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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA

FILHO”

Genilson Donizete de Jesus Faria


Lucas Gomes Granero
Luís Gustavo Nunes Barbosa
João Victor Vedovelli Zago
Jonathan Toshio Maciel da Silva

TRABALHO DE HISTÓRIA DO DIREITO


Segunda Guerra Mundial e o Tribunal de Nuremberg

Franca – SP
2019
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA
FILHO”

Genilson Donizete de Jesus Faria


Lucas Gomes Granero
Luís Gustavo Nunes Barbosa
João Victor Vedovelli Zago
Jonathan Toshio Maciel da Silva

TRABALHO DE HISTÓRIA DO DIREITO


Segunda Guerra Mundial e o Tribunal de Nuremberg

Trabalho semestral da matéria de História do


Direito apresentado ao curso de Direito, da
Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”, como requisito de aprovação
semestral.

Franca – SP
2019
RESUMO
Este trabalho possui uma abordagem histórica com ressalvas de aspectos jurídicos acerca do
contexto histórico da Primeira Guerra Mundial, o período entre guerras, a Segunda Guerra
Mundial e o período pós-guerra, com ênfase nos crimes de guerra cometidos pelos alemães, em
específico, os líderes nazistas. Por meio de pesquisas literárias, estabeleceu-se os parâmetros
principais para sintetizar o desenvolver histórico na formação do Tribunal de Nuremberg, bem
como seus precedentes, sua criação, e sua atuação no julgamento dos crimes de guerra nazistas.
Também foram abordados os pontos controversos do Tribunal de Nuremberg e suas
implicações para o Direito Penal Internacional.
Palavras-chaves: Crimes de guerra, Tribunal de Nuremberg, julgamento.
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 5
1.1. Obra literária – O Julgamento de Nuremberg......................................................................... 5
1.2. O Tribunal de Nuremberg ....................................................................................................... 5
1.3. Julgamento justo ou linchamento legalizado? ........................................................................ 5
1.4. Local e conduta do tribunal..................................................................................................... 6
2. CONTEXTUALIZAÇÃO................................................................................................. 6
2.1. Primeira Guerra Mundial ........................................................................................................ 6
2.2. Período entre guerras ............................................................................................................. 7
2.3. Segunda Guerra Mundial ........................................................................................................ 9
2.4. Declaração de Moscou ............................................................................................................ 9
3. TRIBUNAL DE NUREMBERG .................................................................................... 10
3.1. Criação do Tribunal de Nuremberg ....................................................................................... 10
3.2. Composição ........................................................................................................................... 11
3.3. Competência do Tribunal de Nuremberg.............................................................................. 11
3.4. Julgamento e sentenças ........................................................................................................ 12
4. PONTOS CONTROVERSOS ........................................................................................ 12
4.1. Apontamentos iniciais ........................................................................................................... 12
4.2. Princípio do juiz natural ........................................................................................................ 13
4.3. Princípio do Duplo Grau de Jurisdição .................................................................................. 14
4.4. Nullum crimen, nulla poena sine lege praevia ...................................................................... 14
4.5. Tu quoque ............................................................................................................................. 15
4.6. À título de contraponto ......................................................................................................... 16
5. O TRIBUNAL DE NUREMBERG COMO PONTO DE INFLEXÃO NO DIREITO
INTERNACIONAL PENAL ................................................................................................. 16
5.1. Considerações iniciais ........................................................................................................... 16
5.2. A importância da codificação da jurisdição do Tribunal ....................................................... 17
5.3. Os caminhos para o estabelecimento do Tribunal Penal Internacional ............................... 18
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 18
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 20
RESOLUÇÃO DA QUESTÃO DE HISTÓRIA DO DIREITO......................................... 21
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1. INTRODUÇÃO
1.1. Obra literária – O Julgamento de Nuremberg
O Julgamento de Nuremberg é um filme com a direção de Stanley Kramer, tem como
objetivo elucidar a vida de um juiz americano aposentado designado a presidir um julgamento
responsável de julgar quatro juízes alemães que se utilizaram de recursos jurídicos, bem como
de suas próprias competências para legalizar as atrocidades dos nazistas durante a Segunda
Guerra Mundial. O ponto conflituoso da obra reside no contexto histórico em que está inserido:
o período pós-guerra. Neste contexto, havia o princípio de rixa entre dois grandes sistemas
econômicos: o socialismo e o capitalismo, ou seja, dava-se início à disputa entre os Estados
Unidos e a União Soviética, dessa forma, aplicava-se uma grande pressão política no
julgamento. O filme também apresenta o desenvolvimento do tribunal, e os aspectos que serão
abordados ao longo do trabalho.

1.2. O Tribunal de Nuremberg


Após a guerra restava a dúvida: o que fazer com os líderes do alto escalão nazista
capturados? Churchill defendia a execução sumária dos capturados. Se os nazistas atiram em
alguém sem julgamento, como pode ser crime se as nações aliadas fizessem a mesma coisa.
Porém, o cometimento de um crime não justifica outro e havia na sociedade um anseio por um
julgamento justo e um temor de que um tribunal constituído apenas para condenar trouxesse de
volta o inconformismo alemão após primeira grande guerra. Um julgamento justo
proporcionado pelas nações aliadas (EUA, Rússia, Inglaterra e França) seria um dos mais
significativos tributos do poder à razão.

