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C o l e ç ã o L & P M P O C K E T , vol.

1 0 5 2
R o b e r t J. M c M a h o n é p r o f e s s o r de história n a University of Florida e autor d e
diversos livros, c o m o The Cold War on the Periphery: the United States,
índia, and Pakistan ( 1 9 9 4 ) e The Limits ofEmpire: the US and Southeast
As ia since World War II (1999).

Texto d e a c o r d o c o m a n o v a ortografia.
T í t u l o original: The Cold War

P r i m e i r a e d i ç ã o n a C o l e ç ã o L & P M POCKET: j u l h o d e 2 0 1 2

Tradução: R o s a u r a E i c h e n b e r g
Capa-. Ivan Pinheiro M a c h a d o . Foto: © Shutterstock.com
Preparação: Elisângela R o s a d o s Santos
Revisão: S i m o n e B o r g e s
CIP-Brasil. Catalogação na Fonte
S i n d i c a t o N a c i o n a l d o s E d i t o r e s d e Livros, R J

M l 18g
MacMahon, Robert
G u e r r a f r i a / R o b e r t J. M a c M a h o n ; t r a d u ç ã o d e R o s a u r a E i c h e n b e r g —
Porto Alegre, RS: L & P M , 2012.
2 0 8 p . : il. ; 18 c m ( C o l e ç ã o L & P M P O C K E T ; "v. 1 0 5 2 )
T r a d u ç ã o d e : The Cold War
Apêndice
Inclui b i b l i o g r a f i a
ISBN 978-85-254-2689-5
1. G u e r r a F r i a . 2. Política internacional - 1 9 4 5 - 1 9 8 9 . 3 . C a p i t a l i s m o .
4. C o m u n i s m o . I. Título.

12-3556. CDD: 909.825


CDU: 94(100)"! 945/1989"

© R o b e r t J. M c M a h o n , 2 0 0 3
Guerra fria f o i o r i g i n a l m e n t e p u b l i c a d o e m inglês e m 2 0 0 3 .
Esta t r a d u ç ã o é p u b l i c a d a c o n f o r m e a c o r d o c o m a O x f o r d U n i v e r s i t y
Press.

Todos o s direitos d e s t a e d i ç ã o r e s e r v a d o s a L & P M E d i t o r e s


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I m p r e s s o n a G r á f i c a e E d i t o r a Pallotti, S a n t a M a r i a , R S , Brasil
Inverno de 2012
SUMÁRIO

PREFÁCIO 7

CAPÍTULO 1: A S e g u n d a G u e r r a M u n d i a l e
a destruição da antiga ordem 9

CAPÍTULO 2: A s o r i g e n s d a G u e r r a F r i a n a
Europa: 1945-1950 25

CAPÍTULO 3: R u m o à " G u e r r a Q u e n t e " n a Á s i a :

1945-1950 46

CAPÍTULO 4: U m a G u e r r a F r i a g l o b a l : 1 9 5 0 - 1 9 5 8 69

CAPÍTULO 5: D o c o n f r o n t o à d é t e n t e : 1 9 5 8 - 1 9 6 8 93

CAPÍTULO 6: G u e r r a s F r i a s d e n t r o d e c a d a p a í s 122
CAPÍTULO 7: A s c e n s ã o e q u e d a d a d é t e n t e d a s

superpotências: 1968-1979 140

CAPÍTULO 8: A e t a p a f i n a l : 1 9 8 0 - 1 9 9 0 163

L E I T U R A S COMPLEMENTARES 191

ÍNDICE REMISSIVO ,.196

LISTA DE ILUSTRAÇÕES 205

LISTA D E MAPAS 207


CAPÍTULO 6

G U E R R A S F R I A S D E N T R O D E C A D A PAÍS

A G u e r r a Fria e x e r c e u u m i m p a c t o tão p r o f u n d o e tão


m u l t i f a c e t a d o na estrutura da política internacional e nas
r e l a ç õ e s E s t a d o a E s t a d o que se t o r n o u c o s t u m e i r o c h a m a r
o p e r í o d o de 1945 a 1990 d e " a era da G u e r r a Fria". E s s a
d e s i g n a ç ã o torna-se ainda m a i s a d e q u a d a q u a n d o se consi-
d e r a a p o d e r o s a m a r c a q u e a luta s o v i é t i c o - a m e r i c a n a pelo
d o m í n i o m u n d i a l e p e l a s u p r e m a c i a ideológica d e i x o u den-
tro de m u i t o s d o s e s t a d o s - n a ç õ e s do m u n d o , que é o t e m a
d e s t e capítulo^ Todo o d e s e n v o l v i m e n t o de g r a n d e i m p o r t â n -
c i a q u e o c o r r e u e n t r e 1945 e 1990 n ã o p o d e ser ligado, é
claro, à G u e r r a Fria. D a m e s m a f o r m a , n ã o se p o d e escrever
u m a história da s e g u n d a m e t a d e d o século X X s e m u m a ava-
liação sistemática d a r e p e r c u s s ã o p o d e r o s a e m u i t a s vezes
d e t u r p a d o r a d o c o n f l i t o das s u p e r p o t ê n c i a s n o s E s t a d o s e nas
sociedades do mundo.
A s s u a s r e p e r c u s s õ e s e m c a d a país t ê m r e c e b i d o muito
m e n o s a t e n ç ã o sistemática d o s e s t u d i o s o s q u e a dinâmica
internacional da G u e r r a Fria. E s t e capítulo o f e r e c e simples-
m e n t e u m a p a n h a d o geral de p i n c e l a d a s sobre esse imenso
tópico. S u g e r e a l g u m a s das m a n e i r a s p e l a s quais a Guerra
Fria a f e t o u a c o n s t e l a ç ã o interna d e f o r ç a s n o Terceiro
Mundo, na Europa e nos Estados Unidos.

