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1. UMA TENTATIVA DE DELIMITAR A FRONTEIRA

Delimitar as fronteiras desta dicotomia tão importante para Filosofia do Direito não é algo tão fácil. Em especial,
nos dias atuais, quando uma parte relevante da doutrina, a exemplo de Tercio Sampaio Ferraz Jr., assevera que
ela já se mostra enfraquecida.
Todavia, apesar da advertência do ilustre jurisfilósofo paulista, ainda se mostra oportuna à tentativa de demarcar
uma fronteira entre tais conceitos.
É com este propósito, então, que serão oferecidos aqui alguns critérios. Sem se desconhecer, no entanto, que
esta oferta envolve algumas dificuldades.
A primeira, a de que estes critérios não são todos eles lugares-comuns na doutrina. Ou seja, não contam com a
adesão da unanimidade dos doutrinadores. A segunda, a de que qualquer oferta de critérios envolve, em alguma
medida, maior ou menor, alguma margem de arbítrio.
Porém, apesar dessas dificuldades preliminares, a formulação da proposta mostra-se útil senão pela sua utilidade,
ao menos pela capacidade de suscitar o debate.
Sugerem-se, então, seis diferentes critérios, a saber: a) segundo a etimologia do significante, b) de acordo com a
abrangência ou a aplicabilidade, c) conforme a historicidade (ou temporalidade), d) em razão da fonte (ou gêne-
se), e) consoante à forma de conhecimento e, por fim, f) segundo o princípio que o orienta.
Com a finalidade de que os critérios sejam mais bem compreendidos, a exposição de cada um deles será feita de
forma individualizada e se valendo do cotejo entre as concepções jusnaturalista e juspositivista.

1.1. SEGUNDO A ETIMOLOGIA DO SIGNIFICANTE

Uma das primeiras distinções é a referente à etimologia do significante empregado. Jus, em latim, quer dizer Di-
reito. E “naturalismo” vem da ideia de “natureza”, “espontâneo”, “natural”, “não artificial”.
Assim, direito natural é o direito que não foi criado pelo engenho humano, mas, sim, o direito que foi por ele des-
coberto e que precede a própria existência humana. Por conseguinte, jus naturalis é aquele que, em rigor, não
sofre a interferência do homem.
Por outro lado, juspositivismo é o direito positivado. Positivismo deriva do latim positivismum. “Positivismo” quer
dizer “algo criado”, “algo posto”, “algo que foi criado artificialmente”, “artificial”. O Direito Positivo é o direito criado
pelo homem e, a seguir imposto por ele a outros homens. Logo, direito positivo não é o direito descoberto, não é o
direito obtido de forma contemplativa.
Pelo contrário, é o direito criado pelo homem e que, por isso, muda de acordo com o arbítrio do homem.
Como toda atitude criativa envolve, em maior ou menor medida, alguma dose de arbitrariedade, pois acarreta, em
regra, a imposição da vontade de um indivíduo sobre o outro, o direito positivo é também o direito imposto pelo
homem aos seus semelhantes. Logo, o direito positivo é também aquele que se vale da coercibilidade, ou seja, da
ameaça de se utilizar da força, caso seja necessário.
Aliás, é nessa direção que aponta a doutrina de Hans Kelsen, ao assinalar que norma jurídica é a norma que se
caracteriza pela possibilidade de se aplicar uma sanção institucionalizada pelo Estado.
Note-se que o que dá capacidade ao homem desta criação é a razão, embora não seja ela a determinante na
criação desse Direito. O elemento que dá o pontapé nesse processo de criação é a vontade, o arbítrio. O homem
deseja criar um determinado direito e, ao elaborá-lo/construí-lo, utiliza-se de sua razão. Porém, uma vez criado,
qual é a abrangência do direito positivo?
Note que “ao lado da palavra do latim clássico jus e significando também direito, apareceu a palavra derectum
(inicialmente, talvez, somente rectum e, mais tarde, também a forma directum)”.

