeu, pode tomar as medidas necessárias
pelo artigo 13 do Tratado de Roma (25 de março de 1957), modificado pelo para combater qualquer discriminação baseada em sexo, raça ou origem étnica,
Tratado de Amsterdã (2 de outubro de 1997). religião ou convicções, deficiência, idade ou orientação sexual':

114 Homofobia ConclusflO 11"


um número importante de direitos fundamentais. Se o homos-
para traduzir a sigla "PaCS": "Prática de Contaminação Sidaí'-
sexual encontra-se relativamente protegido, a título individual,
que [aidética]': Um panfleto foi enviado a centenas de milhares
contra as discriminações de que é vitima, em compensação, en-
de pessoas em que se podia ler o seguinte:
quanto casal, os gays e as lésbicas são colocados ainda em uma
situação de desigualdade em relação às uniões heterossexuais. A característica das uniões entre invertidos, além das práticas
nauseabundas contra a natureza, é sua enorme instabilidade
No que diz respeito à segunda forma de hostilidade, ou
[00'] Os sodomitas e os adeptos do amor livre contam com nos-
seja, os "discursos de ódio': sublinhemos que essa noção reme-
sa inércia ['00] Solicito a todos para que se mobilizem com o
te essencialmente aos apelos à violência racista ou antissemi-
objetivo de defender a civilização, a família e a França.96
ta. Incriminados, na França, por uma lei de 1881 (modificada
em 1972) sobre a imprensa, os delitos de injúria, difamação e Em 15 de abril de 1998, o periódico parisiense Le Mon-
incitação à violência racial ou religiosa organizam a proteção de difunde a seguinte notícia: "12.062 prefeitos97 opõem-se
penal dos indivíduos e grupos contra as declarações odiosas; ao contrat d'union sociale [Contrato de União Social]" (ver-
no entanto, essa lei não incrimina os discursos homofóbicos, são anterior ao PaCS). Michel Coulon, prefeito socialista de
permitindo que tais afirmações injuriosas não sejam passíveis Le Fay no departamento de Saône-et-Loire, declara que ele
de punição. Os exemplos são numerosos: no texto de um his- "apresentaria atestado médico" se, um dia, tivesse de "efetuar
toriador midiático, foi possível ler que tal união contra a naturezà: Jean-Pierre Leclerq, prefeito de
Épenouse,98 no departamento de Doubs [divisa com a Suíça]'
[00']a pedofilia assumiu uma extensão calamitosa. O fato de explica que preferiria pedir a demissão a "prestar-se a tal mal-
confiar crianças a casais de homossexuais masculinos (eis o que versação" (FOUREST; VENNER, 1999, p. 11).
irá, certamente, produzir-se pela evolução lógica se o PaCS for
adotado) não deixará, portanto, de incrementar ainda mais os No decorrer de uma passeata organizada pelos adversários
riscos de pedofilia que já se encontram em pleno desenvolvi- do PaCS, vários slogans - tais como "Nada de sobrinhos para
mento (LE Roy LADURIE, 1998). as bichas" ou "Os homossexuais de hoje são os pedófilos de
amanhã!"99 - foram exibidos nas ruas de Paris sem que os ho-
Para importantes políticos, "os homossexuais, à força de mossexuais conseguissem mover qualquer processo judicial.
sua incessante exigência de direitos, adotam o integrismo e, A presumível afabilidade da homofobia, tendo se mantido la-
de passagem, contribuem para engrossar as fileiras do partido tente e um tanto apática, acabou por manifestar-se de forma
Front national':94 "A homossexualidade é a impossibilidade em
que se encontra um ser humano para alcançar o outro em sua
96Panfleto de Avenir de Ia Culture [Futuro da Cultura], 1998. Trata-se de uma seita
diferença sexual, ou seja, a expressão da exclusãd' (BOUTIN,
cristã, cujo lema é Tradition- Famille- Propriété [Tradição- Família- Propriedade].
1998).95Ou, ainda, o comentário de Michel Meylan, deputado
"Na época, o número de prefeitos franceses elevava-se a 36.700; para uma infor-
governista de direita: "Os homossexuais ... mijo em cimà: E eis
mação mais detalhada sobre essa iniciativa dos prefeitos, acesse: <http://www.
a proposta de Emmanuel Hamel, senador governista de direita, prochoix.org/ cgi/blog/index. php/ 1999 /08/06/806-enquete-sur-la -petition-
des-maires-anti-pacs>. (N.T.).
<JH Vale lembrar que, na França, a cerimônia oficial do casamento se efetua na
94 Afirmação de Bernard Accoyer, * deputado do partido governista de direita.
prefeitura, diante do prefeito ou de seu delegado.
*É o atual presidente da Assembleia Nacional Francesa. Por sua vez, Front
Comuna com 93 habitantes; esse prefeito constava da lista das 500 assinaturas
national [Frente Nacional] é o partido da extrema-direita, liderado por Jean-
Marie Le Peno (N.T.). de pessoas exercendo um cargo eletivo que apoiaram a candidatura de Christine
Boutin nas eleições presidenciais de 2002. (N.T.).
95Christine Boutin é a presidenta do Parti Chrétien-Démocrate [Partido Cristão
Democrata]. (N.T.). 99Na origem da passeata anti-PaCS, realizada em 31 de janeiro de 1999, que reuniu
cerca de 100.000 pessoas, encontrava-se a deputada católica, Christine Boutin.

