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A MÚSICA DA FALA.

A ORALIDADE DA POESIA

Amador Ribeiro Neto

Há uma tradição na música popular brasileira de explorar um modo de cantar calcado nas
entonações da fala. Aquela coisa da ginga do malandro de morro vem daí e faz escola na
nossa MPB a partir de Donga e a gravação do nosso primeiro samba, “Pelo telefone”, em
1917, e chega ao ano 2014 na interpretação tão malandra quanto original de Zeca
Pagodinho. Ou Marcelo D2. Ou Criolo. Este balanço maroto que a voz cantada surrupia da
fala é bem diferente dos dós-de-peito dos tenores que acham que cantar bem é estourar
tímpanos dos ouvintes de música popular.

Mas o que nos interessa é aquela coisa da ginga, do molejo, da musicalidade que habita a
fala de cada um de nós. Sabemos que a entonação da fala possui um tipo de
musicalidade. Alguns músicos sacaram muito bem isto. Noel Rosa foi um deles. Com seu
jeito macio de falar, com o fio de uma voz fraquinha que vinha de um pulmão doente, o
compositor de “Feitio de Oração” inovou a interpretação em nossa MPB, além de fazer
escola. Mário Reis e depois João Gilberto souberam muito bem desafinar o coro dos
tenores. Esses intérpretes inventaram uma nova maneira de cantar incorporando a
tecnologia do microfone, que amplia a voz e dispensa os contorcionismos pulmonares.

Noel talvez seja nosso primeiro intérprete bossanovista. Nara Leão alcunhada de “os
joelhos que cantam” (tinha belas pernas, era tímida e cantava suavíssimo) renovou o
modo de cantar popular entre nós. Sua interpretação sensível e miúda, aliada a um
repertório engajado com o que melhor se fazia na época, deixa saudades, além de boas e
bons herdeiros, felizmente. Pena que ao ser substituída no espetáculo “Opinião” (em 1964)
pela estreante Maria Bethânia, a garra-carcará do modo de cantar atarracado aos pulmões
tenha voltado à moda. Bethânia musicalmente é uma anti-Nara: enquanto para a primeira
cantar é interpretar stanislaviskamente, para a segunda o canto é sempre brechtniano. Ou
seja: Bethânia enche os pulmões e solta a voz em todas as direções, atingindo e
derrubando quem estiver na área. Nara é parcimoniosa: seu canto é produto de um ato de
contenção e elaboração cerebral da voz; a emoção é filtrada pelo rigor de um canto-falado.
Nara canta como quem está pensando, tal como nos versos de Fernando Pessoa: “o que
em mim sente está pensando”. Síntese de razão e emoção. Bethânia, com o passar dos
anos, tem dado uma colher de chá ao seu lado “Nara”, sem dúvida. Mas o carcará ainda
domina. Não como negar.

A poesia, num primeiro momento, ao ser fixada no papel, dispensou a memória e a


oralidade. Cristalizou-se em formas fixas e começou a emaranhar-se num círculo de
formas e sentidos vários. O papel agora fazia o que a memória não permitia: guardar
termos e ritmos arqui-irregulares, elencar expressões até então só dicionarizadas, realçar
os esdrúxulos como requintes poéticos. Era a hora a vez da poesia empolada, palaciana,
cheia de volteios e lero-leros.

Felizmente este foi apenas um momento. Embora, de tempos em tempos, poetas insistam
na acepção de que fazer poesia (e muitas vezes prosa e até crítica literária) é embolar o
meio de campo do texto com metáforas cifradas ou jogos de palavras numa colagem
nonsense. De repente, aquela besteira fácil e inconsequente que os surrealistas
denominaram “escrita automática” vira moda entre os incompetentes que querem “fazer”
literatura ou “crítica” literária.

Por sorte sempre tivemos autores que romperam com o círculo fácil do preciosismo verbal
enquanto qualidade literária. Na época colonial, Gregório de Matos é um grande exemplo
da poesia que se apropria da oralidade da fala sem comprometer minimamente a
fabricação do texto poético. Não é à toa que ainda hoje nós o lemos com muito deleite.
Lemos e cantamos Gregório com muito prazer, já que não são poucos os poemas seus
que viraram canções, por exemplo, nas vozes de Maricene Costa e Caetano Veloso.
Indo além do período barroco encontramos outros poetas que prezaram a oralidade
enquanto qualidade estética. Tomás Antônio Gonzaga (com Marília de Dirceu e Cartas
Chilenas), Álvares de Azevedo (com Lira dos Vinte Anos), Cruz e Sousa
(com Broquéis) e Augusto dos Anjos (com Eu) foram oásis de respiração oral em meio a
uma enxurrada de beletrismos. A partir de 1922, com os modernistas, a literatura se deu
conta de que para ser boa uma obra não precisa desprezar a fala. Pelo contrário: a
oralidade garantiu a qualidade de muitos poetas modernistas, como Manuel Bandeira,
Mário e Oswald de Andrade.

