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Tratamento
da deglutição – a atuação do fonoaudiólogo em diferentes países. São José dos Campos: Pulso; 2005.
Capítulo 1 p.15-32
A deglutição, e as outras funções orofaciais, tem sido uma preocupação da Odontologia desde que
os cirurgiões dentistas iniciaram os tratamentos de reposicionamento dos dentes, ou seja,
ortodônticos. A preocupação com os movimentos ou postura da língua ou com as funções exercidas
na boca ocorreram principalmente por causa das recidivas. Ao ler a história da odontologia
veremos que assim que a ortodontia passa a existir, começam a aparecer dentistas buscando
explicações para as recidivas, e muitas destas explicações recaem sobre a língua, hábitos deletérios e
funções orofaciais. Vamos conhecer um pouquinho da história dos dentistas, para mais adiante
entendermos como e o porquê a fonoaudiologia inicia seu trabalho em conjunto com eles.
Em 1728, Pierre Fauchard, dentista francês, foi o primeiro profissional que ao estudar a etiologia da
irregularidade nas posições dentárias obteve o título de Cirurgião Dentista publicando o livro
“Tratado em Odontologia”, sendo por esta razão considerado o pai da odontologia moderna. Nesta
época eram considerados os problemas de ordem estética e só se consideravam os dentes
anteriores.
Em 1836 F.Ch. Kneisel, dentista alemão, escreve o primeiro livro de Ortodontia em língua alemã.
Em 1839 LeFoulon, dentista francês, criou o nome "Orthodonsie", e fez três tipos de aparelhos.
Estudou como possíveis causas da má oclusão, as extrações prematuras, a sucção de dedos, e a ação
inadequada da língua.
Em 1840 Chapin Harris organizou o primeiro número da revista científica chamada "The American
Journal of Dental Surgery". Criou vários tipos de aparelhos ortodônticos, todos feitos em ouro, e em
1842 chamou a atenção para a importância de se corrigirem as irregularidades da posição dos
dentes o mais cedo possível. Criou ainda, um dicionário de ciência dentária, adotando o nome
Ortodontia.
Em 1863 G.Von Langsdorff, dentista alemão, também se preocupou com a influência dos
tecidos moles sobre a posição dos dentes.
Em 1869 Kleinmann, dentista alemão abordou a influência dos tecidos moles na posição dos
dentes e publicou um artigo chamado “A ação da língua sobre a posição dentária”.
Em 1873 C. Tomes, lança uma teoria na qual diz que as forças musculares entre os lábios e a
língua, determinam a posição dos dentes.
Em 1883 J. Parreidt cita como causa das irregularidades na posição dentária a pressão exercida
pelas bochechas nos casos de mordida aberta, e o aumento da tonsila faríngea (adenóide).
Em 1884 Quinby criou um método para a correção de hábitos viciosos (chupar dedo, língua, lábio,
e outros). Ele achava que ao corrigir o hábito haveria a autonormalização da mordida. Quinby
desbravou a pesquisa na Inglaterra, e em seguida apareceram outros dentistas ingleses que
publicaram muitos artigos abordando o assunto forma versus função. Foram eles: Rix, Ballard,
Hovell, Pringle e Tulley.
Em 1888 John Nutting Farrar, dentista inglês, publica um “Tratado sobre as irregularidades dos
dentes e suas correções” sendo a primeira publicação dedicada inteiramente à Ortodontia.
Em 1885 Edward Hartley Angle nasceu. Ele separou a Ortodontia da Odontologia levando a
Ortodontia a ser uma especialidade. Em 1900 Angle fundou em Saint Louis no Missouri – USA, a
primeira escola de Ortodontia do mundo, e em 1901 a Ortodontia passou a ser aceita como a
primeira especialidade do mundo.
Em 1920 Viggo Andresen, da Dinamarca, desenvolveu um aparelho que servia como contenção
funcional e impedia a respiração oral. O aparelho tinha o princípio de John Nutting Farrar, ou seja,
deveria atuar de forma intermitente de acordo com o princípio biológico, trabalhar e descansar. O
ativador de Andresen era um aparelho totalmente inerte e com liberdade de movimentos. Quando
estava na cavidade oral era posto em movimento pela língua e pela musculatura oral. Os aparelhos
móveis não eram reconhecidos na época.