1.3. Julgamento justo ou linchamento legalizado?


Seria importante que o tribunal não fosse visto como um triunfo do poder superior, ou
seja, os vencedores indicando punições sobre os perdedores, mas sim, o triunfo da moral
superior, de forma que a guerra agressiva seja tratada como crime. Este tribunal não busca
tornar a guerra impossível, mas sim, que os chefes se coloquem sob as forças das leis
internacionais, seus preceitos, suas proibições, suas sanções e sua ética ao lado da paz.
Fornecendo um julgamento justo (e não um linchamento legalizado) aos réus, não
limitando seus direitos de defesa - característica dos tribunais de exceção este tribunal
estabeleceria uma base de conduta entre nações pois até aquele momento toda nação tinha seus
códigos penais, porém não existia um código para o mundo inteiro. Esse “código penal” para o
mundo veio a ser mais tarde, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em 1998,
mais de meio séculos após a segunda guerra e após uma série de negociações, finalmente criou-
se o Tribunal Penal Internacional permanente com competência para julgar os crimes mais
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graves contra a comunidade internacional onde quer que tenham sido cometidos. Dentre os
crimes de competência do tribunal estão: crimes de guerra, genocídio, crimes contra a
humanidade e agressão.
1.4. Local e conduta do tribunal
O local escolhido pelas nações vencedoras para o tribunal foi a cidade de Nuremberg
devido ao fato de ali ser considerado o centro conceitual do nazismo e terem ocorrido as maiores
manifestações pró-Hitler. O antigo Palácio da Justiça alemão era um dos poucos prédios ainda
de pé após os vários bombardeios.
Decidiu-se por um julgamento principal, dos líderes das diferentes áreas do governo
nazista e das forças armadas alemãs, o “Julgamento dos Grandes Criminosos de Guerra
Nazistas.” Durante o processo os promotores se atentaram ao fato de os crimes praticados
durante a guerra nunca terem sido chamados de crimes. Então procuraram enquadrar os nazistas
por desobedecerem às leis já existentes tais como tratados de paz, tratados de fronteira, a
Convenção de Genebra e a Convenção de Haia. Dentre os crimes praticados pelos nazistas cita-
se a repressão aos sindicatos alemães, a perturbação à igreja e da perseguição aos judeus que
de mero preconceito se transformou em deliberado extermínio além do terror e devastação
espalhados nos territórios ocupados.
Findo os trabalhos desse julgamento, outros julgamentos seriam realizados, sempre sob
a regência do Estatuto e do Acordo de Londres (apesar desses julgamentos serem conduzidos
sempre somente pelos EUA), cada julgamento específico para um grupo homogêneo de réus.
Nunca, na história da humanidade, se testemunhou matança em tão grande escala. Esses
homens alegam inocência afirmando que apenas cumpriam as ordens de Hitler, porém
intoxicaram a alma do Führer com poder e adulação. Eles colocaram uma arma na mão de Hitler
e, quando ele disparou, eles aplaudiram.

2. CONTEXTUALIZAÇÃO
2.1. Primeira Guerra Mundial
O contexto histórico da Primeira Guerra Mundial é extremamente relevante para
explicar os motivos que levaram os países envolvidos neste primeiro período conflituoso, a
entrarem novamente em conflito poucos anos depois, na Segunda Guerra Mundial. As causas
da Primeira Guerra Mundial explicitam a situação crítica em que se encontravam os valores de
paz mundial, ainda prematuros e de veras vulneráveis aos interesses econômicos de países ainda
em processo imperialista. A partilha de territórios do continente africano e do continente
asiático, foi um procedimento de caráter altamente etnocêntrico e imperialista, e que gerou
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grandes desentendimentos entre os países europeus, em decorrência da desigualdade da


partilha, haja vista que a Inglaterra e a França encontravam-se no auge de seu imperialismo.
Por serem grandes potências econômicas, França e Inglaterra acirravam disputas não só entre
si, mas entre os outros países da Europa, o que incluía não só disputas econômicas, mas questões
que envolviam conflito de culturas e principalmente conflitos políticos. Outro fator que
contribuía para que houvesse conflitos reside no fato de que, países recém-formados, detinham
um grande sentimento nacionalista, o que era o caso da maioria dos Estados, em especial a
Alemanha.
2.2. Período entre guerras
O período entre guerras foi de extrema relevância para o direito penal internacional,
visto que a Primeira Guerra Mundial havia terminado há pouco e grande parte dos delitos
cometidos durante a guerra não foram julgados, portanto tentou-se trabalhar no campo do
direito para que esses delitos não passassem em branco.
Em 1924, confiando na norma jurídica, alguns juristas fundam, na Universidade de
Paris, a Associação Internacional de Direito Penal (AIDP), sendo que um dos seus objetivos
era o estabelecimento de um Tribunal Penal Internacional permanente.
Em 1926, no I Congresso Internacional de Direito Penal, organizado pela AIDP em
Bruxelas, discutiu-se o tema. Como consequência, em 1927, a AIDP propõe à Liga das Nações
(uma pré-ONU) a criação de uma Câmara Criminal da Corte Permanente de Justiça
Internacional. Procurava-se, assim, o estabelecimento dos princípios de direito penal
internacional e, principalmente, da responsabilidade penal do indivíduo no campo
internacional.
No plano diplomático, devem ser reconhecidos alguns esforços no sentido de declarar a
ilicitude da guerra de agressão. Assim foi tratado no Protocolo de Genebra de 2 de outubro de
1924, que estabeleceu o princípio da arbitragem obrigatória, além de qualificar, pela primeira
vez, a guerra de agressão como crime internacional.
Em 1928, a mesma Liga das Nações ajustou o tratado geral de renúncia à guerra,
denominado Pacto Briand-Kellog, que definiu a guerra somente como ilícita, e não como
criminosa, além de estabelecer que os atos de agressão proibidos por suas disposições somente
geravam responsabilidade do Estado, sem estendê-la às pessoas que a organizaram e ordenaram.
Paralelamente, em 1920, a Liga das Nações criou um Comitê Consultivo de Juristas,
com a incumbência de preparar um projeto de tribunal de justiça permanente, como
prolongamento dos princípios estabelecidos em 1919. Recomendou-se que essa jurisdição fosse
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competente para "julgar crimes que constituem violação da ordem pública internacional da Lei
Universal das Nações", princípio invocado pela Assembleia da Liga das Nações.
Neste âmbito, se elaborou um projeto, por iniciativa do representante belga, Barão
Deschamps, de constituir um alto Tribunal de justiça internacional, criado para processar a
todos aqueles que fossem responsáveis por delitos contra a ordem pública internacional e contra
a lei universal das nações. Neste projeto, o Comitê sugeriu que tal Tribunal tivesse a faculdade
de definir a natureza do delito, fixar a pena e decidir os meios apropriados para a execução da
sentença.
Depois de analisar o projeto, a Terceira Comissão da Assembleia da Liga das Nações
declarou que era inútil estabelecer, além do Tribunal Permanente de Justiça Internacional, outro
Tribunal de caráter penal. A melhor alternativa seria confiar as causas criminais aos tribunais
ordinários, como vinha se desenvolvendo até então, segundo o costume e o procedimento
internacional. Ao mesmo tempo, se recomendou que, no futuro, chegaria o dia em que seria
necessário a constituição de uma sala penal no Tribunal Permanente de Justiça Internacional.
Estes trabalhos receberam forte impulso após o atentado ocorrido em Marselha em 9 de
outubro de 1934, perpetrado por terroristas macedônios e croatas, que vitimou o estadista Jean-
Louis Barthou, presidente do Conselho da República Francesa, e o Rei Alexandre I, da
Iugoslávia, provocando a realização da Conferência Internacional para a Repressão do
Terrorismo, ao final da qual foi concluído o primeiro instrumento jurídico que considerava o
terrorismo crime internacional, a Convenção para a Prevenção e Punição do Terrorismo.
O Protocolo da Convenção para a Prevenção e Punição do Terrorismo incluía também
uma Convenção para o Estabelecimento de um Tribunal Penal Internacional, onde tal Tribunal
que se pretendia criar destinava-se a julgar pessoas acusadas das condutas tipificadas como
terrorismo. Esta Convenção para a criação de um Tribunal Penal Internacional da mesma forma
não chegou a entrar em vigor internacionalmente, por falta de ratificações, mas se reconhece
que tal esforço apresentou um extraordinário interesse jurídico e histórico para a codificação da
matéria.
Percebe-se, assim, que durante o final do século XIX e início do século XX o crime de
guerra foi considerado crime internacional e, neste período entre guerras, o terrorismo passou
a ser considerado pela comunidade jurídica como o segundo crime internacional. Neste quadro,
nota-se que o momento histórico era mesmo impossível a criação de um Tribunal Penal
Internacional, já que se alinhavavam os novos fatos históricos internacionais que ocasionariam
na eclosão da Segunda Guerra Mundial e todas as suas violações aos direitos humanos.
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2.3. Segunda Guerra Mundial


