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NOVOS PADRÕES DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA:

PERSPECTIVAS DO CONTRATO COLETIVO


DE TRABALHO NO BRASIL

Coordenador: Marco Antônio de Oliveira (Desep-CUT/Unicamp)

Participantes: José Siqueira Neto (Unicamp)


Hélio Zylberstajn (FEA-USP)
Alberto Figueiredo (PNBE)

Marco Antônio de Oliveira — Vamos dar início ao último painel deste seminário re-
lembrando que ele se insere num projeto de estudos mais amplo sobre a experiência recente
das Câmaras Setoriais, particularmente das Câmaras Setoriais no setor automomotivo. Tive-
mos até agora três painéis que trataram de temas direta ou indiretamente relacionados com
o problema da negociação coletiva no Brasil. O primeiro painel tratou da experiência das Câ-
maras Setoriais, mais detidamente no setor automobilístico. O segundo avaliou o problema
específico da relação entre a reestruturação produtiva e seus impactos sobre o mercado de
trabalho. No terceiro, houve a discussão sobre o tema da reestruturação industrial e seus im-
pactos mais gerais sobre o mundo do trabalho.
O objetivo do presente painel não é fazer uma discussão geral sobre o debate da con-
tratação coletiva, mas tentar confrontar essa perspectiva do contrato coletivo com as expe-
riências recentes de negociação, tomando como base a experiência da Câmara Setorial do
setor automotivo, onde houve um avanço bastante expressivo no que se refere à prática da
negociação coletiva. Com relação a esse tema, um aspecto que precisa ser ressaltado e que
eu espero que seja motivo de atenção por parte dos analistas diz respeito ao momento que
estamos atravessando, uma vez que está prevista para este ano uma revisão constitucional
na qual o tema das relações de trabalho deverá ser tratado.
José Siqueira Neto — Chamo a atenção, inicialmente, para a ilusão que este tema
provoca na maioria das pessoas que o analisam de uma maneira apenas superficial, ou ape-
nas em relação a determinadas experiências, porque há um movimento muito forte na so-
ciedade brasileira de acreditar que a contratação coletiva de trabalho e os avanços das for-
mas de negociação coletiva possibilitam, por si sós, inexoravelmente, a mudança do sistema
de relações de trabalho no Brasil. Estou me referindo especificamente a certa exaltação que
pude observar com a recente contratação dos bancários em âmbito nacional e a dos meta-
lúrgicos na Câmara Setorial Automotiva.
É preciso deixar bem claro que essas alterações no padrão de negociação em absolu-
to sinalizam para a mudança do sistema de relações de trabalho no Brasil; ao contrário, elas
podem apenas reforçar a idéia de reforma do sistema atual, ou seja, de eliminar alguns aspec-
tos de natureza absolutamente corporativista daquele sistema e adaptá-lo a realidades espe-
cíficas dos setores de ponta da sociedade brasileira. Isso não tira o mérito nem o impacto das

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mudanças inicialmente processadas. No entanto, creio que é um tremendo engano restringir


a análise a essas transformações e acreditar que esse padrão que ora se inicia com a indús-
tria automotiva tem a capacidade de se alastrar para o conjunto da economia e do mercado
de trabalho brasileiro.
Não é de hoje que novas formas de negociação têm sido insistentemente buscadas
pelos agentes e, em particular, pelos trabalhadores. Mas essa sinalização da Câmara Setorial
Automotiva é apenas o resultado de um pacto setorial, se bem que de natureza mais ampla
que uma negociação salarial. E a negociação dos bancários em âmbito nacional é um pro-
cesso meio óbvio porque é até difícil imaginar uma negociação de bancários que não tenha
essa característica. A tão propalada negociação por empresa ficaria um tanto quanto inade-
quada no caso específico dos bancários, ou dos aeroviários, enfim, categorias que têm uma
dimensão e uma densidade absolutamente nacionais. Feitas essas ressalvas, que podem ser
bastante polêmicas, gostaria de discutir um problema que diz respeito aos padrões de nego-
ciação. Não podemos ter a ilusão de que a contratação coletiva é apenas um aspecto do di-
reito brasileiro, um aspecto das relações de trabalho. Na verdade, ela se insere num todo har-
mônico que se chama "sistema de relações de trabalho", que estabelece a lógica entra as
relações individuais, as relações coletivas, o controle sobre os sindicatos e sobre a negocia-
ção e a perda *do efeito de greve. Afinal, é um pouco temerário imaginar a mudança exclu-
sivamente centrada na negociação coletiva sem estabelecer a ligação lógica e harmônica en-
tre esses aspectos.
Hoje, no Brasil, temos, de maneira bastante sintética, três propostas para a questão.
Uma proposta de desregulamentação selvagem, "à la chilena", em que a lei autoriza a nego-
ciação direta entre as partes, a livre negociação, e revoga o dispositivo de leis protetoras; te-
mos uma proposta mais formal de alguns setores sindicais que enxergam o contrato coletivo
de trabalho como um instrumento pelo qual se alcançam maiores direitos em relação à ne-
gociação atual; por fim, há uma proposta que vê o contrato coletivo de trabalho como ponto
de partida para uma discussão mais articulada do sistema de relações de trabalho como um
todo. E há um outro detalhe: essas novas formas de organização vão se chocar, inexoravel-
mente, com as atuais formas de organização sindical.
Com o sindicato que temos atualmente, organizado de forma corporativa, por base
municipal, fica muito difícil evoluir nas negociações, quer, e sobretudo, pelo seu conteúdo,
quer pela forma. E mesmo a negociação por empresa fica complicada porque temos um sis-
tema de relações de trabalho em que o sindicato é único por categoria, e isso faz com que
tenhamos atualmente, segundo dados oficiosos, cerca de 15 mil sindicatos. Em contraparti-
da, os Estados Unidos, que têm talvez a experiência mais radicalizada de pluralismo sindical,
possuem 180 sindicatos. Outra característica é o sindicato único por base territorial, mas pul-
verizado por local de trabalho. Aliás, um empresário da área de supermercados me relatou
que um determinado supermercado convive com 180 dissídios, convenções e normas apli-
cáveis ao local de trabalho. É fantástico. Como pensar a negociação coletiva com isso?
Portanto, essas experiências que dão um salto de qualidade em relação ao que se
tem da experiência corporativa não têm a base mínima necessária para se espraiarem ou,
inclusive, para se radicalizarem. Quando chegar ao limite, a negociação do setor automotivo
vai esbarrar na falta de organização do trabalho, na estrutura dos sindicatos, na estrutura da
própria negociação coletiva, no poder normativo da Justiça do Trabalho. Por essas razões,
preconizo que essa discussão se insira num contexto maior de reforma do sistema de rela-
ções de trabalho. E sou totalmente favorável à reforma total, uma mudança de padrão que ins-
taure, em contrapartida ao que temos hoje, o sistema de autonomia privada coletiva, o que
significa assegurar a liberdade sindical efetivamente, não só através da consagração do prin-
cípio da liberdade sindical, mas fundamentalmente através das leis de sustentação à liberda-

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de e autonomia sindical. Isso implica mudar o papel do Estado nas relações de trabalho, e
não, em absoluto, retirá-lo delas.
Fica difícil montar um discurso sobre os novos padrões de negociação coletiva a partir
de algumas experiências extremamente exponenciais daquilo que existe de mais organizado
na sociedade brasileira, desconsiderando as realidades do trabalho rural, do trabalho no setor
público, das diferenças regionais do trabalho no país. Trata-se de uma operação complexa de
combinar todas essas dificuldades, mas encaminhando a transição de um sistema para outro.
É a razão pela qual, volto a insistir, não acredito em grandes frutos além desses que já foram
colhidos dessas experiências específicas. Não sei se com isso desanimo alguns pesquisado-
res, mas infelizmente é a minha posição. E, infelizmente também, se acreditarmos, embala-
dos pelo canto da sereia, que é possível mudar a partir dessas experiências específicas, cairemos
no modelo da desregulamentação, da negociação por local de trabalho, que preconiza a revoga-
ção da própria lei.
Malgrado as experiências já em curso, esse processo tem que ser organizado em âm-
bito nacional, já que a perspectiva de mudança de sistema não vai evoluir exclusivamente de
experiências exponenciais, porque essas param aí. A realidade do setor automotivo não se
extrapola, e haverá uma pluralidade de situações específicas. A radicalização do Acordo das
Montadoras vai significar 30 mil acordos de empresas no Brasil, que não vão sair da empresa.
Se se amplia muito o espectro de uma negociação coletiva, fica-se na empresa e acabou, não
há mais o que fazer em plano nacional e regional, não há mais o que proteger. E a negociação
passa a ter outro caráter. Num sistema em que a negociação parte de cima para baixo, num
patamar mínimo nacional, e vem descendo até o nível da empresa, a negociação representa
a uniformização, a flexibilidade controlada, negociada. E quando passa de baixo para cima,
significa flexibilidade pura e simples, sem nenhum padrão de uniformização. A negociação,
dependendo do patamar do qual parte, tem significado diferente. E é isso o que dá o limite
dessas experiências.
Tudo bem, é possível fazer uma evolução baseada nas empresas onde se negocia e
se criam organizações por local de trabalho — onde não se negocia não se cria. É uma ten-
tativa, mas que sinaliza para aquele caminho a que me referi há pouco, o que flexibiliza a
partir do local de trabalho. Eu, particularmente, não acredito numa mudança de patamar ba-
seada na fragmentação da representação. Isso não só fragiliza como pulveriza de maneira ab-
soluta o controle mínimo que se possa ter sobre a relação de trabalho, o que é temerário, ain-
da mais num país como o nosso. Acredito que a negociação coletiva poderia dar um salto de
qualidade em determinadas relações, poderia ser um instrumento de flexibilização negocia-
da, poderia diminuir o impacto da interferência desnecessária do Estado, desde que balizada
por este princípio da liberdade e autonomia sindical, garantindo a ampla representação dos
sindicatos, mudando o perfil de interferência do poder normativo do Judiciário, enfim, mudan-
do o perfil de todo o sistema.
Hélio Zylberstajn — Eu vou usar o retroprojetor porque isso ajuda na exposição1. Ten-
tarei expor algumas idéias que tenho a respeito da possibilidade que teremos no Brasil para
fazer avançar a negociação coletiva. Parece-me que ela é um mecanismo que deve ser en-
carado como um valor em si mesmo. Uma sociedade democrática é uma sociedade que
consegue administrar o conflito entre capital e trabalho através da negociação coletiva e au-

1 Hélio Zylberstajn utilizou em sua exposição algumas figuras por meio de retroprojetor, que
infelizmente, por problemas técnicos, não pudemos reproduzir aqui. Entretanto, julgamos que sua
fala foi suficientemente clara para suprir essa lacuna. Assim, mesmo sem as figuras, foram mantidas
as referências a elas no texto (N. E.).