Em 1925 Lewis, dentista norte-americano, enumerou várias causas da má oclusão destacando o uso
de mamadeiras e hipertrofia dos tecidos linfóides (amídalas e adenóide).
Em 1927 Rogers, dentista norte-americano, publica sobre casos de mordida aberta envolvendo
problemas de deglutição.
Nas décadas de 20 e 30 a Ortopedia Funcional dos Maxilares despontava com força. O corretor de
função de Fränkel corrigia a má oclusão, praticamente sem contato com os dentes. O vestíbulo oral
era a base das operações para o tratamento. Fränkel acreditava que a pressão da língua ou a sucção
de polegar levava a perturbações funcionais na formação dos componentes esqueletais. Era
necessário inibir o mau hábito e isso levaria a uma reabilitação espontânea. Queria inibir as causas
contra naturais para o sistema orofacial se desenvolver livremente, dentro de sua tendência
fisiológica normal. Os aparelhos de Fränkel não se limitaram à inibição da função muscular
defeituosa, mas também, reeducavam os músculos envolvidos. O uso do aparelho constituía uma
mioterapia funcional não havendo necessidade de o paciente realizar exercícios de forma
consciente. Além dos aparelhos miotônicos e miodinâmicos havia um terceiro grupo, o qual
poderia se chamar de "aparelhos que procuram uma guia postural". O crescimento e
desenvolvimento estão muito relacionados pela função. "A função cria o órgão: o órgão cria a
função". O aparelho de Fränkel afasta a ação muscular nociva dos bucinadores e do orbicular da
boca, deixando livre a ação muscular interna (língua) para exercer sua função modeladora dos
maxilares e dentes.
Em 1946 Rix, dentista inglês, escreve sobre a deglutição e a posição dos dentes.
Em 1953 Asnis publica no Journal Dental Medicine um guia para treinamento lingual.
Em 1960, 1961 e 1962, Straub, dentista norte-americano, escreve sobre o mau funcionamento da
língua, suas causas, efeitos, resultados no tratamento ortodôntico, e sobre a terapia. Straub foi um
grande defensor dos programas de terapia miofuncionais, os quais até criou, pois acreditava
cegamente na inter-relação entre forma e função.
Em 1965, Crowder publica no American Jounal Clinic Hypnosis um artigo ensinando como
controlar a deglutição atípica usando a hipnose.
Ao ler a história da Odontologia, podemos observar que a preocupação com a inter-relação entre
partes duras e moles não é de hoje e que muitos dentistas escreveram sobre isto. Ao mesmo tempo
sabemos de muitos outros artigos de dentistas, que discordavam do ponto de vista dos seus
colegas, os quais acreditavam no uso de exercícios para reeducar músculos e funções orais com o
objetivo de melhorar ou corrigir os dentes Snow (1963); Mason, Proffit (1974); Day (1975). Não
parece nada, mas de 1728 até os dias de hoje temos 277 anos de certezas e dúvidas sobre este
assunto!
E na Fonoaudiologia?
Quem iniciou o trabalho com Motricidade Orofacial? Quais são as primeiras publicações? Em que
país tudo começa? Existem pesquisas realizadas por fonoaudiólogos que comprovem a importância
do trabalho conjunto entre fonoaudiólogos e dentistas na reeducação da deglutição?
Um pouco de história da Fonoaudiologia no mundo
Primórdios da Fonoaudiologia
A Fonoaudiologia inicia com Demóstenes (330 AC) que usava a técnica de colocar seixos, ou pedras
na boca para melhorar sua articulação, já que era gago. Ele discursava diante do mar bravio,
inibindo, sem saber, seu próprio controle auditivo, ou falava com o peito encostado em uma espada
para controlar suas sincinesias posturais e corporais.
Fonoaudiologia na Europa
Em 1900 na Hungria foi dado início a um curso de Fonoaudiologia, e até 1940 outros países como,
Áustria, Nova Zelândia, Alemanha, Noruega e Iugoslávia também o fizeram.
Embora não oficialmente, na Áustria em 1909, já existia terapia para fala e voz.
Em 1911 é fundada a primeira clínica de fala na Inglaterra. Em 1918 o curso é implantado na Suécia.
