Вы находитесь на странице: 1из 152

estrutura

AlgÉbrica
licenciatura em
matemática

Ministério da Educação - MEC


Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior
Universidade Aberta do Brasil
Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Ceará
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Universidade Aberta do Brasil
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
Diretoria de Educação a Distância

Licenciatura em matemática

Estruturas Algébricas

Ângelo Papa Neto

Fortaleza, CE
2011
Créditos
Presidente Marília Maia Moreira
Dilma Vana Rousseff Maria Luiza Maia
Ministro da Educação Saskia Natália Brígido
Fernando Haddad Equipe Arte, Criação e Produção Visual
Secretário da SEED Ábner Di Cavalcanti Medeiros
Carlos Eduardo Bielschowsky Benghson da Silveira Dantas
Davi Jucimon Monteiro
Diretor de Educação a Distância
Germano José Barros Pinheiro
Celso Costa
Gilvandenys Leite Sales Júnior
Reitor do IFCE José Albério Beserra
Celso Costa José Stelio Sampaio Bastos Neto
Pró-Reitor de Ensino Marco Augusto M. Oliveira Júnior
Gilmar Lopes Ribeiro Navar de Medeiros Mendonça e Nascimento
Diretora de EAD/IFCE e Roland Gabriel Nogueira Molina
Coordenadora UAB/IFCE Samuel da Silva Bezerra
Cassandra Ribeiro Joye Equipe Web
Vice-Coordenadora UAB Benghson da Silveira Dantas
Régia Talina Silva Araújo Fabrice Marc Joye
Luiz Bezerra de Andrade FIlho
Coordenador do Curso de
Lucas do Amaral Saboya
Tecnologia em Hotelaria
Ricardo Werlang
José Solon Sales e Silva
Samantha Onofre Lóssio
Coordenador do Curso de Tibério Bezerra Soares
Licenciatura em Matemática
Revisão Textual
Priscila Rodrigues de Alcântara Aurea Suely Zavam
Elaboração do conteúdo Nukácia Meyre Araújo de Almeida
Ângelo Papa Neto Revisão Web
Colaboradora Antônio Carlos Marques Júnior
Lívia Maria de Lima Santiago Débora Liberato Arruda Hissa
Equipe Pedagógica e Design Instrucional Saulo Garcia
Ana Claúdia Uchôa Araújo Logística
Andréa Maria Rocha Rodrigues Francisco Roberto Dias de Aguiar
Carla Anaíle Moreira de Oliveira Virgínia Ferreira Moreira
Cristiane Borges Braga Secretários
Eliana Moreira de Oliveira Breno Giovanni Silva Araújo
Gina Maria Porto de Aguiar Vieira Francisca Venâncio da Silva
Glória Monteiro Macedo
Auxiliar
Iraci Moraes Schmidlin
Ana Paula Gomes Correia
Irene Moura Silva
Bernardo Matias de Carvalho
Isabel Cristina Pereira da Costa
Isabella de Castro Britto
Jane Fontes Guedes
Maria Tatiana Gomes da Silva
Karine Nascimento Portela
Charlene Oliveira da Silveira
Lívia Maria de Lima Santiago
Wagner Souto Fernandes
Lourdes Losane Rocha de Sousa
Luciana Andrade Rodrigues
Maria Irene Silva de Moura
Maria Vanda Silvino da Silva
Catalogação na Fonte: Islânia Fernandes Araújo (CRB 3 – Nº 917)

P229e Neto, Ângelo Papa.


Estruturas Algébricas / Ângelo Papa Neto; Coordenação Cassandra
Ribeiro Joye. - Fortaleza: UAB/IFCE, 2011.
150p. : il. ; 27cm.

ISBN 978-85-63953-19-3

1. MATEMÁTICA. 2. ESTRUTURAS ALGÉBRICAS. 3. ÁLGEBRA


ABSTRATA - GRUPOS. I. Joye, Cassandra Ribeiro (Coord.). II. Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará – IFCE. III. Universi-
dade Aberta do Brasil – UAB. IV. Título.

CDD - 510
Apresentação 7
Referências 150
Currículo 151
SUMÁRIO
AULA 1 Grupos e subgrupos 8
Tópico 1 Definição de grupo e exemplos 9
Tópico 2 Subgrupos 15

AULA 2 Subgrupos normais e homomorfismos 24


Tópico 1 Subgrupos normais 25
Tópico 2 Homomorfismos de grupos 29

AULA 3 Anéis, subanéis e ideais 34


Tópico 1 Definição e exemplos 35
Tópico 2 Subanéis e ideais 41
Tópico 3 Ideais primos e maximais 46

AULA 4 Homomorfismo de anéis 51


Tópico 1 Definições e exemplos 52
Tópico 2 Anel quociente 58
Tópico 3 O teorema fundamental dos homorfismos de
anéis 63
AULA 5 Domínios fatoriais 70
Tópico 1 Domínos euclidianos, domínios de ideais principais e
domínios fatoriais 71
Tópico 2 O corpo de frações de um domínio 81

AULA 6 Polinômios 88
Tópico 1 Sequências quase nulas e polinômios 89
Tópico 2 Algoritmo da divisão para polinômios 97
Tópico 3 Polinômios com coeficientes em um domínio de
fatoração única 103

AULA 7 Introdução à teoria dos corpos 115


Tópico 1 Extensões de corpos 116
Tópico 2 Corpos finitos 124

AULA 8 Aplicações 130


Tópico 1 Construções com régua e compasso 131
Tópico 2 Códigos corretores de erros 137

6 Estruturas Algébricas
APRESENTAÇÃO
Olá aluno(a),

Ao contrário da Aritmética e da Geometria, que são áreas da Matemática que se caracterizam


pelo tipo de objeto estudado, a Álgebra é caracterizada pelos seus métodos. Os métodos,
em Álgebra, seguem a ideia básica de estudar os objetos não isoladamente, mas observando
a estrutura resultante da organização desses objetos em conjuntos com certas propriedades.
Por exemplo, do ponto de vista da Álgebra, um polinômio não deve ser visto como um objeto
isolado, mas antes como um elemento de um conjunto de polinômios onde os elementos
possam ser somados e também multiplicados, uma estrutura, chamada anel de polinômios.
Faz sentido, portanto, falarmos em soma e em produto de matrizes, de polinômios e de
funções, embora tais objetos não sejam números. Isso se dá porque tais objetos podem ser
organizados em conjuntos munidos de uma ou mais operações binárias, o que dá a cada um
desses conjuntos uma estrutura algébrica. Podemos, então, estudar tais estruturas de modo
abstrato, sem fazer referência à natureza dos elementos do conjunto, obtendo resultados que
valem em diferentes contextos. As estruturas algébricas mais básicas Grupos, Anéis e Corpos
são os objetos de estudo de nossas aulas.

Ângelo Papa Neto

APRESENTAÇÃO 7
AULA 1 Grupos e
subgrupos

Olá aluno (a),

Nesta aula iremos estudar a nossa primeira estrutura algébrica, que é estrutura
de grupo. Por serem os objetos matemáticos adequados para se quantificar a
noção de simetria, os grupos encontram aplicações na geometria (fundamentação
da geometria via grupos de transformações, grupos de Lie, ladrilhamentos), na
química (estrutura dos obitais atômicos, ligação química, estrutura cristalográfica
das moléculas), na física (mecânica quântica) e na biologia (estrutura icosaédrica dos
vírus). Trata-se, portanto, de uma noção matemática de fundamental importância.

Objetivos

• Conhecer a estrutura algébrica “grupo” e obter suas propriedades básicas


• Reconhecer a importância da noção de grupo, exibindo vários exemplos
• Conhecer as noções de subgrupo, subgrupo gerado por um conjunto e
grupo cíclico

8 Estruturas Algébricas
TÓPICO 1 Definição de grupo e
exemplos
O bjetivos
• Estender a noção de grupo
• Estudar alguns exemplos importantes

N esse primeiro tópico, vamos apresentar a definição de grupo,


uma série de exemplos de grupos e vamos ilustrar, também com
exemplos, o papel dos grupos no estudo da simetria de objetos.
Um grupo é um conjunto com uma operação binária que satisfaz três
condições básicas (associatividade, existência de um elemento neutro e existência
de inversos). Apresentaremos uma série de exemplos de grupos, ilustrando sua
importância e ubiquidade na Matemática.
Um conjunto G , onde está definida uma operação binária  : G´G ® G tal
que
1. a  (b  c)= (a  b)  c , quaisquer que sejam a, b, c Î G ,
2. Existe eÎ G tal que a  e= e a = a , para todo a Î G ,
3. Dado a Î G , existe b Î G tal que a  b = b  a = e , é chamado grupo. Se,
além disso, vale a condição: Se vale apenas a condição 1, dizemos que G é um
semigrupo. Se valem apenas as condições 1 e 2, dizemos que G é um monóide.
4. Dados a, b Î G , a  b = b  a , dizemos que o grupo é abeliano.
O elemento eÎ G , cuja existência é garantida pelo item 2 da definição, é
único. De fato, se e¢ Î G também satisfaz a condição 2, temos e¢ = e¢  e= e . Da
mesma forma, para cada a Î G , o elemento b Î G , cuja existência é garantida pelo
item 3, é único. Isso pode ser verificado do seguinte modo: se b¢ Î G também satisfaz
3, isto é, se a  b¢ = b¢  a = e, então b = e b = (b¢  a)  b = b¢  (a  b) = b¢  e= b¢ .
Esse elemento b Î G é chamado inverso de a e denotado por b = a-1 .

AULA 1 TÓPICO 1 9
É importante observarmos que a inversão
de um produto inverte também a ordem dos
fatores. Mais precisamente, (ab)-1 = b-1a-1 .
De fato, se c = (ab)-1 , então (ab)c = e. at e n ç ão!
-1
Multiplicando por a à esquerda, obtemos
Por uma questão de simplicidade da notação,
bc = a . Multiplicando por b-1 à esquerda,
-1
costumamos escrever, sempre que não haja perigo
obtemos c = b-1a-1 . A mesma identidade vale de confusão, a operação a  b simplesmente
para o produto de um número finito de elementos como ab , omitindo o símbolo que indica a
(veja o exercício 6). No caso em que G é abeliano, operação. É costume, também, chamarmos ab de
-1 -1 -1
podemos, é claro, escrever (ab) = a b , pois “produto” dos elementos a e b .
o produto é, nesse caso, comutativo.

Exemplos:
Verifique que são válidas as condições da definição de grupo nos seguintes
exemplos.
1. Se K é um corpo, então (K, +) e (K * ,×) são grupos abelianos, onde
K * = K -{ 0} .
*
2. Se Zn = { 0,1, n- 1} e Zn* = { a Î Zn | (a, n)= 1} , então (Zn , +) e (Zn ,×)
são grupos abelianos.
3. Se V é um espaço vetorial, então V com a soma de vetores é um grupo
abeliano.
4. Seja X um conjunto e S(X) = { f : X ® X| f ébijetivo} . Então S(X) , com
a operação  (composição de funções) é um grupo, não necessariamente abeliano.

O exemplo 4 é especialmente importante, tanto que reservamos ao grupo


S(X) um nome especial. Ele é chamado grupo de simetrias de X , ou ainda,
grupo das permutações de X . Temos dois casos particulares de maior interesse:

Caso particular 1: se X = { 1,, n} , então S(X) é denotado por Sn e chamado


grupo simétrico. Cada f Î Sn age sobre o conjunto X = { 1,, n} permutando seus
elementos e é por isso que chamamos f Î Sn de permutação. Da combinatória,
sabemos que o número de permutações de n elementos é n! . Assim Sn tem n!
elementos. Uma função f Î Sn é geralmente denotada do seguinte modo:

æ 1 2  n ö÷
f = çç ÷.
èç f (1) f (2)  f (n)ø÷÷

10 Estruturas Algébricas
Por exemplo, se X = { 1,2,3,4} , então alguns elementos de S4 são

æ1 2 3 4ö÷ æ1 2 3 4ö÷
I = çç ÷÷ , s = çç ÷,
çè1 2 3 4ø÷ çè2 3 4 1ø÷÷

æ1 2 3 4ö÷ 3 æ1 2 3 4÷ö
s 2 = çç ÷ , s = çç ÷,
çè3 4 1 2÷÷ø çè4 1 2 3÷÷ø

4
(note que s = I )

æ1 2 3 4ö÷
t = çç ÷.
çè1 4 3 2ø÷÷

Note que t 2 = I . Devemos observar ainda que

æ1 2 3 4÷ö æ1 2 3 4ö÷
st = çç ÷ × çç ÷=
çè2 3 4 1÷÷ø èç1 4 3 2ø÷÷

æ1 2 3 4ö÷
= çç ÷,
èç2 1 4 3ø÷÷

onde escrevemos, por simplicidade, st em vez de s  t , e o “produto” das


permutações é, na verdade, uma composição de funções. Observemos que

æ1 2 3 4ö÷
ts = çç ÷ ¹ st
èç4 3 2 1ø÷÷

o que mostra que Sn não é abeliano.


2 3
Uma vez que s 4 = I , o subconjunto s = { I , s , s , s } é também um grupo
com a mesma operação de S4 . Pelo mesmo motivo, t = { I , t } também é um grupo.
Outro exemplo muito importante de grupo de simetrias é o seguinte:

Caso particular 2: seja Triângulo escaleno Triângulo isósceles Triângulo equilátero

(ou, mais geralmente, um espaço vetorial


V de dimensão n sobre R). Vamos considerar as funções lineares de Rn em Rn ,
chamadas operadores lineares. Denotamos:
GLn (R)= { T : Rn ® Rn | T é linear einvert ível } .
Isso significa que T Î GLn (R) pode ser escrita como

AULA 1 TÓPICO 1 11
æ öæ ö
çça11  a1n ÷÷ çç x1 ÷÷
T (x1 ,, xn )= çç   ÷÷÷ × çç  ÷÷÷ ,
çç ÷÷ çç ÷÷
èçan1  ann ø÷ çèxn ÷ø
at e n ç ão!
onde A = (aij ) é uma matriz n´ n invertível. O
conjunto GLn (R) , com a operação de composição A notação GL significa general linear, que em
português quer dizer linear geral.
de funções, é um grupo, chamado grupo
linear geral. Como a composição de funções
corresponde ao produto de matrizes, o grupo GLn (R) “pode ser visto como” um
grupo de matrizes, isto é
GLn (R) @ { A Î M n (R)| det A ¹ 0} ,
onde a frase entre aspas acima e o símbolo @ significam isomorfismo, isto é,
embora a natureza dos elementos sejam diferentes (funções em um caso e matrizes
no outro), a estrutura de grupo é a mesma nos dois casos. A noção de isomorfismo
será definida de modo preciso no tópico 2 da próxima aula.
Dados n grupos G1 ,,Gn , com operações 1 ,,  n , respectivamente, o
produto cartesiano
G1 ´´Gn = { (x1 ,, xn )| xi Î Gi }
é um grupo, com operação dada por
(x1 ,, xn )  ( y1,, yn )= (x1 1 y1 ,, xn  n yn ).

A principal característica de um grupo é sua capacidade de medir o


quão simétrico um determinado objeto é. Vamos ilustrar essa afirmação com
mais um exemplo.

Exemplo: Considere três triângulos, um escaleno, um isósceles e um


equilátero. Qual desses três triângulos é o mais simétrico?

Triângulo escaleno Triângulo isósceles Triângulo equilátero


Figura 1: Triângulos

12 Estruturas Algébricas
Se você respondeu “triângulo equilátero”, acertou! Não é difícil perceber
que, de fato, o triângulo equilátero é mais simétrico do que o triângulo isósceles
e que o triângulo escaleno é o menos simétrico dos três. Mas como você percebeu
isso? Que critérios você usou para decidir qual dos três é o mais simétrico ou o
menos simétrico? A questão que se põe é a seguinte: é possível captar essa impressão
intuitiva de modo matematicamente preciso? Ou seja, é possível quantificar, medir,
a noção de simetria? A resposta é sim, e os objetos adequados para se fazer essa
medição são exatamente os grupos.
Mais precisamente, vamos associar a cada um desses triângulos um grupo, de
modo que o número de elementos do grupo meça a simetria do triângulo. Para isso,
considere um subconjunto T do plano cartesiano R2 . Uma função f : R2 ® R2
é chamada simetria de T , se é uma bijeção e f (P) Î T se, e somente se, P Î T .
A restrição de f a T é uma função f : T ® T que permuta os pontos de T .
O conjunto S(T ) , formado pelas simetrias de T , é um grupo com a operação
composição de funções.
A seguir, vamos encontrar S(T ) para cada um dos três triângulos da Figura
1. Comecemos com o triângulo equilátero. Uma rotação de 120º, no sentido anti-
horário, em torno do baricentro do triângulo equilátero da figura acima, leva esse
triângulo equilátero nele mesmo, permutando seus pontos. Leva, por exemplo, o
vértice 1 no vértice 2, o vértice 2 no vértice 3 e o vértice 3 no vértice 1. Assim,
essa rotação induz uma permutação dos vértices do triângulo, que indicamos
æ1 2 3ö÷
(veja o exemplo 4, caso particular 1) por: s = çç ÷. De modo análogo, a
ç2 3 1ø÷÷
è
æ1 2 3ö÷
permutação t = ççç ÷ está associada à reflexão em torno da reta que contém
è1 3 2ø÷÷
a altura do triângulo equilátero. Afirmamos que, se TE é um triângulo eqüilátero,
então S(TE ) = {1, s , s 2 , t , st , s 2t } , onde s e
t são as permutações acima definidas e 1 é a
s aiba mais ! permutação identidade, que deixa cada vértice,
logo todo o triângulo, fixado. O grupo S(TE ) é
O Grupo Diedro Dn é o grupo de simetria de n
um caso particular de grupo diedral (para outros
lados do polígono regular de n> 1 . A ordem
exemplos de grupos diedrais, veja os exercícios
grupo Dn é de 2n. Consulte o site <http://
de aprofundamento 5 e 6).
translate.google.com.br/translate?hl=pt-
Se TI é um triângulo isósceles, uma rotação
BR&langpair=en|pt&u=http://mathworld.
wolfram.com/DihedralGroup.html>
não é uma simetria de TI . Assim, nesse caso,
S(TI ) = {1, t } , onde t é a reflexão em torno da
altura relativa à base do triângulo isósceles.

AULA 1 TÓPICO 1 13
Finalmente, se TS é um triângulo escaleno, a única simetria é a trivial, ou
seja, S(TI ) = {1} . Portanto, os triângulos equilátero, isósceles e escaleno têm,
respectivamente, grupos de simetrias com 6, 2 e 1 elementos. Dessa forma, inferimos
desse exemplo o seguinte princípio: quanto maior o número de elementos do grupo
S(T ) de uma figura T , mais simétrica ela é.
Com isso, encerramos nosso primeiro tópico, que tratou da definição e de
exemplos iniciais de grupos. No próximo tópico, veremos que certos subconjuntos
dos grupos também são grupos, chamados subgrupos.

14 Estruturas Algébricas
TÓPICO 2 Subgrupos
O bjetivos
• Definir e caracterizar a noção de subgrupo
• Definir e caracterizar subgrupo gerado por um conjunto
• Definir grupo cíclico
• Conhecer o teorema de Lagrange

s aiba mais !
Reveja o conteúdo de subespaço vetorial no
V amos, agora, estudar
subconjuntos não-vazios de
um grupo que, com a mesma
operação do grupo, também são grupos.
Chamamos tais subconjuntos de subgrupos.
os

tópico 2 da aula 2 da disciplina de Álgebra Linear


Essa noção é análoga à de subespaço vetorial na
do seu curso.
álgebra linear e nos fornece um modo de obter
novos grupos a partir de grupos dados.
Se G é um grupo e S é um subconjunto de G , não vazio, que é um grupo
com a mesma operação de G , dizemos que S é um subgrupo de G .
O próprio grupo G é um subgrupo dele mesmo. Se eÎ G é o elemento neutro
de G , então { e} também é subgrupo de G . Esses dois subgrupos são chamados
subgrupos triviais de G . Qualquer subgrupo de G diferente de G e { e} é chamado
subgrupo próprio de G .

Lema 1 Um subconjunto S de um grupo G é um subgrupo se e somente se valem


as seguintes condições:
1. S¹ Æ ,
2. Se a, b Î S , então ab-1 Î S .

AULA 1 TÓPICO 2 15
Demonstração:
Se S é subgrupo, então S¹ Æ e, dado b Î S , temos b-1 Î S , o que decorre
da condição 3 da definição de grupo. Logo, dados a, b Î S (não necessariamente
distintos), temos ab-1 Î S .

Reciprocamente, se S¹ Æ , então a condição 1 nos diz que existe a Î S .


Se 1Î G denota o elemento neutro de G então, pela condição 2, 1= aa-1 Î S . Se
b Î S , então b-1 = 1× b-1 Î S , novamente pela condição 2. Finalmente, se a e b
pertencem a S , então ab = a(b-1 )-1 Î S . Sendo assim, S é fechado para a operação
de G e também para a inversão, isto é, o inverso de um elemento de S está em
S. Dessa forma, as condições para que S seja um grupo são satisfeitas, logo S é
subgrupo de G .

EXEMPLOS:
1. Com a mesma notação do exemplo 4 do tópico 1 (caso particular 1),
temos que s = { I , s , s 2 , s 3 } e t = { I , t } são subgrupos de S4 . Temos ainda
que s , t = { I , s , s 2 , s 3 , t , st , s 2t , s 3t } também é subgrupo de S4 . Exercício:
verifique todas essas afirmações.
2. Repetindo ainda as notações
estabelecidas na seção 1, temos que
SLn (R) = {A Î M n (R)| det A = 1} é
subgrupo de GLn (R) . Para verificar isso,
usamos o Lema 1 da seguinte forma: se I at e n ç ão!
é a matriz identidade n´ n , então det I = 1 , A notação SL significa “special linear”, que, em
logo SLn (R) ¹ Æ , ou seja, vale a condição inglês, quer dizer linear especial.
1 do Lema 1. Se A, B Î SLn (R) , então
det(AB-1 ) = det(A )det(B-1 ) = det(A )det(B)-1 = 1× 1 = 1
logo AB-1 Î SLn (R) e vale a condição 2 do Lema 1. Isso mostra que SLn (R) é
subgrupo de GLn (R) .

Notação: se S é subgrupo de G , denotamos S£ G .

A interseção de subgrupos é um subgrupo. Essa afirmação tem verificação


imediata usando-se o Lema 1 e a deixamos para você, aluno(a).
Dado um subconjunto Y Ì G , o menor subgrupo de G (em relação à
inclusão) que contém o subconjunto Y é
Y = S
YÌS

16 Estruturas Algébricas
onde a interseção é tomada sobre todos os
subgrupos de G que contêm Y . Chamamos esse
atenção! subgrupo de subgrupo gerado por Y . Estamos
particularmente interessados no caso em que Y
No caso em que o grupo G não é abeliano, temos
é finito e G é abeliano. Nesse caso é possível obter
Y = {x1 xn | n Î N exi Î Y ou xi -1 Î Y} ,
um descrição mais precisa de Y , dada pelo
ou seja, SG = GS é o conjunto dos produtos
finitos de elementos que pertencem a Y ou cujo próximo lema. Antes, é conveniente estabelecer
inverso pertence a Y . a seguinte notação: se G é um grupo, y Î G e
a Î Z , então
ìï y y se a > 0
ïï
y =í
a ï 1 se a = 0
ïï -1 -1
ïïî y  y se a < 0
onde os “produtos”’ acima são a operação do grupo G repetida | a | vezes.

Lema 2: Se Y = { y1,, yn } é subconjunto de um grupo abeliano G , então


a a
Y = { y1 1  yn n | ai Î Z} .
Neste caso, dizemos que Y é abeliano finitamente gerado e denotamos
Y = y1 ,, yn .

Demonstração:
Por definição, Y é a interseção de todos
atenção! os subgrupos de G que contêm Y . Chamemos
a a
Se Y é infinito, então Y = { , ou seja, Y de S o conjunto { y1 1  yn n | ai Î Z} . Queremos
é o conjunto dos produtos finitos de potências mostrar que S= Y . Primeiro, mostremos que
inteiras de elementos de Y . S é um subgrupo de G . Temos que S¹ Æ ,
pois yi Î S , para cada i Î { 1,, n} . Se
a1 an
a= y y1 n
b1
e b= y  y
1
bn
n são elementos de
a1-b1 an -bn
S, então ab-1 = y 1 yn Î S . Pelo Lema 1, S£ G . Como Y Ì S , temos que
S G . Por outro lado, se S¢ é um subgrupo de G tal que y1 ,, yn Î S¢ , então
a a
y1 1  yn n Î S¢ , para quaisquer a1 ,, an Î Z , logo SÌ S¢ . Consequentemente, S
está contido na interseção de todos os S¢ , isto é, G¢ . Isso conclui a demonstração.

Um subgrupo S£ G é chamado cíclico se S= y , isto é, se S é


gerado por um único elemento y . Neste caso, S tem o seguinte aspecto:

AULA 1 TÓPICO 2 17
S = y = {1, y, y2 ,, ym-1 } , onde 1Î G é o elemento neutro do grupo e mÎ N é
o menor número natural tal que ym = 1 .
Se G é um grupo com um número finito de elementos, dizemos que G é um
grupo finito. O número de elementos de G é chamado ordem de G e é denotado
por | G| ou # (G) . Caso o número de elementos de G seja infinito, dizemos que G
é um grupo infinito. As mesmas nomenclaturas valem para subgrupos. Note-se
que um grupo infinito pode ter subgrupos finitos.

EXEMPLOS:
1. O grupo (C* ,×) é infinito, mas o
2pi
subgrupo Rn = { 1, w , w 2 ,, w n-1} , onde w = e n ,
é finito e cíclico (verifique que Rn é, de fato, um sa iba m a is!
*
subgrupo de C ).
Felix Klein é mais conhecido por seu trabalho
2. (Z, +) é um grupo cíclico infinito. Como
em geometria não-euclidiana, por seu trabalho
veremos mais adiante, esse é, essencialmente,
sobre as conexões entre a geometria e teoria de
o único grupo cíclico infinito (isto é, qualquer
grupo e para os resultados em teoria de função.
grupo cíclico infinito é “isomorfo” ao grupo
Mais informações: http://www.learn-math.info/
aditivo Z ). portugal/historyDetail.htm?id=Klein
3. O grupo Z 4 = {0,1,2,3} , com a operação
soma módulo 4, é cíclico de ordem 4.
4. O grupo Z2 ´ Z2 , com operação (a, b) + (c, d)= (a + c, b + d) , tem ordem
quatro e não é cíclico. Ele é chamado Vierergruppe, ou grupo de Klein.

Dado um grupo finito G e fixado um subgrupo S£ G , dizemos que dois


elementos a, b Î G são equivalentes (em relação a S), e indicamos a º b , se
a-1b Î S. A relação º satisfaz
1. a º a , para todo a Î G .
2. Se a, b Î G e a º b , então b º a .
3. Se a, b, c Î G , a º b e b º c , então a º c .

Isso significa que º é uma relação de equivalência. Como Sé subgrupo,


-1
temos que 1Î S , logo a-1a = 1Î S , o que significa a º a . Se a º b então a b Î S.
Como S é subgrupo de G , a-1b Î S implica que b-1a = (a-1b)-1 Î S , logo b º a .
Finalmente, se a º b e b º c , então a-1b Î S e b-1c Î S, logo

18 Estruturas Algébricas
a-1c = (a-1b)(b-1c) Î S
pois S£ G . Assim, a º c .
As classes de equivalência relativas a º são
-1
a = { x Î G| a º x} = { x Î G| a x Î S} .
Se aS denota o subconjunto { ay | y Î S} , então a-1x Î S é equivalente a
x Î aS . Dessa forma, temos a = aS, ou seja, as classes laterais relativas a º são
exatamente os subconjuntos do tipo aS, com a Î G . Chamamos esses subconjuntos
de classes laterais de S à esquerda em G . Sobre as classes laterais temos dois
fatos relevantes:

1. aS= bS se e somente se a º b .
2. G é a união de todas as classes laterais de S.
De fato, a º b é equivalente a a-1b Î S, isto é, b Î aS . Como a º b implica
b º a , temos também a Î bS , logo aS= bS (por quê?). Reciprocamente, aS= bS
implica que ax = by , com x, y Î S , logo a-1b = xy-1 Î S , pois S é subgrupo.
Portanto, a º b .
Para a afirmação 2, basta notar que, dado a Î G , a = a × 1Î aS .

Importante: Note que todo cuidado foi tomado ao operar com elementos
de G , considerando o fato de a operação dada não ser necessariamente comutativa.
Existe outra relação de equivalência em G dada por
a º b Û ab-1 Î S.

Para uma relação dada desse modo, as classes de equivalência que surgem
são do tipo Sa , com a Î G . São por isso chamadas de classes laterais de S à
direita em G .
Vamos denotar por SG o conjunto formado pelas classes laterais de S à
esquerda em G e GS o conjunto formado pelas classes laterais de S à direita em
G . Observemos que esses conjuntos não são necessariamente iguais. Mais adiante,
introduziremos uma restrição sobre S de modo a que esses conjuntos coincidam.
Apesar de não serem iguais, os conjuntos SG e GS têm a mesma cardinalidade,
isto é, vale o resultado abaixo:

AULA 1 TÓPICO 2 19
Lema 3 Existe uma função bijetiva entre SG e GS , dada por aS  Sa-1 , para
todo a Î G .

Demonstração:
Essa função está bem definida, pois, se aS= bS, então a-1b Î S, logo
a-1 Î Sb-1 e Sa-1 = Sb-1 . A sobrejetividade dessa função é clara. Quanto à
injetividade, se aS e bS têm a mesma imagem, então Sa-1 = Sb-1 , logo a-1b Î S,
donde b Î aS e bS= aS.

Em particular, se SG é finito, então GS também é finito e ambos têm o


mesmo número de elementos. Esse número de elementos é chamado de índice de
S em G e denotado por (G : S) . Quando SG (e, consequentemente, GS ) é infinito,
dizemos que o subgrupo S tem índice infinito em G e denotamos (G : S)= ¥ .
Um grupo G pode ser infinito, com um subgrupo S£ G também infinito,
mas com (G : S) finito:

EXEMPLO:
Se G = R* , com o produto de números reais e S= R2 é o subgrupo formado
*
pelos quadrados dos elementos de R , então ambos são infinitos, mas (R* : R2 )= 2 .
De fato, dado um número real não nulo x , temos x > 0 ou x < 0 . No primeiro
caso, x Î R2 e no segundo caso -x Î R2 . Logo, R2 tem apenas duas classes laterais
*
em R .

Chegamos ao nosso teorema importante:

Teorema 4 (Lagrange): Se G é um subgrupo finito, então a ordem de um subgrupo


de G divide a ordem de G .

Demonstração:
Seja | G| = n e | S| = d . Podemos escrever G = a1SÈ  È amS onde duas
classes laterais ai S e aj S são disjuntas, isto é, se i ¹ j , então ai SÇ aj S= Æ . Além
disso, a função S ® ai S , dada por s  ai s , é bijetiva, logo | ai S| =| S| , para todo
i Î { 1,, m} .

20 Estruturas Algébricas
Assim, a união acima é uma divisão de um conjunto com n elementos em
m partes iguais de d elementos. Logo n = m × d o que implica que d divide n .

Exemplo:
Como aplicação do Teorema de Lagrange, vamos mostrar que, se um grupo
tem um número primo de elementos, então seus únicos subgrupos são os triviais.
De fato, seja G um grupo com | G| = p , onde p é um número primo. Se Sé um
subgrupo de G com | S| = d , pelo Teorema de Lagrange, d é um divisor de p .
Como p é primo, só admite como divisores 1 ou p . Assim, d = 1 ou d = p . Se
d = 1 , então S = { e} e, se d = p , então S = G , pois, nesse caso, S possui o mesmo
número de elementos de G . Portanto, G possui apenas subgrupos triviais.
Nesse segundo tópico, vimos como identificar os subconjuntos de um
grupo que também são grupos, com a mesma operação do grupo, e chamamos tais
subconjuntos de subgrupos. Vimos ainda o importante Teorema de Lagrange, que
fornece uma relação de divisibilidade entre as ordens do grupo e de seus subgrupos.
Encerramos, assim, nossa primeira aula. Na próxima aula, continuaremos o
estudo de grupos, mostrando como construir grupos a partir de um grupo e um
subgrupo dado. Veremos que essa construção só é possível quando o subgrupo é de
um tipo especial, chamado subgrupo normal.

ATIVIDADES D E A PR O FUN DA M E N T O
1. Determine quais das seguintes operações são associativas:
(a) A operação  sobre Z definida por a  b = a - b .
(b) A operação  sobre R definida por a  b = a + b + ab .
a+ b
(c) A operação  sobre Q definida por a  b = .
5
(d) A operação  sobre Z ´ Z definida por (a, b)  (c, d)= (ad + bc, bd) .
a
(e) A operação  sobre Q-{ 0} definida por a  b = .
b
2. Se S £ G, mostre que a classe lateral aS é um subgrupo de G se, e somente se, a = 1 , o elemento neutro
da operação de G .

AULA 1 TÓPICO 2 21
3. Dado um grupo G , mostre que, se a2 = a , para todo a Î G , então G é abeliano.

4. Um grupo de ordem 8 pode conter um subgrupo de ordem 6 ? Por quê?

5. Seja G um grupo cuja ordem é um número primo. Mostre que esse grupo é cíclico.

6. Seja G = { x Î R| 0 £ x < 1} . Para x, y Î G , defina


x  y = x + y - ëx + yû
onde, para cada a Î R , ëaû é o maior inteiro que não supera a . Mostre que x  y é uma operação
binária bem definida sobre G e que (G, ) é um grupo abeliano, denominado grupo dos reais módulo 1.

7. Consideremos o conjunto A das matrizes 2´ 2 com entradas reais. Recordemos que a multiplicação
de matrizes é dada por
æa bö÷ æx y÷ö æax + bz ay + bwö÷
çç ÷× ç ÷= ç ÷.
çè c d÷÷ø ççèz w÷÷ø ççè cx + dz cy + dw ÷÷ø
æ1 1÷ö
Consideremos M = çç ÷ e seja
çè0 1÷÷ø
C = { X Î A | XM = MX} .
(a) Determine quais dos seguintes elementos de A estão em C :
æ1 1ö÷ æ1 1ö÷ æ0 0÷ö æ1 1÷ö æ1 0÷ö æ0 1÷ö
çç ÷ ,çç ÷ , çç ÷ ,çç ÷ ,çç ÷ ,çç ÷.
çè0 1ø÷÷ çè1 1ø÷÷ çè0 0÷÷ø çè1 0÷÷ø çè0 1÷÷ø çè1 0÷÷ø
(b) Prove que, se A, B Î C , então A + B Î C , onde + denota a soma usual de matrizes.
(c) Prove que, se A, B Î C , então A × B Î C , onde × denota o produto usual de matrizes.
æ p qö÷
(d) Encontre condições sobre p, q, r , s Î R que determinem precisamente quando çç ÷ Î C.
èç r sø÷÷

8. Seja G = { a + b 3| a, b Î Q} .
(a) Mostre que (G, +) é um grupo.
(b) Mostre que (G´ ,×) é um grupo.

9. Demonstre (por indução sobre n ) que, se G é um grupo,


(a1a2 an )-1 = an-1an--11 a2-1a1-1,
para quaisquer a1 , a2 ,, an Î G.

10. Se D6 = { 1, a, a2 , b, ab, a2b} é o grupo diedral com 6 elementos (ou seja, o grupo de simetrias de
um triângulo equilátero), verifique que D6 @ S3 (são isomorfos).

11. Se D8 = { 1, a, a2 , a3 , b, ab, a2b, a3b} é o grupo diedral de ordem 8 , isto é, o grupo de simetrias de
um quadrado, mostre que D8 £ S4 , mas D8 ¹ S4 .

22 Estruturas Algébricas
12. Seja p > 2 um inteiro primo. O conjunto Z´p = {1,2,, p - 1} , munido do produto de classes, é
um grupo abeliano.
(a) Verifique que | Zp | = p - 1. Como p ¹ 2 , a ordem de
´
Zp é par.
´ ´
(b) Como Z p
é um grupo, qualquer elemento de Z
p
possui um inverso. Determine o inverso
de p- 1.
(c) Mostre que o único elemento de Z´p , diferente de 1, que é igual ao seu inverso é p- 1.
( Sugestão: supondo que ( p - i ) × ( p - i )= 1, verifique que i = 1.)
(d) Mostre que 1× 2× 3 p - 1= p - 1 .
(e) Usando os ítens anteriores, demonstre o Teorema de Wilson: se p é um número primo, então
( p - 1)! º -1(mod p) . (Note que o caso p = 2 é trivial.)
13. Mostre que as seguintes matrizes, com coeficientes em C , formam um grupo não abeliano G de
ordem 8 com o produto usual de matrizes:

æ1 0ö÷ çæ -1 0 ÷ö æ 0 1ö÷ æç 0 -1ö÷


÷÷ ,
çç ÷ , ç ÷÷ , çç ÷÷ , çç
çè0 1÷ø÷ ççè 0 - -1÷÷ø èç-1 0ø÷ èç -1 0 ø÷÷
æ-1 0 ö÷ çæ- -1 0 ÷ö æ0 -1÷ö æç 0 - -1ö÷
÷÷ .
çç ÷÷ , çç ÷÷ , çç ÷÷ , çç
èç 0 -1ø÷ çè 0 -1÷÷ø çè1 0 ÷ø çè- -1 0 ÷ø÷
æ1 0÷ö æ -1 0 ÷ö æ 0 -1ö÷
Se e= çç ÷÷ , a = ççç ÷÷ e b = ççç ÷÷ , mostre que a4 = e ,
çè0 1÷ø çè 0 - -1÷÷ø èç -1 0 ø÷÷

b2 = a2 e b-1ab = a3 . Este grupo é conhecido como grupo dos quatérnios e denotado por Q8 . Verifique
ainda que podemos escrever
Q8 = { e,-e, a,-a, b,-b, ab,-ab} .
Conclua que a e b geram Q8 .