Pode-se considerar que a Segunda Guerra Mundial foi uma mera continuação da Guerra
de 1914-1918. As questões, principalmente o revanchismo alemão, que envolviam as potências
europeias acabaram levando-as ao conflito não só não foram resolvidas, como foram acirradas
no período entre guerras e acabaram por gerar a grande tragédia iniciada em 1939.
No contexto da II Guerra Mundial, tem-se um conflito significativamente marcado por
inovações em termos de combate. Nunca houvera antes uma guerra naqueles moldes: novas
violações às garantias fundamentais da pessoa humana foram postas em prática, violências
quase que inconcebíveis até então passaram a ser infligidas contra indivíduos, populações ou
mesmo etnias inteiras. Sobretudo na fronte oriental da Europa e na guerra no Pacífico
atrocidades eram cometidas. Esta Guerra foi marcada por novas modalidades de violência, que,
de tão atrozes, tornavam-se pouco previsíveis. E sob a ótica jurídica, salvo em alguns crimes de
guerras específicos, as novas e drásticas violações eram tão absurdas, que não havia sequer
previsão de tipificação delas no sistema jurídico internacional. Por outro lado, seria inaceitável
que aqueles que tivessem cometido tantas atrocidades escapassem incólumes com o fim das
hostilidades. Não se poderia admitir que aquelas atrocidades se tornassem usuais em possíveis
conflitos posteriores. Ainda no decorrer da guerra as partes combatentes preparavam-se para
estabelecer punições aos considerados culpados por tão graves violações, após o desfecho do
conflito.
2.4. Declaração de Moscou
Em 17 de dezembro de 1942, os EUA, a URSS e a Grã-Bretanha fizeram uma
proclamação, à qual se seguiu uma outra, dada a conhecer em 5 de janeiro de 1943, nas quais
indicavam a intenção dos aliados de responsabilizar os alemães e a Alemanha pelos crimes de
guerra e pelas atrocidades cometidas durante o conflito.
O verdadeiro e principal marco preparatório para a formação do Tribunal de Nuremberg
foi a Declaração de Moscou, onde em 11 de fevereiro de 1943, durante a Conferência de Yalta,
Roosevelt, Churchill e Josef Stalin a subscreveram. Em 1º de novembro de 1943, a Declaração
de Moscou, adotada por esses líderes, em nome de seus respectivos governos, tornava explícita
a política dos aliados em relação aos criminosos do Eixo, que consistia em julgá-los após o
encerramento das hostilidades. Esta declaração estabeleceu os princípios adotados pelas Nações
Unidas para julgar os criminosos de guerra do 3º Reich:
[...] Ao acordar qualquer armistício com qualquer governo que possa ser
estabelecido na Alemanha, os oficiais e praças alemães e membros do Partido Nazista
que sejam responsáveis pelas atrocidades, massacres e execuções descritas acima ou
nelas tomaram parte consentânea, serão reconduzidos aos países onde seus
abomináveis atos foram cometidos, a fim de que possam ser julgados e punidos
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conforme as leis destes países libertados e dos governos livres que ali sejam
estabelecidos.
[...] Que aqueles que até o momento não banharam as mãos no sangue dos
inocentes resguardem-se de reunir-se ao rol dos culpados, porque podemos afirmar
que as Três Potências aliadas lhes perseguirão até as mais longínquas regiões da terra
e irão enviar-lhes de volta seus acusadores a fim de que seja feita a justiça. (Declaração
de Moscou)

Esta Declaração é feita sem prejuízo dos casos dos principais criminosos de guerra,
cujos delitos não tenham definição geográfica particular e que serão castigados por decisão
comum dos governos aliados.
Desta forma, percebemos que dois modos de repressão são claramente apresentados na
Declaração de Moscou. Primeiramente, tem-se a repressão local, para os crimes
individualizados, cometidos em um território específico, onde o julgamento destes criminosos
seria feito pelas autoridades do lugar onde haviam praticado o delito e com base no direito
comum daquela jurisdição. Em um segundo modelo de repressão, levavam-se em consideração
os chamados grandes criminosos de guerra, cujos delitos não tinham definição geográfica
específica. Foi por meio deste princípio que se teve o ponto de partida para a formação do
Tribunal de Nuremberg.

