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A potência narrativa nos falsos documentários

CAUE FERNANDES NUNES*

Resumo
Esse artigo propõe uma investigação sobre os falsos documentários
audiovisuais a partir da análise de alguns filmes que se utilizam de
narrativas que mesclam gêneros cinematográficos. O conceito de falso
é problematizado levando em consideração a teoria de Deleuze, em
especial a noção de potências do falso.
Palavras-chave: documentário; falso; mockumentary; potência;
cinema.

*
CAUE FERNANDES NUNES é doutorando em Ciências Sociais - Departamento de
Ciências Sociais – Unicamp.

23
Introdução Num primeiro momento, o
Desde seu surgimento, o documentário documentário convocou para si o status
audiovisual estabeleceu um diálogo com de documento, do “eu estive lá, eis aqui
os demais gêneros cinematográficos. a prova”. As imagens e sons produzidos
Até por uma questão de auto definição, possuíam a intenção de representar o
o documentário se opôs a esses outros mundo histórico. De acordo com Ramos
gêneros, se definindo pelas diferenças, (2008, p. 22), o documentário é uma
no entanto, elas operavam mais no narrativa que produz asserções sobre o
campo do direito do que da prática mundo histórico, na medida em que
propriamente dita, já que os primeiros haja um espectador que receba essas
filmes documentais se utilizavam de imagens e sons como asserções. Por
técnicas tanto do cinema ficcional mundo histórico, entende-se que é
quanto do experimental. Ainda assim, aquele exterior a quem produz a
de uma maneira ou de outra, as asserção, ou seja, há nessa definição
diferenças estavam presentes. Que uma clara separação entre sujeito e
diferenças são essas? objeto. O sujeito-câmera é aquele que

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produz as asserções sobre o objeto- Outra forma de definir o documentário é
mundo. através de sua estrutura institucional:
Pode-se argumentar que o mundo documentário é aquilo que fazem os
histórico não é único, mas sim plural, e documentaristas. Na maioria das vezes
que, portanto, deveríamos falar em os cineastas definem de antemão que
mundos históricos. Além disso, os tipo de filmes estão fazendo e quando a
conceitos por trás da realidade histórica obra chega ao público a definição já
são mutáveis ao longo do tempo. Isso está feita. Isso quer dizer que os
nos leva a crer que um discurso espectadores sabem com antecedência
produzido por um documentário em um que tipo de filme vão assistir, tanto no
determinado período pode perder cinema como na televisão. Essa
validade em outro contexto histórico. estrutura institucional, muitas vezes,
Tudo isso precisa ser considerado, mas não se utiliza de um método reflexivo e
num primeiro momento, a definição por isso não questiona a capacidade dos
inicial basta. documentários de representarem a
“realidade”, fato que suprime grande
Os filmes de ficção também podem parte da complexidade da relação entre
produzir asserções sobre o mundo representação e realidade e deixa
histórico, então como diferenciar um subentendido que os documentários têm
gênero de outro? Segundo Ramos (Ibid. acesso direto e verdadeiro ao “real”.
p. 25), os filmes de ficção são baseados Isso funciona como um dos principais
em uma estrutura narrativa ficcional atrativos do gênero.
encarnada por entes com personalidade
denominados personagens. Portanto, as Os documentários se diferenciam dos
pessoas que aparecem na tela são atores demais tipos de filmes também pelo
representando esses entes e a narrativa corpus do texto e pela maneira que a
não precisa ter nenhum narrativa se organiza. A história do
comprometimento com algo que seja gênero é marcada por períodos em que
exterior ao filme. havia maneiras predominantes de
estruturar a narrativa. Uma das formas
Em ambos os gêneros, a articulação
mais conhecidas é a da “solução de
cinematográfica é parecida, na medida
problemas”: o documentário propõe um
em que a decupagem segue um
problema, em seguida fornece
encadeamento de planos de diferentes
informações sobre essa questão e
ângulos, buscando unidade espacial, usa
prossegue com um desenvolvimento ou
recursos como campo/contracampo,
complexidade do assunto. Por último
raccord 1 de movimento e direção de
chega a uma conclusão que o espectador
olhar. No documentário, essa linguagem
é estimulado a endossar. Os filmes do
é utilizada para construir o argumento
cineasta Michael Morre, por exemplo,
do filme, na ficção, para fazer a trama
seguem essa premissa.
se desenvolver através das ações dos
personagens. Como aponta Nichols (2005, p. 55): “A
lógica que organiza um documentário
sustenta um argumento, uma afirmação
1
Raccord é a montagem em continuidade entre ou uma alegação fundamental sobre o
um plano e outro. A continuidade pode ser do mundo histórico, o que dá ao gênero sua
movimento dos personagens, dos cenários, da
luz e do som para que a narrativa tenha uma
particularidade. Esperamos nos
continuidade verossímil mesmo com muitas envolver com filmes que se envolvem
mudanças de posições de câmera. com o mundo”. Esse argumento se

