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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS


Faculdade de Psicologia

Raquel Leal dos Santos Pegado

O PROFANO E O SAGRADO COMO FACES DA MESMA MOEDA: os sentidos da


imagem da Pombagira no inconsciente coletivo

Belo Horizonte
2018
Raquel Leal dos Santos Pegado

O PROFANO E O SAGRADO COMO FACES DA MESMA MOEDA: os sentidos da


imagem da Pombagira no inconsciente coletivo

Monografia apresentada ao curso de Graduação em


Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção
do título de Bacharel em Psicologia
Orientadora: Prof ª Drª Maria Ignez Costa Moreira

Belo Horizonte
2018
Raquel Leal dos Santos Pegado

O PROFANO E O SAGRADO COMO FACES DA MESMA MOEDA: os sentidos da


imagem da Pombagira no inconsciente coletivo

Monografia apresentada ao curso de Graduação em


Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção
do título de Bacharel em Psicologia

__________________________________________________________________
Prof ª Drª Maria Ignez Costa Moreira (Orientadora)

___________________________________________________________________
Prof.ª. Joana D’Arc Alves (Leitora)

_________________________________________________________________
Prof.º Luiz Guilherme Mafle Ferreira Duarte. (Leitor)

Belo Horizonte, 29 de maio de 2018


A todas as mulheres que sustentaram
seus desejos diante da sociedade patriarcal.
AGRADECIMENTOS

Agradeço, antes de mais nada, a Deus e à Deusa que conduziram minha vida por
caminhos tão importantes para a minha formação como um Ser Humano.
Ao universo, por conspirar a meu favor e trazer-me pessoas tão especiais e importantes
para o meu amadurecimento como mulher, acadêmica e profissional.
A minha família, em especial a meus pais, Duca Leal e Marcos Pegado, por me
ensinarem o valor dos estudos. Grata mãe e pai, por terem lutado pela minha formação, sempre
sinalizando o melhor caminho, mas jamais impondo qual direção seguir. Agradeço também a
meus irmãos, pelo cuidado e apoio.
A minhas tias, por me terem ajudado nos momentos decisivos no meu caminho
acadêmico, do primário até a faculdade. Gratidão por tanto amparo e confiança.

À Juliana Panadés, por termos convivido tanto no período da faculdade, acredite, foi
fundamental para o meu crescimento pessoal.
A meu marido, faltam-me palavras para agradecer tamanho companheirismo e estímulo!
Grata, Mateus Vinícius, pelo seu amor que, em muitos momentos, se expressou através de
palavras motivadoras e pela sua confiança em minha capacidade.
Às minhas amigas, Geísa, Regiane, Hanna, Júlia e Deborah, sou grata pela amizade
construída no decorrer do curso e por me encorajarem a sustentar o meu desejo de estudar Jung.
À minha orientadora Maria Ignez, por acolher o meu tema de monografia com tanto
carinho e zelo, e por sua maestria em nos guiar de forma tão leve, mas ainda tão precisa.
À Joana D’Arc e ao Luiz Guilherme, agradeço por todo o suporte dado no decorrer do
desenvolvimento da monografia e por aceitarem o convite para serem os meus leitores.
À Larissa Paixão, agradeço as contribuições dadas nas orientações que, em muitos
momentos, clarearam minhas ideias.
Ao grupo espiritual Fraternidade Rainha da Floresta, em especial às Filhas da Lua, por
toda experiência vivida nos círculos de mulheres. Ademais, agradeço a todos que colaboraram
diretamente ou indiretamente, para o fechamento de um ciclo tão importante como este.
Arreda, homem, que aí vem mulher
Arreda, homem, que aí vem mulher
Ela é Pombagira, Pombagira de fé
Ela é Pombagira, Pombagira de fé
(RAINHA DO CABARÉ..., 2012)
RESUMO

A presente monografia baseia-se em um estudo que procura compreender a imagem da


Pombagira pelo viés da Teoria Analítica. Inicialmente, este trabalho apresenta a Psicologia
Analítica desenvolvida pelo psiquiatra Carl Gustav Jung, discorrendo assim sobre os conceitos
de símbolo, mito, arquétipo e inconsciente coletivo. Posteriormente, é abordada a construção
mítica da Pombagira. No decorrer do presente trabalho, fez-se importante, também, a reflexão
sobre o estigma e o lugar sagrado da Pombagira no inconsciente coletivo, bem como nas
religiões afro-brasileiras. Por fim, relaciona-se a imagem da Pombagira com a sexualidade da
mulher moderna, dando ênfase ao comportamento feminino que transgride ao “modelo de
mulher” esperado pela sociedade patriarcal.

Palavras-chaves: Jung. Teoria Analítica. Sexualidade. Mulher. Pombagira. Religião. Afro-


brasileira.
ABSTRACT

The present monograph is based on a study that seeks to understand the image of Pombagira by
the bias of the Analytical Theory. Initially, this work presents the Analytical Psychology
developed by the psychiatrist Carl Gustav Jung, thus discussing the concepts of symbol, myth,
archetype and collective unconscious. Subsequently, the mythical construction of Pombagira is
approached. In the course of the present work, the reflection on the stigma and sacred place of
Pombagira in the collective unconscious as well as in Afro-Brazilian religions was also made
important. Finally, the image of Pombagira is related to the sexuality of the modern woman,
emphasizing the feminine behavior that transgresses to the "model of woman" expected by the
patriarchal society.
Keywords: Jung. Analytical Theory. Sexuality. Woman. Pombagira and Afro-Brazilian
regiment.
LISTA DE IMAGEM

FIGURA 1 - Ilustração da Pombagira ..................................................................................... 37

FIGURA 2 - Fotos de médiuns incorporando as Pombagiras .................................................. 38


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 11

2 CONCEITOS CHAVES ELABORADOS POR CARL JUNG ............................................ 13

2.1 O contexto de Carl Jung.................................................................................................. 13

2.2 Conceitos fundamentais .................................................................................................. 14

3 O MITO DA POMBAGIRA ................................................................................................. 24

3.1 Maria Padilha de Castela ................................................................................................ 26

3.2 História da apropriação do mito da Pombagira no Brasil ............................................... 28

3.4 Pombagira: entre o estigma e o lugar sagrado nas religiões afro-brasileiras .................. 32

4 A RELAÇÃO DO SÍMBOLO DA POMBAGIRA E A SEXUALIDADE DA MULHER .. 36

5 CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 43

REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 46
11

1 INTRODUÇÃO

O tema escolhido para a presente monografia surge a partir da minha experiência em


2013, como participante e facilitadora de “círculo de mulheres”, termo utilizado para designar
encontros de mulheres com o propósito de resgatar saberes ancestrais relacionados ao
autocuidado feminino, à ginecologia natural, aos ritos de passagem da mulher, como por
exemplo a primeira menstruação. A isso se une a minha atuação como professora de dança do
ventre, de 2013 até 2016, em um projeto social desenvolvido pela prefeitura de São Joaquim de
Bicas, para meninas a partir de oito anos até mulheres de sessenta anos.
Diante dessas experiências, foi possível vislumbrar outras possibilidades de vivenciar a
sexualidade da mulher, considerando que ainda no sec. XXI existem expectativas em relação à
conduta das mulheres, que devem obedecer a um padrão cheio de atributos, tais como, a
santidade, a castidade, a pureza, entre outros. Contudo, nota-se que, na atualidade, um
contingente significativo de mulheres já não se limita a este modelo estereotipado e buscam
colocar-se na sociedade, em diversas áreas profissionais; além disso, têm-se posicionado de
modo mais livre, no exercício da própria sexualidade, não mais reprimidas, expressando suas
preferências e vontades até então consideradas tabus.
A Psicologia Analítica, proposta por Carl Jung, foi tomada como referencial teórico
para ancorar as reflexões sobre a imagem da Pombagira e as manifestações da sexualidade
feminina na atualidade. Escolhi a imagem da Pombagira, não só por termos na sociedade
brasileira um atravessamento da cultura africana, que esteve presente desde a colonização, mas
por desconstruir um padrão normativo de santidade e pureza atribuído à mulher, tendo em vista
que as entidades míticas das religiões africanas não se enquadram nesta lógica da mulher
santificada. Pelo contrário, percebe-se que, na mitologia africana, nenhuma entidade é vista de
forma dicotômica e excludente: “boa” ou “má”.
Deste modo, o objetivo desta monografia é, através da compreensão da imagem da
Pombagira no inconsciente coletivo, sustentada pela Teoria Analítica, em especial pelos
conceitos de arquétipo, inconsciente coletivo, mito e símbolo, refletir sobre a sexualidade da
mulher moderna.
A começar pela definição de inconsciente, proposta por Jung, que difere da definição de
Freud, uma vez que, na definição junguiana, o inconsciente é visto em duas dimensões, o
inconsciente pessoal e o inconsciente coletivo, sendo ambas fundamentais e inerentes a todo
12

ser humano. Segundo Jung, os elementos das experiências inconscientes individuais formam o
inconsciente pessoal, já as experiências inconscientes compartilhadas com a família, a etnia ou
o comum à espécie humana, denominam-se inconsciente coletivo. Ainda no primeiro capítulo,
é apresentado o conceito de arquétipo, umas das ideias centrais do pensamento junguiano e
fundamental para a compreensão do tema do presente trabalho. Em seguida, serão expostos os
conceitos de símbolo e mito pela perspectiva de Jung.
No segundo capítulo, será abordado o mito da Pombagira. Será feita uma breve
contextualização do cenário do Brasil Colônia, principalmente no campo religioso,
especialmente as influências trazidas pelos africanos escravizados. Ainda nesse capítulo, será
abordada a história de Maria Padilha de Castela, relatada por Meyer (1997), que ressalta na
história dessa mulher a sua contestação quanto às práticas repressivas dirigidas às mulheres. A
historiadora oferece indícios de semelhança entre as imagens de Maria Padilha de Castela e a
Pombagira, no que se refere à sexualidade feminina. Finaliza-se, então, o capítulo com uma
reflexão sobre o estigma e o lugar sagrado da Pombagira no inconsciente coletivo e nas religiões
afro-brasileiras.
O último capitulo tem como proposta relacionar a imagem da Pombagira com a
sexualidade da mulher moderna, ressaltando-se que, embora ainda exista muita repressão
dirigida às mulheres, especialmente no campo da sexualidade, encontramos manifestações
simbólicbs de livre expressão como no mito da Pombagira, no qual é possível perceber que
estamos em constante transformação, com novas produções coletivas que trazem novas
maneiras de as mulheres vivenciarem a sexualidade e romperem estereótipos.
Nas considerações finais, ressaltamos que o estudo da teoria analítica é fundamental
para que entendamos a influência dos símbolos nos modos pelos quais nos conduzimos na vida.
Afinal, somos nós que criamos os símbolos para dar sentido a algo que escapa da ordem linear
e lógica, mas que está o tempo inteiro atravessando-nos, seja nas experiências inconscientes ou
conscientes.
13

2 CONCEITOS CHAVES ELABORADOS POR CARL JUNG

“Jamais alguma ciência substituirá o mito e jamais o mito poderá nascer de alguma
ciência. Não é “Deus” que é um mito, mas o mito que é a revelação de uma vida divina
no homem. Não somos nós que inventamos o mito, é ele que nos fala como “verbo de
Deus”. (JUNG: 2016. p, 335)

Este primeiro capítulo tem como objetivo apresentar os conceitos de arquétipo,


inconsciente coletivo, símbolo e mito desenvolvidos por Carl Jung (1875-1961), em razão de
serem tomados como fundamentais para elucidar o tema da presente monografia, o mito da
Pombagira. Contudo, para maior compreensão do contexto de elaboração dos conceitos acima
citados, apresentamos alguns elementos da biografia de Carl Jung, criador da teoria analítica.