AULA 1 TÓPICO 2 23
AULA 2 Subgrupos normais
e homomorfismos

Olá aluno(a),

Em nossa segunda aula, estudaremos tipos especiais de subgrupos: os subgrupos


normais. Veremos que esse tipo de subgrupo nos permite construir novos grupos
formados por classes laterais, chamados grupos quocientes. Estudaremos,
também, as funções de um grupo em outro que preservam a operação de grupo,
que chamaremos de homomorfismos. Obteremos, enfim, o teorema básico que
rege o comportamento dos homomorfimos de grupos.

Objetivos

• Definir e caracterizar entre os subgrupos aqueles que são normais


• Definir grupo quociente
• Estudar os homomorfismos entre grupos
• Obter o teorema do isomorfismo para grupos

24 Estruturas Algébricas
TÓPICO 1 Subgrupos normais
O bjetivos
• Definir e caracterizar subgrupos normais
• Definir grupo quociente

N a aula anterior, vimos que, dado um grupo G e um subgrupo


S£ G , os conjuntos formados pelas classes laterais à esquerda e
à direita, respectivamente, SG e GS , têm a mesma cardinalidade,
mas não são necessariamente iguais. Isso se deve ao fato de G não ser, em geral,
abeliano. Nosso objetivo, a seguir, é definir um tipo especial de subgrupo S£ G
para o qual tenhamos SG = GS , mesmo quando G não é abeliano.
Um subgrupo S de um grupo G é chamado subgrupo normal se vale uma
das (logo, valem todas as) condições do seguinte lema:

Lema1 Se G é um grupo e S£ G , então são equivalentes:


1. aSa-1 Ì S , para todo a Î G .
2. aSa-1 = S , para todo a Î G .
3. aS= Sa , para todo a Î G .
4. SG = GS .

AULA 2 TÓPICO 1 25
Demonstração:
Suponha que vale 1. Então aSa-1 Ì S ,
para todo a Î G . Substituindo a por a-1 ,
obtemos at e n ç ão!
-1 - 1 -1
a S(a ) Ì S.
Se um grupo G é abeliano, então todo subgrupo
Como (a-1 )-1 = a , temos a-1Sa Ì S .
de G é normal. Para verificarmos isso, basta
Multiplicando por a à esquerda e por a-1 à
observarmos o item 3 do Lema 1.
direita, obtemos
SÌ aSa-1 ,

donde aSa-1 = S , ou seja, vale 2.


Se vale 2, isto é, se aSa-1 = S , então, multiplicando à direita por a , obtemos
aS= Sa . Logo vale 3.
Se vale 3, então toda classe lateral à esquerda é uma classe lateral à direita e
vice-versa. Assim, SG = GS , isto é, vale 4.
Finalmente, suponha que vale 4. Se a Î G , então aSÎS G = GS , ou seja,
existe b Î G tal que aS= Sb . Logo,
aSa-1 = (aS)a-1 = (Sb)a-1 = S(ba-1 ).
Como a Î aS= Sb , existe x Î S tal que a = xb e daí, ba-1 = x-1 Î S .
Portanto, aSa-1 = S(ba-1 ) Ì S , o que mostra a validade de 1.
Notação: Usamos a notação S G para indicar que S é subgrupo normal
de G .
A propriedade mais importante de um subgrupo normal é descrita no lema
a seguir.

Lema2: Se G é um grupo e S G , então SG = GS é um grupo, com operação entre


classes definida do seguinte modo:
aS× bS= (ab)S.
Além disso, se G é abeliano, então GS é abeliano.

Demonstração:
Primeiro, vamos mostrar que a operação dada acima está bem definida. Para
isso, suponhamos que aS= a1S e bS= b1S . Então aa1-1 Î S e bb1-1 Î S . Logo,

ab(a1b1 )-1 = ab(b1-1a1-1 )= a(bb1-1 )a1-1 Î aSa1-1.

26 Estruturas Algébricas
Agora, como S G ,
S  
Ì ÎS 
-1 -1 -1
aSa = aSa (aa ) Ì S.
1 1

Portanto, ab(a1b1 )-1 Î S , ou seja, (ab)S= (a1b1 )S. Isso mostra que a operação
definida em GS não depende da escolha dos representantes de cada uma das classes.
Vamos mostrar, agora, que GS , com a operação acima definida, é um grupo.
1. A operação é associativa: de fato, se aS, bS, cSÎ GS , então
aS× (bS× cS)= aS× (bc)S= [a(bc)]S= [(ab)c]S=
= (ab)S× cS= (aS× bS) × cS.
2. A operação possui um elemento neutro: a classe S, cujo representante
é 1 (o elemento neutro de G ) ou qualquer outro elemento de S. Basta notar que
aS× S= S× aS= aS,
pela definição de produto de classes.
3. Existe um inverso de cada classe: se aSÎ GS , então (aS)-1 = a-1S , pois
aS× a-1S= aa-1S= S
e S é o elemento neutro de GS .
Finalmente, temos G abeliano se e somente se ab = ba , quaisquer que sejam
a, b Î G . Logo
aS× bS= (ab)S= (ba)S= bS× aS
e GS é abeliano. A recíproca demonstra-se de modo análogo.
Complementando o resultado acima, temos o seguinte:
Se S G , grupo GS é chamado grupo quociente de G por S e denotado
por G / S. Assim, os subgrupos normais exercem na teoria de grupos um papel
especial, pois são os subgrupos que fornecem quocientes com estrutura de grupo.

EXEMPLO:
Consideremos o grupo G = Z dos inteiros com a operação + . Como esse
grupo é abeliano,o item 3 do Lema 1 garante que todo subgrupo de Z é normal. Em
particular, se n Î Z , n > 1 , o subgrupo nZ é normal. Logo, o conjunto das classes
laterais de nZ é um grupo, com a operação (a + nZ) + (b + nZ)= (a + b) + nZ ,
a, b Î Z . Cada uma das classes laterias de nZ em Z corresponde a um dos possíveis
restos da divisão por n . De fato, se a Î Z , podemos dividir a por n e escrever
a = nq + r , onde q, r Î Z e 0 £ r < n ( r é o resto da divisão de a por n ). Assim,
a - r = nq , ou seja, a - r Î nZ . Logo, a + nZ = r + nZ e, assim, toda classe lateral
é do tipo r + nZ , com r variando entre 0 e n- 1 . Usando a notação r = r + nZ
para a classe lateral representada por r , podemos escrever Z / nZ = { 0,1,, n- 1} ,

AULA 2 TÓPICO 1 27
isto é, o grupo quociente é formado pelas classes
laterais correspondentes a nZ e cada uma dessas
classes corresponde a um dos possíveis restos da
sa iba m a is!
divisão por n .
Obtenha mais informações a respeito de
subgrupos normais acessando o link:
Dado um subgrupo qualquer Sde um
http://www.mat.unb.br/~maierr/anotas.pdf
grupo G , o conjunto de suas classes laterais
à esquerda não é, necessariamente, um grupo.
Vimos, neste tópico, que, se o subgrupo for
normal, o conjunto de suas classes laterais à esquerda (ou à direita) é um grupo,
chamado grupo quociente de G por S. Isso dá aos subgrupos normais um papel
central na teoria dos grupos, pois com eles podemos construir grupos novos a
partir de grupos dados.

28 Estruturas Algébricas
TÓPICO 2 Homomorfismos de
grupos
O bjetivos
• Definir e apresentar exemplos de homomorf-
ismo de grupos
• Definir isomorfismo e apresentar o teorema do
isomorfismo

D ados dois grupos (G, ) e (H ,×) , uma função f : G ® H é chamada


homomorfismo de grupos se vale
f (a  b)= f (a) × f (b).
Em outras palavras, f é um homomorfismo de grupos se preserva a operação
entre quaisquer dois elementos dos grupos.
Classificação de homomorfismos de grupos
Um homomorfismo injetor é chamado monomorfismo.
Um homomorfismo sobrejetor é chamado epimorfismo e um homomorfismo
bijetor é chamado isomorfismo.
Se há um isomorfismo entre dois grupos G e H , dizemos que eles são
isomorfos e denotamos G @ H . Dois grupos isomorfos são indistinguíveis, do
ponto de vista da teoria dos grupos.

EXEMPLOS:
1. A função p : Z ® Zn , dada por p(a)= a , onde a indica a
classe de equivalência módulo n , é um homomorfismo entre os grupos
aditivos (Z, +) e (Zn , +) . De fato, basta notar que, dados a, bÎ Z , temos
p(a + b) = a + b = a + b = p(a) + p(b) .
2. O conjunto dos números reais positivos, que indicaremos aqui
por R>0 , é um grupo multiplicativo. A função L : R>0 ® R , dada por

AULA 2 TÓPICO 2 29
L(x)= log x , é um homomorfismo do grupo multiplicativo (R>0 ,×) no grupo
aditivo (R, +) . Mais ainda, L é um isomorfismo, isto é, R>0 @ R . De fato,
L(xy)= log(xy) = log(x) + log( y) = L(x) + L( y) , o que mostra que L é um
homomorfismo. Além disso, sabemos, do curso de cálculo 1, que a função logarítmica
é uma bijeção entre R>0 e R , logo temos que L : R>0 ® R é um isomorfismo.
3. A função determinante det : GLn (R) ® R* é um homomorfismo de grupos
multiplicativos. Lembremos que A Î GLn (R) se, e somente se, A é uma matriz
quadrada de ordem n tal que det A ¹ 0 , isto é, det A Î R* . Assim, a função
det : GLn (R) ® R* está bem definida. Uma vez que det(AB) = det(A )det(B) , a
função det : GLn (R) ® R* é um homomorfismo.
A seguir, definiremos dois importantes conjuntos associados a um
homomorfismo de grupos, o seu núcleo e sua imagem, e veremos como é possível
associar a noção de homomorfismo de grupos com a de grupo quociente. Esse é o
conteúdo do Teorema 7, a seguir.
Dado um homomorfismo de grupos f : G ® H , temos f (1G )= 1H , onde 1G
e 1H são os elementos neutros de G e H , respectivamente: por abuso de notação,
denotemos ambos por 1. Então
f (1)= f (1× 1)= f (1)× f (1) Þ f (1)= 1.
-1 -1
Se a Î G , então f (a) = f (a ) . De fato,
f (aa-1 )= f (1)= 1Þ f (a) f (a-1 )= 1Þ f (a-1 )= f (a)-1.
Associados a um homomorfismo de grupos f : G ® H , temos os dois
seguintes conjuntos:
Im( f )= { f (x)| x Î G}
é a imagem de f , também denotada por f (G) .
ker( f )= { x Î G| f (x)= e} ,
onde eÎ H é o elemento neutro da operação de H , é o núcleo de f .

Teorema7 (Teorema fundamental dos homomorfismos) dado um


homomorfismo de grupos f : G ® H , temos:
1. Im( f ) £ H .
2. ker( f )  G .
3. G / ker( f ) @ Im( f ) .

30 Estruturas Algébricas
Demonstração:
Primeiramente, se 1Î G é o elemento neutro, então f (1)= 1Î H , o elemento
neutro de H , logo Im( f ) ¹ Æ . Dados x, y Î Im( f ) , existem a, b Î G tais que
f (a)= x e f (b)= y . Temos:
xy-1 = f (a) f (b)-1 = f (a) f (b-1 )= f (ab-1 ) Î Im( f ),
o que mostra que Im( f ) é subgrupo de H .
Por outro lado, ker( f ) ¹ Æ , pois f (1)= 1 . Se a, b Î ker( f ) , então f (a)= f (b)= 1 ,
logo f (ab-1 )= f (a) f (b-1 )= f (a) f (b)-1 = 1 e isso implica que ab-1 Î ker( f ) . Logo
ker( f ) £ G . Para mostrar que esse subgrupo é normal, consideremos x Î G e
a Î ker( f ) . Temos:
f (xax-1 )= f (x) f (a) f (x-1 )= f (x) f (x)-1 = 1,
o que mostra que xax-1 Î ker( f ) , para todo x Î G e todo a Î ker( f ) . Pelo Lema 5,
ker( f )  G .
Por simplicidade, escrevemos
S= ker( f ) . Seja F : G / S ® Im( f ) , dada por
F(aS)= f (a) . A função F é sobrejetiva, pois
s aiba mais ! seu contradomínio é exatamente Im( f ) .
Obtenha mais informações a respeito de Para mostrarmos que F é injetiva, tomemos
Homomorfismos, acessando o link: aS, bSÎ G / S , tais que F(aS)= F(bS) .
http://www.mat.unb.br/~maierr/anotas.pdf Isso implica que f (a)= f (b) , ou seja,
-1 -1
f (ab )= 1 . Dessa forma, ab Î ker( f )= S ,
isto é, a : b . Portanto, aS= bS e F é
também injetiva, logo é bijetiva. Além disso,
F(aS× bS)= F(abS)= f (ab)= f (a) f (b)= F(aS)F(bS) , o que mostra que F é um
homomorfismo. Sendo um homomorfismo bijetor, F é um isomorfismo.

ATIVIDADES D E A PR O FUN DA M E N T O

1. Mostre que, em um grupo abeliano, todo subgrupo é normal.


2. Mostre que o subgrupo trivial { 1} de um grupo G , formado pelo elemento neutro da operação de grupo,
é normal em G .
3. Mostre que um grupo G é abeliano se, e somente se, a função f : G ® G dada por f (x)= x-1 é um
homomorfismo.

AULA 2 TÓPICO 2 31
4. Prove que um grupo G é abeliano se, e somente se, a função f : G ® G dada por f (x)= x2 é um
homomorfismo.
5. Mostre que os grupos multiplicativos R-{ 0} e C-{ 0} não são isomorfos.
6. Sejam Zn = { 0,1,, n- 1} e Rn = { z Î C| zn = 1} . Verifique que (Zn , +) e (Rn ,×) são grupos
isomorfos. ( Sugestão: exiba um homomorfismo bijetor f : Zn ® Rn ).
 
7. Seja V um espaço vetorial de dimensão n sobre R e { v1 ,, vn } um conjunto de vetores linearmente
independentes em V .
(a) Verifique que o conjunto V com a adição de vetores é um grupo abeliano.
 
(b) Se t Î { 1,, n} e Vt = { n1v1 + nt vt | nt Î Z} , mostre que
{ 0} £ V1 £ V2 £  £ Vn-1 £ Vn = V ,
   
onde `` £ ’’ indica ``subgrupo de’’. Dizemos que Vt é gerado por v1 ,, vt e indicamos V = v1 ,, vt .
(c) Seja V = R2 = { (x, y)| x, y Î R} , com a soma definida por (x, y) + (x ¢, y¢)= (x + x ¢, y + y¢) .
Represente os subgrupos S1 = (1,0),(0,1) e S2 = (2,0,),(1,1) graficamente.
(d) Considere em R2 a relação º definida por
(a, b) º (c, d) Û (a, b) - (c, d) Î S1
(veja o item anterior). Verifique que º é uma relação de equivalência.
(e) Denote por T1 o conjunto das classes de equivalência de º , isto é, T1 = { (a, b)| (a, b) Î R2 } .
Verifique que a soma de classes
(a, b) + (c, d)= (a + c, b + d)
(T
está bem definida. 1 , +) é um grupo?
8. Seja G o grupo multiplicativo de todas as matrizes n´ n não singulares (isto é, matrizes com determinante
diferente de zero). Mostre que o conjunto das matrizes com determinante igual a 1 é um subgrupo normal
de G .
Seja G um grupo cíclico de ordem n , ou seja, G = a , onde an = 1 e ak ¹ 1, se 1£ k £ n - 1. Considere
a função f : Z ® G dada por f (n)= an .
(a) Mostre que f é um homomorfismo sobrejetor.
(b) Determine o núcleo de f .
(c) Use o teorema dos isomorfismos para mostrar que G; Zn (isto é, todo grupo cíclico finito é isomorfo
a Zn onde n =| G| ).
9. Refaça a questão anterior, supondo agora que G é cíclico infinito. Conclua que todo grupo cíclico infinito
é isomorfo a Z .
-1
10. Seja G um grupo e a Î G fixado. Defina f : G ® G pondo f (x)= axa . Mostre que f é um
isomorfismo (chamamos um isomorfismo deste tipo de conjugação).
11. Mostre que um subgrupo H de G é normal se e somente se f (H ) Ì H , para toda conjugação f de
G (veja o exercício anterior).

32 Estruturas Algébricas
12. Dados a, b Î G , o comutador de a e b é o elemento a-1b-1ab Î G , denotado por [a, b] . O subgrupo
dos comutadores de G é definido como o subgrupo de G gerado pelos [a, b] , ou seja,
G¢ = { [a, b]| a, b Î G} .
(a) Mostre que G¢  G (sugestão: use a questão anterior).
(b) Mostre que, se H  G , então G / H é abeliano se e somente se G¢ Ì H .
(c) Mostre que, se H £ G e G¢ Ì H , então H  G .

AULA 2 TÓPICO 2 33
AULA 3 Anéis, subanéis e
ideais

Olá aluno(a),

Iniciaremos, nesta aula, o estudo de nossa segunda estrutura algébrica, que é a


estrutura de anel. A estrutura de anel é importante, pois generaliza a aritmética dos
conjuntos numéricos. Assim, os conjuntos dos números inteiros, dos racionais,
dos reais ou dos complexos, são exemplos de anéis. Conjuntos de matrizes, de
funções e de polinômios também formam anéis.

Depois de estudarmos a definição e uma série de exemplos de anéis, seguiremos


uma trajetória similar àquela que traçamos para grupos, ou seja, estudaremos os
subanéis, e certos subanéis especiais, chamados ideais, que serão importantes na
aula 4, para construirmos anéis de classes de equivalências, assim como fizemos
para os grupos.

Daremos especial atenção aqui aos ideais primos e maximais e explicaremos


como ambos são generalizações na noção de número inteiro primo.

Objetivos

• Definir e estudar exemplos de anéis


• Compreender as noções de subanel e ideal
• Reconhecer os ideais primos e maximais

34 Estruturas Algébricas
TÓPICO 1 Definição e exemplos
O bjetivos
• Compreender o conceito de anéis e reconhecer seus
exemplos
• Observar alguns casos especiais de anéis, em particular,
os corpos e os domínios de integridade, identificando
exemplos
• Obter algumas propriedades básicas da estrutura de anel

A ideia de se estudar uma estrutura algébrica é obter resultados


que valham no contexto mais geral possível e que englobem
exemplos importantes. Essa ideia é bem ilustrada pelo estudo de
anéis. Por exemplo, veremos nessa aula e nas aulas que se seguem, que a estrutura
algébrica subjacente ao conjunto dos números inteiros é exatamente a mesma
que rege o comportamento operatório dos polinômios em uma indeterminada
com coeficientes complexos, a saber, a estrutura de domínio euclidiano (veremos
isso nas aulas 5 e 6). Assim, vale a pena estudar os dois casos de modo unificado,
obtendo resultados que valham para ambos. Veremos, neste tópico, que um anel
é um conjunto não-vazio com duas operações cujas propriedades básicas também
devem ser apresentadas pela soma e pelo produto de números. No entanto, um anel
é uma estrutura abstrata, que pode ser contituída
de elementos com natureza bem diferente da dos
números.
atenção! Um conjunto A onde estão definidas duas
operações binárias + : A ´ A ® A e × : A ´ A ® A ,
Se Y é infinito, então (y)={, ou seja, (y) é o
que denominamos, respectivamente, soma
conjunto dos produtos finitos de potências
e produto, é chamado anel associativo, ou
inteiras de elementos de Y .
simplesmente anel se as seguintes condições são
verificadas:

AULA 3 TÓPICO 1 35
1. A soma é associativa:
(a + b) + c = a + (b + c) , quaiquer que
sejam a, b, c Î A .
2. A soma é comutativa: a + b = b + a , at e n ç ão!
para quaisquer a, b Î A .
O elemento inverso aditivo de um elemento
3. Existe elemento neutro para a soma: a Î A é único. De fato, se b, b¢ Î A são tais que
existe eÎ A tal que e+ a = a + e= a , a + b = 0= b¢ + a , então
para todo a Î A . b¢ = b¢ + 0= b¢ + (a + b)=
.
4. Existe elemento inverso para a = (b¢ + a) + b = 0 + b = b
soma: dado a Î A , existe b Î A tal que Esse único elemento inverso aditivo de a é

a+ b= b+ a= 0 . chamado de simétrico de a e denotado por -a .

5. O produto é associativo: para quaisquer


a, b, c Î A , a × (b× c)= (a × b) × c .
6. Vale a propriedade distributividade: para quaisquer a, b, c Î A ,
a × (b + c)= a × b + a × c e (b + c) × a = b× a + c× a .

No nosso curso trabalharemos com


anéis para os quais valem algumas condições
adicionais. Esses anéis recebem nomes especiais,
como descrito abaixo.
g u a r d e be m isso!
7. Um anel A é dito comutativo se
Podemos resumir as condições 1 a 4, dizendo que
o produto é comutativo: a × b = b× a ,
o conjunto A , com a operação de soma, é um
quaisquer que sejam a, b Î A .
grupo abeliano. No caso em que A é um corpo,
8. Um anel A é dito anel com unidade se
A -{ 0} também é um grupo abeliano.
vale o seguinte: existe elemento neutro
para o produto: existe u Î A tal que
a × u = u × a = a , para todo a Î A .

Observação: demonstra-se, de modo análogo ao que foi feito no item 3


acima, que esse elemento neutro é único. Usamos a notação 1 para o elemento
neutro do produto em A .

9. Um anel comutativo com unidade A é chamado domínio de integridade,


ou simplesmente domínio, se vale a seguinte condição:
se a, b Î A e a × b = 0 , então a = 0 ou b = 0 .

36 Estruturas Algébricas
10. Um anel comutativo com unidade A é chamado corpo se vale a existência
de inverso para o produto: dado a Î A , a ¹ 0 , existe b Î A tal que
a × b = b× a = 1 . Observação: é possível demonstrar que esse elemento inverso
b Î A é único. Usamos a notação a-1 .

EXEMPLOS:
ïìïçæa bö÷ üï
1. O conjunto M 2 (R)= íç ÷÷| a, b, c, d Î Rýï , com a soma e o produto
ïïîçè c d÷ø ïïþ
æ1 0÷ö
de matrizes, é um anel associativo com unidade 1= çç ÷ , mas não é
çè0 1÷÷ø
comutativo. O anel M 2 (R) também não é domínio de integridade, pois, por
æ0 1÷ö æ1 0÷ö æ0 0÷ö
exemplo, çç ÷ × çç ÷ = çç ÷= 0.
çè0 0÷÷ø èç0 0÷÷ø èç0 0÷÷ø
2. O conjunto dos inteiros pares 2Z= { 0, ±2, ±4, ±6,} é um anel comutativo
sem elemento unidade.
3. O conjunto Z dos inteiros, com a soma e o produto usuais de inteiros,
é um domínio de integridade, mas não é corpo, pois, por exemplo, 2 Î Z ,
2 ¹ 0 , mas não existe bÎ Z tal que 2b = 1 .
4. Q, R e C são corpos.
5. O conjunto Z6 = { 0,1,2,3,4,5} munido da soma e do produto módulo 6 é
um anel comutativo com unidade, mas não é um domínio. De fato, 2 ¹ 0 ,
3 ¹ 0 e 2× 3= 0 (módulo 6).
6. Se a Î Z é um inteiro livre de quadrados, ou seja, se a não é divisível pelo
quadrado de um inteiro, então Z[ a ] = { a + b a | a, b Î Z} é, com a soma e
o produto de números reais, um domínio. De fato, se a + b a e c + d a
são elementos de Z[ a ] , então (a + b a ) + (c + d a )= (a + c) + (b + d) a
e (a + b a )(c + d a )= (ac + bda ) + (ad + bc) a são elementos de Z[ a ] .

As condições 1,2,5, 6 e 7 da definição de anel são válidas porque são


válidas em R e Z[ a ] Ì R . O elementos neutro 0 Î R pode ser escrito como
0= 0 + 0 a Î Z[ a ] , logo vale a condição 3. Dado a + b a Î Z[ a ] , o seu
inverso aditivo -(a + b a )= -a + (-b) a também é um elemento de Z[ a ] ,
logo vale a condição 4. A condição 8 é válida porque a unidade 1Î R pode
ser escrita como 1= 1+ 0 a , logo é um elemento de Z[ a ] . Finalmente, se
(a + b a )(c + d a )= 0 , então (ac + bda ) + (ad + bc) a = 0 , o que implica que
ac + bda = 0 e ad + bc = 0 . Dessas duas últimas equações, podemos concluir que
a + b a = 0 ou c + d a = 0 . Logo, vale a condição 9 e Z[ a ] é um domínio de
integridade.

AULA 3 TÓPICO 1 37
7. Se a Î Q é livre de quadrados, isto é, se pode ser escrito como uma
fração onde numerador e denominador são inteiros livres de quadrados,
então Q[ a ] = { a + b a | a, b Î Q} é um corpo. As condições de 1 até 8 da
definição de anel podem ser verificadas de modo análogo ao do exemplo
anterior. Quanto à condição 10, basta notarmos que
a b
(a + b a )-1 = - 2 a,
a - b a a - b2a
2 2

o que mostra que todo elemento não-nulo de Q[ a ] tem um inverso em


Q[ a ] .

8. Considere A um anel comutativo com unidade e


A[x ] = { a0 + a1x +  + anx | n Î N, ai Î A} o conjunto dos polinômios com
n

coeficientes em A . Com a soma e o produto de polinômios, o conjunto A[x ]


torna-se um anel comutativo com unidade.

Teorema1: Todo corpo é um domínio de integridade.

Demonstração:
Se A é um corpo e a, b Î A são tais que a × b = 0 e a ¹ 0 , então existe
-1
a Î A tal que a-1a = 1 . Logo, multiplicando a × b = 0 por a , obtemos
-1

a-1 × (a × b)= 0 , logo (a-1 × a) × b = 0 , isto é, b = 0 .


A recíproca do Teorema acima não é válida, pois Z é um domínio de
integridade que não é corpo.
Coletamos, a seguir, algumas propriedades básicas dos anéis que seguem
diretamente da definição de anel.

Teorema2 Seja A um anel. Então, para a, b, c Î A , temos:


1. a0= 0a = 0 .
2. a(-b)= -(ab)= (-a)b .
3. a(b - c)= ab - ac e (a - b)c = ac - bc

Demonstração:
1. a0= a(0 + 0)= a0 + a0 , logo a0 + (-a0)= a0 e, portanto, 0= a0 .
Analogamente, 0a = 0 .

38 Estruturas Algébricas
2. 0= a0= a(b + (-b))= ab + a(-b) , logo a(-b)= -ab . Analogamente,
(-a)b = -ab .
3. a(b - c)= a(b + (-c))= ab + a(-c)= ab - ac . Analogamente,
(a - b)c = ac - bc .
Seja a1 ,, an uma sequência de elementos de um anel A . Definimos o
produto desses elementos indutivamente, pondo:
1

Õa = a ,
i =1
i 1

k æ k-1 ö÷
çç a ÷ a ,
Õ
i =1
ai =
èçÕ i÷ k
i =1 ø

para todo k , 2 £ k £ n .
k
O símbolo Õ a indica o produto de a1 ak e é denominado produtório.
i =1 i

Uma propriedade básica dos produtórios é a seguinte:

æ m ö÷ æ n ö÷ m+n
çç a ÷ × çç a ÷ = a .
çèÕ i
÷ çÕ i ÷ Õ
i =1 ø è i =1 ø i =1
i

Essa propriedade é conhecida como lei da associatividade generalizada


e significa, simplesmente, que, em um produtório, os parênteses podem ser
livremente manipulados sem que o produto se altere.
Se n é um número inteiro positivo, então na e an significam, respectivamente,
a soma e o produto de a , repeditas n vezes, ou seja,
n

na = a +  + a ,

n 

an = aa.

n


De modo análogo, (-n)a = (-a) +  + (-a) e, caso exista o inverso a-1 de a
n

-1 -1
em A , a = (a )(a ) . Se m e n são inteiros positivos e a e b são elementos
-n

de um anel, temos:
1. aman = am+n .
2. (am )n = amn .
3. ma + na = (m + n)a .
4. m(na)= (mn)a = n(ma) .
5. (ma)(nb)= (mn)ab = (na)(mb) .

AULA 3 TÓPICO 1 39
Encerramos aqui este primeiro tópico sobre anéis, em que estudamos a
definição de anel, vimos que domínios de integridade e corpos são tipos especiais
de anéis comutativos com unidade, e vimos também que todo corpo é domínio
de integridade. Além disso, tivemos a oportunidade de exibir alguns exemplos
importantes de anéis e verificar a validade das propriedades básicas das operações
de soma e produto em um anel, decorrentes diretamente da definição.

40 Estruturas Algébricas
TÓPICO 2 Subanéis e ideais
O bjetivos
• Definir e exibir exemplos de subanéis
• Conceituar ideais

N este tópico, estudaremos subconjuntos de um anel que, com


as mesmas operações do anel, são também um anel. Esses
subconjuntos são chamados subanéis. Vamos também definir
ideais, que são os subanéis adequados para a construção de anéis quociente, em
analogia com os subgrupos normais, estudados na aula anterior.
Seja A um anel. Um subconjunto não-vazio SÌ A é dito subanel de A
se S , com as mesmas operações de A , for um anel, não necessariamente com
unidade. Se o subanel S de A contiver a unidade de A , diremos que S é um
subanel unitário de A .

Lema3: Dado um anel A e um subconjunto não-vazio SÌ A , S é um subanel se,


e somente se, valem as seguintes condições, para quaisquer a, b Î S :
1. a - b Î S e
2. ab Î S .

Demonstração:
Se S é um subanel de A , então as condições 1 e 2 são consequências da
definição de anel. Reciprocamente, suponhamos que valem as condições 1 e 2. A
condição 2 nos diz que o produto de dois elementos de S pertence a S, logo

AULA 3 TÓPICO 2 41
podemos restringir o produto de A a S. A
associatividade e a comutatividade da soma e
do produto, e também a distributividade, valem
em S porque valem em A e SÌ A . Precisamos at e n ç ão!
mostrar que o elemento neutro da soma 0 Î A
A condição 1 do Lema 3 coincide com uma das
pertence, de fato, a S. Como S não é vazio, existe condições para que um subconjunto de um
a Î S . Pela condição 1, temos 0= a - a Î S , grupo seja um subgrupo. A diferença é apenas na
como queríamos demonstrar. Mais ainda, se notação: a - b é o análogo de ab-1 se a operação
a Î S , então -a = 0 - a Î S , novamente pela de produto for substituída pela de soma.
condição 1. Finalmente, dados a, b Î S , temos
a + b = a - (-b) Î S , logo podemos restringir a
soma de A ao subconjunto S.

Se X é um subconjunto de um anel A , g u a r d e be m isso!


o menor subanel de A que contém X é
O subconjunto { 0} formado pelo elemento
chamado subanel gerado por X . Dada uma
neutro da soma em um anel A é um subanel
família (Sl )lÎL de subanéis de um anel A ,
de A . De fato, se a, bÎ { 0} , então a = b = 0
temos que a interseção S= ÇlÎL Sl é um e a - b = 0 Î { 0} , ab = 0 Î { 0} . Pelo Lema 3,
subanel de A . De fato, se a, b Î S , então { 0} é subanel de A .
a, b Î Sl , para todo l Î L , logo, pelo Lema
3, a - b Î Sl e ab Î Sl , para todo l Î L .
Assim, a - b Î S e ab Î S e, novamente pelo Lema 3, S é subanel de A . Dessa
forma, podemos concluir que o subanel gerado por um subconjunto de um anel A
é a interseção de todos os subanéis de A que contêm X .

EXEMPLOS:
1. Z é subanel unitário de Q.
2. Seja F[0,1] o anel formado por todas as funções f : [0,1] ® R , com a soma
e o produto dados, respectivamente, por
( f + g)(t )= f (t ) + g(t ),

( fg)(t )= f (t ) g(t ).

Seja C[0,1] o subconjunto de F[0,1] formado por todas as funções contínuas


de [0,1] em R. Como a diferença e o produto de funções contínuas são funções
contínuas, vemos que C[0,1] é subanel de F[0,1] . Além disso, como a função

42 Estruturas Algébricas
constante 1: [0,1] ® R , dada por 1(t )= 1 , para todo t Î [0,1] , é contínua, o subanel
C[0,1] é unitário.
3. O subconjunto 2Z Ì Z , formado pelos inteiro pares, é um subanel do anel
Z que não é unitário. De fato, 1Î Z , sendo ímpar, não pertence a 2Z.
4. S= { 0,2,4} Ì Z6 é subanel de Z6 , o que pode ser verificado de modo direto
usando-se o Lema 3.

Dado um anel A , se existe um inteiro


positivo m tal que m× 1= 0 em A , então existe
um inteiro positivo mínimo n tal que n× 1= 0 .
Esse inteiro positivo mínimo é chamado
atenção!
característica do anel A . Se não existe inteiro
Se X = Æ , então o subanel S gerado por X é
positivo m tal que m× 1= 0 , dizemos que o anel
a interseção de todos os subanéis de A . Como
A tem característica zero. Usamos a notação
{ 0} é um subanel de A , temos, em particular,
car(A ) para a característica de A .
que SÌ { 0} , logo S = { 0} , ou seja, o subanel
gerado pelo conjunto vazio é o subanel { 0} . EXEMPLO:
Em Z, m× 1= 0 implica que m = 0 , logo
não existe inteiro positivo m tal que m× 1= 0 ,
o que mostra que car(Z)= 0 . Por outro lado, se nÎ Z , n > 1 , no anel Zn das classes
de equivalência módulo n , temos n× 1= n = 0 e n é o menor inteiro positivo
satisfazendo essa igualdade. Logo, car(Zn )= n . No caso em que A é um domínio,
temos o seguinte resultado.

Teorema4 Seja D um domínio. Então a carcterística de D é igual zero ou a um


número primo.

Demonstração:
Seja n = car(D) . Se n = 0 , nada há a demonstrar. Vamos mostrar que, se
n ¹ 0 , então n é um número primo. De fato, se 1Î K é a identidade, então n× 1= 0
e n é o menor inteiro positivo que satisfaz essa igualdade. Se n não fosse primo,
então poderíamos escrever n = ab , com a, bÎ Z e 1< a < n e 1< b < n . Assim
n× 1= 0 implicaria (ab) × 1= 0 , ou seja, (a × 1)(b× 1)= 0 . Como D é domínio, essa
última igualdade implicaria a× 1= 0 ou b× 1= 0 , o que iria contra a minimalidade

AULA 3 TÓPICO 2 43
de n . Assim, não é possível obter-se uma decomposição de n como produto de
fatores menores do que n , o que mostra que n é primo.
Vamos, agora, definir o importante conceito de ideal. O estudo de ideais
começou com os trabalhos de Kronecker e Dedekind em meados do século XIX,
em conexão com estudo da unicidade da fatoração de um número como produto
de primos anéis mais gerais do que o anel dos inteiros. Com o passar do tempo, a
noção de ideal mostrou-se central na teoria dos anéis e encontrou aplicações em
geometria, teoria dos números e análise.
Um subconjunto não-vazio I de um anel (comutativo com unidade) A é
chamado ideal de A se valem as seguintes condições:
1. Se a, b Î I , então a - b Î I .
2. Se a Î I e a Î A , então aa Î I .

Note que, pelo Lema 3, todo ideal é um subanel. Mas nem todo subanel é
um ideal, visto que a condição 2 exige que o produto de um elemento a Î I por
qualquer elemento a Î A esteja em I . Mais explicitamente, podemos exibir como
exemplo o subanel Z de R. É claro que, se a Î R e a Î Z , o produto aa não
pertence, necessariamente, a Z. Basta considerar, por exemplo, a = 2 .

Exemplos:
1. Todo subanel do anel Z é um ideal de Z. Para verificar isso, basta notar
que, se S é subanel de Z, a Î S e nÎ Z , então
ïìï a +  + a se n > 0
ïï
na = í 0 se n = 0
ïï
ïïî(-a) +  + (-a) se n < 0
Em qualquer um dos três casos, na Î S , logo S é um ideal de Z.

2. Dado um anel A , os subconjuntos { 0} e A são ideais de A , chamados


ideais triviais de A . Se I é um ideal não trivial de A , então I é dito ideal
próprio de A .

Teorema5 Seja A um anel comutativo com unidade 1Î A .


