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JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO
11ª Vara do Trabalho de Brasília - DF
ACP 0000247-02.2018.5.10.0016
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
RÉU: INSTITUTO HOSPITAL DE BASE DO DISTRITO FEDERAL -IHBDF
Processo : 0000247-02.2018.5.10.0016
SENTENÇA
I. RELATÓRIO
O réu utilizou-se do mandado de segurança como sucedâneo recursal (processo autuado sob o
nº 0000163-49.2018.5.10.0000), no qual o Desembargador Relator Dorival Borges de Souza Neto concedeu
parcialmente a liminar por meio da decisão acostada no id. d7036bf.
A decisão liminar deste órgão jurisdicional foi mantida, com ressalva à parcela destacada por
ordem do eminente Relator naquele processo acessório (0000163-49.2018.5.10.0000), nos moldes do id.
e9aa1b3.
Sem outras provas foi encerrada a instrução processual no tocante à tutela de urgência
antecedente e proferida a decisão de id. 6c333b7, por meio da qual foi acolhida a pretensão cautelar.
Após o julgamento da tutela cautelar antecedente, a classe processual foi alterada para Ação
Civil Pública (id. 98eb717).
O autor formulou o pedido principal nestes mesmos autos, id. c155e52. Atribuiu à causa o
valor de R$ 500.000,00.
É o relatório.
II. FUNDAMENTOS
No mesmo diapasão, o artigo 99, § 3º, do CPC dispõe sobre a presunção exclusivamente em
favor da pessoa natural na alegação de insuficiência econômica em requerimento de gratuidade de justiça, de
acordo com o artigo 5º, LXXIV, da CRFB.
Assim, mesmo após o advento do CPC introduzido pela Lei nº 13.105/2015 manteve-se
inalterada essa compreensão do ordenamento jurídico, consoante enunciado do item II da Súmula nº
463/TST.
No caso concreto, contudo, o réu afirmou, mas não demonstrou a ausência de condições
financeiras de suportar os custos da ação judicial. Totalmente inadequada a afirmação de notoriedade de
insuficiência de recursos por parte do instituto.
Rejeito.
De todo modo, o valor atribuído à causa na petição da ação principal encontra-se compatível
com os pedidos formulados, notadamente se considerado o pleito de indenização por dano moral coletivo.
Rejeito.
Em contestação, o réu asseverou ser pessoa jurídica de direito privado, regularmente instituído
pelo Decreto nº 38.332/2017, após autorização da Lei Distrital nº 5.899/2017, e em consonância com a Lei nº
9.637/1998, estando, em suma, desobrigado da realização de concurso público para a contratação de pessoal.
Sustenta que a seleção realizada obedeceu seu regulamento. Alega a disponibilização de vagas para pessoas
com deficiência, tanto que 93 candidatos nessas condições inscreveram-se na seleção. Afirma que a
procedência do pedido inicial acarretará prejuízos aos serviços de saúde e aos profissionais admitidos, assim
como supõe que a contratação como ocorreu foi causa de resultados positivos.
À análise.
Conforme relatado, este processo teve início com pedido de tutela cautelar antecedentes, no
qual, desde o momento liminar, assim, a partir de cognição apenas sumária, tomou-se decisão destinada à
vigência provisória, pois, após o aprofundamento das discussões jurídicas e maior dilação probatória, o
processo terá, naturalmente, sentença vocacionada ao caráter definitivo. Naquela ocasião - sobretudo por
ausência de divulgação de edital, de inexistência de publicidade efetiva, de falta de disponibilização de vagas,
bem como por conta da previsão de contratação poucos dias depois do exíguo prazo para a inscrição -
prejudicou a ampla concorrência e a validade do processo seletivo controvertido em virtude de ofensa aos
princípios que orientam a Administração Pública desde o artigo 37, caput, da CRFB e aos valores erigidos
como fundamentais nas normas especificamente aplicáveis ao requerido (artigos 2º, III e IX, da Lei Distrital
nº 5.899/2017 e 3º da Resolução CA/IHBDF nº 3/2017). Eis o teor daquele primeiro ato judicial:
"Hoje em dia, tornou-se notória a corrupção sistêmica e endêmica que infestou as instituições
do nosso país, colocando-as em risco de ruína.