2.1 O contexto de Carl Jung

Carl Jung nasceu em 1875, em Kesswil, na Suiça. Aos quatro anos, mudou-se com a
família para Basileia, naquela época, um grande centro cultural da Suíça. Jung estudou biologia,
zoologia, paleontologia e arqueologia. Em 1895, ingressou na Universidade de Medicina da
Basileia, vindo a interessar-se pela psiquiatria. Dando continuidade aos estudos, em 1902,
concluiu seu doutorado na Universidade de Zurique, tendo defendido a tese sobre “Psicologia
e Patologia dos Fenômenos Chamados Ocultos”.
O psiquiatra Carl Jung integrou-se ao movimento psicanalítico em sua fase inicial, tendo
sido o primeiro presidente da Associação Internacional de Psicanálise – IPA, entidade que
congregava os psicanalistas que se formavam em torno de Freud. (SERBENA, 2010).
Importante destacar que o início de sua carreira foi marcado pelos estudos desenvolvidos, além
de principalmente por Freud, também por Breuer e Pierre Janet. (JUNG, [1902]/2016)1.
O primeiro contato de Jung, com a obra de Freud, foi em 1901, através do livro
“Interpretação dos sonhos”. Naquela época, começava uma grande parceria entre eles, que iria
perdurar por pouco mais de dez anos. Por volta de 1911, surgiram as primeiras divergências
entre Jung e Freud, relativas à teoria da libido. Enquanto Freud afirmava a libido como uma
energia sexual em sentido amplo, ou seja, para além da conotação genital, e que a neurose seria

1
A data entre colchetes indica o ano de publicação original da obra que só será indicada na primeira citação da
obra no texto. Nas seguintes será registrada apenas a data da edição consultada pelo autor/redator ou a data da
publicação original.
14

explicada pelas vicissitudes das pulsões, Jung considerava a pulsão como uma energia vital. O
rompimento definitivo entre eles veio quando Jung publicou o livro “Símbolos da
Transformação” (1986) no qual deixa claras suas diferenças teóricas com Freud. O rompimento
não foi nada fácil para Jung, como ele mesmo deixa claro na sua obra “Memórias, sonhos,
reflexões” (JUNG, 2016):

Depois da ruptura com Freud, começou para mim um período de incertezas internas
e, mais que isso, de desorientação. Eu me sentia flutuando pois ainda não encontrara
minha própria posição. O que mais almejava nesse momento era adquirir uma nova
atitude em relação aos meus doentes. (JUNG, 2016, p. 178)

Em 1912, Jung passou a perguntar aos seus pacientes de onde vinham e quais eram o
sentido das imagens que eles expressavam, em sonhos ou produções artísticas. Ele não buscava
por suas respostas só no trabalho com os seus pacientes, mas também mergulhando em seu
próprio inconsciente. Ele conta que passou por sua vida interior toda, detendo-se sobretudo na
infância, buscando algum entendimento em suas imagens. No entanto, nada havia encontrado
em seu inconsciente pessoal e começou, então, a perceber que era necessário ampliar o conceito
de inconsciente. É neste contexto, de ampla investigação sobre a mente humana, que ele
encontra suas respostas no mundo dos mitos. Jung percebeu a existência de imagens que são
formadas a partir da vivência de cada um, contudo essas imagens possuíam uma estrutura
semelhante e comum a todos e que se manifestavam também na mitologia e nos rituais
religiosos e místicos. Em 1912, ele se referirá a essas imagens como “imagens primordiais”,
contudo, em 1919, substitui o nome “imagens primordiais” por arquétipo. (JUNG, 2016).

2.2 Conceitos fundamentais

Para Jung (2016), o conceito de libido pode ser compreendido como uma energia
psíquica geral e não apenas uma energia de caráter sexual, como defendia Freud. Sendo assim,
a visão da psique, a partir da teoria analítica de Jung, diverge da teoria de Freud, a partir do
conceito de libido.
Além disso, a psique para Jung não era concebida como “uma página em branco” no
nascimento de cada indivíduo, pois o seu conceito de inconsciente amplia-se de maneira a serem
incluídas nele as estruturas e as imagens comuns a toda humanidade, ou seja, os arquétipos,
nomeação criada por Jung. Os arquétipos manifestam-se nos sonhos, nos mitos, nas religiões e
nos contos de fada. (SERBENA, 2010).
15

Na teoria analítica, a psique é constituída por elementos inconscientes oriundos de


diversas fontes, dos indivíduos e dos campos mais coletivos e impessoais, pois, os indivíduos
estão inseridos em famílias que fazem parte de uma cultura que, por sua vez, são da espécie
humana. Sendo assim, compreende-se que, para Carl Jung, os elementos de experiências
inconscientes individuais formam o inconsciente pessoal, já as experiências inconscientes
compartilhadas com a família, etnia ou o comum à espécie humana, denominam-se inconsciente
coletivo. (SERBENA, 2010). Para maior compreensão, vale mencionar o que o próprio Jung
[1928] explica sobre o conceito de inconsciente coletivo:

[...] o inconsciente contém não só componentes de ordem pessoal, mas também


impessoal, coletiva, sob forma de categorias herdadas ou arquétipos. Já propus antes
a hipótese de que o inconsciente, em seus níveis mais profundos, possui conteúdos
coletivos em estado relativamente ativo; por isso designei inconsciente coletivo.
(JUNG, 2017, p.26)

Desta maneira, pode-se compreender que uma camada superficial do inconsciente seja
realmente pessoal, que vai surgindo e ganhando forma a partir das experiências e vivências do
sujeito no decorrer da vida. Também pode ser comparada a um espaço no qual os conteúdos
esquecidos e recalcados adquirem significado e sentido. (JUNG, 2017).
Os materiais contidos nessa camada são elementos que foram, em algum momento,
incompatíveis e por isso submetidos à repressão, tornando-se assim inconscientes, contudo, por
outro lado, sempre há a possibilidade dos elementos inconscientes tornarem-se novamente
conscientes, uma vez que sejam reconhecidos. Ou seja, os conteúdos inconscientes só são de
natureza pessoal quando podem ser reconhecidos, em nosso passado, a partir dos seus efeitos e
suas manifestações parciais no presente momento, ou até mesmo quando pode-se reconhecer a
sua origem específica. (JUNG, 2017).
Segundo Serbena (2010), o inconsciente coletivo está em uma camada mais profunda,
que já não tem mais sua origem nas experiências de natureza individual, mas sim universal. Isto
é, no inconsciente coletivo existem conteúdos e modos de comportamento que são comuns a
tudo e a todos “Em outras palavras, são idênticos em todos os seres humanos, constituindo,
portanto, um substrato psíquico comum de natureza psíquica suprapessoal que existe em cada
indivíduo.” (JUNG, 2017, p 15).
Partindo da ideia que Jung nos traz, sobre uma base universal de natureza psíquica
existente em todos os indivíduos, é possível dizer que a psique tem duas maneiras distintas e
complementares de funcionamento. A consciência egoica, que se manifesta por meio da lógica
ou raciocínio analítico, e o inconsciente, que funciona por meio da analogia. Desta forma, o
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relacionamento entre consciente e inconsciente acontece por meio da imagem e da imaginação.


Sendo assim, o inconsciente opera através de pensamentos analógicos, associações e
semelhanças que se revelam nos sonhos, nas fantasias, nos mitos e nos pensamentos míticos.
(SERBENA, 2010).
Na Teoria Analítica, compreende-se que o ego é uma pequena parte da psique, assim, o
inconsciente tem uma amplitude muito maior, já que inclui a esfera coletiva. Isso quer dizer
que existe tanto a consciência egoica (semelhante à consciência na definição do senso comum
e da terminologia) quanto “outra consciência”, referente aos processos inconscientes e
arquetípicos. (SERBENA, 2010).
O inconsciente, para Jung, possui uma autonomia em relação ao ego, e dispõe de
estruturas de imagens (arquétipos) próprias das situações específicas, e que funcionam como
um caráter de sabedoria instintiva e automática. (SERBENA, 2010).
É pertinente considerar que discorrer sobre o conceito de arquétipo implica dificuldades
que são esclarecidas por Jolande Jacobi (2016), psicanalista junguiana:

É impossível oferecer uma definição exata de arquétipo; talvez o termo “delinear”


aqui pudesse ser entendido, em sentido mais lato, como “parafrasear” em vez de
descrever. Porque o arquétipo representa um profundo enigma que supera nossa
capacidade de apreensão racional; “o que um conteúdo arquetípico sempre expressa
é, antes de tudo, uma metáfora”, ele contém sempre algo que permanece desconhecido
e informulável. Por isso, toda interpretação, necessariamente, não poderá ir além do
“como se…” Não se pode diretamente responder de onde vem o arquétipo, se ele foi
adquirido ou não. (JACOBI, 2016, p.43)

Portanto, para uma tentativa de compreensão, é possível dizer que os arquétipos são
estruturas básicas e universais da psique, sendo utilizados como um elemento para entender os
tipos de experiências, nas quais a função criativa da imaginação está presente. Isso acontece
porque o arquétipo manifesta-se concomitantemente em diversos níveis; como imagem, com
modelo de percepção ou filtro da realidade, mas também pode aparecer como um afeto ou
impulso. (SERBENA, 2010).
Como já foi mencionado, para Jung, a ideia de uma mente vazia que vai sendo
preenchida com as experiências pessoais no decorrer da vida é equivocada. A mente, para Jung,
é mais que isso, ela é composta por imagens primordiais que reaparecem sempre e por toda
parte. Essas imagens são um a priori, ou seja, são anteriores às experiências individuais. Nossa
mente contém sensações, emoções, pensamentos e memórias de forte carga afetiva comum a
toda humanidade. Sendo assim, toda forma de conhecimento que deriva do inconsciente
coletivo é chamado por Jung de arquétipo. (JUNG, 2016).
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Os arquétipos representam o quadro psíquico do “padrão de comportamento”


semelhante ao biológico e que fornece aos seres humanos seu tipo distinto. Da mesma forma
que as manifestações do plano biológico podem alterar-se no decorrer do desenvolvimento, as
manifestações do arquétipo também podem passar por mudanças. Contudo, na prática, o
arquétipo nunca surgiu dentro da vida orgânica, pois ele entra em cena com a vida. (JACOBI,
2016).
Os conteúdos do inconsciente coletivo (arquétipo) são tipos arcaicos e primordiais, ou
seja, são imagens universais que existem desde os tempos mais remotos. A hipótese que Jung
levanta, é que eles se constituíram pela repetição do tema por várias gerações. Portanto, hoje
existem vários arquétipos na mente humana, relacionados principalmente a situações comuns à
existência do ser humano. “Há tantos arquétipos quantas são as situações típicas na vida”
(Collin Wilson apud CLARKE, 1992, p.154). Podemos destacar alguns exemplos de arquétipos
que nos atravessam constantemente em nosso cotidiano, como: sombra, anima, animus, herói,
velho sábio, a grande mãe, persona, self, entre outros. (CLARKE, 1992).
Contudo, o arquétipo em si não é alcançado diretamente, mas sim a partir de suas
manifestações, sendo estes fenômenos as imagens psíquicas, padrões de comportamento ou
produções humanas. Em outras palavras, não é possível acessar a forma (arquétipo em si), mas
sim o conteúdo (fenômeno), pois, o arquétipo em si, é vazio e totalmente formal, tendo apenas
uma possibilidade de “pré-formação”, que seria dada como “a priori”. (JUNG, 2016).
Para Jung, se existe uma origem da estrutura psíquica e dos arquétipos, esta origem só
pode ser uma questão metafísica, ou seja, impossível de responder sobre o surgimento
destes. Sendo assim, a origem de um arquétipo continua sendo obscura, e sua essência
incompreensível, pois ele está justamente neste campo sombrio, no inconsciente coletivo ao
qual nunca teremos acesso direto; sendo possível só ter um conhecimento indireto de sua
essência por meio do encontro com as manifestações do arquétipo na psique. (JUNG, 2016).
Muito se questiona de onde surgiu o conceito de arquétipo. De acordo com Jung, este
conceito advém da observação constante de que os mitos e os contos da literatura universal
manifestam-se sempre em toda parte, sendo produções simbólicas da humanidade. Por isso é
possível encontrar os mesmos temas nas fantasias, nos sonhos, nas ideias delirantes e ilusões
dos indivíduos que vivem atualmente, sendo essas imagens e semelhanças típicas denominadas
por Jung de representações arquetípicas. (JUNG, 2016).
Quanto mais claras as representações arquetípicas, mais são seguidas de tonalidades
afetivas nítidas. Elas têm origem no arquétipo que, em si mesmo, foge a qualquer representação
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ou forma preexistente e inconsciente. O arquétipo aparenta fazer parte da estrutura psíquica