3. TRIBUNAL DE NUREMBERG
3.1. Criação do Tribunal de Nuremberg
Com o fim definitivo da Segunda Guerra com o rendimento incondicional da Alemanha
nazista em 8 de maio de 1945, o acordo de Potsdam previa que os criminosos de guerra
deveriam ser julgados. No entanto, nenhuma dessas declarações ou acordos estabelecia a forma
precisa para levar os responsáveis pelos crimes a tribunais.
Após muita discussão sobre a necessidade, a extensão e a forma do julgamento, em 8 de
agosto de 1945, durante a conferência de Londres, as quatro potências vencedoras – os Estados
Unidos, o Reino Unido, a União Soviética e a França – celebraram acordo destinado a
estabelecer as regras que deveriam orientar o processo e julgamento dos grandes criminosos de
guerra das potências europeias do Eixo. Este acordo, que subsequentemente recebeu a
assinatura de mais 19 Estados, ficou conhecido como a Carta de criação do Tribunal Militar
Internacional de Nuremberg, que acabou por ser conhecido como o Tribunal de Nuremberg.
Em 6 de outubro de 1945 foi aprovado o Estatuto do Tribunal de Nuremberg, contendo
30 artigos e estabelecendo no art. 4º que aquela seria uma corte quadripartite, à qual cada país
aliado deveria enviar um juiz titular e outro suplente, com a Presidência sendo exercida de
forma rotativa.
11

3.2. Composição
O Reino Unido indicou Geoffrey Lawrence – que também foi escolhido como
presidente do Tribunal – e Noram Birkett (suplente). Já os Estados Unidos indicaram Francis
Biddle e John Parker, como seu suplente. Por sua vez, a França indicou o professor Henri
Donnedieu de Vabres, Professor da Universidade de Paris e um dos maiores especialistas
europeus em direito internacional, e Robert Falco como seu suplente. Por fim, a União Soviética
teve o Major-General Iona T. Viktchenko e, também, o Tenente-Coronel Alexander F.
Volchkov.
O Ministério Público foi composto por equipes das potências, chefiadas,
respectivamente, por: Robert H. Jackson (EUA), Auguste Champetier de Ribes e François de
Menthon (França), Hartley Shawcross e David Maxwell-Fyfe (Reino Unido) e General Roman
A. Rudenko (URSS). [62]
Os advogados de defesa eram todos alemães, merecendo destaque os Drs. Hans Marx,
Otto Stahmer, Fritz Sauter e Gunther Von Rohscheidt
Como se pode constatar, embora o Tribunal tivesse a denominação de militar, todos os
juízes, salvo o soviético, eram civis e considerados juristas notáveis em seus países. A
denominação Tribunal Militar decorreu da necessidade de os Estados Unidos contornarem o
obstáculo do princípio da anterioridade da lei previsto no Direito Penal comum interno e
inexistente em seu Direito Penal Militar.
3.3. Competência do Tribunal de Nuremberg
O Tribunal poderia julgar pessoas que tivessem cometido crimes contra a paz, crimes
de guerra e crimes contra a Humanidade (Artigo 6), devendo a responsabilidade dos acusados
ser apurada tanto como indivíduos como quanto membros de organizações (Artigo 4). A estes
foram acrescidos ainda o crime de complô: Art. 6º - O Tribunal estabelecido por acordo
mencionado no art. 1º acima, para o julgamento e castigo dos grandes criminosos de guerra dos
países europeus do Eixo, será competente para julgar e punir quaisquer pessoas que, agindo por
conta dos países europeus do Eixo, tenham cometido, individualmente ou sob o título de
membros de organizações.
Apesar do Estatuto de Nuremberg não trazer o enquadramento de nenhum crime
definido como crime de organizações, mesmo assim seis entidades do nazismo foram
formalmente denunciadas perante o Tribunal: Gabinete do Reich, as SA, Corpo Diretivo do
Partido Nazista, as SS, a Gestapo, e o grupo formado pelo Estado-Maior e pelo Alto Comando
de Reich: o OKH (armada de terra), o OKM (armada marítima) e o OKL (força aérea). Acima
deles estava o OKW (comando superior militar) encabeçado por Hitler.
12

O texto do Estatuto, portanto, atribuía as responsabilidades das mais genéricas, de modo


que qualquer pessoa poderia ser indiciada, julgada e condenada com base em qualquer daqueles
preceitos do artigo 6º. A caracterização de cada delito específico ficaria a cargo da Corte, de
modo que a Acusação tinha grande facilidade em adequar qualquer conduta aos encargos de
amplo sentido elencados no Estatuto.
3.4. Julgamento e sentenças
Assim, em 20 de novembro de 1945, no Palácio da Justiça da cidade bávara de
Nuremberg, sob a presidência de Geoffrey Lawrence, juiz da representação britânica, foram
iniciadas as 403 sessões públicas do julgamento de vinte e quatro líderes nazistas capturados
pelas forças aliadas, dentre os quais vinte médicos considerados criminosos de guerra, devido
aos brutais experimentos realizados em seres humanos.
A cidade de Nuremberg foi escolhida porque além de representar o ponto de
concentração da zona de ocupação norte-americana, foi o centro irradiador do nazismo, bem
como ex-palco das mais gigantescas manifestações do partido Nacional-Socialista dos
Trabalhadores Alemães, nome oficial do Partido Nazista.
Ao longo de 218 dias de audiência, em 1º de outubro de 1946, o Tribunal divulgou as
sentenças absolvendo três réus, condenando nove à pena de prisão perpétua ou temporária, e, o
restante deles (doze) à pena de morte por enforcamento e condenando quatro organizações
criminosas.
Em 16 de outubro de 1946, os condenados à morte são enforcados no ginásio da prisão
de Nuremberg, onde posteriormente seus corpos foram secretamente incinerados em um
crematório de Munique e suas cinzas jogadas em um afluente do rio Isar, para que se evitassem
futuras glorificações. Em 18 de julho de 1947, os condenados à prisão são transferidos para a
penitenciária dos Aliados no complexo de Spandau, em Berlim, reservada exclusivamente aos
criminosos de guerra e sob controle das quatro potências vencedoras da Guerra.