Nesse cenário, estamos diante de grave deterioração das entidades - o que não é
exclusividade de um Poder do Estado ou de um Ente da Federação, da Administração Pública
Centralizada ou Descentralizada - advinda de gestões incompatíveis com os compromissos
assumidos com a Constituição da República de 1988.
Por evidente, não se discute neste processo a precariedade específica e notória da saúde
pública no âmbito do Distrito Federal, tampouco as causas desse triste quadro, mas a
contextualização inicial demonstra a importância cada vez maior da defesa dos valores
essenciais à ordem constitucional, definidores do nosso Estado Democrático de Direito.
No caso concreto, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a presente ação cujo objeto é a
tutela cautelar antecedente, a fim de suspender o segundo processo seletivo promovido pelo
requerido, para a contratação de 66 (sessenta e seis) empregados com formações diversas (id.
97f9e9e).
A análise da prova documental sumariamente produzida revelou situação ainda mais drástica
nesta relação processual, pois, no segundo processo seletivo, sequer foi localizado um edital,
nem notícia da contratação de organizadora do certame, mas apenas a disponibilização de 66
vagas para diversas funções, igualmente sem reserva de postos para portadores de
deficiência, com divulgação da informação apenas nos sites e do período de inscrição de 08 a
www.diariooficialdf.com.br www.saude.df.gov.br 23.03.2018, com previsão de admissão
imediata, em 26.03.2018.
Cumpre ressaltar que esses mesmos valores são básicos à formação do requerido e às regras
para seleção de seus empregados, por força dos artigos 2º, III e IX, da Lei Distrital nº
5.899/2017 e 3º da Resolução CA/IHBDF nº 3/2017.
Então, com base nos documentos trazidos com a petição inicial da tutela de urgência, foi
possível verificar a ausência de divulgação mínima exigida para a publicidade do processo seletivo, conforme
imposto pelo caput do artigo 37 da CRFB e até mesmo pelas normas específicas aplicáveis ao réu: artigos 2º,
III e IX, da Lei Distrital nº 5.899/2017 e 3º da Resolução CA/IHBDF nº 3/2017; bem como a ausência de
disponibilização de vagas para pessoas com deficiência, contrariando a Política Nacional para a Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência instituída pela Lei nº 7.853/1989, regulamentada pelo Decreto nº
3.298/1999.
Após ser instado novamente, este Juízo manteve a decisão liminar, senão com relação à
parcela excluída por força da decisão do Exmo. Desembargador Relator Dorival Borges de Souza Neto em
mandado de segurança (processo autuado sob o nº 0000163-49.2018.5.10.0000). Neste segundo momento, a
par da convicção de que o processo seletivo inobservou as necessárias impessoalidade e objetividade, foram
enfrentadas as alegações do réu de risco aos serviços de saúde supostamente por causa da correção do
procedimento irregular verificado, nestes termos:
"O Instituto Hospital de Base apresentou contestação no id. 74cdc79 acompanhada de farta
documentação.
Cumpre ressaltar que a sociedade brasiliense como um todo lamenta a deficiência dos
serviços públicos prestados direta ou indiretamente pelo Distrito Federal, assim também em
relação ao Hospital de Base com o risco de colapso descrito por seu Diretor de Atenção à
Saúde conforme id. c93677a.
É notório o histórico das organizações sociais e seus contratos de gestão na área de saúde
pública do Distrito Federal, com os problemas enfrentados sendo amplamente divulgados
(artigo 374, I, do CPC), do que a questão trabalhista é apenas um dos reflexos.
Nesse contexto, embora seja louvável a intenção de correção do sistema e saúde pelos atuais
administradores públicos ou não, os órgãos de fiscalização não podem transigir com os
primados da ordem jurídica por conta de urgência provocada por incompetência ou desvio
daquelas autoridades e dirigentes.