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tônoma dos agentes sociais. Vou enunciar alguns problemas que me parecem os mais rele-
vantes, os quais teremos que enfrentar e resolver para que consigamos uma efetiva negocia-
ção coletiva no Brasil.
Antes de pensar em avanço do nosso sistema de relações de trabalho e negociação
coletiva, temos que atender a dois pressupostos: o primeiro é o da estabilidade da economia
e o segundo é o de uma maior competição no nosso mercado. Talvez seja um pouco de exa-
gero, mas afirmo que até hoje a negociação coletiva no Brasil tem sido, na verdade, um gran-
de conluio — em função do ambiente permanentemente inflacionário em que vivemos e da
estrutura monopolista, oligopolista ou não competitiva dos nossos mercados. Nas nossas ne-
gociações, o que está sendo demandado pelo trabalhador vai ser repassado para o preço e
por isso o empresário aceita. Ele aceita o reajuste de salário simplesmente porque ele sabe
que vai repassar e que isso vai ser sancionado pela nossa cultura inflacionária. O meu primei-
ro argumento é que na verdade nós não temos uma negociação coletiva, mas sim um repas-
se sistemático dessa corrida preços/salários. Não estou querendo dizer que devemos cruzar
os braços e esperar para começar a modernização das relações de trabalho no momento em
que conseguirmos ter um presidente e um ministro da Fazenda que estabilizem nossa eco-
nomia. O meu ponto é que uma economia cronicamente inflacionária e pouco competitiva
não produz uma negociação coletiva para valer, e sim um jogo de repasse. Esse é o pressu-
posto: só avançaremos quando tivermos conseguido a estabilização e a maior abertura dos
mercados.
Supondo que esses problemas sejam devidamente encaminhados e equacionados,
gostaria de refletir com vocês sobre os problemas que devemos enfrentar para modernizar e
aprimorar as relações de trabalho no Brasil, que são: a estrutura e as garantias sindicais; a
representação dos trabalhadores no local de trabalho; a estrutura da negociação coletiva; ga-
rantias da negociação e os mecanismos de resolução dos impasses, controle do emprego e
demissão, negociação e flexibilização; além de um quesito importante que não está muito
inserido no tema do nosso encontro, mas que vale a pena destacar, que é a questão da ne-
gociação coletiva no setor público.
Estrutura sindical: é sem dúvida o primeiro problema a ser enfrentado. Devemos de-
cidir em algum momento no futuro a ratificação da Convenção 87 da OIT, que trata especifi-
camente da questão da liberdade sindical, sem preconizar nem a unicidade nem a pluralida-
de sindical, remetendo esta questão para decisão dos trabalhadores. Essa é a posição da OIT
e da grande maioria dos países, sendo o Brasil uma das poucas exceções. A possibilidade
dessa ratificação no Brasil envolve inclusive a mudança da Constituição, pois ela prevê a uni-
cidade sindical. Se eventualmente seguirmos essa trajetória, muito provavelmente teremos
o pluralismo. Isso é palpite meu, mas acho difícil evitá-lo em face da fragmentação do movi-
mento sindical no Brasil, o que nos remete à questão de cuidar também para que não haja
um excessivo fracionamento do movimento sindical.
Outro ponto importante é que a liberdade sindical deve valer para os dois lados, e
todos nós sabemos que o lado que mais tem resistido à liberdade sindical é o patronal. De-
vemos, pois, contemplar inclusive a possibilidade de pluralismo nas associações patronais.
Isso é tabu, é um problema difícil de resolver, e talvez por isso tenha entrado em primeiro
lugar na lista. Se vamos modernizar as relações de trabalho, temos que resolver este proble-
ma.
A questão que eu chamo genericamente de garantias sindicais envolve várias outras
questões, e a mais importante é a imunidade para as lideranças e para a representação sin-
dical. A justificativa é a mesma que se aplica à imunidade dos parlamentares: alguém que
representa uma coletividade deve ter garantias para exercer essa representação. Mas do lado
patronal, hoje, existe muita contestação em relação à imunidade das lideranças sindicais,

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porque, como não temos a representação de trabalhadores e sindicatos no local de trabalho,


a maneira que os sindicatos encontraram para ampliar e garantir a sua presença nos locais
de trabalho foi a reformulação de seus estatutos e a ampliação do tamanho das diretorias.
A partir da Constituição de 1988, que vedou a interferência do Estado na organização
sindical, aquele estatuto-padrão dos sindicatos deixou de existir e estes iniciaram um proces-
so de mudança dos estatutos — ampliaram o número de diretores e, com isso, começaram
a garantir a presença em diversas empresas. As entidades patronais reclamam desse proces-
so, pois não têm controle sobre ele, e ao mesmo tempo resistem a discutir e admitir a possi-
bilidade da representação dos trabalhadores no local de trabalho. Essa é uma questão que
precisaria ser resolvida. Dirigentes sindicais devem ter imunidade e deve-se encontrar uma
maneira de limitar o seu número. Nas garantias sindicais há também a questão das receitas
sindicais. Hoje há receitas compulsórias, um imposto sindical que sobreviveu à Constituição
e um segundo imposto que é a contribuição confederativa. Se caminharmos para a liberdade
e pluralismo sindical, temos que encontrar outras maneiras não compulsórias de garantir as
receitas sindicais. O imposto sindical e a contribuição confederativa garantidos na Constitui-
ção não são uma maneira de garantir receita sindical que conviva bem com o pluralismo sin-
dical. Vamos ter que resolver essa questão também.
Representação dos trabalhadores no local de trabalho: eis uma questão difícil. Talvez
não fosse o caso de apresentá-la nesta mesa, imagino que todos tenham uma grande vivên-
cia com o tema, mas costumo mostrar visualmente do que se trata. Essa é uma estrutura de
representação dos trabalhadores completa, típica dos países desenvolvidos e industrializa-
dos, que começa no local de trabalho. Há várias formas de representação: sindicato de em-
presas, conselho de representantes, delegados sindicais. Em alguns países, duas ou até mes-
mo três das formas convivem, mas existe alguma forma de representação no local de
trabalho. Depois há uma estrutura sindical: o sindicato regional, setorial, federações etc. E,
por último, a pirâmide se completa com a central sindical. Isso é típico de um país industria-
lizado.
Essa outra figura mostra a estrutura que o Getúlio criou e que durou até 1988, uma
estrutura que não tinha nem base, nem pico, com sindicatos fora da empresa, proibidos de
se coordenarem numa central. Com a Constituição de 1988 e com a Nova República, preen-
cheu-se formal e legalmente o espaço reservado às centrais. Trata-se agora de completar a
pirâmide em sua base. Esse é um grande problema. Os empresários brasileiros tendem a re-
chaçar qualquer discussão em relação a isso. Talvez uma forma de encaminhamento com
alguma chance de chegar a uma solução negociada seria estabelecer a diferença entre re-
presentação de trabalhadores e representação sindical no local de trabalho. Tenho a impres-
são de que a representação de trabalhadores, que está prevista no Artigo 11 da Constituição,
é algo que poderia ser aceito pelos empresários. Teríamos um conselho de representantes
de trabalhadores eleitos em cada local de trabalho, e a negociação coletiva cuidaria da re-
presentação sindical no local de trabalho. Talvez essa seja uma forma de se conseguir avan-
çar e preencher esse espaço da pirâmide que está faltando. Trata-se de uma questão crítica
e, como disse o Siqueira, não se pode pensar em aprimorar relações de trabalho e negocia-
ção coletiva sem uma estrutura que alcance o local de trabalho.
Esse é o tipo da coisa que vai acabar se resolvendo na prática, mas existe uma dis-
cussão sobre qual a melhor forma de estruturar a negociação coletiva: descentralizá-la, re-
metê-la para a empresa, pulverizar ou unificar? Talvez eu esteja simplificando, mas as duas
posições extremas seriam essas: uma única data-base, com negociação periódica e nacio-
nal, ou negociações totalmente descentralizadas, por empresa. Muitos economistas, inclusi-
ve, tendem a defender a unificação das datas-base como mecanismo para se alcançar a pró-
pria estabilização da economia. Argumentam que os países que têm negociações

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centralizadas cuidam melhor da inflação e do desemprego, têm economias mais estáveis e


imunes ao ciclo econômico — daí a receita para o Brasil. Sou um pouco cético quanto a isso
porque os exemplos usados para justificar a tese são países que têm muito pouco a ver com
o Brasil. Isso deu certo na Suécia, Noruega, Áustria e Israel, que são completamente diferen-
tes do Brasil; eu diria diametralmente opostos. São países muito mais homogêneos, que re-
solveram os problemas básicos, que têm alguns valores nacionais que induzem a um maior
consenso e portanto maior eficiência e pragmatismo nesse tipo de negociação. Todos eles
dependem muito do setor externo, da exportação, da competitividade dos produtos no mer-
cado internacional, o que é um elemento indutor de consenso na negociação.
E nós, no Brasil, não temos nada disso, exatamente o contrário: somos um país enor-
me, heterogêneo, dependemos muito pouco de exportação, temos sérios problemas básicos
a resolver, de modo que eu tenho dúvidas se esse caminho da centralização da negociação
seria o mais eficiente. Claro, essa é uma questão que a própria prática vai resolvendo. Há se-
tores que naturalmente vão ter negociações centralizadas, como já está ocorrendo entre os
bancários. Os mercados que. têm uma estrutura nacional — bancários, eletricitários, todo o
setor energético, de petróleo — provavelmente vão ter negociações nacionais. Os outros,
acho que vão depender de como evoluirá o processo. Uma possibilidade que eu considero
interessante seria tentar encaminhar uma negociação nacional, à qual adeririam todas as
centrais, sindicatos, entidades patronais, tendo em vista um acordo nacional para a convivên-
cia entre capital e trabalho. Seria muito interessante se pudéssemos negociar as regras da
negociação coletiva. Por exemplo, as regras da greve, os procedimentos para resolução de
impasses, a ética dessa convivência, isso poderia ser discutido em âmbito nacional e tenho
a impressão de que haveria um espaço para se avançar nessa direção.
Quanto às garantias da negociação e os mecanismos de resolução de impasses, te-
mos uma falta de garantia e uma ausência completa de estímulos para a negociação. Vou
citar só um exemplo de como essa é uma realidade dramática. No Artigo 114 da Constituição,
parágrafo segundo, está escrito que quando a negociação resultar em impasse qualquer uma
das partes poderá ajuizar o dissídio, ou seja, tentar resolvê-lo através da Justiça do Trabalho.
Mas o mesmo parágrafo diz que, se houver recusa à negociação, também qualquer uma das
partes pode ajuizar o dissídio. Ou seja, é possível, premeditadamente, chegar ao dissídio,
bastando para isso que uma das partes se recuse a negociar. A Constituição faculta que esse
impasse acabe na Justiça do Trabalho. Todo o nosso arcabouço legal e institucional, toda a
nossa tradição e toda a forma como o Estado se equipou para a questão trabalhista nos indu-
zem a produzir, permanentemente, impasses e encaminhá-los para a Justiça do Trabalho.
Não há estímulo à negociação, e não há também obrigatoriedade de negociação. Uma parte
pode alegar qualquer fato sem ser obrigada a comprová-lo.
Por exemplo, uma empresa pode alegar que não vai atender a determinada deman-
da porque senão "entrará no vermelho", passará a ter prejuízo. Se uma empresa alega esse
tipo de argumento, tem que estar preparada para abrir seus livros, precisa mostrar que vai
entrar em prejuízo, mas ela não é obrigada a isso. É uma tradição legal e institucional que não
estimula e nem obriga à conduta da negociação. E se vamos produzir um sistema de nego-
ciação, teremos que mudar isso também. Muitos dispositivos que hoje inibem a negociação
têm que ser transformados de modo a favorecê-la.
Outro ponto interessante é que a negociação coletiva levará fatalmente à discussão
sobre o controle do emprego e da demissão. Um dos aspectos que mais caracteriza o regime
de contratação coletiva, na minha opinião, é que a demissão muda totalmente de qualidade.
Hoje, no Brasil, o contrato coletivo é individual: é a carteira profissional. E a empresa tem li-
berdade completa de demitir, mesmo sem justa causa. Eu não conheço país em que empre-
sários tenham a liberdade de demitir que os empresários brasileiros têm. O contrato coletivo