4. PONTOS CONTROVERSOS
4.1. Apontamentos iniciais
As incongruências dos Julgamentos de Nuremberg com os princípios gerais do direito
já eram evidentes antes mesmo de sua instalação. Fica evidente no Estatuto do Tribunal o
esforço em superar algumas fragilidades na condução do processo e, durante os julgamentos,
outros pontos foram levantados pela defesa dos acusados, sendo objeto de apreciação no
decorrer do processo.
13

Durante a atuação da corte e nos anos seguintes, profusa produção acadêmica apreciou
as decisões tomadas pelo Tribunal à luz dos princípios gerais do direito penal, ora ratificando
as decisões tomadas, ora elencando elementos sensíveis na atuação do tribunal, sem prejuízo a
consideração uníssona da relevância da lide, de sua posição de vanguarda e da pressão da
opinião pública internacional por justiça.
Consideramos útil restringir a análise aos princípios mais citados na bibliografia
elencada, sem desconsiderar os desvios citados por correntes minoritárias. Para tanto, serão
abordados os princípios do juiz natural, do duplo grau de jurisdição, da reserva legal, da
irretroatividade da lei penal e da boa-fé objetiva.
4.2. Princípio do juiz natural
O primeiro ponto sensível, por evidente, é a legitimidade do tribunal para conhecer dos
delitos. A corte fora estabelecida pela Carta de Londres e organizado pelo Estatuto do Tribunal
Militar Internacional.
A Carta de Londres de 08 de agosto de 1945 estabelecia o tribunal dando-lhe
competência para processar criminosos de guerra com delitos sem região geográfica
determinada (art. 1º), posto que os delitos que pudessem ser geograficamente delimitados
seriam julgados nos países com jurisdição sobre o território em que o delito foi cometido (art.
4º). A corte seria estabelecida pelos governos dos Aliados, facultado a governos das Nações
Unidas aderir ao acordo (art. 5º).
O Estatuto, aprovado pelos Aliados 18 de outubro de 1945, em definia os delitos que
seriam apreciados (art. 6º), vedava aos réus ou a seus advogados questionar a competência do
Tribunal ou de seus membros (art. 3º), impedia que a posição ocupada fosse evocada para
mitigar a responsabilidade pessoal (art. 7º) resguardando ao Tribunal a possibilidade de atenuar
a pena caso os atos tivessem sido cometidos em obediência ao governo ou a superiores (art. 8º),
permitia a condenação in absentia (art. 12), facultava aos acusados conduzir sua própria defesa
(art. 16, d) ou indicar defesa técnica desde que dotados de capacidade postulatória (art. 23),
sustava às partes a possibilidade de recorrer da sentença garantindo apenas que as sentenças
fossem motivadas (art. 26), admitia pena de morte (art. 27) e a possibilidade de confisco dos
bens roubados (art. 28).
Os signatários de ambos os documentos eram os vencedores da Segunda Grande Guerra,
inexistindo anuência alemã anterior ou contemporânea aos fatos para a formação de um tribunal
internacional com competência para julgar crimes cometidos por seus nacionais em seu
território. A estrutura do tribunal, sua competência, rito, réus e objeto foram definidos pelos
vencedores sem participação dos vencidos ou de países neutros, senão para ratificar o que já
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estava pactuado. Para além da incompetência territorial, convém ressaltar a extemporaneidade


da instituição do tribunal, instituído ao término do conflito, quando os delitos – mesmo os
considerados permanentes – já haviam se encerrado.1
Um último ponto a ser considerado é a imparcialidade dos judicantes. Cada governo
Aliado indicou juízes titulares, suplentes e promotores para atuar nos processos, vetando aos
réus afetar sua seleção a qualquer pretexto. Nenhum magistrado de países neutros foi acionado
para apreciar os casos ou, junto dos vencedores, compor uma corte mista.2
Há entretanto que se ressaltar a amplitude da comoção gerada pelos crimes perpetrados
pelos réus e a dificuldade em apontar, dada a proporção do conflito, países que não se
envolveram nele em algum grau, além do tempo necessário para acionar os mecanismos
diplomáticos para apontar magistrados de países imparciais em circunstâncias que exigiam
tempestividade,3 bem como considerar os riscos de submeter qualquer processo penal ao clamor
da opinião pública em detrimento dos princípios gerais do direito.
4.3. Princípio do Duplo Grau de Jurisdição
O segundo ponto controverso dos julgamentos é a inexistência de qualquer corte de
apelação. Tratando-se de corte estabelecida com uma única instância e sem submeter-se a
nenhum nível dos tribunais nacionais dos países envolvidos, as decisões prolatadas pela corte
não eram passíveis de irresignação ou revisão, exceto pelo Conselho de Controle da Alemanha,
composto por representantes dos governos que ocuparam o território alemão.
Inexistindo argumentação jurídica para dar lastro ao estabelecimento de um tribunal de
exceção cujas decisões não se submetiam a nenhum grau de revisão, qualquer discussão a
respeito da competência do tribunal ou dos juízes (art. 3º) ou possibilidade de revisão das
decisões e sentenças (art. 26) foram eliminadas de plano pelo Tribunal em seu Estatuto.

4.4. Nullum crimen, nulla poena sine lege praevia


São de antiquíssima tradição os princípios que proclamam a competência exclusiva da
lei para tipificar o crime e a irretroatividade de seus efeitos4, de modo que compõe o fundamento
do ordenamento jurídico de todos os países envolvidos nos Julgamentos, tanto dos judicantes

1 FERRO, Ana Luiza Almeida. O Tribunal de Nuremberg: Dos Precedentes à Confirmação de Seus
Princípios. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. P. 27.
2 GONÇALVES, Joanisval Britto. Tribunal de Nuremberg 1945-1946. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar,