O Terceiro M u n d o : d e s c o l o n i z a ç ã o , f o r m a ç ã o dos
E s t a d o s e geopolítica d a G u e r r a F r i a
O s u r g i m e n t o de d ú z i a s de e s t a d o s - n a ç õ e s recém-inde-
p e n d e n t e s p o r t o d a a extensão d o Terceiro M u n d o , j u n t o com
o p r o c e s s o de d e s c o l o n i z a ç ã o p o r v e z e s sangrento, invaria-
v e l m e n t e a p i n h a d o de conflitos, q u e lhes d e u origem, n ã o só
coincidiu n o t e m p o c o m a G u e r r a Fria, c o m o foi inextrica-
v e l m e n t e m o d e l a d o p o r ela.- N a v e r d a d e , a luta abrangente

122
p e l o p o d e r e p e l a i n f l u ê n c i a global entre o s E s t a d o s U n i d o s ,
a U n i ã o S o v i é t i c a e s e u s r e s p e c t i v o s aliados é q u e produziu^
o próprio termo "Terceiro Mundo". Clichê político conve-
n i e n t e q u e a g l o m e r a v a d e m o d o u m t a n t o f r o u x o as á r e a s
predominantemente pobres, não brancas e não comprome-
t i d a s d o p l a n e t a , o T e r c e i r o M u n d o c o n o t a v a n o início u m a
a r e n a d e c o n t e s t a ç ã o entre o O e s t e e o L e s t e , os a s s i m c h a -
j n a d o s Primeiro e Segundo M u n d o s í Á s pressões da Guerra
F r i a às v e z e s e x a c e r b a r a m , e m o u t r a s o c a s i õ e s f a c i l i t a r a m ,
a transição do colonialismo para a independência. Embora
o impacto particular da Guerra Fria tenha variado muito de
u m a luta f i m d e i m p é r i o p a r a outra, a d i s p u t a d a s s u p e r p o -
t ê n c i a s a v u l t a v a s e m p r e c o m o u m a v a r i á v e l e x t e r n a de c a p i -
tal i m p o r t â n c i a / q u a l q u e r história d e d e s c o l o n i z a ç ã o s e r i a
i n c o m p l e t a se d e i x a s s e d e e x a m i n a r as m ú l t i p l a s f o r m a s
pelas quais o conflito das superpotências impactou o pro-
c e s s o — d o s m o v i m e n t o s p e l a liberdade n o sul e s u d e s t e d a
Á s i a e m m e a d o s e n o final d a d é c a d a de 4 0 , q u e i n a u g u r a r a m
a era d a d e s c o l o n i z a ç ã o , até a resistência d o s a f r i c a n o s a o
d o m í n i o c o l o n i a l p o r t u g u ê s n o início e e m m e a d o s d a d é c a d a
de 70, q u e a f i n a l i z o u .
A formação de novos Estados pós-coloniais e m grande
parte da Ásia, da África, do. Oriente M é d i o e t a m b é m e m
regiões do Caribe desenrolou-se igualmente contra o p a n o
de f u n d o s e m p r e p r e s e n t e d a G u e r r a Fria A f o r m a , a c o e -
são e a v i t a l i d a d e d e s s e s E s t a d o s ; a c o n f i g u r a ç ã o interna d e
p o d e r d e n t r o deles; a sua c a p a c i d a d e de c o n q u i s t a r a t e n ç ã o e
prestígio i n t e r n a c i o n a i s ; o s p l a n o s de s e u s líderes p a r a a s s e -
g u r a r r e c u r s o s , capital e a s s i s t ê n c i a t é c n i c a e x t e r n o s a f i m d e
satisfazer as p r i o r i d a d e s d o d e s e n v o l v i m e n t o e c o n ô m i c o o u
para o b t e r a s s i s t ê n c i a m i l i t a r a f i m de suprir as n e c e s s i d a d e s
de d e f e s a — t u d o foi s i g n i f i c a t i v a m e n t e a f e t a d o p e l a G u e r r a
F r i a . / E m m u i t o s a s p e c t o s , a história da f o r m a ç ã o d o s E s t a -
dos n o p e r í o d o p ó s - S e g u n d a G u e r r a M u n d i a l — a s s i m c o m o
a h i s t ó r i a d a d e s c o l o n i z a ç ã o — s i m p l e s m e n t e n ã o p o d e ser
escrita s e m q u e se p r e s t e u m a a t e n ç ã o c u i d a d o s a e s i s t e m á -
tica a e s s a i m p o r t a n t e v a r i á v e l externa.
123
A G u e r r a F r i a a p r e s e n t o u a o s p o t e n c i a i s líderes d o Ter-
c e i r o M u n d o u m a série c o m p l e x a d e p r o b l e m a s , d e s a f i o s e
o p o r t u n i d a d e s . Isso s e t o r n o u a p r i n c í p i o e v i d e n t e d u r a n t e
as lutas a n t i c o l o n i a i s n o início d o p e r í o d o p ó s - g u e r r a n o
-Sudeste A s i á t i c o ^ H o C h i M i n h e S u k a r n o p e d i r a m assistên-
cia a o s E s t a d o s U n i d o s l o g o d e p o i s d a r e n d i ç ã o d o J a p ã o ^
f o r m u l a n d o s u a s s o l i c i t a ç õ e s e m t e r m o s d o a p o i o histórico
d o s E s t a d o s U n i d o s à a u t o d e t e r m i n a ç ã o . T o d a v i a , o s dois
,-ficaram r a p i d a m e n t e d e s a n i m a d o s a o d e s c o b r i r q u e o c o m -
p r o m i s s o d a a d m i n i s t r a ç ã o T r u m a n c o m s e u s a l i a d o s euro-
p e u s d á G u e r r a Fria t i n h a p r i o r i d a d e , i m p e d i n d o , a o m e n o s
inicialmente, qualquer compromisso diplomático o u mate-
rial c o m s e u s r e s p e c t i v o s m o v i m e n t o s d e i n d e p e n d ê n c i a / H o . ,
agente veterano d o Comintern e m e m b r o fundador do Partido
Comunista da Indochina, voltou-se para a União Soviética e
r.f>ara a R e p ú b l i c a P o p u l a r da C h i n a e m b u s c a d e a p o i o , q u e
ele c o m e ç o u a r e c e b e r n o início d e 1950. S u k a r n o , p o r outro
lado, p r o v o u a s u a bona fides a n t i c o m u n i s t a r e p r i m i n d o u m a
c a m p a n h a c o m u n i s t a interna q u e p r o c u r a v a g a n h a r o c o n -
trole d o mais amplo movimento d e independência indoné-
s i o . R e p r i m i n d o a r e b e l i ã o M a d i u n d e 1948, o s n a c i o n a l i s t a s
i n d o n é s i o s d e m o n s t r a r a m o caráter m o d e r a d o d e s e u m o v i -
m e n t o ; esse a c o n t e c i m e n t o c o n v i n c e n t e f a z i a p a r t e d e u m a
estratégia t o t a l m e n t e c o n s c i e n t e p a r a o b t e r o a p o i o o c i d e n -
tal, s o b r e t u d o o a m e r i c a n o . A estratégia a c a b o u s e n d o u m
s u c e s s o n a m e d i d a e m q u e a a d m i n i s t r a ç ã o T r u m a n pressio-
' n o u a H o l a n d a n o a n o s e g u i n t e p a r a q u e c o n c e d e s s e a inde-
p e n d ê n c i a a o q u e o s a m e r i c a n o s j u l g a v a m ser u m a liderança^
"indonésia r e l a t i v a m e n t e c o n f i á v e l e i n t e i r a m e n t e a n t i c o m u -
nista.
A s trajetórias radicalmente divergentes de campanhas
semelhantes e m prol do autogoverno nacional, montadas
p e l o s n a c i o n a l i s t a s v i e t n a m i t a s e i n d o n é s i o s , i l u s t r a m clara-
m e n t e a i m p o r t â n c i a d a d i n â m i c a d a G u e r r a F r i a dentro das
s o c i e d a d e s d o T e r c e i r o M u n d o . E s s e s c a s o s t a m b é m ilumi-
n a m a s o p ç õ e s d i f e r e n t e s à d i s p o s i ç ã o d o s estadistas n a t i v o s
q u a n d o estes t e n t a m n a v e g a r e m m e i o a o s b a n c o s d e areia
124
traiçoeiros da política d a s g r a n d e s p o t ê n c i a s . / N o s extre-
m o s , e s s e s líderes p o d i a m p r o c u r a r o b t e r o a p o i o a m e r i c a n o
d e m o n s t r a n d o ou a f i a n ç a n d o as suas c o n v i c ç õ e s a n t i c o -
m u n i s t a s , o seu caráter m o d e r a d o e as suas t e n d ê n c i a s p r ó -