Aliás, não se ignora a liminar deferida no mandado de segurança, cujo processo está autuado
sob o nº 0000163-49.2018.5.10.0000, nos seguintes termos:
'Por todo exposto, concedo parcialmente a liminar postulada para cassar a tutela
apenas em relação à suspensão ou à dispensa dos empregados contratados
anteriormente à data da concessão da tutela de urgência, mantidas as demais
determinações do Juízo de primeiro grau.' (destaques originais)
Então, logicamente, a ordem do eminente Relator deverá ser cumprida, assim como serão, por
hierarquia, as ulteriores advindas das instâncias superiores.
A propósito, ainda não foi recebida comunicação oficial de nenhum outro ato judicial em
ação diversa utilizada como sucedâneo recursal. De todo modo, eventual ordem dos tribunais
poderá, no máximo, sustar os efeitos do comando decisório proferido em caráter precário,
mas não impedirá a regular tramitação processual até a cognição exauriente e a natural
decisão definitiva do mérito." (destaques originais) (id. e9aa1b3)
A Lei das Organizações Sociais inovou o ordenamento jurídico para conferir a pessoas
jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, a possibilidade de qualificação pelo Poder Executivo para
celebração de contrato de gestão com objeto voltado a ensino, pesquisa científica, desenvolvimento
tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde. O diploma normativo,
exemplificativamente, também prevê a possibilidade de destinação de recursos orçamentários e bens público,
dispensada a licitação, em permissão de uso (artigo 12, caput e § 3º, da Lei nº 9.637/1998), de cessão de
servidores com ônus para a origem (artigo 14 da Lei nº 9.637/1998) e a dispensa de licitação para as
atividades contempladas no contrato de gestão (artigo 24, XXIV, da Lei nº 8.666/1993).
Com efeito, o direito social fundamental à saúde está previsto no artigo 6º da CRFB e, para sua
concretização, impôs-se ao Estado o dever de promovê-lo mediante políticas sociais e econômicas,
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Número do processo: ACP-0000247-02.2018.5.10.0016
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facultando a execução direta ou indireta, inclusive por terceiros da iniciativa privada, sem prejuízo da livre
iniciativa das instituições privadas, consoante inteligência dos artigos 196, 197 e 199 da CRFB. Nesta frente
de atuação, o artigo 14 da Lei nº 9.637/1998 dispõe:
" A organização social que absorver atividades de entidade federal extinta no âmbito da área
de saúde deverá considerar no contrato de gestão, quanto ao atendimento da comunidade, os
princípios do Sistema Único de Saúde, expressos no art. 198 da Constituição Federal e no art.
7o da Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990."
Diante do dever do Estado de adotar políticas públicas para promoção, proteção e recuperação
da saúde de todos (artigo 196 da CRFB) e do seu evidente descumprimento com a ineficiência do sistema
único próprio, com desolador cenário de sucateamento dos hospitais, filas para atendimento acarretando até
mesmo o não atendimento, quadro deficitário de servidores ainda assim sujeito a despreparo decorrente do
aparelhamento e desestímulo dos técnicos habilitados, tudo a prejudicar a qualidade e a promessa de
universalidade nessa delicada área de atuação estatal, com resultados fatais dessa exclusão social - o discurso
de modernização da gestão dos serviços hospitalares, com qualificação profissional, práticas
empreendedoras, progresso tecnológico, por meio da parceria com a iniciativa privada, organização social
com quem se pretende contrato de gestão, encontrou terreno fértil.
Ou seja, o legítimo anseio da sociedade serviu para justificar a atuação do terceiro setor para a
atender esse interesse público, sob a tese de que o particular é dotado de maior liberdade na aplicação dos
recursos se comparado à burocracia do setor público, favorecendo o alcance das metas estipuladas no
contrato de gestão, pois sujeito ao controle de resultados.