1. Se I é um ideal de A e 1Î I , então I = A .
2. Se A é um corpo, os únicos ideais de A são { 0} e A .

44 Estruturas Algébricas
Demonstração:
1. Se I Ì A é um ideal de A e 1Î I , então para cada a Î A , a = a × 1Î I ,
ou seja, A Ì I , logo I = A .
2. Seja I Ì A um ideal de um corpo A e suponha que I ¹ { 0} . Então existe
a Î I , a ¹ 0 . Como A é um corpo, a ¹ 0 implica que existe a Î A tal que aa = 1 .
Isso implica que 1= aa Î I e, pelo item 1, I = A .
Dados a1 ,, an Î A , o conjunto
(a1 ,, an )= { a1t1 +  + ant n | t i Î A}
é um ideal de A , chamado ideal gerado por a1 ,, an . De fato, dados
x, y Î (a1 ,, an ) e a Î A , temos que x = a1t1 +  + ant n e y = a1u1 +  + anun ,
com t i , ui Î A . Logo, x - y = a1 (t1 - u1 ) +  + an (t n - un ) Î (a1 ,, an ) e
ax = a1(at1 ) +  + an (at n ) Î (a1,, an ) .
Um ideal gerado por um número finito de elementos é chamado ideal
finitamente gerado. Um ideal gerado por um único elemento, ou seja, um ideal
do tipo
(a)= aA = { at | t Î A}
é chamado ideal principal de A .
Encerramos, aqui, nosso segundo tópico, sobre subanéis e ideais. Vimos
sua definição, alguns exemplos e alguns resultados básicos sobre subanéis e ideais
em anéis comutativos com unidade. No próximo tópico, estudaremos dois tipos
especiais de ideais: os primos e os maximais.

AULA 3 TÓPICO 2 45
TÓPICO 3 Ideais primos e
maximais
O bjetivos
• Definir e exibir exemplos de ideais primos e maximais
• Estudar os ideais primos no anel dos números inteiros

A seguir, iremos definir dois tipos importantes de ideais, os ideais


primos e os ideais maximais. Ambos generalizam a noção de
número primo, como veremos a seguir.
Seja A um anel (comutativo com unidade) e seja P um ideal de A . Dizemos
que P é um ideal primo se
a, b ∈ A e ab ∈ P ⇒ a ∈ Pou b ∈ P
Seja A um anel (comutativo com unidade) e seja M um ideal de A . Dizemos
que M é um ideal maximal se
I ideal deA e M Ì I Þ I = M ouM = A.
A própria definição de ideal maximal justifica seu nome. De fato, um ideal é
maximal quando não está contido em ideal próprio algum de A . Já o nome ideal
primo é justificado pelo exemplo e pelo Teorema a seguir.
Exemplo: (ideais de Z) Seja I ¹ { 0} um ideal do anel Z dos números inteiros.
Como a Î I implica que -a = (-1)a Î I , podemos garantir que existe n Î I , n > 0 .
Seja m Î I o menor inteiro positivo em I . Dado a Î I , o algoritmo da divisão nos
diz que existem q, r Î Z , com a = mq + r e 0 £ r < m . Agora, a, m Î I implicam
que r = a - mq Î I . Se r ¹ 0 , então teríamos 0< r < m e r Î I , ou seja, r seria o
menor elemento positivo em I . Mas já estamos supondo que m é o menor inteiro
positivo pertencente a I . Isso significa que r ¹ 0 não pode ocorrer, isto é, r = 0 .
Logo, a = mq e, em geral, todo elemento de I é um múltiplo de m , o que indicamos
por I Ì mZ . Mas, m Î I implica que mZ Ì I e, assim, I = mZ , onde mZ indica o

46 Estruturas Algébricas
conjunto dos múltiplos de m ( mZ= { mk| k Î Z} ). Ideais formados pelos múltiplos
de um elemento são chamados ideais principais e serão estudados na aula 5.

O Teorema a seguir complementa o exemplo acima, caracterizando os ideais


primos e os ideais maximais de Z. Em particular, o item 3 desse Teorema mostra
que, no anel dos inteiros, as noções de ideal primo e de ideal maximal coincidem.

Teorema6
1. Se I = mZ e J = nZ são dois ideais de Z, então I Ì J se, e somente se, n| m.
2. Um ideal P de Z é primo se, e somente se, P = pZ , com pÎ Z primo.
3. Um ideal P de Z é primo se, e somente se, é maximal.

Demonstração:
1. I Ì J é equivalente a mZ Ì nZ . Em particular, m Î mZ Ì nZ , ou seja,
m é um múltiplo de n , isto é, n| m . Reciprocamente, se n| m , então m = nk ,
com k Î Z . Assim, se a Î mZ , então a = mc , onde cÎ Z , logo a = n(kc) , ou seja,
a Î nZ , o que mostra que mZ Ì nZ .
2. Dados a, bÎ Z , tais que ab Î pZ , temos que ab é um múltiplo de p ,
ou seja, p| ab . Como p é primo, p| ab implica p| a ou p| b , logo a Î pZ
ou b Î pZ . Isso mostra que pZ é primo para p primo. Reciprocamente, se P
é um ideal primo de Z, então, pelo exemplo acima, P = nZ, com nÎ Z . Vamos
mostrar que n é primo. De fato, se n = ab , com a, bÎ Z , então ab = n Î nZ= P .
Como P é ideal primo, ab Î P implica que a Î P ou b Î P . Se a Î P = nZ , então
n| a . Porém, n = ab , implica que a| n , ou seja, n = ±a e b = ±1 . Caso b Î P , um
raciocínio análogo mostra que a = ±1 . Portanto, a única decomposição possível
n = ab , para n , é a trivial, isto é, com a = ±1 ou b = ±1 . Isso mostra que p é
primo.
3. Se M = mZ é um ideal maximal de Z, então m é primo, do contrário,
existiria n > 1 inteiro tal que n| m e, daí, M = mZ Ì nZ Ì Z (inclusões estritas), o
que não é possível, pois M é maximal. Sendo m primo, pelo item 2, M = mZ é um
ideal primo. Reciprocamente, seja P = pZ um ideal primo e suponha que P Ì I Ì A ,
onde I = aZ é um ideal de Z. Se a primeira inclusão for estrita, então pZ Ì aZ
implica que a| p, mas p| a . Como p é primo, os únicos divisores positivos de p
são 1 e p . Uma vez que p| a , temos a ¹ p . Logo a = 1 e I = aZ= Z . Isso mostra
que P = pZ é maximal.

AULA 3 TÓPICO 3 47
O Teorema 6 justifica o nome ideal primo, pois, em Z, os ideais primos são
exatamente aqueles do tipo pZ , em que p é um número primo. A situação do
Teorema 6 não se repete em geral, como vemos no exemplo a seguir.

EXEMPLO:
Seja A = Z[x ] , o anel de polinômios com coeficientes em Z, na indeterminada
x . O conjunto
I = (x)= { xf (x)| f (x) Î Z[x ]} = { g(x) Î Z[x ]| g(0)= 0} ,
formado pelos múltiplos de x , ou seja, pelos polinômios que têm coeficiente a0 = 0 ,
é um ideal primo de A que não é maximal em A . De fato, se g(x), h(x) Î Z[x ]
são tais que g(x)h(x) Î I , então g(0)h(0)= 0 . Como Z é um domínio, g(0)h(0)= 0
implica que g(0)= 0 ou h(0)= 0 , ou seja, g(x) Î I ou h(x) Î I , o que mostra que
I é primo.
Por outro lado, I está contido propriamente no ideal
J = (2, x)= { 2f (x) + xg(x)| f (x), g(x) Î Z[x ]} = { h(x) Î Z[x ]| h(0)épar } .
Isso é claro, pois 0 é par, logo p(x) Î I implica que p(0)= 0 , em particular,
p(0) é par, o que por sua vez, implica que p(x) Î J . Mais ainda, o ideal J é
próprio, ou seja, J ¹ A . Par comprovar isso, basta notar que q(x)= 1+ x Î A , mas
q(x) Î
/ J , pois q(0)= 1 é ímpar. Assim, encontramos um ideal J tal que I Ì J Ì A
(inclusões estritas) e isso mostra que I não é maximal.
Dessa forma, nem todo ideal primo em um anel qualquer A é maximal.
Porém, a recíproca dessa afirmação é válida, como veremos a seguir.

Teorema7 Em um anel comutativo com unidade A , todo ideal maximal é v.

Demonstração:
Seja M um ideal maximal e sejam a, b Î A tais que ab Î M .
Supondo que a Î
/ M , vamos mostrar que b Î M . Considere, para isso, o ideal
I = { ay + m| y Î A, m Î M } . Temos que M Ì I Ì A , com a Î I . Como, por
hipótese, a Î
/ M , temos que a inclusão M Ì I é estrita. Logo, por ser M maximal,
devemos ter I = A . Em particular, 1Î I , ou seja, 1= ay + m , para algum y Î A e
algum m Î M . Multiplicando essa última igualdade por b , obtemos b = aby + bm .
Como, por hipótese, ab Î M e m Î M , temos que b = aby + bm Î M , como
queríamos demonstrar.

48 Estruturas Algébricas
Com esse resultado, encerramos nosso terceiro tópico e a aula 3. Nesta aula,
começamos a estudar a importante estrutura algébrica de anel e vimos que existem
tipos especiais de anéis: os domínios de integridade e os corpos. Vimos que todo
corpo é um domínio de integridade, que a um anel podemos associar um número
inteiro não negativo, chamado característica do anel, que é primo, ou zero, sempre
que o anel for um domínio. Vimos que existem subconjuntos de um anel que têm
ainda estrutura de anel, são chamados de subanéis. Dentre os subanéis há alguns
de especial importância, chamados ideais e, dentre os ideais, vimos dois tipos que
também são bastante importantes: os ideais primos e os ideais maximais.
Na próxima aula, estudaremos as funções naturais que podem ser definidas
entre anéis e os anéis que podem ser formados a partir de quocientes de anéis por
ideias.

atividade de a pr o fuda m e n t o
1. Dado um corpo K , seja
ïì f (x) ïü
K(x)= ïí | f (x), g(x) Î K[x ], g(x) ¹ 0ïý.
ïîï g(x) ïþï
f (x) h(x) f (x)(x) + g(x)h(x) e f (x) h(x) f (x)h(x) , K(x) é um
Com as operações + = × =
g(x) (x) g(x)(x) g(x) (x) g(x)(x)

anel. Mostre que K(x) é um corpo, chamado, corpo das funções racionais sobre K .

2. Seja F = { f : R ® R| f éfunçãocontínua} , com as operações


( f + g)(x)= f (x) + g(x),

( f × g)(x)= f (x) × g(x).

(a) Mostre que (F, +,×) é um anel.


(b) Para cada a Î R , mostre que I = { f Î F | f (a)= 0} é um ideal de F .
(c) Mostre que I [ a,b] = { f Î F| f (x)= 0, "x Î [a, b]} é um ideal de A .
3. Dado nÎ Z, n³ 1 , seja A = Zn [x, y] = R[ y] , onde R = Zn [x ] .
(a) Mostre que (x) é um ideal primo de A que não é ideal maximal.
(b) Mostre que (x, y) é ideal maximal se, e somente se, n é primo.
(c) Sabendo que (8, x) é um ideal primo de A , determine os possíveis valores de n .

AULA 3 TÓPICO 3 49
4. Dado um anel A , seja A[x ] = { a0 + a1x +  + anxn | n Î N, ai Î A} o anel dos polinômios
2
na indeterminada x com coeficientes em A . Dado f (x)= a0 + a1x + a2x +  + anx Î A[x ] ,
n

chamamos o coeficiente an de coeficiente líder do polinômio f e a0 de termo constante de f .


(a) Mostre que o termo constante de f (x) g(x) é o produto dos termos constantes de f (x) e g(x) .
f (x) g(x)
(b) Se A é um domínio, então o coeficiente líder de é o produto dos coeficientes líderes de f (x)
e g(x) .
(c) Mostre que f (x) Î A[x ] é unidade de A[x ] se e somente se f (x) é um polinômio constante e igual a
uma unidade de A , isto é, f (x) Î A * , onde A * = { unidadesdeA} .

5. Seja A = { a1 ,, an } um anel finito.


(a) Mostre que uma função f : A ® A é injetiva se, e somente se, é sobrejetiva.
(b) Mostre que A é um domínio de integridade se, e somente se, para cada a Î A , a ¹ 0 , a função
fa : A ® A , dada por fa (x)= ax for bijetiva.
(c) Mostre que um anel finito é domínio de integridade se, e somente se, é corpo.

50 Estruturas Algébricas
AULA 4 Homomorfismo
de anéis

Olá aluno(a),

Assim como fizemos no estudo de grupos, estudaremos nessa aula as funções


que podem ser definidas entre anéis e que, de um modo natural, preservam sua
estrutura, ou seja, preservam as duas operações dos anéis. Tais funções serão
chamadas homomorfismos de anéis. Os homomorfismos de anéis ocupam o
mesmo papel relevante para a teoria de anéis que os homomorfismos de grupos
para a teoria de grupos. Veremos, ainda, que é possível a construção de anéis
quociente de modo análogo à construção que fizemos de grupo quociente. Nesse
ponto, veremos que a noção de ideal desempenha papel similar ao de subgrupo
normal no caso de grupos.

Objetivos

• Definir e estabelecer as propriedades básicas de homomorfismos de anéis


• Construir o quociente de um anel por um ideal
• Demonstrar o teorema dos homomorfismos para anéis

AULA 4 51
TÓPICO 1 Definições e
exemplos
O bjetivos
• Estabelecer a noção de homomorfismo de anéis
• Citar exemplos de homomorfismos de anéis
• Definir núcleo e imagem de um homomorfismo de anéis

E
homomorfismos
stabeleceremos, neste primeiro
tópico,
os
de
a
resultados
nomenclatura

anéis.
dois conjuntos básicos, associados a um
básicos sobre
Definiremos
e

sa iba m a is!
Para mais informações sobre homomorfismo
de anéis, acesse o link http://www.mat.
homomorfismo, seu núcleo e sua imagem,
uc.pt/~picado/algebraII/0405/Apontamentos/
e veremos uma série de exemplos de
aula4.pdf
homomorfismos de anéis.
Consideremos dois anéis, não
necessariamente comutativos nem com unidade, (A, +,×) e (B, Å, Ä) . Uma função
f : A ® B é chamada homomorfismo de anéis, ou homomorfismo entre os
anéis A e B, se
f (a + b)= f (a) Å f (b),

f (a × b)= f (a) Ä f (b),


para quaisquer a, b Î A . Em geral, como não há risco de confusão, usamos as
mesmas notações para as operações nos anéis A e B, e escrevemos
f (a + b)= f (a) + f (b),

f (ab)= f (a) f (b).

52 Estruturas Algébricas
No caso em que A e B são anéis com
unidade, se 1A e 1B denotam os elementos
neutros do produto em A e B, respectivamente,
atenção! então dizemos que o homomorfismo f : A ® B é
A partir daqui, sempre que considerarmos um unitário se
homomorfismo f : A ® B entre dois anéis com f (1A )= 1B.
unidade, iremos supor que esse homomorfismo É claro que aqui também podemos, para
é unitário. evitar sobrecarga na notação, suprimir os índices
e escrever
f (1)= 1.

Teorema1 Dados A , B e C anéis e f : A ® B , g : B ® C , homomorfismos de


anéis, temos o seguinte:
1. A função composta g  f é um homomorfismo de anéis. Se f e g forem
unitários, g  f também o é.
2. Se f é uma função bijetora, então a sua inversa f -1 : B ® A é um homomor-
fismo. Se f for unitário, f -1 também o é.

Demonstração:
Para demonstrarmos 1, precisamos verificar que, dados a, b Î A ,
( g  f )(a + b)= ( g  f )(a) + ( g  f )(b) e ( g  f )(a × b)= ( g  f )(a) × ( g  f )(b) . Faremos
isso apenas para a primeira igualdade, sendo a segunda inteiramente análoga.
Temos, então,
( g  f )(a + b)= g( f (a + b))= g( f (a) + f (b)),
pois f é homomorfismo. Logo,
( g  f )(a + b)= g( f (a) + f (b))= g( f (a))= g( f (b)),
pois g também é homomorfismo. Mas isso é exatamente o que queríamos
demonstrar. Além disso, se f e g forem unitários, então g( f (1))= g(1)= 1, o que
mostra que g  f também é unitário.
Vamos demonstrar 2. Para isso, seja f -1 : B ® A a inversa da função f ,
que sabemos que existe, pois estamos supondo f bijetora. Dados x, y Î B ,
f
existem a, b Î A tais que f (a)= x e f (b)= y , pois é sobrejetora. Temos, então,
f -1 (x + y)= f -1 ( f (a) + f (b))= f -1( f (a + b))= a + b = f -1 (x) + f -1 ( y) . De modo
-1 -1 -1 -1 -1
análogo, temos: f (xy)= f ( f (a) f (b))= f ( f (ab))= a + b = f (x) f ( y) . Isso
mostra que f -1 é um homomorfismo. Como f (1)= 1 implica f -1 (1)= 1 , temos,
ainda, que f unitário implica f -1 unitário.

AULA 4 TÓPICO 1 53
No caso do item 2 do Teorema 1 acima, ou seja, quando f : A ® B é um
homomorfismo bijetor, dizemos que f é um isomorfismo de anéis, Dizemos,
ainda, que A e B são isomorfos e indicamos o isomorfismo entre eles com a
notação A @ B .

Dado um homomorfismo de anéis f : A ® B , podemos considerar os


seguintes conjuntos associados a f : o núcleo de f ,
ker f = { a Î A | f (a)= 0} ,
onde 0 é o elemento enutro da soma em B, e a imagem de f ,
Im f = { f (a)| a Î A} .

Teorema2 Dado um homomorfismo de anéis f : A ® B , temos:


1. f (0)= 0 .
2. f (-a)= - f (a) , para cada a Î A .
3. ker f é um ideal de A .
4. Imf é um subanel de B.

Demonstração:
(a) f (0)= f (0 + 0)= f (0) + f (0) , o que implica f (0)= 0 .
(b) Dado a Î A , f (a + (-a))= f (0)= 0 , pelo item (a). Como f é
homomorfismo, f (a) + f (-a)= f (a + (-a))= 0 , logo, f (-a)= - f (a) , como
queríamos.
(c) Dados a, b Î ker f , f (a)= 0 e f (b)= 0 . Logo,
f (a + b)= f (a) + f (b)= 0 + 0= 0 , o que implica a + b Î ker f . Se, a Î A e
a Î ker f , então f (aa)= f (a ) f (a)= f (a ) × 0= 0 , o que implica que aa Î ker f .
Portanto, pela definição de ideal, dada na aula 3, tópico 2, ker f é ideal de A .
(d) Usaremos aqui, o Lema 3 da aula 3. Dados x, y Î Im f , existem
a, b Î A tais que f (a)= x e f (b)= y . Assim, x - y = f (a) - f (b) . Pelo item (b),
- f (b)= f (-b) , logo x - y = f (a) + f (-b)= f (a + (-b)) , pois f é homomorfismo.
Portanto, x - y = f (a - b) , o que mostra que x - y Î Im f . Por outro lado,
xy = f (a) f (b)= f (ab) , pois f é homomorfismo. Logo, xy Î Im f .

EXEMPLO 1:
Dado um número inteiro n , n > 1 , seja Zn = { 0,1,, n- 1} o anel
das classes de restos módulo n . A função f : Z ® Zn , dada por f (k)= k ,

54 Estruturas Algébricas
é um homomorfismo de anéis. De fato, f (a + b)= a + b = a + b = f (a) + f (b)
e f (ab)= a × b = a × b = f (a) f (b) . Esse homomorfsmo é unitário, pois f (1)= 1 .
Dado a Î Zn , temos a = f (a) , logo Im f = Zn . O núcleo de f é dado por
ker f = { k Î Z| f (k)= 0} . Como f (k)= 0 é equivalente a k = 0 , temos que k Î Zn
se, e somente se, k = 0 , isto é, se e somente se, n| k . Dessa forma, ker f = nZ ,
conjunto dos múltiplos de n . Já vimos, na aula 3, que esse conjunto é um ideal.
Vale observar que, pelo Teorema 2, item (c), nZ = ker f implica diretamente que
nZ é um ideal de Z . Em geral, podemos usar esse argumento para mostrar que
um dado subconjunto I de um anel A é ideal desse anel: basta encontrar um
homomorfismo f : A ® B cujo núcleo seja I .

EXEMPLO 2:
Sabemos que o corpo dos números complexos pode ser representado
pelo conjunto C = { (a, b)| a, b Î R} de pares ordenados de números reais, com
as operações (a, b) + (c, d)= (a + c, b + d) e (a, b) × (c, d)= (ac - bd, ad + bc) .
A função f : R® C , dada por f (x)= (x,0) , é um homomorfismo
injetor. De fato, f (x + y)= (x + y,0)= (x,0) + ( y,0)= f (x) + f ( y) e
f (xy)= (xy,0)= (x,0) × ( y,0)= f (x) f ( y) . Para a injetividade, basta ver que
f (x)= f ( y) implica que (x,0)= ( y,0) , ou seja, x = y . Mais adiante veremos
que a injetividade decorre de um resultado mais geral. A existência desse
homomorfismo injetor f : R ® C é expressa dizendo-se que R pode ser imerso em
C. Interpretamos tal homomorfismo como uma inclusão e escrevemos R Ì C , mas,
na verdade, R não está contido em C . O que ocorre, na verdade, é que R;Im f e
Imf Ì C . Costumamos dizer, também, que R possui uma cópia contida em C (no
caso, essa cópia é Imf ).

EXEMPLO 3:
Seja Q[x ] o anel dos polinômios na indeterminada x , com coeficientes em
Q e considere a função f : Q[x ] ® R dada por f ( p(x))= p( 2) . Por exemplo,
f (1+ x2 )= 1+ ( 2)2 = 3 , f (2x + 1)= 2 2 + 1 , f (x3 + x + 1)= 8 + 2 + 1 .
A função f é um homomorfismo de anéis. Para verificarmos isso,
observemos que, se p(x) e q(x) são polinômios com coeficientes
racionais, então f ( p(x) + q(x))= p( 2) + q( 2)= f ( p(x)) + f (q(x)) e
f ( p(x)q(x))= p( 2)q( 2)= f ( p(x)) f (q(x)) . O homomorfismo f é chamado
homomorfismo de avaliação em 2 . O núcleo de f é formado pelos
polinômios de Q[x ] que se anulam em 2 , ou seja, p(x) Î ker f se, e somente

AULA 4 TÓPICO 1 55
se, p( 2)= 0 . Por exemplo, x2 - 2 Î ker f . Dado p(x) Î ker f , podemos escrever
p(x)= (x2 - 2)q(x) + r (x) , onde r (x) é um polinômio de grau 1 (faremos um estudo mais
aprofundado sobre polinômios na aula 6). Assim, podemos escrever r (x)= a + bx ,
com a, b Î Q . Como p( 2)= 0 , temos 0= p( 2)= (( 2)2 - 2)q( 2) + r ( 2) , ou
seja, r ( 2)= 0 , o que significa que a + b 2 = 0 . Se b ¹ 0 , então poderíamos
a
escrever 2 = - Î Q , o que é absurdo, pois 2 não é racional. Por essa razão,
b
b = 0 e a + 0× 2 = 0 , o que implica a = 0 . Consequentemente, r (x)= 0 (polinômio
identicamente nulo) e p(x)= (x2 - 2)q(x) . Acabamos de mostrar que todo elemento
p(x) de ker f é múltiplo de x2 - 2 . Portanto ker f Ì (x2 - 2) , o ideal gerado pelo
polinômio x2 - 2 . Como x2 - 2 Î ker f , a outra inclusão também ocorre e vale a
igualdade ker f = (x2 - 2) .

Podemos caracterizar a sobrejetividade de uma função f usando a sua


imagem. Mais precisamente, f : A ® B é sobrejetiva se, e somente se, Im f = B .
No caso em que f é um homomorfismo, podemos caracterizar a injetividade de f
por meio de seu núcleo:

Teorema3 Um homorfismo de anéis é injetor f : A ® B se, e somente se, ker f ={0}

Demonstração:
Se f é injetiva e x Î ker f , então f (x)= 0= f (0) , logo x = 0 . Reciprocamente,
se ker f = { 0} e x, y Î A são tais que f (x)= f ( y) , então f (x) - f ( y)= 0 , isto é,
f (x - y)= 0 . Isso implica que x - y Î ker f = { 0} , ou seja, x = y .
A injetividade do homomorfismo, no caso do exemplo 2 acima, vale em um
contexto mais geral. De fato, temos o seguinte resultado.

Teorema4 Se K é um corpo e f : K ® B é um homomorfismo de anéis, então temos


duas possibilidades:
1. f é identicamente nulo, isto é, f (x)= 0 , para todo x Î K , ou
2. f é injetivo.

56 Estruturas Algébricas
Demonstração:
Suponha que não ocorre o primeiro caso, isto é, f não é identicamente
nulo. Então ker f é um ideal próprio de K , ou seja, ker f ¹ K . Como K é um
corpo, seus únicos ideais são { 0} e K e ker f ¹ K , temos, necessariamente, que
ker f = { 0} . Pelo Teorema 3, f é injetor.
Com esse resultado, finalizamos nosso primeiro tópico. Vimos aqui a definição
de homomorfismo de anéis, suas propriedades básicas e alguns exemplos. Vimos
ainda que, associados a um homomorfismo de anéis, f : A ® B é um ideal de A ,
o núcleo de f , e um subanel de B, a imagem de f , e que podemos caracterizar a
injetividade e a sobrejetividade de f por meio desse ideal e desse subanel.

AULA 4 TÓPICO 1 57
TÓPICO 2 Anel quociente
O bjetivos
• Definir anel quociente
• Caracterizar ideais primos e maximais por meio de anéis
quocientes

N este tópico, construiremos, para um anel dado A e um ideal I


de A , o anel quociente de A por I . Essa construção segue os
mesmos moldes da construção de grupo quociente que fizemos
na aula 2. Essa construção terá papel central no estudo mais aprofundado que
faremos dos homomorfismos, no tópico 3. Veremos, ainda, como caracterizar
um ideal primo, ou maximal, de acordo com as propriedades do anel quociente
associado.
No que se segue, continuaremos a considerar, salvo menção em contrário,
apenas anéis comutativos e com unidade. Seja, pois, A um anel e I um ideal de
A . Vamos definir uma relação de equivalência entre elementos de A , relativa a I ,
da seguinte maneira:
Dados a, b Î A , dizemos que a e b são congruentes módulo I e indicamos
a º b se a - b Î I .
O nosso primeiro passo é mostrar que essa relação é, de fato, uma relação de
equivalência.

Lema5 A relação º definida acima é uma relação reflexiva, simétrica e transi-


tiva, logo, uma relação de equivalência.

58 Estruturas Algébricas
Demonstração:
Dado a Î A , temos a - a = 0 Î I , logo a º a e a relação é reflexiva.
Se a, b Î A são tais que a º b , então a - b Î I , logo b - a = (-1)(a - b) Î I ,
ou seja, b º a e a relação é simétrica. Finalmente, se a º b e b º c , então a - b Î I
e b - c Î I . Somando, obtemos a - c = (a - b) + (b - c) Î I , ou seja, a º c e a
relação é transitiva.
Dado a Î A , o conjunto dos elementos de A que são congruentes a a ,
módulo I é denotado por a . Assim,
a = { x Î A | x º a} = { x Î A | x - a Î I } .
É claro que a Î a . O conjunto a é chamado classe de equivalência módulo
I e também é denotado por a + I , sendo essa última notação bem mais sugestiva,
pois podemos ver cada classe de equivalência como uma “translação”’ do ideal I .
O elemento a é chamado representante da classe. Em geral, qualquer elemento de
a pode ser escolhido como um representante de a , pois b Î a implica que b = a .

EXEMPLO:
Se A = Z e I = 5Z , o ideal formado pelos múltiplos de 5, então a e b ,
inteiros, são equivalentes se, e somente se, a - b Î 5Z , isto é, 5| a - b . Dado a Î Z
, temos a = 5k + r , onde r Î { 0,1,2,3,4} é o resto da divisão de a por 5. Como só
há cinco possibilidades para o resto r dessa divisão e a - r = 5k Î Z , temos que
a Î r , e Z = 0 È 1È 2 È 3 È 4 .
O conjunto formado pelas classes de equivalência relativas a I é chamado
conjunto quociente e é denotado por A / I . Explicitamente, temos:
A / I = { a| a Î A} = { a + I | a Î A} .
Para que o conjunto quociente A / I
ganhe estrutura de anel, devemos definir sobre
ele duas operações:
g uarde bem i s s o ! • SOMA: a + b = a + b , e
Boa definição: Devemos notar que tanto a soma • PRODUTO: a × b = a × b .
quanto o produto de classes de equivalência são
definidos usando-se os representantes dessas É preciso mostrar que essas operações
classes. Assim, faz sentido perguntar se essas estão bem definidas, e desse modo não dependem
operações realmente independem das escolhas das escolhas dos representantes das classes, e
desses representantes. Para esclarecer esse ponto, também satisfazem as condições da definição de
exibimos um exemplo. anel.

AULA 4 TÓPICO 2 59
EXEMPLO:
Consideremos A = Z e I = 5Z , como no exemplo acima. Observemos as
seguintes igualdades entre classes: 1= 6 e 3= 8 . Se calcularmos a soma 1+ 3 ,
obteremos 1+ 3= 1+ 3= 4 . Por outro lado, 6 + 8= 14 , mas 14= 4 , pois 14 - 4= 10 ,
que é múltiplo de 5. Da mesma forma, 1× 3= 3 e 6× 8= 48= 3 , pois 48 - 3= 45 ,
que é múltiplo de 5. Logo, nesse caso particular, a soma e o produto não dependem
dos representantes escolhidos. Iremos, a seguir, mostrar que essa independência
vale sempre.
Fixado um anel A e um ideal I de A , sejam a1 , a2 , b1 , b2 Î A tais que
a1 - a2 Î I e b1 - b2 Î I , ou seja, a1 = a2 e b1 = b2 . Queremos mostrar que
a1 + b1 = a2 + b2 . Isso é equivalente a mostrar que a1 + b1 = a2 + b2 . Veja que
(a1 + b1 ) - (a2 + b2 )= (a1 - a2 ) + (b1 - b2 ) Î I , logo a1 + b1 = a2 + b2 , como
queríamos demonstrar. Para o produto, queremos mostrar que a1 × b1 = a2 × b2 . Temos
o seguinte: a1b1 - a2b2 = a1b1 - a1b2 + a1b2 - a2b2 = a1 (b1 - b2 ) + b2 (a1 - a2 ) Î I , pois
a1 - a2 Î I , b1 - b2 Î I e I é um ideal. Assim, a1b1 = a2b2 , o que é equivalente à
igualdade a1 × b1 = a2 × b2 , como queríamos demonstrar.

Condições da definição de anel: Verificaremos apenas algumas das


condições da definição de anel. As verificações omitidas podem ser feitas de modo
análogo.
1. Associatividade do produto: dados a, b, c Î A / I , temos:
a × (b× c)= a × b× c = a × (b× c).
como vale a associatividade em A , temos a × (b× c)= (a × b) × c , logo,
a × (b× c)= (a × b) × c = a × b× c = (a × b) × c.
A associatividade da soma é totalmente similar.

2. Comutatividade da soma: dados a, b Î A / I , temos: a + b = a + b .


Como a + b = b + a em A , pois A é um anel, temos a + b = b + a = b + a .
No caso em que A é comutativo, a comutatividade do produto em A / I
pode ser demonstrada como fizemos acima para a soma.

3. Existência de elemento neutro para a soma: se 0 Î A é o elemento


neutro da soma em A , então a + 0= a + 0= a . Logo, 0 é o elemento neutro da
soma em A / I .

60 Estruturas Algébricas
No caso em que A é um anel com unidade 1Î A , o anel A / I também
possui um elemento neutro para o produto: 1. De fato, 1× a = 1× a = a = a × 1= a × 1 .

4. Distributividade: dados a, b, c Î A / I , temos:


a × (b + c)= a × (b + c)= a × (b + c).
Como vale a distributividade em A , temos:
a × (b + c)= ab + ac = ab + ac = a × b + a × c.

Vamos agora demonstrar um resultado importante que relaciona certos


propriedades dos ideais com propriedades dos anéis quocientes a eles associados.

Teorema6 Seja A um anel comutativo com unidade e I um ideal de A .


1. I é um ideal primo se, e somente se, A / I é um domínio de integridade.
2. I é um ideal maximal se, e somente se, A/I é um corpo.

Demonstração: Suponhamos, primeiro, que I é um ideal primo. Dados


a, b Î A / I tais que a × b = 0 , temos ab = 0 , logo ab - 0 Î I , ou seja, ab Î I . Como
I é ideal primo, temos que a Î I ou b Î I . No primeiro caso, a = 0 ; e no segundo
caso, b = 0 . Isso mostra que A / I é um domínio.
Reciprocamente, se A / I é domínio e a, b Î A são tais que ab Î I , então ab = 0 ,
isto é, a × b = 0 . Como A / I é dompinio, essa última igualdade implica que a = 0
ou b = 0 e isso é equivalente a a Î I ou b Î I . Logo, I é ideal primo.
Suponhamos, agora, que I é um ideal maximal. Dado a Î A / I , a ¹ 0 ,
/ I . Assim, o ideal J = I + aA = { x + ay| x Î I , y Î A} contém I
temos que a Î
/ I . Como I é maximal, devemos ter J = A , em
propriamente, pois a Î J e a Î
particular, 1Î J , ou seja, podemos escrever 1= x + ay , com x Î I e y Î A . Dessa
forma, 1= x + a × y e, como x Î I , temos x = 0 ,
logo 1= a × y . Encontramos, pois, um inverso
para o elemento não-nulo a de A / I . Isso
s aiba mais ! mostra que A / I é corpo.
Para mais informações sobre anel Quociente, acesse Reciprocamente, suponhamos que A / I é
o link http://www.mat.ufmg.br/~marques/ corpo e consideremos um ideal J de A tal que
Apostila-Aneis.pdf I Ì J Ì A . Devemos mostrar que J = I ou J = A
. Se J = I nada há a fazer. Logo, podemos supor
que J ¹ I , ou seja, que existe a Î J , a Î
/I .

AULA 4 TÓPICO 2 61
Isso significa que a ¹ 0 e, como A / I é corpo, existe y Î A / I tal que a × y = 1 ,
ou seja, 1- ay = x Î I . Agora, x Î I Ì J e a Î J implicam que 1= x + ay Î J . Pelo
Teorema 6, item 1, da aula 3, temos J = A . Isso mostra que I é maximal.
Com esse resultado, encerramos nosso segundo tópico, que tratou da
construção de um anel quociente a partir de um anel e de um ideal desse anel.

62 Estruturas Algébricas
TÓPICO 3 O teorema fundamental dos
homorfismos de anéis
O bjetivos
• Identificar o teorema fundamental dos homomorfismos
de anéis
• Reconhecer algumas aplicações desse teorema

E ste é o terceiro e último tópico da nossa aula 4. Nele estudaremos


a relação que existe entre anéis quociente e homomorfismos. Essa
relação é estabelecida no Teorema Fundamental dos Homomorfismos
de Anéis. Esse é um teorema análogo àquele que vimos na aula 2 para grupos.
Consideremos um homomorfismo de anéis f : A ® B . Já vimos, no Teorema
2, que ker f é um ideal de A e Imf é um subanel de B . Assim, é possível
A / ker f
considerarmos o anel quociente . O objetivo principal deste tópico é
demonstrar que A / ker f é isomorfo ao subanel Imf . Lembremos que dois anéis
são ditos isomorfos se existe um homomorfismo bijetor entre eles.

Teorema7 (Teorema Fundamental dos Homomorfismos de Anéis) Dado um


homomorfismo de anéis f : A ® B , temos
A / ker f @ Im f ,
ou seja, o anel quociente A / ker f é isomorfo ao subanel Imf de B.

Demonstração:
Vamos exibir um isomorfismo entre A / ker f e Imf . Mais explicitamente,
seja F : A / ker f ® Im f dada por
F(a)= f (a).

AULA 4 TÓPICO 3 63
Vamos mostrar que F é um homomorfismo bijetor.
Em primeiro lugar, devemos verificar que F está bem definida. Isso significa
verificar que F(a) não depende do representante da classe a . Em outras palavras,
se a = b , devemos mostrar que F(a)= F(b) . Se a = b , então a - b Î ker f , logo
f (a - b)= 0 e isso implica que f (a) - f (b)= 0 , ou seja, f (a)= f (b) . Portanto,
F(a)= f (a)= f (b)= F(b) , como queríamos demonstrar.
Vamos, agora, mostrar que F é um homomorfismo.
Se a, b Î A / ker f , então F(a + b)= F(a + b)= f (a + b)= f (a) + f (b)= F(a) + F(b)
e F(a × b)= F(ab)= f (ab)= f (a) f (b)= F(a)F(b) .
Para demonstrar a injetividade de F , usaremos o Teorema 3 desta aula e
assim mostraremos que ker F = { 0} . Se a Î ker F , então F(a)= 0 , isto é, f (a)= 0 .
Isso implica que a Î ker f e, portanto, a = 0 em A / ker f , o que mostra que F
é injetiva.
Finalmente, para demonstrarmos a sobrejetividade de F , consideremos
y Î Im f . Existe, então, a Î A tal que f (a)= y e, assim, F(a)= f (a)= y . Dessa
maneira, mostramos que, dado y Î Im f , existe a Î A / ker f tal que F(a)= y ,
logo F é um homomorfismo sobrejetor.