1.2. DE ACORDO COM A ABRANGÊNCIA OU A APLICABILIDADE

Quanto à abrangência (a quem/onde se aplica) o Direito Natural é o direito universal. O direito que pretende ser
aplicável a qualquer país, a qualquer grupo de pessoas, a qualquer região, porque compartilhado por todos.
Nesse sentido, serve de exemplo, o direito à liberdade, direito à vida ou direito à dignidade da pessoa humana. Ou
seja, o direito que tem o potencial de ser compartilhado por qualquer ser humano, o direito inerente à condição
humana, nos moldes daquilo que sustentava Hugo Grotius (iure gentium).
Por sua vez, o direito positivo é o direito regional ou particular, o direito aplicado a uma determinada localidade. O
Direito Positivo pretende ser um direito específico, singular, peculiar, identificado com uma determinada região.
Nesse sentido, serve de exemplo, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Na Holanda, o direito positivo o
admite e regula. Todavia, no Vaticano, ele é inadmissível.
Essas variações entre um ordenamento jurídico e outro permitem identificar um aspecto que caracteriza o jusposi-
tivismo: a especificidade. Sendo assim, o Direito Positivo é o direito que pretende se adaptar às peculiaridades de
cada região e cultura.

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1.3. CONFORME A TEMPORALIDADE (OU HISTORICIDADE)

No que toca à temporalidade (historicidade), o jusnaturalismo é o direito que pretende ser imutável, a-histórico, ou
seja, o direito que está fora da história. O direito natural seria, portanto, o direito perfeito, completo, o que não
precisa ser atualizado, melhorado, corrigido, adaptado.
O direito que não carece de mais nenhum tipo de desenvolvimento ou aprimoramento. E, neste sentido, ele tende
a se tornar perpétuo, ou aspira ser eterno ou, pelo menos, resistente à modificação.
O juspositivismo, do ponto de vista histórico, revela-se como o direito mutável, em constante metamorfose, em
constante evolução, dinâmico por vocação, o direito que acompanha às transformações sociais, o direito inacaba-
do, sujeito à atualização.
Direito Positivo é o direito sujeito à adaptação, o direito manipulável segundo as necessidades sociais, o direito
em constante (des)envolvimento. Ele muda à medida que o contexto social é alterado. Em suma, é o direito de
uma época, de um Estado, de um contexto histórico.

1.4. QUANTO À FONTE

No que toca à fonte, ou gênese, o direito natural se origina da natureza. Cuidado, no entanto, com a polissemia da
expressão natureza. Esta palavra pode assumir muitos e diferentes significados. E este significado, inclusive, irá
variar conforme a espécie de jusnaturalismo que se faça alusão.
Por exemplo, se a referência é ao jusnaturalismo medieval, a palavra natureza assumirá o significado de natureza
divina, aquilo que é oriundo de Deus. Porém, se o emprego do termo é feito no contexto do jusnaturalismo moder-
no, nos moldes da lição de Samuel Pufendorf, natureza terá o sentido de natureza racional.
Portanto, é preciso ter cautela com o emprego e a interpretação do vocábulo natureza.
O certo é que a ideia de natureza traz consigo a noção de algo que antecede à existência humana, algo diante do
qual o homem se prostra com humildade, contempla e aceita.
Em última instância, natureza é aquilo que não pode ser manipulado (interpelado) pelo homem. Se for assim, for-
çoso é concluir que direito natural é o direito que não força a natureza.
Por outro lado, a fonte do juspositivismo é a vontade. Isto é, o arbítrio (escolha) de criar um novo direito, de alterar
um direito existente ou, ainda, de revogá-lo.
Essa dinâmica, própria do ordenamento jurídico, de criação de normas jurídicas, de alteração das normas existen-
tes, revela que a fonte do juspositivismo é a vontade: do legislador constituinte ou do legislador infraconstitucional.
Não é a razão. A razão, através de seus engenhos (sistema, método, linguagem específica etc.),
viabiliza a construção do ordenamento jurídico, mas não é ela que determina o seu aparecimento. FERRAZ JR.,
Tercio Sampaio. A Ciência do Direito. 2ª edição. São Paulo: 1980, p. 24.
Contribuições mais importantes do Jusnaturalismo Moderno: a) o método sistemático conforme o rigor lógico da
dedução; b) o sentido crítico-avaliativo do direito posto em nome de padrões éticos contidos nos princípios reco-
nhecidos pela razão.
Sobre a dinâmica jurídica, Kelsen a subdivide em duas frentes, a saber: a) a norma fundamental e b) a estrutura
escalonada da ordem jurídica. Consulte-se KELSEN, 1999, p. 215-308.