- o c i d e n t a i s ; ou, a l t e r n a t i v a m e n t e , p o d i a m tentar c o n q u i s t a r
o a p o i o s o v i é t i c o ou c h i n ê s a c e n t u a n d o as suas c r e d e n c i a i s
r e v o l u c i o n á r i a s e antiocidentais.
N o m u n d o essencialmente bipolar que todos os movi-
m e n t o s d e i n d e p e n d ê n c i a n o Terceiro M u n d o e n f r e n t a r a m
d e s d e m e a d o s d a d é c a d a d e 4 0 até m e a d o s da d é c a d a d e
70, e r a difícil e v i t a r a p r e s s ã o p a r a se alinhar a u m o u o u t r o
c a m p o i d e o l ó g i c o e s e u s i s t e m a d e a l i a n ç a militar — e s p e -
c i a l m e n t e p o r q u e os b e n e f í c i o s c o n c r e t o s p o d i a m fluir o u
ser b l o q u e a d o s c o m o r e s u l t a d o da o p ç ã o e s c o l h i d a . Q u a n t o
mais contestada a campanha pela independência, mais os
que b u s c a v a m essa independência sentiam necessidade do
apoio d e u m ou outro dos d o i s b l o c o s . A l é m disso, q u a n d o
as c o a l i z õ e s a n t i c o l o n i a i s r o m p i a m - s e , c o m o a c o n t e c e u n o
C o n g o e m 1960 e e m A n g o l a e m 1 9 7 4 - 1 9 7 5 , a t e n t a ç ã o d e
obter a p o i o d e p a t r o n o s d i f e r e n t e s e n t r e as s u p e r p o t ê n c i a s se
m o s t r a v a irresistível p a r a as f a c ç õ e s e m disputa. A s v i s õ e s
particulares d o s líderes n a c i o n a l i s t a s p a r a o f u t u r o , q u e c o s -
tumavam abarcar transformações socioeconômicas de longo
a l c a n c e e m s u a s terras nativas, c o m p l i c a v a m a i n d a m a i s a s
e s c o l h a s q u e lhes e r a m i m p o s t a s p e l a s p r e s s õ e s d o c o n f l i t o
entre as s u p e r p o t ê n c i a s . R e t i r a r - s e d o b l o c o d e p o d e r o c i -
dental, c o m s u a s suspeitas a r r a i g a d a s e m r e l a ç ã o à q u e l e s
i n c l i n a d o s a m a r c h a r a o s o m d o s t a m b o r e s socialistas, p o d e -
ria r e s t r i n g i r c e r t o s c a m i n h o s p o l í t i c o s d e d e s e n v o l v i m e n t o
no p a í s , c o m p r o m e t e n d o a l i b e r d a d e de e s c o l h a p e l a q u a l
as elites n a c i o n a i s f u n d a d o r a s i n v a r i a v e l m e n t e a n s i a v a m .
Retirar-se d o b l o c o socialista, p o r outro lado, c e r t a m e n t e
m i n i m i z a r i a , e t a l v e z até e l i m i n a s s e , a o p ç ã o d e f a z e r u s o d e
lisonjas p a r a o b t e r dólares e a p o i o d a n a ç ã o m a i s p o d e r o s a e
mais r i c a d o m u n d o .
C o m a i n d e p e n d ê n c i a , os r e c é m - f u n d a d o s E s t a d o s d o
Terceiro M u n d o e n f r e n t a v a m u m a série i g u a l m e n t e a g u d a
125
de dilemas. Alguns procuravam ativamente o alinhamento
c o m os Estados Unidos, porque u m compromisso formal
com o Ocidente parecia adequar-se melhor às principais
necessidades internas. N o caso do Paquistão, por exemplo,
as suas elites governantes buscaram c o m vigor u m a cone-
xão americana desde os primeiros tempos de seu frágil país,
tornando-se u m aliado formal e m meados da década de 50
por meio da negociação de u m acordo de segurança bilateral
c o m Washington e da participação e m dois pactos multilate-
rais. A conexão americana forneceu ao Paquistão u m a prote-
ção m e n o s contra a União Soviética que contra a índia, sua
principal rival regional, ou assim acreditavam as principais
autoridades do Paquistão. Ela oferecia u m m e i o de assegu-
rar a sobrevivência de u m experimento muito precário em
matéria de construção de nação, dada a forma de governo
étnica, lingüística e geograficamente dividida do Paquistão,
enquanto reforçava naquele Estado a posição dominante
do grupo étnico Punjabi, que havia pressionado de maneira
muito agressiva pela ajuda americana e pelo alinhamento
ocidental. Durante toda a década e meia que se seguiu, os
compromissos do Paquistão na Guerra Fria, somados_à ajuda
militar e econômica deles resultante, modelaram poderosa-
mente a constelação interna de forças n o país. A aliança com
os Estados Unidos sustentava, e m particular, a elite P u n j a b F
e os militares paquistaneses e m detrimento de outros concor-_
"rentes internos que t a m b é m disputavam o poder, distorcendo
o equilíbrio político da nação quase desde a sua concepção.7 y '
/ / N o caso da Tailândia, para citar outro exemplo mar-
c a n t e , seus líderes procuravam u m a conexão americana por
u m à causa de mistura semelhante de razões. Cobiçavam um
protetor externo c o m o parte de u m a estratégia nacional de_
Tonga data, inspirada pelo temor tradicional e m relação à _
China, seu yizinho gigantesco e potencialmente ameaçador^
— fosse comunista ou não. A Guerra Fria forneceu às elites
Thai u m m e i o de assegurar esse protetor externo, u m a vez
que suas necessidades por acaso se ajustavam à busca ame-
ricana de aliados no Terceiro M u n d o . C o m o seus congêneres
126
no Paquistão, os líderes militares Thai t a m b é m procuravam,
u m a conexão americana e os dólares que assim haveriam de
jorrar, c o m o objetivo de aumentar seu controle interno d o
"poder e calar as vozes dissidentes. Dessa maneira, o.curso da
"história m o d e r n a Thai foi profundamente alterado.
E m b o r a cada circunstância particular revele natural-
mente características singulares, jpxiste s e m dúvida u m
padrão mais amplo e m que se pode ver que aquelas nações
"do Terceiro M u n d o que optaram pelo alinhamento ociden-
tal assim agiram mais por razões internas que por m e d o do
comunismo_e que os desenvolvimentos internos subsequen-
tes dentro daqueles Estados foram profundamente influen-
ciados c o m o conseqüência de sua o p ç ã o ^ a í s e s diversos,
c o m o o Iraque, o Irã, a Arábia Saudita, a Turquia, o Paquis-
tão, as Filipinas, o Ceilão, a Coréia do Sul e a Tailândia —
para mencionar apenas alguns dos mais proeminentes —,
descobriram que suas prioridades internas, os recursos dis-
poníveis e o equilíbrio interno de forças foram gravemente
afetados pelas decisões tomadas pelos seus líderes e m prol
de u m alinhamento formal ou informal c o m o Ocidente,
Alguns eram certamente Estados recém-emergentes, produto
das lutas pela independência; outros eram Estados muito
mais antigos, c u j o status de entidades autogovernáveis havia
sido comprometido, m a s nunca completamente extinto, pelo
império ocidental. Entretanto, apesar dessas histórias ampla-
mente divergentes, a forte marca deixada pela Guerra Fria
e m cada u m deles continua inequívoca.
j f K estratégia de u m estudado não alinhamento atraiu
outro grupo de líderes do Terceiro M u n d o , aqueles para
quem as metas nacionais importantes poderiam ser mais
eficazmente alcançadas se fosse evitado u m compromisso
formal c o m o Oeste ou com o L e s t e / S u k a r n o , da Indonésia,
"Tramai Àbdel Nasser, do Egito, K w a m e N k r u m a h , de Gana
e^ Jawaharlal Nehru, da índia, entre outros, lutaram cons-
c i e n t e m e n t e para que suas nações adotassem u m a posição
de independência e m relação a qualquer u m dos blocos de
poder da Guerra Fria. Os fatores complexos que estavam