Todavia, não se olvida que as organizações sociais recebem recursos públicos, bens públicos e
servidores públicos, razão pela qual devem observar o núcleo essencial dos princípios da Administração
Pública, notadamente aqueles previstos no artigo 37, caput, da CRFB. No mesmo diapasão, embora o critério
formal determine que seus contratos trabalhistas sejam regidos pelo direito privado, essa realidade
compensada pela incidência de princípios do direito público, resulta no que a doutrina denomina de regime
jurídico híbrido. Por conseguinte, não se sujeitam à obrigatoriedade do concurso público, mas devem realizar
seleção pública através de procedimento objetivo e impessoal. Nesse sentido, pacificou-se o entendimento
jurisprudencial após o julgamento da ADI 1.923/DF pelo excelso Supremo Tribunal Federal, assim
ementado:
2. Os setores de saúde (CF, art. 199, caput), educação (CF, art. 209, caput), cultura (CF, art.
215), desporto e lazer (CF, art. 217), ciência e tecnologia (CF, art. 218) e meio ambiente (CF,
art. 225) configuram serviços públicos sociais, em relação aos quais a Constituição, ao
mencionar que "são deveres do Estado e da Sociedade" e que são "livres à iniciativa privada",
permite a atuação, por direito próprio, dos particulares, sem que para tanto seja necessária a
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delegação pelo poder público, de forma que não incide, in casu, o art. 175, caput, da
Constituição.
3. A atuação do poder público no domínio econômico e social pode ser viabilizada por
intervenção direta ou indireta, disponibilizando utilidades materiais aos beneficiários, no
primeiro caso, ou fazendo uso, no segundo caso, de seu instrumental jurídico para induzir que
os particulares executem atividades de interesses públicos através da regulação, com
coercitividade, ou através do fomento, pelo uso de incentivos e estímulos a comportamentos
voluntários.
5. O marco legal das Organizações Sociais inclina-se para a atividade de fomento público no
domínio dos serviços sociais, entendida tal atividade como a disciplina não coercitiva da
conduta dos particulares, cujo desempenho em atividades de interesse público é estimulado
por sanções premiais, em observância aos princípios da consensualidade e da participação na
Administração Pública.
6. A finalidade de fomento, in casu, é posta em prática pela cessão de recursos, bens e pessoal
da Administração Pública para as entidades privadas, após a celebração de contrato de
gestão, o que viabilizará o direcionamento, pelo Poder Público, da atuação do particular em
consonância com o interesse público, através da inserção de metas e de resultados a serem
alcançados, sem que isso configure qualquer forma de renúncia aos deveres constitucionais
de atuação.
8. Os arts. 18 a 22 da Lei nº 9.637/98 apenas concentram a decisão política, que poderia ser
validamente feita no futuro, de afastar a atuação de entidades públicas através da intervenção
direta para privilegiar a escolha pela busca dos mesmos fins através da indução e do fomento
de atores privados, razão pela qual a extinção das entidades mencionadas nos dispositivos
não afronta a Constituição, dada a irrelevância do fator tempo na opção pelo modelo de
fomento - se simultaneamente ou após a edição da Lei.
13. Diante, porém, de um cenário de escassez de bens, recursos e servidores públicos, no qual
o contrato de gestão firmado com uma entidade privada termina por excluir, por
consequência, a mesma pretensão veiculada pelos demais particulares em idêntica situação,
todos almejando a posição subjetiva de parceiro privado, impõe-se que o Poder Público
conduza a celebração do contrato de gestão por um procedimento público impessoal e
pautado por critérios objetivos, por força da incidência direta dos princípios constitucionais
da impessoalidade, da publicidade e da eficiência na Administração Pública (CF, art. 37,
caput).
14. As dispensas de licitação instituídas no art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93 e no art. 12, §3º,
da Lei nº 9.637/98 têm a finalidade que a doutrina contemporânea denomina de função
regulatória da licitação, através da qual a licitação passa a ser também vista como
mecanismo de indução de determinadas práticas sociais benéficas, fomentando a atuação de
organizações sociais que já ostentem, à época da contratação, o título de qualificação, e que
por isso sejam reconhecidamente colaboradoras do Poder Público no desempenho dos
deveres constitucionais no campo dos serviços sociais. O afastamento do certame licitatório
não exime, porém, o administrador público da observância dos princípios constitucionais, de
modo que a contratação direta deve observar critérios objetivos e impessoais, com
publicidade de forma a permitir o acesso a todos os interessados.