1.5. SEGUNDO A FORMA DE CONHECIMENTO

Toma-se conhecimento da existência de um direito natural, dentre outras maneiras (embora esta seja a mais fre-
quente), por meio da razão. A razão, no que toca ao jusnaturalismo, não é utilizada como mecanismo de criação
de direitos, mas, sim, como uma ferramenta para que se tenha acesso aos direitos naturais: tomar conhecimento
de que eles existem.
É nesse sentido, por exemplo, que, dentro dos quadrantes do jusnaturalimo moderno, o homem não é compreen-
dido como um “filho de Deus”, ou como um cidadão do “mundo histórico, mas, sim, como um ser natural, um ele-
mento de um mundo concebível segundo leis naturais”.
Suponha a existência de duas diferentes dimensões. A dimensão dos mortais, daqueles que vivem na escuridão
da caverna, e a dimensão dos semideuses, a que representa um mundo de luz. Nesta segunda dimensão estão
os direitos naturais, aplicáveis a todos aqueles que estão na primeira dimensão.
Mas a circunstância dos direitos naturais se encontrarem em uma dimensão e serem aplicáveis à outra provoca,
de imediato, a seguinte pergunta: como o homem pode tomar conhecimento da existência dos direitos naturais, de
sorte a não ofender a natureza (divina, cosmológica, humana etc.)? E a resposta é: graças à razão.
Por isso, é que “as prescrições do direito natural pressupõem, segundo Samuel Pufendorf, a natureza decaída do
homem”.
A propósito, note que, segundo Pufendorf, o fundamento do direito natural moderno é a necessidade do homem
de viver em sociedade (socialitas), não sendo ela, a necessidade, em si, um direito natural.

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Exemplo: o direito natural é o direito à vida, mas o seu fundamento é a necessidade do homem de viver em socie-
dade. Fora da sociedade, o homem é frágil, não resiste às intempéries dos fenômenos naturais. Em sociedade, o
homem adquire resistência.
Enfim, só se tem acesso à informação de quais são os direitos naturais através da razão. Não é ela, a razão, um
mecanismo de construção desses direitos, mas um veículo de acesso, para que se descubra a existência deles.
Enquanto no direito natural, toma-se conhecimento do direito por meio da razão, no direito positivado, a forma por
meio da qual se toma conhecimento da existência dele é a publicação do texto de lei no Diário Oficial da União, do
Estado ou do Município. Por isso, é que, desde o antigo império romano, a publicação sempre foi uma caracterís-
tica fundamental da norma jurídica.
Para que o direito posto possa valer, é preciso que ele seja previamente publicado. Como é cediço, ninguém se
escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece (LINDB, art.3º).
Sobre a impossibilidade de alegação do desconhecimento da norma, consulte-se a lição de Tercio Sampaio Fer-
raz Jr. sobre a validade como uma relação de imunização.

1.6. CONSOANTE O PRINCÍPIO QUE ORIENTA

O princípio que orienta um sistema de direito natural é, em regra, o da Justiça. No Direito Natural, o que se almeja,
no sentido de direito natural, perfeito, imutável e universal, é o direito justo. Logo, nesse contexto, todo direito é
um ensaio de direito justo.
Por conseguinte, o compromisso com do jusnaturalismo é com o princípio da justiça.
Todavia, o princípio que guia, em regra, a confecção do direito positivado é o de Utilidade. No direito positivo, cri-
am-se normas, revogam-se outras, tudo de acordo com o que seja mais útil ou conveniente. Por isso, o compro-
misso do juspositivismo é com a utilidade a que se presta.