Em 1920 foi aberta a Escola Vienense de Logopedia com reconhecimento oficial em 1924. Em 1937
clínicas de Fonoaudiologia são fundadas na Rússia.
A International Assostiation for Logopedics and Phoniatrics - IALP é a maior organização de
profissionais que se dedicam ao estudo da comunicação humana e representa 130.000 especialistas
por meio de 56 sociedades nacionais afiliadas de 38 países. Esta organização foi fundada em 1924
por Emil Froeschels em Viena na Áustria. Neste mesmo ano foi realizado o primeiro Congresso da
IALP com oito países representados.
Fonoaudiologia no Brasil
No início, no Brasil, a Fonoaudiologia e a Educação Especial se misturavam. Já se pensava em
reabilitação desde a época do Império.
Em 1854 foi fundado o Colégio Imperial para meninos cegos, e em 1855 foi fundado o Colégio
Nacional destinado ao ensino dos surdos, ambos no Rio de Janeiro. Em 1912 um médico do Rio de
Janeiro inicia as pesquisas e reabilitação dos distúrbios da voz
e da fala, bem como cria cursos de orientação a professores, promovendo conferências sobre o
tratamento da voz e da gagueira. Isto foi considerado o início da diferenciação da Fonoaudiologia
com a Educação Especial.
Em 1920, 1928, 1935 e 1938, já encontramos publicações no Brasil de otorrinolaringologistas sobre
voz. Em 1948 é lançada, a 3ª edição da obra “Manual de Califasia” do Dr. Silveira Bueno, que
tratava principalmente de problemas de dicção e articulação. A partir da década de 1950 surgem os
primeiros cursos livres para a reeducação da fala, voz, audição e linguagem.
Até o início dos anos 70 a profissão ainda se chamava de Logopedia ou Terapia da Palavra no Rio
de Janeiro, e de Fonoaudiologia em São Paulo. O nome utilizado hoje no Brasil, Fonoaudiologia,
veio da Argentina.
O primeiro curso de Fonoaudiologia no Brasil, com um ano de duração, foi aberto em 1960 na
Universidade de São Paulo. O segundo curso, também com um ano de duração, iniciou em 1961 na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Na seqüência abriram os seguintes cursos: em 1965
Santa Maria no Rio Grande do Sul; em 1967 Universidade Federal Rio Janeiro; em 1968 Escola
Paulista de Medicina em São Paulo; em 1971 Pontifícia Universidade Católica em Campinas-SP; e
em 1972 Instituto Henry Dunant no Rio de Janeiro.
O primeiro curso aprovado no Brasil foi o de Santa Maria – Rio Grande do Sul em 1974. Em 1975
foram aprovados os cursos da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, e por último, o da Escola Paulista de Medicina. O primeiro
currículo mínimo foi aprovado em 08/07/1976.
A Fonoaudiologia brasileira inicia seus congressos com apresentação dos primeiros trabalhos
científicos em 1978, com o 1° Congresso de profissionais afins da Medicina em Fortaleza – CE. Em
1979, ocorreu o 1° Congresso de Profissionais de Ensino da Saúde em Campinas e em 1983 ocorreu
o 1° Congresso Internacional dos Profissionais em Fonoaudiologia no Rio de Janeiro.
Órgãos de classe foram criados, sendo que o primeiro foi em 1962 e se chamou Associação
Brasileira de Fonoaudiologia – ABF. Esta associação foi fundada em São Paulo, e após alguns anos
foi transformada em sindicato. Em 1974 foi criada a ABRAFA que reunia fonoaudiólogos e médicos,
também extinta após alguns anos de atividades.
Em 1988 foi criada a Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia – SBFa com sede em São Paulo. Esta
sociedade é responsável atualmente pelos congressos anuais da Fonoaudiologia e edita uma revista
científica. Conta hoje com aproximadamente 2000 fonoaudiólogos como sócios.
Todas estas entidades tiveram, e têm como objetivo, cuidar da parte científica da profissão.
Para resolver as questões profissionais foram criados no Brasil os chamados Conselhos de Classe.
Em 1983 foi criado o Conselho Federal de Fonoaudiologia e em 1986 os Conselhos Regionais de
Fonoaudiologia da 1ª região - Rio de Janeiro e a 2ª Região - São Paulo. Atualmente existem sete
conselhos regionais de classe representando todo o Brasil que tem aproximadamente 25.000
fonoaudiólogos.