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é, exatamente, a maneira para se mudar qualitativamente essa situação. A questão da demis-


são teria que ser tratada entre a empresa e o sindicato, ou seja, o contrato coletivo abre a
possibilidade para que o sindicato exerça controle sobre o emprego. Mais do que uma alte-
ração formal, é uma alteração qualitativa e até histórica nos objetivos e nas estratégias do
movimento sindical. Talvez eu exagere um pouco, mas creio que quando o movimento sin-
dical passa a reivindicar o controle sobre o emprego numa sociedade capitalista, ele está, no
fundo, adiando o sonho do socialismo. E ele deve estar examinando a possibilidade de con-
viver na sociedade capitalista com algum nível de controle sobre o emprego. Não é à toa que
a questão do contrato coletivo é polêmica inclusive no movimento sindical, porque ela tem
essa conotação. E eu acho que do lado empresarial não se tem essa perspectiva do significa-
do dessa proposição. Seria um erro trágico se os empresários brasileiros se recusassem a dis-
cutir seriamente a questão do controle do emprego que é uma implicação concreta do con-
trato coletivo.
Ligada a essa questão vem a da flexibilização e da negociação. À medida que a ne-
gociação coletiva avança e que o contrato coletivo vai se ampliando, os empresários colocam
com apreensão (e eu diria que eles têm razões para isso) a questão da rigidez que o avanço
das instituições de controle do mercado de trabalho acaba gerando. E se pensarmos no con-
texto histórico em que surge o controle sindical sobre o emprego, veremos que ele surge no
paradigma fordista-taylorista e se expande definitivamente nos anos 30. Não é à toa que no
contrato coletivo de trabalho americano ou mesmo inglês encontra-se um plano de cargos e
salários da empresa, um plano de carreira. As regras de promoção, de transferência, de au-
mento salarial, tudo isso está contemplado pela negociação coletiva. E esse arranjo dá certo,
porque trata-se de um paradigma ou um ambiente de muita previsibilidade. A tecnologia está
dada, e muda a uma velocidade extremamente previsível, os mercados estão assegurados e o
controle do emprego, o contrato coletivo, o fordismo e o taylorismo se associam, sobrevivendo
ajustados ao paradigma organizacional até os anos 60,70. Então começam os problemas, e hoje
esse modelo está em crise.
Creio que isto está ligado à crescente resistência que os empresários oferecem ao
movimento sindical. Isto está ligado à revisão dos contratos coletivos de trabalho em todos
os países e à necessidade de se buscar a flexibilização negociada. Vamos ter que achar uma
forma de não começar pelo fordismo e pelo taylorismo, mas negociando a flexibilização. Ou-
tro dia ouvi uma expressão muito interessante: o que nós precisamos é um "contrato vivo",
um contrato que permanentemente possa se ajustar aos interesses do capital e do trabalha-
dor. Um contrato que tenha uma perspectiva de longa duração pode ter implicações sérias
para a competitividade, para a sobrevivência da própria empresa. Essa perspectiva de mais
longo prazo também terá que ser contemplada.
Quanto à negociação coletiva no setor público, não se pode negar a esses trabalha-
dores o direito de organizar sindicatos e o de negociar coletivamente. Só que a negociação
coletiva no setor público, levada ao seu extremo, pode acabar gerando situações que vão
contradizer o próprio processo democrático. Estou querendo dizer que um grupo de funcio-
nários que tenha poder de barganha no setor público, ao exercê-lo através da negociação co-
letiva, no seu limite, pode chegar a provocar até a alteração da alocação de recursos prevista,
por exemplo, no orçamento, que é uma lei votada pelo Legislativo e que, em tese, representa
a vontade média da sociedade sobre como os recursos devem ser alocados.
Portanto, um direito democrático como negociação coletiva pode levar uma minoria
de trabalhadores a se apropriar de recursos que a maioria da população, através da represen-
tação nos parlamentos, tenha decidido alocar de outra forma. Esse é um problema seriíssimo
que não está resolvido definitivamente nos países que têm modelos aperfeiçoados de nego-
ciação coletiva. E a situação aqui no Brasil se agrava ainda mais porque a presença de cele-

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tistas no setor público leva muitos desses impasses ao Judiciário. Hoje, a Justiça trabalhista
está interferindo no orçamento através das suas decisões, e essa interferência de poderes é
um problema complicado. Muita gente chega a propor que não seria o caso de uma negocia-
ção coletiva, mas de uma negociação quase institucional no setor público, em que todas as
parcelas da população estivessem representadas.
Finalmente, o problema mais complicado de todos é o de como fazer a transição.
Como é que vamos sair de uma situação na qual, em tese, temos direitos garantidos para
uma outra em que, provavelmente, teremos menos direitos garantidos, mas mais possibili-
dades de assegurar direitos através da negociação. Essa transição será difícil. Como conciliar
a mudança da CLT e da Constituição com esse novo modelo que se quer implantar? Daí as
ambiguidades que todos nós temos: queremos a mudança, mas, ao mesmo tempo, quere-
mos preservar ao máximo o que temos hoje. Não será fácil operar essa transição. Há várias
propostas, mas todas elas discutíveis e de difícil execução.
Alberto Figueiredo — O problema do nosso país é que ele tem uma estrutura de po-
der que é a mesma há quatrocentos, quinhentos anos. E essa estrutura foi toda construída
sobre um poder autoritário, direcionado. Uns poucos mandam e está acabado. Hoje, no país,
isso é mais ou menos forte de acordo com o setor. Mas se a gente não acreditasse que é pos-
sível um tipo de mudança, acho que o PNBE nem existiria.
Da exposição do Hélio eu vou relacionar alguns pontos que eu gostaria de abordar.
Primeiro, a pedra-chave da história é o reconhecimento das divergências e do conflito de in-
teresses entre capital e trabalho. Isso para mim é absolutamente lógico, natural. Existe de fato
esse conflito, que é inevitável. Mas conflito não significa briga de morte; é uma divergência
de interesses. É uma questão de alocação, de definir onde é a fronteira da divisão. Isso, para
mim, é um ponto básico nesta discussão.
O segundo ponto é o reconhecimento da legitimidade dos interesses de ambas as
partes. Isso é fundamental porque eu só posso discutir com a outra parte se reconhecer o
ponto de vista dela. Para eu negociar com a outra parte, tenho que reconhecer que os seus
interesses são legítimos, e é a partir daí que nós vamos discutir qual é a balança do conflito.
Liberdade e organização sindical: aí começamos pelo aspecto mais técnico, que é
também onde começa o processo de ruptura. Isso vem junto com a questão da contribuição
compulsória. Há um cartório, um espaço definido, uma taxa imposta, que sobrevive porque
compulsoriamente contribuem para a sobrevivência dela. E isso tem todas as consequências
de praxe. Iso gera as distorções, a acomodação e a falta de representatividade. Se não se
romper esse modelo, não vamos chegar a um sistema novo. É lógico que quem tem o poder
não tem interesse em mudar nada, por que ele não quer perder nada. É natural que alguns
tenham esse ponto de vista.
Redução do papel do Estado e garantia de direitos mínimos: significa que no modelo
que a gente vem discutindo o Estado limitar-se-ia a estabelecer o balizamento, a fronteira da
negociação, o que não se pode desrespeitar, enfim, os chamados direitos mínimos. O que
são os direitos mínimos, cabe à sociedade discutir através dos seus representantes. Isso aí
passa pela questão da Justiça do Trabalho e pela idéia de tutela. Quanto à Justiça do Traba-
lho, embora eu não seja jurista, fui diretor de fábrica de 650 empregados durante doze anos
e sei exatamente o que acontece lá dentro. Além dos entraves burocráticos, o acúmulo de
processos etc, tem também o lado sujo: o dirigente sindical que se vende, o advogado que
se vende, embora isso não seja generalizável.
A negociação direta entre as partes para definir as regras de convivência é algo fun-
damental para um sistema democrático. Fora isso só resta a tutela onde um estabelece e os
outros cumprem. Deve haver mecanismos consensuais entre as partes para a solução dos
conflitos. Em caso de impasse, comissão paritária, mediação de terceiro, arbitragem etc. Ou-

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tra questão importante é a imunidade de representação dos trabalhadores para evitar perse-
guição.
E coroando todo esse processo, que é uma síntese e não precondição do contrato
coletivo de trabalho, as partes é que devem estabelecer como vai ser. Não estou pedindo lei
nenhuma. Até o ponto em que a lei não impedir, se houver vontade política das partes, se faz
qualquer contrato. No que ferir a lei, vamos fazer um lobbyzinho em Brasília. O que falta é
vontade política, porque estão todos acomodados a essa situação. Isso é o aspecto técnico
do problema. Agora vou entrar objetivamente no que eu acho que interessa.
É difícil? Sim, é extremamente difícil, afinal há quatrocentos anos agimos de uma cer-
ta forma. A mudança disso é a mudança de estrutura. Não se pode pretender mudar em meio
ano tudo o que não mudou em toda a nossa história. Apesar desta dificuldade, trata-se de um
processo que é preciso percorrer, como subir uma escada até o 10° andar de degrau em de-
grau, mais rapidamente ou mais lentamente, depende da convicção. Eu tenho que me con-
vencer ou ser induzido a me convencer disso. Eu sou empresário e sigo a ótica do empresá-
rio. E nessa questão você identifica, grosso modo, três grupos de empresários. Um grupo que,
por refletir, conhecer, viajar — o PNBE, por exemplo, já viajou o mundo inteiro em reuniões
com empresários, trabalhadores, associações — , está convicto de que o caminho é a nego-
ciação coletiva. Há os que acham que talvez seja esse o caminho, mas ainda estão indecisos,
receosos, sem ação. E tem um grupo que é objetivamente refratário porque sabe que, no mo-
mento de dividir uma parte do poder, eles sairão perdendo. São refratários por essência, que-
rem que tudo fique do jeito que está. Quantas empresas estão na bancarrota e o dono está
muito bem?
Eu acho que isso é um processo. A questão-chave é o custo/benefício: quanto me
custa mudar e quanto eu vou ganhar. Se o empresário se convencer ou for convencido de
que essa mudança de sistema é um ganho, de que ele terá menos problemas e melhores
resultados na atividade dele, ele começará a se interessar. Não há razão para que, por prin-
cípio, ele não admita aceitar algo que é melhor para ele. E aí entra o efeito-demonstração
através do qual é possível ampliar esssas experiências para quem está fora. O empresário
tem medo de ser "bonzinho" na sua empresa e perder espaço para a concorrência. Ele não.
sai na frente, não inova. Aliás, muitas vezes me perguntam: "Se o PNBE tem esse discurso
avançado, por que não faz?". Mas não é um fato isolado que vai alterar tudo. Isso tem que ser
um movimento pelo menos de nível setorial. E a gente percebe que uma parcela dos empre-
sários já está aceitando coisas que em 1980 nem queriam ouvir falar, como a importância de
um mercado forte. É uma questão que vai numa curva não linear.
Se houver um mercado mais forte, melhor inclusive para enfrentar a abertura comer-
cial. A base que sustenta o empresário é o mercado interno. Ele pode exportar, mas o PIB
brasileiro é 10% de exportação e as empresas que exportam põem como referência 30%, mas
isso não quer dizer nada, pode ser 20%, 40%. É a menor parte da atividade dele e é preciso
ter consistência para poder dar o salto para frente. Já existe uma consciência, que felizmente
está se alastrando, de que só com um mercado forte se consegue evoluir. E de onde é que
sai um mercado forte, não é do dinheiro? E para isso é preciso dar melhor condição de tra-
balho, saúde e salário para as pessoas. Antigamente não se podia admitir isso, mas agora as
pessoas já começam a pensar assim. Se ainda é pouco, não sei, mas acho que houve uma
evolução de 80 para cá e podemos esperar avançar um pouco mais.
Adalberto Moreira Cardoso — Eu gostaria fazer uma pergunta ao Hélio, mas que é ex-
tensiva aos demais membros da mesa. Você disse que há duas precondições para o contrato
coletivo de trabalho: a abertura e o aumento da competitividade...

