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Anais Eletrônicos do 14º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia – 14º SNHCT

Traduções e Translações: Um exemplo de Sociologia da


Tradução para a História da Psicologia

Luiz Eduardo Prado da Fonseca1

Introdução

O presente trabalho visa utilizar o método da Sociologia da Tradução, proposto por


Callon, Latour e outros, para realizar uma breve análise de um momento específico da
História da Psicologia. Trata-se, num primeiro momento, da criação do Laboratório de
Psicologia dentro da Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro e, num segundo
momento, na conversão deste no que seria o primeiro Instituto de Psicologia do Brasil.
Pra a análise destas duas traduções, nos basearemos em dois modelos: (1) No artigo de
Callon sobre o estudo de moluscos em declínio populacional na baía de St. Brieuc e a
domesticação destes - e diversos outros atores - como forma de arregimentar aliados
humanos e não-humanos em busca de um objetivo comum; (2) Nas diversas
demonstrações de Translação que Latour propõe no terceiro capítulo do seu livro
Ciência em Ação. Para o recorte histórico do Laboratório e do posterior Instituto,
iremos nos basear no relato de Centofanti, com ocasionais consultas a outros textos que
versam sobre este período. Este estudo propõe uma análise que visa apenas ampliar as
reflexões sobre o momento escolhido para o recorte, tendo em vista a importância
histórica do Laboratório e do Instituto para a Psicologia brasileira, bem como para o
entendimento dos jogos de interesse e poder que perpassaram os personagens
envolvidos no caso, sem, de modo algum, fechar esta história a análises e propostas
posteriores.

1
Mestrando no Programa de Pós Graduação em História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia da
UFRJ.
Belo Horizonte, Campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
08 a 11 de outubro de 2014 | ISBN: 978-85-62707-62-9
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1 - Callon, moluscos, pescadores e sociologia do conhecimento

Callon (1986) propõe o estudo do caso dos moluscos em processo de desaparecimento e


os pescadores que os exploravam como forma de abrir discussões metodológicas sobre
as possibilidades de se realizar estudos desta natureza dentro da Sociologia do
Conhecimento. Seu artigo passa pelos temas de forma bastante didática, e se abre
propondo três grandes eixos para a discussão do fazer da Sociologia da Tradução
(Agnosticism, Generalized Simmetry e Free Association), que são, num sentido geral,
uma forma de eliminar pré-concepções e de seguir os atores de acordo com seus passos,
evitando uma narrativa assimétrica.

Callon, em seu artigo, define quatro grandes momentos para a tradução:


Problematization, Interessement, Enrolment e Mobilisation (CALLON, 1986). Os
quatro se referem, respectivamente, a como se tornar indispensável através do problema
levantado (no caso dos pescadores e moluscos, os pesquisadores eram a chave para a
resolução da baixa população); como “interessar” os atores (“interessar” como “estar
entre”, colocar cada um nos seus lugares na questão de modo que ajam); como alistá-los
(como fazê-los agir em seu nome e negociar com eles para que façam o que se espera);
e, por fim, como mobilizá-los.

Nos importa, principalmente, o esquema proposto pelo autor para analisar o


acontecimento, num sentido geral de que os diversos atores envolvidos precisam ser
interessados, e precisam ser interessados de tal forma que seus objetivos confluam num
dado momento para um único ponto em comum. Este ponto, que será chamado de
Obligatory Passage Point (OPP, Ponto de Passagem Obrigatória), é o que irá unir os
atores dentro desta história, e seus objetivos depois podem ser concluídos
separadamente, sejam eles quais forem. Callon inclusive chama nossa atenção para a
possibilidade de “betrayals”, traições por parte dos atores no curso dos acontecimentos,
que podem ser imprevistos e que demonstram que as traduções podem falhar
(CALLON, 1986).

