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Confira o significado do termo 'República'

segundo o 'Dicionário de políticas públicas'


Notícias
segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Cícero
denuncia Catilina, afresco de Cesare Maccari (1882-1888)

Verbete presente no livro Dicionário de políticas públicas - 2ª edição, organizado por


Geraldo Di Giovanni e Marco Aurélio Nogueira (páginas 884 a 888). Permitida a
reprodução, desde que citada a fonte.

República/Republicanismo

Por Renato Lessa

Em um marco estritamente institucionalista, pode-se dizer que república é uma forma de


governo que se distingue da forma monárquica. Tal distinção deve-se ao fato de que o
fundamento do poder nas repúblicas não está associado a governo unipessoal e à sucessão
dinástica, tal como nas monarquias, invariavelmente governadas por casas reais. Ainda que,
ao longo do século 20 – e mesmo no início do 21 – o termo “república” tenha sido utilizado
na autodenominação de regimes políticos autoritários, de modo geral a ideia contemporânea
de república aproxima-se da de democracia, posto que está associada à soberania popular,
exercida por meio da participação em eleições regulares, livres, competitivas e extensivas a
todos os postos politicamente relevantes. A tais traços devem ser acrescentadas a distinção e a
separação entre teologia e política.

A ideia de república como forma de governo que se constitui como negação da forma
monárquica ganhou consistência a partir da emergência das duas revoluções republicanas
modernas, em fins do século 18. Embora suas origens, durações e efeitos tenham sido
distintos, tanto a Revolução Americana (1776) como a Revolução Francesa (1789) tiveram
imenso papel na afirmação de uma forma de governo diversa da tradição monárquica
europeia. A recusa norte-americana ao governo despótico – presente de modo inequívoco na
reflexão dos founding fathers – acabou por eliminar a monarquia como alternativa
institucional para o novo país, fundado a partir da vitória na guerra de independência frente
aos ingleses. No caso francês, a recusa das práticas institucionais do Antigo Regime,
defendida tanto por moderados como por radicais, acabou por conduzir à república, ainda que
essa tenha sido suprimida sob Napoleão e pela Restauração que se lhe seguiu.

Durante o século 19, tanto na Europa quanto nas antigas periferias coloniais – América do
Sul, por exemplo –, vários movimentos democratizantes ou de libertação nacional evocaram a
forma republicana, sempre na chave de repúdio à forma monárquica de governo unipessoal
com fundamento dinástico. As revoluções europeias de 1830 e 1848, assim como os
movimentos nacionais na América Espanhola, estruturaram-se em torno de ideais
republicanos, cujo núcleo invariavelmente gravitava em torno da necessidade de afirmar o
princípio da soberania popular.

A própria experiência brasileira, tardia com relação à da América do Sul, teve nesse traço um
aspecto importante. Entre nós, a defesa da república, durante o século 19, caracterizou-se
menos pela defesa de um programa claro de reforma para a sociedade e a política e mais pela
simples negação do governo monárquico e pessoal de d. Pedro II. A primeira década
republicana no Brasil foi marcada por forte instabilidade e por intensa disputa a respeito do
que deveria significar um regime republicano. Coube ao governo do paulista Campos Salles
(1898-1902) estabelecer as bases do regime, que vigoraram até 1930.

A chave conceitual que opõe república a monarquia como formas de governo está, no entanto,
longe de resumir os significados possíveis da ideia de república. A discussão clássica, por
exemplo, aproximava a ideia grega de politeia ao conceito romano de res publica. Com efeito,
de Aristóteles a Cícero, os termos grego e romano designam mais uma forma de vida pública
e coletiva do que um regime político em sentido restrito. O significado de tal forma de vida
foi considerado por diversos pensadores modernos, em uma linhagem que conecta, por
exemplo, Maquiavel, no século 16, a Montesquieu, David Hume, James Madison e Imannuel
Kant, no século 18.

Para essa linhagem de pensadores, república é, antes de tudo, uma forma social, cuja
caracterização exige mais do que a descrição de formas institucionais e mecanismos de
governo. Maquiavel, ao se reportar à experiência da república romana, a apresenta como
regime a um só tempo garantidor das liberdades públicas e fundado em um forte sentido de
virtude e envolvimento cívicos. Montesquieu, no século 18, sobretudo em seu Espírito das
leis, recepcionou essa longa tradição. Para ele, a república pode ser definida como uma forma
social, marcada por uma combinação complexa de traços: território pequeno, homogeneidade
social e cultural e presença de forte espírito cívico, caracterizado pelo predomínio de
considerações de caráter público sobre as agendas privadas dos cidadãos. Para ele, as relações
entre república e democracia não são necessárias: além de democráticas, as repúblicas podem
ser aristocráticas. No primeiro dos casos, todo o corpo do povo governa, no segundo apenas
uma parte, reconhecida como a melhor. O que caracteriza a república em qualquer daquelas
alternativas é o princípio que a move, a virtude, que pode ser traduzida como um alto grau de
envolvimento dos cidadãos em questões de natureza pública, tomadas como referências mais
dignas do que o plano dos interesses privados e pessoais.
Em ângulo distinto, David Hume, em seus Ensaios morais, políticos e literários, opôs as
repúblicas a sistemas despóticos, fundados no domínio pessoal e em idiossincrasias dos
governantes. Para ele, a oposição entre as duas formas emerge do fato de que o fundamento
da república é o domínio da lei e da regularidade institucional. A seu juízo, as qualidades
morais dos governantes e dos cidadãos não seriam tão relevantes quanto a qualidade das leis e
do quadro institucional. No caso de governos pessoais, e não republicanos, as qualidades
pessoais dos monarcas, ao contrário, fariam imensa diferença. A abordagem de Hume, por
não insistir tanto no tema da virtude cívica e individual, inspirou o tratamento que viria a ser
dado, pouco tempo depois, pelos fundadores da república norte-americana ao tema
republicano.