116 Homofobia
Condu"Oo 117
brutal. Todos os herdeiros da tradição homofóbica estavam Desde o final do século XIX, na França, a lei tem protegido
presentes: associações católicas, muçulmanas, protestantes e os indivíduos e os grupos contra esses ataques verbais insultan-
judaicas desfilavam, lado a lado, com a extrema direita e a teso A difamação é definida como a alegação ou a imputação de
burguesia conservadora. A antiga repulsa visceral esbaldou- um fato preciso que causa prejuízo à honra ou à consideração
se freneticamente nas paixões homofóbicas: "Veados nojen- da pessoa ou da corporação à qual ele é imputado. A injúria é
tos", "Que essa escória vá para o inferno" ou, ainda, "Parem uma expressão ultrajante que utiliza termos de menosprezo ou
de nos torrar o saco com a AIDS de vocês" - eis outros tantos de ofensa, mas, diferentemente da difamação, não contém a im-
insultos proferidos, publicamente, pelos manifestantes. 100 putação de um fato concreto. A provocação à discriminação, ao
Diante de tal violência, a necessidade de uma lei para pro- ódio ou à violência - em particular, por razões raciais - contra
teger os homossexuais começa a impor-se nas mentes. Com uma pessoa ou um grupo de pessoas é igualmente sancionada
efeito, alguns meses depois, em 18 de outubro, uma primeira pelo direito. Se, após vários anos, as associações de luta contra
proposta de lei, na Assembleia Nacional francesa, ampliando o racismo podem apresentar-se como parte civil, foi apenas re-
a provocação à discriminação e à violência homofóbicas foi centemente (graças a uma emenda proposta, em 10 de fevereiro
apresentada pelo deputado liberal, F. Léotard.lol Em seguida, de 2000, pelo deputado Jean-Pierre Michel) que as associações
vários projetos foram elaborados por outras formações polí- de gays se beneficiaram, igualmente, dessa possibilidade nos
ticas e pelas principais associações de defesa dos direitos do casos tanto de discriminação material quanto de ameaças vo-
homem;102 todos esses textos propõem incluir a orientação luntárias à vida ou à integridade das pessoas, mas sempre no
sexual nas incriminações penais de injúria, difamação e pro- âmbito de incitação ao ódio.
vocação à discriminação, ao ódio e à violência em relação a A fim de atender a essa situação, uma lei de 30 de dezembro
uma pessoa ou a um grupo de pessoas. de 2004, "relativa à criação da HALDEl03", amplia a punição dos
discursos injuriosos, difamatórios e de incitação à discrimina-
100 Para uma análise mais aprofundada das ações contra o reconhecimento dos ção contra "uma pessoa ou um grupo de pessoas em razão de
casais formados por pessoas do mesmo sexo, ver Fourest; Venner, 1999; Bor- sua orientação sexual': Desde então, o Ministério Público pode
rillo; Fassin; Iacub, 1999; Desfossé; Dhellemmes; Frai'ssé; Raymond, 1999.
apresentar queixa quando as afirmações forem dirigidas a um
Proposição de lei relativa à luta contra a provocação à discriminação, ao ódio ou
101
grupo de pessoas; por sua vez, as associações inscritas, no mí-
à violência em relação a pessoas em razão de suas práticas sexuais não reprimi-
das pela lei, registrada em 9 de novembro de 1999, sob o n° 1.893.
nimo, há cinco anos e tendo por objeto a defesa dos direitos
de gays e lésbicas podem constituir-se como parte civil, com o
102 Cf. Borrillo e Lascoumes, 1999. As associações de luta contra a AIDS e de defesa
dos direitos de gays e lésbicas (Aides, Act -Dp, "Sida Info Service'; o "Centre Gay et
acordo da vítima, tratando-se de injúrias, difamações ou incita-
Lesbien de Paris'; ProChoix, "Fond de lutte contra l'homophobie" e "sos Homo- ção à discriminação considerada individualmente.
phobie") constituíram, em 1999, um organismo interassociativo com a Liga dos Di- Além disso, uma lei de 18 de março de 2003 - na sequência
reitos do Homem a fim de apoiar um projeto de lei contra o sexismo e a homofobia;
da lei desse mesmo ano "que visava agravar as penas que san-
em seguida, os principais partidos políticos de esquerda começaram a trabalhar
cionam as infrações com caráter racista, antissemita e xenó-
sobre a questão. O Partido Comunista foi a segunda formação política a apre-
sentar, oficialmente, uma proposta de lei, em 1° de fevereiro de 2000 (n° 2.150); fobo" - introduz no Código Penal francês uma circunstância
proposta do Partido Socialista registrada em 10 de maio de 2000 sob o n° 2.373; agravante em razão da verdadeira, ou suposta, "orientação se-
proposta dos Verdes registrada, nesta mesma data, sob o nO2.376; além de propos- xual" da vítima; à semelhança do móbil racista ou antissemita,
ta de lei oriunda do Grupo Socialista, no Senado, apresentada em 21 de março de
2000 (n° 274). Em 26 de janeiro de 2000, a Assembleia Parlamentar do Conselho
da Europa votou uma resolução que propõe a proteção das discriminações basea- 103 Sigla de Haute autorité de lutte contre les discriminations et pour l'égalité [Alta
das na orientação sexual, assim como dos discursos de ódio contra gays e lésbicas. Autoridade de Luta contra as Discriminações e em favor da Igualdade]. (N.T.).