15. As organizações sociais, por integrarem o Terceiro Setor, não fazem parte do conceito
constitucional de Administração Pública, razão pela qual não se submetem, em suas
contratações com terceiros, ao dever de licitar, o que consistiria em quebra da lógica de
flexibilidade do setor privado, finalidade por detrás de todo o marco regulatório instituído
pela Lei. Por receberem recursos públicos, bens públicos e servidores públicos, porém, seu
regime jurídico tem de ser minimamente informado pela incidência do núcleo essencial dos
princípios da Administração Pública (CF, art. 37, caput), dentre os quais se destaca o
princípio da impessoalidade, de modo que suas contratações devem observar o disposto em
regulamento próprio (Lei nº 9.637/98, art. 4º, VIII), fixando regras objetivas e impessoais
para o dispêndio de recursos públicos.
16. Os empregados das Organizações Sociais não são servidores públicos, mas sim
empregados privados, por isso que sua remuneração não deve ter base em lei (CF, art. 37,
X), mas nos contratos de trabalho firmados consensualmente. Por identidade de razões,
também não se aplica às Organizações Sociais a exigência de concurso público (CF, art. 37,
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II), mas a seleção de pessoal, da mesma forma como a contratação de obras e serviços, deve
ser posta em prática através de um procedimento objetivo e impessoal.
17. Inexiste violação aos direitos dos servidores públicos cedidos às organizações sociais, na
medida em que preservado o paradigma com o cargo de origem, sendo desnecessária a
previsão em lei para que verbas de natureza privada sejam pagas pelas organizações sociais,
sob pena de afronta à própria lógica de eficiência e de flexibilidade que inspiraram a criação
do novo modelo.
18. O âmbito constitucionalmente definido para o controle a ser exercido pelo Tribunal de
Contas da União (CF, arts. 70, 71 e 74) e pelo Ministério Público (CF, arts. 127 e seguintes)
não é de qualquer forma restringido pelo art. 4º, caput, da Lei nº 9.637/98, porquanto dirigido
à estruturação interna da organização social, e pelo art. 10 do mesmo diploma, na medida em
que trata apenas do dever de representação dos responsáveis pela fiscalização, sem mitigar a
atuação de ofício dos órgãos constitucionais.
20. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido é julgado parcialmente procedente, para
conferir interpretação conforme à Constituição à Lei nº 9.637/98 e ao art. 24, XXIV, da Lei nº
8666/93, incluído pela Lei nº 9.648/98, para que: (i) o procedimento de qualificação seja
conduzido de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput
do art. 37 da CF, e de acordo com parâmetros fixados em abstrato segundo o que prega o art.
20 da Lei nº 9.637/98; (ii) a celebração do contrato de gestão seja conduzida de forma
pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF; (iii)
as hipóteses de dispensa de licitação para contratações (Lei nº 8.666/93, art. 24, XXIV) e
outorga de permissão de uso de bem público (Lei nº 9.637/98, art. 12, §3º) sejam conduzidas
de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da
CF; (iv) os contratos a serem celebrados pela Organização Social com terceiros, com
recursos públicos, sejam conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância
dos princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado
por cada entidade; (v) a seleção de pessoal pelas Organizações Sociais seja conduzida de
forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da
CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; e (vi) para afastar
qualquer interpretação que restrinja o controle, pelo Ministério Público e pelo TCU, da
aplicação de verbas públicas." (sem destaque no original) (STF, Pleno, ADI 1.923/DF,
Relator Ministro Luiz Fux, Publicação 17.12.2015)
Além disso, constam dos autos o contrato de gestão celebrado pelo Ente Público com o
requerido (id. b0f8bff), o Estatuto do Instituto Hospital de Base do Distrito Federal (id. 3c7e962) e a
Resolução CA/IHBDF Nº 3/2017 (id. 637b910), com o regulamento próprio do processo de seleção para
admissão de pessoal, enquanto documentos úteis à solução do presente litígio.
Aliás, esses valores também estão consagrados no artigo 2º, IX, da Lei Distrital nº 5.889/2017,
in verbis:
(...)