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CADERNOS DE PESQUISA N° 1 - JUNHO 1994

Hélio Zylberstqjn — Para o contrato coletivo não, mas para o avanço da negociação
coletiva. Estabilidade econômica e abertura.
Adalberto Moreira Cardoso — Você coloca a recuperação econômica e a maior com-
petitividade como condições, quando o acordo das montadoras — se se pode encará-lo
como um acordo coletivo, ou como um protótipo disso — , na verdade, foi um mecanismo de
retomada do crescimento nesse setor específico. Esse acordo não poderia ser ampliado para
o âmbito nacional? A contratação coletiva não poderia ser uma precondição para a retomada
do crescimento, para uma mudança nas relações com o Estado e, principalmente, para a mu-
dança das relações entre capital e trabalho? Ou seja, ao invés do velho esquema onde há
sempre uma precondição econômica para uma mudança institucional, o caminho não será,
ao contrário, forçar uma redefinição das regras do jogo econômico a partir de uma mudança
institucional?
Alvaro Comin — O Hélio levantou um problema que eu acho central, mas não o en-
frentou a funndo. Eu gostaria de convidá-lo a fazê-lo, estendendo o convite ao Siqueira. A
questão é: qualquer que seja o modelo de contratação coletiva que se deseje ver implantado
no país, teremos que passar por um processo de transição do modelo atual, que é bastante
rígido e enraizado na estrutura sindical brasileira que existe há décadas. Foi esse desenho
institucional de relações capital-trabalho que de alguma forma deu origem à estrutura sindi-
cal e à conformação social desses atores hoje. Não se trata de pensar apenas estartégias de
transição, mas de avaliar em que medida bastará uma alteração no desenho institucional e
no aparato legal para chegarmos a uma alteração das estruturas sociais tal como elas estão
organizadas hoje, nesse modelo de sindicalismo.
Em segundo lugar cabe pensar qual será o fórum que vai permitir que, de forma con-
certada, se chegue a esse modelo. Será o Congresso Nacional, a revisão constitucional, um
grande fórum de trabalhadores e empregados? Gostaria também que o Siqueira aprofundas-
se a sua reflexão sobre as Câmaras Setoriais. Até onde eu entendo, tratou-se de um grande
acordo que envolveu todo um complexo industrial, e as cláusulas que foram negociadas com
relação a salário, emprego etc. foram negociadas mais ou menos segundo a estrutura que se
tem hoje, dos sindicatos e suas bases municipais. Tal como foi feito, não é nem uma expe-
riência de contrato coletivo, sem dúvida, mas também não não é um acordo de empresas.
O Alberto fez uma rápida tipologia do empresariado brasileiro, mas eu gostaria que
ele nos desse um panorama um pouco mais preciso. A impressão que se tem hoje é de que
a resistência maior a uma alteração significativa no aparato institucional das relações capital-
trabalho vem precisamente do setor patronal e de uma ala bastante pequena do setor traba-
lhista, representada principalmente pela CGT. Gostaria que ele aprofundasse um pouco esse
diagnóstico tendo em conta principalmente a própria relação custo/benefício que ele apon-
tou como sendo a lógica empresarial por excelência. Como é que o empresariado que hoje
fala em novas tecnologias, em modernidade, em novas formas de gestão da força de trabalho
etc. defende a CLT? Essa estrutura atual não é incompatível com as concepções modernas
de produção?
Francisco de Oliveira — Eu tomo a questão do Adalberto para o Hélio e aproveito para
fazer uma ligação com a discussão do painel de ontem. Para dizer de uma vez, esse acordo
busca inspiração no modelo social-democrata. Esses países social-democratas, a meu ver,
são uma espécie de Estrela de Belém desse acordo, a guiar o sindicalismo brasileiro, e eu
acho que alguma parte do empresariado brasileiro não está infensa a esse modelo. Esses paí-
ses não eram nada estáveis, alguns sofreram processos de transformação violentíssimos e
alguns estavam entre os mais atrasados da Europa. Sobre alguns a gente diz hoje: realmente,

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

aí a classe operária chegou ao paraíso. Esses países, Suécia, Áustria no princípio do século,
não tinham nada para dar certo, eram um desastre.
Por isso eu não colocaria como precondição a estabilização e a abertura, ao contrá-
rio, elas devem ser o resultado. Esses acordos evidentemente não substituem uma política
econômica que busque estabilizar a economia, derrotar a inflação, mas eles podem consti-
tuir, na verdade, algo que faltou nos planos econômicos, inclusive os chamados heterodoxos.
A heterodoxia desconheceu a capacidade desta sociedade. A heterodoxia era batizada dessa
forma por ser heterodoxa no campo formal da ciência econômica, mas ela desconheceu que
estava tratando com uma sociedade nova. É uma sociedade nova e muito desigual, sem dú-
vida nenhuma, uma sociedade que o debate anterior mostrou ser muito dividida, com um
forte setor informal, para dizer o mínimo. Tudo isso é verdade, mas acho que a heterodoxia
que fabricou os planos Bresser e Cruzado não pode desconhecer que nada se pode fazer
hoje sem olhar qual é o estado de forças dessa nova sociedade. E a heterodoxia, que queria
ser o caminho mais democrático, resultava no expediente mais autoritário. Era, de novo, de
cima para baixo. Não será pois a capacidade destes atores de formular políticas, sem substi-
tuir o Estado, o pressuposto da estabilização e não o contrário, como você parece propor?
Alberto Figueiredo — Se eu entendi bem a pergunta do Alvaro, ou seja, se as relações
de trabalho amarradas na CLT não seriam impeditivas da modernização, minha resposta é
sim, concordo plenamente. E o empresariado não é contra essa idéia. Uma pesquisa feita
pelo PNBE revelou que 98% de nossos empresários são a favor do contrato coletivo. O PNBE
é um microuniverso, mas é mais do que nada.
Mas esse tema é nebuloso para a pequena parte que o conhece e desconhecido por
uma grande parte dos empresários. Ou você acha que o empresário está o tempo todo me-
tido nessas coisas? Ele está é dentro da empresa dele, tentando ver como é que faz para estar
vivo amanhã. Não é porque é empresário e fez curso de engenharia na Poli que está bem in-
formado. A gente até brinca que quando você fala de contrato coletivo com um empresário
ele te responde: "Você está falando de contrato coletivo, mostra logo esse contrato que eu
quero ver de que jeito que é isso aí", como se fosse um contrato de aluguel. Há um grande
desconhecimento sobre o contrato coletivo e boa parte da rejeição que existe é fruto disso,
do desconhecimento. Há sempre o medo da mudança. Na questão da modernização, sem
dúvida o empresário vai precisar de um trabalhador mais preparado e não é com salário de
fome, mantendo a educação nesses subníveis brasileiros, que se vai atingir isso.
Hélio Zylberstqjn — Parece que a palavra "precondição" foi o que gerou mais polê-
mica. Eu não quis dizer que a gente deve esperar o milagre da estabilização, esperar o bolo
crescer para dividir. Eu levantei a questão da unificação das datas-base porque houve um pla-
no, que não foi mencionado, que as unificou: o Plano Collor, o pior de todos. Veja, não se
consegue estabilizar a economia baixando um decreto que diz que no dia 1o de maio todo o
mundo negocia. Essa é a mensagem que eu quis dar. Acredito que os processos são simul-
tâneos, e por isso considero que poderíamos explorar seriamente a possibilidade do acordo
nacional sem preocupações com parâmetros.
Num primeiro momento, não vamos discutir de quanto vai ser o aumento salarial1,
quanto devem ser as férias. Vamos esquecer isso, vamos procurar nos colocar de acordo so-
bre como deve ser a convivência entre capital e trabalho, de maneira civilizada, democrática,
reconhecendo mutuamente a legitimidade. Se começarmos a caminhar nesse tipo de dis-
cussão, isso sim vai contribuir para alcançarmos a estabilidade. Não quis, absolutamente, di-
zer que uma coisa tem que esperar a outra. Minha dúvida é se a centralização seria uma fór-
mula mágica para o controle dos preços, como instrumento macroeconômico. Essas coisas
deram certo em situações muito concretas, num processo histórico muito bem definido.

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CADERNOS DE PESQUISA N° 1 - JUNHO 1994

Creio que deveríamos caminhar para tentar produzir um diálogo confiável e consequente.
Isso sim eu acredito que favorece a estabilidade.
Alguém mencionou que a liberdade sindical é que deveria ser a precondição. Acho
que as coisas não são excludentes, mas devem caminhar juntas. Seria até temerário adotar
a liberdade sindical sem garantias sindicais. Se simplesmente acabarem o imposto sindical,
á contribuição confederativa, o conceito de categoria e a base territorial, estaremos num re-
gime de liberdade sindical, e não sei se o movimento sindical sobreviveria a isso. Esse pro-
cesso tem que ser negociado e pensado com muito cuidado.
Falou-se em transição, e de fato esse vai ser o grande problema de todas as reformas
que nós teremos que fazer, inclusive a das relações de trabalho. Como avançar sem abrir
mão daquilo que já se tem? Como chegar a um novo modelo preservando as garantias que
estão na lei, na Constituição? Para cada interlocutor essas garantias têm um sentido diferente.
Por exemplo, a FIESP, quando fala em direitos adquiridos, pensa em seus direitos sindicais.
Ela aceita mudar, mas quer preservar seus direitos sindicais. Por isso afirmei que a questão
da liberdade sindical tem que ser colocada para os dois lados. Mas, de fato, essa transição
vai ser muito problemática.
Surpreendeu-me agradavelmente no Fórum Capital-Trabalho na USP a disposição do
movimento sindical em aceitar um enxugamento da legislação trabalhista — pelo menos
essa é a posição da CUT. O primeiro documento do fórum é muito claro nisso. O novo modelo
teria uma lista muito pequena de direitos, direitos mínimos. E na Constituição teríamos prin-
cípios. Princípio da liberdade sindical, direito de greve, salário-mínimo, estas questões bási-
cas estariam na Constituição. Uma legislação trabalhista muito enxuta, uma lista muito pe-
quena de direitos, e o reforço muito grande na garantia do sindicato e na negociação coletiva:
esse é um movimento muito grande que boa parcela do setor sindical mais representativo e
consequente aceitaria.
Evidentemente, o fórum final para essas mudanças deve ser o Congresso Nacional,
porque implicam mudanças nas leis e na Constituição. Mas seria muito interessante se as en-
tidades mais representativas tanto do movimento sindical quanto do movimento empresarial
pudessem chegar a um acordo sobre os detalhes desse modelo e entregar esse projeto para
o Congresso Nacional. Esse encaminhamento teria grande possibilidade de sucesso. Se não
for esse o caminho, acho que vamos ficar mais vinte, trinta, quarenta anos esperando essas
mudanças.
Quanto às Câmaras Setoriais, concordo com o Siqueira: o movimento das Câmaras
Setoriais ainda é de cima para baixo. Estou muito curioso em verificar até onde esse processo
vai e se ele vai atingir ou não a negociação no interior das empresas. Não estou dizendo que
a negociação tenha que ser de baixo para cima. Algumas questões se resolvem na Câmara
Setorial, mas isso tem que ter desdobramentos até o local de trabalho, e aí se coloca a ques-
tão da representação dos trabalhadores no local de trabalho e como isso será resolvido na
Câmara Setorial.
Ainda sobre as Câmaras Setoriais, eu não tenho conhecimento detalhado, mas me
parece que na indústria automobilística, onde a discussão do contrato coletivo está mais
avançada, se discute estrutura de cargos e salários, o que é a continuidade do tal modelo tay-
lorista e fordista que eu mencionei. Isso quer dizer que nós estamos pegando o bonde do
contrato coletivo e da modernização das relações de trabalho, mas uma modernização que
já está superada. É muito importante que a gente pegue o próximo bonde. Esse já passou.
Precisamos encontrar outras formas de garantia de emprego que não as formas burocráticas
de quatro ou cinco décadas atrás, que atenderam aos interesses das burocracias sindicais e
das burocracias da administração de recursos humanos. E o resultado desses interesses é o
plano de cargos e salários. A organização que vai sobreviver no novo paradigma não pode ser