127
por trás de seus cálculos ao optarem por u m a trajetória não
alinhada são amplamente ilustrativos. "Quando as relações
exteriores escapam de. nosso controle para ficarem a cargo
de alguma outra pessoa", alertou N e h r u , "nessa condição e"
nessa medida deixamos de ser independentes." O primeiro
entre os primeiros-ministros da índia estava convencido de
que sua j o v e m nação seria capaz de maximizar sua estatura
internacional e influência nos conselhos mundiais, assu-
mindo o papel de u m a terceira força nas relações internacio-
nais. A g i n d o desse m o d o , o Partido do Congresso então no
poder, que tinha N e h r u entre seus membros, poderia evitar a
alienação de algumas forças políticas poderosas na f o r m a de
governo notavelmente diversa da índia, alienação que teria
sido o resultado inevitável de u m compromisso formal com
fo Oeste ou c o m o Leste/^Mantendo-se a distância das esferas
de influência americana ou soviética, os planejadores india-
nos calculavam que seria possível atrair de ambos os campos
'a necessária assistência para o desenvolvimento. "Mesmo
aceitando ajuda econômica", u m N e h r u realista confidenciou
a u m assessor, "não é u m a política prudente colocar todos os
nossos ovos n u m único cesto." Sukarno, Nasser, N k r u m a h e
outros teriam concordado entusiasticamente com esse senti-
m e n t o / P a r a grande consternação dos combatentes da Guerra
Fria americanos, que comumente exibiam u m a mentalidade
de ou-você-está-conosco-ou-contra-nós, Washington foi for-
çado a competir pelas nações não alinhadas ou neutras do
Terceiro M u n d o .
E m suma, deve-se reconhecer a ação dos atores do
Terceiro M u n d o , que tentavam utilizar a realidade interna-
cional dominante de sua era, a Guerra Fria, para maximizar
potenciais benefícios — ou ao m e n o s minimizar potenciais
danos. Deve-se t a m b é m reconhecer, porém, que muitas das
conseqüências da Guerra Fria para os povos e sociedades do
Terceiro M u n d o revelaram-se tão inesperadas quanto fora do
controle dos atores locais. A esse respeito, vale tornar a enfa-
tizar que o Terceiro M u n d o surgiu j á e m 1950 c o m o o princi-
pal campo de batalha da Guerra Fria. O s conflitos c o m raízes
128
locais - desde Coréia, C o n g o e Vietnã até Angola, Afeganis-
tão e Nicarágua - tornaram-se exponencialmente mais cus-
tosos, porque o conflito das superpotências t a m b é m lhes foi
sobreposto ./Vale lembrar aqui que o grosso dos estimados
20 milhões que morreram nas guerras que se alastraram pelo
globo entre 1945 e 1990 era formado por vítimas dos confli-
tos n o Terceiro M u n d o , a maioria dos quais estava ligada a o
menos indiretamente à Guerra Fria.