A Fonoaudiologia no Brasil cresceu, se diversificou, e naturalmente começou a ter especialistas.
O Conselho Federal de Fonoaudiologia,
por meio da Resolução de número 130/95, determinou as áreas de especialidade da
Fonoaudiologia brasileira: Motricidade Oral; Linguagem; Voz e Audiologia e em seguida
regulamentou os cursos de especialização via Resolução n. 131/95.
Foram emitidos até 04 de maio de 2005, segundo informações oficiais do Conselho Federal de
Fonoaudiologia, 2888 títulos de especialistas sendo 980 na área de motricidade oral, 846 na área de
audiologia, 595 na área de voz e 467 na área de linguagem.
Com relação à parte científica as primeiras publicações na área de Fonoaudiologia no Brasil foram
as seguintes:
Livros:
1969: “Vocabulário Ilustrado para Terapeutas” de Marly Bezerra Canongia, publicado pela própria
autora na cidade do Rio de Janeiro.
1970: “Disgrafia” de Abigail Caraciki publicado pela Ed. Forense também no Rio de Janeiro.
1972: “Fundamentos Científicos da Fonoaudiologia” de Antônio Amorim publicado pela Ed. Grafik
em São Paulo.
Revistas:
As duas primeiras revistas científicas brasileiras foram editadas na década de 80. Em 1986 surge a
Revista Distúrbio da Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), que
é a primeira revista de Fonoaudiologia do Brasil e também é a primeira a ser indexada no Lilacs. No
ano de 1989 é editada a Revista Lugar em Fonoaudiologia pela Universidade Estácio de Sá do Rio
de Janeiro, a qual já não existe mais.
Para se ter uma idéia da evolução com relação às revistas científicas brasileiras, atualmente são
publicadas sete revistas, sendo que três delas já são indexadas no Lilacs e uma delas, também no
MedLine.
–Distúrbios da Comunicação PUC–SP (Lilacs)
–Pró Fono - Revista de Atualização Científica (Lilacs e MedLine)
–Fono Atual (Lilacs)
–Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia
–Fonoaudiologia Brasil
–Revista CEFAC de Atualização Científica
–Jornal Brasileiro de Fonoaudiologia do Conselho Federal de Fonoaudiologia
Bem, após este panorama geral da Fonoaudiologia no mundo e no Brasil, retomamos nosso tema
inicial que é o da “Deglutição”, a qual, no Brasil, é estudada, avaliada e tratada pelos
fonoaudiólogos especialistas em Motricidade Orofacial (MO).
Esta área de especialidade cresceu muito nos últimos anos, e tem o maior número de
fonoaudiólogos especialistas cadastrados pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia. A MO está
subdividida em áreas de domínio, uma vez que não é possível saber em detalhes tudo que esta área
abarca. O Comitê de MO da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia (SBFa) descreveu por meio de
alguns documentos, o que é estudado nesta área e quais são alguns dos conhecimentos necessários
para ser especialista em MO. Uma consulta ao site da SBFa - Comitê de MO - documentos, poderá
ajudar a compreender melhor esta grande área de conhecimento: www.sbfa.org.br.
1º Artigo – “Síndrome de Apert - estudo multidisciplinar” o qual foi escrito pela fonoaudióloga
Lidia D’Agostino em conjunto com outros profissionais, tendo sido publicado na Revista Brasileira
de Deficiência Mental, 5: 5-11, 1970
2º Artigo – “Reeducação mioterápica nas pressões atípica de língua: diagnóstico e terapêutica” de
Beatriz A.E. Padovan, o qual foi publicado na revista de Ortodontia, 9 (1 e 2) jan/abr, 1976.
3º Artigo – “Reorganização Neurológica” de Beatriz A.E. Padovan, o qual foi publicado no Jornal
Brasileiro de Reabilitação Vocal. Rio de Janeiro, ano 2, n.6, vol.2, jan/fev/março, 1981.
4º Artigo – “Algumas considerações fonoaudiológicas sobre deglutição atípica numa abordagem
multidisciplinar” de Zelita C. F. Guedes, o qual foi publicado na Acta AWHO, 2(4): 40-6, 1985.