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

essa que se baseia nesse tipo de administração de pessoas. Esse bonde não pode ser toma-
do.
José Siqueira Neto — Eu vou fazer inicialmente uma distinção terminológica. Tem-se
empregado nesse debate o termo "descentralização" como o oposto da negociação nacio-
nal. Não confundam descentralização, como negociação descentralizada, com uma negocia-
ção pulverizada. Acho que o Hélio se refere várias vezes à negociação descentralizada pen-
sando na negociação pulverizada. A negociação se dá segundo cada realidade. Esse dado é
importantíssimo. Eu sou um ardoroso defensor da negociação descentralizada e um ardoro-
so crítico da negociação pulverizada, que não organiza nada, insere os que já estão inseridos,
cria ilhas de excelência e mantém o resto na barbárie.
Eu queria fazer uma consideração sobre a exposição do Hélio, que coloca dúvidas
sobre se no Brasil existem as condições que existiam em certos países da Europa para a ne-
gociação centralizada. Eu acho que a negociação tem que evoluir. Quando se analisa o pro-
blema do setor público nós vemos que a lógica da pulverização não dá em nada, gera uma
cascata de direitos reprimidos que não tem fim. Então, talvez nesse caso seja preciso a lei.
Mas o sistema de relações de trabalho não é uma coisa diluída. Estamos falando do trabalho
urbano? Perfeito. Aí talvez a idéia do Hélio de descentralizar, dar oportunidade para as em-
presas, atender às especificidades empresariais pura e exclusivamente, talvez até funcione,
mas mesmo assim eu duvido muito. Acho que isso desregulamenta, elimina qualquer prote-
ção, qualquer orientação geral.
Pensando num sistema de relações de trabalho que visualize tudo, no setor público
eu vejo que a negociação de patamares mínimos é fundamental para entrar na essência des-
sa máquina administrativa nacional e dar um mínimo de transparência e controle à socieda-
de sobre o que os prefeitos, os governadores, os deputados fazem com a máquina adminis-
trativa. É fundamental até pela transparência de como a coisa evolui em termos de
funcionários públicos e para não sermos mais vítimas de caçadores de marajás. É claro que
no serviço público há especificidades que eu acho até saudáveis. Aquela determinação pé-
trea de que o Estado não pode fazer nada a não ser em função da lei é uma segurança do
cidadão e tem que ser respeitada. No serviço público, uma negociação levada às últimas con-
sequências não tem sentido, tanto como não tem no setor privado.
Eu gostaria de chamar a atenção para essa sutileza do debate e também contrariar
mais uma vez o Hélio aqui. Não dá para acreditar nessa cultura do "vamos-fazendo-que-as-
coisas-vão-mudando". O que vai acontecer é uma reforma, porque o medo vai bater em cima
dos sindicatos. Mudar o sistema de relações de trabalho hoje no Brasil significa envolver to-
das as frentes. No empresariado tem a FIESP, que não quer mudar porque não vai saber o que
fazer com aquela pirâmide, vai bater no sindicato. E aí vem aquela questão: e os sindicatos
pequenos e fracos? Sinto muito, têm que acabar. Um sindicato, em princípio, une os fracos
para que fiquem fortes. Se ele une os fracos para ficarem fracos, eu não posso aceitar. Ima-
gino que é possível fortalecer esses sindicatos fracos. Afinal, não se pode conceber que numa
categoria economicamente forte como os metalúrgicos haja um sindicato em Espírito Santo
do Pinhal, onde existem duas empresas metalúrgicas: quando o empresário está de bom hu-
mor, o cidadão é recebido com a polícia à bala, e quando está de mau humor, nem passa na
cidade. É um sindicato fraco, mas porque está fragmentado, é regional. Mas, ao se mudar o
perfil da organização sindical, tal qual o perfil dos países minimamente organizados, por ra-
mos de atividade econômica, toda atividade será representada por um único corpo, e aquele
sindicato lá de Pinhal será um sindicato forte, que consequentemente vai fazer a negociação.
Isso é muito importante.
Mas a tendência do "ir fazendo" significa acomodar os interesses: não pode mexer
com o advogado trabalhista, não pode mexer com o Poder Judiciário, não pode mexer com

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CADERNOS DE PESQUISA N° 1 - JUNHO 1994

os vogais, não pode mexer com o sindicato. Então negocia quem quer e quem não quiser
fique com a lei. O pior problema é o sujeito tomar uma determinada direção sem saber, é
imaginar que tem um discurso moderno quando na verdade está indo para o buraco. Isso
não leva a nada. E nesse sentido eu acredito que a institucionalização básica é fundamental.
Ela pode trazer um mínimo de estabilidade. E aí eu defendo a liberdade sindical no sentido
moderno. Depois da Convenção da OIT, de 1948, outras convenções aprimoraram o conceito
de liberdade sindical: a 151, a 154, a que organiza a representação por local de trabalho, a
que estabelece a liberdade sindical no serviço público, aquela que estabelece a liberdade
sindical no seu sentido amplo, que estabelece um direito de natureza individual, mas que é
coletivo, a proteção e a garantia do exercício da liberdade sindical — porque não adianta
nada ter liberdade sindical se na primeira vez que um dirigente sindical encaminha uma rei-
vindicação é mandado embora.
Tem que haver mecanismos para elaborar isso, e nesse sentido acho que a base ins-
titucional induz à negociação. Não obriga. Esse negócio de obrigar à negociação é muito dis-
cutível. Ela induz, assim como o sistema instaurado em 1930 induziu a esse tipo de sindicato.
Tanto induziu que em 1988 acabou esse tipo de interferência e os sindicatos continuaram se
organizando da mesma forma, por categoria, por base territorial e por aí afora. A base institu-
cional é muito importante no sentido de induzir, porque a negociação, a partir dessa base,
fatalmente vai fazer com que alguns aspectos de estabilidade sejam confirmados.
Outro grande equívoco no Brasil é imaginar a negociação coletiva como um instru-
mento de política salarial. No médio e longo prazos ela acaba sendo isso, acaba estabelecen-
do os patamares mínimos de salário, mas a negociação coletiva nãão serve para isso. Pelo
contrário, ela determina a gestão da mão-de-obra, o funcionamento do trabalho, uma série
de ingredientes que acabam influenciando toda relação de trabalho.
E sobre o problema das Câmaras Setoriais eu volto a insistir que acho um grande
avanço, uma experiência que pode ser radicalizada, no bom sentido, mas daí a imaginar que
vão encaminhar por si só a evolução dos mecanismos gerais de negociação, eu não creio.
Quanto ao problema da transição, é realmente o mais sério. Transitar para onde? Se
não se alterar substancialmente o sistema, não há transição nenhuma a fazer. Se o nosso ob-
jetivo é determinar os setores em que essa negociação pode se dar, isso significa que nós
vamos definir aqueles setores para os quais nós vamos criar os privilégios, os setores que vão
extrapolar ou abdicar da lei, dependendo da circunstância, porque daí tudo tem vigência
temporária, se resolverem mudar vão perder tudo o que conquistaram. Tudo bem, não tenho
restrição nenhuma. É só criar um artigo: está autorizado, quem quiser negociar, negocia. E aí
o patronato, automaticamente, vai perder essa resistência à organização por local de traba-
lho, porque vai precisar dela para fazer a negociação. Não tem transição nenhuma para fazer.
A transição se toma relevante quando nós vamos passar, realmente, de um sistema para o
outro, sair do corporativismo e ingressar na liberdade e autonomia coletiva. Aí tem todos
aqueles problemas que o Hélio muito bem examinou: vão mudar organização por local de
trabalho, sindicato, negociação etc. Mas estamos mudando para fazer o quê? Estamos supri-
mindo uma lei de abrangência nacional e criando mecanismos flexíveis de adaptação do
mercado de trabalho. Mas não dá para quebrar uma lei de abrangência nacional e criar uma
série de leis pulverizadas de natureza regional, setorial.
Essa transição é impossível, é uma travessia que ninguém consegue fazer. Vai sair de
onde? De patamares com referenciais diferentes. O que é possível é ir desmontando por par-
tes o sistema vigente e estabelecer qual é o novo sistema, mas não tem parâmetro essa his-
tória de revogar tudo e começar tudo do zero. Em lugar nenhum do mundo se fez isso. Bra-
sileiro tem a mania do fantástico. Uma vez um professor que foi consultor no Ministério do
Trabalho foi procurado pelos árbitros de futebol, que queriam regulamentar a profissão. En-

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

tão ele recomendou que fossem pesquisar os países em que isso acontecera, porque ele sa-
bia que nenhum país no mundo tem essa profissão regulamentada. Passaram-se alguns me-
ses e os árbitros telefonaram: "Professor, temos uma ótima notícia para o senhor. Nós vamos
ter a oportunidade de fazer uma coisa única no mundo!". Quer dizer, o Brasil de vez em quan-
do tem a mania de inventar coisas que ninguém consegue inventar.
Vamos pegar exemplos parecidos com os nossos: Portugal, Espanha, Itália saíram de
experiências muito parecidas com a nossa e tiveram uma transição para um sistema diferente.
Em primeiro lugar, garantiram a condição institucional, a liberdade sindical, e deram um tem-
po para que se criasse o corpo necessário para poder criar a negociação coletiva, desmontan-
do por partes aqueles elementos excessivamente intervencionistas no mundo do trabalho.
Continua havendo lei do trabalho nesses países, só que com um caráter diferente. Enquanto
a CLT tem setecentos e tantos artigos e mais uma porção de leis ordinárias, eles têm um esta-
tuto do trabalhador, que é muito mais protetor nesse aspecto que a própria CLT, apenas com
noventa artigos.
É interessante observar que na Espanha a mudança básica na Constituição foi feita
em 1976 e o estatuto dos trabalhadores veio quatro anos depois. Nesse lapso de tempo as
coisas foram sendo ajeitadas com bom senso. Não se trata de quebrar tudo da noite para o
dia. Deve-se estabelecer como continua a vigência dos contratos em vigor, aqueles já firma-
dos, como isso se opera. Aí criam-se condições concretas para a negociação coletiva. E eu
espero — sinceramente, sem ter pretensões — que o fórum para o contrato coletivo seja
aquele que o Ministério do Trabalho está organizando, que este fórum dê conta de fazer tudo
isso que o Hélio preconiza: juntar os agentes, fazer um diagnóstico e encaminhá-lo ao Con-
gresso para que ele discuta isso, na pauta inclusive da revisão constitucional. Não vou dizer
detalhes do plano porque preciso da autorização do ministro, mas nós estamos com a idéia
de propor um debate articulado nacionalmente, descentralizado, com uma estrutura bastan-
te democrática, de forma que todos os pesquisadores, professores, dirigentes sindicais par-
ticipem para que possamos formar uma base mínima de consenso. E quanto ao que o Alberto
disse, sobre a maior parte das pessoas desconhecer o assunto, temos que dar massa crítica
para que estas pessoas contribuam e possam de fato trabalhar positivamente nesse debate.
Hálio Zylberstqjn — Bem, creio que temos um problema sério de terminologia, deixa
eu ver se entro num acordo com o Siqueira. Temos uma possibilidade que você descarta, e
eu também acho que não é a melhor, que você chamou da negociação pulverizada. O outro
extremo a que eu estava me referindo é a negociação centralizada nacional. Agora, o que
você chama de negociação descentralizada é o que eu chamaria de negociação articulada.
Você tem um setor que negocia nacionalmente e depois vai articulando negociações até che-
gar na empresa.
José Siqueira Neto — Mas tem que haver uma legislação...
Hélio Zylberstqjn - Sim, uma legislação enxuta, mas que garanta o mínimo.
José Siqueira Neto — Mas é preciso explicitar o que é esse mínimo. Porque o salário-
mínimo gerou um espírito muito predador na sociedade brasileira, tudo é baseado no salá-
rio-mínimo. Não é descer a detalhes como, por exemplo, estabelecer que a jornada seja, ri-
gidamente, de 44 horas. Pode ser anual, mas garantindo os parâmetros mínimos de controle.
Hélio Zylberstqjn — O que eu estou chamando de negociação articulada, e você de
descentralizada, é quando um setor nacional negocia nacionalmente e depois vai descentra-
lizando. Mas não vai fazer muito sentido ter negociações desse tipo em todos os setores.
José Siqueira Neto — Aí vai parar no nível nacional...