Por fim, Callon segue aliando as descrições dos acontecimentos e, ao mesmo tempo,
propondo discussões dentro da Sociologia da Tradução, culminando num arranjo onde
os três biólogos marinhos arregimentam os moluscos, os pescadores e a comunidade
científica através de um instrumento que se transformou na promessa de recuperação da
população dos moluscos (que atenderia o próprio interesse destes em se reproduzirem

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com segurança, o dos pescadores de aumentarem sua produção e da comunidade


científica em aumentar os conhecimentos sobre a espécie em questão, que era
desconhecida). O panorama destas associações pode ser observado na imagem a seguir:

(CALLON, 1986)

2 - O Laboratório como OPP: Reunindo os atores

2.1- De instrumentos, necessidades e desejos a um Laboratório

A história se passa na Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro, que, segundo


Centofanti (1982) foi fundada em 1911, com o intuito de imitar uma Colônia anterior,
existente na Ilha do Governador, direcionada para mulheres e de estrutura semelhante.
Porém, nossa história só se inicia quando Gustavo Riedel, diretor da Colônia, vislumbra
para ela um futuro promissor. Inspirado pelos movimentos higienistas de sua época,
busca colaboradores. Encontra em Guilherme Guinle e na fundação Graffrée-Guinle as
verbas necessárias para a compra de instrumentos e o local para a criação do
Laboratório (CAMPOS, 1953). As intenções de Riedel estão expressas na passagem
abaixo:

“É provável que Riedel tenha adquirido os aparelhos como parte dos planos de uma
idealização anterior, a do Serviço de Profilaxia Mental, na colônia, em 1922. Nessa
época, Riedel esteve viajando pelos Estados Unidos e voltou entusiasmado com o
movimento de Higiene Mental, que, em 1923, redundou na criação da Liga Brasileira de
Higiene Mental.” (CENTOFANTI, 1982, p. 182).

Porém, ainda há o contexto da própria Colônia. Aparte voos e almejos de Riedel, já


havia na época uma consciência da necessidade de inserção da Psicologia como aliada
na atuação do que, na época, era chamada de profilaxia mental. E, em Penna (1992),
encontramos a justificativa de tal necessidade num trabalho de um dos empregados da
Colônia. O Dr. Oswaldo Guimarães, assistente do ambulatório, em seu trabalho “O
Laboratório de Psicologia”, alerta que

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“atualmente todo Instituto destinado ao estudo, cura e profilaxia das moléstias mentais
deve ter, como como auxiliar indispensável, um laboratório de Psicologia, a cargo de
um psicólogo profissional. Este torna-se, então, valioso colaborador do médico, para
eficiência da ação de tal Instituto.” (GUIMARÃES, apud PENNA, 1992, p. 31).

Temos, portanto, uma Colônia que estava de braços abertos para a atuação de um
psicólogo profissional, capaz de capitanear um Laboratório psicológico para auxílio nos
serviços. Temos, também, um diretor com ares higienistas, que vislumbra no
Laboratório uma forma de, no futuro, ingressar nos movimentos de Higiene Mental.
Ambas as partes apontam na mesma direção, mas ainda carece algo para que estes
movimentos realmente caminhem para o mesmo lugar. E é nesse momento que aparece
Waclaw Radecki.

Descrito por Centofanti como um “remanescente do período clássico dos System


Makers [criadores de sistemas, em referência aos clássicos sistemas de Psicologia],
estava ele, no Brasil de 1930, igualmente procurando um lugar ao sol” (CENTOFANTI,
1982, p. 188), Radecki imigrou da Polônia para o Brasil. Erudito, tendo conhecido
grandes nomes da Psicologia mundial, ao chegar ao Brasil procurou estabelecer-se, mas
não encontrou ambiente acadêmico para seus desejos grandiosos de fundar ele mesmo
um sistema.

Passou por Curitiba, onde lecionou brevemente na Universidade de Ciências do Paraná,


e deu cursos em São Paulo (CENTOFANTI, 1982, p.181-182), mas nenhuma dessas
atividades lhe satisfez o apetite de se desenvolver, tampouco lhe ofereceu as condições
para tal. Porém, numa visita ao Rio de Janeiro, entrou em contato com Manuel de
Bonfim, autor de um livro intitulado “Noções de Psychologia” e que Radecki havia
estudado, e a partir de Manuel encontrou a Colônia do Engenho de Dentro. Uma vez
entrado em contato, foi contratado como chefe de análises clínicas da Colônia
(CENTOFANTI, 1982, p. 183).