O impacto da Guerra Fria na Europa


O impacto da Guerra Fria na Europa oferece o m a i s
.forte dos contrastes. Se p o d e ser responsabilizada p o r grande
parte da guerra, devastação e instabilidade que arruinou as
-áreas emergentes entre 1945 e 1990, a disputa soviético-ame-
ricana merece, por outro lado, grande parte do crédito pelo
período inédito de paz, prosperidade e estabilidade experi-
mentado pelos europeus. Jronicamente, u m a luta ideológica
e geopolítica que começou c o m o u m conflito a respeito do
destino da Europa acabou não só p o u p a n d o a Europa, m a s
"estabelecendo os fundamentos essenciais para o desenvolvi-
mento econômico mais.sustentado da história europeia.'Esse
progresso foi acompanhado e t o m a d o possível por u m a p a z
duradoura e m todo o continente e por u m rápido m o v i m e n t o
e m direção à integração política e econômica na Europa
Ocidental, sendo cada u m desses desenvolvimentos incitado
pela Guerra Fria. A " E r a de O u r o " da expansão e da produti-
vidade capitalista, q u e abrange desde o final dos anos 40 até
o início dos anos 70, coincidiu basicamente com as primei-
ras duas décadas e meia da Guerra Fria - e foi fomentada,
de f o r m a significativa, por essa m e s m a guerra. Aqueles anos
testemunharam " a revolução mais dramática, rápida e pro-
funda nas relações h u m a n a s de que a história tem registro",
na avaliação perspicaz do historiador Eric Hobsbawn. "Para
muitos daqueles que tinham vivido durante a Depressão e
a guerra", acrescenta o historiador John Young, "a Europa
Ocidental parecia a terra prometida."

129
i
A s tendências na segurança, na economia e na política
/ieram a se reforçar m u t u a m e n t e na Europa da Guerra Fria.
3 s cerca de U S $ 13 bilhões injetados na Europa Ociden-
tal pelo auxílio americano do Plano Marshall, entre 1948 e
1952, certamente ajudaram a estimular o grande desenvolvi-
mento do pós-guerra, ainda que os historiadores continuem
a debater sobre o peso exato que se deve atribuir à contribui-
ção americana. O "guarda-chuva de segurança" americano,
o apoio e o estímulo americano à integração da A l e m a n h a
Ocidental n a Europa Ocidental, b e m como o movimento
paralelo para u m a integração regional mais ampla, t a m b é m
desempenharam u m papel instrumental.,y'Òs estadistas da
Europa Ocidental às vezes seguiam a liderança americana,
m a s c o m igual freqüência t o m a v a m eles próprios a inicia-
tiva, agarrando as oportunidades oferecidas pela Guerra Fria,
pela ocupação da A l e m a n h a e pelo novo interesse americano
nos assuntos europeus para foijar o tipo de mudanças regio-
nais e reformas econômicas e sociais internas que julgavam
n e c e s s á r i a s / E l e s e seus financiadores americanos reconhe-
ceram desde o início, c o m o observa o historiador Herman-
-Josef Rupieper, "que, para a prosperidade e a democracia
florescerem na "metade ocidental de u m a Europa dividida,
os europeus ocidentais, c o m ajuda e proteção americanas,
teriam de r u m a r para u m sistema político, militar e eco-
n ô m i c o integrado". O s líderes dos principais Estados da_
Europa Ocidental estavam t a m b é m muito conscientes de que^
o problema da A l e m a n h a , u m a praga para a segurança do^
continente por gerações, precisava ser resolvido a f i m de_que
1T produtividade alemã pudesse ser utilizada na recuperação
econômica da E u r o p a sem que a À í e m a n h a apareçess_e„de_
novo c o m o u m a ameaça militar
^Eles agiram c o m criatividade e determinação na busca
de soluções para esses problemas. E m j u l h o de 1952, França,
Itália, República Federal da Alemanha, Bélgica, H o l a n d a ^
L u x e m b u r g o f o r m a r a m a "Comunidade Européia do Carvão
êjdo Aço7/Em março de 1957, n u m passo ainda mais ousado
e mais significativo e m direção à unidade, as m e s m a s seis
130
nações assinaram os tratados de R o m a estabelecendo u m a
Comunidade Econômica Européia (EEC) e u m a C o m u n i d a d e
Européia da Energia Atômica (EURATOM). U m a aproxima-'
ção histórica entre França e Alemanha facilitou o desenvol-
vimento dessas instituições supranacionais bem-sucedidas.
" A l e m a n h a e França são vizinhos que travaram guerra entre
si inúmeras vezes ao longo dos séculos", exclampu o chan-
celer da A l e m a n h a Ocidental Konrad A d e n a u e r p ' U m a lou-
cura europeia que deve terminar de uma v e z pára sempre."
As taxas de crescimento impressionantes dos países da E E C ,
que estavam na vanguarda do desenvolvimento e c o n ô m i c o
da Europa Ocidental, demonstravam as vantagens tangíveis
de trocar a competição militar pela cooperação econômica,
fem 1960,. "os Seis" eram responsáveis em conjunto por u m
quarto da produção industrial do m u n d o e por dois quintos
dó comércio internacional global.,,
O s cidadãos comuns da Europa Ocidental foram os prin-
cipais beneficiários desses desenvolvimentos. O crescimento
econômico sustentado propiciou-lhes salários mais elevados,
semanas de trabalho mais curtas, benefícios sociais gene-
rosos e melhores serviços de saúde e educação. O sucesso
da fórmula produtivista - e m síntese, asse u m bolo maior e
todos se beneficiarão - também contribuiu para a estabilidade
política, diminuiu a tensão tradicional entre a m ã o de obra e
o capital e boicotou o charme dos partidos comunistas da
Europa Ocidental. O desemprego praticamente desapareceu,
_sendo e m média apenas 2,9% em toda a Eúropa Ocidental n a
"Hécada de 50 e mero 1,5% na de 6Q^Em comparação com o
j^ssaclo, verdadeiros paraísos do.consumidor f o r a m criados,,
na Europa da Guejrra Fria; as pessoas da classe operária e da
[classe média ganhavam u m a renda cada vez mais compatí-
vel c o m a aquisição de mercadorias que antes haviam sido
prerrogativa dos r i c o s ^ N a Itália, por exemplo, a posse de
um carro próprio pulou de 469.000 unidades em 1938 para
15 milhões e m 1975. A posse de refrigeradores cresceu de
apenas 8% dos lares britânicos em 1956 para 69% em 1971.
Em 1973, 6 2 % das famílias francesas tiravam férias anuais,