Como primeira aplicação do Teorema 7 acima, vamos revisitar o Exemplo 3,


dado no primeiro tópico desta aula.

EXEMPLO:
Como já vimos no Exemplo 3, na página 54 , f : Q[x ] ® R ,
dado por f ( p(x))= p( 2) , é um homomorfismo, com núcleo
2 2
ker f = (x - 2)= { (x - 2)q(x)| q(x) Î Q[x ]} , o ideal formado pelos múltiplos de
x2 - 2 . A imagem de f é
Im f = { p( 2)| p(x) Î Q[x ]} .
Podemos descrever essa imagem de um modo mais explícito, se
notarmos que ( 2)n Î Q se n é par, e ( 2)n = r 2 , com r Î Q , se n é
ímpar. Assim, se p(x)= a0 + a1x +  + amxm , com a0 , a1 ,, am Î Q , então
p( 2)= a0 + a1 2 +  + am ( 2)m . Nessa última soma há dois tipos de parcelas:
i
quando i for par ai ( 2)i será um número racional, e quando i for ímpar, ai ( 2 )
será do tipo r 2 , com r Î Q . Portanto, podemos escrever p( 2)= a + b 2 , onde
a, b Î Q . Assim,
Im f = { a + b 2| a, b Î Q} .

64 Estruturas Algébricas
Esse último conjunto é denotado por Q[ 2] . O Teorema Fundamental dos
Homomorfismos de Anéis nos diz, portanto, que

Q[x ] / ker f @ Im f , ou seja,

Q[x ] / (x2 - 2) @ Q[ 2].

Como um isomorfismo desse tipo pode nos ser útil? A principal utilidade
de um isomorfismo é que podemos usá-lo para transferir um problema
de um contexto para outro de modo que a solução do problema possa ser
simplificada. Ilustraremos essa ideia geral, respondendo à seguinte pergunta:

O ideal (x2 - 2) é maximal em Q[x ] ?

De acordo com o item 2 do Teorema 6, (x2 - 2) é maximal se, e somente se,


Q[x ] / (x2 - 2) é um corpo. Mas, como Q[ 2] é isomorfo a Q[x ] / (x2 - 2) , temos
2
que Q[x ] / (x - 2) é um corpo se, e somente se, Q[ 2] é corpo (veja o exercício 2
de aprofundamento).
Vamos, então, verificar que Q[ 2] é corpo. De fato, se a + b 2 Î Q[ 2] é
diferente de zero, então a ¹ 0 e b ¹ 0 . Logo,

1 1 a- b 2 a- b 2 a b
= × = 2 2
= 2 2
- 2 × 2.
a+ b 2 a+ b 2 b 2 a - 2b a - 2b a - 2b2

Esse é um procedimento conhecido como racionalização (veja o Exemplo


8, tópico 1, aula 3). Observe que a2 - 2b2 não pode ser igual a zero, pois, se
a
a2 - 2b2 = 0 , teríamos 2 = , com a e b racionais, o não é possível, devido a
b
2 ser irracional.
a -b
Assim, sendo 2 2
e 2 2
números racionais, temos que
1 a - 2b a - 2b
Î Q[ 2] . Isso significa que todo elemento não-nulo de Q[ 2] tem um
a+ b 2
inverso em Q[ 2] , ou seja, Q[ 2] é um corpo. Pelo que discutimos acima, isso
implica que (x2 - 2) é um ideal maximal em Q[x ] .
Outro fato importante sobre homomorfismos de anéis é o teorema a seguir,
conhecido como Teorema da Correspondência. Esse teorema estabelece uma
correspondência entre os ideais de dois anéis entre os quais há um homomorfismo

AULA 4 TÓPICO 3 65
sobrejetor. Lembremos a seguinte notação: se I é um subconjunto de A e
f : A ® B é uma função, então f (I )= { f (x)| x Î I } . Da mesma forma, se J é um
subconjunto de B , então f -1 (J)= { a Î A | f (a) Î J} .

Teorema (Teorema da Correspondência) Seja f : A ® B um homomorfismo


sobrejetor de anéis e N = ker f . Temos o seguinte:
Existe uma correspondência bijetiva
1. {Ideais que contêm N} Û {Ideais de B}
dada por I  f (I ) .
2. Dados I 1 e I 2 ideais de A , contendo N , temos I 1 Ì I 2 se, e somente
se, f (I 1 ) Ì f (I 2 ) .

Demonstração:
1. Dado um ideal I de A , vamos mostrar que f (I ) é um ideal de B.
Se x, y Î f (I ) , então existem a, b Î I tais que f (a)= x e f (b)= y . Assim,
x + y = f (a) + f (b)= f (a + b) Î f (I ) . Se b Î B , então b x = b f (a) . como f é
sobrejetor, existe a Î A tal que f (a )= b . Assim, b x = f (a ) f (a)= f (aa) Î f (I ) .
Dessa forma, mostramos que f (I ) é um ideal de B.
Por outro lado, seja J um ideal de B. Vamos mostrar que
f -1
(J)= { a Î A | f (a) Î J} é um ideal de A . Para isso, tomemos a, b Î f -1 (J) .
Então f (a) Î J e f (b) Î J , logo f (a + b)= f (a) + f (b) Î J , ou seja, a + b Î f -1 (J) .
Se a Î A e a Î f -1 (J) , então f (aa)= f (a ) f (a) Î J , pois f (a) Î J e J é um ideal.
Assim, alpha a Î f -1 (J) . Dessa forma, I = f -1 (J) é um ideal de A .
Observemos, agora, que, se N = ker f , então f (N )= { 0} Ì J . Isso significa que,
se a Î N , então f (a)= 0 Î J , logo a Î f -1 (J) para todo a Î N , ou seja, N Ì f -1 (J)= I .
Isso mostra que, para cada ideal J de B, o ideal I = f -1 (J) de A contém N .
Vamos, agora, mostrar que f (I )= J . Essa é uma igualdade entre conjuntos.
Logo, precisamos mostrar que cada um dos conjuntos está contido no outro. A
inclusão f (I ) Ì J segue diretamente da definição de I : dado a Î I = f -1 (J) ,
temos que f (a) Î J . Para demonstrarmos a inclusão inversa, tomemos b Î J .
-1
Como f é sobrejetiva, existe a Î A tal que f (a)= b Î J , logo a Î f (J)= I e
b = f (a) Î f (I ) .
Sejam, agora, I e I ¢ dois ideais de A , contendo N , tais que f (I )= f (I ¢) .
Vamos mostrar que I = I ¢ . Se a Î I , então f (a) Î f (I )= f (I ¢) , logo existe a¢ Î I ¢
tal que f (a)= f (a¢) . Isso implica que f (a - a¢)= 0 , ou seja, a - a¢ Î ker f = N Ì I ¢ .

66 Estruturas Algébricas
Portanto, a = a¢ + y , com a¢, y Î I ¢ e isso mostra que a Î I ¢ , logo vale a inclusão
I Ì I ¢ . Para mostrarmos a validade da outra inclusão, basta tomarmos a¢ Î I ¢ e
procedermos exatamente da mesma maneira, atentando para o fato de que N Ì I .
2. Se I 1 Ì I 2 e x Î f (I 1 ) , então x = f (a) , com a Î I 1 Ì I 2 , logo, x = f (a) Î I 2 .
Isso mostra que f (I 1 ) Ì f (I 2 ) .
Reciprocamente, se f (I 1 ) Ì f (I 2 ) e a Î I 1 , então f (a) Î f (I 1 ) Ì f (I 2 ) . Logo,
existe b Î I 2 tal que f (a)= f (b) . Daí, temos f (a - b)= 0 , ou seja, a - b = c Î N Ì I 2 .
Portanto, a = b + c Î I 2 e isso mostra que I 1 Ì I 2 .
Como aplicação do Teorema 8 acima, vamos exibir, por meio de um exemplo,
como determinar todos os ideais de um anel finito.

EXEMPLO:
Vamos, a seguir, determinar todos os
ideais de Z6 . Devemos, para isso, considerar o
s aiba mais !
homomorfismo f : Z ® Z6 , dado por f (n)= n ,
Para mais informações acesse o link http://
onde a barra indica classe de equivalência
www.mat.uc.pt/~picado/algebraII/0405/
módulo 6. Esse homomorfismo é
Apontamentos/aula4.pdf
sobrejetor e ker f = 6Z . Pelo Teorema 8,
os ideais de Z6 são exatamente aqueles
do tipo f (I ) , onde I é um ideal de Zker f = 6Z .
que contêm
Já vimos no primeiro exemplo do Tópico 3, aula 3, os ideais de Z são todos
principais, isto é, são todos do tipo mZ , com m Î Z , m³ 0 . Se 6Z Ì mZ , então
m| 6 . Os divisores positivos de 6 são 1,2,3 e 6 . Assim, os únicos ideais de Z6
são f (mZ) , como m = 1,2,3 ou 6 . Como f (mZ)= mZ6 (veja o exercício 1 de
aprofundamento), temos que os ideais de Z6 são 1Z6 = Z6 , 2Z6 , 3Z6 e 6Z6 = { 0} .

Terminamos aqui o terceiro tópico e nossa aula 4. Os homomorfismos de anéis


aqui estudados são ferramentas úteis na resolução de problemas envolvendo anéis,
pois nos permitem tranferir um problema para um contexto onde sua solução é
mais simples. Os principais resultados vistos nessa aula são o Teorema Fundamental
dos Homomorfismos de Anéis e o Teorema da Correspondência. Nas próximas aulas
veremos mais aplicações dos homomorfismos de anéis.

AULA 4 TÓPICO 3 67
at iv ida d e d e a p r of u da m e n t o

1. Seja n Î Z , n > 1 . Considere o homomorfismo f : Z ® Zn , dado por f (m)= m . Mostre que


f (aZ)= aZn .

2. Seja f : A ® B um isomorfismo de anéis. Mostre que


(a) A é um domínio de integridade se, e somente se, B também é um domínio.
(b) A é um corpo se, e somente se, B também é um corpo.

3. Em cada um dos itens abaixo, mostre que o homomorfismo em questão é sobrejetivo e determine seu
núcleo.
(a) f : Z ® Z8 , dado por f (n)= n .
(b) f : Q[x, y] ® Q[x ] , dada por f (P(x, y))= P(x,0) , onde x, y e t são indeterminadas.
(c) f : R[x ] ® C , dada por f (P(x))= P(i ) , onde i 2 = -1 .

-1 + i 3
4. Seja f : Q[x ] ® C , dada por f (P(x))= P(w ) , onde w = . Mostre que
2
(a) ker T = (x3 - 1) .
(b) ImT = { a + bw + cw 2 | a, b, c Î Q} .

5. Usando os homomorfismos sobrejetores do problema anterior, mostre que


(a) Z / 8Z @ Z8 .
(b) Q[x, y] / ( y) @ Q[x ] .
(c) R[x ] / (x2 + 1) @ C .

6. Seja C[0,1] o conjunto das funções contínuas f : [0,1] ® R .


(a) Verifique que, com a soma e o produto definidos por ( f + g)(x)= f (x) + g(x) e
( f × g)(x)= f (x) × g(x) , o conjunto C[0,1] tem uma estrutura de anel comutativo com unidade.
(b) Fixado a Î [0,1] , mostre que I a = { f Î C[0,1]| f (a)= 0} é um ideal de C[0,1] .
(c) Mostre que a função
Y a : C[0,1] ® R
dada por Y a ( f )= f (a) , é um homomorfismo sobrejetor.
(d) Mostre que C[0,1] / I a é isomorfo a R . O que podemos afirmar sobre o ideal I a ?

1 1
7. Seja C[0,1] como no exercício anterior. Mostre que I = { f Î C[0,1]| f ( )= f ( )= 0} é um ideal de
3 2
C[0,1] . O ideal I é maximal?

68 Estruturas Algébricas
8. Seja V um espaço vetorial sobre um corpo K e A(T ) o conjunto de todos os operadores lineares de V ,
isto é, o conjunto de todas as tranformações lineares T : V ® V .
(a) No curso de Álgebra Linear, demonstra-se que A(V ) é um espaço vetorial sobre K , com a
soma e o produto por escalares definidos por
(T1 + T2 )(v)= T1 (v) + T2 (v) e (a × T1 )(v)= a × T1(v),
onde T1 ,T2 Î A(V ) e a Î K . Verifique se isso realmente ocorre.
(b) Considere, em A(V ) , o seguinte produto:
(T1 × T2 )(v)= T1 (T2 (v)) ,
onde T1 ,T2 Î A(V ) . Mostre que, com esse produto e a soma do item anterior, A(T ) é um anel
não comutativo.
(c) Seja f :V ® W uma transformação linear bijetiva. Mostre que
f * : A(V ) ® A(W ) ,
dada por f * (T )= f  T  f-1 , é um isomorfismo de anéis.
(d) Conclua que, se V e W são espaços vetoriais de mesma dimensão (finita), então A(V ) e
A(W ) são anéis isomorfos.

9. Seja A um anel com unidade e


f:Z® A
um homomorfismo, definido por
(a) Verifique que f é, de fato, um homomorfismo.
(b) O núcleo de ker f é um ideal de Z , logo é do tipo nZ , com n Î Z , n³ 0 . Por quê? O
número n é chamado característica do anel A (outra definição de característica de um anel já foi
dada na aula 3, tópico 2. As duas definições são equivalentes).
(c) Mostre que, se A é um domínio de integridade, o número inteiro n obtido no item anterior é
igual a zero ou igual a um número primo. Em outras palavras, a característica de um domínio de
integridade é igual a zero ou um número primo.

10. Seja K um corpo e P a interseção de todos os subcorpos de K . Demonstre que P é o menor


subcorpo de K . Chamamos P de corpo primo de K .

11. Seja K um corpo e P o corpo primo de K (veja a questão anterior). Mostre que:
(a) Se a característica de K é igual a zero, então P @ Q .
(b) Se a característica de K é igual a p ( p primo), então P @ Z p .

12. Seja f : Z ® Z um homomorfismo. Mostre que f (n)= 0 para todo n Î Z ou f (n)= n , para
todo n Î Z .

AULA 4 TÓPICO 3 69
AULA 5 Domínios
fatoriais

Olá aluno(a),

Nesta aula, estudaremos os domínios de integridade onde vale um resultado


análogo ao Teorema Fundamental da Aritmética, ou seja, onde elementos que não
são invertíveis admitem decomposição única como produto de “primos”. Esses
domínios são chamados domínios fatoriais ou dominios de fatoração única.

No curso de Teoria dos Números, vimos que os números inteiros têm a seguinte
propriedade notável: dado um número inteiro maior do que 1, esse número é
um primo ou pode ser escrito como produto de um número finito de primos de
modo único. Apesar de parecer, à primeira vista, uma propriedade de menor
importância, essa unicidade é, de fato, essencial para quase toda aritmética que
se desenvolve posteriormente. Isso justifica o nome “Teorema Fundamental da
Aritmética”, que se dá a essa propriedade dos inteiros. Dessa forma, vale muito a
pena isolar essa propriedade (a unicidade da decomposição em primos) e procurar
os anéis onde ela continua válida. Como em anéis que não são domínios podemos
ter comportamentos bastante anômalos (basta lembra que o produto de dois
elementos não nulos pode ser zero em um anel que não é domínio), a primeira
restrição que devemos fazer é considerar apenas domínios de integridade.

Objetivos

• Identificar os domínios de integridade onde vale a propriedade da fatoração


única
• Construir o corpo de frações de um domínio de integridade dado

70 Estruturas Algébricas
TÓPICO 1 Domínos euclidianos, domínios de
ideais principais e domínios fatoriais
O bjetivos
• Identificar uma relação de divisibilidade em um
domínio arbitrário
• Estabelecer de modo preciso as noções de primo e
de irredutível em um domínio
• Definir, exibir exemplos e estabeler a relação
entre domínios euclidianos, de ideais principais e
fatoriais

D e início, relembremos que um domínio de integridade A é um


anel comutativo com unidade no qual vale, para a, b Î A ,
a × b = 0 Þ a = 0 ou b = 0.
Neste tópico, consideraremos três tipos de domínios que têm propriedades
similares àquelas do anel dos inteiros que estudamos no curso de Teoria dos
Números: os dominios euclidianos, nos quais podemos fazer divisões com resto,
os domínios de ideais principais, os quais cada ideal é gerado por um único
elemento, e, finalmente, os dominios de fatoração única, ou fatoriais, nos quais
cada elemento que não é invertível é irredutível ou pode ser escrito como produto
de irredutíveis de modo único.
Podemos estabelecer em um domínio A uma noção de divisibilidade similar
a dos inteiros. Mais precisamente, se a, b Î A , dizemos que a divide b , ou que b é
divisível por a , ou ainda que b é múltiplo de a , se existe c Î A tal que b = a × c .
Denotamos a| b.
Um elemento u Î A é chamado unidade se u| 1 , isto é, se existe v Î A tal
que uv = 1 . O elemento v é único e é chamado inverso de u . O conjunto das
unidades de A é denotado por A * e tem, com o produto de A , uma estrutura de
grupo.

AULA 5 TÓPICO 1 71
A relação de divisibilidade é reflexiva,
isto é, a| a , para todo a Î A , pois a = a ×1,
onde 1Î A é o elemento neutro do produto.
Também é transitiva, pois a| b e b| c implicam at e n ç ão!
que a| c . De fato, a| b implica que b = au , com
Se a, b Î A são associados, então os ideais
u Î A , e b| c implica que c = bv , com v Î  .
(a) = { a Î A |  Î A} e (b) = { mb| m Î A} ,
Logo c = bv = (au)v = a(uv) , com uv Î  e,
gerados por a e b , respectivamente, são iguais.
portanto, a| c . Se a| b e b| a , dizemos que a
De fato, sendo a e b associados, temos a = bu ,
e b são associados e denotamos a : b . Neste *
com u Î A . Se x Î (a) , então x = a , com
caso, existem u, v Î A tais que b = au e a = bv . x = ell (bu) = (ellu)b Î (b) .
ÎA, logo
Logo, b = au = bvu . Se b = 0 , então a = bv = 0 . Isso mostra que (a) Ì (b) . Por outro lado, se
Se b ¹ 0 , então b = bvu implica (porque A y Î (b) , então y = mb , com m Î A , logo
*
é domínio) que 1= vu , ou seja, u, v Î A . y = m(au-1 ) = (mu-1 )a Î (a) . Isso mostra
Reciprocamente, se u é unidade de A , então que (b) Ì (a) . Portanto, (a) = (b) .
-1
b = au implica que a = bu e, assim, a| b e
b| a . Resumindo, dois elementos a, b Î A são
associados se, e somente se, existe uma unidade u tal que b = au .

EXEMPLOS:
1. No domínio  dos números inteiros, temos  * = { -1,1} , isto é, as únicas
unidades de  são -1 e 1. Dois inteiros a e b são associados se, e somente
se | a|=| b| .
2. Em um corpo K , todo elemento não-nulo é invertível, logo K * = K -{ 0} .
Isso significa que dois elementos não-nulos quaisquer x, y Î K são
associados.

Uma decomposição de um elemento d Î A é uma expressão de d como


produto de outros elementos de A , isto é, d = ab , com a, b Î A . Se um desses
elementos (digamos, a ) é uma unidade, então o outro (no caso, b ) é associado a
d e dizemos que a decomposição é trivial, ou imprópria. Um elemento p Î A ,
*
p Î A * , é dito irredutível se p = ab , com a, b Î A , implica que a Î A ou b Î A * ,
ou seja, p admite apenas decomposições triviais.
Um elemento p Î A , p Î A * , é dito primo se p| ab , com a, b Î A , implica
p| a ou p| b . No anel  dos inteiros um elemento é primo se e somente se for
irredutível. Veremos a seguir que isso nem sempre acontece. O que podemos
afirmar em geral é o seguinte.

72 Estruturas Algébricas
Lema1 Em um domínio de integridade, todo elemento primo é irredutível.

Demonstração:
Seja A um domínio de integridade. Seja p Î A um primo e p = ab uma
decomposição de p . Vamos mostrar que a Î A * ou b Î A * . Primeiro, como p = ab ,
temos que p| ab . Sendo p primo, p| a ou p| b . No primeiro caso, a = pc ,
com c Î A , logo p = ab = pcb . Como p é primo, podemos garantir que p ¹ 0 .
Cancelando p (pois A é domínio) obtemos 1= cb e, consequentemente, b Î A * .
Se p| b , podemos concluir, de modo análogo, que a Î A * .
A recíproca do Lema 1 não é válida em geral. De fato, exibiremos a seguir
um contraexemplo.

EXEMPLO:
Seja [ -5] = { a + b -5| a, b Î } . A discussão em torno do primeiro
exemplo do tópico 3 da aula 4 pode ser rapetida aqui para verificarmos que
[ -5]; [x ] / (x2 + 5) . Isso mostra de imediato que [ -5] é um anel,
embora possamos verificar isso diretamente. Mais ainda, podemos afirmar
que [ -5] é um domínio. De fato, se (a + b -5)(c + d -5) = 0 , então
(ac + 5bd) + (ad + bc) -5 = 0 . Como a, b, c, d Î  , essa última igualdade implica
bc
que ac + 5bd = 0 e ad + bc = 0 . Supondo a ¹ 0 , temos d = - , logo de
2
5b c a
ac + 5bd = 0 vem que ac - = 0 , ou seja, c(a2 - 5b2 ) = 0 . Como 5 não é
a
racional, temos c = 0 . Assim, ad + bc = 0 implica ad = 0 e, sendo a ¹ 0 , temos
d = 0 , portanto c + d -5 = 0 . Analogamente, se c ¹ 0 , obtemos a + b -5 = 0 .
Consideremos a função N : [ -5] ®  , dada por
N (a + b 5) = a2 + 5b2.
Notemos que, se z = a + b -5 e
z = a - b -5 denota o conjugado de z ,
então N (z) = zz . Uma consequência
direta dessa representação é que
g uarde bem i s s o !
N (zw) = (zw)(zw) = zzww = N (z)N (w) .
Iremos considerar funções como esta ainda
neste tópico, quando estudarmos os domínios
Agora mostraremos que o elemento
euclidianos.
2 + -5 é irredutível mas não é primo.
Precisaremos, para isso do seguinte resultado.

AULA 5 TÓPICO 1 73
Lema2 Um elemento z Î [ -5] é unidade se, e somente se, N (z) = 1.

Demonstração:
Se N (z) = 1, então zz = 1 , logo z é o
inverso de z e z é unidade. Reciprocamente,
se existe w Î [ -5] tal que zw = 1 , então
at e n ç ão!
N (zw) = N (1) = 1. Assim, N (z)N (w) = 1 . Como
N (z) e N (w) são inteiros positivos, a única A partir do Lema2 acima também podemos

possibilidade aqui é que N (z) = N (w) = 1 . concluir que [ -5]* = { ±1} .


De fato, N (±1) = (±1)2 = 1. Pelo Lema,
Se z = a + b -5 , então N (z) = 1 implica
±1Î [ -5] . Reciprocamente, se
que a2 + 5b2 = 1 , o que só possível se b = 0 e
z = a + b -5 Î [ -5] , então, pelo Lema,
*

a = ±1 , ou seja, z = ±1Î [ -5]* .


N (z) = 1. Assim, a2 + 5b2 = 1, com a, b Î  .
Isso só pode ocorrer se a = ±1 e b = 0 , ou
Voltando ao exemplo,
seja, se z = ±1.
observemos, agora que N (2 + -5) = 9 .
Se 2 + -5 = zw , então N (z)N (w) = 9
e, em particular, N (z)| 9 . Como N (z) ³ 0 , as únicas possibilidades são
N (z) = 1, N (z) = 3 ou N (z) = 9 . Se N (z) = 1, o Lema 2 nos diz que z é
unidade. Se N (z) = 9 , então N (w) = 1 e, novamente pelo Lema 2, w é
unidade. O caso N (z) = 3 é impossível, pois a2 + 5b2 não pode ser igual a 3 ,
se a, b Î  . Concluímos, então, que 2 + -5 é irredutível.
No entanto, 2 + -5 não é primo, pois 2 + -5 divide 3× 3 , mas 2 + -5 não
divide 3 . De fato, se 3 = (2 + -5)(a + b -5) , então 3 = (2a - 5b) + (a + 2b) -5 ,
o que implica 2a - 5b = 3 e a + 2b = 0 . Logo, a = -2b e 2a - 5b = 3 implicaria
-9b = 3 , com b Î  , o que é impossível.
Um domínio A é chamado domínio de ideais principais (DIP) se
todo ideal I de A for principal, isto é, gerado por um elemento x Î A . Mais
precisamente, se I é um ideal de A , então existe x Î A tal que
I = { ax| a Î A} .
O exemplo típico de DIP é o anel  . Demonstraremos isso mais adiante em
um contexto mais geral. A recíproca do Lema 1 vale em um DIP (e em particular
para  ).

74 Estruturas Algébricas
Teorema3 Em um DIP, um elemento é irredutível se, e somente se, for primo.

Demonstração:
O Lema 1 nos diz que todo primo é irredutível em qualquer domínio.
Reciprocamente, se A é um DIP, p Î A é irredutível e a, b Î A são tais que p| ab ,
então
( p, a) = { px + ay| x, y Î A}
é um ideal de A . Como A é um DIP, existe c Î A tal que ( p, a) = (c) . Em particular
p Î (c) , ou seja, c| p. Como p é irredutível, c Î A * ou c = up , com u Î A * . Neste
último caso, (a, p) = (c) = ( p) e, em particular, a Î ( p) , o que implica p| a . Por
outro lado, se c Î A * , então (c) = A e 1Î (c) = ( p, a) . Logo, existem x, y Î A tais
que
1= px + ay.
Multiplicando essa igualdade por b , obtemos
b = pbx + aby.
Como p| ab , temos que p| pbx + aby , isto é, p| b . Isso mostra que p é
primo.
Um domínio A é dito domínio de fatoração única (DFU) se valem as
seguintes condições:
1. Todo elemento não nulo de A que não é uma unidade pode ser escrito
como produto de um número finito de irredutíveis.
2. Todo elemento irredutível é primo.
O próximo resultado justifica o nome DFU:

Teorema4 Em um DFU todo elemento não nulo que não é uma unidade pode ser escrito
como produto de irredutíveis de modo único, a menos da ordem dos fatores no produto
e de produto por unidades.

Demonstração:
Seja A um DFU. Pela definição de DFU, basta demonstrar a unicidade. Se
p1  pr e q1 qt são duas fatorações de um mesmo elemento a Î A como produto
de irredutíveis, então p1 | q1 qt . Sendo p1 irredutível no DFU A , p1 também
é primo, logo p1 divide um dos qj . Após um reordenamento dos fatores, se
necessário, podemos assumir que p1 | q1 , isto é, q1 = u1 p1 . Como q1 é irredutível,
u1 é uma unidade. Podemos escrever, então

AULA 5 TÓPICO 1 75
p2 p3  pr = u1q2q3 qt .
Procedendo da mesma maneira, podemos assumir (após um reordenamento
dos fatores, se necessário) que p2 | q2 , ou seja, que q2 = u2 p2 , com u2 Î A * . Logo,
p3  pr = u1u2q3 qt
e, repetindo esse procedimento um número finito de vezes, de modo a cancelar o
maior número possível de irredutíveis, obteríamos, se r < t ,
1= u1¼ur qt -r qt ,
-1 -1
isto é, qt -r qr = u u , o que é impossível, pois um produto de irredutíveis
1 r

não pode ser uma unidade (veja a tarefa 2 desta aula). Do mesmo modo, supor r > t
nos levaria a uma contradição. Assim r = t e cada pi é associado a um qi . Vale,
portanto, a unicidade.
Uma coleção de ideais I j , com j ³1 , de um anel A é chamada cadeia
ascendente se I 1 Ì I 2 Ì  Ì I n Ì  . Uma cadeia ascendente é dita estacionária
se existe n ³1 tal que
I 1 Ì I 2 Ì  Ì I n-1 Ì I n = I n+1 = 
ou seja, se I j +1 = I j , para todo j ³ n.

Lema5 Seja A um domínio de ideais principais. Então toda cadeia ascendente de


ideais de A é estacionária.

Demonstração:
Dada uma cadeia ascendente de ideais I 1 Ì I 2 Ì , seja, para cada j , aj o
gerador de I j , isto é, I j = (aj ) . Seja I = È j ³1I j a união de todos os ideais dessa
cadeia. Afirmamos que I é um ideal de A . De fato, I contém cada I j , logo não
é vazio. se x, y Î I , então x Î I j e y Î I k , com j ³1 e k ³1 . Se j £ k , então
x Î I j Ì I k , logo x + y Î I k Ì I . Se k £ j , então y Î I k Ì I j e x + y Î I j Ì I . Se
a Î A e x Î I , então x Î I j , para algum j ³1 , logo ax Î I j Ì I . Assim, I é um
ideal do DIP A . Consequentemente, existe a Î A tal que I = (a) . Como a Î I
, existe n ³1 tal que a Î I n = (an ) , ou seja, an | a . Por outro lado, an Î I = (a)
implica que a| an . Assim, a e an são associados e I = (a) = (an ) = I n . Agora, se
k ³ n, então I n Ì I k Ì I = I n , logo I k = I n e a cadeia é estacionária.
A condição toda cadeia ascendente é estacionária é chamada condição das
cadeias ascendentes (CCA). O resultado acima é caso particular de um teorema
devido à matemática alemã Emmy Noether, que afirma serem equivalentes a CCA

76 Estruturas Algébricas
e a finitude do número de geradores dos ideais de A , isto é, dado um ideal I de
A existem a1,¼, ar Î A tais que I = (a1,¼, ar ) = { a1a1 +  + ar ar | ai Î A} . Anéis
satisfazendo uma dessas condições são chamados noetherianos em homenagem a
ela.

Teorema6 Todo domínio de ideais principais é um domínio de fatoração única.

Demonstração:
Já mostramos que, em um DIP, todo irredutível é primo. Basta mostrarmos,
então, que, em um DIP, todo elemento que não é zero nem unidade, pode ser
escrito como produto de um número finito de irredutíveis. Caso isso não ocorresse,
poderíamos produzir uma cadeia ascendente não estacionária (veja a tarefa 3). Mas
isso contradiz o resultado do Lema 5.

A recíproca do Lema 6 não é válida. Exibiremos um contraexemplo mais


adiante, na aula 6.
Dizemos que A é um domínio euclidiano se existe uma função N : A ®  ,
chamada norma, tal que
1. N (a) ³ 0 , para todo a Î A e N (a) = 0 se, e somente se, a = 0 .
2. N (a × b) = N (a) × N (b) , para quaisquer a, b Î A .
3. Dados a, b Î A , com b ¹ 0 , existem q, r Î A tais que
a = bq + r , com 0 £ N (r ) < N (b)our = 0.

A condição 2 da definição acima pode ser substituída, supondo-se


simplesmente que vale
1. Se a, b Î A e a| b, então N (a) £ N (b) .

A verificação de que 2 implica 2' é simples: se a| b, então existe c Î A tal


que b = ac . Logo, N (b) = N (ac) e, supondo que vale 2 , N (b) = N (a)N (c) . Como
N (a), N (b) e N (c) são inteiros não negativos, a relação N (b) = N (a)N (c) implica
que N (a) £ N (b) .

EXEMPLO 1
O anel A =  , com a função N :  ®  dada por N (a) =| a| , é um domínio
euclidiano. A demonstração desse fato usa o Princípio de Eudoxo, mais conhecido

AULA 5 TÓPICO 1 77
como Princípio de Arquimedes, que afirma que um número real está sempre entre
dois números inteiros consecutivos. Se a, b Î  , com b ¹ 0 , então existe, pelo
Princípio de Eudoxo, q Î  tal que
a
q £ < q +1.
b
Multiplicando por b , temos, se b > 0 , bq £ a < bq + br , ou seja,

r  
0 £ a - bq < b . Se b < 0 , temos bq ³ a > bq + b , ou seja, 0 ³ a - bq > b . Em
qualquer um dos casos, 0 £| r |<| b| , onde r = a - bq . Isso mostra que vale a
condição 3 da definição de domínio euclidiano. Uma vez que | ab|=| a| ×| b| , vale a
condição 2. Finalmente, a condição 1 é consequência da definição de valor absoluto
de um número real.

EXEMPLO 2
Veremos, na aula 6, que A = K[ X] , o anel de polinômios na indeterminada X
com coeficientes no corpo K , é um domínio euclidiano, com norma N : K[ X] ® 
dada por N ( f (X)) = grau ( f (X)) .

EXEMPLO 3
Seja [i ] = { a + bi | a, b Î } , onde i 2 = -1 . Com a soma e o produto de
números complexos, [i ] é um domínio, chamado domínio de inteiros de Gauss.
Munido com a função N : [i ] ®  , dada por N (a + bi ) = a2 + b2 , [i ] é um
domínio euclidiano. De fato, N (a + bi ) = a2 + b2 ³ 0 para todo z = a + bi Î [i ] e
N (z) = 0 implica que a2 + b2 = 0 . Como a, b Î  , essa última igualdade implica
que a = b = 0 , logo z = 0 . Dessa forma, vale a condição 1. Para verificarmos a
validade da condição 2, basta notarmos que N (z) = a2 + b2 = zz , onde z = a - bi
é o conjugado de z . Assim, N (zw) = zw × zw = zw × z × w = zz × ww = N (z)N (w) . A
condição 3 merece uma atenção especial e será tratada no teorema a seguir.

Teorema7 Seja [i ] = { a + bi | a, b Î } o domínio dos inteiros de Gauss. Dados


z, w Î [i ] , com w ¹ 0 , existem q, r Î [i ] tais que
z = qw + r , e 0 £ N (r ) < N (w).

Demonstração:
Os elementos de [i ] formam uma rede de pontos distribuídos de modo
homogêneo ao longo do plano. Mais precisamente, esses elementos correspondem

78 Estruturas Algébricas
aos pontos que têm coordenadas inteiras, ou, de modo mais geométrico, aos pontos
que são vértices dos quadrados de lado 1 que formam um ladrilhamento do plano.
Como o plano complexo é totalmente coberto pelos quadrados desse ladrilhamento,
z
o número complexo pertence a um desses quadrados. Dentre os quatro vértices
w
z z
do quadrado que contém , seja q Î [i ] aquele cuja distância a é a menor
w w
possível, podendo ser, inclusive, igual a zero. Essa distância não pode ser maior do
z
que metade da diagonal do quadrado, que tem lado 1, ou seja, a distância entre
2 z w
e q é menor ou igual a . Isso se dá porque o ponto que corresponde a está
2 w
em um dos quatro quadrados menores exibidos na figura 1 abaixo, justamente o
quadrado pequeno que contém o vértice q .

z no interior do quadrado.
Figura 1: Ponto
w
Como a maior distância entre dois pontos sobre um quadrado é o comprimento
z 2
de sua diagonal, temos 0 £| - q|£ < 1. Temos: | z - qw |<| w | . Observando
w 2
que N (a) =| a| 2 e denotando r = z - qw , obtemos, finalmente, z = qw + r , com
0 £ N (r ) < N (w) , como queríamos.

O resultado que exibiremos a seguir é uma repetição de um argumento


utilizado no curso de Teoria dos Números. Essa teorema estabelece a ligação entre
os domínios euclidianos e dos domínios de ideais principais.

Teorema8 Todo domínio euclidiano é um domínio de ideais principais.

Demonstração:
Seja A um domínio euclidiano e I um ideal de A . O conjunto
N I = { N (x)| x Î I } Ì 

AULA 5 TÓPICO 1 79
é não vazio. Pelo princípio da boa ordem, existe x0 Î I tal que N (x0 ) é mínimo. Como
x0 Î I , temos a inclusão (x0 ) Ì I . Reciprocamente, se x Î I , existem q, r Î A tais
que x = qx0 + r e 0 £ N (r ) < N (x0 ) . Como x0 , x Î I , temos que r = x - qx0 Î I .
Se r ¹ 0 , então r Î I e N (r ) < N (x0 ) contrariam a minimalidade de x0 . Assim,
r = 0 e x = qx0 Î (x0 ) , demonstrando que I Ì (x0 ) . Portanto qualquer ideal I de
A é principal, sendo gerado pelo elemento x0 tal que N (x0 ) é mínimo.
Dessa forma, temos a seguinte sequência de implicações:

DomínioEuclidiano Þ D.I .P. Þ D.F.U.

Além disso, as implicações no sentido inverso não valem em geral. Exibiremos


na, aula 6, um DFU que não é DIP. O exemplo a seguir é um DIP que não é domínio
euclidiano.
EXEMPLO:
1+ -19
O anel A = [q ] = { a + bq | a, b Î ,q = } é um DIP e não é domínio
2
euclidiano.
Encerramos aqui o primeiro tópico de nossa quinta aula. Vimos aqui a
importância da noção de fatoração única, originalmente uma propriedade nos
números inteiros, que ocorre também em contextos mais amplos, como nos inteiros
de Gauss ou anéis de polinômios. Vimos que o tratamento abstrato dessa noção,
feito isolando-se as condições essenciais para que ocorra a fatoração única, nos
permite obter resultados que valem tanto para o anel dos inteiros, quanto para
outros anéis que também sejam domínios de fatoração única.