herdada, logo revela-se espontaneamente por toda parte e por todo lugar. Vale ressaltar que os
arquétipos não têm conteúdo determinado, pois a imagem primordial só tem conteúdo
determinado quando é completada pelo material da experiência consciente e é neste momento
que surgem as representações arquetípicas, ou seja, os símbolos. (JUNG, 2016).
O conceito de símbolo é fundamental para compreender como o arquétipo se revela na
consciência do homem. Existe uma diferença importante entre arquétipo e símbolo. Como
vimos anteriormente, o arquétipo é uma estrutura, uma forma, sendo esta vazia e em potência.
Quando essa imagem primordial se eleva à consciência ela é preenchida pelas representações
culturais. Torna-se, então, um símbolo. O símbolo é o arquétipo em ato, carregando dois
sentidos: um visível, pois está na consciência, outro invisível, que brotou das profundezas do
inconsciente coletivo. (JACOBI, 2016).

Foi esse poder da psique de criar imagens que, por exemplo, verteu o arquétipo da
“luta entre a luz e as trevas, ou do bem e do mal” para um evento retratável como luta
entre o dragão e o herói (um tema primordial de muitas cosmogonias); ou que traduziu
o arquétipo da “ideia de morte e renascimento” para uma sequência representável da
vida do herói ou também para o símbolo do labirinto, tornando-se o criador de uma
série ilimitada de mitos, contos de fadas, fábulas, épicos, baladas, dramas, romances,
etc. Vemos esse poder em atividade impressionante em todas as grandes criações
intemporais da arte, que inesgotavelmente conectam o passado primordial com o
futuro mais distante; nós o identificamos nas visões dos videntes e nas aparições e
sinais de santos e buscadores religiosos, nas fantasias dos poetas e também sem dúvida
no mundo noturno dos sonhos, que, haurindo do tesouro inesgotável de arquétipo do
inconsciente, está insistentemente criando novos símbolos (JACOBI, 2016,p. 93).

Com base no que foi mencionado por Jacobi (2016), é possível compreender que, se o
arquétipo se mostra no aqui e agora, quer dizer que ele é percebido na consciência de alguma
forma, ou seja, a partir do símbolo. Então, o símbolo, em certa medida é, ao mesmo tempo, um
arquétipo. Haja vista que o símbolo sempre tem algo que é invisível e algo que é visível, o que
é da ordem do invisível está atribuído ao arquétipo, que por sua vez está no inconsciente
coletivo, já o que se refere ao visível está relacionado com a imagem, que foi produzida pela
consciência. Ou seja, para o arquétipo ser visto é necessário que este tenha um desenho básico
arquetípico para assim ser visto como símbolo.
A psique cria símbolos, sendo que a base é o arquétipo inconsciente e cuja imagem
manifesta surge das ideias que o consciente construiu. Portanto, os arquétipos são elementos
estruturais precisos da psique, possuindo, assim, uma certa autonomia e energia para atrair os
conteúdos adequados do consciente para eles. Para maior compreensão, pode-se pensar que o
inconsciente oferece a forma arquetípica, que em si é vazia e, por isso, irrepresentável. Mas, no
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consciente, essa imagem arquetípica é imediatamente preenchida por material de representação


que é semelhante e assim acaba sendo perceptível. (JACOBI, 2016).
O arquétipo pode ser comparado a um material “cru” fornecido pelo inconsciente
coletivo que entra em um envolvimento com a consciência e com sua “propriedade doadora de
formas” (JACOBI, 2016, p. 92), assim, o que era vazio adquire corpo e conteúdo. Ou seja, ele
se torna representável e só assim que se torna uma imagem verdadeira, uma imagem
arquetípica: o símbolo. Para uma compreensão mais prática, pode-se pensar que o arquétipo em
si é puramente energia psíquica centralizada, mas esta energia ganha modo de manifestação a
partir do símbolo. (JACOBI, 2016).
Posto isso, é de fácil compreensão que o símbolo seja a imagem da energia psíquica,
portanto jamais teremos acesso ao arquétipo diretamente, mas apenas indiretamente, quando se
manifesta no símbolo arquetípico. A existência do arquétipo é autônoma em relação ao ego e a
subjetividade de cada sujeito, revelando-se por imagens, emoções e afetos, de modo não
racional, através de ligações semelhantes, com uma lógica analógica e não pelo raciocínio
“causa e efeito”. Desta maneira, existe na psique um padrão ativo e que corresponde a uma
totalidade que engloba tanto o inconsciente quanto o consciente. (SERBENA, 2010).
Durante este processo, ocorre uma transformação em que os símbolos envolvidos, que
originalmente possuíam significados individuais e próprios, ganham mais sentido, atribuindo o
indivíduo a uma universalidade cada vez maior, como por exemplo a família, a etnia e o cosmos.
Isso acontece devido à repetição e redundância da vivência do símbolo. (SERBENA, 2010).
Dado que o significado é inesgotável e sua representação na forma lógica não é viável,
é possível compreender que a elucidação e a construção do sentido do símbolo acontecem
através de um fluxo de repetição que segue por repetição, de redundância que segue por
redundância, cada vez com mais proximidade e com mais cargas de significados, e assim
sucessivamente, até chegar a uma redundância tão aperfeiçoada que será vista socialmente,
principalmente, nos rituais e nos mitos. (SERBENA, 2016).
Os rituais são expressões comportamentais da dinâmica dos símbolos e dos arquétipos,
através da repetição de comportamentos. Já os mitos, são demonstrações discursivas de
repetições, na forma oral ou escrita, dentro das relações linguísticas que se cria a partir das
ideias e das imagens. Assim, é possível notar que o discurso metafórico dos mitos é a linguagem
dos arquétipos. (SERBENA, 2016).
Serbena (2016) afirma que o mito é uma manifestação muito importante dos símbolos,
pois ele é uma narrativa desenvolvida a partir da ligação das imagens do consciente com os
20

símbolos, incluindo as narrativas que validam as religiões, os cultos, as lendas, o conto popular
e as narrativas românticas. Ou seja, o sentido simbólico dos termos e a conexão das narrativas
são fundamentais para o mito.
Interessante refletir a função dos mitos, já que se ouve muito falar sobre eles, de um
lugar que empobrece e distorce sua função na humanidade. Porém, para compreender melhor o
que realmente são os mitos, é necessário entender, mais profundamente, o que é o símbolo e
como o processo de repetição e redundância deste faz surgir os mitos. (JACOBI, 2016).
O símbolo e sua energia têm diversas funções, inicialmente a sua função é somente
investigativa, pois, ao explorar, vai desenvolvendo o “sentido da aventura espiritual dos
homens, lançados através do espaço-tempo”. (CHEVALIER; GHEERBRANT apud
SERBENA, 2016 p. 80). Assim, o indivíduo representa o mundo notado e vivido em sua
universalidade psíquica, tanto consciente, quanto inconsciente. Neste processo, o sujeito
também substitui conteúdos e vivências afetivas impossíveis de serem vividas, devido à
realidade em si ou pela atitude consciente. Este sistema de investigação, representação e
substituição, proporciona um intermédio entre os elementos separados e opostos na experiência
do sujeito, unindo e condensando em uma imagem preenchida de sentido e significando a
integralidade da experiência humana em todos os seus níveis, ou seja, nos âmbitos sociais, nos
campos religiosos, na esfera cósmica e no plano psíquico. (SERBENA, 2016).
Sendo assim, Serbena (2016) afirma que se pode afirmar que o símbolo pode ter uma
função terapêutica, pois gera um sentimento e sensação de pertencimento, ou melhor dizendo,
de participação em uma totalidade que responde às múltiplas necessidades humanas. A presença
do símbolo no mundo humano tem a função de socialização, pois é a partir dele que os sujeitos
se comunicam com a totalidade social. Então, o símbolo está vivo e atuante, através da cultura
e da experiência individual. Por meio desta atuação e da imaginação, ele desenvolve uma
relação entre as vivências psíquicas (conteúdos internos) e as assimilações do mundo externo.
Assim, um reflete o outro, gerando uma “ressonância” entre si e viabilizando o aprofundamento
do sujeito na sua experiência pessoal e na vivência em sua universalidade.
Esse processo acontece no “mundo interno” do sujeito, através de suas fantasias e
imaginação, contudo, muitas vezes, pode não ser notado. Dessa maneira, ele corre o risco de
ser desvalorizado, pois há uma confusão entre a dimensão mítica e a dimensão “utilitária” do
simbolismo, sendo que a dimensão mítica acaba sendo rebaixada à utilitária. (SERBENA,
20616).
21

Esse processo de desvalorização epistemológica do imaginário, dos produtos


simbólicos e do próprio símbolo vem ocorrendo desde Aristóteles e permeia a
racionalidade ocidental desde Descartes. Isto está ligado à identificação do conceito
de indivíduo com a razão, “o espírito é pensado segundo as modalidades da
experiência objetiva: [...] e nisto reside a alienação fundamental.” (DURAND apud
SERBENA, 20616, p 80).

A partir do que foi explicitado acima, é possível entender que o processo da


minimização do conceito de símbolo a um signo ou sinal é um equívoco da racionalidade
ocidental, tendo em vista que ambos os conceitos são diferentes. O signo é apenas constituído
pelo modelo: significado/significante, já o símbolo, pode ter vários significantes diferentes ao
mesmo tempo. Como por exemplo, ele pode ter os significantes: cósmico (a imagem do mundo
exterior), onírico (referente a imagens de sentimentos pessoais que se manifestam nos sonhos)
e poético (manifestação do imaginário na linguagem). (SERBENA, 2016).
A partir dessa lógica, pode-se concluir, que o fato de o símbolo se manifestar de diversas
maneiras, faz com que ele acabe possuindo uma redundância. Este processo de redundância
possui um caráter de aperfeiçoamento e aproximação do arquétipo, contudo, ainda assim não é
possível alcançar o significado, afinal ele é irrepresentável. Desta maneira, o conjunto de todos
os símbolos sobre um determinado assunto é capaz de esclarecer os próprios símbolos.
(SERBENA, 2016).
Para elucidar melhor este processo, vale trazer uma reflexão feita por Durand, citada
por Serbena:

A redundância simbólica acaba por se manifestar nos rituais e a redundância


linguística é significativa dos mitos. A redundância linguística é a repetição de frases,
palavras ou uma estrutura que contenha um sentido. O símbolo pode ser definido
como: “[...] signo que remete a um indizível e invisível significado, sendo assim
obrigado a encarnar concretamente esta adequação que lhe escapa, pelo jogo das
redundâncias míticas, rituais, iconográficas que corrigem e completam
inesgotavelmente a inadequação” (DURAND apoud SERBENA, 2016, p.79).