131
mais que o dobro do n ú m e r o de famílias que podiam se dar
a esse luxo e m 1958. Reveladoramente, o primeiro-ministro
britânico Harold Macmillan pediu votos na eleição geral de
1959 c o m o extraordinário slogan: "Vocês nunca tiveram
uma vida tão b o a "
Durante as primeiras décadas do pós-guerra, os consu-
midores da Europa Ocidental preencheram a lacuna que os
separara por muito t e m p o de seus congêneres americanos. N a
década de 60, todos possuíam o que David Reynolds identi-
fica c o m o os atributos essenciais das sociedades orientadas
para o consumo: "mercadorias domésticas de produção em
massa, u m a população crescente c o m rendas em elevação,
expansão do crédito e propaganda agressiva". N a medida em
que a Guerra Fria consistiu t a m b é m na batalha pelos cora-
ções, pelas mentes e pelos estômagos dos cidadãos comuns,
o sucesso espetacular das economias capitalistas durante o
terceiro quartel do século X X sustentou substancialmente as
reivindicações políticas e ideológicas dos Estados Unidos e
seus aliados ocidentais.
À s deficiências concomitantes das economias planifica-^
das de estilo soviético na Europa Oriental, que lutavam para
satisfazer as necessidades básicas das populações locais, for-
taleciam ainda mais as pretensões de superioridade ociden-
tais a década de 60 e m diante, abriu-se u m a lacuna cada
vez maior entre as condições materiais nas metades oriental
e ocidental da Europa. Depois da Segunda Guerra Mundial,
as sociedades predominantemente agrárias a leste do rio Elba
passaram por u m a transição abrupta do capitalismo para o
socialismo — sob o olhar vigilante de Stalin. Imitando de
perto o m o d e l o soviético, os partidos comunistas n o poder na
Europa Oriental d e r a m início a políticas de industrialização
rápida e forçada, enquanto subordinavam os impulsos nacio-
n a l i s t a s aos imperativos do "internacionalismo proletário",
definido por Moscou. Sem dúvida, resultaram benefícios
para os cidadãos comuns: melhorias no serviço de saúde,
aperfeiçoamento na alimentação, queda das taxas de morta-
l i d a d e , expansão do acesso à educação, consecução do pleno
132
1

emprego. Porém, esses ganhos cobraram u m preço bastante


elevado e m países nos quais a repressão"política, a perse-
guição religiosa, a supressão das liberdades individuais_e a
conformidade ideológica imposta com energia tornaram-se a
norma, c o m o haviam sido por muito tempo n a própria União
Jgoviética./As economias planificadas da Europa Oriental
e da U n i ã o Soviética registraram u m progresso impressio-
nante n o final da década de 50, suplantando as economias da
Europa Ocidental e m termos de taxas de crescimento anuais.
Nos anos 60, entretanto, esse crescimento desacelerou con-
sideravelmente, q u a n d o se tornaram cada vez mais evidentes
os problemas inerentes aos modelos de planejamento des-
cendente (top-down), somados à incapacidade dos Estados
do bloco oriental para satisfazer as crescentes demandas dos
consumidores..

A Doutrina Brezhnev
O Politburo soviético decidiu usar a força para
W eliminar a agitação do pluralismo político na Tcheços-
lováquia por receio de que o contágio do liberalismo
|:se espalhasse p o r toda a Europa Oriental, solapando a
-autoridade do Kremlin. E m 26 de setembro de 1968, o
I j o r n a l oficial Prayda_viib\içou o que veio a ser chamado
y d e Doutrina B r e z h n e v para justificar a invasão. Dizia"
frque ós líderes nacionais p o d i a m seguir caminhos sepa-
fcrados de desenvolvimento, m a s apenas se esses cafm-
IOS não causassem da.no ao socialjsjnp no país, n e m ao.
^ m o v i m e n t o socialista mais amplo. E m outras palavras^
jg>/Jüremlin: traçaria Ós limites da diversidade na Europa
gOriental.

A s c a m p a n h a s periódicas para liberalizar os sistemas


econômico e político em cada u m dos Estados do Pacto de
Varsóvia cambalearam durante as décadas de 50 e 60 A
•União Soviética, quer sob o rígido Stalin, quer sob o mais
flexível Kruschev, quer sob o austero Brezhnev, simples-