Com efeito, James Madison, o principal intelectual público da Revolução Americana,


procurou desvincular o tema da república do da necessidade de uma virtude cívica incomum
por parte dos cidadãos. Para tal, redefiniu a ideia clássica de república, e a associou ao que
definiu como o “esquema da representação”, cuja presença a torna um regime que não se
confunde com a ideia clássica de democracia, fundada no exercício direto do poder pela
multidão.

Para Madison, a república, já agora representativa, também não se limita a uma forma de
governo. Ela está associada a uma forma social marcada pela heterogeneidade dos interesses
sociais, pelo individualismo e por intenso faccionalismo. A ideia tradicional de república,
associada a territórios pequenos e a população homogênea, cede lugar ao gigantismo
territorial e à complexidade do tecido social. Nesse novo enquadramento, o interesse público
dependerá da escolha regular de representantes, dotados de maior discernimento do que os
indivíduos, movidos por seus apetites privados. O princípio da representação, como filtro de
energias democráticas perturbadoras, e um arranjo institucional no qual todo poder político é
posto sob controle de outro poder – na chave aberta por Montesquieu, em O espírito das leis –
definem o núcleo do republicanismo à americana.

Coube a Immanuel Kant, ainda no século 18, fixar os fundamentos da moderna tradição
republicana. Seu argumento contrapôs-se a uma ideia de poder político pensado como
domínio paternal (imperium paternale). Sua referência, para fins de exercer acrítica, foi o
filósofo Leibiniz, para quem o Estado deveria garantir que os cidadãos estejam satisfeitos e
tranquilos de ânimo, que sejam moderados (capazes de dominar suas paixões), que sejam
devotos, bonitos de corpo, ágeis e ao mesmo tempo robustos, que disponham dos meios
necessários à vida. De acordo com Norberto Bobbio, para Leibiniz o Estado deveria ser
“mestre, sacerdote, empresário econômico, treinador esportivo, moralista, pedagogo,
confessor e comerciante”. Kant, ao contrário, apresenta a defesa de um Estado fundado na
liberdade. O imperium paternale supõe que os súditos sejam filhos menores, incapazes da
distinção entre o que é útil e prejudicial, o que os torna passivos diante da suposta
benevolência estatal. Para Kant, em suma, o imperium paternale é o pior despotismo que se
pode imaginar.

Sob tal imperium, a distinção entre bom e mau governo cola-se à figurado soberano-pai: é
bom o governo do príncipe bom, mau o do príncipe mau. Em outros termos, não há critério
formal– ou seja, de ordem geral e universal – capaz de distinguir um tipo de governo de outro:
sua bondade e sua maldade decorrem de atributos pessoais do governante. Nessa chave, a
república aparece mais como exercício das virtudes públicas do que fundada em bons arranjos
legais e institucionais. É o tema do Estado de direito, e de sua necessária universalidade – a
liberdade segundo leis universais – que a parece como fundamento necessário para o governo
não despótico.

A retomada recente do interesse pelo tema da república, no século 20, pode ser percebida
como reação a se pensar a democracia como mero cumprimento das regras formais que
regulam a competição política. O republicanismo contemporâneo – presente em autores como
Philip Pettite, entre nós, Luiz Werneck Vianna, Newton Bignotto e Sergio Cardoso – tem por
meta a reintrodução dos valores da qualidade da vida pública. Nesse sentido, o
republicanismo pode ser pensado tanto como um acréscimo à (e não supressão da) defesa
liberal da liberdade individual e da garantia de direitos, quanto como um acréscimo aos
procedimentos majoritários e rotineiros da democracia contemporânea. Ao reintroduzir o
tema da qualificação do espaço público, o republicanismo contemporâneo, mais do que
propugnar por reformas institucionais, aposta nas possibilidades de reativação das virtudes
cívicas.

Referências Bibliográficas

BIGNOTTO, N. Origens do republicanismo moderno. Belo Horizonte: Ufmg, 2001.

_______. (Org.). Pensar a República. Belo Horizonte: UFMG, 2000.

CARDOSO, S. (Org.). Retorno ao republicanismo. Belo Horizonte: Ufmg, 2004.

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Estado, instituições e democracia:


república. Brasília, DF: Ipea, 2010.

PETTIT, P. Republicanism: a theory of freedom andgovernment. Oxford: Oxford University


Press, 1997.

VIANNA, L. W. Esquerda brasileira e tradição republicana. Rio de Janeiro: Revan, 2006.


Assessoria de Imprensa da Fundação Editora da Unesp

http://editoraunesp.com.br/blog/confira-o-significado-do-termo-republica-segundo-o-
dicionario-de-politicas-publicas

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