80 Estruturas Algébricas
TÓPICO 2 O corpo de frações de
um domínio
O bjetivos
• Assimilar a noção de corpo de frações de um
domínio
• Identificar os domínios como únicos anéis para
os quais é possível a construção de um corpo de
frações

N este tópico, faremos uma construção importante. Para cada


domínio de integridade A , iremos construir um corpo K
“contendo” A e tal que, para a Î A , a ¹ 0 , exista x Î K
satisfazendo a × x = 1. Esse corpo é chamado corpo de frações do domínio A . A
palavra contendo aparece entre aspas pois, na verdade, não ocorre uma inclusão,
mas sim um homomorfismo injetor de A em K , análogo ao homomorfismo  ®  ,
discutido na aula 4. Em particular, essa construção nos permite definir com precisão
o que é número racional: basta aplicar os resultados que estudaremos aqui ao caso
A=.
Seja A um domínio de integridade. Denotamos A´ = A -{ 0} . Seja
B = A ´ A´ = { (a, b)| a, b Î A, b ¹ 0} . Consideremos a seguinte relação em B :
(a, b): (c, d) Û ad = bc.
Essa é uma relação de equivalência. De fato, a reflexividade e a simetria da
relação podem ser verificadas sem muita dificuldade do seguinte modo:
• Reflexividade: dado um par ordenado (a, b) Î B , a definição da relação :
nos diz que ab = ab Þ (a, b): (a, b) .
• Simetria: dados (a, b),(c, d) Î B , se (a, b): (c, d) , então ad = bc o que é
equivalente a cb = da , ou seja, (c, d): (a, b) .

AULA 5 TÓPICO 2 81
Quanto à transitividade, temos o seguinte: se (a, b): (c, d) e (c, d): (e, f ) ,
então ad = bc e cf = de. Multiplicando a primeira igualdade por f , obtemos
d(af ) = b(cf ) . Usando a segunda igualdade, obtemos: d(af ) = b(de) , isto é,
d(af ) = d(be) . Como d ¹ 0 e A é um domínio, podemos cancelar d e obter
af = be, o que implica (a, b): (e, f ) .
Vamos denotar por K o conjunto das classes de equivalência que a relação :
define sobre B , ou seja,
(a, b) = { (x, y) Î B| (x, y): (a, b)} e

K = { (a, b)| (a, b) Î B} .


Observemos, ainda, que, se k ¹ 0 , então (a, b) = (ak, bk) . Dessa forma,
podemos definir as seguintes operações em K :
PRODUTO: (a, b) × (c, d) = (ac, bd) .
SOMA: (a, b) + (c, b) = (a + c, b) .
Note que a soma foi definida apenas
para pares ordenados que têm as segundas
coordenadas iguais. Isso não acarreta problemas
de definição, pois, se as segundas coordenadas at e n ç ão!
forem distintas, podemos proceder da seguinte
A maneira como somamos as classes acima é
forma:
exatamente o modo como somamos frações,
(a, b) + (c, d) = (ad, bd) + (bc, bd) = (ad + bc, bd). transformando-as em frações com o mesmo
Consideremos duas classes (a, b) e (c, d) . denominador.
Podemos escolher outros representantes A seguir, mostraremos que as operações
para essas classes, digamos, (a1 , b1 ) Î (a, b) e acima estão bem definidas, isto é, que não há
(c1 , d1 ) Î (c, d) , de modo que (a1 , b1 ) = (a, b) e ambiguidade nas definições. Isso deve ser feito
(c1 , d1 ) = (c, d) . Dessa forma, temos, pela definição sempre que definirmos operações entre classes,
da relação de equivalência, a1b = ab1 e c1d = cd1 . como já fizemos na aula 1, quando definimos as
Multiplicando essas igualdades membro a operações de um grupo quociente, e na aula 4,
membro, obtemos (a1c1 )(bd) = (ac)(b1d1 ) . quando tratamos da boa definição das operações

Novamente pela definição da relação de em um anel quociente.

equivalência, temos (ac, bd) = (a1c1, b1d1 ) .


De acordo com a definição que demos para o
produto de classes,

(a, b) × (c, d) = (ac, bd) = (a1c1, b1d1 ) = (a1, b1 ) × (c1, d1 ).

82 Estruturas Algébricas
Portanto, o produto de classes não depende da escolha dos representantes.
Vamos, agora, mostrar que vale o mesmo para a soma. Como já vimos acima,
dadas duas classes (a, b) e (c, d) , podemos obter novos representantes de modo
que as segundas coordenadas dos pares ordenados coincidam. Mais precisamente,
podemos considerar (a, b) = (ad, bd) e (c, d) = (bc, bd) . Assim, podemos considerar,
sem perda de generalidade, duas classes representadas por pares cujas segundas
coordenadas coincidem: (x, z) e ( y, z) . Consideremos outros representantes das
mesmas classes: (x1 , z1 ) = (x, z) e ( y1 , z1 ) = ( y, z) . Pela definição da relação de
equivalência, x1z = xz1 e y1z = yz1 . Somando essas duas igualdades membro a
membro, obtemos x1z + y1z = xz1 + yz1 e assim (x1 + y1 )z = (x + y)z1 . Novamente
pela definição da relação de equivalência, temos (x1 + y1, z1 ) = (x + y, z) e, pela
definição dada para a soma de classes,
(x1 , z1 ) + ( y1 , z1 ) = (x1 + y1 , z1 ) = (x + y, z) = (x, z) + ( y, z).
Isso mostra que a soma também independe da escolha dos representantes
das classes.

a
Usamos a notação para indicar a classe (a, b) e chamamos cada uma
b
dessas classes de fração. As coordenadas a e b de um representante da classe
a
(a, b) , ou seja, da fração , são chamadas, respectivamente, de numerador e
b
a
denominador da fração . Usando a notação de fração, podemos reescrever as
b
operações entre classes, definidas acima, da seguinte maneira:
a c ad + bc
+ = ,
b d bd
a c ac
× = .
b d bd

O Teorema a seguir mostra que o conjunto das frações com numerador e


denominador em um domínio A é um corpo. Lembremos que, se A e B são dois
aneis, dizemos que A pode ser imerso em B , se existe um homomorfismo injetor
f : A ® B.

Teorema9 O conjunto K das frações com numerador e denominador em um domínio


A , com as operações definidas acima, é um corpo, chamado corpo de frações de
A e denotado por K = c. f . (A ) . Todo domínio de integridade A pode ser imerso
em seu corpo de frações.

AULA 5 TÓPICO 2 83
Demonstração:
Já mostramos que as operações são bem definidas. Verificar que valem os
axiomas de anel comutativo é uma tarefa de rotina (veja a tarefa número 6). O
1 a 1× a a
elemento neutro do produto é a fração 1 . De fato, × = = . Por outro lado,
1 1 b 1× b b
0
o elemento neutro da soma é a fração . De fato, se a Î K , então
1 b
a 0 a 0 a+ 0 a
+ = + = = .
b 1 b b b b
a
Dada uma fração Î K , a ¹ 0 , podemos garantir que a ¹ 0 , do contrário,
b b 1
a 0 0
teríamos = = , a última igualdade sendo válida porque 0× 1= 0 = b× 0 (vale
b b 1
lembrar que cada fração é uma classe de pares ordenados). Sendo a ¹ 0 , temos
b
Î K . Além disso,
a a b ab
× =
b a ba
1
e essa última fração é igual a, pois (ab) × 1= 1× (ba) . Isso mostra que todo elemento
1
diferente do elemento neutro da soma de K , possui um inverso em K . Logo, o anel
comutativo com unidade K é, na verdade, um corpo.
Para mostrar que A pode ser imerso em seu corpo de frações K ,
a
consideremos a função f : A ® K , dada por f (a) = . Primeiro, verifiquemos que
1
f é um homomorfismo:
a+ b a b
f (a + b) = = + = f (a) + f (b),
1 1 1
ab a b
f (ab) = = × = f (a) f (b).
1 1 1
0
O núcleo de f é trivial, pois a Î ker f se, e somente se, f (a) = . Logo,
a 0 1
= , o que significa a × 1= 1× 0 , ou seja, a = 0 . Assim, ker f = { 0} e f é um
1 1
homomorfismo injetor. Isso mostra que A pode ser imerso em K .

EXEMPLO 1:
Se A =  , o domínio dos inteiros, então c. f .() =  . De fato, o procedimento
descrito acima é uma construção formal do corpo dos números racionais.

EXEMPLO 2:
Se A é um corpo, então K = c. f . (A ) é isomorfo a A . De fato, o homomorfismo
a
injetor f : A ® K , dado por f (a) = , como na demonstração do Lema 9, é, neste
1

84 Estruturas Algébricas
caso, também sobrejetor. Para verificarmos isso, tomemos a Î K . Como b Î A ,
b
-1 a ab-1 ab-1
b ¹ 0 e K é um corpo, temos b Î A . Assim, = -1 = = f (ab-1 ) e isso
b bb 1
mostra que f é sobrejetivo.

EXEMPLO 3:
Em particular, veremos que, se k é um
corpo, então k[x ] , o conjunto dos polinômios na
atenção! indeterminada x , com coeficientes em k , com
as operações de soma e produto de polinômios,
Na próxima aula, estudaremos os anéis de
é um domínio. O corpo de frações de k[x ] é
polinômios.
denotado por k(x) . Podemos descrevê-lo do
seguinte modo:
ì
ï f (x) ü
ï
k(x) = ï
í | f (x), g(x) Î k[x ], g(x) ¹ 0ï
ý.
ï
ï g(x)
î ï
ï
þ
EXEMPLO 4:
O anel de inteiros de Gauss [i ] = { a + bi | a, b Î ,i 2 = -1} é um domínio de
integridade. Aliás, já mostramos, nesta aula, que [i ] é um domínio euclidiano.
O corpo de frações de [i ] é formado pelas frações do tipo a + bi . Podemos
c + di
simplificar essa expressão do seguinte modo:

a + bi a + bi c - di (a + bi )(c - di ) ac + bd bc - ad
= × = = 2 + × i.
c + di c + di c - di c2 + d2 c + d2 c2 + d2

Como já comentamos anteriormente nesta aula, esse processo é chamado


racionalização. As igualdades acima mostram que todo elemento de c. f .([i ])
está contido em [i ] = { r + si | r , s Î ,i 2 = -1} . Reciprocamente, se r + si Î [i ] ,
então podemos escrever
a c ad + bc× i
r + si = + ×i = Î c. f .([i ]).
b d bd
Assim, c. f .([i ]) = [i ] . Isso mostra, em particular, que [i ] é um corpo.

Encerramos aqui nosso segundo tópico e a aula 5. Nesta aula vimos que a
importante noção de fatoração única que vale para números inteiros, pode ser
tratada abstratamente. O anel dos inteiros, sendo um domínio euclidiano, é o exemplo
padrão e clássico das estruturas que estudamos aqui. A contrapartida geométrica

AULA 5 TÓPICO 2 85
é dada pelo outro exemplo clássico: os anéis de polinômios com coeficientes em
um corpo, que serão estudados na próxima aula. Veremos que os polinômios com
coeficientes em um corpo e uma indeterminada formam um domínio euclidiano,
mas se considerarmos polinômios com mais de uma indeterminada, o domínio
resultante não será sequer um domínio de ideais principais, embora seja um
domínio de fatoração única.

at iv ida d e d e a p r of u da m e n t o

1. Considere a equação diofantina x2 + y2 = z2 . Os trios de inteiros (x, y, z) ¹ (0,0,0) que satisfazem


essa equação são chamados trios pitagóricos. Se m.d.c.(x, y, z) = 1, dizemos que o trio pitagórico
(x, y, z) é primitivo.
(a) Mostre que se (x, y, z) é um trio pitagórico primitivo, então z é ímpar. Sugestão: a igualdade
x2 + y2 = z2 implica que x2 + y2 º z2 (mod4) .
(b) Dado um trio pitagórico primitivo (x, y, z) , mostre que um primo p Î [i ] não pode dividir
simultaneamente x + iy e x - iy .
(c) Observando que z2 = (x + iy)(x - iy) em [i ] , e que o anel dos inteiros gaussianos é um DFU, use o
item anterior para mostrar que x + iy = u(m + in)2 , onde u Î [i ] .
*

(d) Conclua que x = ±(m2 - n2 ) , y = ±2mn e z = ±(m2 + n2 ) , com m, n Î  de paridades distintas.

2. Esse exercício usa a fatoração única em [i ] para demonstrar que qualquer primo p Î  tal que
p º 1(mod4) pode ser escrito como soma de dois quadrados.
(a) Mostre que, se p º 1(mod4) , então a congruência x2 º -1(modp) tem solução ( sugestão: Calcule
æ -1ö p-1
o símbolo de Legendre çç ÷÷÷ = (-1) 2 ).
çè p ÷ø
2
(b) De acordo com o resultado do item anterior, p| n + 1, para algum n Î  . Logo p| (n + i )(n - i ) .
Mostre que p p + i e p p - i . Conclua que p não é primo em [i ] , logo p é redutível em [i ] .
(c) Pelo item anterior, p = (a + ib)(c + id) e nenhum dos fatores é uma unidade. Considere a norma em
ambos os membros dessa igualdade e conclua que p é soma de dois quadrados.

3. Observe que (2 + i )(2- i ) = 5 = (1+ 2i )(1- 2i ) . Por que isso não contradiz a fatoração única em [i ]
?

4. (Inteiros de Eisenstein) Seja w = e2pi / 3 = -1+ i 3 . Considere a função N : [w ] ®  dada por
2
N (a + bw ) = a2 - ab + b2 .

86 Estruturas Algébricas
(a) Mostre que se a + bw for escrito na forma u + vi , com u, v Î  , então N (a + bw ) = u2 + v2 .
(b) Mostre que, se a, b Î [w ] , então N (ab ) = N (a )N (b ) . Conclua que, se a | g em [w ] , então
N (a )| N (g ) em  .
(c) Seja a Î [w ] . Mostre que a é unidade se, e somente se, N (a ) = 1. Encontre todas as unidades
de [w ] (existem seis ao todo).
(d) Mostre que 1- w é irredutível em [w ] e que 3 = u(1- w )2 para alguma unidade u Î [w ] .
(e) Mostre que [w ] é um dompinio euclidiano, logo é um DIP e também um DFU.

5. Seja A um DIP e f : A ® D um homomorfismo de A em um domínio D . Mostre que A / ker f


é isomorfo a um corpo contido em D . Sugestão: use a tarefa 5 desta aula e o Teorema Fundamental dos
Homomorfismos.

6. Seja A um domínio de integridade e K = c. f . (A ) o corpo de frações de A . Se L é um corpo


e f : A ® L é um homomorfismo de anéis, mostre que existe um único homomorfismo de anéis
g : K ® L tal que g(a) = f (a) , para todo a Î A .

AULA 5 TÓPICO 2 87
AULA 6 Polinômios

Olá, aluno (a),

Todos nós temos uma noção básica do que é um polinômio e também conhecemos
algumas de suas propriedades básicas. Nesta aula, estudaremos polinômios no
contexto da Álgebra Abstrata. A ideia principal é estudar conjuntos de polinômios
em vez de estudá-los isoladamente. Os polinômios com coeficientes em um anel
A formam um novo anel, chamado anel de polinômios sobre A . Com o auxílio do
Teorema Fundamental dos Homomorfismos de Anéis, visto na aula 4, veremos que
os anéis de polinômios são uma ferramenta fundamental na construção de novos
exemplos de anéis. A definição de polinômio que daremos nos permitirá definir
outro conceito importante: o de série formal. Também estudaremos nesta aula os
polinômios irredutíveis, aqueles que desempenham papel similar aos dos números
primos em  . Vamos lá?

Objetivos

• Compreender a definição de polinômio e de anel de polinômios


• Reconhecer a noção de série formal como uma extensão natural da noção
de polinômio
• Identificar a validade do algoritmo da divisão em anéis de polinômios com
coeficientes em um corpo
• Utilizar o critério de Eisenstein para decidir quando um polinômio com
coeficientes inteiros é irredutível

88 Estruturas Algébricas
TÓPICO 1 Sequências quase nulas
e polinômios
O bjetivos
• Compreender o que é um polinômio e o significado
formal da noção de indeterminada
• Identificar algumas propriedades dos anéis de
polinômios e dos anéis de séries formais
• Construir anéis de polinômios em mais de uma
indeterminada

N este primeiro tópico, veremos a definição formal de polinômio


e esclareceremos o que é a indeterminada de um polinômio.
Estudaremos um processo indutivo que permite a construção de
anéis de polinômios em um número finito de indeterminadas. Veremos também que
a definição de polinômio pode ser naturalmente estendida para que se possa definir
série formal. Esses objetos formam anéis, cujas propriedades serão estudadas ao
longo desta aula.
No que se segue, iremos considerar zero como um número natural, isto é,
 = { 0,1,2,¼} . Essa escolha será justificada mais adiante.
Dado um conjunto A , uma sequência de elementos de A é uma função
f :  ® A . Usamos a notação fn em vez de f (n) e indicamos a sequência como
f = ( fn ) = ( f0 , f1 ,¼, fn ,¼) . Em geral, trataremos aqui dos casos em que A é um
anel. A ideia é induzir no conjunto das sequências uma estrutura de anel induzida
pela estrutura de anel de A . Para isso, precisamos dizer quando duas sequências
são iguais e também precisamos definir operações entre sequências.
Duas sequências são ditas iguais quando são iguais como funções. Isso
significa que ( fn ) = ( gn ) se, e somente se, fn = gn , para todo n³ 0 . O elemento fn
da sequência f é chamado n -ésimo termo da sequência, ou termo de grau n da
sequência f .

AULA 6 TÓPICO 1 89
A soma de duas sequências f = ( fn ) e g = ( gn ) é uma sequência f + g
dada por
f + g = ( f0 + g0 , f1 + g1 , f2 + g2 ,¼),
ou seja, a soma de duas sequências é feita termo a termo. A sequência nula é
f = ( fn ) tal que fn = 0 , para todo n³ 0 , isto é, f é a função identicamente nula.
Vamos denotá-la por 0 . A sequência nula tem a seguinte propriedade notável:
f + 0 = f , paratodasequência f .
Dizemos que 0 é o elemento neutro da soma de sequências.
O produto de duas sequências f = ( fn ) e g = ( gn ) é feito levando-se em
consideração o grau de cada termo, de modo que o produto fi × gj tenha grau i + j .
Tal produto é chamado produto graduado de sequências. Dessa forma, temos
f × g = (h0 , h1 , h2 ,¼, hk ,¼)
onde
hk = f0 gk + f1 gk-1 +  + fk-1 g1 + fk g0 .
Vamos denotar o conjunto das sequências de elementos de um anel A ,
munidos da soma e do produto definidos acima, pelo símbolo S(A ) , ou
simplesmente S, quando estiver claro em que anel estamos tomando os termos fn .
Uma sequência f ÎS é chamada quase
nula quando existir n0 ³ 0 tal que fn = 0 ,
para todo n ³ n0 . O conjunto das sequências
quase nulas é denotado por S0 (A ) ou S0 .
Dada f Î S0 , f ¹ 0 , existe algum termo at e n ç ão!
de f que é diferente de zero. Como f é quase No caso em que é a sequência nula,
nula, existe N Î  tal que fn = 0 , para todo convencionamos que, embora alguns autores
n > N . Se fN ¹ 0 , então dizemos que o grau de assumam que a sequência nula não tem grau.

f é N e usamos a notação: grau ( f ) = N .

Lema1 Seja A um anel e S0 (A) o conjunto das sequências quase nulas de elementos de A.
1. A soma de duas sequências quase nulas f e g é uma sequência quase nula e,
se f + g ≠ 0 , então grau ( f + g ) = max{grau ( f ), grau ( g )} .
2. O produto de duas sequências quase nulas é uma sequência quase nula e, se
A é um domínio, então grau ( f ⋅ g ) = grau ( f ) + grau ( g ) .

90 Estruturas Algébricas
Demonstração:
1. Sendo f e g sequências quase nulas, podemos escrever
f = ( f0 , f1 ,¼, fn ,0,0,¼) e g = ( g0 , g1 ,¼, gm ,0,0,¼) , onde n = grau ( f ) e
m = grau ( g) . Podemos supor que n £ m (o caso m £ n é similar). Como a soma é
dada coordenada a coordenada, temos
f + g = ( f0 + g0 , f1 + g1 ,¼, fn + gn , gn+1 ,¼, gm ,0,0,¼),
ou seja, ( f + g)i = 0 , se i > m e ( f + g)m = gm ¹ 0 . Assim, f + g Î S0 (A ) e, se
f + g ¹ 0 , então grau ( f + g) = m = max{ grau ( f ),grau ( g)} .
2. Se f , g Î S0 (A ) , podemos, como antes, escrever f = ( f0 , f1,¼, fn ,0,0,¼) e
g = ( g0 , g1 ,¼, gm ,0,0,¼) . O produto f × g é dado por
f × g = ( f0 g0 , f0 g1 + f1 g0 , f0 g2 + f1 g1 + f2 g0 ,¼).
Em geral, o termo de grau  de f × g é dado pela soma
f0 g + f1 g-1 +  + f -1 g1 + f  g0 (*).
Em particular, o termo de grau m + n é dado por fn gm . Como fn ¹ 0 ,
gm ¹ 0 e A é um domínio, temos que fn gm ¹ 0 . Se  > m + n , então o
termo de grau  , dado pela soma (*), é igual a zero. Logo, f × g Î S0 (A ) e
grau ( f × g) = n + m = grau ( f ) + grau ( g) .

A função f : A ® S0 , dada por f(a) = (a,0,0,¼) é um homomorfismo injetor.


De fato, se f(a) = f(b) , então (a,0,0,¼) = (b,0,0,¼) e isso implica que a = b , pela
definição de igualdade de sequências. Além disso,
f(a + b) = (a + b,0,0,¼) = (a,0,0,¼) + (b,0,0,¼) = f(a) + f(b) e

f(ab) = (ab,0,0,¼) = (a,0,0,¼)(b,0,0,¼) = f(a)× f(b).


Isso mostra que A pode ser “mergulhado” em S0 (logo, também em S, pois
S0 Ì S ) no seguinte sentido: podemos identificar cada elemento a Î A com sua
imagem f(a) = (a,0,0,¼) , sem que isso altere a soma e o produto de elementos
de A (veja o Exemplo 2, tópico 1, aula 4, para uma situação similar). Usando essa
identificação, escreveremos, daqui por diante, a = (a,0,0,¼) .
A sequência
x = (0,1,0,0,¼)
é chamada indeterminada de S sobre A . Essa sequência tem as seguintes
propriedades notáveis:
x2 = x × x = (0,0,1,0,0,¼),
x3 = x2 × x = (0,0,0,1,0,0,¼),

AULA 6 TÓPICO 1 91
e assim por diante, ou seja, xn , n³ 1 , é a sequência cujo termo de grau n é igual
a 1 e todos os outros termos são iguais a zero. Isso pode ser verificado diretamente,
usando-se a definição de produto de sequências.
Usando a definição de soma, podemos escrever, para uma sequência f Î S
qualquer,
f = ( f0 , f1 , f2 ,¼) = ( f0 ,0,0,¼) + (0, f1 ,0,0,¼) + (0,0, f2 ,0,0,¼) +
Agora, notemos que, novamente pela definição de produto de sequências,
posição n

(0,0,¼,0, fn ,0,0,¼) = ( fn ,0,0,¼)× (0,0,¼,0, 1 ,0,0,¼) = fnxn
para todo n³ 1 . Assim, obtemos
f = f0 + f1x + f2x2 + f3x3 +
No caso em que f Î S0 , existe N = grau ( f ) ³ 0 tal que
f = f0 + f1x + f2x2 +  + fN x N .
e chamamos f de polinômio. Se, por outro lado, f Î S \ S0 , a ``soma’’
f = f0 + f1x + f2x2 + f3x3 +
é chamada de série formal. O adjetivo formal justifica-se por não estarmos
considerando x como número real ou complexo, mas como uma sequência particular.
Assim, não faz sentido aqui falarmos em convergência, visto que f = f0 + f1x +
é uma expressão que não necessariamente é um número complexo, mas apenas
outro modo de escrever a sequência f = ( f0 , f1 ,¼) .
Os termos fi Î A passam a ser chamados coeficientes do polinômio, ou da
série formal. Se f é um polinômio, o coeficiente fn , com n = grau ( f ) , é chamado
coeficiente líder de f .
Dessa forma, uma série formal é uma sequência e um polinômio é uma
sequência quase nula, e o que os torna distinguidos dentre as sequências é o
modo que escolhemos para multiplicá-los, ou seja, uma sequência quase nula
ganha o nome especial de polinômio e se comporta como o que costumamos pensar
ser um polinômio, devido ao produto especial que definimos entre duas dessas
sequências. Esse é um exemplo claro de como a estrutura geral do conjunto de
objetos age sobre a natureza de cada objeto em particular.
Os resultados sobre sequências quase nulas podem ser reescritos como
resultados para polinômios, bastando para isso substituir as palavras sequência
quase nula por polinômio. Em particular, o Lema 1 pode ser usado para polinômios.
Usamos as notações:
A[x ] = {polinômios com coeficientes em A}

92 Estruturas Algébricas
A [[ x ]] = {séries formais com coeficientes em A}

Teorema2 Seja A um anel comutativo com unidade. Usando a notação dada


acima, A[x] e A[[x]] são anéis.

Demonstração:
Vamos, primeiramente, mostrar que A[[x ]] é um anel. Depois mostraremos
que A[x ] é um subanel de A[[x ]] . A associatividade da soma e do produto, a
comutatividade da soma e do produto, e a distributividade seguem todas o mesmo
raciocínio: transferir o problema para A , usando-se a definição da operação. A
título de ilustração, vamos verificar uma dessas propriedades, a comutatividade da
soma: dados
f = a0 + a1x + a2x2 + e g = b0 + b1x + b2x2 + ,

f + g = (a0 + b0 ) + (a+ b1 )x + (a2 + b2 )x2 +  = (b0 + a0 ) + (b1 + a1 )x + (b2 + a2 )x2


+ = g + f

pois a soma é comutativa em A , já que A é um anel.


A série identicamente nula 0 = (0,0,¼) = 0 + 0x + 0X2 + é o elemento
neutro da soma em A[[x ]] , o que pode ser verificado diretamente usando-se a
definição. Dada f = a0 + a1x + a2x2 +  Î A[[x ]] , a série - f = -a0 - a1x - a2x2 -
é tal que f + (- f ) = (- f ) + f = 0 , onde 0 aqui denota a série identicamente nula.
Logo, toda série de A[[x ]] possui um inverso aditivo.
A unidade 1Î A pode ser identificada com a série 1= (1,0,0,¼) . Dada uma
série f = a0 + a1x + a2x2 +  Î A[[x ]] , 1× f = f × 1= f , como pode ser verificado
diretamente usando-se a definição de produto de séries. Logo, 1 é o elemento
neutro do produto em A[[x ]] .
Isso mostra que A[[x ]] é um anel.
O item 2 do Lema 1 nos diz que a soma e o produto de dois polinômios
(sequências quase nulas) é um plonômio. Dessa forma, A[x ] é fechado para a soma e
para o produto. Além disso, os elementos neutros 0 e 1 de A[[x ]] , definidos acima,
são elementos de A[x ] . Portanto, A[x ] é subanel de A[[x ]] , e, em particular, é um
anel.
Usamos também a notação A(x) para indicar as frações tais que o numerador
e o denominador são polinômios, isto é,

AULA 6 TÓPICO 1 93
ì f (x)
ï ü
ï
A(x) = c. f . (A[x ]) = ï
í | f (x), g(x) Î A[x ], g(x) ¹ 0ï
ý,
ï
ï g(x)
î ï
ï
þ

no sentido, discutido na aula 5. Uma fração tal que o numerador e o denominador


são polinômios é chamada função racional.

EXEMPLOS:
1. Se A Ì B , então A[x ] Ì B[x ] . Em particular, [x ] Ì [x ] Ì [x ] .
1 1
2. Î [x ] , mas Î [[x ]] . De fato, (1- x)(1+ x + x2 + x3 + ) = 1
1- x 1- x
1
e isso implica que = 1+ x + x2 + x3 +  Î [[x ]] .
1- x
3. Se A é um anel e I é um ideal de A , denotamos por I [x ] o conjunto dos
polinômios de A[x ] cujos coeficientes pertencem a I . Mais ainda, podemos afirmar
que o conjunto I [x ] é um ideal de A[x ] (veja a tarefa 1 dessa aula) e que A[x ] / I [x ]
é isomorfo ao anel (A / I )[x ] , formado pelos polinômios na indeterminada x com
coeficientes no anel quociente A / I (veja a tarefa 2 dessa aula).
4. Como caso particular do exemplo acima, podemos considerar o anel
de polinômios m [x ] , onde m é um inteiro maior do que 1, como sendo o anel
quociente [x ] / m[x ] .

Dizemos que f Î A[x ] (ou f Î A[[x ]] ) é invertível, quando existe g Î A[x ]


(ou g Î A[[x ]] ) tal que f × g = 1 . Convém lembrar que estamos fazendo aqui a
seguinte identificação: 1= (1,0,0,¼) .

Lema3 Seja A um anel.


1. Um elemento f = a0 + a1x +  + anxn Î A[x ] é invertível se, e somente
se, a0 é invertível em A, isto é, se existe b0 Î A tal que a0 b0 = 1 .
2. Se A é um domínio, um elemento f = a0 + a1x +  + anxn Î A[x ] é
invertível se, e somente se, f Î A e f é invertível em A.

Demonstração:
1. Se existe g = b0 + b1x + b2x2 +  Î A[[x ]] tal que fg = 1 , então
a0b0 + (a0b1 + a1b0 )x + (a0b2 + a1b1 + a2b0 )x2 +  = 1+ 0× x + 0x2 + 
o que implica, em particular, que a0b0 = 1 .
Reciprocamente, se existe b0 Î A tal que a0b0 = 1 , iremos construir a seguir

94 Estruturas Algébricas
uma série formal g = b0 + b1x + b2x2 + tal que fg = 1 . A condição fg = 1 nos
diz que todos os coeficientes de fg são nulos, exceto o de grau zero, que é a0b0 = 1 .
Assim, temos:
a0b1 + a1b0 = 0.
Como a0 , a1 e b0 são conhecidos, podemos determinar b1 de modo único a
partir dessa equação.
Supondo, por indução, que já foram determinados b0 , b1 , b2 ,¼, bn , podemos
determinar bn+1 . De fato, como todos os ai , i ³ 0 , são conhecidos, a igualdade
a0bn+1 + a1bn +  + anb1 + an+1b0 = 0
nos fornece o valor de bn+1 . Portanto, pelo princípio da indução, podemos
2
construir g = b0 + b1x + b2x + tal que fg = 1 , como queríamos.
2. Se f Î A e f é invertível em A , então existe b Î A Ì A[x ] tal que
ab = 1 . Reciprocamente, se existe g = b0 + b1x +  + bmxm tal que fg = 1 , então
a0b0 = 1 , logo a0 é invertível em A . Sabemos que anbm = 0 , logo an = 0 ou
b = 0 , pois A é um domínio. O coeficiente do termo de grau m + n - 1 em f × g
m

é an-1bm + anbm-1 = 0 . Multiplicando essa igualdade por an , obtemos


=0

an-1(anbm ) + an2bm-1 = 0.

Logo, an2bm-1 = 0 . Vamos, agora, mostrar por indução sobre r ³ 1 , que


anr +1bm-r = 0 . Os casos r = 0 e r = 1 já foram feitos. Suponhamos, por indução, que
anj +1bm- j = 0 , para cada j Î { 0,1,¼, r - 1} . Dado r > 1 , o termo de grau n + m - r é
anbm-r + an-1bm-r +1 +  + an-r +1bm-1 + an-r bm = 0.
Multiplicando essa última igualdade por anr -1 e usando a hipótese de
indução, vemos que
anr bm-r = 0.
Logo, pelo segundo princípio da indução, temos anr bm-r = 0 , para todo r ³ 0 .
Em particular, se r = m , obtemos anmb0 = 0 . Como a0b0 = 1 , temos anm = 0 e,
sendo A um domínio, an = 0 .
Podemos repetir esse processo para concluirmos que an-1 = 0 , an-2 = 0 e
assim por diante, até a1 = 0 . Concluímos, pois, que f = a0 Î A e f é invertível
em A .

Seja A um anel e R = A[x ] o anel de polinômios com coeficientes em A .


Podemos considerar o anel de polinômios com coeficientes em R . É conveniente

AULA 6 TÓPICO 1 95
denotarmos a indeterminada usando outro símbolo, por exemplo, y . O anel R[ y] é
formado por polinômios na indeterminada y cujos coeficientes são polinômios na
indeterminada x . Em vez de usarmos a notação R[ y] , com R = A[x ] , escrevemos,
simplesmente, A[x, y] . A construção na ordem inversa gera o mesmo anel. Mais
precisamente, se S = A[ y] , então e S[x ] é isomorfo a A[x, y] (veja o exercício de
aprofundamento 1). Um elemento f (x, y) Î A[x, y] é chamado polinômio em duas
indeterminadas com coeficientes em A .

EXEMPLO:
Seja f (x, y) = 1+ x + 4xy + x2 y + xy4 + y5 Î [x, y] . Podemos considerar
f (x, y) como polinômio na indeterminada y com coeficientes em [x ] :
f (x, y) = (1+ x) + (4x + x2 ) y + xy4 + y5 , ou como um polinômio na indeterminada
5 4 2
x com coeficientes em [ y] : f (x, y) = (1+ y ) + (1+ 4 y + y )x + yx .

De um modo geral, para um anel A , podemos construir anéis de polinômios


com coeficientes em A em n indeterminadas, onde n é um número natural. Se
n = 1 ou n = 2 , a construção do anel de polinômios em n indeterminadas já foi
feita. Suponhamos, por indução, que tenhamos construído o anel A[x1 ,¼, xn-1 ] ,
formado pelos polinômios em n- 1 indeterminadas com coeficientes em A . O anel
A[x1 ,¼, xn ] é formado pelos polinômios na indeterminada xn , com coeficientes em
A[x1 ,¼, xn-1 ] .
Concluímos, assim, o primeiro tópico desta aula, onde vimos uma definição
formal da noção de polinômio e constatamos que o conjunto dos polinômios em
uma indeterminada com coeficientes em um anel A é também um anel, chamado
anel de polinômios sobre A . Vimos ainda que é possível repetir essa construção
indutivamente, para gerar anéis de polinômios em várias indeterminadas.
No próximo tópico, estudaremos os anéis de polinômios mais detalhadamente,
tendo como ponto de partida um algoritmo de divisão similar ao que existe para
números inteiros.

96 Estruturas Algébricas
TÓPICO 2 Algoritmo da divisão
para polinômios
O bjetivos
• Estabelecer e usar o algoritmo da divisão para
polinômios
• Compreender algumas das consequências desse
algoritmo

O algoritmo da divisão para números inteiros afirma que, dados


a, bÎ  , existem únicos q, r Î  , tais que 0 £ r £ b - 1 e
a = b× q + r .
Esse é o algoritmo que nos permite fazer divisões com resto entre os inteiros.
Sobre ele está construída toda a aritmética modular (congruências). Neste tópico,
estabeleceremos um algoritmo análogo para polinômios e estudaremos algumas de
suas consequências.
Dados f (x), g(x) Î A[x ] , queremos encontrar q(x), r (x) Î A[x ] tais que
f (x) = g(x) × q(x) + r (x)
e determinar, se possível, condições para que q(x) e r (x) sejam únicos. A primeira
dificuldade reside no fato de não podermos comparar dois polinômios como
fazemos para números inteiros. Assim as desigualdades 0 £ r £ b - 1 , que surgem
no algoritmo da divisão de números inteiros, devem ser adaptadas para o caso dos
polinômios. A melhor maneira de fazer isso é comparando os graus dos polinômios.
Assim, temos:

AULA 6 TÓPICO 2 97
Teorema4 Seja A um corpo e consideremos f (x), g(x) Î A[x ] , com grau(f)>0 e
grau(g)>0. Então existem únicos tais que únicos q(x), r (x) Î A[x ] tais que
f (x) = g(x) × q(x) + r (x) e 0 £ grau (r ) £ grau ( g) - 1.