2004. P. 153.
3 EHRENFREUND, Norbert. The Nuremberg Legacy: How the Nazi War Crimes Trial Changed the

Course of History. 1ª Edição. ed. Nova Iorque: Palgrave Macmillan, 2007. P. 104-105. HERZOG,
Jacques-Bernard. A Justiça Penal Internacional, vinte anos após Nuremberg. In: Revista Brasileira de
Criminologia e Direito Penal. Rio de Janeiro: Instituto de Criminologia, 1966. S. 1, v.4, n. 14, P. 37.
4 GONÇALVES. Op. Cit. P. 136.
15

quanto dos julgados, especialmente nos países com sistema jurídico inspirados no sistema
romano-germânico5.
Nessa matéria, a Alemanha já havia aderido ao Pacto Kellogg-Briand também
conhecido como Pacto de Paris ou Pacto Multilateral contra a Guerra, assinado em 27 de agosto
de 1928, que renunciava à guerra como instrumento para a solução de disputas internacionais
privilegiando meios pacíficos. Também havia aderido ao Pacto da Sociedade das Nações,
assinado em Versalhes em 28 de junho de 1919, e às Convenções de Haia de 29 de julho de
1899 e de 18 de outubro de 19076, que postulavam a resolução pacífica de conflitos
internacionais, regulavam o tratamento de prisioneiros de guerra, proibiam o ataque,
bombardeio ou saque de cidades ou habitações indefesas, entre outras condutas levadas a cabo
pelos alemães (e pelos Aliados) na iminência e no decorrer do conflito7.
Algumas considerações, entretanto, fazem-se imperativas. Quando considerados os
crimes que o Estatuto reconheceu ao tribunal a competência para julgar, observa-se que apenas
os Crimes de Guerra já haviam sido tipificados previamente em acordos e tratados ratificados
pela Alemanha, os Crimes Contra a Paz e os Crimes contra a Humanidade são inovações do
Estatuto, logo, lei ex post facto.8 Em contrapeso, há quem argumente que o princípio da reserva
legal encontra limites em sua aplicação para além das esferas pátrias por ser o direito
internacional eminentemente consuetudinário e por constituir-se em uma garantia do indivíduo
frente às intempéries do Estado.9
4.5. Tu quoque
É indubitável que, no calor do conflito, ambos os lados se excederam e, sem grande
esforço argumentativo, é possível apontar ações dos Aliados que se enquadram perfeitamente
nos delitos tipificados e julgados em Nuremberg. Entretanto, em flagrante dissimetria, nenhum
deles foi objeto de apreciação.
À guisa de exemplo, os bombardeios americanos em Hiroshima e Nagasaki, em que
armas nucleares foram usadas contra alvos civis em agosto de 1945, foram solenemente
ignorados na condução do processo. O Pacto Molotov–Ribbentrop, conhecido como Pacto de
Não Agressão Germano–Soviético, assinado em Moscou em 23 de agosto de 1939 com

5 FREITAS, Alessandra Maria Martins de. O Tribunal de Nuremberg: Da tipificação de crimes contra a
humanidade a novos paradigmas no direito internacional. Revista eletrônica de Direito Internacional,
Centro de Direito Internacional (CEDIN), vol. 12, 2º semestre 2013. P. 10.
6 GONÇALVES. Op. Cit. P. 127-130.
7 MELLO, Rubens Ferreira. Textos de direito internacional e de história diplomática de 1815 a 1914.

Rio de Janeiro: [s. n.], 1950. P. 64.


8 GONÇALVES. Op. Cit. P. 158.
9 FERRO. Op. Cit. P. 106-108. EHRENFREUND. Op. Cit. P. 54-58.
16

protocolos secretos que organizavam a partilha do território polonês em zonas de influência


nazista e soviética, foi imputado a um dos acusados – Joachim von Ribbentrop – sem que
semelhante acusação, por simetria, fosse apresentada contra qualquer oficial soviético.
Entretanto, também neste caso, o próprio Estatuto do Tribunal afastava a possibilidade
de trazer à baila semelhante consideração, ao ser claro em afirmar a competência da corte em
apreciar os crimes perpetrados – exclusivamente – pelo Eixo Europeu (art. 1º).
4.6. À título de contraponto
É inegável, entretanto, o contributo da experiência em Nuremberg para o
estabelecimento do direito penal internacional. Superados os descompassos na matéria que
marcaram a Guerra Fria, estabeleceu-se nas últimas décadas um tribunal penal com jurisdição
supranacional projetado não apenas para dar continuidade ao legado de Nuremberg, mas para
superar suas fragilidades10. Trata-se do Tribunal Penal Internacional permanente, sediado em
Haia, de que o Brasil é signatário11.
O Tribunal Penal Internacional permanente, regulado pelo Estatuto de Roma assinado
em 17 de julho de 1998, é composto por juízes neutros, eleitos (art. 36 do Estatuto de Roma) e
passíveis de serem afetados (art. 41), aprecia condutas delituosas levadas a cabo após a
constituição da corte (arts. 11 e 24) nos territórios em que possui jurisdição (art.12) e por crimes
previamente tipificados (arts. 5º a 8º, 22 e 23), garantindo o duplo grau de jurisdição (art. 81 a
85). Mantendo o legado de Nuremberg, afasta a possibilidade de considerar a qualidade de
oficial ou subalterno como excludente de responsabilidade criminal (art. 27 e 33), admite como
pena a prisão perpétua (art. 77), mas não prevê aplicação da pena capital.

5. O TRIBUNAL DE NUREMBERG COMO PONTO DE INFLEXÃO NO


DIREITO INTERNACIONAL PENAL
5.1. Considerações iniciais
O Tribunal de Nuremberg abriu diversos “novos caminhos legais”. Pela primeira vez na
história, Estados com diferentes formas de organização governamental e constituições juntaram
forças para dar início ao processo na corte do inimigo derrotado. Ao invés de procurarem
vingança, os Aliados buscaram conduzir um processo judicial de acordo com a lei. Também
causou uma ruptura de paradigma no Direito Internacional: até então o julgamento penal dos

10SILVA, Tatiane Fonseca da. O julgamento de Nuremberg e sua relação com os direitos fundamentais
e com o Direito Internacional: uma análise necessária. In Revista do Laboratório de Estudos da
Violência da UNESP/Marília. Ano 2014 – Edição 13 – Maio/2014 ISSN 1983-2192. P. 57.
11 Aprovado pelo Congresso Nacional através do Decreto Legislativo Nº 112 de 2002, DOU de

07/06/2002, e promulgado pelo Decreto Federal Nº 4.388, de 25 de setembro de 2002, DOU de