IX -o processo de seleção para admissão de pessoal do IHBDF deve ser conduzido de forma
pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios da publicidade, da
impessoalidade, da moralidade, da economicidade e da eficiência, nos termos do regulamento
próprio a ser editado pelo Conselho de Administração". (sem grifo no original)
"Art. 45. O processo de seleção para o pessoal efetivo do IHBDF será precedido de edital,
observadas as peculiaridades de cada categoria profissional.
(...)
Ademais, o processo seletivo controvertido nesta ação conseguiu ofender esses e outros
valores ainda mais evidentemente, para preencher as 66 vagas de Técnico de Manutenção em Equipamentos
Hospitalares; Engenheiro Clínico; Médico Regulador; Analista de Processos Operacionais; Assistente de
Faturamento; Enfermeiro Auditor; Médico Auditor; Analista de Gestão de Pessoas; Analista Administrativo;
Farmacêutico; Engenheiro Ambiental; Comprador Especializado; Analista de Contratos; Analista de
Compras; Administrador; a começar pela ausência da publicação de edital, contrariando o artigo 45 do
próprio Estatuto do IHBDF.
Do mesmo modo, a falta de edital ou de qualquer outro documento para balizar o processo
seletivo, a par de desrespeitar os postulados de publicidade, impessoalidade, moralidade e, em última análise,
eficiência, e afrontar diretamente o estatuto social do réu, também prejudicou a disponibilização de vagas
para portadores de deficiência, contrariando, assim, a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora
de Deficiência instituída pela Lei nº 7.853/1989, regulamentada pelo Decreto nº 3.298/1999.
É importante registrar que, depois da formulação do pedido principal pelo autor, o réu não
apresentou outros documentos com a contestação de id. dc1dae7, mantendo-se o conjunto probatório
insuficiente em favor das teses defensivas já repelidas, inclusive conforme certificado em decisão judicial
anterior.
Pelo exposto, declaro a nulidade absoluta do segundo processo seletivo realizado pelo réu e,
por consequência lógica, de todas as contratações de empregados decorrentes dessa seleção.
Cumpre ressaltar que, na contestação de id. dc1dae7, o réu não impugnou especificamente os
pedidos de obrigações de fazer e não fazer.
De todo modo, uma vez evidenciado o ilícito, é inadmissível sua perpetuação, bem como a
produção de efeitos pelo ato nulo.
c) abster-se de realizar processos seletivos futuros com base em metodologias de seleção que
tenham caráter subjetivo;
d) abster-se de realizar processos seletivos sem a publicação de edital público, com as diversas
etapas da seleção, banca examinadora, prazos, critérios objetivos e recursos cabíveis, com
publicação mínima no Diário Oficial do DF e no seu sítio eletrônico;
e) estabelecer, nos futuros editais públicos de seleção, a reserva de vagas para candidatos
portadores de deficiência, na forma da lei;
i) publicar esta sentença, na íntegra, em seu sítio eletrônico, para conhecimento de todos os
interessados.
Os valores das astreintes acima indicados deverão ser devidamente corrigidos e revertidos ao
Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD), previsto na Lei nº 9.008/1995, nos termos do art. 5º, §6º e da
Lei nº 7.347/1985, ou a instituição sem fins lucrativos a ser indicada pelo órgão ministerial para homologação
judicial.
A proteção contra o dano extrapatrimonial foi alçada à condição de direito fundamental nos
incisos V e X do artigo 5º da Constituição da República, in verbis:
"Art. 5º (...)
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado
o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;"
Com efeito, os valores jurídicos protegidos não são restritos à esfera individual, pois o
ordenamento jurídico estabeleceu novo paradigma com a dimensão social e coletiva de direitos e suas
Consta expressamente das disposições dos artigos 6º, VI e VII, da Lei nº 8.078/1990 e 1º da
Lei nº 7.347/1985 o reconhecimento ao direito coletivo e difuso de caráter extrapatrimonial, cujas ameaças de
lesão e lesões são, respectivamente, prevenidas e reparadas pelo sistema processual previsto nesses diplomas
normativos.