Nesse segmento, o mito é uma importante manifestação do símbolo, por isso que reduzir
o mito ao semiológico é empobrecê-lo, pois ele é do campo semântico. Importante destacar,
que o mito é o início da racionalização da experiência simbólica, contudo, na forma de narrativa,
no qual o símbolo é traduzido em palavras e os arquétipos em ideias, maneiras de pensamentos,
visões sobre o mundo e conceitos. (SERBENA, 2016)
Para Campbell (1979), os mitos são como pistas para as potencialidades espirituais da
vida humana. Ele afirma que os mitos nos ensinam a nos voltarmos para dentro com a intenção
de captar as mensagens simbólicas. Ele ainda sugere que se leia mitos de outros povos e não
22

mitos da própria religião, pois é comum interpretar a própria religião como um fato. Ao lermos
mitos de outras culturas, a mensagem mítica fica mais fácil de ser captada.
Campbell (1979), ainda, considera que a mitologia tem grande função e influência na
vida humana. Os mitos são vestígios que se alinham ao redor dos sistemas de crença dos
indivíduos, “como cacos de cerâmica partida num sítio arqueológico”. (Campbell, 1979, p, 10).
E uma vez que somos seres orgânicos, há uma grande energia nos mitos, que aparece através
dos Deuses e Deusas, dos heróis e da história em si, que nos influencia indiretamente. Um dos
exemplos dado por ele são os rituais em que se evocam forças simbólicas.
Campbell (1979) lança mão de outro exemplo para compreender melhor a importância
dos mitos e dos rituais que nos atravessam constantemente, nas situações mais comuns do
cotidiano, mas que, no fundo, têm muita simbologia envolvida. Pense na posição dos juízes em
nossa sociedade, qual a imagem que vem à sua cabeça? Possivelmente virá a imagem de uma
pessoa usando uma toga escura, pois este traje está diretamente associado à imagem de um juiz.
Campbell (1979) vai encarar esse tipo de situação em termos mitológicos e não sociológicos.
Desta forma, ele afirma que para a lei manter a autoridade, além da imposição, o poder do juiz
precisa ser ritualizado (mitologizado), através de um símbolo que transpareça esse poder.
É por isso que tanto ele, quanto outros autores, inclusive Carl Jung, afirmam que
estamos o tempo inteiro sendo envolvidos por imagens, símbolos e forças inerentes. Não
estamos separados do todo e não somos uma folha em branco ao nascer. Muito do que se tem
hoje, já estava aqui há milênios, e é por isso que os sinais estão bem aí, nas mitologias, nas
poesias, nos rituais, etc. (CAMPBELL, 1979).
O trecho abaixo, do livro o Poder do Mito, em forma poética, ilustra muito bem a
importância de nos atentarmos aos mitos que estão tão presentes em nossa vida, em forma de
histórias e vivências:

Não precisamos correr sozinhos o risco da aventura, pois os heróis de todos os


tempos a enfrentaram antes de nós. O labirinto é conhecido em toda sua
extensão. Temos apenas de seguir a trilha do herói, e lá, onde temíamos
encontrar algo abominável, encontraremos um Deus. E lá, onde esperávamos
matar alguém, mataremos a nós mesmos. Onde imaginávamos viajar para
longe, iremos ter ao centro da nossa própria existência. E lá, onde pensávamos
estar só, estaremos na companhia do mundo todo. (CAMPBELL,1979, P.131)
23

Sendo assim, o mito ajuda a colocarmos a mente em contato com a experiência de


estarmos vivos ou seja, o mito diz o que é a experiência de vivermos determinada situação.
Pergunte ao mito o que é um casamento, a morte, o nascimento, um herói, o bem e o mal, que
ele irá te responder, com diferentes palavras e histórias, mas com um único sentido que leva ao
mesmo lugar, ao mesmo símbolo. (CAMPBELL, 1979).
24

3 O MITO DA POMBAGIRA

De vermelho e negro vestindo a noite o mistério traz,


De colar de cor, de brinco dourado a promessa faz,
Se é preciso ir, você pode ir, peça o que quiser,
Mas cuidado amigo, ela é bonita, ela é mulher,
E num canto da rua zombando, zombando, zombando está,
Ela é moça bonita girando, girando, girando lá,
Oi girando lá, laroiê, oi girando lá, mojubá
(FARELLI, 2006, p. 2).

A proposta deste capítulo é apresentar o mito da Pombagira, a circulação de sua imagem


na cultura popular brasileira e o culto a ela nos rituais afro-brasileiros. Contudo, para
entendermos a construção mítica da Pombagira, é necessário destacar que o mito é uma
manifestação fundamental dos símbolos, sendo ele uma narrativa desenvolvida a partir da
ligação das imagens do consciente com os símbolos. (SERBENA, 2016).
O mito aborda, numa linguagem própria, a ambiguidade do social, sendo resultado da
alternância entre aliança e enfrentamento, ordem e desordem. O mito não pode ser pensado de
forma estática, pois está totalmente exposto ao movimento e às transformações socioculturais,
econômicas, políticas e religiosas, adequando-se, assim, aos contextos históricos. Pensar no
mito é sair da lógica linear e compreender que é impossível encontrar uma única visão em
relação a ele, haja vista que o mito vem para dar sentido a algum acontecimento, e este processo
de “dar sentido” remete-nos à singularidade de cada povo que vivencia determinada
experiência. Ou seja, o mito é como uma metáfora, apropriada por vários grupos e povos para
explicar o mundo. (CAMPBELL, 1979).
Sendo assim, para pensar a construção mítica da Pombagira, é necessário levar em conta
que é um mito extremamente ambíguo, cheio de contradições e com fragmentos de narrativas
oriundas de vários contextos históricos do mundo, já que o mito da Pombagira advém de várias
culturas, associadas às crenças populares procedentes de diversos povos. E é dentro desta lógica
complexa que sua imagem surge, por meio do imaginário popular. (LAGOS, 2007).
A historiadora Marlyse Meyer (1993) toma a figura da rainha Maria Padilha de Castela
como o mito matriz, tomado por ela como um ponto de partida para entender a imagem da
Pombagira. Vale ressaltar, também, que há vários estudos sobre o surgimento da própria palavra
“Pombagira”. (COSTA, 2015).
Há indícios de que o nome “Pombagira” aparece no Brasil no período colonial, no fim
do século XIX, nos ritos da Macumba carioca, religião proveniente dos cultos de origem banto,
do século XVII. Este nome também vai aparecer relacionado a uma entidade feminina cultuada
25

na Umbanda e em outras religiões afro-brasileiras. No entanto, segundo Prandi (2001), não foi
encontrada na África nenhuma informação sobre um Orixá que tivesse o nome de Pombagira.
Na cultura africana, “orixá” é uma expressão que designa uma divindade que representa os
elementos da natureza, tais como o mar, o rio, o trovão, a mata, entre outros. Dessa forma, há
indicações de que a entidade Pombagira seja de origem brasileira.
A denominação “Pombagira”, é também associada à alteração da palavra “Bombogirá”,
pois, na língua ritual dos candomblés angola, da tradição banto, o nome de Exu é Bombogirá.
Assim, entende-se Pombagira como o princípio feminino que complementa Bombogirá que é
o princípio masculino. Sendo que, no decorrer do tempo, a própria tradição oral se encarregou
de denominar de Pombagira, o principio feminino de Exu, pela semelhança fonética. (PRANDI,
2001).
Contudo, o escritor Saraceni (2011), em seus estudos, faz a associação da Pombagira
com as feiticeiras africanas Yamins ou Lá mi Oxorangá, que são entidades femininas cultuadas
no culto Geledé, uma sociedade secreta Yorubá, de natureza matriarcal. Entretanto, quando
Meyer (1993) aprofunda as suas pesquisas em relação à Pombagira, ela levanta a hipótese de
que o mito fundante da Pombagira brasileira, possa ter alguma relação com a história da Maria
Padilha de Castela. (COSTA, 2015).
Costa (2015) ressalta o aspecto sincrético no mito da Pombagira, e, a partir da exposição
transcrita abaixo, é possível compreender que haja múltiplos sentidos à imagem da Pombagira:

A Pombagira apresenta traços de um processo sincrético que, com o passar do


tempo, foi-se adaptando, de acordo com as transformações socioculturais e
religiosas. A Pombagira expressa as múltiplas faces dos imaginários religiosos e
culturais, ibéricos, ciganos e africanos, pois ela agrega as qualidades do Inckice
Bombogira, divindade masculina do panteão banto, e de Lebará, divindade feminina
Yorubá. E agrega, também, as qualidades das feiticeiras, ciganas andaluzas, e das
bruxas europeias, revestidas do arquétipo da rainha Maria Padilha de Castela, da
Espanha. (COSTA, 2015, p.16).

Meyer (1993) é considerada uma referência nos estudos sobre o mito da Pombagira. Em
seu trabalho, sobre a história da Maria Padilha de Castela, a personagem histórica é tomada
como uma matriz na construção da imagem da Pombagira. Embora o trabalho de Meyer (1993)
não seja o único sobre a construção da imagem da Pombagira, essa monografia não se ocupou
do levantamento desses diversos trabalhos, em razão do foco do presente estudo e dos limites
próprios do desenvolvimento de uma monografia.
A imagem da Pombagira é um construto sincrético, com vários elementos pertencentes
a diversas culturas religiosas trazidas para o Brasil colonial, sendo ela fruto do imaginário dos
26

povos colonizadores europeus, dos ciganos, africanos e dos povos nativos, como descreve Costa
(2015).
Como já foi exposto anteriormente, todo mito é dinâmico, dúbio e atravessado
constantemente por diversas narrativas. Neste sentido, não é diferente com os relatos que
envolvem o mito da Pombagira. Contudo, no presente trabalho, limitar-nos-emos à associação
entre a personagem de Maria Padilha de Castela e a Pombagira, como já havíamos adiantado.

3.1 Maria Padilha de Castela

Existem registros de que no século XIV, em meados de 1352, na Espanha, Maria Padilha
de Castela ganha grande importância na vida do Rei Dom Pedro I de Castela, tornando-se sua
amante. (BIÃO, 2011).
Maria Padilha era, na verdade, conhecida como Mari Díaz. Nasceu numa família
importante de Castela e, por volta dos seus 20 anos, ficou conhecida como Doña Maria Padilha,
ao encontrar o Rei Dom Pedro. Ao lado do Dom Pedro I, ela se tornou uma das mulheres mais
poderosas da época, não só por estar ao lado do Rei, mas também por saber utilizar sua beleza,
inteligência e poder de sedução, como o próprio povo dizia entre si. O Rei era conhecido como
um homem mau e com várias mulheres ao seu redor. Teve cinco filhos reconhecidos, sendo que
com Maria Padilha ele teve um filho (falecido quando criança) e três filhas. (BIÃO, 2011).
De acordo com a narrativa, Maria Padilha morre em 1361, aos vinte sete anos. Nove
meses após sua morte precoce, o Rei torna-a rainha de Castela, conseguindo fazer um acordo
com as autoridades eclesiásticas de Sevilha, no sentido de que, mesmo com dois casamentos
públicos, considerassem o fato de ele ter-se casado em segredo com Maria Padilha, antes de sua
morte. Assim, uma amante torna-se rainha de Castela naquela época. (BIÃO, 2011)
Após tornar-se rainha, ela passa a ser vista como um modelo de mulher sedutora,
poderosa, sensual, inteligente e astuta. É desta imagem que se foi criando um imaginário cheio
de mistério e de poderes mágicos em torno da sua identidade. Ficou sendo também um
estereótipo de mulher perigosa, fatal e independente. Vale ressaltar que esse imaginário é criado
em um período de muita repressão da mulher. E é por isso que ela também ganha outro
significado: (COSTA, 2015).