Demonstração:
Sejam
f (x) = anxn + an-1xn-1 +  + a1x + a0 e g(x) = bmxm + bm-1xm-1 +  + b1x + b0 ,
onde an ¹ 0 e bm ¹ 0 . Se m > n , então podemos escrever f (x) = 0× g(x) + f (x) e,
como 0 £ grau ( f ) < grau ( g) , podemos escrever q(x) = 0 e r (x) = f (x) .
Vamos supor, agora, que m £ n seja
K0

an n-m
f1 (x) = f (x) - x g(x).
bm
Dessa forma, diminuímos o grau de f1 (x) , ou seja, n1 = grau ( f1 ) < grau ( f ) .
Se grau ( f1 ) < grau ( g) , podemos escrever q(x) = K0xn-m e r (x) = f1(x) . Se
grau ( f1 ) ³ grau ( g) , então
f2 (x) = f1(x) - K1xn1-m × g(x),
onde a constante K1 é obtida dividindo-se o coeficiente líder de f1 pelo
coeficiente líder de g . Novamente, obtemos, n2 = grau ( f2 ) < grau ( f1 ) . Mais uma
vez, se grau ( f2 ) < grau ( g) , podemos escrever
q(x )
 r (x )

f (x) = (K0x + K1xn1-m )× g(x) + f2 (x).


n-m

Se ocorrer n2 > m , repetimos o processo. A sequência decrescente


n > n1 > n2 > de números naturais é finita e, certamente, existe ni < m . Quando
o procedimento atinge esse ni , paramos e escrevemos:
q(x) = K0xn-m + K1xn1-m +  + Ki -1xni-1-m e
r (x) = fi (x).
Esse é o algoritmo que nos permite dividir um polinômio por outro. Se
olharmos com cuidado o que foi escrito acima, veremos que essa demonstração
nada mais é do que o método que usamos para dividir polinômios.
Resta mostrar a unicidade: se f (x) = q(x) g(x) + r (x) e f (x) = q'(x) g(x) + r '(x) ,
onde 0 £ grau (r ) < grau ( g) e 0 £ grau (r ') < grau ( g) , devemos mostrar que
q = q' e r = r ' . Das igualdades acima, segue que
(q(x) - q'(x)) × g(x) = r '(x) - r (x).
Se q(x) - q'(x) ¹ 0 , então grau (q - q') ³ 0 e
grau (r ' - r ) = grau ((q(x) - q'(x)) × g(x)) ³ grau ( g).

98 Estruturas Algébricas
Por outro lado, grau (r ) < grau ( g) e grau (r ') < grau ( g) implicam que
grau (r ' - r ) < grau ( g) . Juntando as duas desigualdades, obtemos a contradição
grau ( g) > grau (r ' - r ) ³ grau ( g) . O absurdo veio de supormos que q(x) - q'(x) ¹ 0 .
Logo q(x) = q'(x) e r '(x) = f (x) - q'(x) g(x) = f (x) - q(x) g(x) = r (x) , o que demonstra
a unicidade.

Como é de praxe, chamaremos q(x) e r (x)


de quociente e resto da divisão de f (x) por g(x) .
Quando o resto r (x) é o polinômio 0 , podemos
atenção! escrever f (x) = q(x) g(x) . Dizemos, nesse caso,
O resultado do Teorema 4 continua válido se que g(x) divide f (x) , ou que f (x) é divisível
A for um domínio de integridade, desde que o por g(x) , ou ainda que f (x) é múltiplo de g(x) .
coeficiente líder (coeficiente do termo de maior Usamos a notação g| f .
grau) do polinômio divisor g(x) seja invertível
em A. Por exemplo, se g(x) for um polinômio EXEMPLO 1
mônico, ou seja, um polinômio cujo coeficiente Não é possível aplicar o algoritmo
líder é igual a 1. da divisão para dividir o polinômio
f (x) = x - 4x + 2x + 5 Î [x ]
3 2
por
g(x) = 3x + 1Î [x ] , de modo que o quociente e
o resto pertençam a [x ] . Isso se dá porque o coeficiente líder de g(x) = 3x + 1 não
é invertível em  . No entanto, o algoritmo funciona se o divisor for h(x) = x + 1 ,
pois, nesse caso, o coeficiente líder de h(x) é igual a 1, logo é invertível em  .
Devemos notar que é possível dividirmos f (x) por g(x) , desde que permitamos
que o quociente e o resto possam pertencer a [x ] .

EXEMPLO 2.
Seja f (x1,¼, xn ) Î A[x1,¼, xn ] . Podemos escrever f como um polinômio na
indeterminada xn , com coeficientes no domínio R = A[x1 ,¼, xn-1 ] . Como xn - an
é um polinômio em R[xn ] cujo coeficiente líder é invertível, podemos dividir
f (x1 ,¼, xn ) por xn - an em R[xn ] , obtendo
f (x1 ,¼, xn ) = (xn - an )q(x, ¼, xn ) + r (x1 ,¼, xn-1 ).
Note que o resto da divisão r (x1 ,¼, xn-1 ) não depende de xn , pois o grau
desse polinômio em relação à indeterminada xn é menor do que grau (xn - an ) = 1 ,
isto é, o grau de r em relação à indeterminada xn é zero, o que significa que esse
polinômio não depende da indeterminada xn .

AULA 6 TÓPICO 2 99
De acordo com a definição que demos, polinômios são sequências, que por
sua vez são funções. Assim, polinômios são funções definidas em  . Podemos
ver os polinômios como funções de outro modo, considerando a possibilidade de
“avaliar” um polinômio em um elemento a Î A . Isso nada mais é do que considerar
a expressão formal do polinômio p(x) Î A[x ] , com a indeterminada x substituída
pelo elemento a Î A , gerando a expressão:
p(a) = anan +  + a1a + a0 .
Temos, assim, para cada a Î A , uma função fa : A[x ] ® A , dada por
fa ( p(x)) = p(a) , chamada função avaliação no ponto a Î A .
O problema central da álgebra clássica, que motivou a criação e o estudo
sistemático da álgebra abstrata, é o da resolução de equações algébricas:
anxn + an-1xn-1 +  + a1x + a0 = 0.
Aqui, a indeterminada x assume seu papel usual de “quantidade a
determinar”. Se denotarmos p(x) = anxn +  + a1x + a0 , poderemos reescrever a
equação acima como
p(x) = 0.
Um elemento a Î A tal que p(a) = 0 é chamado raiz do polinômo p(x) .
A existência de raízes de p(x) depende diretamente de A . Assim, por exemplo,
p(x) = x2 + 1 não tem raízes em  , mas tem duas raízes em  . O Corolário a
seguir relaciona a presença de raízes de um polinômio p(x) com a questão da
divisibilidade em A[x ] .

Corolário5 (Teorema do Resto)


1. Dado um polinômio p(x) Î A[x ] , o resto da divisão de p(x) por x-a é p(a).
2. Dado um polinômio p(x) Î A[x ] , um elemento a Î A é raiz de p(x) se e so-
mente se x-a divide p(x).

Demonstração:
De acordo com o Teorema 4, existem q(x), r (x) Î A[x ] , tais que
p(x) = q(x)(x - a) + r (x) e 0 £ grau (r ) < grau (x - a) = 1 .
Logo, grau (r ) = 0 , isto é, r (x) = r , é uma constante. Assim,
p(a) = q(a)(a - a) + r , o que implica que p(a) = r . A segunda parte do Corolário
segue diretamente da primeira.

100 Estruturas Algébricas


Seja K um corpo e K[x ] o anel de polinômios com coeficientes em K . A
seguir, mostraremos que K[x ] é um domínio euclidiano. Para tal, construiremos
uma função norma N : K[x ] ®  satisfazendo as condições da definição de domínio
euclidiano, dadas na aula 5. É claro que essa função deve depender diretamente
do grau, para que possamos utilizar o resultado do Teorema 4. Devemos relembrar
que, por definição, consideramos grau (0) = -¥ , ou seja, o grau do polinômio
identicamente nulo é -¥ . A utilidade dessa escolha, que a princípio parece
ser um tanto quanto despropositada, transparece a seguir. Devemos considerar,
também por convenção, que a-¥ = 0 , para qualquer a real, a> 1 .

Corolário6 Se K é um corpo, então K[x] é um domínio euclidiano.

Demonstração:
O fato de K[x ] ser um domínio é
consequência direta do Lema 7, a ser demonstrado
no próximo tópico. A função N : K[x ] ®  , dada
atenção!
por N ( f (x)) = 2grau ( f (x )) é uma função norma. De
De acordo com o que estudamos na aula 5,
fato, N ( f (x)) = 2n ³ 0 , onde n = grau ( f (x)) e
podemos garantir que, se é um corpo, então é um
N ( f (x)) = 0 se, e somente se, grau ( f (x)) = -¥ ,
DIP e, consequentemente, é também um DFU.
o que é equivalente a dizer que f (x) é o
polinômio identicamente nulo. Assim, vale a
condição 1.
Como K é corpo, grau ( f (x) × g(x)) = grau ( f (x)) + grau ( g(x)) , logo
grau ( f (x )) grau ( g(x ))
N ( f (x) × g(x)) = 2 ×2 = N ( f (x)) × N ( g(x)) e vale a condição 2.
Finalmente, a condição 3 é
consequência direta do Teorema 4. O único
fato a verificar é a validade das desigualdades
0 £ N (r (x)) < N ( g(x)) . Sabemos, do
atenção !
Teorema 4, que 0 £ grau (r (x)) < grau ( g(x))
Na demonstração do Teorema 6, consideramos
ou r (x) = 0 . Se r (x) = 0 , então
a norma definida como N(f(x)) = 2grau (f(x)).
N (r (x)) = 0 < N ( g(x)) , pois g(x) ¹ 0 , por
A escolha da base 2 para essa potência não é
hipótese. Se 0 £ grau (r (x)) < grau ( g(x)) ,
essencial. Podemos substituir 2 por qualquer grau (r (x ))
então 0
2 £2 < 2grau ( g(x )) , isto é,
número inteiro maior do que 1
1£ N (r (x)) < N ( g(x)) . Em qualquer um dos
casos, 0 £ N (r (x)) < N ( g(x)) .

AULA 6 TÓPICO 2 101


Portanto, o anel K[x ] é um domínio euclidiano.

Encerramos, assim, o tópico 2. Aqui, vimos que é possível dar a um anel de


polinômios, em uma indeterminada sobre um corpo K , uma estrutura de domínio
euclidiano e que, portanto, os ideais nesses anéis são todos principais, isto é,
gerados por um só polinômio. Outra consequência da existência de um algoritmo
de divisão em K[x ] é que esses anéis são domínios onde vale o teorema da fatoração
única.

102 Estruturas Algébricas


TÓPICO 3
Polinômios com coeficientes em
um domínio de fatoração única
O bjetivos
• Identificar a propriedade de fatoração única como
estável na passagem de um anel para um anel de
polinômios com coeficientes nesse anel
• Compreender e utilizar o critério de Eisenstein
para decidir se um dado polinômio é irredutível

s aiba mais !
Dois polinômios são iguais se são iguais como
N este tópico, estaremos
interessados em critérios que
nos permitam verificar se um
dado polinômio f (x) com coeficientes inteiros
é irredutível.
funções, ou, alternativamente, se os seus Seja A um domínio de fatoração única e
coeficientes de mesmo grau são iguais. A[x ] o anel de polinômios com coeficientes em
A . Comecemos com o seguinte resultado.

Lema7 Se A é um domínio de integridade, então A[x] também o é.

Demonstração:
Dados f (x), g(x) Î A[x ] tais que f (x) g(x) = 0 , devemos mostrar
que f (x) = 0 ou g(x) = 0 , onde essas igualdades são entre polinômios. Se
f (x) = a0 + a1x + a2x2 +anxn e g(x) = b0 + b1x + b2x2 +  + bmxm , então
f (x) × g(x) = a0b0 + (a0b1 + a1b0 )x + (a0b2 + a1b1 + a2b0 )x2 +  + anbmxn+m .
Como esse polinômio é identicamente nulo, todos os seus coeficientes são
iguais a zero, logo
ì
ïa0b0 = 0
ï
ï
ï
ïa0b1 + a1b0 = 0
ï
ï
ía0b2 + a1b1 + a2b0 = 0
ï
ï
ï
ï 
ï
ï
îanbm
ï = 0

AULA 6 TÓPICO 3 103


Se os dois polinômios fossem não nulos, então existiriam coeficientes ak ¹ 0
e b ¹ 0 de menor grau, isto é, tais que ai = 0 , para todo i < k e bj = 0 , para
todo j < l . Nesse caso, o coeficiente


=0  
=0 
a0bk+ + a1bk+-1 +  + ak-1b +1 + ak b + ak+1b-1 +  + ak+-1b1 + ak+ b0

De f (x) g(x) seria nulo, logo ak b = 0 , com ak ¹ 0 e b ¹ 0 , absurdo, pois


ak , b Î A e A é, por hipótese, um domínio de integridade. Isso mostra que pelo
menos um dos polinômios é identicamente nulo, portanto A[x ] é um domínio.
O Lema 7 acima nos remete à seguinte questão: dada uma propriedade de A ,
é possível garantir que ela se estende a A[x ] ? O exemplo abaixo mostra que isso
nem sempre ocorre.

EXEMPLO:
O anel  é um domínio de ideais
principais, mas [x ] não é um D.I.P., pois o ideal
g u a r d e be m isso!
(2, x) = { 2× f (x) + x × g(x)| f (x), g(x) Î [x ]}
Já vimos, no Corolário 6, que, se é um corpo,
Não é principal. De fato, se (2, x) fosse gerado
então é um domínio euclidiano, logo também é
por um polinômio h(x) , teríamos 2 Î (h(x)) ,
um DIP e um DFU. O exemplo acima mostra que a
o que implicaria h(x)| 2 , isto é, 2 = h(x) × a(x) ,
hipótese dos coeficientes estarem em um corpo é
com a(x) Î [x ] . Em particular, grau (h) = 0 ,
essencial para o resultado desse corolário. De fato,
ou seja, h(x) = H Î  . Como x Î (h(x)) teríamos
mesmo sendo um domínio, podemos perder a
h(x)| x , ou seja, x = h(x) × b(x) = H × b(x) , onde
propriedade dos ideais serem principais.
b(x) Î [x ] . Comparando coeficientes, teríamos
b(x) = x e H = 1 , logo (2, x) = (h(x)) = (1) = [x ] ,
o que não ocorre, pois os elementos de (2, x) têm
coeficiente de grau zero PAR, logo 1+ x Î [x ] e
1+ x Î (2, x) .
O próximo resultado, conhecido como
Lema de Gauss, é de fundamental importância no at e n ç ão!
que se segue. Precisamos de algumas definições Mostraremos, no Teorema 10, que, se é um DFU,
preliminares. Dado um polinômio f (x) Î A[x ] , então também é um DFU e isso nos dirá que é um
onde A é um DFU, o máximo divisor comum exemplo de DFU que não é DIP, como prometido
dos coeficientes de f (x) é chamado conteúdo na aula anterior.

de f (x) e denotado por c( f ) . Se um polinômio

104 Estruturas Algébricas


f (x) Î A[x ] tem conteúdo 1, então f (x) é dito primitivo. Se a Î A e f (x) Î A[x ] ,
escrevemos a| f (x) para denotar que a divide todos os coeficientes de f (x) , isto
é, f (x) = a × g(x) , com g(x) Î A[x ] . Note que o conteúdo de um polinômio divide
o polinômio: c( f )| f .

Lema8 (Gauss) Seja A um DFU e p Î A um elemento irredutível.


1. Se f (x ), g (x ) Î A[x ] e p| f (x ) × g (x ) , então p| f (x ) ou p| g (x ) .
2. O produto de polinômios primitivos é primitivo.

Demonstração:
Demonstraremos o item 1 em sua forma contrapositiva, isto é,

pf (x)ü
ï
ï
ý Þ pf (x) × g(x). Para tal, escrevamos
pg(x)ïï
þ
f (x) = a0 + a1x + a2x2 +  + ai xi + 
g(x) = b0 + b1x + b2x2 +  + bj x j + 

onde ai e bj são os primeiros coeficientes de f (x) e g(x) , respectivamente, que


não são divisíveis por p . Considere o coeficiente ci + j de xi + j em f (x) × g(x) :
ci + j = a0bi + j + a1bi + j -1 +  + ai -1bj +1 + ai bj + ai +1bj -1 +  + ai + j -1b1 + ai + j b0 .

Como pai bj e p divide todas as outras parcelas da soma acima, temos que
pci + j Logo, pf (x) × g(x) .
Para mostrarmos o item 2, suponhamos que f (x) e g(x) sejam polinômios
primitivos em A[x ] . Seja d = c( fg) Î A e suponhamos que d ¹ 1 . Então existe
p Î A primo que divide d , pois A é um DFU. Como p| d e d| f (x) g(x) , temos
que p| f (x) g(x) . Pelo item 1, demonstrado acima, p| f (x) ou p| g(x) . Mas isso não
é possível, pois f e g são primitivos.

As principais consequências do Lema de Gauss estão nos resultados seguintes.

Corolário9 Seja A um DFU e K = c. f . ( A) . Se f (x ) Î A[x ] é primitivo e admite


uma fatoração f (x ) = G(x )H (x ) , com G, H Î K [x ] , então existem g , h Î A[x ] tais
que f (x ) = g (x )h(x ) .

AULA 6 TÓPICO 3 105


Demonstração:
a c
Podemos escrever G(x) = g(x) e H (x) = h(x) , onde a, b, c, d Î A e
b d ac
g(x), h(x) Î A[x ] são polinômios primitivos. Assim f (x) = g(x)h(x) , isto é,
bd
acf (x) = bdg(x)h(x) , com g(x)h(x) primitivo (pelo Lema 8). O conteúdo do
polinômio do primeiro membro da igualdade é ac , enquanto o conteúdo do
polinômio no segundo membro é bd . Logo ac = bd e f (x) = g(x)h(x) .

Teorema10 Se A é um domínio de fatoração única, então A[x] também o é.

Demonstração:
Por indução sobre o grau de um polinômio f (x) Î A[x ] , é possível mostrar
que ele é produto de um número finito de polinômios irredutíveis. Basta, então,
mostrar que todo polinômio irredutível é primo. Seja p(x) Î A[x ] um polinômio
irredutível e f (x), g(x) Î A[x ] tais que p(x)| f (x) × g(x) . Se p(x) = p Î A , ou seja,
se p(x) é constante, então, pelo item 1 do Lema 8, p(x)| f (x) ou p(x)| g(x) . Se
p(x) Î A[x ] não é constante, então p(x) é primitivo, do contrário poderíamos
escrever p(x) = c( p) × p0 (x) , o que seria uma decomposição não trivial de p(x) .
Além disso, pelo Corolário 9, p(x) irredutível em A[x ] implica que p(x) também
é irredutível em K[x ] . Como K e um corpo, o Corolário 6 nos garante que K[x ]
é um domínio euclidiano, logo também é um DFU e, portanto, p(x)| f (x) × g(x)
implica que p(x) divide um dos fatores em K[x ] , ou seja, existe H (x) Î K[x ]
tal que, f (x) = p(x) × H (x) , digamos. Podemos supor, ainda, que f (x) é primitivo,
1
substituindo H (x) por × H (x) se necessário. Assim, novamente pelo Corolário
c( f )
9, concluímos que f (x) = p(x) × h(x) , com h(x) Î A[x ] , ou seja, p(x) divide f (x) em
A[x ] Claro que o mesmo acontece se supusermos que p(x) divide g(x) em K[x ] .

EXEMPLOS:
1. Como  é um DFU, [x ] também o é. Como já vimos, [x ] não é um DIP,
logo, [x ] é um exemplo de DFU que não é DIP.
2. Se A é um DFU, então A[x1 ,¼, xn ] também é um DFU.
3. Se K é um corpo, então A = K[x ] é, pelo Corolário 6, um DFU, logo,
K[x, y] = A[ y] também é um DFU, pelo Teorema 10. Repetindo esse argumento,
verificamos que K[x1 ,¼, xn ] é um DFU.

106 Estruturas Algébricas


Sendo um DFU, o domínio A[x ] possui irredutíveis. Em geral, determinar
se um polinômio f (x) Î A[x ] é irredutível é um problema difícil. Para termos ideia
das dificuldades que podem surgir, consideremos o seguinte exemplo.

EXEMPLO (EMIL ARTIN):


Seja p(x) = x5 - x - 1Î [x ] . Se

s aiba mais ! p(x) for redutível, então p(x) = f (x) g(x) ,


com grau ( f ) > 0 , grau ( g) > 0 e
Emil Artin, matemático austríaco, nascido em
grau ( f ) + grau ( g) = grau ( p) = 5 . Se um dos
Viena, que fez a sua carreira na Alemanha (mais
fatores for linear, terá que ser do tipo x - a ,
precisamente em Hamburgo) até ao regime Nazi,
com a Î  , ou seja,
quando ele emigra para os Estados Unidos em
1937 onde esteve na Universidade de Indiana de p(x) = (x - a)(x 4 +).
1938 até 1946, e na Universidade de Princeton de Em particular, p(a) = 0 . Multiplicando,
5 4
1946 até 1958. Fonte: <http://apprendre-math. vemos que p(x) = x - ax + , donde a = -1,
info/portugal/historyDetail.htm?id=Artin>. por comparação de coeficientes. Porém
p(-1) = -1 ¹ 0 , consequentemente p(x) não
possui fatores lineares. Assim, grau ( f ) = 2 e
grau ( g) = 3 , ou grau ( f ) = 3 e grau ( g) = 2 . Sem perda de generalidade, vamos
supor que grau ( f ) = 2 e grau ( g) = 3 , isto é,
f (x) = x2 + ax + b e g(x) = x3 + cx2 + dx + e.
Observe que ambos os polinômios são mônicos, ou seja, têm coeficiente líder
igual a 1. Como f (x)| p(x) e os coeficientes de f e p são inteiros, dado cÎ  ,
f (c)| p(c) . Usando esse fato, podemos construir a seguinte tabela:
x p(x) f (x)
2 29 ±1ou ± 29
1 -1 ±1
0 -1 ±1
-1 -1 ±1
-2 -31 ±1ou ± 31

Analisando a tabela, vemos que b = f (0) = ±1 . Logo f (x) = x2 + ax ± 1


e ±1= f (1) = 1+ a ± 1 . Isso implica que a Î { -3,-1,1} . Ainda usando a
tabela, vemos que ±1= f (-1) = 1- a ± 1 , donde a Î { -1,1,3} . Portanto,
a Î { -3,-1,1}Ç{ -1,1,3} = { -1,1} , isto é, a = ±1 . Assim,

f (x) = x2 ± 1± 1.

AULA 6 TÓPICO 3 107


Dessa forma, | f (2)|£ 7 < 29 e | f (-2)|£ 7 < 31 . Isso significa que f (2) = ±1
e f (-2) = ±1 . Observando novamente a tabela, vemos que f (c) = ±1, para cinco
valores diferentes de c , a saber, cÎ { -2,-1,0,1,2} . Pelo princípio da casa dos
pombos, existem três elementos distintos u, v, w do conjunto { -2,-1,0,1,2} tais
que f (u) = f (v) = f (w) = 1 (ou f (u) = f (v) = f (w) = -1 ). Portanto, f (x) - 1 é um
polinômio de grau 2 com três raízes distintas. Conclusão: p(x) é irredutível.

Teorema11 (Critério de Eisenstein) Seja A um domínio de integridade e K


seu corpo de frações. Se, para o polinômio
f (x) = an x n + an-1x n-1 +  + a1x + a0 Î A[x]
existe um primo p Î A tal que
1. pan ,
2. p| ai , para i = 0,1,¼,n - 1 ,
3. p2a0 ,
então f (x) é irredutível em K[x] .

Demonstração:
Suponha, ainda que pareça absurdo, que f (x) = g(x)h(x) , onde
g(x) = b0 + b1x +  + bk x k e

h(x) = c0 + c1x +  + cmxn ,


sendo k + m = n e 0 < k, m < n . Então a0 = b0c0 e an = bk cm . Como, por
hipótese, pan , temos que pbk e pcm . Ainda por hipótese, p| a0 e p2a0 , logo p| b0
ou p| c0 , mas p não divide ambos, isto é,
p| b0 e pc0 ou

p| c0 e pb0 .
Vamos supor que p| b0 e pc0 . O outro caso é similar. Uma vez que p| b0 e
pbk , existe i , 1£ i £ k tal que p| bi -1 e pbi .
Os coeficientes de f (x) podem ser escritos como
a0 = b0c0 ,

a1 = b0c1 + b1c0 ,

108 Estruturas Algébricas


a2 = b0c2 + b1c1 + b2c0 ,

i 0,
ai = b0ci + b1ci -1 +  + bi -1c1 + bc

an = bk cm .
Como p| a1 , p| b0 e a1 = b0c1 + b1c0 , temos p| b1c0 . Como estamos supondo
que pc0 , segue que p| b1 , pois p é primo.
A igualdade a2 = b0c2 + b1c1 + b2c0 , juntamente com com p| a2 , p| b0 e p| b1 ,
implicam que p| b2c0 . Como pc0 , temos p| b2 .
Continuando esse processo, vemos que p| bj , para cada j Î { 0,¼, i - 1} . Logo,
como p| ai , a igualdade ai = b0ci + b1ci -1 +  + bi -1c1 + bc
i 0 implica que p| bc
i 0 , ou

seja, p| bi ou p| c0 . O que não ocorre. Essa contradição vem de supormos f (x)


redutível em A[x ] . Logo f (x) é irredutível em A[x ] . Pelo Corolário 9, f (x) é
irredutível em K[x ] , onde K é o corpo de frações de A .

EXEMPLO:
Seja pÎ  um número primo. O polinômio Ø p (x) = x p-1 +  + x + 1 é chamado
p -ésimo polinômio ciclotômico. Vamos, a seguir, mostrar que Ø p é irredutível.
Primeiramente, notemos que, se f (x) = Ø p (x + 1) então f (x) é irredutível se, e
somente se, Ø p também é. De fato, uma decomposição Ø p (x) = F(x)G(x) implicaria
uma decomposição f (x) = F(x + 1)G(x + 1) . Reciprocamente, uma decomposição
f (x) = g(x)h(x) implicaria uma decomposição Ø p (x) = g(x - 1)h(x - 1) .
x p -1 ,
Agora, como Ø p (x) = 1+ x + x2 +  + x p-1 = temos
x - 1
(x + 1)p - 1 , logo Ø (x + 1) = x p-1 + p x p-2 +  + p x+ p ,
Ø p (x + 1) =
x
p
1 p- 2 p -1
ou seja, Ø p (x + 1) = x p-1 + p +  + p x + p . Como p| p , para todo
1 p- 2 k
2
1£ k £ p - 1 , p1 e p p , pelo critério de Einsenstein, Ø p (x + 1) é irredutível, logo
Ø p (x) também é irredutível.
Isso mostra que, em [x ] , existem polinômios irredutíveis de grau
arbitrariamente grande. É interessante observarmos que isso contrasta fortemente
com a situação em [x ] , onde os polinômios irredutíveis têm grau 1, e em [x ] ,
onde os polinômios irredutíveis têm grau 1 ou 2 .
Concluímos aqui nossa sexta aula. Estudamos os anéis de polinômios e o
problema da irredutibilidade nesses anéis. Um dos principais pontos desta aula são
o Lema de Gauss e suas consequências, principalmente o Teorema 10, que afirma

AULA 6 TÓPICO 3 109


que a propriedade da fatoração única é preservada na passagem de um domínio para
um anel de polinômios com coeficientes nesse domínio. Outro resultado relevante
é o Critério de Einsenstein, que fornece um método para verificar se um polinômio
com coeficientes inteiros é irredutível em [x ] . Os conteúdos abordados nesta aula
serão aplicados na próxima, quando estudaremos as extensões de corpos.

at iv ida d e d e a p r of u da m e n t o

1. Seja A um anel, R = A[x ] e S = A[ y] . Mostre que R[ y] e S[x ] são anéis isomorfos.


Sugestão: Seja f (x, y) = a0 (x) + a1(x) y +  + an (x) yn Î R[ y] . Podemos escrever
f (x, y) = b0 ( y) + b1 ( y)x +  + bm ( y)x . Considere, então, o homomorfismo f : R[ y] ® S[x ] ,
m

dado por
f(a0 (x) + a1(x) y +  + an (x) yn ) = b0 ( y) + b1( y)x +  + bm ( y)xm .
Mostre que f é um isomorfismo.
2. Dado nÎ  , n³ 1 , seja A = n [x, y] .
(a) Mostre que (x) é um ideal primo de A que não é ideal maximal.
(b) Mostre que (x, y) é ideal maximal se, e somente se, n é primo.
(c) Sabendo que (8, x) é um ideal primo de A , determine os possíveis valores de n .

3. Seja A = [x, y] o anel de polinômios com duas indeterminadas com coeficientes reais.
(a) Mostre que I = (x3 - y2 ) é um ideal de A .
(b) Mostre que, no anel quociente A / I , não vale o teorema da fatoração única.

4. Em cada um dos itens abaixo, mostre que o homomorfismo em questão é sobrejetivo e determine seu
núcleo.
(a) f :  ® 8 , dado por f (n) = n .
(b) f : [x, y] ® [x ] , dada por f (P(x, y)) = P(x,0) , onde x, y e t são indeterminadas.
(c) f : [x ] ®  , dada por f (P(x)) = P(i ) , onde i 2 = -1.

5. Usando os homomorfismos sobrejetores do problema anterior, mostre que


(a)  / 8 @ 8
(b) [x, y] / ( y) @ [x ]
(c) [x ] / (x2 + 1) @ 

110 Estruturas Algébricas


-1 + i 3
6. Seja f : [x ] ®  , dada por f (P(x)) = P(w ) , onde w = . Mostre que
2
(a) ker T = (x3 - 1) .
(b) Im T = { a + bw + cw 2 | a, b, c Î } .

7. Dois ideais I e J de um anel A são chamados comaximais quando I + J = A , onde I + J é,


por definição, o ideal formado pelas somas do tipo i + j , onde i Î I e j Î J . Verifique quais dos ideais
abaixo são comaximais:
(a) (x) e ( y) em [x, y] .
(b) (m) e (n) em  , onde m e n são inteiros primos entre si.
(c) (x2 + 1) e (x) em [x ] .

8. Seja C = { (x, y) Î  2 | x2 + y2 = 1} , considere o conjunto


F = { p : C ® 
| p(x, y) éum polinômio } ,
isto é, F é o conjunto de todas as funções polinomiais de duas indeterminadas,
p(x, y) = å xž i y j
1£i £m
1£ j £n

definidas sobre a circunferência de raio 1 centrada na origem.


(a) Mostre que, com a soma e o produto usuais de funções,
( f + g)(x, y) = f (x, y) + g(x, y),

( f × g)(x, y) = f (x, y) × g(x, y),


F é um anel comutativo com unidade. Determine a unidade de F .
(b) Considere o homomorfismo de anéis Ø : [x, y] ® F dado por Ø( p) = p| C ( p restrito a C ).
Determine o núcleo e a imagem de Ø .
(c) Mostre, usando o item anterior, que
F @ [x, y] / (x2 + y2 - 1).

9. Determine todos os ideais de [x ] / (2x) .

10. Seja  o anel quociente [x ] / (x2 ) . Os elementos de  são chamados números duais. Eles são
classes de equivalência de polinômios com coeficientes reais. Seja e = x . Então
 = [e ] = { a + be | a, b Î } .

(a) Mostre que, se f :  ®  é uma função derivável, então f (x + e) = f (x) + e × f '(x) , para todo
xÎ.

AULA 6 TÓPICO 3 111


(b) Mostre que (1+ e)n = 1+ ne , para todo nÎ  .
(c) Mostre que a + be é invertível se, e somente se, a = ±1 .

11. Encontre o quociente e o resto da divisão de f (x) = 3- 2x + 5x3 + x3 Î 7 [x ] por


g(x) = x - 2 Î 7 [x ] .

12. Demonstre o teorema das raízes racionais: Se r / sÎ  é raiz do polinômio


p(x) = a0 + a1x +  + anx e m.d.c.(r , s) = 1, então r | a0 e s| an .
n

13. Usando o resultado do exercício anterior, mostre que, se a Î  é raiz de um polinômio mônico,
então a Î  .

14. Fatore P(x) = x3 + x2 - x - 10 como produto de irredutíveis em [x ] .

15. Seja pÎ  um primo fixado.


(a) Demonstre que y : [x ] ®  p [x ] , dado por
(a0 + a1x +  + anx2) = a0 + a1x +  + anxn
é um homomorfismo de anéis.
(b) Verifique que, se y( f (x)) é irredutível em p[x ] , então f (x) é irredutível em [x ] (dica:
demonstre a afirmação na forma contrapositiva).
(c) Verifique que, se y( f (x)) é irredutível em p[x ] , então f (x) é irredutível em [x ] (esse item é
igual ao anterior?).
(d) Mostre que x 4 - 7x3 + x + 1 é irredutível em [x ] .
(e) Mostre que x 4 - 5x3 + 2x + 3 é irredutível em [x ] .

16. Seja cÎ  fixado. Considere a função j : [x ] ® [x ] dada por j( f (x)) = f (x + c) .
(a) Demonstre que j é um isomorfismo.
(b) Demonstre: dado um polinômio g(x) Î [x ] , se g(x + c) é irredutível sobre  então g(x) é
irredutível sobre  .
(c)(Gauss)UsandoocritériodeEisenstein,mostrequeopolinômio Øp(x) = xp - 1+ xp - 2 +  + x + 1
é irredutível (dica: escreva Øp(x) = xp - 1x - 1 é mostre, usando o critério de Eisentein, que Ø (c)
(Gauss) Usando o critério de Eisenstein, mostre que o polinômio Ø p (x) = x p-1 + x p-2 +  + x + 1
p
x -1
é irredutível (dica: escreva Ø p (x) = é mostre, usando o critério de Eisentein, que Ø p (x + 1)
x -1
é irredutível).

112 Estruturas Algébricas


17. Demonstre que f (x,y) = x 2 + y 2 é irredutível sobre [x,y] .

18. Seja K um corpo e f (x) = a0 + a1x +  + an-1x n-1 + an x n Î K[x] um polinômio


de grau n e termo constante a0 ¹ 0 . Demonstre que, se f (x) for irredutível, então
g(x) = an + an-1x +  + a1x n-1 + a0x n também será.
19. x 5 + x + 1 é irredutível em 2[x] ?
20. Seja K um corpo e A = K[x ] .
(a) Demonstre que todo ideal de A é do tipo
( f ) = { f (x) g(x) | g(x) Î K[x ]} ,
onde f é um polinômio com coeficientes em K (dica: essa demonstração é totalmente análoga à que
fizemos para A =  ).
(b) Demonstre: um ideal I de A é primo se e somente se I = ( f ) , onde f Î K[x ] é irredutível.
(c) Mostre que [x ] / (x2 + x + 1) é um domínio de integridade.

21. Faça uma lista com todos os polinômios de grau 3 em 2[x ] . Quais desses polinômios são irredutíveis?

22. Determine todos os polinômios de grau 2 irredutíveis sobre 3 .

23. Sejam f , g Î [x ] . Suponha que f é irredutível em [x ] e que f e g possuam uma raiz comum
em  . Demonstre que f | g .

24. Determine quais dos seguintes polinômios são irredutíveis em [x ] :


(a) f (x) = 3x2 - 7x + 5 .
(b) f (x) = x3 + 6x2 + 5x + 25.
(c) f (x) = x5 - 3x3 + 21x - 15 .
(d) f (x) = x3 - 3x - 1.

25. Fatore x 4 + 1 , x 4 - 4 e x 4 + 4 completamente sobre  .

26. Se n é um inteiro positivo não divisível por 2 nem por 3 , mostre que o polinômio
(x + y)n - xn - yn Î [x, y] é divisível pelo polinômio xy(x2 + xy + y2 ) .

27. Um polinômio f de grau n sobre um corpo K tem, no máximo, n raízes nesse corpo. Baseando-se
nesse fato, demonstre as seguintes afirmações:

AULA 6 TÓPICO 3 113


(a) Se f tem grau n e existem a1 ,¼, an+1 Î K tais que f (ai ) = 0 , para todo i Î {1,¼, n + 1} , então
f é identicamente nulo.
(b) Se f e g têm grau n e existem a1 ,¼, an+1 Î K tais que f (ai ) = g(ai ) , para todo i Î {1,¼, n + 1} ,
então f = g .
28. Demonstre que o polinômio (x - 1)(x - 2)(x - n) + 1 é irredutível sobre  .

114 Estruturas Algébricas


AULA 7 Introdução à teoria
dos corpos

Olá aluno(a),

Nesta aula, estudaremos de maneira breve alguns dos corpos que contêm o
corpo  dos números racionais e que têm especial importãncia, os chamados
corpos de números algébricos, que são exatamente as extensões finitas de  .
Veremos ainda resultados (Teoremas 4 e 5) que garantem que os corpos com um
número finito de elementos são exatamente aqueles cujo número de elementos
é a potência de um primo. Vale salientar que os resultados aqui apresentados
constituem apenas uma pequena parte da teoria dos corpos.

Objetivos

• Identificar e trabalhar com extensões algébricas finitas, em particular, com o


corpo de decomposição de um polinômio
• Identificar e construir corpos finitos

AULA 7 115
TÓPICO 1 Extensões de corpos
O bjetivos
• Identificar quando um elemento é algébrico ou
transcendente sobre um corpo K
• Determinar o grau de algumas extensões finitas de corpos
• Encontrar o corpo de decomposição de um polinômio,
para alguns casos simples

N este primeiro tópico, faremos uma breve introdução ao estudo das


extensões de corpos, concentrando nossa atenção nas extensões
algébricas e, mais especificamente, naquelas cujo grau é finito.
Os resultados vistos aqui serão usados no tópico 2 para estudarmos extensões
finitas e também na aula 8, quando resolveremos alguns problemas clássicos de
Geometria usando as técnicas desenvolvidas aqui.
Seja K um corpo e L um corpo contendo K . Dizemos que K é um subcorpo
de L , ou que L é uma extensão de K . Usamos a notação L| K para indicar que
L é uma extensão de K . O corpo L pode ser visto como um espaço vetorial sobre
K . De fato, a soma em L satisfaz as condições da definição de espaço vetorial
(isto é, L com a operação soma é um grupo abeliano) e, dados a Î K Ì L e x Î L ,
o produto ax está bem definido e satisfaz as condições da definição de espaço
vetorial, pois é um produto de dois elementos do corpo L .
A dimensão de L como espaço vetorial sobre K é chamada grau da extensão
L| K e é denotada por [L : K ] . No caso em que L é um espaço veotrial de dimensão
infinita sobre K , denotamos [L : K ] = ¥ . Quando [L : K ] = 2 , dizemos que L é
uma extensão quadrática de K . Se [L : K ] = 3 , dizemos que L é uma extensão
cúbica de K .