Campos (1953) aponta que apenas a circunstância de estar no Brasil favoreceu Radecki
para tomar as rédeas do ainda não formado Laboratório da Colônia, que, onde havíamos
parado a história, estava com instrumentos angariados por um aspirante a higienista e
com um ambiente favorável a uma colaboração conjunta dos psiquiatras com um ainda
ausente psicólogo profissional. Porém, Centofanti nos indica mais detalhes desta
história:

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“O que deve realmente ter determinado novos fins para a aparelhagem e favorecido a
indicação de Radecki foi seu notável currículo. É importante lembrar que, em Genebra
[centro de formação de Radecki], diferente de muitos centros europeus, a Psicologia
figurava entre os cursos de licenciatura em ciências naturais e não dentre os de
Filosofia. Isto o deixava adequadamente habilitado para desenvolver seu futuro trabalho
no Laboratório, dentro do espírito da Psicologia Experimental da época.”
(CENTOFANTI, 1982, p. 183).

Radecki, agora chefe de análises clínicas da Colônia, pode realizar o sonho de Riedel de
um Laboratório de Psicologia. Nos instrumentos financiados por Guinle a pedido de
Riedel servirão para o polonês levar adiante seus sonhos de estabelecer um sistema
psicológico. A Colônia ganha o luxuoso auxílio de uma Psicometria moderna
comandada por um profissional competente. E o Laboratório transformou-se na
confluência destes atores.

2.2 – O Porta-Voz e o Ponto de Passagem Obrigatória

Existiam demandas a serem cumpridas. Riedel queria um movimento de higiene mental


brasileiro. A Colônia carecia de um especialista em Psicologia. Radecki precisava de
um ambiente para desenvolver seus estudos. E, no meio de todas estas demandas,
estavam os outros atores da história: instrumentos caros e modernos, salas do
Dispensário nº 2 da Colônia, Guinle a fundação Graffrée-Guinle, os psicopatas do
Engenho de Dentro...

De modo a unir todos estes num só ponto, emerge o que Callon define como Ponto de
Passagem Obrigatória (Obligatory Passage Point): aquilo que fará com que os atores
confluam suas demandas num único ponto para que todos alcancem seus objetivos. Nas
palavras de Callon, sobre os pesquisadores dos moluscos de St. Brieuc: “They
determined a set of actors and defined their identities in such a way as to establish
themselves as an obligatory passage point in the network of relationships they were
building.” (CALLON, 1986).

Em nosso caso, o ponto de passagem obrigatório definiu-se como sendo o Laboratório.


Riedel, com os aparelhos funcionando, teria seu vindouro movimento higienista
amparado na Psicologia Experimental de um profissional gabaritado; a Colônia ganhara
um chefe de análises clínicas que de fato contribuiu para o tratamento dos internos com
a Psicometria (Penna (1992, p. 33) aponta que de fato ocorreram medições
psicométricas com os aparelhos); Radecki ganha o ambiente e os aparatos necessários
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para se desenvolver intelectualmente. Estava estabelecido o desenho da análise em


questão.

Mais do que apenas o OPP que o Laboratório se tornou, temos a Tradução realizada
pelos atores. Radecki tornou-se indispensável com seu currículo, exatamente o que
buscava Riedel e a Colônia (Problematization). Todos estavam devidamente
interessados (na acepção de Callon do termo), de modo que o Laboratório os fez atingir
seus objetivos através desse interessamento. Todos foram alistados e seguiram seus
papeis da maneira esperada (dentro do que eles mesmos esperavam de seus papeis, vale
assinalar). E, por fim, Radecki tomou o lugar de Porta-Voz, como liderando o
Laboratório: Centofanti (1982, p. 184-185), nos revela que Radecki e sua esposa
passaram a residir na Colônia, bem como a serem, respectivamente, chefe de laboratório
e primeira assistente.

3 – Translações: Latour e as estratégias

Em seu livro Ciência em Ação, Bruno Latour empreende uma análise da Ciência a partir
de suas práticas e das práticas dos próprios cientistas. A partir de diversas análises
diferentes, o livro se propõe como um grande compêndio de esquemas e descrições que
visam gerar regras e métodos para se seguir a Ciência em seu curso de ação, e não
apenas uma Ciência estática e acabada.