Maria Padilha assume o estereótipo de transgressora da ordem estabelecida. Um


estigma herdado do mito primordial do Éden, com Adão e Eva, onde essa é seduzida
pela “serpente” e, consequentemente, seduz Adão. Na bíblia sagrada, existem várias
referências à mulher virtuosa e santa, mas aquela que quebra os paradigmas é
27

considerada uma devassa e pessoa perigosa, portanto, devia ser vigiada e


punida. (COSTA, 2015, p. 18).

Há indicações de que sua história acaba inspirando poetas, que, com o passar dos anos,
difundiram sua imagem de rainha poderosa e perversa, com poderes mágicos que manipulavam
um rei cruel. Sua imagem então ressurge no século XV em romances e contos, perdurando até
o século XVI. Especialmente em 1547, registros mostram que aparecem, nos romances velhos
do editor espanhol Martin Núcio, em sua primeira edição e em mais três edições novas em 1581,
vários poemas épicos sobre Maria Padilha. (COSTA, 2015).
Ainda se afirma que, com a chegada dos ciganos na Espanha, Maria Padilha ganha mais
força entre esses povos, já que os ciganos acabam desenvolvendo uma identificação muito
grande com o símbolo libertário que ela representava, até porque era correspondente à forma
com a qual eles próprios viviam. (COSTA, 2015).
Interessante ressaltar que a historiadora Meyer (1993) traz referências à Maria Padilha
nos teatros do século XIX, no qual ela ganha uma nova roupagem, através da obra escrita pelo
francês, Prosper Mérimée, por meio da personagem cigana andaluza, Carmen. A personagem
cigana Carmem era protagonista da ópera de Georges Bizet, fazendo alusões à figura de Maria
Padilha, através dos seus conjuros, cânticos e por invocar o nome da rainha de Castela.
Também, no ano de 1841, há registros de que no teatro La Scala, em Milão, estreou a ópera
denominada Maria Padilla (Padilha), criada por Gaetano Donizatti. Vale mencionar que,
segundo a historiadora, essa ópera posteriormente também foi apresentada no Rio de Janeiro,
pela primeira vez, em 1856.
Muitas lendas e histórias circularam sobre rainha de Castela, narrativas sobre as suas
aparições e os que a viam nestas aparições descreviam-na como muito bela e vestida de roupas
eróticas. Há também lendas em que ela aparecia nas tabernas, seduzia os homens e durante o
ato sexual contava-lhes quem ela realmente era, assustando-os. A circulação dessa narrativa
motivava os homens a irem às tabernas espanholas, na esperança de que se pudessem encontrar
com essa bela mulher. Na inquisição espanhola, Maria Padilha também aparece nas expressões
das ciganas feiticeiras, tanto nas suas invocações, quanto nas confissões ao tribunal eclesiástico.
(COSTA, 2015).
Tudo indica que, com esses acontecimentos e com o apreço do povo cigano, ela
tenha-se tornado uma referência para os povos ciganos da Península Ibérica que a nomearam
como a “Baró Crallisa”, a grande rainha dos ciganos. (MEYER, 1993).
28

O vínculo de Maria Padilha com os ciganos irá fazer parte do imaginário e da


memória popular, assim como o de bruxa iniciada nos mistérios dos sabats, o de uma
mulher fatal, poderosa, sensual, sedutora, insaciável, feiticeira, com conhecimento de
magia, bruxaria e espírito vingativo. Com essa fama ou estereótipo, ela ultrapassou as
fronteiras da Península Ibérica, cruzando os mares e chegando à Terra de Santa Cruz,
no Brasil colonial. No contexto do Brasil colonial, “a magia está ligada justamente à
angústia ante o estranho e o desconhecido; é ela uma técnica irracional para
tranquilizar. Dessa forma, tudo concorria: o caráter supersticioso dos primeiros
imigrantes” (BASTIDE Apud COSTA, 2015, p.24).

Além de todas as representações de Maria Padilha, provenientes das histórias e das


lendas que foram criadas no decorrer dos séculos, há também outra narrativa sobre a iniciação
de Maria Padilha na feitiçaria. Após sua morte tornou-se não só um símbolo libertário para os
ciganos, mas também um símbolo da magia para as feiticeiras europeias e posteriormente para
as feiticeiras que viveram no Brasil Colônia. (COSTA, 2015).
Então, é assim que Maria Padilha de Castela permanece viva no imaginário popular
como uma mulher poderosa e transgressora, audaciosa e pecadora, sensual e devassa. É nesse
paradigma que sua história perdurou por muito tempo, atravessando fronteiras, levando uma
imagem contraditória e obscura, ressurgindo em vários cenários, épocas e com diferentes
aspectos, mas sempre com uma imagem de mulher perigosa, seja pelos seus “pecados” que
ameaçavam a fé, ou seja por sua habilidade em utilizar sua inteligência e seu poder de sedução
a seu favor e a favor dos seus discípulos. (LAGOS, 2007).

3.2 História da apropriação do mito da Pombagira no Brasil

O Brasil Colônia “era a tensão entre o céu e o inferno, sendo o purgatório dos brancos
e o inferno dos negros”. (VAINFAS, 1988 p.168). A justificativa ideológica do processo de
colonização era a cristianização dos “povos bárbaros”. Contudo, havia também a crença de que
as caravelas portuguesas estavam indo para o paraíso. As próprias descrições, no início, eram
de que as novas terras se assemelhavam às narrativas do Jardim do Éden. Porém, segundo a
historiadora Laura de Mello (2009), essa visão não durou muito, pois, com a estadia dos
portugueses e com o contato com os costumes dos outros povos, designados pelos portugueses
como “as impurezas do diferente”, foi transformando, aos poucos, o paraíso em um inferno.
O contato com esse ambiente, denominado “infernalizado”, acabou consolidando, ao
mesmo tempo a terra conquistada, como também um espaço de purgação para a salvação dos
cristãos. Desta maneira, a visão cristã do expansionismo, além de estabelecer que as terras
foram “descobertas”, também muda o discurso do Paraíso Terrestre para o Novo Mundo, para
29

assim reforçar o processo de colonização. É assim que o paraíso se tornou o “Novo Mundo”,
para ser o porto de abrigo aos exilados de Portugal e para “ensinar” aos nativos e aos escravos
a fé cristã. Toda vida humana no Novo Mundo foi demonizada e considerada pecadora. O Brasil
surgia e criava suas bases nesse contexto marcado pela contradição entre o paraíso terrestre,
identificado pela natureza exuberante e um inferno, devido à humanidade que ali estava.
(SOUZA, 2009).
Em referência à religiosidade, por mais que os jesuítas tentassem implantar o
catolicismo e extinguir qualquer outra manifestação religiosa, não foi possível dizimar algo que
estava tão presente e vívido naquele povo. Então, surge uma religião sincrética, que tinha traços
católicos, indígenas, judaicos e africanos. O universo religioso colonial era uma mistura dos
santos católicos, com orixás e com a presença do diabo. (SOUZA, 2009).

Em nenhum outro lugar do mundo a religiosidade e a superstição se expressariam da


mesma forma que no Brasil, por um simples motivo: nenhum outro lugar do mundo
fundamentou suas bases sobre as raízes portuguesas, indígenas e africanas ao mesmo
tempo e nenhum outro lugar possuiu a mesma dinâmica colonial que o Brasil.
(SILVA, 2011, p.1)

Meyer (1993) relata que a história da Maria Padilha de Castela chega ao Brasil colonial,
principalmente, através dos ciganos exilados de Portugal no século XVI. Ainda segundo Meyer
(1993), no decorrer do século XVII, o mito de Maria Padilha novamente surge no imaginário
do Brasil colônia, no entanto, agora não só como a rainha dos ciganos, mas sim, como aquela a
ser invocada pelas feiticeiras, também exiladas de Portugal, por praticarem magia e
compactuarem com “forças trevosas”.
Costa (2015) considera que a primeira feiticeira a chegar ao Brasil tenha sido a Maria
Paixo. Ainda no século XVII, também, tem-se a notícia de que, na Bahia, havia uma bruxa,
Antônia, designada como Nobrega. Existem indícios de que ela possuísse uma expressiva
clientela feminina, por trazer o amor de volta. Também há notícias de uma degredada que veio
para o Brasil em 1633, conhecida como Ana Martins que, com seus noventa anos, efetuava
conjuros de Maria Padilha e de toda a sua quadrilha. (COSTA, 2015).
Importante destacar o que representava a feitiçaria naquela época, qual a sua função e
porque era tão procurada. Segundo Mello (1986), a ideia de magia e feitiçaria estava
intimamente ligada à sobrevivência das pessoas. Assim, buscavam-se, através da feitiçaria,
soluções imediatas para os problemas, desde questões de saúde até problemas referentes aos
relacionamentos amorosos. (SOUZA, 2009).
30

Além de investir em conceitos que subestimavam o corpo feminino, a ciência médica


passou a perseguir as mulheres que possuíam conhecimentos sobre como tratar do
próprio corpo. Esse saber informal, transmitido de mãe para filha, era necessário para
a sobrevivência dos costumes e das tradições femininas. Conjurando os espíritos,
curandeiras e benzedeiras, com suas palavras e ervas mágicas, suas orações e
adivinhações para afastar entidades malévolas, substituíam a falta de médicos e
cirurgiões. Era também a crença na origem sobrenatural da doença que levava tais
mulheres a recorrer a expedientes sobrenaturais; mas essa atitude acabou deixando-as
na mira da Igreja, que as via como feiticeiras capazes de detectar e debelar as
manifestações de Satã nos corpos adoentados. Isso mesmo quando elas estavam
apenas substituindo os médicos, que não alcançavam os longínquos rincões da
colônia. (DEL PIORE, 2004, p.68).