Drummond veio logo depois e foi logo reclamando da pedra no meio do caminho que uns
parnasianos anacrônicos queriam ressuscitar. E que finalmente ressuscitaram com a
geração de 45, exceção feita ao grande João Cabral de Melo Neto, inserido nesta geração
apenas cronologicamente. Cabral radicalizou a fala em Morte e Vida Severina e em Dois
Parlamentos. Mas dela nunca abriu mão. Talvez fosse um bom tema de reflexão: o rigor
de uma forma valéryana associado a uma oralidade não menos radical.

A partir da produção dos modernistas, e até nossos dias, oralidade está ligada ao que há
de mais experimental em nossa poesia. A poesia de Cego Aderaldo pode ser tão
importante quanto a de Mallarmé. Augusto de Campos, nosso maior poeta vivo, fez esta
observação há quase meio século.

https://prezi.com/ipc3tdm8uyc0/a-musica-no-contexto-da-oralidade-ritual-
transmissao-e-tr/

1.
Lá ia eu comer, todo feliz,
Quando no Pilotis
Ouço a notícia triste
Que acabara a batata frita
Uma colega grita
Só sobrou alpiste
Para acalmá-la, Samba de breque
Digo calmamente,
No Café Vicente
Já tem chocolate
Mas ela, histérica, na minha cara
Diz feito uma arara
Isso é um disparate!

2.
Eu quero ouvir você contar
Para o povo da ESEM Embolada
Como é a sua língua
Tudo de bom que ela tem

3.
Eu agora vou cantar
Contra toda intolerância Repente
E você que me escutar
Largue a sua ignorância

4.
Eu não quero fama ou riqueza
Não quero saber de ostentação
Eu te falo com muita franqueza Rap
Eu só quero saúde e educação

5.
É duro de acreditar
Já estou perdendo a esperança Partido-alto
De esse mundo mudar
Temos de salvar as nossas crianças

O curso de Português Instrumental pretende potencializar, no quadro de discentes da Estácio


as habilidades técnicas específicas tanto para o uso das normas da língua portuguesa quanto para a
compreensão e elaboração de textos e documentos institucionais.

É doutorando e mestre em Língua Portuguesa pela UERJ, licenciado e bacharel em Letras,


com habilitação em português-literaturas, pela UFRJ, especialista em Língua Portuguesa pelo
Instituto de Língua Portuguesa do Liceu Literário Português, especialista em Docência do Ensino
Superior, pela Universidade Estácio de Sá, Especialista e Educação à Distância, pela Uniseb. É
professor de Língua Portuguesa na Escola Sesc de Ensino Médio e professor substituto do
Departamento de Língua Portuguesa do Instituto de Letras da UERJ. Foi professor substituto de
Língua Portuguesa e Literatura Brasileira do CEFET - campus Itaguaí e de Técnicas de
Comunicação Aplicada do Curso de Guia de Turismo do CETEP - Ipanema. Foi professor de Tempo
Integral da Universidade Estácio de Sá de 1999 até dezembro de 2017, onde atuou como
professor presencial de Sintaxe, Morfologia, Formação da Língua Portuguesa, Produção Textual
e Estágio Supervisionado no curso de Letras, Comunicação nas Empresas, Comunicação e
Expressão, Língua Portuguesa e Português Instrumental nas turmas de Administração, Marketing,
Recursos Humanos e Redes de Computadores, professor tele transmitido de Formação da Língua
Portuguesa e tutor online da mesma disciplina do curso de Letras a distância ou semipresencial.
Promove treinamentos em língua portuguesa, redação profissional e comunicação empresarial
em instituições públicas e privadas do Estado do Rio de Janeiro. É coordenador e professor de
Língua Portuguesa do Curso pra Concurso e diretor do Instituto Langue e Parole, dedicado a
estudos, descrição e ensino da língua portuguesa. É autor do Pequeno Dicionário do Futebolês,
publicado em 2014, pela Editora Macabea e reeditado pela Multifoco Editora em 2017 e do livro
Didático Formação da Língua Portuguesa, Seses Editora, 2017. . (Texto informado pelo autor)

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