No terceiro capítulo, Latour inicia uma narrativa de como um empreendimento,


ambicioso, pode se tornar complexo quando é preciso angariar aliados e remanejar
interesses de formas diversas a ponto de chegar-se onde se pretende chegar. Para tal,
parte da história de Diesel, que tentou desenvolver um motor a partir dos princípios
termodinâmicos de Carnot e, num dado ponto, viu-se obrigado a enfrentar a necessidade
de múltiplas negociações (LATOUR, 1998). Segue uma passagem que explica esta fase:

“Se Diesel for a única pessoa que acredita em seu motor perfeito, o motor ficará para
sempre numa gaveta de escritório, em Augsburg. Para propagarem-se no espaço e
tornarem-se duradouros eles todos precisam (todos nós precisamos) das ações dos
outros. Mas como serão essas ações? Muitas, na maioria das vezes imprevisíveis, que
transformarão o objeto ou a afirmação transportada. Portanto, estamos diante de uma
incerteza: ou os outros não tomam a afirmação em suas mãos ou a tomam. Se não
tomarem, a afirmação ficará presa num ponto do tempo e do espaço: eu, meus sonhos,
minhas fantasias... Mas se a tomarem nas mãos, poderão transformá-la tanto que ficará
irreconhecível. Para sair dessa incerteza, precisamos fazer duas coisas ao mesmo tempo:

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(1) alistar outras pessoas para que elas participem da construção do fato; (2) controlar
o comportamento delas para tornar previsíveis as ações.” (LATOUR, 1998, p. 177-178).

Após esta exposição, Latour define cinco formas de transladar os interesses através das
pessoas: “Eu quero o que você quer”, ligação direta entre interesses (p. 178); “Eu quero;
por que você não quer?” Uma forma de mudar o interesse alheio de forma que conflua
com o seu (p. 183); “Se você desviasse um pouquinho...”, uma negociação direta que
visa aproximar os interesses num denominador comum que se torne atalho para os
interesses (p. 183); “Remanejando interesses e objetivos”, uma série de táticas menores
para manejar os interesses alheios a seu favor (p. 187); e, por fim, “Tornar-se
indispensável”, ser o único caminho para a obtenção do resultado buscado (p. 197).
(LATOUR, 1998).

Aparte o estilo peculiar dos títulos, a ideia é bastante simples, e se resume nas
negociações que se é preciso fazer para que os possíveis interessados comprem a sua
ideia. Muda-se o foco da ideia em si, como auto-suficiente para convencer, e trabalha-se
a ideia numa rede de associações, interessando (no sentido de Callon, que Latour
reconhece) os interessados

4 - De Laboratório a Instituto: Translações de um polonês

4.1 – Angariando aliados e suas estratégias

Tendo sido fundado por Radecki o Laboratório, iniciou-se uma segunda etapa de seus
esforços. Agora, como bem indicou Centofanti, tendo o polonês conseguido seu espaço,
iniciou uma busca por alianças. Já tínhamos indícios de que os planos de Radecki eram
maiores do que apenas chefiar o Laboratório idealizado por Riedel, e, novamente,
Centofanti nos fornece valiosa descrição do mestre polonês:

“Entretanto, desde o início Radecki tinha grandes planos para o laboratório e


estabeleceu finalidades muito ambiciosas. Ele deveria servir como: instituição auxiliar
médica, auxiliar das necessidades sociais e práticas, núcleo científico e centro didático
para formar os técnicos brasileiros. É fácil perceber que a extensão das atividades a que
o laboratório se propunha não era empreitada a ser realizada por apenas duas pessoas.
Com tal objetivo, pareceu-lhe mais importante iniciar seu trabalho divulgando a
existência do Laboratório e suas propostas, bem como a própria Psicologia, que,
naquela época, era pouco conhecida e acreditada entre nós.” (CENTOFANTI, 1982, p.
185).

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Para tal, Radecki iniciou seus trabalhos. A princípio, começou uma vultuosa produção
científica no laboratório, primeiro sozinho e aos poucos com colaboradores. Penna
(1992), em um laborioso texto, nos demonstra a incrível produção do Laboratório,
grande para a época, com cerca de 30 trabalhos e relatos de pesquisas, atuações clínicas,
resumos de cursos e afins. Sobre os cursos, muitos foram ministrados em diversos
lugares, e é desses que virão os novos aliados de Radecki.