2. DIREITO POSITIVO E NATURAL: UMA DICOTOMIA ENFRAQUECIDA

No universo da ciência jurídica atual, a dicotomia, direito positivo e natural, é uma dicotomia operacionalmente
enfraquecida. Se, no século XVIII, “pressupunha-se uma espécie de duplicação do sistema jurídico:
por de trás ou por cima das relações jurídicas estabelecidas por normas postas, admitia-se o conjunto de direitos
naturais”. E, essa duplicação viabilizou uma forma de distinguir o direito natural da moral (autonomia x heterono-
mia; Pufendorf, Kant e Thomasius) e, ao mesmo tempo, conferiu ao direito natural uma posição de superioridade
diante do direito positivo.
Este cenário não durou muito tempo, perdurando apenas até as primeiras décadas do século XIX.
O século XIX foi o século do positivismo filosófico de Auguste Comte, do cientificismo, do evolucionismo, do en-
cantamento pelas ciências naturais. Logo, foi o século em que quase desapareceu tanto a noção de direito natural
como a própria filosofia do direito. Em suma, no século XIX, não há dicotomia entre direito natural e positivo, mas
um só direito, o positivado.
No início do século XX, a dicotomia reaparece, pois a noção de direito natural volta a ganhar força (Giorgio Del
Vecchio, Rudolf Stamller). Todavia, apesar de até hoje a ciência dogmática do direito dispensar certa atenção ao
conceito de direito natural, “a dicotomia, como instrumento operacional, isto é, como técnica para descrição e
classificação de situações jurídicas normativamente decidíveis,
perdeu força”. E, uma das razões do enfraquecimento operacional da dicotomia reside na promulgação constituci-
onal dos direitos fundamentais. A Constituição positivou, por meio dos direitos fundamentais, muitos dos antigos
direitos naturais. E, o pior, a inflação de direitos fundamentais acarretou, progressivamente, a sua banalização.
Disto decorre um profundo paradoxo. De um lado, é cada vez mais importante a definição e a garantia dos cha-
mados “direitos humanos”. De outro, é cada vez mais acentuada a fragmentação da imagem do homem na plura-
lidade dos universos culturais.
Ou seja, quanto maior é o número de direitos naturais declarados, transformados em direitos fundamentais pelas
Constituições, maior é a relatividade e a perda de valor desses direitos.

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A teoria do “mínimo ético”, “já foi exposta de certa maneira pelo filósofo inglês Jeremy Bentham e depois desen-
volvida por vários autores, entre os quais um grande jurista e politicólogo alemão do fim do século XIX e do princí-
pio do século XX, Georg Jellinek”.
A teoria do mínimo ético sustenta que o Direito constitui apenas em um mínimo de Moral ao qual se atribui força
obrigatória com o objetivo de que a sociedade possa sobreviver. A Moral, em regra, é obedecida de forma espon-
tânea. Porém, mais cedo ou mais tarde, acaba ocorrendo algum ato de desobediência. É aí, então, que surge o
Direito, com a finalidade de impedir, com mais vigor, a violação às normas que uma dada sociedade considera
indispensável à convivência social.
Deste modo, segundo esta teoria, o Direito não é, na sua essência, diferente da Moral, antes é uma parte desta,
armada de garantias específicas. Logo, “tudo o que é jurídico é moral, mas nem tudo o que é moral é jurídico”.
Veja abaixo a ilustração da teoria.

Mas será que a lição desta teoria é ainda hoje aceitável? Será que tudo é jurídico é moral? Será? Será que a re-
gra do Código de Trânsito, que determina que a faixa da direita seja a faixa da baixa velocidade, é uma regra mo-
ral? Será que o artigo do Código de Processo Penal, que estabelece o prazo de 15 dias para o oferecimento da
denúncia, é uma norma moral? E mais, será que a modificação deste artigo do Código de Processo Penal pelo
legislador tem a capacidade de influenciar no campo da moral? A resposta a todas essas indagações só pode ser
negativa. E, por quê? Porque nem tudo que se passa no mundo jurídico é ditado por motivos de ordem moral.

Para melhor entender essa afirmação cabe aqui uma nova pergunta: qual a diferença entre o moral, o imoral e
amoral? Imoral é aquilo que é contrário à moral. Amoral é aquilo é indiferente à moral. Moral é aquilo que está de
acordo com a Moral. Sendo assim, é possível afirmar que “fora da Moral existe o ‘imoral’, mas existe também o
que é apenas ‘amoral’”. E, por consequência, dentro do Direito podem existir tanto normas morais, imorais como
amorais.
“Há, portanto, um campo da Moral que não se confunde com o campo jurídico. O Direito, infelizmente, tutela muita
coisa que não é moral”. O certo é que muitas “relações amorais ou imorais realizam-se à sombra da lei, crescendo
e se desenvolvendo sem meios de obstá-las”. Logo, é inegável que há um campo do Direito “que, se não é imoral,
é pelo menos amoral o que induz a representar o Direito e a Moral como dois círculos secantes”.