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CADERNOS DE PESQUISA N° 1 - JUNHO 1994

Hélio Zylberstqjn — Ou pode nem começar pelo nível nacional. Podem haver setores
que se organizem estadual ou regionalmente.
José Siqueira Neto — Por exemplo?
Hélio Zylberstqjn — Por exemplo, o setor de vestuário. Acho muito difícil regular na-
cionalmente este setor numa negociação. Por ele ser muito mais competitivo, constituído por
microempresas, talvez o melhor caminho seja ter negociações estaduais ou regionais. O mí-
nimo será dado em lei.
José Siqueira Neto — Mas tem aí um dado fundamental que muitos esquecem. Um
dos elementos do direito não é uniformizar a concorrência capitalista? Qual é o temor do em-
presário? O Alberto falou: é o medo de que a concorrência não o acompanhe. A uniformiza-
ção é um ponto importante.
Hélio Zylberstqjn — Isso é a lei, Siqueira. Na lei vão estar previstos alguns elementos,
poucos, mínimos — e quando falamos em mínimo, não estamos pensando só no salário-mí-
nimo, obviamente, mas numa lista de direitos. Você fala na lei de férias. Eu me lembro, no
Fórum Capital-Trabalho, que surgiu uma proposta de que as férias de trinta dias não fossem
garantidas. Isso não está no documento, mas foi uma das propostas que se discutiu. As férias
mínimas, garantidas, seriam de vinte dias. O que não quer dizer que todos os trabalhadores
teriam vinte dias. Os dez dias, ou quantos forem a mais, seriam conquistados na negociação.
Se nós tivéssemos uma legislação desse tipo, esses mínimos provavelmente estariam real-
mente garantidos.
O que estou querendo dizer é que nós queremos realmente verificar o que é impres-
cindível e qual a base mínima a ser garantida na lei. E acho que há possibilidade de se chegar
a um consenso em relação a isso, pelo menos foi isso que se percebeu no Fórum. Agora, fica
o problema complicado de como será essa transição de novecentos artigos para oitenta, no-
venta. Nós não deveríamos, autoritariamente, determinar que todos os setores, todas as ati-
vidades tenham, obrigatoriamente, uma negociação nacional. É preciso deixar a coisa fluir
um pouco, uma vez que se tenha garantido, minimamente, certos direitos, bem como a or-
ganização sindical e a negociação coletiva.
José Siqueira Neto — Com direito de extensão, como há nos países desenvolvidos?
Onde você percebe que há uma sabotagem na negociação coletiva, o poder público, depen-
dendo das circunstâncias...
Hélio Zylberstqjn — Talvez esse seja um item para ser resolvido naquele tal acordo
nacional, a questão da extensão. As partes discutiriam isso. O que se deve evitar é o tipo de
approach típico da nossa relação de trabalho. Nós, no Brasil, achamos que é importante an-
tecipar na lei o resultado do jogo. E a gente não deixa ter jogo. É o que a nossa legislação
trabalhista faz, está tudo lá. Ela determina o resultado. A conclusão é que nós não temos nem
aquele resultado previsto e nem o jogo. Precisamos mudar o enfoque, devemos nos ater ao
processo, e não ao resultado, vamos garantir o processo, vamos fazer um jogo limpo, equili-
brado. Vamos dar gramado, bola, meia, um juiz e deixar jogar. Garanta-se o jogo. É essa mu-
dança que eu acho que a gente deveria fazer.
Outra questão importante, que o Siqueira comentou, é a dos servidores públicos.
Creio que um pouco da contradição que você aponta no que eu disse deve-se muito à forma
como os serviços públicos e a administração pública estão organizados no Brasil, que é ex-
cessivamente centralizada. E hoje temos a tendência, que provavelmente vai se firmar, a um
processo de descentralização da oferta dos serviços públicos. Por exemplo, a saúde. É evi-
dente que o governo também está conduzindo autoritariamente esse processo, mas acho

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

que o governo e a sociedade chegaram à conclusão de que não dá mais para ter um sistema
de saúde centralizado pelo governo federal. O que está sendo cogitado? Descentralizar.
Transferir inclusive os servidores do INAMPS para a responsabilidade dos estados e municí-
pios. Talvez comece a acontecer isso com outros tipos de serviços públicos. O governo fede-
ral vai se liberar do encargo de ter que prestar esses serviços e vai descentralizar isso. E quan-
do eu digo setor público, não estou pensando só no setor público federal, mas no estadual e
no municipal. Há um problema sério de funcionamento da democracia quando a negociação
coletiva chega à sua plenitude no setor público, e não só no Brasil, mas também em outros
países.
Carlos Augusto Gonçalves Jr. — A minha questão é em particular para o Siqueira. Você
afirmou que, mesmo nos setores que mais têm avançado — ainda que lentamente — , a pro-
posição de um contrato coletivo de trabalho para as bases, caso da experiência do setor auto-
mobilístico, há uns quatro pontos de estrangulamento dessa experiência. Como você acom-
panhou muito de perto isto, pelo menos no período em que esteve na frente dessa questão
pelo lado dos trabalhadores, eu gostaria que você explicitasse melhor quais são os fundamen-
tos dessa sua avaliação à luz desse recente acordo realizado no setor automotivo, levando em
consideração um item muito específico, mas de muita importância política. Um dos itens do
acordo foi a unificação da data-base do conjunto da categoria, metalúrgica para o estado de
São Paulo, o que tem um efeito significativo. Do ponto de vista da Câmara Setorial há então um
acordo que aponta não para a tendência da pulverização, mas para a unificação. Gostaria que
você problematizasse isso.
Sebastião Lopes Neto — Essa menção ao setor do vestuário me chamou a atenção,
porque a CUT tem um setor de vestuário que abrange calçados, confecções, curtume e têxtil.
As confecções se concentram muito no Sul, com algumas ilhas no Nordeste, são milhares de
pequenas empresas, com muita economia clandestina. Como seria a negociação num setor
como este, articulado em âmbito nacional e descentralizado? Como levar em conta as desi-
gualdades regionais? O Nordeste teria incentivos? A minha preocupação é que eu não vi até
aqui, a não ser na questão da transição, qual será o papel do Estado.
No desenvolvimento das questões colocadas, não vejo como o sistema das relações
de trabalho não acabe ficando apenas nos setores mais avançados, que não seja um sistema
que sirva, no final, aos setores mais avançados, sejam os setores sindicais mais organizados,
ou os setores da economia mais avançados ou estrategicamente mais importantes, ou que
tenham interesses para relações mais estáveis etc. Porque o país tem uma forte economia
informal. E tem a questão das centrais, me parece muito pouco tratado o papel das centrais
sindicais, principalmente levando em conta que nós temos não sei quantos mil sindicatos.
E lembrando o que me pareceu um elogio geral a uma espécie de conquista que hou-
ve na Constituinte, quando a Constituinte manteve o enquadramento por município e por ca-
tegoria, provocou uma avalanche de novos sindicatos. A Força Sindical adotou uma tática de
criação de sindicatos. A região de Campinas, por exemplo, tem sete novos sindicatos de me-
talúrgicos . Ou já registrados, ou na porta do cartório esperando que ele abra. Quando for criado
um município, no dia em que o cartório abrir, velhos capangas do movimento sindical vão se
tomar dirigentes sindicais, como é o Taruga em Americana, um conhecido capanga, atirador
e tal que virou presidente de sindicato de Americana, bancado pela Nardini, nossos empresá-
rios progressistas.
E, por último, quero abordar a questão da organização por local de trabalho. Eu estou
sentindo neste debate que a organização por local de trabalho aparece como uma comple-
mentaridade à execução do acordo. Parece que do ponto de vista da CUT ela seria muito
mais o pilar de uma nova relação de trabalho a partir da qual se procure a construção de uma

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CADERNOS DE PESQUISA N° 1 - JUNHO 1994

nova estrutura sindical. Pergunto aos debatedores como eles vêem a real representatividade
das centrais sindicais para discutir essa questão. Eu tenho muita dúvida sobre elas, muito
mais sobre a Força Sindical, é óbvio. Outra questão: neste período político que vai até a pró-
xima eleição presidencial, com essas contradições do governo Itamar e com o Congresso di-
rigido pelo Inocêncio, como vocês vêem, institucionalmente, a possibilidade de essa discus-
são avançar?
Edward Amadeo — O problema da CLT me faz lembrar um pouco a metáfora que o
Hélio fez sobre o jogo. O Japão, os Estados Unidos e a Europa são regiões em que a metáfora
se aplica de maneira diferente. Na Europa, relativamente a outros países, há uma legislação
muito próxima de estabelecer o resultado do jogo desde o início. No Japão, as regras do jogo
são parecidas com as dos Estados Unidos, mas o resultado do jogo nos dois países é comple-
tamente diferente. Isso para mim significa que a questão da regulamentação está muito re-
lativizada pela cultura dos agentes envolvidos. Um tipo de legislação ou regulamentação que
seja totalmente estranho à cultura dos agentes é letra morta. No fundo, a CLT é, em alguma
medida, letra morta, porque houve modificação nas atitudes e na cultura dos agentes envol-
vidos. Isso leva ao problema do timing entre o fórum que o Siqueira está anunciando há al-
gum tempo e a revisão constitucional.
A posição do movimento sindical, da CUT em particular, com relação à revisão cons-
titucional é diferente da que adotou em relação à Constituinte. Por quê? Porque naquele mo-
mento específico, 1987, 1988, o importante era cristalizar certas conquistas e colocá-las na
Constituição, e muitas delas aconteceram. Os direitos sociais, o custo da demissão, até mes-
mo a participação nos lucros eram alguns pontos que interessavam ao movimento sindical.
Hoje, com a idéia do contrato coletivo, não sei mais qual será exatamente a posição do mo-
vimento sindical. Vamos atuar sobre a Constituição ou vamos querer um fórum de negocia-
ção que seja mais ou menos flexível e que dê espaço para que, quando necessário, as coisas
mudem? Estou preocupado com o timing justamente pelo possível conflito entre o que vai
ser regulamentado e a atitude dos agentes. Estamos a seis meses da revisão constitucional
— se é que ela vai se realizar na data prevista — e há muito pouco tempo para adaptar as
mudanças que se deseja introduzir na posição dos atores. A questão da contribuição sindical
é algo que não tem consenso.
Outro problema é o custo da demissão. O Hélio levantou a questão do controle do
emprego, e eu diria mais: o treinamento profissional e uma série de outras coisas que mu-
dam radicalmente o contorno da relação capital-trabalho. Se isso passar a existir, o custo da
demissão, que está na Constituição em 40% do FGTS, some, não é mais preciso. Mas se não
se tiver, até lá, conseguido alguma coisa desse tipo, tem que manter os 40%. O problema é
de timing. Quem vai representar o setor patronal, afinal de contas, é a FIESP, a FIERJ? Elas vão
legislar, obviamente, em causa própria. Toda a problemática que tínhamos na questão do
pacto social voltará a acontecer. Vamos legislar sobre temas em que os agentes, obviamente,
vão tentar preservar uma série de interesses. Preferível seria, a despeito ou à revelia de uma
agenda política mais ampla, que essa revisão constitucional não acontecesse em seis meses,
mas num prazo suficiente para que os agentes institucionais, de alguma forma, se manifes-
tassem, de tal maneira que não se chegasse ao conflito entre legislação e cultura dos agentes
envolvidos.
Marco Antônio de Oliveira — Eu queria recuperar o tema geral do seminário, que é
"reestruturação produtiva e novos padrões de negociação". Parece que essa questão não foi
tocada, e no meu modo de ver ela é fundamental para se pensar o futuro e a possibilidade
real de um novo sistema de relações de trabalho. O Hélio afirmou, com grande propriedade,
que um sistema de contratação coletiva do tipo nacional teve lugar justamente na Europa do