26/09/2002.
17

indivíduos era de atribuição exclusiva dos Estados; a partir desse momento, a responsabilidade
penal do indivíduo no âmbito internacional despontava. O Tribunal estabeleceu que toda
humanidade estaria resguardada por uma espécie de escudo internacional legal, e nem mesmo
um chefe de Estado estaria protegido.
5.2. A importância da codificação da jurisdição do Tribunal
O fundamento da jurisdição do TIN, apesar das controvérsias, é fruto do direito
internacional consuetudinário de punição àqueles que cometeram crimes contra os valores
essenciais da comunidade internacional. Em 1947, a Comissão de Direito Internacional da ONU
foi incumbida de codificar os princípios utilizados em Nuremberg, para consolidar o avanço do
Direito Internacional Penal. Em 1950, a comissão aprovou os seguintes sete princípios:
1°) todo aquele que comete ato que consiste em crime internacional é passível de
punição;
2°) lei nacional que não considera o ato crime é irrelevante;
3°) as imunidades locais são irrelevantes;
4°) a obediência às ordens superiores não são eximentes;
5°) todos os acusados têm direito ao devido processo legal;
6°) são crimes internacionais os julgados em Nuremberg:
- conspiracy;
- crimes contra a paz;
- crimes contra as leis e os costumes da guerra;
- crimes contra a humanidade, desde que conexos com os demais.
7°) conluio para cometer tais atos é crime.
O Estatuto do Tribunal Internacional Militar também enumerou, de forma categórica,
as condutas que seriam caracterizadas como “crimes contra a humanidade”: assassinato,
exterminação, redução à escravidão, deportação e outros atos desumanos cometidos contra
populações civis, perseguições por motivos políticos, raciais ou religiosos.
Segundo François de Menthon, procurador-chefe da França nos julgamentos de
Nuremberg, tal rol de crimes relacionar-se à noção de condição humana. Esta, sob ótica jurídica,
encerraria um conjunto de prerrogativas arrogadas a todos os indivíduos, e que constituiria o
verdadeiro sentido de suas vidas - o direito à cidadania, à vida familiar, ao trabalho, à prática
religiosa, à manifestação política. Para Menthon, assim, os crimes contra a humanidade teriam
natureza pública e privada, que lesariam a pessoa humana em sua condição de sujeito de certos
direitos inalienáveis.
18

De acordo com Christopher Macleod é possível considerar, ainda, que os crimes contra
a humanidade são aqueles que violam a noção de grand-être, ou seja, de um espírito coletivo.
Tal conceito, cuja formulação primordial é atribuída a Auguste Comte, é calcado no
entendimento de que todo grupo social possui um conjunto de valores que, embora não sejam,
necessariamente, partilhados pela unanimidade de seus membros, são consensualmente aceitos
como identificadores desse grupo². Nesse âmbito, aquelas condutas que violassem o grand-être,
ou seja, os valores inerentes à consciência coletiva, romperiam o próprio elo que as liga à
identidade de humanidade – daí seu caráter “desumano”. Tais violações consistiriam, assim,
crimes lesa-humanidade.
5.3. Os caminhos para o estabelecimento do Tribunal Penal Internacional
Após o término da segunda grande guerra, a instauração da Guerra Fria impediu que
fosse estabelecido um código de crimes internacionais e de um tribunal internacional penal. Foi
necessário o fim da Guerra Fria, com a queda do Muro de Berlim e o desmantelamento do
comunismo soviético para que o CS da ONU determinasse a criação de dois tribunais
internacionais penais ad hoc e temporários (tribunais da ex-Iugoslávia e Ruanda). Com os dois
tribunais ad hoc, aceleraram-se os esforços para a constituição de um Tribunal Internacional
Penal permanente, para julgar indivíduos acusados de cometer crimes de jus cogens posteriores
à data de instalação do tribunal.
Em 1998, durante Conferência Intergovernamental em Roma, realizada pelas Nações
Unidas em Roma, foi adotado o tratado chamado de Estatuto de Roma, que cria o Tribunal
Penal Internacional, sediado em Haia.
Como o tratado não aceitava o pedido de reservas, havia uma baixa expectativa que o
tratado entrasse em vigor. Porém, em 2002 o tratado atingiu o número mínimo de 60
ratificações. Atualmente, 123 Estados fazem parte do Tribunal Penal Internacional; notam-se
ausências relevantes, como as da China, Estados Unidos, Israel, Irã e Rússia.
É composto de um preâmbulo e treze capítulos, com 128 artigos que englobam as regras
referentes aos crimes, à investigação e processo, à cooperação e execução da pena, bem como
ao financiamento das atividades. É um tribunal independente da ONU, com personalidade
jurídica própria, mas que possui uma relação de cooperação com a organização. É composto
por quatro órgãos: Presidência, Divisão Judicial, Procuradoria e Secretariado.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Homo hominis lupus”. Disse Thomas Hobbes ao analisar o contexto social de sua
época, em que o homem é explorador, usurpador e autodestrutivo. A partir desta célebre frase,
verifica-se um reflexo do que representou as atrocidades cometidas pelos nazistas durante a
19

Segunda Guerra Mundial e o que sucedeu tais crimes: Um julgamento unilateral, haja vista que,
os países Aliados também assassinaram, bombardearam, mutilaram e fuzilaram a humanidade,
mas não foram julgados por isso. Um julgamento rigoroso, que devolveu em mesma medida os
crimes, de forma escrupulosa, instituiu sentenças implacáveis e primitivas, ao considerar que
12 dos 24 réus foram condenados à morte por forca. A forca foi utilizada desde os primórdios
da humanidade, porém com o desenvolvimento de uma ideologia geral de direitos humanos
durante o século XX, esperou-se que formas cruéis de morte com requintes de tortura fossem
extintas, mas o Tribunal de Nuremberg provou o contrário, demonstrando que a atrocidade
ainda é combatida com atrocidade.
Ainda que os veredictos do Tribunal reflitam a Lei de Talião, é imprescindível ressaltar
que o Tribunal de Nuremberg representou um enorme passo para o que representa a justiça em
um âmbito internacional, foi sucedido pelo Tribunal Penal Internacional, que, de forma
definitiva, abandonou a pena de morte, e passou a empregar o direito de forma integral,
abrangendo todos os países que se submetem à sua jurisdição e aqueles que violarem normas
internacionais consuetudinárias.
O Tribunal de Nuremberg deixa um legado de que a justiça foi parcialmente feita. Não
obstante que metade dos réus foi condenado à prisão, a outra metade foi condenada à morte, o
que não apaga o feito de condenar os que mataram cerca de 40 milhões, mas demonstra que os
direitos humanos necessitam de consolidação. Neste caso, utilizou-se do direito como uma
forma de retaliação, contudo, também como uma forma de obter justiça o que o consolidou
como a principal fonte de justiça internacional, antes creditada às mãos.
20