Sendo assim, as narrativas afirmam que diante desse contexto de perseguição, as


feiticeiras utilizavam-se do imaginário para garantir a própria sobrevivência e também a das
pessoas que estavam em situações menos favoráveis. Elas criavam um clima de medo e de
temor, espalhando superstições com o intuito de garantir a sua existência, a partir de um
imaginário que já estava presente. Por isso, aproveitavam-se das memórias e das lembranças,
já que “o imaginário se manifesta como simbolismo e como logos. O imaginário necessita do
simbolismo e da lógica e não só para expressar-se, o qual resulta óbvio, mas para poder existir”
(RUÍZ apud COSTA, 2015, p.26).
Todas as feiticeiras, sejam elas adeptas de Maria Padilha ou não, eram consideradas
bruxas, por causa das crenças medievais em relação aos cultos sabás das bruxas, que aconteciam
na Europa, desde os tempos dos domínios dos mouros, na Península Ibérica. Quando os
portugueses chegam ao Brasil, trazem com eles crenças populares sobre a bruxa de Évora, em
que mulheres nuas dançavam em volta de uma fogueira dentro da floresta, sob a luz da lua
cheia, e eram possuídas sexualmente por seres fálicos, que eram metade homem e metade
animal, com chifres e caudas semelhantes aos deuses Sátiros, Pãs e Silenos, considerados pela
Igreja como manifestação do demônio. (COSTA, 2015).
A feiticeira que invocava o nome da Rainha Maria Padilha de Castela era vista pela
Igreja como bruxa, que foi possuída sexualmente pelo demônio, ou seja, Maria Padilha era
considerada um demônio feminino que teria seduzido um rei e feito com que ele se separasse
de sua esposa para ficar com ela. A sedução, a sexualidade e a libido eram vistas como
características demoníacas. (COSTA, 2015).
Assim sendo, é possível compreender que haja indícios de que o mito de Maria Padilha
chegue ao Brasil colônia através das crenças religiosas e do imaginário das feiticeiras
portuguesas, como por exemplo a Maria Antônia (Maria Paixo), a Ana Martins e a Antônia
Maria Beja. Contudo, mesmo após as feiticeiras serem mortas pela Inquisição, a figura de Maria
31

Padilha continua viva no imaginário do povo, transpassado por lendas, histórias, credos, medo
e devoção. (COSTA, 2015).
Foi no contexto do Brasil colônia que credos, crenças, lembranças, Deuses e Santos
misturaram-se de tal maneira que naturalmente foram surgindo religiões com elementos
indígenas, africanos e católicos. Suspeita-se que a primeira religião a surgir dessa fusão tenha
sido a nomeada de “Cantimbós”, na segunda metade do século XVII. Há também relatos de que
será na religião ameríndia-afro-brasileira, “Toré”, que Maria Padilha Castela se manifesta,
através da incorporação, mas que posteriormente é vista manifestando-se em outros cultos:

Instaura-se o elo entre o lado feminino de Exu, a Lebará dos cultos afros yorubás, e a
‘Lebará branca’, das Macumbas cariocas brasileiras, por meio do mito, da feiticeira
andaluza, amante insaciável, fêmea indomável e sedutora. Maria Padilha de Castela,
depois de se manifestar por vários anos no Nordeste brasileiro, migrou e se solidificou
no Rio de Janeiro, a partir do final do século XIX, na Macumba carioca, tornando-se
um Exu-alma-feminina, ou a mulher de Exu-alma, e foi consagrada a rainha carioca
da magia (AUGRAS, 2009; FARELLI, 2006). Após essa associação da Lebará
africana, o lado feminino de Exu yorubano e o duplo feminino de Bombogiro banto,
com a rainha branca Maria Padilha de Castela, ela passa a ser invocada nos terreiros
de religiões sincréticas afro-brasileiras, presentes em todo o País. (COSTA, 2015 p.
33).

Portanto, é perceptível que Maria Padilha talvez seja a mais “popular” imagem da
Pombagira, sendo o foco de muitos historiadores, conhecida em muitos terreiros espalhados
pelo Brasil, e sendo até popular entre os que não são adeptos das religiões afro-brasileiras.
(PRANDI, 2001).
Prandi (2001), relata que Meyer desenvolve uma construção literária baseada em fatos
documentais, no que se refere tanto à personagem histórica ibérica, como às concepções míticas
sobre a Maria Padilha afro-brasileira. A associação, entre o mito construído sobre a história de
Maria Padilha e a imagem da Pombagira, não deixa de ser um ponto muito intrigante para os
historiadores, tanto pela permanência no imaginário popular da rainha de Castela, como pelo
paradoxo da emergência de imagens de mulheres poderosas e livres em períodos históricos
marcadamente repressores sobre as mulheres.
Novamente, fica claro como o mito da Pombagira foge do pensamento linear, como não
cabe em nenhuma história, justificativa ou narrativa fechada e limitada. Mas, embora sejam
muitas versões e narrativas sobre a imagem da Pombagira, percebem-se uma semelhança e
aproximação em suas manifestações, seja no campo religioso ou no imaginário popular, ficando
nítidos os seus traços marcantes de “pouco santa”, mas de muito poder nas diversas histórias
lidas. (BARROS, BAIRRÕES, 2015).
32

3.4 Pombagira: entre o estigma e o lugar sagrado nas religiões afro-brasileiras

O cenário em que o Brasil se encontrava no período colônia, quando as religiões afro-


brasileiras foram surgindo, era o de extrema repressão a qualquer credo religioso diferente da
fé católica, uma vez que não havia a figura do Estado Laico. Os princípios religiosos eram
utilizados como instrumento de repressão e de controle dos povos indígenas, dos negros e das
mulheres.

De fato, as religiões afro-brasileiras espelham muito as condições históricas de sua


formação: religiões de subalternos (primeiro os escravos, depois os negros livres
marginalizados, mais tarde os pobres urbanos) que se formam também como religiões
subalternas, isto é, no mínimo, religiões tributárias do catolicismo, que até hoje, em
grande medida, aparece como a religião que dá identidade aos seguidores dos cultos
afro-brasileiros. Quando as religiões dos orixás e voduns eram religiões de grupos
negros isolados (mais ou menos até 40 ou 50 anos atrás), o catolicismo, além de ser a
face voltada para o mundo branco exterior, dominante e ameaçador era ele também o
elemento que, tendo o sincretismo como instrumento operador, rompia com esse
isolamento sociocultural para fazer de todos, mais que negros, participantes de uma
identidade nacional: ser brasileiro. (PRANDI, 1997, p.155).

Por mais que o sincretismo tenha, de certa forma, preservado elementos próprios dos
negros e dos nativos, grande parte foi perdida, primeiramente, porque a moralidade estava sob
controle do branco, impondo novas maneiras de viver e de ser ao negro, além de a escravidão
separar muitas famílias, aos poucos, destruir as referências tribais. (PRANDI, 1997). Contudo,
por mais que muitos princípios e cultos religiosos africanos tenham sido reprimidos e a religião
dos brancos tenha sido imposta, os negros resistiram.
As práticas das religiões afro-brasileiras permaneceram ao longo da história e não
perderam a sua maior característica: o reconhecimento e a expressão da personalidade humana
em sua totalidade, ou seja, em seus aspectos “positivos” e “negativos”. Por isso, muito se fala
que as religiões afro-brasileiras são religiões de liberação da personalidade, pois não é seu
objetivo o aniquilamento das paixões humanas. Pelo contrário, a própria mitologia dos Orixás
mostra claramente como “mal e bem” fazem parte da natureza humana. (BARROS, BAIRRÃO,
2015).
As religiões afro-brasileiras reconhecem o mal como um elemento característico do
homem e desmistifica a ideia de “mal”. Não existe Orixá ou entidade que seja boa ou má, não
existe pior ou melhor. São forças distintas, mas fundamentais para realização do homem. Nessa
lógica, não há uma moral estabelecida que dite o que é certo ou errado, o que pode e o que não
33

pode, destoando, assim, das religiões de raízes cristãs que pregam normas de conduta, definindo
e separando o que é o bem do que é o mal.
Sendo assim, é possível dizer que as religiões de matrizes africanas veem as pessoas
como seres ambivalentes, que desejam e que lutam por suas realizações. Segundo Prandi
(1997), “o bom seguidor das religiões dos orixás deve fazer todo o possível para que seus
desejos se realizem, pois é através da realização humana que os Deuses ficam mais fortes, e
podem assim mais nos ajudar.” (PRANDI, 1997, p.13).
Interessante pensar nesta relação que se estabelece através da busca do devoto em
realizar os seus desejos, a fim de fortalecer o Orixá, para que este o ajude mais ainda a satisfazer
os seus próprios anseios. Sendo que quando este elo se enfraquece, devido à falta do devoto
para com suas obrigações, o Orixá pode ficar contrariado, afinal, mesmo sendo uma divindade
sagrada, ele pode oscilar entre os sentimentos positivos e negativos, assim como nós, os seres
humanos (BARROS, BAIRRÃO, 2015). Diante dessa lógica, pode-se refletir, a partir do olhar
da psicologia, que se a pessoa não reconhece os seus desejos, uma hora ou outra, ela terá que
se haver consigo mesma.
No que diz respeito à imagem da entidade Pombagira, em relação à aceitação e o
reconhecimento dos próprios desejos humanos, compreende-se que os desejos de ordem sexual
e afetiva podem e devem ser realizados pela mulher. E é por isso que os “Exus e as Pombagiras
são bons exemplos de como essa religião é capaz de incluir toda e qualquer característica do
humano no sagrado”. (BARROS; BAIRRÃO, 2015, p.128). Afinal, as Pombagiras são
entidades que:

Se apresentam subversivas, transgressoras, mostram a sexualidade como fator


importante do seu poder, além de inverterem os papéis estabelecidos, colocando-se
na condição de sedutoras. Os papéis instituídos sofrem algumas alterações por um
viés sutil que passa pela sexualidade, nos quais elementos de poder, de sedução
masculina se misturam com os femininos, como cigarro, a bebida, o perfume e as
flores. (LAGOS, 2007, p.41)

Para o sociólogo Prandi (1997), com a Pombagira, acessam-se os aspectos mais


próximos dos instintos, aspirações e desejos. O culto a esta entidade revela o lado “menos
nobre” dos humanos, do ponto de vista popular, sendo também o lado mais encobertado das
manifestações da sexualidade das mulheres, pois ele coloca em questão o estereótipo da mulher
boazinha e pacífica. Prandi também afirma que a Pombagira é a entidade que mais se aproxima
dos seres humanos, sendo que ela “teria tido uma vida passada que espelha certamente uma das
mais difíceis condições humanas: a prostituição”. (PRANDI, 1997, p.8). É esta condição que
34

lhe permite um total conhecimento e domínio sobre a vida sexual e os relacionamentos afetivos,
podendo assim dar conselhos àqueles que não compreendem os seus desejos, fantasias e
angústias.
Interessante pensar como o termo “prostituta” foi utilizado pelo autor para caracterizar
a entidade. O uso desse termo revela um preconceito? Teria sido empregada para fazer uma
referência às mulheres que rompem com os padrões, em busca de realizarem seus desejos e
viverem livremente suas relações amorosas, ou uma mulher que de fato trabalha como
profissional do sexo? (BARRO, BAIRRÃO, 2015).
Na tese de mestrado, “Arreda homem que ai vem a mulher”, de Nilza Lagos (2007),
percebe-se que há pensamentos que divergem daqueles que o autor Prandi (2001) associa à
imagem da Pombagira. É possível notar essa diferença na declaração que a Mãe de Santo
Yalorixá, Maria Otilia de Omolú, faz ao ser entrevistada por Lagos: “A Pombagira é como nós,
que gosta de tudo que é bom, e, acontece de muitas pessoas acharem que a Pombagira é uma
prostituta, uma mulher que só trabalha para o mal, mas ela ajuda muita gente”. (LAGOS, 2007,
p. 31).
A mãe de santo Fátima de Oyá, também entrevistada por Lagos (2007), traz para
discussão as características da Pombagira, associadas ao seu “poder feminino”.

Ela é maravilhosa e como eu disse, [...] tem gente que diz que Pombagira só faz mal,
é prostituta, isso, aquilo, representa a prostituição. Nada disso. Ela é maravilhosa,
feiticeira, ela passa aquela energia, assim, faz a mulherada se sentir mais mulher, mais
sexy. É isso. Eu gosto que meus olhos chega brilhar, né. (LAGOS, 2007, p. 31).