116 Estruturas Algébricas


EXEMPLOS:
1. O corpo  dos números complexos é um espaço vetorial de dimensão
2 sobre o corpo  dos números reais. De fato, {1, i } Ì  formam uma base de 
sobre  . Dizemos que |  é uma extensão quadrática e denotamos [ :  ] = 2 .
2. Seja K um corpo e K(x) o corpo de funções racionais sobre K , isto é,
K(x) é o corpo de frações de K[x ] . Então K(x) é uma extensão de grau infinito de
K . Isso se dá porque x é uma indeterminada, logo {1, x, x2 , x3 ,¼} é um conjunto
infinito e linearmente independente sobre K (veja a Tarefa 1 dessa aula)

Quando consideramos uma cadeia de corpos F Ì K Ì L , temos o seguinte


resultado sobre os graus das extensões.

Teorema1 Sejam F, K e L corpos tais que F Ì K Ì L . Então [L : F ] é finito se, e


somente se, [L : K ] e [K : F ] são finitos e
[L : F ] = [L : K ] × [K : F ].

Demonstração:
Supondo que [L : F ] é finito, L pode ser visto como um espaço vetorial de
dimensão finita sobre F . Como K é um subespaço de L , [K : F ] também é finito.
Qualquer conjunto que gera L com coeficientes em F , uma base, por exemplo,
também gera L com coeficientes em K . Logo, [L : K ] também é finito.
Reciprocamente, suponhamos que [K : F ] = m e [L : K ] = n . Vamos mostrar
que [L : F ] é finito e é igual a mn . Seja { u1,¼, um } uma base de K sobre F e
{ v1,¼, vn } uma base de L sobre K . Afirmamos que B = { ui v j | 1£ i £ m,1£ j £ n}
é uma base de L sobre F . Note que, como B tem mn elementos, isso mostra que
[L : F ] = mn .

Dado y Î L , existem a1 ,¼, an Î K tais que y = a1v1 +  + anvn . Para cada j ,


1£ j £ n , existem a1j ,¼, amj Î F tais que aj = a1j u1 +  + amj um . Assim,
y = a1v1 +  + anvn = (a11u1 +  + am1um )v1 +  + (a1nu1 + amnum )vn =
= å žij ui v j .
a
1£i £m
1£ j £n

Dessa forma, B gera L sobre F . Vamos mostrar, agora, que B é linearmente


independente sobre F . Para isso, consideremos uma combinação linear do tipo

å žij ui v j = 0,
a
1£i £m
1£ j £n

com aij Î F . Devemos mostrar que aij = 0 , para quaisquer i Î {1,¼, m} e

AULA 7 TÓPICO 1 117


j Î {1,¼, n} . Podemos reorganizar os termos na soma acima de modo que tenhamos
n
0 = åb
žj vj ,
j =1

onde, para cada j Î {1,¼, n} , bj = a1j u1 +  + amj um Î K . Como { v1 ,¼, vn } é uma


base de L sobre K , a igualdade acima implica que bj = 0 , para cada j Î {1,¼, n}
Assim, para cada j , 0 = bj = a1j u1 +  + amj um . Como { u1,¼, um } é uma base de
K sobre F e aij Î F , esta última igualdade implica que aij = 0 , para quaisquer
i Î {1,¼, m} e j Î {1,¼, n} .
Seja K um corpo e S um subconjunto de K . Existe um menor subcorpo de
K que contém S , a saber, a interseção de todos os subcorpos de K que contêm S
. Estamos particularmente interessados no caso em que S = FÈ{ a} , onde F é um
subcorpo de K e a é um elemento de K que não pertence a F . Denotamos esse
menor subcorpo por F(a ) . Temos suas situações possíveis:
1. Não existe polinômio f (x) Î F[x ] tal que f (a ) = 0 . Neste caso, dizemos
que a Î K é transcendente sobre F . O corpo F(a ) é um corpo de funções
racionais em a , ou seja,
ìï f (a ) üï
F(a ) = ïí | f (x), g(x) Î F[x ]ïý
ïîï g(a ) ïþï
e a comporta-se exatamente como uma indeterminada.
2. Existe um polinômio f (x) Î F[x ] tal que f (a ) = 0 . Neste caso, dizemos
que a Î K é algébrico sobre F . No Teorema a seguir, coletaremos os principais
resultados sobre F(a ) quando a é algébrico.

Teorema2 Seja K| F uma extensão de corpos, a Î K , a ÎF , algébrico sobre F


e seja f (x) Î F[x ] um polinômio mônico de grau mínimo tal que f (a ) = 0 e seja
grau ( f ) = n . Então,
1. f é único.
2. f é irredutível em F[x ] .
3. {1, a, a 2 ,¼, a n-1} é uma base do espaço vetorial F(a ) sobre F .
4. [F(a ): F ] = n .
5. Um polinômio g(x) com coeficientes em F satisfaz g(a ) = 0 se, e somente
se, f (x) divide g(x) em F[x ] .

Demonstração:
(1) Suponhamos que existam f (x), g(x) Î F[x ] mônicos (isto é, com
coeficientes líderes iguais a 1) e com grau n = grau ( f ) = grau ( g) mínimo, tais

118 Estruturas Algébricas


que f (a ) = 0 e g(a ) = 0 . Então h(x) = f (x) - g(x) tem grau menor do que n e
h(a ) = 0 . Como grau (h) < grau ( f ) e f é o polinômio não nulo com menor grau
que se anula em a , h(x) = 0 , isto é, h(x) é o polinômio identicamente nulo. Isso
significa que f (x) = g(x) , o que demonstra a unicidade de f .
(2) Se f fosse redutível, poderíamos escrever f = f1 f2 , com
grau ( f1 ) < grau ( f ) e grau ( f2 ) < grau ( f ) . Como f1(a ) f2 (a ) = f (a ) = 0 , teríamos
f1(a ) = 0 ou f2 (a ) = 0 . Mas isso contraria o fato de que f é o polinômio de menor
grau que tem a como raíz. Portanto, f é irredutível.
(3) Se houvesse uma relação de dependência linear entre os
elementos de {1, a, a 2 ,¼, a n-1} , ou seja, se existissem a0 , a1 ,¼, an-1 tais que
a0 × 1+ a1a +  + an-1a n-1 = 0 , o polinômio g(x) = a0 + a1x +  + an-1xn-1 seria tal
que g(a ) = 0 e grau ( g) < grau ( f ) , contrariando a minimalidade do grau de f .
Dessa forma, uma tal relação de dependência linear não existe e, assim, o conjunto
{1, a, a 2 ,¼, a n-1} é linearmente independente.
Seja L o subespaço de F(a ) gerado por
{1, a, a 2 ,¼, a n-1} . Vamos mostrar que L = F(a ) .
Para isso, é suficiente mostrarmos que L é um
g uarde bem i s s o ! corpo, pois F Ì L , a Î L e, por definição, F(a ) é
Na demonstração dos itens (3) e (5), utilizamos o menor corpo que contém F e a . Primeiramente,
o fato de que em F[x ] podemos calcular o mostraremos que a k Î L , para todo k ³ 1 . Para
máximo divisor comum entre dois polinômios. 1£ k £ n - 1 isso é consequência da definição de
Isso é uma consequência direta de F[x ] ser um L . Como f (x) = xn - bn-1xn-1 -  - b1x - b0 se
domínio euclidiano, pois, conforme você, aluno, anula em a , temos
deve lembrar do curso de Teoria dos Números,
a n = b0 + b1a +  + bn-1a n-1 Î L.
o Algoritmo de Euclides para o cálculo do MDC
Supondo, por indução, que ak Î L ,
entre dois inteiros, ou, em geral, entre dois
para 1£ k £ m , a k = c0 + c1a +  + cn-1a n-1 ,
elementos de um domínio euclidiano, utiliza-se
pois {1, a, a 2 ,¼, a n-1} gera L . Multiplicando a
apenas do Algoritmo da Divisão, disponível em
última igualdade por a , obtemos
domínios euclidianos, em particular em F[x ] .
a k+1 = c0a + c1a 2 +  + cn-1a n = c0a + c1a 2 +  +
+cn-1 (b0 + b1a +  + bn-1a n-1 ) Î L.

Assim, pela segunda forma do princípio de indução, a k Î L , para todo k ³ 1


.
Agora, dados u, v Î L , temos u + v Î L , pois L é um espaço vetorial, e u × v Î L .
Para nos convencermos de que u × v de fato pertence a L , basta notarmos que é
possível escrever tanto u quanto v como combinações lineares de 1, a,¼, a n-1 ,

AULA 7 TÓPICO 1 119


e, portanto, o produto u × v pode ser escrito como combinação linear de potências
de a , com expoentes maiores ou iguais a 1, que já vimos serem elementos de L .
Dessa forma, L é um subanel de F(a ) e, de fato, é um domínio, pois é subanel de
um corpo.
Para mostrarmos que L é um corpo, basta então verificarmos que, dado
u Î L , u ¹ 0 , existe v Î L tal que u × v = 1 . Como u Î L , podemos escrever u
como combinação linear de 1, a,¼, a n-1 com coeficientes em F , ou seja, existe
um polinômio h(x) Î F[x ] tal que u = h(a ) . Como grau (h) < grau ( f ) e f é um
polinômio irredutível, segue que o máximo divisor comum entre h e f em F[x ] é
igual a 1, ou seja, existem polinômios g, q Î F[x ] tais que
h(x) g(x) + f (x)q(x) = 1
e essa é uma igualdade de polinômios, ou seja, continua válida se substituirmos x
por a . Fazendo isso, obtemos h(a ) g(a ) + f (a )q(a ) = 1. Como f (a ) = 0 , obtemos
h(a ) g(a ) = 1 . Fazendo g(a ) = v Î L , obtemos u × v = 1 , com v Î L . Assim, L é
um corpo, como queríamos demonstrar.
(4) Como a base {1, a, a 2 ,¼, a n-1} de F(a ) sobre F tem n elementos, temos
que [F(a ): F ] = n .
(5) Se f (x) não dividisse g(x) em F[x ] , então o máximo divisor comum de
f e g seria igual ao polinômio constante 1, pois f é irredutível. Assim, existiriam
r (x), s(x) Î F[x ] tais que
r (x) f (x) + s(x) g(x) = 1.
Fazendo x = a , obteríamos 0 = r (a ) f (a ) + s(a ) g(a ) = 1 , contradição. Logo,
f (x) divide g(x) em F[x ] .
O polinômio f (x) Î F[x ] de menor grau que anula a é chamado polinômio
minimal de a . Podemos interpretar os resultados do Teorema acima à luz do
Teorema fundamental dos homomorfismos de anéis (cf. Aula 4). Para isso, basta
considerarmos o homomorfismo avaliação Ö : F[x ] ® K , dado por Ö( g(x)) = g(a ) .
O núcleo desse homomorfismo é ker Ö = { g(x) Î F[x ]| g(a ) = 0} = ( f (x)) , o
ideal gerado por f (x) em F[x ] . A imagem de Ö , F[a ] = { g(a )| g(x) Î F[x ]} ,
sendo subanel do corpo K , é um domínio de integridade. Como, pelo Teorema
fundamental dos homomorfismos de anéis, F[a ] é isomorfo a F[x ] / ( f (x)) , o
ideal ( f (x)) é primo, logo f (x) é irredutível. De modo similar ao que fizemos na
demonstração do Teorema 2 da Aula 3, é possível mostrar que F[x ] / ( f (x)) é, de
fato, um corpo (é claro que isso também foi feito na demonstração do Teorema 2).
Portanto, F[a ] é um corpo e, como F[a ] contém F e a , temos F[a ] = F(a ) .

120 Estruturas Algébricas


EXEMPLOS:
1. O polinômio minimal de 2 sobre  é f (x) = x2 - 2 . De fato, f ( 2) = 0
e, se g(x) Î [x ] , g( 2) = 0 , então a divisão de g(x) por f (x) fornece
g(x) = f (x)q(x) + r (x), 0 £ grau (r ) < grau ( f ) = 2, ou r (x) = 0.
Assim, podemos escrever r (x) = a + bx , com a, bÎ  . Como
g( 2) = f ( 2) = 0 temos 0 = r ( 2) = a + b 2 , o que implica a = b = 0 , do
a
contrário, teríamos 2 = - Î  , o que não ocorre. Portanto r (x) = 0 e f (x)| g(x)
b
em [x ] . Isso mostra, também, que [ 2] = ( 2) = { a + b 2| a, b Î } .
2. ( 3 2) = { a + b 3 2 + c3 4| a, b, c Î } . O polinômio minimal de 3
2 é
f (x) = x - 2 . Pelo critério de Einsenstein (Aula 6, Teorema 11) com p = 2 , f (x) é
3

irredutível. Assim, [( 3 2): ] = grau (x3 - 2) = 3 .


1 3 2p 2p
3. Seja z3 = - + i × Î  . Podemos escrever z 3 = cos + i × sen , logo
2 2 3 3
4p 4p 1 3
z 32 = cos + i × sen = - -i × = z 3 . O polinômio g(x) = x3 - 1 é tal que
3 3 2 2
g(z 3 ) = 0 . Porém, g(x) não é irredutível em [x ] , pois g(x) = (x - 1)(x2 + x + 1) .
O polinômio f (x) = x2 + x + 1 não tem raízes em  e tem grau menor do que 4 ,
logo é irredutível em [x ] . Como f (z 3 ) = z 32 + z 3 + 1= z 3 + z 3 + 1= -1+ 1 = 0 ,
f (x) é o polinômio mininal de z3 sobre  . Portanto, [(z3 ): ] = grau ( f ) = 2 .
4. O polinômio minimal de i sobre  é f (x) = x2 + 1 . Logo, [(i ): ] = 2 .

Dizemos que um corpo K , contendo o corpo F , é algébrico sobre F ,


se todo elemento de K é algébrico sobre F . Caso contrário, isto é, se existe um
elemento de K que não é algébrico sobre F , dizemos que K é transcendente
sobre F , ou que a extensão K| F é transcendente. No caso particular de K =  ,
uma extensão finita L de  é necessariamente uma extensão algébrica, chamada
corpo de números algébricos.
Se o grau [K : F ] = n da extensão é finito, então K é algébrico sobre F (veja
a tarefa 2). A recíproca, no entanto, não é verdadeira, ou seja, existem extensões
algébricas de grau infinito.
No exemplo 1 deste tópico, consideramos a extensão ( 2)|  . Nesse
exemplo, o polinômio minimal de 2 é f (x) = x2 - 2 . Esse polinômio é irredutível
sobre  , mas, sobre ( 2) , f (x) fatora-se como o produto de dois fatores lineares:
f (x) = (x - 2)(x + 2) . Assim, o corpo ( 2) contém as raízes de f (x) .
Nesse exemplo, o elemento 2 , que não pertence ao corpo  , foi tomado em
um corpo maior, no caso,  . Em geral, dado um corpo K , não dispomos a priori
de um corpo maior onde possamos tomar as raízes de um determinado polinômio

AULA 7 TÓPICO 1 121


com coeficentes em K .
Seja K um corpo e f (x) Î K[x ] um polinômio irredutível sobre K . O anel
quociente L = K[x ] / ( f (x)) é um corpo e podemos identificar K com um subcorpo
de L . Dessa forma, obtemos uma extensão L| K que contém pelo menos uma
raíz de f (x) . De fato, se a = p(x) = x é a imagem de x pela projeção canônica
p : K[x ] ® K[x ] / ( f (x)) , que associa cada polinômio de K[x ] a sua classe no anel
quociente, então f (a ) = f (x ) = f (x) = 0 . Isso significa que a Î L é uma raiz de
f (x) em L .

EXEMPLO:
Se f (x) = x2 - 2 , então, pelo teorema fundamental dos homomorfismos de
anéis, L = [x ] / ( f (x)) é isomorfo ao anel (que é, de fato, um corpo) [ 2] e esse
isomorfismo identifica x com 2.

Caso L contenha todas as raízes de f (x) , o processo termina. Caso contrário,


existe um polinômio irredutível f1 (x) Î L[x ] de grau maior do que 1, tal que
f (x) = (x - a1 )m1 (x - ar )mr f1(x),
onde a1,¼, ar são as raízes de f (x) contidas em L e m1 ,¼, mr são inteiros maiores
ou iguais a 1. Cada mi é chamado multiplicidade de ai como raiz de f (x) .
Como f1(x) é irredutível em L[x ] , o anel quociente L1 = L[x ] / ( f1(x)) é um
corpo e podemos considerar L Ì L1 do mesmo modo que consideramos K Ì L . Em
L1 f1(x) possui pelo menos uma raiz, que também é raiz de f (x) , pois f1(x) divide
f (x) . Esse processo pode ser repetido de modo a obtermos, após um número finito
de passos, uma cadeia de corpos
K Ì L Ì L1 Ì  Ì Ls ,
onde Ls é um corpo que contém todas as raízes de f (x) . Se s³ 1 é o menor inteiro
positivo tal que Ls contém todas as raízes de f (x) , o corpo Ls é chamado corpo de
decomposição de f (x) . Esse nome se deve ao fato de que, em Ls [x ] , o polinômio
f (x) pode ser escrito como produto de polinômios de grau 1:
f (x) = c(x - a1 )m1 (x - at )mt ,
com a1,¼, at Î Ls e c Î K -{ 0} .

EXEMPLO:
O polinômiof (x) = x 4 - 2 Î [x ] é irredutível sobre  . Sabemos
que 4 2 Î  é raiz de f (x) . Logo, f (x) é o polinômio minimal de 4 2
sobre  e [( 4 2): ] = grau ( f ) = 4 . Em ( 4 2) , podemos escrever

122 Estruturas Algébricas


f (x) = (x - 4 2)(x + 4 2)(x2 + 2) , onde x2 + 2 é irredutível sobre ( 4 2)
Assim, x2 + 2 é o polinômio minimal de i × 4 2 Î  sobre K = ( 4 2)
O corpo L = K(i ) = ( 4 2, i ) é um corpo de decomposição de f (x) e
[L : ] = [L : K ] × [K : Q] = 2× 4 = 8 .
Sobre o corpo de decomposição de um polinômio, temos o seguinte resultado.

Teorema3 Seja F um corpo, f (x) Î F[x ] um polinômio irredutível sobre F e L


um corpo de decomposição de f (x) .
1. L é uma extensão finita de F .
2. Se K é outro corpo de decomposição de f (x) , então existe um isomorfismo
s : L ® K tal que s (x) = x , para todo x Î F .

Demonstração:
(1) A construção que fizemos acima nos mostra que, na cadeia
K Ì L Ì L1 Ì  Ì Ls ,
onde Ls é o corpo de decomposição de f (x) Î K[x ] , cada inclusão representa uma
extensão finita. Logo, o grau [Ls : K ] é finito.
(2) A demonstração dessa afirmação requer o uso do Lema de Zorn e da noção
de fecho algébrico, que não estudaremos aqui, devido ao caráter introdutório desta
aula. O leitor interessado pode consultar, por exemplo, o livro de O. Endler, Teoria
dos Corpos, citado nas referências.

Um isomorfismo s : L ® K entre duas extensões L É F e K É F de um corpo


F , tal que s (x) = x para todo x Î F , é chamado F -automorfismo de L em K .
Nosso primeiro tópico termina aqui. Estudamos, de modo introdutório, a
noção de elemento algébrico sobre um corpo. Vimos que há uma relação estreita
entre números algébricos e polinômios, dada pelo fato de que a cada número
algébrico a sobre um corpo está associado um polinômio irredutível de grau
mínimo, chamado polinômio minimal de a . Vimos também que cada polinômio
irredutível de K[x ] pode ser decomposto em uma extensão adequada L| K .
No próximo tópico, veremos como os resultados vistos aqui podem ser
aplicados ao estudo dos corpos com um número finito de elementos.

AULA 7 TÓPICO 1 123


TÓPICO 2 Corpos finitos
O bjetivos
• Identificar a existência e a unicidade dos corpos
finitos
• Construir um corpo com pn elementos, dados p
primo e n natural

O Teorema 2 da Aula 3 nos dá uma maneira de obter uma infinidade


de exemplos de corpos finitos. De fato, temos que  p é um corpo
se, e somente se, p é primo. Como veremos neste tópico, esses não
são os únicos exemplos de corpos finitos. De fato, demonstraremos a seguir que,
para cada primo p e para cada inteiro positivo n , existe essencialmente um único
corpo com pn elementos. Usando as ferramentas desenvolvidas no tópico anterior,
encontraremos um método para construir estes corpos.
Na disciplina de Álgebra Linear, vimos que podemos construir um espaço
vetorial sobre um corpo K qualquer. Assim, podemos considerar o caso em que K =  p ,
um corpo finito com p elementos, onde p é um número primo. Seja, portanto, V
um espaço vetorial de dimensão finita dimKV = n . Isso significa que existe uma
base B = { v1,¼, vn } de V sobre  p . Logo todo v Î V pode ser escrito como
v = a1v1 +  + anvn ,
com a1 ,¼, an Î  p . Podemos escolher cada coeficiente de p modos. Assim, o
espaço vetorial V tem pn elementos.

124 Estruturas Algébricas


O Teorema a seguir mostra que todo corpo com um número finito de
elementos pode ser visto como um espaço vetorial sobre  p para algum primo p ,
exatamente como exposto no parágrafo acima.

Teorema4 Seja L um corpo finito, com m elementos. Então vale o seguinte:


1. Existe p primo tal que  p Ì L é uma extensão finita com [L :  p ] = n .
2. Vale a igualdade m = pn .

Demonstração:
Consideremos o homomorfismo f:®L, dado por f(0) = 0 ,
f(n) = 1+  + 1 ( n vezes), se n> 0 , e f(n) = -1-  - 1 ( -n vezes), se n< 0 .
Aqui, 1= 1L denota o elemento neutro do produto em L . Como L é finito, existe
p

p tal que 1+  + 1= 0 . De fato, se isso não acontecesse, seria possível produzir
uma sequência 1,1+ 1,1+ 1+ 1,¼ de elementos distintos, logo infinita, em L , o
que não é possível, pois L possui apenas um número finito de elementos (veja a
tarefa 3, no final desta aula). Podemos considerar p como sendo o menor inteiro
p

positivo tal que 1+  + 1= 0 (isso é possível, pelo princípio da boa ordenação).

n 
Se n é um inteiro positivo tal que 1+  + 1= 0 , então p| n .
O núcleo kerf é um ideal de  e, como  é um domínio de ideais principais
(aula 5), ker f = n , para algum nÎ  , n> 0 . Como f( p) = 0 , p Î ker f = n ,
logo n| p . Como p é o menor inteiro positivo tal que f( p) = 0 , temos p| n . Assim,
n = p , pois n e p são positivos.
O teorema fundamental dos homomorfismos de anéis nos diz que  / p
é isomorfo a um subanel de L . Como L é um corpo, esse subanel é um domínio.
Assim,  p =  / p é um domínio e, pelo Teorema 2 da aula 3, p é primo e  p é
um corpo. Dessa forma, acabamos de verificar que L é uma extensão do corpo  p .
Uma vez que L é um corpo finito, a extensão L|  p é, necessariamente, uma
extensão finita. Pela discussão do início do tópico, o número de elementos de L é
pn , onde n = [L :  p ] .

O Teorema 4 mostra que o número de elementos em um corpo finito deve ser,


necessariamente a potência de um primo. O Teorema 5 a seguir garante que, para
cada primo p e para cada n inteiro positivo, existe um corpo com pn elementos.

AULA 7 TÓPICO 2 125


Teorema5 Para cada inteiro primo p e para cada inteiro positivo n , existe um
corpo L com pn elementos. Dados dois corpos L e K , ambos com q = pn elemen-
tos, existe um  p -automorfismo de L em K .

Demonstração:
Seja q = pn e considere o polinômio f (x) = xq - x . O Teorema 3 garante que
existe uma extensão finita N de  p que é corpo de decomposição de f (x) , isto
é, todas as raízes de f (x) estão em N . Seja L Ì N o conjunto das raízes de f (x) .
Vamos mostrar que L = N .
Notemos que, dados a, b Î L , temos a q = a e b q = b , pois ambos são
raízes de f (x) = xq - x . Agora (a × b )q = a q × b q = a × b , o que implica a × b Î L .
-1
Mais ainda, f (1) = 0 f (0) = 0 implicam que 1Î L e 0 Î L . Se a ¹ 0 , a Î N
é raiz de f (x) pois (a-1 )q = (a q )-1 = a-1 , logo a-1 Î L . No desenvolvimento
binomial de (a + b )q , os coeficientes binomiais q são múltiplos de q = pn ,
k
para cada k , 1£ k £ q - 1 , logo todos os coeficientes binomiais q são múltiplos
k
de p . Como o corpo N É  p tem característica p , temos q = 0 , para cada k ,
k q
1£ k £ q - 1 , logo (a + b )q = a q + b q e (a - b )q = a q - b q . Como a = a e
b q = b , temos (a ± b )q = a q ± b q = a ± b , o que implica que a ± b Î L . Dessa
forma, o subconjunto não-vazio L de N é fechado para a soma, para a diferença,
para o produto e para a inversão de elementos não nulos, além de conter 0 e 1.
Portanto, L é um corpo e contém todas as raízes de f (x) , sendo, portanto, o corpo
de decomposição de f (x) , ou seja, L = N .
Mostramos, portanto, que existe um corpo com q = pn elementos, para
todo p primo e todo n³ 1 . Esse corpo é exatamente o corpo de decomposição do
polinômio f (x) = xq - x Î  p [x ] . Pelo item (2) do Teorema 3, se K é outro corpo de
decomposição de f (x) existe um  p -automorfismo s : L ® K .
Assim, para concluirmos a demonstração, basta verificarmos que, se K
for outro corpo finito com q = pn elementos, então K também será corpo de
decomposição de f (x) = xq - x . De fato, vamos mostrar que todo elemento de K
é raiz de f (x) Primeiramente, f (0) = 0 , logo 0 Î K é raiz de f (x) . O conjunto
K * = K -{ 0} é um grupo (o grupo multiplicativo do corpo K ) e tem q- 1 elementos.
Dado x Î K * seja S = áxñ = {1, x, x2 ,¼, xr -1} o subgrupo (finito) de K * gerado por
x ( xr = 1 ). Esse grupo tem r elementos e, pelo Teorema de Lagrange (estudado na
Aula 1), r divide a ordem do grupo K * , isto é, q - 1= r × a , para algum a inteiro.

126 Estruturas Algébricas


Assim, xq-1 = x ar = (xr )a = 1a = 1 e, portanto, f (x) = xq - x = x(xq-1 - 1) = 0 . Isso
mostra que todo corpo finito K com q = pn elementos é corpo de decomposição
de f (x) = xq - x , como queríamos.

EXEMPLO:
Seja F = 2 = { 0,1} . O polinômio
2
f (x) = x + x + 1Î F[x ] é irredutível sobre F .
at e n ç ão!
De fato, como f (x) tem grau 2 , sabemos que f
é irredutível se, e somente se, não tiver raízes em Usamos a notação q para indicar o corpo (único
a menos de isomorfismo) com q = pn elementos.
F . Como F = { 0,1} e f (0) = 1 , f (1) = 1, f não
tem raízes em F = 2 e, portanto, é irredutível
em F[x ] . O anel quociente K = 2[x ] / ( f (x)) é, logo, um corpo, cujos elementos
podem ser representados na forma a + na , com a, bÎ 2 , onde a 2 + a + 1= 0 ,
o que significa que a 2 = -a - 1= a + 1 . Essa última igualdade ocorre porque
-1= 1 em 2 . Como temos duas escolhas para a e duas escolhas para b , o corpo
K tem 4 elementos. Mais precisamente:
4 = 2[x ] / ( f (x)) = { 0,1, a,1+ a}
Podemos construir as tabelas de adição e multiplicação para os elementos
de K :
+ 0 1 a 1+ a × 0 1 a 1+ a
0 0 1 a 1+ a 0 0 0 0 0
1 1 0 1+ a a 1 0 1 a 1+ a
a a 1+ a 0 1 a 0 a 1+ a 1
1+ a 1+ a a 1 0 1+ a 0 1+ a 1 a

Com este exemplo, encerramos o tópico 2. Vimos aqui que um corpo finito
tem como número de elementos uma potência de um número primo. Vimos também
que, para cada primo p e para cada inteiro positivo n , existe um corpo de ordem
pn e, mais ainda, esse corpo é essencialmente único, no seguinte sentido: dois
corpos finitos com o mesmo número de elementos são isomorfos. Concluímos o
tópico exibindo, por meio de um exmplo, um método para construir explicitamente
um corpo finito com pn elementos.
Nessa sétima aula, procuramos exibir algumas noções básicas sobre corpos,
enfatizando sua relação estreita com o estudo da decomposição de polinômios.
Na aula seguinte, usaremos alguns resultados encontrados aqui para resolvermos
problemas clássicos de geometria.

AULA 7 TÓPICO 2 127


atividade de a pr o fuda m e n t o

1. Se K Ì L são corpos e [L : K ] = p , um número primo, mostre que, se um corpo N é tal que


K Ì N Ì L , então N = K ou N = L .

2
2. Mostre que, se o grau de u sobre K é ímpar, então K(u) = K(u ) . Sugestão: Mostre que
2
K Ì K(u ) Ì K(u) e que, se K(u) ¹ K(u ) , a extensão K(u ) Ì K(u) é quadrática.
2 2

3. Seja f (x) Î K[x ] e seja L = K(a1 ,¼, an ) tal que f (x) = (x - a1 )(x - an ) em L[x ] .
(a) Mostre que [L : K ] £ n! ;
(b) Supondo que f (x) é irredutível em K[x ] , mostre que [L : K ] = n se, e somente se,
L = K(a j ) , para algum j Î {1,¼, n} . Neste caso, L = K(a j ) para todo j Î {1,¼, n} ;
(c) No final da Aula 6, mostramos que f (x) = x p-1 + x p-2 +  + x + 1 é irredutível em
[x ] . Mostre que este polinômio satisfaz as condições do item (b).

4. Para cada um dos corpos L abaixo, determine todos os homomorfismos de L em  :


(a) L =  .
(b) L = ( 3 5) .
(c) L = (i , 4 2) .

5. Seja L| K uma extensão algébrica e considere a Î L . Seja B = { b1 ,¼, bn } uma base de L como
espaço vetorial sobre K . O operador linesr Ta : L ® L , dado por Ta (x) = a × x é representado, na
base B , pela matriz
æa11 a12  a1n ö÷
çç ÷
çça21 a22  a2n ÷÷÷
A = çç ÷
çç    ÷÷÷
çç ÷
çèan1 an2  ann ÷ø÷

cujas entradas são determinadas pelas equações


n
a × b1 = åa
ž1j b j ,
j =1
n
a × b2 = åa
ž2 j b j ,
j =1

128 Estruturas Algébricas


n
a × bn = åa
žnj b j .
j =1

O polinômio característico de a em relação à extensão L| K , denotado por Fa ,L| K (x) , é o polinômio


característico do operador Ta , dado por Fa ,L| K (x) = det(xI - A ) . Mais explicitamente,

æx - a11 -a12  -a1n ö÷


çç ÷
çç-a21 x - a22  -a2n ÷÷÷
Fa ,L| K (x) = det çç ÷÷.
çç    ÷÷
çç ÷
èç-an1 -an2  x - ann ÷ø÷

Calcule o polinômio característico Fa ,L|  (x) , para cada a e L dados abaixo:


(a) L = (i ) , a = 1+ i .
(b) L = ( 2, 3) , a = 2 + 3 .
(c) L = (i , 3 5) , a = i + 3 5 .

6. Usando a mesma notação do exercício anterior, mostre que Fa ,K (a )| K (x) é o polinômio minimal de a
sobre K .

AULA 7 TÓPICO 2 129


AULA 8 Aplicações

Olá aluno(a),

Chegamos à nossa última aula. Exibiremos duas aplicações dos assuntos


estudados nas aulas anteriores. A primeira aplicação é a resolução de três
problemas geométricos levantados pelos matemáticos da Grécia antiga, os
quais só podem ser adequadamente tratados usando-se álgebra abstrata, mais
precisamente a teoria dos corpos, desenvolvida na aula 7. A segunda aplicação,
os códigos corretores de erros, é a base matemática para o funcionamento de
inúmeros artefatos tecnológicos que usamos nos dias atuais: CDs, DVDs, telefones
celulares e transmissões digitais de TV, além do próprio computador pessoal.

Objetivos

• Estabelecer conexões entre os assuntos estudados nas aulas anteriores e as


soluções de problemas oriundos de outras áreas
• Compreender a Álgebra Abstrata como uma ferramenta útil em Geometria e
em Teoria da Comunicação

130 Estruturas Algébricas


TÓPICO 1 Construções com régua
e compasso
O bjetivos
• Compreender, situar historicamente os problemas
clássicos de construção por régua e compasso, bem como
compreender a impossibilidade de sua solução
• Visualizar a ligação entre esses problemas e a teoria dos
corpos

N este primeiro tópico, indicaremos, de modo breve, como usar


o Teorema 2 da aula 7, para mostrar a impossibilidade de três
construções geométricas, valendo-nos de régua e compasso: a
duplicação do cubo, a trissecção de um ângulo arbitrário e a quadratura do círculo.
Esses três problemas surgiram na Grécia antiga e, por isso, são chamados problemas
clássicos de construção. A impossibilidade de sua resolução só foi estabelecida em
meados do século XIX.
Os geômetras gregos, seguindo uma tradição amadurecida ao longo de
séculos de estudo e cristalizada nos treze livros de Euclides de Megara, chamados
Elementos, adotavam como instrumentos básicos para a construção de figuras
geométricas planas a régua, sem marcas, e o compasso. Enfatizamos que a régua
euclidiana não possui marcas, pois não é utilizada para medir comprimentos,
mas apenas para traçar retas. Por sua vez, o compasso é o instrumento euclidiano
utilizado para se traçar círculos.
Discussões de ordem prática em torno da limitação de instrumentos
específicos não estão em questão aqui. Assim, podemos assumir que dispomos
de uma régua suficientemente comprida de modo a ser possível traçar qualquer
segmento, mesmo que tenha comprimento muito grande (a distância entre Saturno
e o sol, por exemplo). Podemos também, assumir que dispomos de um compasso
capaz de traçar qualquer círculo, mesmo que seu diâmetro seja muito grande (o
diâmetro de nossa galáxia, por exemplo).

AULA 8 TÓPICO 1 131


Evidentemente, os próprios gregos conheciam outros instrumentos e com eles
conseguiram resolver os problemas aqui propostos. No entanto, a solução, usando-
se apenas régua e compasso, é a mais simples possível e, por isso, os matemáticos
gregos, sempre que confrontados com um problema de construção, procuravam
obter uma solução valendo-se somente de régua e compasso.

Os problemas clássicos gregos são:


1. A duplicação do cubo: dado um cubo,
você s abia? construir, usando apenas régua e compasso,
outro cubo que tenha o dobro do volume.
Além da importância matemática dos problemas
Como veremos, isso é equivalente a construir, a
geométricos citados, é necessário compreender
partir de um segmento de comprimento 1, um
que, na antiguidade, ciência e mito confundiam-
se. Assim, por exemplo, o problema da duplicação segmento de comprimento 3
2;
do cubo está vinculado à seguinte narrativa: em 2. Trissecção do ângulo: dado um ângulo
427 a.C., uma peste assolou Atenas, dizimando qualquer, traçar, usando apenas régua e
um quarto de sua população. Como Apolo era o compasso, duas semirretas que tenham origem
deus que regia as pragas e doenças, as pitonisas no vértice do ângulo e que dividam o ângulo em
do oráculo de Apolo em Delos foram consultadas 3 ângulos iguais;
sobre o que fazer para aplacar a ira do deus. A 3. Quadratura do círculo: construir, usando
resposta foi que o altar do templo de Apolo, que apenas régua e compasso, um quadrado que
tinha o formato de um cubo, deveria ser duplicado. tenha área igual à área de um círculo dado.
Prontamente, os atenienses construíram um novo Mostraremos que isso é equivalente a construir,
altar com aresta duas vezes maior. Isso não afastou
a partir de um segmento de comprimento 1,
a peste, pois o volume do altar fora multiplicado
outro segmento que tenha comprimento p.
por oito.

O escritor norte-americano Joseph


Campbell, autoridade renomada em mitologia, atestando a importância mística do
problema da quadratura, afirma, em seu livro «O Herói de Mil Faces»,

[Segundo as tradições antigas] a cúpula do céu se apóia nos quatro cantos da


terra, por vezes sustentada por quatro reis cariátides, anões, gigantes, elefantes
ou tartarugas. Daí decorre a tradicional importância atribuída ao problema
matemático da quadratura do círculo: ele contém o segredo da transformação
das formas celestes em formas terrestres.(Campbell, J., O Herói de Mil Faces,
ed. Pensamento - São Paulo, 2007, p. 46).