133
mente não estava disposta a tolerar u m a reforma estrutural
genuína ou u m a verdadeira diversidade política em sua esfera
de influência. /O florescimento e a rápida morte da "Prima-
vera de P r a g a " de 1968 deixaram os limites da liberalização
dolorosamente claros. E m janeiro daquele ano, Alexander
Dubcek, u m líder comunista reformista, assumiu o poder na
Tcheçoslováquia. Ele deu o m á x i m o de si para satisfazer o
clamor popular tcheco em prol de maior liberdade política
e reformas econômicas significativas, mantendo ao mesmo
t e m p o o apoio da União Soviética e a unidade de seu Partido
Comunista então no p o d e r / i s s o se revelou u m ato de equilí-
brio impossível. Durante a noite de 20 de agosto de 1968, os
tanques soviéticos entraram na Tchecoslováquia e, tal como
na Hungria doze anos antes* esmagaram u m ensaio esperan-
çoso de pluralismo p o l í t i c o / s a b i a m e n t e , os tchecos optaram
por não resistir, poupando milhares de vidas. Desse ponto
e m diante, não havia mais dúvida de que o controle soviético
na Europa Oriental baseava-se, em última análise, na força
bruta e na vontade de usá-la
O ano de 1968 marcou t a m b é m u m a conjuntura impor-
tante na história interna da Europa Oriental na Guerra Fria.
E m maio, estudantes e trabalhadores e m Paris promoveram
u m a série de passeatas que quase derrubaram o governo de
Gaulle. O s protestos franceses foram apenas o mais drás-
tico de u m a série de desafios às estruturas predominantes de
poder que varreram a Europa Ocidental e os Estados Uni-
dos em 1968,./Embora cada m o v i m e n t o tivesse as suas p a r ^
ticularidades l o c a i s , o florescimento de u m a cultura jovem^
a " N o v a Esquerda", e u m espírito iconoclasta e antiautori-
tário na maioria das, democracias ocidentais sugerem laços
comuns entre e l e s . - O p r ó p r i o sucesso da ordem da Guerra
Frià na Europa Ocidental parecia ter criado u m a nova gera^
ção que aceitava como naturais os principais frutos dessa_
ordem - paz, estabilidade, abundância material, benefícios
sociais reforçados e oportunidades e d u c a c i o n a i s / N a França,
na Itália, na A l e m a n h a Ocidental e e m outras partes, essa
nova geração, eletrizada e m parte pela intervenção ameri-

134
cana impopular no Vietnã, começou a questionar algumas
das verdades centrais da Guerra Fria^A contenção do comu-
nismo precisava de intervenções sangrentas no Terceiro
M u n d o ? A União Soviética ainda era uma ameaça? Ainda
se justificava a presença de tropas americanas e armas nu-
cleares em solo europeu? As políticas ocidentais alternati-
vas_podiam reduzir a chance de u m A r m a g e d o n nuclear? O s
fatos vieram a demonstrar que o consenso da política externa
e_ militar da Guerra Fria começou a desmoronar n a Europa
Ocidental, então próspera, j u n t o c o m a ordem política q u e
ela.fo.mentara.

O l m p a c t o da Guerra Fria nos Estados Unidos


A Guerra Fria t a m b é m deixou u m a marca indelével n o
Estado e na sociedade americanos. N a verdade, n ã o deixou
nenhum aspecto da vida americana intocado^ C o m o resultado
direto dos temores de segurança provocados pela ameaça
comunista/soviética, o governo, federal assumiu u m p o d e r
e u m a responsabilidade imensamente exacerbados, a "pre-
sidência j m p e r i a r j D ç u p o u o centro do palco, u m a u m e n t o
substancial nos gastos d e defesa tornou-se u m a característica
permanente do orçamento federal e u m complexo militar-
-industrial deitou raízes na sociedade americana. /As amplas
mudanças pós-1945 nos padrões residenciais e nas estrutu-
ras ocupacionais do país também são, e m grande medida,
u m subproduto da Guerra Fria, assim como a cooptação d e
inovações científicas e tecnológicas .para fins relacionados
à esfera militar e a concomitante transformação de muitas
universidades de prestígio e m locais proeminentes de pes-
quisa patrocinada pelo governo ./Muitas prioridades nacio-
nais específicas f o r a m modeladas de m o d o semelhante e, e m
alguns casos, explicitamente justificadas pela Guerra Fria:
desde a proposta de u m sistema de rodovias interestaduais,
apresentada p o r Eisenhower, ao aumento de gastos federais
em educação e à exploração espacial. Até m e s m o a trajetó-
ria do m o v i m e n t o d o s direitos civis foi influenciada p e l o

135
conflito soviético-americano, embora de maneira contradi-
tória. Os segregacionistas tentaram inicialmente desvirtuar
a luta dos negros pela liberdade pichando os adeptos dessa"
causa c o m as tintas do comunismo, mas sua campanha aca~
bou contrabalançada pelo fato de as administrações Eisenho-"
wer e K e n n e d y reconhecerem que a continuação do sistema
de subordinação racial nos Estados sulistas e a recusa dos"
direitos essenciais aos afro-americanos m a n c h a v a m a ima-
g e m global dos Estados Unidos, f o r m a n d o assim u m passivo"
inaceitável da Guerra Fria.
Política, cultural e psicologicamente, a Guerra Fria alte-
rou o perfil da vida americana de múltiplas formas. A confor-
midade ideológica exigida por muitas das elites políticas da
nação provocou u m estreitamento dos limites admissíveis do
discurso político, colocando vários movimentos reformistas na
defensiva e deixando alguns liberais vulneráveis a acusações
de radicalismo e deslealdade: A "caça aos vermelhos" e a culpa
por associação com pessoas suspeitas tornaram-se u m a tática
comum, ainda que deplorável, nas eleições locais e nacionais,
na política sindical e nas investigações de funcionários do
governo, professores e membros da indústria cinematográfica,
entre outros. O historiador Stephen J. Whitfield responsabiliza
a_Guerra Fria "pela sufocação da liberdade e pelo aviltamento
da própria cultura" nos Estados Unidos, especialmente durante^
década de 50. Ela fomentou uma repressão, ele argumenta,
que "enfraquecia o legado "dé liberdades civis, contestava os
padrões de tolerância e equidade e manchava a própria ima-
gem da democrac i a ' ^ O s estudiosos Peter J. Kuznick e James"
Gilbert localizam o maior impacto da Guerra Fria no âmbito
difuso da psicologia social: "Ela persuadiu milhões de ameri-
canos", eles escrevem, "a interpretar seu mundo em termos de_
"Inimigos insidiosos no país e no exterior que os ameaçavam
' c o m a aniquilação nuclear ou outras formas de extermínio".
"Em suma, o m e d o difundido de inimigos internos e externos
constitui u m legado-chave da Guerra Fria,//"
S e m dúvida, o temor de toda a sociedade diante da
ameaça potencial que o c o m u n i s m o representava dentro
136
dos Estados Unidos é u m a das manifestações mais imedia-
tas e impressionantes da Guerra Fria no p a í s / É s s e temor era
incubado por u m determinado conjunto de elites para seus
próprios fins. Havia comunistas nos Estados Unidos, certa-
mente, ainda que não fossem muitos. O Partido Comunista
americano vangloriava-se de ter cerca de 32.000 m e m b r o s
em 1950, o m e s m o ano e m que o mais notório anticomu-
nista, o senador por Wisconsin Joseph McCarthy, lançou sua
primeira cruzada sensacionalista contra as supostas hordas
de comunistas que, ele acusava, residiam nas salas do pró-
prio governo americano . / p ara considerar esse n ú m e r o e m
perspectiva, o total de m e m b r o s da Igreja Luterana Evan-
gélica finlandesa era igual ao dos associados do Partido
Comunista^ Havia também comunistas ou simpatizantes do
comunismo n o ramo executivo do governo, apesar de n u n c a
serem mais que u m punhado. O caso mais importante foi o
de Alger Hiss, u m ex-funcionário de nível médio n o Depar-
tamento de Estado que espionou para a União Soviética e
foi condenado por perjúrio n u m j u l g a m e n t o a c o m p a n h a d o
de perto e m 1948.
Entretanto, M c C a r t h y e outros políticos sectários exa-
geravam deliberadamente o problema, m a n i p u l a n d o os
temores públicos para fazer avançar sua própria carreira.
O f a t o d e que o bombástico M c C a r t h y tivesse escolhido
n i n g u é m m e n o s que George Marshall p a r a vilipendiar e m
d e t e r m i n a d o m o m e n t o aponta a tática inescrupulosa e a
desonestidade f u n d a m e n t a l do senador.^O altamente respei-
tado ex-general e ex-secretário de Estado e D e f e s a , decla-
rou McCarthy, fazia parte de " u m a conspiração t ã o i m e n s a
e de u m a i n f â m i a tão negra a ponto de eclipsar qualquer ini-
ciativa anterior desse tipo n a história h u m a n a " . T a m p o u c o
estava sozinho e m fazer acusações absurdas para manter os
adversários políticos na defensiva^/O congressista da Cali-,
fórnia, senador Richard M. N i x o n / p o r exemplo, o p r i n c i p a l
acusador de Hiss, devia sua escalada até atingir proeminên-*
cia nacional à reputação que desenvolveu por perseguir os
subversivos c o m u n i s t a s c o m i n c o m u m obstinação. C o m o