A Pombagira, ao expressar a liberdade das mulheres, é tomada de modo pejorativo para


classificar de forma negativa as mulheres que rompem os padrões de gênero atribuídos ao
comportamento sexual e afetivo da mulher. Pode-se perceber que essa lógica se repete quando
se trata de uma entidade que exalta justamente as vivências afetivo sexuais das mulheres.
(BARROS, BAIRRÃO, 2015).
A Pombagira é também vista como uma entidade que, com função de conceder
segurança e favorecer o autoconhecimento das mulheres, trabalha questões que, segundo uma
das mães de santo entrevistada por Barros (2015), “giram em torno da questão da autoestima,
da beleza, de resgatar a mulher, da mulher ser si mesma”. (BARROS, BAIRRÃO 2015 p.11).
Isso mostra o amplo significado da imagem da Pombagira, que foge do controle de
qualquer definição que queira limitá-la em apenas uma característica ou função. Talvez, a
definição que mais se aproxime do que se pareça ser a Pombagira, seja “advogada das
35

mulheres”, como Barros e Bairrão (2015) colocam, ou seja, aquela que defende a mulher para
que possa buscar a realização dos próprios desejos.
36

4 A RELAÇÃO DO SÍMBOLO DA POMBAGIRA E A SEXUALIDADE DA MULHER

Pensar a sexualidade da mulher, a partir do mito da Pombagira, é considerar os aspectos


da repressão e da desqualificação da sexualidade feminina, haja vista que, no imaginário social,
a Pombagira é associada ao desregramento, à transgressão da lei, que responde aos desejos sem
passar por um juízo de valor. Pensar em sua imagem, é tirar a mulher do lugar de santa e
imaculada, dando-lhe liberdade de expressão dos seus próprios desejos. (BARROS,
BAIRRÃO,2015).
No decorrer da história, dentro do mundo patriarcal, foram-se criando duas categorias
de mulher: as devassas e as santas. A mulher “santa” era associada à figura da Virgem Maria,
da mãe e da mulher do lar. Ela era intocável, um objeto de propriedade do marido e controlada
pela Igreja. Considerada frágil, incapaz e de pouca inteligência, não podendo assim responder
por seus atos, precisando então da autorização do marido, tutelada até mesmo no campo
jurídico. (LAGOS, 2007).
A “santa mulher” não podia expressar suas opiniões, tampouco os seus desejos sexuais.
O seu destino já estava traçado desde nova, normalmente idealizado e imposto por seu pai, que,
posteriormente, transfere ao marido o poder sobre a filha. Sua vida resumia-se basicamente em
preparar-se para casar e, quando casada, satisfazer os desejos do cônjuge, cuidar da casa e dos
filhos. (LAGOS, 2007).
Esse lugar de santa não se relacionava à ideia de a mulher ser honrada e tratada como
a representação da Virgem Maria na terra. Por mais que se esperasse da mulher um
comportamento espelhado na Virgem Maria, o lugar de “sagrado” que as mulheres ocupavam
era o de “serem intocáveis por outrem, pois eram consideradas propriedades de seus maridos e,
portanto, sagradas.” (COSTA, 2015, p. 75).
Já as devassas, eram as mulheres que tinham uma vida sexual e afetiva fora dos padrões
de sua época, fugindo assim do estereótipo da mulher frágil, submissa, delicada, materna, do
lar, além de não se encaixarem no lugar de pura e imaculada. Sendo assim, eram consideradas
prostitutas, feiticeiras, bruxas ou loucas. Associadas ao demônio, eram condenadas à fogueira,
levadas para hospitais psiquiátricos, presas ou até mesmo mortas por seus companheiros.
(COSTA, 2015).
As mulheres que manifestavam seus desejos sexuais, que tinham relacionamentos
extraconjugais, que questionavam o lugar superior do homem eram consideradas pecadoras e
veículo de feitiçarias. As mulheres eram tomadas como a própria manifestação do diabo, pois:
37

Acreditava-se que eram capazes de gerar toda sorte de monstruosidades, e tal façanha
fazia com que fossem vistas como verdadeiras aliadas do Diabo [...] as mulheres
parecem emprestar seus corpos para que, neles, o Demônio realize as suas astúcias.
(DEL PRIORE, 2013, p. 109).

A crença de que a mulher era mais propensa aos pecados da carne do que o homem
surge devido ao mito do Jardim do Éden, no qual Eva era seduzida pela serpente, cometendo
não só o pecado de comer o fruto proibido, como também induzindo Adão a pecar. Essa era
uma das justificativas para as mulheres serem controladas primeiro pelos pais, posteriormente
pelos maridos, mas sempre sob a direção da Igreja Cristã que postulava uma ligação entre a
sexualidade da mulher com a manifestação do demônio. (COSTA, 2015).
Interessante pensar que o lugar de santa e sagrada era, na verdade, um lugar que tentava
controlar o comportamento e os impulsos sexuais da mulher. Até porque, mesmo ela acatando
o lugar de submissão (santa), era vista como a portadora do “pecado original”.

As mulheres carregam os estigmas do pecado, da provocação e da indução ao coito


carnal. Por esse motivo, Santo Agostinho condenava o corpo feminino por ser um
veículo de insinuações e provocações à luxúria que levavam o homem a transgredir,
devido às características primordiais trazidas por elas, como exemplos, a arte da
sedução e do desejo pecaminoso. (COSTA, 2015, p. 76).

Então, pode-se compreender que, antes de existir a separação entre a promíscua e a


santa, a transgressora e a submissa, frágil e agressiva, a mulher já estivesse marcada pela ideia
de ser um veículo do mal, já existisse um aspecto que, segundo a Igreja, fosse inerente à mulher:
o pecado do desejo sexual. Pecado este que assombra a estabilidade da sociedade machista, que
enfeitiça os homens fazendo com que percam a razão. Assim, era dada ao homem a função de
inibir e controlar a mulher, já que ele possuía a razão e ela era desprovida da mesma, além de
ser vulnerável às paixões desgovernadas e à luxuria. (COSTA 2015).
A mulher é colocada na posição de subordinação ao marido, devido à narrativa bíblica
da criação da mulher, apoiando-se na ideia de que a mulher provém da matéria-prima do
homem. Desse modo, as mulheres só podiam obter a salvação servindo ao marido, cuidando da
casa e dos filhos, sendo que a sexualidade só poderia ser exercida para a procriação, caso
contrário, estaria cometendo o pecado mais grave, sendo igualada à condição amaldiçoada de
Eva. (COSTA, 2015).
Contudo, mesmo com a tentativa de conter os desejos da mulher e inibir a sua
sexualidade, seja através das crenças cristãs, do domínio do homem, ou ainda com a tentativa
38

de criar um ideal de mulher santa, não foi possível calar totalmente as mulheres. A Pombagira
é um símbolo que representa exatamente essa ruptura com a ideia de que a mulher é um objeto,
dando a ela o lugar de sujeito na própria vida, tendo liberdade sexual e impulsionando-a a
quebrar as regras estabelecidas e romper com o continuísmo histórico de submissão e de posse.
(BARROS, BAIRRÃO, 2015).
A Pombagira questiona a opressão sexual vivenciada pelas mulheres. Ela é, segundo
Menezes (2009), um agente transformador que simbolicamente não permite às mulheres
submeterem-se às construções socioculturais desse feminino submisso, passivo e assexuado. A
Pombagira é o símbolo do direito de dizer não, de se colocar em suas relações e de ser dona do
seu próprio corpo. (COSTA, 2015).
Então, da mesma forma que ao mencionar o mito da Pombagira é necessário falar da
repressão da mulher e do estereótipo de prostituta, é fundamental também enfatizar que ela,
mesmo tendo uma imagem de devassa, no imaginário popular, é um grande símbolo da
libertação das mulheres na vivência de seus corpos e dos seus desejos mais íntimos e
encobertos. (LAGOS, 2007).

No cenário das religiões afro-brasieiras, a Pombagira é uma figura ambivalente,


ambígua, vista sempre com desconfiança, ora admirada, ora temida, porque [...]
coloca em movimento tudo o que está estagnado, e ora vivendo em zona de conforto,
ela cria brechas e chama a atenção das mulheres que estão sob o domínio masculino
para se libertarem da obrigação de serem santas e manterem um perfil angelical
estabelecido na sociedade. (COSTA, 2015, p.102).

Importante ressaltar que, mesmo tendo essa característica ambivalente, ela está presente
no campo religioso, ou seja, a sua figura paradoxal é reconhecida como sagrada. Uma figura
como a da Pombagira pertencer ao campo religioso, afro-brasileiro, é muito significativo, uma
vez que esta religião exalta a ambiguidade da personalidade humana, mostra que as
características de forte, livre e desejante podem fazer parte da personalidade, em especial, da
personalidade da mulher. Isso parece soar óbvio, mas não é, pois se fosse ela não seria tão
recriminada e demonizada. (BARROS, BAIRRÕES, 2015).
Quando a Pombagira se opõe à subserviência da mulher, de postura angelical e submissa
que foi estabelecida, ela mostra que não cabe na moldura idealizada para a mulher. Ela não é
angelical e é por isso que é associada ao demônio. Afinal, ambos (a mulher e o demônio), para
a Igreja, seriam indomesticáveis e figuras sem juízo. O mal é atribuído a ela por sua
desobediência ao poder masculino e por sua ousadia em ser diferente do que se é “permitido”
pela sociedade. (BARROS, BAIRRÕES, 2015).
39

A imagem da Pombagira configura a possibilidade de elaboração de um feminino que


difere do tradicional. Sua imagem, muitas vezes, choca e chama a atenção para aquilo que está
mais próximo do que imaginamos, que é mais comum do que se fala e mais normal do que se
pensa. Pode ser percebido claramente em seus ritos, gestos, roupas, gargalhadas e cânticos, este
“feminino” tão pouco santificado, mas ainda assim sagrado. (COSTA, 2015).
Para ilustrar melhor, abaixo são expostas uma ilustração retirada do blog Umbanda EDA
e algumas fotos do artigo cientifico “Performances de gênero na umbanda: a Pombagira como
interpretação afro-brasileira de “mulher”, publicadas na revista do Instituto de Estudos
Brasileiros que mostra um culto à Pombagira. Essa imagem e as fotos caracterizam um pouco
esse “universo” que a imagem da Pombagira simboliza, contudo, vale ressaltar que sua figura
não se limita apenas à ilustração e às fotos, pois, como já mencionado, seu mito é de extrema
complexidade e é impossível concluir no espaço da monografia a totalidade de sua
compreensão.

Figura 1 - Ilustração da Pombagira

Fonte: (10 Pontos..., 2018).


40

Figura 2 - Fotos de médiuns incorporando as Pombagiras.

Fonte: (PERFOMANCES..., 2015).

O cigarro, o decote, as roupas vermelhas, a bebida, o gestual, a cabeça erguida, a


iluminação apenas pela luz das velas que trazem uma ideia de mistério, a estética do ritual e até
mesmo o batom vermelho enunciam quem são, mostram uma mulher fora do padrão, revelam
uma outra forma de pensar e lidar com o feminino. (BARROS, BAIRRÕES, 2015).
Nos cânticos, também é possível perceber que a Pombagira aparece como a sensual e a
poderosa, que tem poder de ajudar aos que estão em condições precárias, de “cortar todo mal”,
de resolver problemas de amor e defender os seus devotos dos inimigos, sendo que seu poder
está em sua sensualidade e no mistério de sua feitiçaria. (COSTA, 2015).
A título de exemplo, abaixo são expostos dois cânticos dedicados à Pombagira para
maior compreensão:
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Cântico 1: Rosa Caveira


Olha quem chegou para trabalhar
Trazendo um feitiço no olhar
Rosa Caveira jeito sensual
Vai cortando com sua risada
Todo o mal
Sua morada é na figueira
Para vencer o mal
chama Rosa Caveira
Fonte: (10 PONTOS..., 2018)

Cântico 2: Pombagira dos Sete Maridos

Pombagira é mulher de Sete Maridos!