Observamos pelos dados expostos acima, que dos quatro artigos, um livro e um capítulo de livro,
na área de MO, escritos entre 1970 e 1985 temos três deles, que no seu título, já mostram uma
preocupação com as alterações da deglutição. A partir de 1987, livros, capítulos em livros, artigos
em revistas, vídeos educativos, dissertações e teses na área de MO, são escritos pelos estudiosos
deste assunto e passam a fazer parte do cenário bibliográfico brasileiro.
Os primeiros brasileiros que pesquisaram sobre avaliação e terapia miofuncional tinham pouca ou
quase nenhuma literatura nacional para avançar em seus estudos. Nesta época dois livros clássicos
da área de MO, “Inter-relações entre a odontoestomatologia e a fonoaudiologia” de Segóvia (1977),
publicado na Argentina, e “Oral Myofunctional Disorders”, de Barret e Hanson (1974), publicado
nos Estados Unidos, foram muito utilizados por quase todos aqueles que queriam se aprofundar
em MO. Estes livros foram e continuam sendo considerados clássicos para quem quer iniciar seus
estudos na Motricidade Oral, compreendendo melhor o caminho que esta área de conhecimento
trilhou.
No ano de 1975 Goldberger escreveu o livro intitulado “Tongue thrust correction” e, em 1978, de
Roberta B. Pierce temos “Tongue Thrust – a look at oral myofunctional disorders”. Antes destes
livros, já em 1962, foi publicado na Califórnia por Larr, o livro “Tongue thrust and speech
correction”, que tratava dos problemas da fala correlacionados com a deglutição atípica.
Como podemos observar, quando a Fonoaudiologia iniciava no Brasil, nos Estados Unidos entre
1962 e 1978, já haviam sido publicados sete livros sobre o assunto deglutição. Como vimos
anteriormente, no Brasil o primeiro livro sobre o mesmo assunto é publicado somente em 1983 ; são
vinte e um anos de diferença entre o primeiro livro de deglutição escrito por um norte-americano e
o publicado no Brasil.
Observamos que quando os norte-americanos já estavam discutindo este assunto, os brasileiros, por
terem iniciado esta profissão mais tardiamente, ainda engatinhavam. As mesmas discussões que os
norte-americanos tiveram na década de 70 e 80, os brasileiros especialistas em MO começaram a ter
na década de 80 e 90, portanto com pelo menos dez anos de atraso. O interessante é que mesmo sem
conhecermos a literatura americana, ou mesmo ter tido acesso a ela anteriormente, observamos que
os problemas, as discussões e as soluções encontradas pelos fonoaudiólogos brasileiros são
praticamente as mesmas daquelas que os fonoaudiólogos norte-americanos encontraram.
O que também pudemos observar, e que do meu ponto de vista é muito interessante, é que tanto os
fonoaudiólogos norte-americanos como os brasileiros iniciaram seus estudos, suas questões e
soluções para o problema da deglutição praticamente quase 80 anos depois que os dentistas já
vinham discutindo este assunto, considerando que em 1884 Quinby, dentista inglês, criou um
método para a correção de hábitos viciosos (chupar dedo, língua, lábio, e outros), e Rogers, dentista
norte americano, em 1918 divulgou sua técnica de trabalho miofuncional para a solução dos
problemas miofuncionais orofaciais.
Buscando também por “miologia orofacial” (orofacial myology), encontrei entre 1966 a 1992, (26
anos) nove textos, o que dá uma média de 0,34 textos ao ano. De 1993 a 2005, em 12 anos, foram
encontrados dezenove textos com a média de 1,58 textos/ano. Estes números parecem nos apontar
para um interesse maior dos norte-americanos na busca por soluções para um velho problema.
(Tabela 1)
Por último busquei por “deglutição atípica” (tongue thrust). De 1966 a 1992 encontrei 91 artigos
com a média de 3,50 artigos/ano. De 1993 a 2005, foram encontrados 47 artigos, portanto, com a
média de 3,91/ano, novamente vemos que o interesse por este assunto aumentou um pouco nos
últimos anos. (Tabela 1)
Na somatória de todos os artigos encontrados, vimos que no período de 1966 a 1992, a média de
publicações por ano foi de 7,46 artigos/ano, e no período de 1993 a 2005, a média foi de 8,83
artigos/ano, mostrando que o interesse sobre este assunto continua e até aumentou um pouco,
conforme mostra a Tabela 1.