137
c o m p a n h e i r o da chapa de E i s e n h o w e r em 1952, N i x o n ata-
cou certa vez o candidato d e m o c r a t a à presidência Adiai
Stevenson por ser u m "conciliador" c o m título de "Ph.D.
obtido na escola covarde de contenção comunista de D e a n
Acheson".
Apesar da merecida atenção que o macarthismo, ver-
são extrema da caça às bruxas comunistas, t e m recebido dos
estudiosos, outros efeitos internos da Guerra Fria revelaram-
-se realmente de maior alcance^íO crescimento maciço dos
gastos da defesa, com seus efeitos explosivos sobre a econo-
mia nacional global, as oportunidades ocupacionais e os des-
locamentos da população, merece ser reconhecido como o
agente mais poderoso de m u d a n ç a nos Estados Unidos nesse
período. Durante as duas primeiras décadas da Guerra Fria,
o governo federal investiu Ü S $ 776 bilhões na defesa nacio-
nal, aproximadamente 60% do orçamento federal total /fessa
porcentagem torna-se ainda mais elevada, caso se incluam"
os gastos indiretos relacionados c o m a d e f e s a / A s necessi-
dades da defesa logo passaram a dominar as prioridades de
pesquisa e desenvolvimento da nação, quando cientistas e
engenheiros na iniciativa privada e nas universidades luta-
v a m para satisfazer as necessidades do governo — e colher
contratos lucrativos ao longo desse processo. Indústrias
inteiramente novas ou recém-revigoradas, inclusive na área
de comunicação, eletrônica, aviação, computação e explora-
ção do espaço, expandiram-se j u n t o c o m a Guerra Fria e, em
grande medida, p o r causa do conflito ..Algumas dessas indús-
trias, nas palavras perspicazes da economista A n n Markusen,
"alterariam irrevogavelmente o cenário regional, ocupacio-
nal e econômico americano". Entre as maiores ramificações
dos gastos de defesa provocados pela Guerra Fria, estava o
florescimento de parques industriais de defesa no sul e no
oeste do país e m detrimento da base industrial mais antiga
no nordeste e no meio-oeste. Somente a Califórnia recebeu
mais de U S $ 67 milhões em contratos de defesa entre 1951
e 1965, cerca de 2 0 % do total, quando a Guerra Fria ajudou_
a fomentar o crescimento do c h a m a d o cinturão__do_sol. Ela
138
estimulou, por motivos associados a esse desenvolvimento,
u m a grande migração demográfica da população americana
"para o oeste e para o sul, b e m como u m a reavaliação c o m -
plementar das escalas do poder político no Congresso e n o
sistema partidário: os dois processos foram marcos da era
pos-Segunda Guerra Mundial,
A s imensas necessidades orçamentárias e as múltiplas
obrigações militares que a Guerra Fria impôs ao p o v o ameri-
cano requeriam cidadãos mobilizados e engajados. O s líderes
dos Estados Unidos, de Truman em diante, trabalharam assi-
duamente para forjar u m consenso interno que sustentasse
o n o v o papel da nação c o m o o guardião sempre vigilante
do m u n d o contra qualquer sinal de instabilidade ou agressão
inspiradas pelo comunismo. Eles conseguiram cumprir essa
tarefa c o m talento e sucesso absolutos até meados da década
de 60, ajudados pelo que pareciam evidências inequívocas
de temeridade soviética e chinesa na E u r o p a Oriental e e m
Perlim, b e m c o m o na Coréia, e m Taiwan e e m C u b a . # o r é m ,
quando a Guerra Fria entrou em sua terceira década, o con-
senso começou a rachar. A Guerra do Vietnã deixou b e m
claro para os americanos os custos altos - e, para u m n ú m e r o
crescente de cidadãos, inaceitáveis — da hegemonia global de
sua nação. A guerra, que provocou o maior movimento pela
paz na história dos Estados Unidos, desencadeou u m debate
interno dilacerante sobre o preço do globalismo americano^
Esse debate se alastrou ferozmente pelo final da década de
60, tornando necessária u m a reavaliação, nos mais altos
níveis do governo americano, da estratégia global da Guerra
Fria, que havia deixado o país por demais comprometido e
profundamente dividido.

139

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