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

pós-guerra, num contexto muito particular, de maior homogeneidade do mercado de traba-


lho, maior igualdade social, predomínio do fordismo e, como contrapartida natural de tudo
isso, um sistema de remuneração apoiado no contrato. E o que temos aqui? A idéia do con-
trato não é nova, ela remonta ás origens do movimento sindical, ressurge com o chamado
novo sindicalismo, e aqui o que encontramos é um mercado de trabalho altamente hetero-
gêneo, uma profunda desigualdade social, sem que haja um Estado de bem-estar social con-
solidado, nem um fordismo completo, até porque não há a contraparte natural do sistema de
contratação coletiva.
A questão que eu coloco é a seguinte: afinal de contas, para que estamos discutindo
contratação coletiva se, segundo essa visão, essa idéia estaria superada? Só vejo possibilida-
de de a idéia de um novo sistema de relações de trabalho ganhar força e, portanto, o instru-
mento do contrato passar a vigorar, se esse sistema de relação for visto como uma peça fun-
damental no próprio sistema de reestruturação produtiva. E aí eu acho que esbarramos em
um problema de outra natureza, que transcende a órbita do debate das relações de trabalho
stricto sensu. O problema é a própria dimensão do processo de reestruturação. Se nós cami-
nharmos para um processo de tipo restrito, conservador, assentado unicamente nas escolhas
dos agentes privados, podemos ter uma via que é a do sindicato por empresa, que o Siqueira
chamou de "ilhas de excelência", e aí podemos conviver com a atual legislação sem nenhum
problema. A legislação que sobrevive à reforma de 1988 é tão híbrida que permite essa pul-
verização e a contratação por empresa sem grandes danos.
Outro dado importante a ressaltar é que, como há uma pressão fortemente autoritá-
ria sobre as relações de trabalho, e fortemente centrada nas relações diretas entre patrão e
empregado, o advento das inovações pode reforçar esses laços dentro de uma lógica restrita
em detrimento do próprio sindicato como um agente coletivo. Parece-me que a questão do
contrato não está tanto em sua forma jurídica, mas na associação do sistema de contratação
com o próprio processo de modernização em curso — ou ele se ancora num projeto moder-
nizador mais amplo, em que os trabalhadores passam a ser vistos como interlocutores reais
no jogo político, ou, do contrário, não há possibilidade de vigência desse contrato com esse
nexo articulador, que vai da questão nacional à questão local. Para resolver os problemas no
chão-de-fábrica, a relação atual está dada e permite isso. No Brasil, o empresário moderno é
o que não usa chibata. Prioriza-se a relação direta em detrimento do sindicato. Essa questão
precisaria ser pensada, sob pena de a gente discutir a questão no plano jurídico e esbarrar na
realidade.
Um outro problema diz respeito à revisão constitucional. O plano jurídico é um desa-
guador natural desse debate, mas é um corolário dele. A pergunta que eu faço é a seguinte:
não tanto qual é a expectativa de vocês em relação à revisão, mas como vocês estão vendo
o posicionamento dos atores em relação a ela?
Adalberto Moreira Cardoso — Tenho a impressão de que o Marco tocou um ponto im-
portante. No momento em que no mundo inteiro está-se repensando a forma do contrato co-
letivo em função do processo de reestruturação produtiva, parece meio anacrônica essa op-
ção no Brasil. Mas eu queria voltar ao problema da revisão constitucional para lembrar alguns
fatos da Constituinte de 1988 e levantar uma questão: os interesses defendidos então têm al-
guma possibilidade de sofrer uma mudança de qualidade? Eu me refiro, por exemplo, ao in-
teresse empresarial em relação à atividade sindical, tal como foi primeiro manifestado em
dois documentos, um da CNI e outro da FIESP, ambos defendendo ardorosamente o imposto
sindical, mas divergindo em relação à questão da unicidade ou pluralidade. O argumento pú-
blico, então, era que os pequenos sindicatos seriam absorvidos pela CUT, porque não teriam
como se manter financeiramente sem o imposto sindical, e haveria um processo de concen-
tração sindical fartamente combatido.

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CADERNOS DE PESQUISA N° 1 - JUNHO 1994

O que mudou? Um lado importante dessa mudança tem a ver com o fortalecimento
da Força Sindical e com o investimento poderoso do empresariado no fortalecimento da For-
ça Sindical. Hoje em dia, a Força Sindical competiria com a CUT num processo de incorpo-
ração de pequenos sindicatos. E, certamente, a Força Sindical joga hoje no Brasil um papel
de aliado do empresariado, não do ponto de vista que estamos discutindo aqui, de interesses
divergentes que vão encontrar formas de diálogo, mas nas questões principais da transfor-
mação do capitalismo que está ocorrendo no Brasil. Isso sem levar em conta o fato de que o
imposto sindical não mantém só a pirâmide da FIESP, é um dinheiro pelo qual o empresaria-
do não tem que se mexer e que funciona como fonte poderosa de financiamento de lobbies.
Se acabar o imposto sindical, o empresariado terá que se mexer para continuar concentran-
do esses recursos e manter parte de seus lobbies em Brasília.
Do ponto de vista do movimento sindical, as duas CGTs, ainda hoje, se mantêm com
o dinheiro do imposto sindical que vem das federações. As confederações nacionais, hoje
em dia, são grandes empresas. Têm hotéis, algumas têm grandes indústrias, comércio, inde-
pendem financeiramente do próprio imposto sindical. Para elas, acabando a estrutura sindi-
cal, as pessoas que lá estão há vinte anos vão se manter como empresários. Não está em jogo
a sobrevivência física dessas pessoas. Desse ponto de vista, não sei se a CGT seria um lobby
poderoso. Estou chamando a atenção sobre esses interesses para a revisão constitucional
que vai acontecer daqui a seis meses. Fundamentalmente, se o que está em jogo é a consti-
tuição das regras do jogo, e o pressuposto da fala de todos aqui é que os atores que discutirão
essas regras serão atores virtuosos, vão levar em conta o interesse do outro, a legitimidade
do interesse oposto, abdicarão de alguns interesses poderosos seus para definir regras mini-
mamente democráticas. Esse foi o pressuposto das várias intervenções. No entanto, as regras
serão discutidas segundo uma distribuição atual de poder que confere, ainda, um poder des-
mesurado para o capital definir, de seu ponto de vista, regras que não sejam equânimes e
democráticas.
Hélio Zylberstcgn — Do ponto de vista da parcela do movimento sindical que depen-
de do imposto sindical, é verdade. Mas para as entidades empresariais o imposto sindical é
peanuts. Trata-se de mais um imposto que também só pode ter sentido se for mantida a uni-
cidade sindical. Mas o imposto sindical pode desaparecer, que do ponto de vista deles não
há problema nenhum. Eles defenderam a unicidade e, consequentemente, se aliaram ao
lobby da parcela do movimento sindical que queria o imposto e a unicidade. Mas o imposto
sindical é praticamente nada, muito maiores são a contribuição assistencial e a contribuição
confederativa. E muito maiores ainda são as contribuições para o Senai e o Senac, e isso só
tem sentido se houver unicidade sindical. Se houver pluralismo, como dividir isso?
Elson L. S. Pires — Assim como o processo de industrialização produziu uma série de
atividades informais, a atual reestruturação produtiva, no meu modo de ver, vai produzir no-
vos contingentes de trabalhadores informais, e talvez uma certa mão-de-obra qualificada vá
ser jogada fora. Em paralelo a esse processo já estão sendo criados sindicatos de informais
que funcionam em Salvador, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e alguns outros estados. Eu
não sei como é que vai se fazer isso aí, fica por conta dos companheiros da CUT, mam eu
queria ouvir algum comentário sobre isso porque talvez essa seja uma das questões centrais:
a organização sindical desse grande contingente, talvez 50% da PEA.
José Siqueira Neto — Olha, Augusto, eu acho que a unificação da data-base no setor
automotivo no estado de São Paulo só vem confirmar aquela minha tese. Já que o setor au-
tomotivo não conseguiu ainda estabelecer um padrão único, pelo menos unificou a data-
base e, nesse momento, também o salário. Porque aí tem o efeito prático. A concentração do
pólo automotivo está no ABC, que negocia em abril. Acontece que há sindicatos de empresas

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

que também fabricam automóveis, como o de Taubaté, que estavam negociando em novem-
bro. Essa diferenciação é só um problema operacional. Vejo como um avanço, mas relativo.
Isso atendeu também aos interesses do setor automotivo. Já que vai ter que conviver
com trinta sindicatos no local de trabalho, pelo menos uniformiza o momento de negociar o
salário. E, diga-se de passagem, é o caminho que vem se construindo há quatro anos com
total aquiescência do sindicato dos trabalhadores do qual eu sou copartícipe. Isso teve início
em 1989, quando começamos a estabelecer parâmetros, depois teve o processo de negocia-
ção de salários em base trimestral, depois mensal, depois a primeira pancada veio com o pri-
meiro acordo do setor automotivo, e agora a pancada final.
Quanto às centrais, *Neto, o papel delas vai depender do que elas querem. Acho que
as centrais têm que organizar o conjunto dos sindicatos no Brasil. Isso para mim não é cen-
tral, é sindicato organizado por ramo de atividade e local de trabalho. É como a pirâmide de
que o Hélio falou. O problema de a legislação não ficar apenas para aqueles que estão avan-
çados é um dilema. Temos que considerar os setores da economia que são privilegiados em
relação aos outros. Se ocorrer esse entendimento balizado num patamar uniforme, pode-se
estar nivelando por baixo. Tem-se que tomar o cuidado de garantir a eficácia dos mecanis-
mos de negociação, mas não se pode nivelar seu patamar por baixo. Uma coisa é defender
a não-discriminação, eu acho que tem que haver um patamar mínimo.
Outra coisa é defender que a Autolatina pague o mesmo salário e dê as mesmas con-
dições e garantias que a oficina mecânica da esquina. O que vai acontecer é que a Autolatina
vai pagar pelo parâmetro da oficina da esquina. E aí cai-se no discurso fácil: é só tirar a con-
tribuição do INSS que tudo se resolve, tirar as contribuições sociais para aumentar o salário
no curto prazo. E o sujeito acredita nisso. Não importa que ele está tirando do vizinho. Por
outro lado, não se pode fazer o discurso oficial, "tudo igual para todo mundo". E as centrais
devem funcionar como um regulador desse processo.
Sobre a representatividade, temos que partir de uma constatação óbvia. Sob o ponto
de vista real de representação, nenhum agente no Brasil tem isso. É óbvio. Vivemos quantos
anos de castração da organização autônoma? A mim, é muito simpática a idéia espanhola,
que na verdade vem da Alemanha, da votação direta no local de trabalho, representação pro-
porcional de quem está lá, por lista, de maneira democrática. O exemplo espanhol foi assim.
Quando houve a abertura, as Comisiones Obreras e a UGT não tinham praticamente uma
base orgânica. Houve um tempo para se organizar inclusive o que eu chamo de geografia sin-
dical. E aí, pelo voto direto, representação, liberdade e autonomia e essa base foi surgindo. É
ridículo um país defender a unicidade sindical tendo 19 mil sindicatos.
O Amadeo coloca corretamente um problema que é saber qual o timing desse deba-
te em relação à reforma constitucional, que está prevista para começar em outubro. Mas eu
não tenho muita ilusão a esse respeito. Se não houver uma base mínima de consenso não
muda nada na Constituição, não vai haver reforma nenhuma. Há 2 milhões de reclamações
por ano, vai subir para 4 milhões e vai surgir empresa só para tirar papel da Justiça do Traba-
lho. Resolve-se o problema de emprego do advogado, desenvolve-se a indústria do papel. Por
isso eu concordo, tem que haver uma combinação de agenda. No debate sobre o contrato
coletivo no setor automotivo, no qual fizemos um diagnóstico profundo das relações de tra-
balho, cada parte apresentou um documento em que interpretava as relações individuais, co-
letivas e com o Estado, e chegou-se a um consenso absolutamente fantástico, não houve
qualquer divergência. Não sei por que isso não foi divulgado. Um documento conjunto, não
só do setor automotivo, mas também com fabricantes de porca, parafuso, arruela, tudo, e ain-
da com sindicatos, apresentando um consenso do que estava entravando o desenvolvimento
das relações de trabalho no Brasil. Se se organizar um processo, sem se ser inocente a ponto
de imaginar que isso vá depender da boa vontade dos homens, se se conseguir organizar e