REFERÊNCIAS

https://www.billdownscbs.com/2015/01/1943-third-moscow-conference.html
https://www.google.com/search?q=cria%C3%A7%C3%A3o+do+tribunal+de+nuremberg&so
urce=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwjItOyhm9_iAhVZILkGHdCdBZsQ_AUIECgB
&biw=1366&bih=608#imgrc=1b0ooALwoW5fgM:
https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-foi-o-julgamento-de-nuremberg/
https://jus.com.br/artigos/14525/a-criacao-de-um-tribunal-penal-internacional
https://www.sohistoria.com.br/ef2/primeiraguerra/p1.php
http://legal.un.org/ilc/texts/instruments/english/draft_articles/7_1_1950.pdf
http://centrodireitointernacional.com.br/static/revistaeletronica/volume12/arquivos_pdf/sumar
io/Artigo_Alessandra_Freitas.pdf
https://museums.nuernberg.de/memorium-nuremberg-trials/the-legacy-of-nuremberg/birth-of-
international-criminal-law/
FERRO, Ana Luiza Almeida. O Tribunal de Nuremberg: Dos Precedentes à Confirmação de
Seus Princípios. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.
GOLÇALVES, Joanisval Britto. Tribunal de Nuremberg 1945-1946. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004.
EHRENFREUND, Norbert. The Nuremberg Legacy: How the Nazi War Crimes Trial Changed
the Course of History. 1ª Ed. New York: Palgrave Macmillan, 2007.
HERZOG, Jacques-Bernard. A Justiça Penal Internacional, vinte anos após Nuremberg. In:
Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal. Rio de Janeiro: Instituto de Criminologia,
1966.
FREITAS, Alessandra Maria Martins de. O Tribunal de Nuremberg: Da tipificação de crimes
contra a humanidade a novos paradigmas no direito internacional. Revista eletrônica de Direito
Internacional, Centro de Direito Internancional (CEDIN), vol. 12, 2013.
MELLO, Rubens Ferreira. Textos de direito internacional e de história diplomática de 1815 a
1914. Rio de Janeiro: [s. n.], 1950.
SILVA, Tatiane Fonseca da. O julgamento de Nuremberg e sua relação com os direitos
fundamentais e com o Direito Internacional: uma análise necessária. In Revista do Laboratório
de Estudos da Violência da UNESP/Marília. Ano 2014 – Edição 13 – Maio/2014 ISSN 1983-
2192.
RAMOS, Andre de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
21

RESOLUÇÃO DA QUESTÃO DE HISTÓRIA DO DIREITO

O primeiro elemento a ser considerado na comparação entre o direito produzido pelos


gregos e pelos romanos tange a sua organização política. A hélade muito cedo se organizou em
uma miríade de polis política e militarmente independentes, mas ligadas pela cultura, costumes,
língua e religião. Eventualmente, frente um inimigo em comum, organizaram-se em
confederações sem diminuir a autonomia de cada cidade-estado. O mundo romano, em
contraposição, apesar de ser um império multicultural, partiu da expansão da hegemonia de
uma única urbe, Roma, garantindo até finais do século III, uma única estrutura política e um
único centro de poder em torno do qual orbitava o império.
Consequentemente, o estudo da produção do direito helênico deve considerar que cada
cidade tinha seu próprio ordenamento, estrutura política própria e garantia direitos e deveres
díspares a seus cidadãos. A exceção é o período de dominação macedônica, em que a expansão
de um império unificou politicamente os gregos e amalgamou em sua cultura elementos
orientais.
Outro ponto a ser considerado são as fontes que foram preservadas. A abertura cultural
de Atenas permitiu o afluxo de pensadores e viabilizou a formação de larga produção
humanística, parte dela conservada pelo medievo ocidental ou pelo mundo árabe.
Evidentemente, o material a disposição versa mais sobre a realidade ática e provém de filósofos
e oradores. Parte significativa desse material relata o contexto ateniense em comparação com
outras polis ou versa sobre um Estado ideal.
Em termos gerais, à semelhança do que acontece no universo romano, a produção do
direito parte dos costumes de cada cidade e a positivação do direito é contemporânea aos
conflitos entre os grandes proprietários de terra que a princípio monopolizavam o status de
cidadãos e os demais habitantes de cada polis.
A cerca do direito romano há mais fontes. A primeira fase, como dito, é oral e
consuetudinária, com o direito sendo gradualmente positivado durante o conflito entre
patriciado e plebe. O ponto de partida é a Lei das XII Tábuas que consolidou o costume vigente.
Uma peculiaridade romana, em relação aos gregos, é a produção de um direito das gentes em
oposição ao direito dos cidadãos, marcado pela influência dos costumes e dos direitos dos povos
dominados. Foram também os primeiros a consagrar obras importante ao estudo do direito,
extensa produção dos jurisconsultos, especialmente durante o principado.
Dos helenos recebemos a consciência de cidadãos e o conceito de justiça, dos romanos
a concepção de direito (ius). Os gregos não construíram uma ciência do direito, nem
22

desenvolveram uma sistemática do direito privado, em oposição ao legado romano que


influenciou consideravelmente o direito privado medieval e moderno, especialmente pela
proteção legal da propriedade, a igualdade dos sujeitos legais e suas vontades e a possibilidade
de testar. Essa influência romana no direito ocidental data do medievo e é patente nos institutos,
hábitos de raciocínio e fórmulas que ainda permeiam os direitos nacionais europeus continentais
e latino-americanos, especialmente nos países influenciados pelo ius commune.

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