132 Estruturas Algébricas


Para podermos utilizar as ferramentas
desenvolvidas na aula 7, precisamos traduzir o
sa iba m a is!
problema geométrico em linguagem algébrica.
Mais informações sobre Joseph Campell, acesse
Para fazer isso, usamos a geometria analítica:
o site http://www.amalgama.blog.br/02/2009/
associamos a cada ponto do plano um par
joseph-campbell-o-evolucionista-das-religioes/
ordenado de números reais.
Dado um conjunto não-vazio C0 de
pontos no plano, podemos construir, para cada
par de pontos distintos P,Q Î C0 , uma reta que passa por P e Q e também
dois círculos, um centrado em P e passando por Q e outro centrado em Q e
passando por P . O conjunto dessas retas e desses círculos é denotado por s(C0 ) .
Se X é um ponto do plano tal que { X} = a Ç b , com a, b Î s(C0 ) , dizemos que X
é um ponto construtível de primeira espécie a partir de C0 . O conjunto dos
pontos construtíveis de primeira espécie é denotado por C1 . Usando a mesma ideia,
podemos obter o conjunto C2 , dos pontos construtíveis de segunda espécie, a
partir de C 0 , como sendo o conjunto dos pontos X tais que { X} = a Ç b , com
a, b Î s(C1 ) . Continuando esse processo, obtemos
Cn = { X| { X} = a Ç b, a, b Î s(Cn-1 )} .
No que se segue, consideraremos os pontos construtíveis a partir do
conjunto C0 = { (0,0),(1,0)} . Os pontos construtíveis de primeira espécie a partir
de C0 = { (0,0),(1,0)} são

1 3 1 3
C1 = { (0,0),(1,0),(-1,0),(2,0),( , ),( ,- )}
2 2 2 2

e estão ilustrados na figura abaixo.

Figura 1: Pontos construtíveis


1 1
Observemos que ( ,0) ÎC1 , mas ( ,0) Î C2 (veja a tarefa 1 desta aula).
2 2

AULA 8 TÓPICO 1 133


Um ponto P é dito construtível se
existe n³ 0 tal que P Î Cn . Um número a Î 
é chamado número construtível se o ponto
atenção ! (a,0) for construtível. O próximo teorema
Sejam A, B,C, D Î Cn . Se caracteriza os números reais construtíveis.
c(A, B)Çc(C, D) = { E, F} , então Vamos estabelecer uma notação que nos ajudará
E, F Î Cn+1 e podemos considerar na demonstração do teorema. Se A e B são
c(A, B)Çc(C, D) = c(A, B)Çr (E, F) . Assim, pontos distintos do plano, r (A, B) denota a
para obtermos pontos construtíveis, basta reta determinada por A e B e c(A, B) denota o
considerarmos interseções entre duas retas, ou círculo de centro A que passa por B . Notemos
entre uma reta e um círculo. que r (A, B) = r (B, A ) , porém, c(A, B) ¹ c(B, A ) .
Se A = (a1 , a2 ) e B = (b1, b2 ) , então a equação da
reta r (A, B) é
r (A, B): (b2 - a2 )X + (a1 - b1 )Y + (a2b1 - a1b2 ) = 0.
A equação do círculo c(A, B) é
c(A, B): (X - a1 )2 + (Y - a2 )2 = (b1 - a1 )2 + (b2 - a2 )2.

Teorema1 Qualquer número real construtível a é algébrico sobre os racionais e


[(a): ] é uma potência de 2

Demonstração:
Se a Î  é construtível, então (a,0) Î Cn , para algum n³ 0 . Isso significa
que (a,0) está na interseção de duas retas ou de uma reta e um círculo, determinados
por pontos construtíveis de espécie n- 1 . Mais precisamente, existem pontos
A, B,C, D Î Cn-1 tais que { (a,0)} = r (A, B) Ç r (C, D) ou { (a,0)} = r (A, B) Ç c(C, D) .
Em qualquer um dos casos, o par ordenado (a,0) é solução de um sistema de um
dos tipos abaixo:
ì
ï
ï(b2 - a2 )X + (a1 - b1 )Y + (a2b1 - a1b2 ) = 0
í ou
î(d2 - c2 )X + (c1 - d1 )Y + (c2d1 - c1d2 ) = 0
ï
ï
ì
ï
ï(b2 - a2 )X + (a1 - b1 )Y + (a2b1 - a1b2 ) = 0
í 2 2 2 2,
î(X - c1 ) + (Y - c2 ) = (d1 - c1 ) + (d2 - c2 )
ï
ï
onde A = (a1 , a2 ), B = (b1, b2 ),C = (c1, c2 ), D = (d1, d2 ) .
Eliminando a indeterminada Y nesses sistemas, obtemos uma equação de
grau no máximo 2 . Assim, podemos afirmar que, se as coordenadas ai , bi , ci , di (
i = 1,2 ) dos pontos A, B,C, D , pertencem a um corpo F , então a Î F( D ) , com

134 Estruturas Algébricas


D Î K , D > 0 ( D é o discriminante da equação quadrática oriunda do segundo
sistema acima). Como C0 = { (0,0),(1,0)} e 0,1Î  , podemos afirmar que a Î Fn ,
onde
 = F0 Ì F1 Ì F2 Ì  Ì Fn
e, para cada n³ 0 , Fn+1 = Fn ( Dn ) , com Dn Î F e Dn > 0 .
De acordo com o Teorema 1 da Aula 7, aplicado um número finito de vezes,
[Fn : ] = 2n . Como  Ì (a) Ì Fn , temos que [(a): ] é um divisor de [Fn : ] = 2n ,
logo é, necessariamente, uma potência de 2 , como queríamos demonstrar.
Vamos, agora, usar o Teorema 1 para mostrar a impossibilidade das
construções clássicas.

1. Duplicação do cubo: Seja V = a3 o volume do cubo original. Para


construirmos um cubo de volume 2V , é necessário construirmos, a partir da
aresta a , uma aresta b tal que b3 = 2a3 , ou seja, b = 3 2 × a . O problema, então, é
equivalente a construir o número 3 2 . Como f (x) = x3 - 2 é irredutível sobre  ,
temos que [( 3 2 : )] = grau ( f ) = 3 . Logo, 3
2 não pode ser construtível, pois
[( 3 2 : )] não é uma potência de 2 .
2. Trissecção do ângulo: Alguns ângulos (por exemplo, 90 ) podem
ser trissectados, usando-se régua e compasso. Vamos mostrar que 60 não pode
ser trissectado usando-se régua e compasso. Se pudéssemos trissectar o ângulo
de 60 , poderíamos construir o ângulo de 20 . Uma vez construído esse ângulo,
seria possível construir um triângulo retângulo com um dos ângulos internos
medindo 20 . Logo, o número a = 2× cos20 seria construtível. A partir da relação
trigonométrica cos3q = 4cos3q - 3cosq , deduzimos que a3 - 3a - 1= 0 . Assim,
a é raiz do polinômio f (x) = x3 - 3x - 1 , irredutível sobre  e, portanto,
[(a): ] = grau ( f ) = 3 . Como o grau dessa extensão não é uma potência de
2 , a = 2cos20 não é construtível, logo um ângulo que mede 60 não pode ser
trissectado.
3. Quadratura do círculo: A área de um círculo de raio 1 é p . Construir
um quadrado cuja área é igual a p é equivalente a construir o lado desse quadrado,
ou seja, um segmento de comprimento p . Mas, se p fosse construtível,
p = ( p ) , também seria construtível. Pelo Teorema 1, p seria algébrico sobre  .
2

Mas o número p é transcendente. Logo, o problema da quadratura do círculo é


insolúvel por régua e compasso.

AULA 8 TÓPICO 1 135


Concluímos, aqui, nosso primeiro tópico.
Vimos que a noção de extensão de corpos,
estudada na aula 7, nos permite resolver três
atenção ! problemas sobre construções geométricas que
A transcendência de p não é um fato elementar, permaneceram em aberto por mais de 23 séculos,
e só demonstrada por Carl Louis Ferdinand desde a Grécia antiga até o século XIX, quando
von Lindemann (1852-1939), em 1882. Essa foram resolvidos recorrendo-se à ferramenta
demonstração encerrou a busca pela quadratura algébrica.
do círculo, problema em aberto que perdurou em
Matemática por mais de 2300 anos!

136 Estruturas Algébricas


TÓPICO 2 Códigos corretores
de erros
O bjetivos
• Compreender o funcionamento dos códigos detectores e
dos códigos corretores de erros
• Identificar a noção de corpo finito como elemento básico
na construção de códigos

N este tópico, veremos uma importante aplicação das noções


estudadas nas aulas anteriores: a Teoria dos Códigos.
Evidentemente, apresentaremos aqui apenas uma breve
introdução a esse vasto assunto. Para um estudo mais aprofundado, recomendamos
o livro “Códigos Corretores de Erros”, de Hefez e Vilela (veja nas referências).
Os códigos corretores de erros formam a ferramenta matemática que permite a
transmissão de dados com perda mínima de informação, tornando possível o
funcionamento de vários aparelhos, como os transmissores digitais de imagem
e som (CD, DVD, BlueRay, TV digital, telefonia digital). Esta aplicação contrasta
fortemente com a vista no tópico 1 desta aula, pois ao contrário de resolver um
problema antigo, torna possível a transmissão de informações por meio digital,
fundamental nos dias atuais.
O artigo de Claude Elwood Shannon (1916-
2001), Mathematical theory of communications,
publicado em 1948, marca o início da Teoria dos sa iba m a is!
Códigos. Neste artigo, Shannon mostrou que há
Para maiores informações a respeito do artigo
como corrigir a interferência sofrida por uma
de Claude Elwood Shannon (1916-2001),
determinada mensagem (que pode ser um som,
Mathematical theory of communications,
uma imagem ou outra informação qualquer) acesse o site www.mast.queensu.ca/~math474/
de modo a recuperar a mensagem original com shannon1948.pdf.
grande precisão.

AULA 8 TÓPICO 2 137


Segundo seu colega do MIT (Massachusetts Institute of Technology), R. G.
Gallager, “Shannon foi a pessoa que viu a representação binária como elemento
fundamental em toda comunicação. Essa foi uma descoberta realmente sua, e dela
surgiu toda revolução das comunicações”.
Nas três décadas que se seguiram, a Teoria dos Códigos desenvolveu-se em
boa parte graças ao trabalho de matemáticos ligados ao Bell Telephone Laboratories,
nos Estados Unidos: Elwyn Ralph Berlekamp (1940- ), Edgar Nelson Gilbert
(1923- ), Richard Wesley Hamming (1915-1998), David S. Slepian (1923-2007), Neil
James Alexander Sloane (1939- ), e também a outros matemáticos, dentre os quais
destacamos Jacobus Hendricus van Lint (1932-2004), professor da universidade de
Eindhover, na Holanda. Esse desenvolvimento culminou com a apresentação, no
dia 8 de março de 1979, do primeiro protótipo de um CD (Compact Disc), para uma
audiência de aproximadamente 300 jornalistas, na sede da Philips, na Holanda. Por
conta de seu pequeno tamanho, o CD foi chamado pelos cientistas da Philips de
Pinkeltje, nome de um minúsculo duende que é o personagem central de uma série
de livros populares na Holanda.
Para compreender como funciona um código, vamos começar com um
exemplo de um código que detecta um erro.

EXEMPLO 2:
O código usado para detectar um erro na transmissão de dados entre o teclado
e a unidade central processamento (CPU) de um computador é o ASCII (American
Standard Code for Information Interchange, ou seja, Código Padrão Americano para
o Intercâmbio de Informação). O código consiste de associações entre os símbolos
do teclado e listas de 7 dígitos 0 ou 1. Cada dígito de uma dessas listas é chamado
bit. Por exemplo, podemos associar ao símbolo * à lista 1001101, formada por 7
bits. Como, para cada possível bit, temos duas possibilidades, ao todo podemos
dispor de 128 = 27 listas.
Para que possamos detectar um erro, devemos introduzir um oitavo bit,
chamado bit de checagem. Obtemos assim uma lista com 8 bits, denominada byte,
onde 7 dígitos (bits) transmitem uma informação e o oitavo bit serve para verificar
se a informação foi transmitida corretamente.

138 Estruturas Algébricas


Figura 2: Ligação entre teclado e CPU

Na prática, acrescentamos o oitavo bit de modo que o byte resultante tenha


um número par e dígitos (bits) iguais a 1. Por exemplo, tomemos a lista de 7 dígitos
1001101, que corresponde ao símbolo *. Nessa lista, temos quatro bits iguais a 1.
Isso significa que o oitavo bit deve ser, necessariamente, igual a 0 , de modo que,
no byte resultante, o número de bits iguais a 1 seja par:
bit dechecagem byte
 
1001101 0 = 10011010.
Assim, digamos que um usuário do
computador pressione a tecla * no teclado e que,
por algum motivo, haja exatamente um erro
na transmissão da mensagem para a CPU. Isso at e n ç ão!
significa que exatamente um dos bits do byte Devemos observar que o código ASCII detecta
10011010 foi trocado, logo, o byte resultante um erro, mas não é capaz de corrigi-lo, sendo
possuirá um número ímpar de bits iguais a 1. necessário o reenvio da informação. Códigos
Um byte com um número ímpar de bits iguais a 1 detectores de erros são úteis em sistemas de redes,
é rejeitado pela CPU e o usuário tem que digitar onde a informação pode facilmente ser reenviada,
novamente. sem prejuízo de tempo. No entanto, quando é

A Figura 3 abaixo esquematiza o preciso enviar informações para um destinatário

funcionamento de um código. A ideia é distante, o erro, além de detectado, tem que ser
corrigido.
selecionar um certo número de blocos de
comprimento finito, que formarão o código.
No exemplo acima, os blocos são os bytes. Uma certa informação que precisa ser
transmitida por um canal sujeito à interferência é codificada (transformada em um

AULA 8 TÓPICO 2 139


bloco X pertencente ao código) e transmitida. Depois da transmissão, a informação
recebida ( X + E ) é analisada e, dependendo do código escolhido, será possível
corrigir um certo número de erros ( E ) que eventualmente podem ter ocorrido
durante a transmissão. Só depois, a informação é decodificada.

Figura 3: Codificação e decodificação

Um código é chamado código de blocos se a informação codificada pode


ser dividida em blocos, todos com n símbolos, que podem ser decodificados
independentemente. Estes blocos são chamados palavras do código e n é chamado
comprimento da palavra. No exemplo que vimos anteriormente, o código ASCII é
um código de blocos, no qual as palavras são os bytes de comprimento 8 .
Seja Q um conjunto com q símbolos, que chamaremos de alfabeto (por
exemplo, no código ASCII, Q= { 0,1} ). Em um código de blocos, cada palavra é
uma lista formada por n elementos de Q : (q1 ,¼, qn ) Î Q´´Q = Q . Por uma
n

questão de simplicidade e porque não há perigo de confusão, denotamos cada


palavra simplesmente escrevendo q1 qn , omitindo as vírgulas e os parênteses. Se
X,Y Î Qn , a distância de Hamming entre X = x1 xn e Y = y1  yn , denotada
por d(X,Y) , é dada por
d(X,Y) = # { i | 1£ i £ n, xi ¹ yi }
onde o símbolo # denota o número de elementos de um conjunto.
A distância de Hamming é uma métrica, isto é, satisfaz as seguintes
condições:
1. d(X, X) = 0 , para todo X Î Qn .
2. Se X,Y Î Qn e X ¹ Y , então d(X,Y) > 0 .
3. d(X,Y) = d(Y, X) , para quaisquer X,Y Î Qn .
4. Se X,Y, Z Î Qn , então d(X, Z) £ d(X,Y) + d(Y, Z) .

Todas as condições acima podem ser verificadas sem dificuldade, exceto a


condição 4, cuja validade será verificada a seguir.

140 Estruturas Algébricas


Se X = Y ou Y = Z , então d(X, Z) = d(Y, Z) ou d(X, Z) = d(X,Y) ,
respectivamente. Assim, neste caso vale 4. Podemos, então, supor que X ¹ Y e
Y ¹ Z . Se xi ¹ zi para algum i , 1£ i £ n , então xi ¹ yi ou yi ¹ zi , do contrário
xi = yi e yi = zi implicariam xi = zi . Portanto, se as i -ésimas coordenadas de
X e Z contribuem com uma unidade para d(X, Z) , então as mesmas i - ésimas
coordenadas contribuem com uma unidade em d(X,Y) ou uma unidade em
d(Y, Z) (ou uma unidade em cada). Sendo assim, d(X, Z) £ d(X,Y) + d(Y, Z) , como
queríamos.
Um código de blocos é, portanto, um subconjunto C Ì Qn . Se # (C) = 1 ,
dizemos que C é trivial. Se # (Q)q = 2 , o código C é chamado binário. Se q = 3 ,
o código C é chamado ternário, e assim por diante.
Desejamos encontrar códigos cujas palavras sejam difíceis de serem
confundidas umas com as outras. Isso significa que, dadas duas palavras distintas
X,Y Î C , devemos ter d(X,Y) ³ d . , onde d > 0 é um inteiro positivo que mede
quão distintas umas das outras são as palavras do código C . Chamamos esse inteiro
d = d(C) de distância mínima de C . Mais precisamente, a distância mínima de
C é dada por
d(C) = min{ d(x, y)| x, y Î C} .

Se o valor de d(C) é grande , temos uma garantia de que o código pode


funcionar bem. De fato, se ocorrer um erro de transmissão e a palavra enviada
d
X for recebida como Z , e se d(X, Z) < , onde
d 2
representa o maior intro que não supera d
2 2
, então a palavra Z deve ser interpretada como
X.
at e n ç ão!
Neste ponto, vale a pena observarmos que, tanto
o computador que envia quanto o que recebe a
mensagem têm, a sua disposição, uma listagem
com todas as palavras do código, de modo a poder
calcular a distância de Hamming entre a palavra
recebida e cada uma das palavras do código. Dessa
forma, a palavra recebida Z é interpretada como
sendo a palavra X do código tal que d(X, Z)
assume o menor valor possível.

Figura 4: Distância mínima

AULA 8 TÓPICO 2 141


EXEMPLO 3:
Se Q= { 0,1} e C= { 001,010,100} , as distâncias entre os elementos de C são:
d(001,010) = 2 , d(001,100) = 2 e d(010,100) = 2 . Logo, a distância mínima de C
é igual a 2 .
Assim, para um código C com distância mínima d , se a interferência na
d
transmissão provoca um erro menor do que , o código é capaz de corrigir o erro
2
e recuperar a mensagem original.
A partir deste ponto, vamos fazer uso do nosso estudo de corpos finitos para
podermos construir códigos eficientes. Vamos tomar como alfabeto um corpo finito
q , com q elementos. Como já vimos na aula 7, q é, necessariamente, a potência
de um número primo. As palavras são, agora,
elementos de qn = q ´´ q . Como qn é um
espaço vetorial sobre q , as palavras podem ser
atenção ! vistas agora como vetores.

Revise o conteúdo de subespaço vetorial na


Um subespaço vetorial C de qn é chamado

disciplina de álgebra linear aula 2. código linear. Se C tem dimensão k , então C é


chamado código [n, k ] .

Esta estrutura algébrica adicional nos permite simplificar os cálculos e obter


resultados mais profundos sobre os códigos lineares do que sobre os códigos de
blocos que não têm estrutura algébrica alguma.
Uma uma matriz k ´ nG cujas linhas formam uma base do código C como
subespaço de qn , é chamada matriz geradora do código C . Se G é uma matriz
geradora de C , então
C = { X × G| X Î qk } ,
onde um elemento X de qk deve ser identificado aqui com a matriz linha ( 1´ k )
X . O resultado do produto X × G é uma matriz linha 1´ n , que identificamos com
um elemento de qn , pertencente a C .

EXEMPLO 1:
Seja CÌ 26 o código binário gerado pela base B = {100011,010101,001110} .
A matriz geradora de C é
æ1 0 0 0 1 1ö÷
çç ÷
G = çç0 1 0 1 0 1÷÷÷ ,
çç ÷
çè0 0 1 1 1 0÷÷ø

142 Estruturas Algébricas


cujas linhas são os vetores da base B de C . Para cada X = x1x2x3 Î 23 , o produto
X × G é um elemento de C e todos os elementos de C são obtidos dessa forma. Por
exemplo, dado X = 101Î 23 , temos
æ1 0 0 0 1 1ö÷
çç ÷
X × G = (1 0 1) × çç0 1 0 1 0 1÷÷÷ = (1 0 1 1 0 1).
çç ÷
çè0 0 1 1 1 0÷÷ø
Ao todo, 23 tem 8 elementos, logo C também tem oito elementos.
Se um código C tem distância mínima d = 2e+ 1, então ele pode corrigir
d
até = e erros em uma palavra recebida. Para encontrar a distância mínima d
2
de um código arbitrário C , temos que encontrar a distância entre todos os pares
M (M - 1)
de palavras. Se o código possui M palavras, precisamos calcular M =
2 2
distâncias. Quando C é um código linear, podemos encontrar a distância mínima
com muito menos esforço computacional. Para isso, precisamos considerar o peso
w (X) de uma palavra X Î C , que é dado por
w (X) = d(X,0),
onde 0 é o vetor nulo do espaço vetorial qn . O peso mínimo de C é dado por
w (C) = min{ w (X)| X Î C, X ¹ 0} .
Para encontrar o peso mínimo, precisamos calcular w (X) para todo X Î C .
Logo, é necessário calcular M - 1 distâncias, o que representa um esforço
computacional bem menor do que aquele usado no cálculo da distância mínima.
Temos, então, o seguinte resultado:

Teorema2 Em um código linear C , a distância mínima é igual ao peso mínimo.

Demonstração:
Como C é um espaço vetorial, se X,Y Î C , então X - Y Î C . Pela definição
de distância de Hamming, d(X,Y) é igual à quantidade de coordenadas distintas
de X e Y . Esse número coincide com o número de coordenadas não nulas de
X - Y , logo d(X,Y) = d(X - Y,0) = w (X - Y) . Assim, a menor distância coincide
com o menor peso.
Seja q = pn , onde p é um número primo e n é um número inteiro positivo.
Seja C um código [n, k ] sobre q , isto é, C é um subespaço de dimensão k de qn .
Podemos escolher uma base B = { v1¼, vk } de C dada por
v1 = 1000x1 k+1 x1n

AULA 8 TÓPICO 2 143


v2 = 0100x2 k+1 x2n

vk = 001xkk+1 xkn .
Com essa escolha, a matriz geradora de C adquire a seguinte forma, chamada
forma canônica:
æ1 0  0 x1 k+1  x1n ö÷
çç ÷
çç0 1  0 x2 k+1  x2n ÷÷÷
G = çç ÷ = (I k P),
çç       ÷÷÷
çç ÷
çè0 0  1 xkk+1  xkn ÷÷ø

onde I k denota a matriz identidade k ´ k e


æx1 k+1  x1n ö÷
çç ÷
ççx2 k+1  x2n ÷÷÷
P = çç ÷
çç   ÷÷÷
çç ÷
çèxkk+1  xkn ÷÷ø
k´(n-k )

A partir da matriz transposta simétrica de P ,


æ-x1 k+1  -xkk+1 ö÷
çç ÷
çç-x1 k+2  -xkk+2 ÷÷
-P = çç
t ÷
çç   ÷÷÷
çç ÷÷
çè-x1 n  -xkn ø÷÷ (n-k )´k

e da matriz identidade I n-k , podemos construir a matriz


æ-x1 k+1  -xkk+1 1 0  0ö÷
çç ÷
çç-x1 k+2  -xkk+2 0 1  0÷÷÷
H = (-P I n-k ) = çç
t
÷
çç       ÷÷÷
çç ÷
çè-x1 n  -xkn 0  0 1÷÷ø(n-k )´n

chamada matriz de checagem de paridade, ou, simplesmente, matriz de


checagem, do código C . A importância da matriz de checagem é esclarecida pelo
teorema a seguir.

Teorema3 Dado um código C , linear [n, k ] sobre q e uma palavra x Î qn , temos
x Î Cse, esomentese, x × H t = 0,
onde H t representa a transposta da matriz de checagem.

144 Estruturas Algébricas


Demonstração:
Primeiramente, mostraremos que G× H t = 0 , a matriz nula de ordem
k ´ (n - k) . De fato,
æ-x1 k+1 -x1 k+2  -x1n ö÷
çç ÷÷
çç    ÷÷
æ1 0  0 x1 k+1  x1n ö÷ çç ÷
çç ÷ ç-x -xkk+2  -xkn ÷÷÷
çç0 1  0 x2 k+1  x2n ÷÷÷ ççç kk+1 ÷
G× H t = çç ÷ × ç1 0  0 ÷÷÷ .
ç       ÷÷÷ çç ÷÷
ççç ÷ çç0 1  0 ÷÷
çè0 0  1 xkk+1  xkn ÷ø÷k´n çç ÷÷
çç    ÷÷
çç ÷÷
èç0 0  1 ÷ø n´(n-k )

O produto de matrizes acima é igual à matriz nula de ordem k ´ (n - k) (veja


a tarefa 3 desta aula).
Uma palavra x Î qn pertence ao código C se, e somente se, x = y × G , onde
G é a matriz k ´ n geradora do código C e y Î q . Assim, x Î C se, e somente se,
k

x × H t = y × (G× H t ) = y × 0 = 0 .

Seja H a matriz de checagem do código [n, k ] linear C . Dado um vetor


x Î  , o produto x × H t é um vetor de qn-k , que chamaremos de síndrome de x .
n
q

Como vimos na Aula 1, um espaço vetorial V , quando se considera apenas a


operação soma, é um grupo abeliano, e um subespaço S de V é um subgrupo de V .
Em particular, o código linear C é subgrupo de qn . Dessa forma, qn = C1 È  È Cm ,
onde cada Ci ( i Î {1,¼, m} .) é uma classe lateral de C . Dois elementos x, y Î qn
pertencem à mesma classe (isto é, são equivalentes) se x - y Î C . Devemos observar
que, pelo Teorema 3,
x - y Î C Û (x - y)H t = 0 Û x × H t = y × H t .
Isso significa que x e y são equivalentes se, e somente se, têm a mesma
síndrome.
Vejamos como as observações acima se aplicam à situação real. Suponhamos
que uma palavra x Î C tenha sido recebida com erro, devido à interferência.
Admitimos que o erro na transmissão é um vetor eÎ qn , de talodo que a palavra
recebida y , seja igual à palavra enviada x , adicionada ao erro oriundo da
interferência na transmissão, ou seja, y = x + e . Assim, y - e= x Î C , o que
mostra que y e e são equivalentes e, portanto, têm a mesma síndrome.
Se queremos decodificar a palavra com um mínimo de mudanças, devemos
assumir que o vetor e possui o maior número possível de zeros como coodenadas,
isto é, que o peso w (e) seja mínimo. Assim, para cada palavra recebida y , devemos

AULA 8 TÓPICO 2 145


procurar o vetor e0 de peso mínimo que pertença à classe y + C , representada por
y , ou seja, que tenha a mesma síndrome de y . Chamamos e0 de vetor líder da
classe y + C . Feito isso, a palavra x pode ser recuperada calculando-se y - e0 .
Dessa forma, podemos elaborar o seguinte algoritmo básico de decodificação
e correção de erros:
Consideremos um código linear C , de dimensão k em qn , com matriz de
checagem H . Suponhamos que a palavra y foi recebida.
1. Calcule a síndrome y × H t .
2. Considere um vetor erro arbitrário e= e1 en e imponha a e a condição:
e× H = y × H t .
t

3. O item anterior fornece um sistema linear indeterminado, com n - k


equações envolvendo as incógnitas e1 ,¼, en . Encontre uma solução e= e1 en do
sistema, tal que w (e) seja mínimo.
4. Calcule y - e . Como y × H t = e× H t , a diferença y - e é, certamente, uma
palavra x do código C .
5. Decodifique a palavra y como sendo x .

Vamos ilustrar o funcionamento do algoritmo acima por meio de um exemplo.

EXEMPLO:
Queremos transmitir 8 símbolos, a1 ,¼, a7 , usando um código que nos
permita corrigir um erro. Podemos associar a cada símbolo um número de 0 a 7 .
Escrevendo esses números na base 2 , obtemos as seguintes palavras de três bits:
000,001,010,011,100,101,110,111.
A informação será transmitida dessa forma e, após recebida, será convertida
novamente em número decimal e, finalmente, no símbolo correspondente ao
número específico.
Para que seja possível corrigir um erro, devemos introduzir o que costumamos
denominar redundância, que nada mais é do que uma informação adicional que
torna o código mais eficiente. No nosso exemplo, adicionaremos mais três bits a
cada palavra x1x2x3 , de modo a obtermos palavras com 6 bits: x1x2x3x4x5x6 . Os
três bits adicionais devem depender dos três primeiros bits. Vamos escolher as
seguintes relações lineares: x4 = x2 + x3 , x5 = x1 + x3 e x6 = x1 + x2 . Dese modo,
obtemos o seguinte código linear:
C= { 000000,001110,010101,011011,100011,101101,110110,111000} .

146 Estruturas Algébricas


O peso de uma palavra não-nula de C é igual a 3 ou 4 . Logo, o peso
mínimo do código C é w (C) = 3 . Suponha que uma palavra y foi recebida após a
transmissão e que yÎC , mas existe xi Î C tal que d( y, xi ) = 1 . Se x j Î C , x j ¹ xi ,
então a desigualdade triangular nos diz que d(xi , x j ) £ d(xi , y) + d( y, x j ) . Como o
código C é linear, o Teorema 2 garante que a distância mínima de C é igual ao seu
peso mínimo w (C) = 3 . Assim, 3 £ d(xi , x j ) £ d(xi , y) + d( y, x j ) . Como d(xi , y) = 1 ,
obtemos d( y, x j ) ³ 2 . Isso significa que a única palavra do código que está à
distância 1 de y é xi , enquanto as outras palavras de C estão mais distantes.
Portanto, a palavra recebida y deve ser substituída pela palavra xi , pertencente
ao código. Isso significa que o código C pode corrigir 1 erro.
Para descobrir a matriz geradora de C , escrevemos:
x5 x6

x4
    
C = { (x1, x2 , x3 , x2 + x3 , x1 + x3 , x1 + x2 ) Î 26 | x1 , x2 , x3 Î 2 } =
æ1 0 0 0 1 1ö÷
çç ÷
= { (x1x2x3 ) × çç0 1 0 1 0 1÷÷÷| x1x2x3 Î 23 } .
çç ÷
çè0 0 1 1 1 0÷÷ø
Assim, o código binário CÌ 26 coincide que o que foi dado no Exemplo da
página 13, gerado pela base B = {100011,010101,001110} , cuja matriz geradora é
æ1 0 0 0 1 1ö÷
çç ÷
G = çç0 1 0 1 0 1÷÷÷.
çç ÷
çè0 0 1 1 1 0÷÷ø
A matriz de checagem de C é
æ0 1 1 1 0 0ö÷
çç ÷
H = çç1 0 1 0 1 0÷÷÷.
çç ÷
çè1 1 0 0 0 1÷÷ø
(veja a terefa 4 desta aula. Note que, em 2 , -1= 1 ).
Suponhamos que tenhamos recebido a seguinte palavra, após a transmissão:
y = 110010 . Como yÎC , devemos procurar a palavra do código mais próxima de
y . No presente exemplo, isso pode ser feito por verificação direta, pois o código
tem poucas palavras. Na prática, contudo, isso é inviável, pois, em geral, um código
tem um número muito grande de palavras. Vamos, por isso, buscar o elemento
xi Î C mais próximo de y , usando o algoritmo exposto acima.
1. Calculando a síndrome de y , obtemos:

AULA 8 TÓPICO 2 147


æ0 1 1ö÷
çç ÷
çç1 0 1÷÷÷
çç ÷
ç1 1 0÷÷÷
y × H t = (110 010) × ççç ÷ = (10 0).
çç1 0 0÷÷÷
çç ÷÷
çç0 1 0÷÷
çç0 ÷÷
è 0 1ø÷

1 2e3e4e5e6 Î 2 tal que e× H = y × H = (10 0) . Temos:


6
2. Seja e= ee t t

ì
ïe2 + e3 + e4 = 1
ï
ï
ï
íe1 + e3 + e5 = 0
ï
ï
îe1 + e2 + e6 =
ï
ï 0
Como w (e) deve ser mínimo, escolhemos
as coordenadas de e de modo que apareça
o maior número possível de zeros. Isso
ocorre quando e1 = e2 = e3 = e5 = e6 = 0
atenção!
e e4 = 1 . Logo e= 000100 e
O código do exemplo acima é capaz de corrigir x = y - e= 110010 - 000100 = 110110 Î C .
1 erro. Caso a interferência na transmissão Concluímos, então, que a palavra y foi enviada
provoque mais de um erro, o código pode falhar,
como x = 110110 Î C e sofreu interferência,
não recuperando corretamente a palavra enviada.
que alterou um de seus bits. O código C foi,
portanto, capaz de recuperar a palavra enviada
x a partir da palavra y recebida (com 1 erro).
Concluímos aqui o nosso último tópico. Nele vimos, de modo resumido, como
é possível a construção de um código corretor de erros. Fizemos uso de técnicas
desenvolvidas em aulas anteriores para conceber um método de transmissão de
dados que minimiza a perda de informações.
Existem muitas outras aplicações da Álgebra Abstrata a outras partes da
Matemática e mesmo a outras áreas do conhecimento. Citemos, brevemente e
apenas a título de informação, algumas dessas aplicações: na Mecânica Quântica,
as partículas elementares podem ser estudadas usando-se a teoria da representação
(linear) de grupos, com a qual verificamos os homomorfismos de um grupo abstrato
em um grupo formado por matrizes.

148 Estruturas Algébricas


at iv ida d e d e a p r of u da m e n t o

1. Sejam m e n números inteiros maiores ou iguais a 2 , tais que mdc(m, n) = 1 . Mostre que, se um
ângulo q puder ser dividido em m partes iguais e também em n partes iguais, com régua e compasso,
então q pode ser dividido em m × n partes iguais com régua e compasso.

p 1
2. Use o fato de que não pode ser trissectado para mostrar que 4x3 - 3x + é irredutível em [x ] .
3 2

3. Considere o código C linear [7,4] sobre 2 que tem matriz de checagem dada por
æ0 0 0 1 1 1 1ö÷
çç ÷
çç0 1 1 0 0 1 1÷÷.
çç ÷÷
çè1 0 1 0 1 0 1÷÷ø
Este código é chamado código [7,4] de Hamming.
(a) Determine o peso de C .
(b) Encontre uma matriz geradora de C .
(c) Calcule os vetores líderes das classes de equivalência de C .
(d) Escreva alguns vetores de 27 e decodifique-os.

4. Dados x, y Î qn , com x = x1 xn e y = y1  yn , o elemento


n
, y = åxži yi Î q
i =1

é chamado produto interno em qn .


(a) Exiba um exemplo de vetor x Î 25 , com x ¹ 0 e , x = 0 .
(b) Se CÌ qn é um código linear, mostre que o conjunto
C^ = { y Î qn | , y = 0 paratodox Î C}
é um código linear, chamado código dual de C .
(c) Mostre que a matriz geradora de C^ é igual à matriz de checagem de C .

5. Seja C um código binário com matriz geradora


æ1 0 0 0 1 0 1ö÷
çç ÷
çç0 1 0 0 1 0 1÷÷÷
çç ÷.
çç0 0 1 0 0 1 1÷÷÷
çç ÷
çè0 0 0 1 0 1 1÷÷ø

Decodifique as seguintes palavras recebidas:


(a) 1101011.
(b) 0110111.
(c) 0111000 .

AULA 8 TÓPICO 2 149


REFERÊNCIAS
ARTIN, E. Algebra with Galois Theory. American Mathematical Society, Providence, Rhode
Island, 2007.
BHATTACHARYA, P.B.; JAIN, S.K.; NAGPAUL, S.R. Basic abstract Algebra. Cambridge:
Cambridge University Press, 1999.
ENDLER, O. Teoria dos Corpos. Monografias de Matemática, 44. Rio de Janeiro: IMPA,
1987.
GARCIA, Arnaldo; LEQUAIN, Yves. Elementos de Álgebra. 5. ed. Rio de Janeiro: Projeto
Euclides, IMPA, 2008.
GONÇALVES, Adilson. Introdução à Álgebra. Rio de janeiro: Projeto Euclides, IMPA, 1995.
HEFEZ, A.; VILELA. M.L.T. Códigos corretores de erros. Rio de Janeiro: IMPA, 2008.

150 Estruturas Algébricas


CURRÍCULO
Angelo Papa Neto

Angelo Papa Neto nasceu em Fortaleza, onde fez seus estudos básicos e sua graduação.
É licenciado em Matemática pela Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também fez
seu mestrado. Concluiu o doutorado em Matemática em 2007 na Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP). Sua área de pesquisa é a Álgebra Comutativa, área em que nutre
especial interesse pela Teoria de Valorizações, pela Teoria das Formas Quadráticas e pela
Álgebra Real. É professor efetivo do IFCE desde 1997. Casado desde 2000, é pai de dois
filhos. Na música, é um grande admirador de J. S. Bach, L. Beethoven e Dimitri Shostakovich;
no cinema, de F. W. Murnau, Fritz Lang e A. Hitchcock; na literatura, de F. Kafka, A. Tchekov
e Guimarães Rosa; na gastronomia, de sua esposa Sueli.

CURRÍCULO 151

Вам также может понравиться