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concentrar esse debate, a gente tem mais ou menos o timing da revisão constitucional. Do
contrário, eu acho que não muda nada. Vamos ter que nos conformar com a próxima etapa,
que é a emenda constitucional.
Vou entrar agora na questão do Adalberto. Vocês já pararam para pensar como fun-
ciona a Justiça do Trabalho? Vocalato, dissídio coletivo, demora na solução dos conflitos in-
dividuais... É uma vergonha, uma indecência, um processo trabalhista no Brasil demora oito
anos para se resolver. Burocracia de 8 mil pessoas, papel que não acaba mais.... Não dá para
pensarem modernização das relações de trabalho com essa estrutura. E a maioria dos repre-
sentantes do Poder Judiciário vai dizer que o problema é falta de junta. É só começar a abrir
novas juntas pelo Brasil afora e o problema estará resolvido. E quem sustenta isso? A troco
de quê?
Hélio Zylberstqjn — Há alguns anos eu fiz uma conta. Para cada dois cruzeiros julga-
dos e decididos na Justiça, o custo era de um cruzeiro.
José Siqueira Neto — Tenho a intuição de que três orçamentos anuais da União no
setor da Justiça Trabalhista pagam todas as reclamações que correm por conta dela. Talvez
até menos. Um amigo meu que é juiz do trabalho fez um estágio na Alemanha, pela Bosch,
no programa das comissões paritárias de solução de conflito. Teve um caso de justa causa de
um operário por quebra de máquina. O operário alegava que havia faltado no dia em que o
patrão deixara uma certa ordem de operação na máquina, que ele portanto não cumprira,
sendo por isso mandado embora. E o juiz perguntou a ele se havia comunicado ao patrão, ao
que respondeu que sim, mas o patrão não dera ouvidos. Então o juiz imediatamente telefo-
nou ao patrão para que este averiguasse a falta do empregado no tal dia, o que realmente
confirmou em questão de poucos minutos. O patrão reconheceu o erro e na hora propôs
readmitir o operário, com o que este concordou. Pois bem, perguntado como resolveria isso
no Brasil, esse meu amigo respondeu: "Muito simples, eu ouviria três testemunhas de cada
lado e julgaria depois de oito anos". E é verdade. É uma justiça movida a maracutaia.
A geografia sindical, volto a insistir, é agradável para os dois lados. E o poder da uni-
cidade sindical é fantástico. A FIESP diz que a CUT vai absorver muitos sindicatos porque tem
experiência nisso — há mais de trinta sindicatos da CUT nas bases da FIESP. Ela sabe muito
bem como funciona. Eu creio que, apesar de o imposto sindical ter sido relevante, o proble-
ma não é esse. Esse expediente do remendo é típico do Brasil. Se for revogado o imposto
sindical, cria-se imposto confederativo. E o dirigente se pergunta: "para que cobrar o imposto
sindical — para ser chamado de pelego?". Cobra o confederativo e depois extrapola no assis-
tencial.
Eu concordo portanto com o Marco que não é apenas uma questão jurídica. Mas eu
tenho uma discordância: a modernização produtiva não é para todos os setores da economia
nacional. Os que estão lá atrás vão depender de uma ação concreta. Não podem deixar-se
encantar por essas mudanças que alguns setores estão sofrendo em função da concorrência
internacional. Deixar para depois o trabalho rural é outra piada. Há setores da economia na-
cional que estão longe desse processo de reestruturação. Mas uma mudança institucional e
jurídica das relações de trabalho pode ter um reflexo fundamental na economia.
Quanto à revisão constitucional, está todo mundo em compasso de espera, à exce-
ção da FIESP, que já tem seu lobby montado, com secretária, telefone, tudo para tentar atuar
de maneira organizada na revisão constitucional. Há também muitos setores dos trabalhado-
res falando em se organizar e discutir, mas não vejo nada mais concreto. Isso preocupa, mas
também ninguém acreditava na articulação dos trabalhadores na Constituinte e depois os di-
reitos sociais foram muito bem articulados.

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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E NEGOCIAÇÕES CAPITAL-TRABALHO

Hélio Zylberstqjn — Eu vou procurar, rapidamente, tocar em alguns pontos que me


pareceram importantes nas perguntas. Como seria a negociação articulada no complexo ves-
tuário-têxtil? Exatamente por ser um universo tão espalhado no Brasil, com tantas microem-
presas com trabalho informal, trabalho a domicílio, eu acho que não tem sentido querer de-
terminar alguma coisa nacionalmente. Esse é um setor que se deve procurar organizar mais
regionalmente. Onde houver alguma concentração, procura-se organizar. Setores que têm
caráter mais nacional vão se organizar nacionalmente e outros vão ficar em situação inter-
mediária. Eu não me preocupo muito com isso. É algo que vai ocorrer uma vez que se te-
nham garantido algumas regras mínimas.
Alguém levantou a questão da negociação coletiva só para os setores avançados. É
verdade, não podemos dar à negociação coletiva uma qualidade que ela não tem. Por si só,
a negociação coletiva não vai promover a igualdade social. Pelo contrário, pode promover até
mais desigualdade entre os grupos de trabalhadores. A negociação coletiva não pode resol-
ver os nossos grandes problemas básicos, sociais e econômicos. Por isso é que se deve pen-
sar nesse mínimo que tem que ser muito bem negociado e garantido de fato.
O papel das centrais. Alguém levantou a questão dos novos sindicatos. Por que isso
está ocorrendo? Exatamente pelo incentivo das contribuições compulsórias. Qualquer um de
nós pode hoje montar um sindicato e começar a cobrar contribuição confederativa. O "sindi-
cato dos debatedores", por exemplo. E vai ter gente que vai receber um papel carimbado e
terá que pagar.
Quanto à revisão constitucional, eu estou de acordo com o Siqueira: se não houver
um consenso, um projeto sério e consequente gerado pelos atores sociais, essa reforma ou
não vai existir ou vai aprofundar a tendência da Constituinte: em vez de 34 direitos sociais,
talvez venhamos a ter 68, e manter a unicidade sindical.
O Amadeo levantou a questão do custo da demissão, e focalizou um aspecto muito
restrito. De fato, a Constituição estabeleceu um custo de 40% do saldo do FGTS. Mas quando
eu estava me referindo ao controle do emprego, não me referia ao custo de demissão. Isso é
peanuts, é muito barato demitir alguém. O contrato coletivo e o controle do emprego signifi-
cam que cada demissão tem que ser discutida. Tem que caracterizar muito bem uma justa
causa, uma necessidade econômica ou uma mudança tecnológica, e aí negociar com o sin-
dicato a demissão. Não é uma questão de pagar para demitir. É negociar para demitir, com
as regras estabelecidas no contrato. É isso que é o controle de emprego e por isso ele é tão
importante.
A representação dos trabalhadores como um pilar para uma nova estrutura de rela-
ções de trabalho. Exatamente. A representação no local de trabalho vai ser a base da estru-
tura sindical, e deve ser a base da nova organização que vai se gerar nessa perspectiva de
modernização, que não é avançada mas que vai ocorrer nos setores avançados e dinâmicos,
sem dúvida. Esse novo paradigma industrial requer a participação dos trabalhadores. É por
isso que a organização dos trabalhadores no local de trabalho tem sentido também para a
modernização da própria economia. Aí é que está o dilema do movimento sindical, porque
essa modernização pode ocorrer com ou sem o sindicato. É o que está se passando no mun-
do desenvolvido. As empresas nos países avançados estão adquirindo know-how de parti-
rem para a modernização com o que se chama de human resources approach. A empresa
consegue prestarão trabalhador serviços que tradicionalmente eram prestados pelo sindica-
to e o trabalhador naquela empresa não vê necessidade do sindicato. Exemplo típico disso é
a IBM nos Estados Unidos, que se orgulha de não ter sindicato. Isso apresenta para o movi-
mento sindical um problema sério, e isso é conseguido tanto na base da pressão como na
base de condições objetivamente muito favoráveis de trabalho, inclusive com políticas de
acesso, de participação. Esse novo paradigma pode resultar numa industrialização sem sin-

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dicato. É o risco que o movimento sindical está correndo, e por isso seria muito importante
que ele tentasse forçar uma discussão séria a respeito desse novo modelo que se quer, na
esperança de que se chegasse alguma proposta de consenso entre os diversos atores sociais.
Alberto Figueiredo — Sobre a questão dos atores virtuosos, não se trata de ser bonzi-
nho. Eu acho que está se ampliando um segmento convicto de que, se o trabalhador tiver
melhores condições, há uma criação objetiva de mercado que vai ser melhor para o próprio
empresário, independente de qualquer questão ideológica.
O modelo que nós defendemos é o seguinte: pluralidade sindical com base na ques-
tão da competência. Quem tem competência se estabelece e sobrevive. Com a legislação
definindo um mínimo para evitar picaretagem, porque hoje, apesar da legislação que formata
tudo, tem muito picareta.
Sobre a questão da negociação, o modelo de contratação articulada apresentado
pelo Hélio nos agrada muito. Haveria níveis de negociação mais gerais, estreitando até che-
gar na empresa com as suas especificidades. Sem ordem de cima para baixo ou de baixo
para cima. Existiriam níveis, e pronto.
No que se refere à questão da representação no local de trabalho, nós defendemos
a comissão de fábrica, com as chapas representando os sindicatos — com pluralismo, e não
um por categoria. Em função do voto proporcional do pessoal da empresa as diversas corren-
tes formariam a chapa. Teria lugar sim o sindicato dentro da comissão de fábrica e existiria
sim a representação no local de trabalho.
Sobre acabar com as contribuições, o Hélio tem razão. Ouvi o tesoureiro da CUT falar
que o imposto sindical é piada: dos 35 milhões do orçamento da central esse ano, dois são
de recursos externos e no restante o imposto sindical representa muito pouco. Já a revisão
constitucional, na nossa visão, do jeito que está vai ser mais ou menos como foi a anterior:
um mercado persa, uma série de lobbies brigando por pequenos detalhes.

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