As ilustrações têm benefícios e prejuízos. Entre os prejuízos está o de se simplificar excessivamente os proble-
mas, correndo-se o risco de tomar a parte pelo todo. Contudo, no começo dos estudos, as representações gráfi-
cas servem como pontos de referência para posteriores investigações.

2. SIMILARIDADES ENTRE AS NORMAS MORAIS E JURÍDICAS.

Há certa similaridade entre normas jurídicas e regras morais. “Ambos têm caráter prescritivo, vinculam e estabele-
cem obrigações numa forma objetiva, isto é, independentemente do consentimento subjetivo individual”. As duas

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normas são preceitos inarredáveis à convivência social, vez que, se é certo que não há sociedade sem direito (ubi
societas, ibi jus), não é menos certo que não há sociedade sem moral (ubi societas, ibi mos).

Se não há dúvida de que Tercio Sampaio Ferraz Jr assinala estas duas semelhanças entre as normas morais e
jurídicas, esta não parece ser a compreensão de Miguel Reale. Este último sustenta que as normas morais con-
tam com a adesão dos obrigados. “Quem pratica um ato, consciente da sua moralidade, já aderiu ao mandamento
a que obedece”. Porém, o mesmo não ocorre com as normas do mundo jurídico.
Apesar das similitudes, há entre as normas morais e jurídicas algumas diferenças. Todavia, a demarcação, em si,
desta fronteira, não é tarefa fácil. Antes, pelo contrário, há muito tempo, é um dos problemas mais tormentosos da
filosofia do direito. Exatamente por isso, ao longo da história, sucederam-se diversas tentativas em traçar essa
distinção. Convém, então, começar essa viagem pelo tempo a partir do critério de distinção mais famoso.

3. QUANTO AO OBJETO QUE É CONTROLADO

Diz-se que as normas jurídicas são heterônomas e as normas morais são autônomas. Este critério de distinção é
o mais famoso dentre todos os que já foram sugeridos. É o mais famoso tanto por força da autoridade intelectual
de seu mentor, Immanuel Kant, quanto por conta do longo período em que predominou, de meados do século
XVIII até meados do século XIX.

Segundo este critério, as normas jurídicas regulam à conduta externa do indivíduo, nada dizendo respeito às in-
tenções ou aos desejos, enquanto os dispositivos morais relacionam-se ao aspecto interno do comportamento. Ou
seja, normas jurídicas pretendem controlar comportamentos (normalmente, a partir da sua execução), normas
morais aspiram controlar pensamentos (cogitatio). Nas palavras de Antônio Luís Machado Neto, normas jurídicas
são as que regulam a conduta em interferência intersubjetiva (correlação entre o fazer de um e o impedir de outro
ou de outros sujeitos humanos). Normas morais são as que disciplinam a conduta em interferência subjetiva (a
correlação entre o fazer e o omitir do mesmo sujeito).

Não se nega que as normas jurídicas podem ser injustas e iníquas. Entretanto, enquanto não forem revogadas, ou
não caírem em manifesto desuso, elas obrigam. Elas se impõem contra a vontade dos súditos. Não é por outra
razão que o Estado, por meio da dogmática jurídica hermenêutica e empírica, se apressa em neutralizar os efeitos
de um possível “direito injusto”. Em outras palavras, empenha-se para manter sobre controle, através da interpre-
tação e aplicação da norma jurídica, as insatisfações dos indivíduos submetidos à norma jurídica.
Todavia, como assinala Tercio Sampaio Ferraz Jr., essa distinção é vaga e ambígua. Por um lado, negar que mo-
tivos e intenções são irrelevantes para o Direito, é incorrer em grave equívoco. Afinal, o que dizer da distinção
entre dolo e culpa feita pelo Direito Penal? Forçoso é reconhecer, para distinguir estes dois conceitos jurídico-
penais, que a intenção do agente assume grande relevância.

Por outro lado, insistir que as normas morais são indiferentes à exterioridade da conduta, é também incidir em
sério erro. As normas morais interessam-se pela “exterioridade da conduta, até mesmo quando a intenção é tida
como boa: de boas intenções, como diz o provérbio, o inferno está cheio”. Aliás, perante as normas morais, há
distinção entre escusa e justificação, vez que a boa intenção pode servir como escusa (mentir ao irmão sobre a
circunstância de que a morte de seu filho está próxima), mas não justifica a mentira como conduta moral.
“...Pufendorf ultrapassa a mera distinção entre Direito Natural e Teologia Moral segundo o critério de normas refe-
rentes ao sentido e à finalidade desta vida, em contraposição às referentes à outra vida, distinguindo as ações
humanas em internas e externas: o que permanece guardado no coração humano e não se manifesta exterior-
mente deve ser objeto apenas da Teologia Moral. A influência desta distinção em Tomasius e posteriormente em
Kant é significativa”.