Centofanti (1982. P. 186 – 187) conta dos muitos cursos ministrados por Radecki,
dentre eles no laboratório, Liga Brasileira de Higiene Mental, Escola de Enfermeiras
Alfredo Pinto e Faculdade Nacional de Medicina. O público envolvia médicos (muitos
da própria Colônia), enfermeiras e técnicos, bem como militares (este último grupo
assistindo palestras no próprio laboratório) interessados nos aspectos científicos da
seleção profissional de aviadores. Fora do Rio, também foram realizados cursos na
Faculdade de Direito de Curitiba e no Congresso de Higiene me Belo Horizonte.

Não à toa todos estes cursos foram ministrados. Listados por Centofanti e figurando nos
trabalhos listados por Penna, um grupo forte de colaboradores rodeou Radecki: Nilton
Campos, Antônio de Bulhões Pedreira, Oswaldo Guimarães e Flávio Dias (todos
médicos); Lucília Tavares (professora municipal indicada pela Secretaria de Educação);
Ubirajara da Rocha, Arauld Bretas e Alberto Moore (médicos militares do setor de
aviação do Exército da época), e por fim Euríalo Cannabrava (advogado), Edgard
Sanchez (filósofo e professor) e Jaime Grabois (ex-interno de uma clínica Psiquiátrica
na Bahia e que se transferiu para o Rio).

Colaboradores estes que compraram a ideia do Laboratório, cada qual com seus
motivos, e contribuíram fortemente para seu desenvolvimento. Diz Centofanti:

“Grabois nos diz que, ao chegar ao Laboratório, as atividades científicas se encontravam


diminuídas e que Radecki estava preocupado com a difusão de seu sistema. Não há
dúvidas de que Radecki se voltava para sua auto-promoção. Um tanto vaidoso e
narcisista, sonhava em se imortalizar na Psicologia, mas não se pode fazer disso um
agravo ao homem.” (CENTOFANTI, 1982, p. 188).

Começaria uma fase prévia de preparação para o que viria a seguir: a transformação do
Laboratório em Instituto de Psicologia. Como o intuito deste trabalho é apenas estudar
as negociações de Radecki, cabe adiantar o fim da história brevemente: o polonês
conseguiu êxito em seu plano de criar um Instituto de Psicologia. Porém, apenas sete

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meses depois, este foi fechado por diversas razões, e um Radecki derrotado mudou-se
para o Uruguai no intuito de continuar seu projeto (CENTOFANTI, 1982).

Voltando à cronologia, Radecki diminuiu as atividades científicas do laboratório por


bons motivos. Campos nos revela alguns deles:

“Crescendo em sua infatigável operosidade, o professor Waclaw Radecki, preocupado


com a necessidade de aperfeiçoamento e renovação, chefia um grupo de médicos em
uma viagem de estudos à Europa, realizada no ano de 1927. “(CAMPOS, 1953).

Tal viagem, dada no ano de 1927, deu-se antes da chegada do último colaborador, Jaime
Grabois, que nos revelou acima atividades diminuídas. Não à toa pois, nesta fase,
Radecki focalizou as publicações do laboratório de modo a delinear seu obscuro projeto
de sistema. Nos conta Centofanti (1982, p. 188) uma preocupação com o sistema
psicológico revelada nos subtítulos dos trabalhos publicados, sempre em referência ao
Discriminacionismo afetivo, sistema psicológico desenvolvido pelo mestre polonês, e
brevemente resumido por Centofanti em outro trabalho, de 2003 (“O
discriminacionismo afetivo”, CENTOFANTI, 2003).

Deu-se, por fim, o plano de Radecki completado:

“E a agitação vivida pelo laborat´prio em 1931 surtiu bons resultados. A 19 de março de


1931, o Decreto-Lei n. 21.173 criou o Instituto de Psicologia. De acordo com o referido
decreto, o Instituto de Psicologia “provém da conversão do antigo laboratório da
Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro” e “fica sob dependência imediata da
Secretaria de Estado da Educação e Saúde Pública, enquanto não for instalada a
Faculdade de Educação, Ciências e Letras [...]” (CENTOFANTI, 1982, (p. 189 – 190).

Porém, o Instituto deu-se no âmbito da reforma universitária Francisco Campos, e neste


contexto viabilizou-se de forma peculiar. Segue Centofanti:

“Assim, o status de um Instituto, dentro de uma Faculdade de Educação, Ciências e


Letras, permeado por um espírito universitário, permitiria a Radecki a arquitetura de
planos mais ambiciosos e ainda mais arrojados do que os estabelecidos para o
laboratório. Percebendo isso, Radecki e seus colaboradores lançaram o instituto numa
tríplice finalidade: núcleo de pesquisas científicas de Psicologia Geral, Individual,
Coletiva e Aplicada, centro de aplicação e escola superior de Psicologia.”
(CENTOFANTI, 1982, p. 190).