Nesse sentido, importante a definição de dano moral coletivo apresentada por Xisto Tiago de
Medeiros Neto: "lesão injusta e intolerável a interesses ou direitos titularizados pela coletividade (...) os quais
se distinguem pela natureza extrapatrimonial e por refletir valores e bens fundamentais tutelados pelo sistema
jurídico" (MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2012, p. 170).
Assim, o dano moral coletivo, por definição, pressupõe a existência de conduta antijurídica
com gravidade suficiente para a repercussão social nociva a valores fundamentais do sistema jurídico, a
configurar ofensa a interesses extrapatrimoniais de toda a coletividade ou mesmo de toda sociedade. Por
conseguinte, estamos diante da invocação de interesses transindividuais, indivisíveis e titularizados em
comunhão pelo grupo social, sejam coletivos em sentido estrito ou difusos, nos moldes do artigo 81,
parágrafo único, I e II, do CDC:
Foram atingidos pela conduta não apenas aqueles que efetivamente participaram do segundo
processo seletivo do IHBDF, mas também quem não conseguiu participar da seleção por conta do ilícito
patronal e, afinal, toda a sociedade, interessada no respeito aos pertinentes valores basilares estabelecidos na
Constituição da República e na correta aplicação dos recursos públicos repassados ao réu por meio de
contrato de gestão.
Dessarte, a prática do réu revelou padrão de conduta lesivo aos interesses e direitos
extrapatrimoniais da coletividade e, diante do ilícito, não há necessidade de prova do dano, pois é presumido
a partir do ato ofensivo de que decorre inexoravelmente a violação dos valores da humanidade, razão pela
qual se afirma que o dano moral existe in re ipsa.
Noutras palavras, quando provado o fato, que atinge de forma intolerável e significativa
direitos coletivos (lato sensu), a exigir a responsabilização exemplar do ofensor, restará evidenciado, em
consequência, o dano moral coletivo.
Ademais, o arbitramento judicial deve ser prudente e considerar alguns parâmetros sugeridos
por doutrina e jurisprudência: a) o ambiente cultural dos envolvidos; b) a situação econômica das partes; c) o
grau de culpa do ofensor; d) a gravidade e a extensão do dano.
Nesse contexto, a indenização por dano moral coletivo deverá considerar o porte econômico
da parte ré para funcionar como medida pedagógica e punitiva e desestimular a repetição do ilícito, sendo que
a única informação a respeito foi trazida pelo autor, no sentido de que o Governo do Distrito Federal
repassará ao IHBDF seiscentos milhões de reais por ano.
III. Dispositivo
Diante do exposto, e considerando o que mais consta dos autos, decido julgar parcialmente
procedente o pedido da ação principal formulada por MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO em face
de INSTITUTO HOSPITAL DE BASE DO DISTRITO FEDERAL - IHBDF, para, nos termos da
fundamentação:
1) Declarar a nulidade absoluta do segundo processo seletivo realizado pelo réu e de todas as
contratações de empregados decorrentes dessa seleção;
2) Condenar o réu ao cumprimento das seguintes obrigações de fazer e não fazer pleiteadas,
sob pena de multa de R$ 50.000,00 por cada descumprimento:
c) abster-se de realizar processos seletivos futuros com base em metodologias de seleção que
tenham caráter subjetivo;
d) abster-se de realizar processos seletivos sem a publicação de edital público, com as diversas
etapas da seleção, banca examinadora, prazos, critérios objetivos e recursos cabíveis, com
publicação mínima no Diário Oficial do DF e no seu sítio eletrônico;
e) estabelecer, nos futuros editais públicos de seleção, a reserva de vagas para candidatos
portadores de deficiência, na forma da lei;
g) abster-se de realizar provas pela internet em suas seleções públicas, adotando exames
presenciais e com a presença de fiscais nos locais dos exames;
i) publicar esta sentença, na íntegra, em seu sítio eletrônico, para conhecimento de todos os
interessados.
Custas pelo réu no importe de R$ 10.000,00, calculadas sobre o valor arbitrado à condenação
(R$ 500.000,00).
Juros de mora, nos termos do artigo 39, § 1º, da Lei nº 8.177/1991, a contar do ajuizamento da
ação (artigo 883 da CLT).