4. QUANTO À INSTÂNCIA QUE IMPÕE A NORMA.

Um segundo critério de diferenciação é a instância que estabelece a norma, ou seja, o juízo que qualifica o com-
portamento. Em outros termos, quem impõe a norma. Como regra, afirma-se que a norma moral é imposta pela
própria subjetividade de quem age, ao passo que a norma jurídica se estabelece por força de uma instância obje-
tiva, um terceiro com autoridade para impor ela. Disto decorre que “a imoralidade do ato exige arrependimento do
agente, ou seja, o tribunal da moral é a própria consciência, enquanto no direito a pressão para o cumprimento da
ação lícita é objetiva e depende de instância externas ao agente”.

Registre-se, por oportuno, que, segundo a lição de Miguel Reale, o critério atinente à instância que estabelece a
norma não é um critério diverso do anterior (heteronomia versus autonomia), mas, sim, outro significado contido

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nele. Nesse sentido, então, normas jurídicas são normas heterônomas e, como tal, são postas por um terceiro
sobre o agente. Este terceiro pode ser o legislador, o juiz etc.
Logo, de acordo com Miguel Reale, normas heterônomas são aquelas que possuem, ao mesmo tempo, três ca-
racterísticas, são elas: a) não exigem a adesão espontânea do indivíduo a elas submetido, b) têm por objetivo
controlar comportamentos (e não intenções) e c) são impostas por um terceiro ao indivíduo a elas subordinado.
Por conseguinte, as normas jurídicas apresentam uma validade objetiva e transpessoal.

De outra banda, as normas morais são autônomas, pois a validade delas é subjetiva e pessoal. Em outros termos,
elas exigem a adesão espontânea de quem a elas se submete. Elas são impostas pelo indivíduo a si mesmo. E,
por isso, elas disciplinam as intenções do agente. Portanto, em certa medida, é possível afirmar que as normas
morais constituem a identidade do próprio indivíduo, pois à medida que ele as obedece tem a impressão de que
ele próprio estabeleceu as normas que irá cumprir.

O certo é que, mesmo que se afaste a divergência entre os respeitados juristas, o critério pertinente à instância
que estabelece a norma também apresenta alguns problemas. Afirmar que o tribunal da moral é a própria consci-
ência, não é, de todo, certo. Por mais que o remorso seja, como regra, a mais frequente das sanções morais, ele
não é a única. Afinal, o que dizer da reprovação social, muitas vezes até agressiva?

“Por outro lado, a instância subjetiva no julgamento dos atos não é indiferente ao direito, como o mostra a distin-
ção referida entre dolo e culpa ou a inaceitabilidade de que o estrito cumprimento da lei possa ser usado como um
meio para prejudicar alguém”. Em outras palavras, normas jurídicas não são impostas apenas por um terceiro ao
indivíduo. Podem também exigir, para fins de imposição, que o indivíduo manifeste a sua adesão a ela, que ele
obrigue a si mesmo. Não é o Estado que obriga o criminoso a praticar o delito na forma dolosa (de forma livre e
consciente), antes é ele que se auto-obriga a fazê-lo.

5. QUANTO À NECESSIDADE DE PUBLICAÇÃO.

Desde Roma, já se sabe que normas jurídicas passam a existir por deliberação e promulgação (ou a partir da
publicação). As normas morais, por seu turno, não apresentam esta característica. A expressão “esta lei entra em
vigor na data da sua publicação” não tem a menor aplicabilidade às normas morais. “Não obstante isso, é preciso
reconhecer que, no caso das normas costumeiras, estamos diante de normas jurídicas para as quais não há tam-
bém deliberação e promulgação”. Logo, este critério, também, apresenta alguns problemas.