Nº. de Média anual Nº. de Média anual Nº. de Média anual Nº. total de Média total
artigos de artigos de artigos de artigos anual de
publicado publicações publicados publicações publicados publicações publicados publicações
1966 a 94 3,61 9 0,34 91 3,50 194 7,46
1992
(26 anos)
1993 a 40 3,33 19 1,58 47 3,91 106 8,83
2005
(12 anos)
Claro que poderíamos ter buscado estes dados em outras bases de dados, mas o MedLine sempre é
um bom indicador do que se está pesquisando no mundo.
Em seguida, procurei saber em quais países estes artigos estavam sendo publicados usando a
mesma base de dados, ou seja, o MedLine. Volto a dizer que este é apenas um indicador e que
minha sugestão é que outras bases de dados sejam consultadas para termos uma idéia mais exata
dos dados aqui apontados.
Também tem que ficar claro, que o fato da maioria dos artigos nesta área terem sido publicados nos
Estados Unidos, não quer dizer que todos os autores sejam norte-americanos. Muitos brasileiros, e
japoneses especialistas em MO, por exemplo, publicam em revistas americanas, principalmente no
“The International Journal of Orofacial Myology”, que é uma revista especializada na área de MO,
publicando principalmente artigos que discutem a relação dos trabalhos conjuntos realizados entre
fonoaudiólogos e dentistas, os quais mostram a inter-relação entre forma e função.
Buscando por “Miologia Orofacial” (Orofacial Myology), que é um termo usado basicamente nos
Estados Unidos, encontramos que tanto no período de 1966 a 1992, com nove artigos publicados,
como no período de 1993 a 2005, com dezenove artigos publicados, todos os 28 (100%) artigos
foram publicados nos Estados Unidos.
Para finalizar, gostaria de dizer que as bases da terapia miofuncional, parecem ser as mesmas desde
o início, quando os primeiros dentistas, há 150 anos atrás, se preocuparam com as funções
orofaciais, preconizando que quando uma função estivesse alterada, haveria interferências na
forma.
Praticamente em toda literatura pesquisada, o trabalho realizado pelos Fonoaudiólogos com relação
à terapia miofuncional e deglutição atípica, não diverge muito. A terapia quase sempre está
centrada na correção das alterações musculares orofaciais e na correção das funções orofaciais. O
que observei que varia um pouco, é que nos primórdios do trabalho miofuncional, de uma forma
geral, o que se fazia era muito centrado na reabilitação da função de deglutir. Atualmente, a terapia
para reabilitar a função de deglutir é menos valorizada, já que ao se trabalhar com as outras funções
orofaciais, respiração e mastigação, em geral, a deglutição se re-equilibra, não necessitando de um
trabalho tão específico ou tão longo com o ato em si de deglutir.
Outro dado interessante, é que os fonoaudiólogos que escreveram sobre a terapia com a deglutição
das décadas de 60, 70 e 80 já preconizavam que para a reeducação da deglutição, era necessário que
fossem solucionados os problemas oclusais, assim como fossem tratadas as alterações de outras
funções, como por exemplo, a respiração oral, uma vez que sem fechar a boca, é impossível manter
a língua bem posicionada. Isto nos mostra que, apesar do trabalho ser centrado na deglutição já se
sabia muito bem que outras alterações que impedissem a reabilitação da deglutição tinham que ser
tratadas anteriormente, principalmente as alterações oclusais.
Uma última diferença a ser comentada, é que os autores norte-americanos apresentam uma cultura
de trabalhar com programas bem definidos de terapia. Muitos criam propostas a partir de
modificações de trabalhos já existentes anteriormente. Tais programas tendem a ser rigorosamente
seguidos por seus adeptos, o que permite verificar a eficiência dos mesmos. No Brasil é menos
comum a existência de programas de terapia com tal tipo de estruturação. Normalmente, os
terapeutas seguem um pouco do que eles aprenderam durante a graduação, um pouco do que
viram em cursos ou do que leram nos livros de MO, tendendo a atuar de um modo empírico,
procurando sentir o que pode ser melhor para cada paciente. Porém, raramente existe um
programa pré-definido ou estruturado de intervenção e, embora encontremos algumas exceções,
estamos falando daquilo que tem sido mais comum.
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