Pombagira é mulher de Sete Maridos,
Mas não mexa com ela!
Pombagira é um perigo!
Ela é Pombagira, a Rainha da Encruzilhada,
Que enfrenta seus inimigos
Com uma forte gargalhada.
Fonte: (10 PONTOS..., 2018)

Interessante pensar que a Pombagira vem acabar com o ‘mal’, sendo que esse mal, de
acordo com Oli Costa (2015), é a violência psicológica e física sofrida por todos os
marginalizados, principalmente a mulher. Neste sentido, percebe-se novamente um paradoxo,
pois a Pombagira é vista como a agente do mal, mas também é quem livra de todo mal a mulher
submissa e todos os excluídos. Sendo assim, é importante refletir que, ao definir a Pombagira
como o demônio feminino ou uma “agente do mal”, deve ser levado em conta de onde vem essa
definição, afinal, por mais que sua imagem seja marcada pela ambiguidade, há que se pensar
que muitas vezes as acusações, as difamações e os estereótipos de destruidora de lar e prostituta
são, na verdade, leituras feitas por um olhar viciado e já preconcebido que distorce aquilo que
destoa e que sai do que é dito normal. Demonizando quando o que se revela é transgressor,
prostituindo quando o que se expressa é erótico, patologizando quando o que vem à tona é o
desejo.
Essa lógica preconceituosa tenta impedir uma elaboração de um feminino que se mostre
de outra maneira, que não só àquela imposta pela sociedade machista. Mas, ao pensarmos que
o símbolo da Pombagira se manteve mais de 600 anos vivo, permite-nos concluir que essa
tentativa não foi de todo um êxito. Alguma coisa esse símbolo tem a dizer, alguma coisa o
mantém no imaginário popular que o faz estar vivo até hoje. (LAGOS, 2007).
42

Então, pensando que Pombagira corresponde ao feminino, pode-se refletir que o


“feminino” que ela traz é marcado pela força, independência e liberdade. Logo, é possível
questionar a categoria de “feminino” sendo apenas característico daquilo que é frágil, puro e
ingênuo. A partir da contribuição da filósofa Butler (1993), é possível compreender que a
imagem da Pombagira pode contribuir com a “ampliação” da categoria de “feminino”,
englobando os aspectos de força, independência, coragem, autonomia, entre outros, desta
forma, contribuindo para a minimização da segregação entre as mulheres. (BARROS,
BAIRRÕES, 2015).
Para Cláudia, mãe de santo, as Pombagiras “são a força motriz das mulheres, elas são
primordiais, toda mulher tinha que trabalhar a Pombagira dela muito, muito”. (BARROS,
BAIRRÕES, 2015, p.133). Traduzindo essa fala pelo viés da Psicologia, entende-se como é
importante e fundamental que a mulher possa se permitir voltar seu olhar para sua sexualidade.
A mãe de santo ainda complementa: “A Pombagira dá segurança, ela dá vontade de ir à luta, de
trabalhar fora, ganhar o seu, não depender de ninguém, Pombagira dá estabilidade para a
mulher”. (BARROS, BAIRRÕES, 2015, p.133). Sendo assim, é possível dizer que quando a
mulher reconhece a sua sexualidade, ela não só está manifestando o seu desejo no campo sexual
e afetivo, mas também o desejo subjetivo, percebendo o seu corpo, os seus anseios e
reinventando o significado de feminino, indo além do estereótipo e entendendo o que é ser
mulher para si mesma. (BARROS, BAIRRÕES, 2015).

Essa transformação se deve provavelmente a uma elaboração social da mulher


independente e ativa; àquilo que nos parece ser fruto de melhor integração de sentidos
vivenciados nas experiências de cotidianidade e sexualidade, um deslocamento
expressivo de novas configurações de “mulher”, cindidas anteriormente entre ser mãe
ou ser amante/ mulher de rua (que trabalha fora), ser “santa” ou ser puta/ “satanizada”.
(BARROS, BAIRRÕES, 2015, p. 140).

Deste modo, é possível perceber que a imagem da Pombagira permite-nos vislumbrar


outras possibilidades de vivência da sexualidade da mulher, mesmo que ainda no sec. XXI
existam expectativas em relação à conduta desta. Até porque, na atualidade, um contingente de
mulheres já não se limita ao modelo estereotipado de santa, visto que algumas mulheres
contemporâneas já conseguem se colocar na sociedade, em diversas áreas, inclusive na sexual,
tendo espaço para a expressão de suas preferências e vontade em temas que antes elas não
tinham liberdade de mencionar. (VIEIRA, 2005).
Atualmente, muitas mulheres vivem sua sexualidade de uma forma mais livre, não se
adequando mais a um lugar anulado e reprimido. No entanto, é preciso demarcar que essa ideia
43

não corresponde à totalidade das mulheres, uma vez que ainda se vivencia uma transformação
que está em processo. (VIEIRA, 2005).

5 CONCLUSÃO

A presente monografia teve como objetivo investigar se a imagem da Pombagira é um


símbolo da superação da repressão sexual dirigida às mulheres, tendo como referencial teórico
a Psicologia Analítica desenvolvida por Carl Gustav Jung.
O primeiro ponto a considerar é que esta monografia trouxe como contribuição para a
acadêmica e futura psicóloga, que pretende dar continuidade aos estudos sobre teoria junguiana,
a clareza de que a Pombagira não é um arquétipo, visto que não é possível ter acesso a este, que
está imerso no inconsciente coletivo.
Jung contribui com o campo da Psicologia, quando traz o conceito de inconsciente
coletivo, arquétipo, símbolo, mito, entre outros, uma vez que, através dos seus estudos, é
possível alcançar uma melhor compreensão de como os símbolos, presentes na expressão
artística, nos sonhos, nos rituais e nos mitos estão em todo o percurso histórico da humanidade,
dizendo indiretamente sobre a experiência que a existência humana promove em nós.
Carl Jung coloca o inconsciente como algo que não se desenvolve apenas durante a vida
pessoal dos sujeitos, mas, ao contrário, algo que é dado a priori, algo que se assemelha ao
conceito de instinto. Ou seja, são estruturas básicas e universais da psique que são denominadas
de arquétipo. O arquétipo ainda pode ser um padrão de comportamento herdado, ou seja, uma
estrutura que possibilitaria o desenvolvimento desse comportamento, mas que vai ser
preenchido e atualizado.
E onde os arquétipos se manifestam de tal maneira que não é possível alcançá-los? Os
arquétipos estão no inconsciente coletivo. Como já mencionado, anteriormente, Jung não
acreditava que o inconsciente provinha apenas das experiências que surgiam durante a vida do
sujeito. Para ele, a mente humana não chegava ao mundo como uma “folha em branco”. Ele
acreditava que, além do inconsciente individual, existia uma camada mais profunda e que já
estava presente em nós desde o nosso nascimento, uma camada que guardava informações e
experiências de caráter universal. Essa camada é o inconsciente coletivo que abriga os
conteúdos e modos de comportamento que são comuns a tudo e a todos.
Para maior compreensão, pode-se pensar que o inconsciente coletivo seja aquele que
abriga as estruturas arquetípicas, e por serem da ordem do inconsciente não é possível o acesso
44

direto a ele. Mas, a partir de suas manifestações, como, por exemplo, as imagens psíquicas,
padrões de comportamento e as produções humanas, é possível perceber a presença e a
influência dele em nossa vida.
Essas produções humanas, imagens psíquicas e padrões de comportamento podem ser
entendidas como símbolos já que o arquétipo é uma estrutura, uma forma, sendo esta vazia e
em potência. Quando essa imagem é elevada à consciência, ela é preenchida pelas
representações culturais, formando assim um símbolo. Ou seja, pode-se dizer que o símbolo é
o arquétipo em ato, repleto de sentidos, sendo que há os sentidos visíveis, relacionados à cultura
e aos sentidos invisíveis, relacionados ao inconsciente coletivo.
Então, foi possível compreender que a imagem da Pombagira não é um arquétipo por
esta fazer parte da ordem do inalcançável, mas entendê-la como um símbolo foi fundamental,
pois pensar que o seu mito se manteve vivo por mais de 600 anos, percorrendo muitos lugares
do mundo, através de um imaginário popular que levou e leva a imagem de uma mulher forte,
transgressora, sensual e poderosa, é pensar que a imagem da Pombagira diz algo sobre nós
mesmos.
Afinal, como o próprio Jung (2016) afirma, estamos o tempo inteiro sendo envolvidos
por imagens, símbolos e forças inerentes. Não estamos separados do todo. Nossa história é
refletida em mitos e os mitos são reflexos das experiências humanas. Tanto é que, segundo
Campbell (1979), os mitos são narrativas que tentam explicar o mundo humano, sendo assim
ele diz de uma experiência pessoal e de uma vivência em sua universalidade.
Deste modo, considero que consegui depreender o objetivo proposto na elaboração desta
monografia, posto que no decorrer dos estudos pude constatar que a imagem da Pombagira
pode ser uma figura da liberdade sexual da mulher moderna, já que esta traz em sua imagem a
marca de guerreira, sedutora, poderosa, independente e capaz, dando força para a ideia de que
a mulher não pode ser limitada às características de um feminino frágil e santificado. Sua
imagem traz um recado claro: a mulher tem o direito de usufruir da sua sexualidade da maneira
que desejar e de vivenciar o feminino do jeito que para ela faz sentido, proporcionando para si
mesma prazer e bem-estar.
Embora, considerando que foi possível atingir o objetivo desta monografia, não há a
pretensão de esgotar o assunto, visto ser um tema com diversos atravessamentos e que exige
um nível de aprofundamento maior. Finalizo este trabalho sabendo que ele só é o começo.
Afinal, pensar na imagem da Pombagira como um símbolo de libertação sexual da mulher
convida-nos a adentrar em outras discussões, que não foram o foco aqui, mas que são de muita
45

relevância, como por exemplo, a discussão do conceito de gênero, a busca das mulheres pela
igualdade dentro das religiões afro-brasileiras, a relação do mito da Pombagira com o mito
fundante de Lilith, entre outras questões.
Além desses pontos que são levantados como recomendações de futuros trabalhos
complementares a este, fica também uma questão a ser um dia estudada em relação ao arquétipo
da Grande Mãe. Sei, superficialmente, que este arquétipo tem quatro aspectos principais, a
nutrição, a fertilidade, o poder e a destruição. Os dois primeiros são considerados os aspectos
positivos, já os dois últimos são denominados como aspectos negativos. Então, será que a nossa
cultura ocidental nega os aspectos negativos da Grande Mãe? Ou ainda, será que a Pombagira
pode ser um símbolo dos aspectos negativos do arquétipo da Grande Mãe?
Ademais, penso que esta monografia poderá ser de grande utilidade para outros
trabalhos e para estudos realizados sobre o feminino, trazendo, assim, mais informações e mais
clareza sobre um assunto ainda tão polêmico, mas presente cada vez mais em nosso cotidiano,
seja pelas mídias sociais, no ambiente acadêmico ou até mesmo em nossas casas e em nossas
relações.
Acredito, também, que este trabalho poderá ser muito proveitoso para os estudantes de
psicologia que desejam começar a sua jornada dentro da Teoria Analítica, como eu desejei um
dia, mas que não tiveram nenhuma matéria dentro da sua própria graduação acadêmica que
contemplasse o pensamento de Jung, que contribui tanto para o campo da Psicologia.
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