6. QUANTO À COERCIBILIDADE.

Normas morais são incoercíveis. Normas jurídicas são coercíveis. Coercível não é o mesmo que coação. Coercí-
vel é a potencialidade de que uma coação seja aplicada. É dizer, a possibilidade abstrata, ainda não concretizada,
de que uma coação seja aplicada. Logo, normas jurídicas são normas trazem, em si, a ameaça de uma coação.
Segundo Kelsen, normas jurídicas não são coercíveis, são coativas. Ou seja, implicam na efetiva aplicação de
uma coação. A esse respeito, veja a distinção que o professor austríaco traça entre a comunidade jurídica e um
“bando de salteadores”.

7. QUANTO À BILATERALIDADE ATRIBUTIVA.

Normas jurídicas são bilaterais e atributivas. Bilaterais, porque estabelecem uma relação entre duas ou mais pes-
soas (bilateralidade social), uma relação que não pode ser modificada por nenhuma delas de forma unilateral (bi-
lateralidade axiológica). Atributivas, porque proporcionam uma “atribuição garantida de uma pretensão ou ação,
que pode se limitar aos sujeitos da relação ou estender-se a terceiros (atributividade)”. Exemplo: uma norma jurí-
dica permite a criação de uma relação de compra e venda, a qual não pode ser alterada unilateralmente por qual-
quer dos sujeitos e, ao mesmo tempo, cria para cada um deles a garantia de pode exigir a prestação esperada.
As normas morais, por seu turno, são bilaterais, mas não são atributivas. Criam entre os sujeitos uma relação
moral que não pode ser modificada unilateralmente, mas não confere a eles o poder de exigir uma pretensão ou
ação correspondente.

8. ASPECTOS APROVEITÁVEIS DE ALGUNS DOS CRITÉRIOS MENCIONADOS.

Apesar dos problemas assinalados no que toca ao primeiro critério, a distinção quanto ao objeto que é controlado
ainda apresenta alguma utilidade. Isto porque esta diferenciação realça um importante aspecto, qual seja, enquan-
to a norma jurídica “admite a separação entre a ação motivada e o motivo da ação, o preceito moral sempre os
considera solidariamente. Isto é, o direito pode punir o ato independentemente dos motivos – por exemplo, no

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caso de responsabilidade objetiva – mas isto não ocorre com a moral, para a qual a motivação e a ação motivada
são inseparáveis”.

O mesmo se diga quanto ao critério pertinente à instância, uma vez que as sanções morais, seja o remorso seja a
reprovação social, nunca fazem parte do conteúdo explícito da norma moral. Por outro lado, as normas jurídicas
são caracterizadas, como ensina Kelsen, por prescreverem de forma expressa as suas sanções. Mas não é ape-
nas esse aspecto que se pode aproveitar do critério. Enquanto o “direito admite as normas permissivas de conte-
údo próprio, a permissão moral é sempre a contrario sensu, ou seja, permitido é o que não é moralmente proibido
ou obrigatório. O direito e só o direito permite expressamente”.

Esta última nuance tem um desdobramento deveras relevante. O sistema composto por normas jurídicas podem
ser autossuficientes, pois contém normas destinadas apenas ao reconhecimento, à mudança e à aplicação do
próprio direito. “A moral não tem normas secundárias, salvo se a jurisdicizamos”.
Não se quer assinalar com isso que os demais critérios apresentados não apresentem aspectos aproveitáveis.
Cada critério, na sua medida, contribui para melhor definição da fronteira entre Moral e Direito. Apesar disso, o
certo é que não há critério infalível. O que, por sua vez, reforça a tese de que não é possível sustentar, na atuali-
dade, uma separação total entre os campos da Moral e do Direito. Sendo certo que a Moral não constitui o Direito,
não é menos certo que a Moral regula o Direito. Em suma, a “imoralidade faz com que a obrigação jurídica perca
sentido, mas não torna a obrigação jurídica juridicamente inválida. A distinção é sútil, mas importante”.

9. CARACTERÍSTICAS DAS NORMAS CONSUETUDINÁRIAS.

Segundo Miguel Reale, normas consuetudinárias não são coercíveis, não apresentam atributividade, mas são
heterônomas e bilaterais. Logo, o que distingue a norma de costume da norma jurídica é a coercibilidade e atribu-
tividade que esta última apresenta, e aquela não. Por outro lado, o que distingue as normas consuetudinárias das
normas morais é a circunstância de que aquelas são heterônomas, enquanto as normas morais não são. Eis, en-
tão, o que são os costumes, práticas sociais rotineiras (hábitos sociais) heterônomas.

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