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E foi, nesta tríplice finalidade, que nossa narrativa acaba, já adiantado o fim da história
parágrafos acima, mas terminada na vitoriosa criação do Instituto, foco de nossa
discussão a seguir.

4.2 – De Laboratório a Instituto: As múltiplas negociações

Vimos a batalha de Radecki, na primeira parte, se tornando o porta-voz dos interessados


por Riedel e a Colônia – e o próprio – em prol do Laboratório. Não só sendo o
laboratório o “Ponto de Passagem Obrigatória” de Callon, Radecki em si mesmo
personificou a quinta estratégia de Latour para a translação: tornar-se indispensável. E
foi a partir desta indispensabilidade que criou o instituto.

Todos os aliados agregados por ele foram transladados a partir das translações 1, 2 e 3:
Radecki criou objetivos iguais (com os muitos médicos, “Eu quero o que você quer”),
angariou aliados por convencimento (Lucília Tavares, ao interessar a Secretaria de
Educação a ponto de enviar uma professora, “Eu quero, por que você não quer?”) e
negociou objetivos em comum (com os médicos militares, que terminaram por
desenvolver trabalhos com a temática da seleção profissional de aviadores, “Se você
desviasse um pouquinho...”).

Seja na igualdade de interesses, no convencimento, na negociação de interesses ou


mesmo na indispensabilidade a qual Radecki se mostrou, fica evidente a característica
empreendedora do mestre polonês a qual Centofanti se referiu (1982). Mais apenas do
que empreendedorismo, Radecki revelou a capacidade para fazer ciência a partir de
associações, fortes e fracas, e nossa investigação nos levou exatamente a esta conclusão:
muito do empreendimento dele baseou-se em firmar boas bases e bons aliados em prol
de atingir seus objetivos, bastante científicos.

Conclusão

Concluímos, com o presente trabalho, que utilizar-se do método da Sociologia da


Tradução que Latour e Callon propõe em momentos diferentes foi de bastante utilidade.
Apesar da pouca bibliografia referente ao polonês Radecki, a análise aqui descrita
conseguiu propor uma interpretação deste breve momento da História da Psicologia de
forma estável e fundamentada. Nossa pretensão de não acrescer muito ao que aconteceu
além de uma nova forma de interpretar os dados e descrições históricas mantém-se,
ainda abertos a quaisquer novas contribuições. Fica a validade deste estudo em suas

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próprias descrições: seguindo os atores por onde eles forem, e falando do que eles
disserem, nada mais, nada menos. Esperamos que tenha, além da função histórica clara
de retomar fatos e acontecimentos pouco estudados neste campo, servir de exemplo da
utilização da Sociologia da Tradução, de modo a demonstrar que tal método pode ter
validade tanto para estudos científicos como para estudos da história das ciências,
sempre acrescentando boa interpretações a velhos problemas.

Referências Bibliográficas

CALLON, M. Some elements of a sociology of translations: domestication of the


scallops and the fishermen of St. Brieuc Bay. In: LAW, J. Power, action and belief: a
new sociology of knowledge? London, Routledge, 1986, p. 196 – 223.

CAMPOS, Nilton. Necrológio Waclaw Radecki (1887 - 1953). Boletim do Instituto de


Psicologia, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p.1-3, abr. 1953.

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CENTOFANTI, Rogério. Radecki e a Psicologia no Brasil. In: ANTUNES, Mitsuko


Aparecida Makino. História da Psicologia no Brasil: Primeiros Ensaios. Rio de
Janeiro: Eduerj, 1982. p. 177-208.

____. O discriminacionismo afetivo de Radecki. Memorandum, 5, 94 – 104.


Disponível em: http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/artigos05/centofanti01.htm

PENNA, Antônio Gomes. Sobre a produção científica do Laboratório de Psicopatas da


Colônia do Engenho de Dentro. In: PENNA, Antônio Gomes. História da Psicologia
no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Imago, 1992. p. 31-54.

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