118 Homofobia Conclusão 119


daí em diante, o móbil homofóbico é considerado também odio-
so. O assassinato é, assim,punido com a reclusão perpétua quan-
do for cometido em razão da orientação sexual da vítima. Referências
A lei contra a homofobia e a identidade gay
~
Não se trata, de modo algum, de considerar que a orien-
tação sexual possa constituir a substância de uma identidade;
tal pretensão implicaria confinar as pessoas em um sistema de
atitudes e de comportamentos, limitando-as a uma consciên- AGUERO, J.; BLOCH, 1.; BYRNE, D. 'lhe Relationships among Sexual
cia de si precariamente escolhida. A sexualidade de um indi- Beliefs, Attitudes, Experience and Homophobia. Journal of Homosexu-
víduo parece ser um elemento demasiado pouco significativo ality, v. 10, n. 1-2, Nova York: 'lhe Haworth Press, 1984.
para pretender defini-Io. A "personalidade homossexual" não ALISON, J. Ser "gay" é como ser canhoto. Expresso, Lisboa, 28 mar.
existe: essa ideia, elaborada por uma ideologia normativa do 2008. Disponível em: <http://aeiou.expresso.pt/gen. pl ?p=stories&op=
tipo médico-higienista, é completamente ineficaz para a sal- view&fokey=ex.stories/2 79138>.
vaguarda das pessoas; entre outros aspectos, porque ela nun- ALMEIDA, G. Argumentos em torno da possibilidade de infecção por
ca teve o objetivo de proteger, mas de reprimir. DST e Aids entre mulheres que se auto definem como lésbicas. Physis,
A banalização institucional da homossexualidade104 pare- Rio de Janeiro, v. 19, n. 2, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/
scielo. php?pid=SO 103-73312009000200004&script=sci_arttext>.
ce ser uma etapa necessária para deixar de lado a ideologia
essencialista (WEEKS, 2007, p. 45 ss.), produtora de uma espé- ALSTON, J. P. Attitudes towards Extramarital and Homosexual Rela-
tions. Journal for the Scientifie Study of Religion, n. 13, 1974.
cie artificial (a homossexualidade); de fato, ainda se procura
classificar, nessa espécie, uma parcela heterogênea de indiví- AMARAL, S. M. Manual prático dos direitos de homossexuais e transe-
duos (os/as homossexuais). Ora, nada permite constituir tal xuais. Editora do site "Amor Legal'; 2006.

grupo monolítico em função, exclusivamente, do desejo se- AMNESTY INTERNATIONAL. Briser le silenee: violations des droits de
l'homme liées à l'orientation sexuelle. Paris, abro 1998.
xual. A abordagem minoritária, especialmente quando seus
fundamentos permanecem contestáveis em termos de carac- AMNESTY INTERNATIONAL. Identité sexuelle et perséeutions. Paris,
terização, pode ter efeitos perversos dificilmente controláveis. 2001 . Disponível em: <http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/
Eis por que a via da não discriminação e da repressão das vio- index.php?storytopic= 1770>.

lências contra os gays e as lésbicas constitui uma salvaguarda ANATRELLA, T. Le sexe oublié. Paris: Flammarion, 1990.
não só para as vítimas, mas também contra qualquer tentação AQUINO, T. Summa Theologiae. [Suma Teológica. 8 vols. São Paulo:
identitária: o dever de proteção relativamente a gays e lésbicas Ed.Loyola, 2000-2003.]
não se baseia, de modo algum, em qualquer filiação a uma ARÁN, M. Políticas do desejo na atualidade: o reconhecimento social
"naturezà: "essêncià' ou "grupo': Por conseguinte, a homo- do casal homossexuaL Disponível em: <http://www.estadosgerais.org/
fobia do "verdugo" - e não a homossexualidade da vítima - é encontro/IV /PT /trabalhos/Marcia_Aran. pdf>.
que deve tornar-se o objeto de qualificações jurídicas. BADINTER, É. XY de l'identité maseuline. Paris: Odile Jacob, 1992.
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104 Essa banalização não deve implicar um apelo à discrição; tal atitude, como e Artes da UFRN [lançada em dezembro de 2007, publica artigos resul-
observa L. Bersani, "nada é além da deferência para com uma hierarquia dife-
tantes de estudos teóricos e pesquisas empíricas sobre gênero, sexuali-
rencial que reserva as posições inferiores àqueles que consentem em conservar dade e homossexualidade]. Disponível em: <http://www.cchla.ufrn.br/
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