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estrutura através da chamada montagem documentário se construiu através das
de evidências: ao invés dos cortes semelhanças e diferenças com outros
darem a sensação de tempo e espaço gêneros, é no falso documentário que
unidos em que seguimos os esse processo se torna mais evidente.
personagens, a edição organiza os cortes Não existe uma única definição para o
para que dê a impressão de um termo o falso documentário, a própria
argumento único, convincente, nomenclatura possui variações como
sustentado por uma lógica. pseudodocumentário ou mock-
A mescla de gêneros esteve presente na documentary 3 . Em uma primeira
história dos documentários desde os definição, falso documentário é um
primeiros filmes, como por exemplo, filme com uma ética inteiramente
em Nanook, o esquimó 2 (1922), de ficcional, mas que possui uma estética-
Robert Flaherty. Como Nanook vivia na técnica documentária. Um exemplo
Baía de Hudson, no Canadá, onde as bastante conhecido é Zelig (1983), de
condições climáticas são extremamente Woody Allen, filme que narra a história
adversas, parte das cenas foram de um homem que possui a habilidade
filmadas em outro local com situações de se transformar fisicamente, assim
mais favoráveis. O processo de Flaherty como um camaleão pode mudar de cor.
foi acompanhar a vida do esquimó, Se tiver contato com um negro, a pele
inicialmente sem os equipamentos, e de Zelig escurece; quando se aproxima
depois encenou para a câmera aquilo de um obeso, ele também engorda e
que acreditava ser mais importante. assim por diante. A estrutura da obra é
Grande parte do filme é, portanto, construída dentro da tradição
encenado, prática comum aos filmes de griersoniana em que há a prevalência da
ficção. A diferença é que não havia voz-de-Deus de um narrador que nunca
atores, os próprios esquimós aparece, mas que é onipresente e
reencenavam suas ações. Há, inclusive, onisciente dando todas as explicações
a encenação de atividades que os necessárias para o entendimento da
esquimós não utilizavam mais, como a narrativa. A obra possui um trabalho de
cena da caça da morsa com o arpão. Em pesquisa que resgata fotos e imagens de
seu dia-a-dia, Nanook havia filmes antigos que servem como prova
abandonado esse tipo de caça, mas da existência do personagem. Á essa
Flaherty quis registrar aquilo que estrutura, são adicionadas trechos de
considerava mais representativo no entrevistas de cientistas, psiquiatras,
universo dos esquimós, mesmo o que médicos, historiadores e testemunhas,
pertencia ao passado. Como observa que funcionam como a voz de
Ramos (2008, p. 39), a encenação autoridade para dar embasamento
sempre foi uma prática habitual no científico a esse estranho fenômeno.
documentário, não só nas próprias Nos créditos iniciais, o diretor inscreve
locações, mas também em estúdios, seu filme como documentário quando
através de reconstruções de um agradece os entrevistados “pela
determinado fato. disponibilidade de participação neste
documentário”. O espectador só percebe
Dos falsos documentários
Se desde o seu surgimento, o 3
A contração utilizada por alguns autores é
mockumentary. “Mock”, em inglês, quando
usado como adjetivo pode significar “falso”,
2
Mantenho os nomes em português dos filmes “imitação”, “simulacro”; como substantivo pode
lançados no Brasil. ser “zombaria”, “escárnio”, “falsificação”.

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a “farsa” porque Zelig é interpretado deslocamento é menos perceptível. A
pelo próprio Woody Allen, que na estética-técnica do cinema direto é
época já era uma pessoa conhecida utilizada com bastante fidelidade,
publicamente, e também porque a através da não interferência do cineasta,
premissa da narrativa – a existência do deixando a situação se desenvolver por
homem camaleão – é um tanto si mesma, registrando a “vida como ela
inverosímil. é”, com câmera na mão e não utilização
de luz artificial. O espectador encontra
O deslocamento proposto por esse tipo todas as convenções linguísticas
de filme surge exatamente da interseção associadas ao gênero documentário,
entre a ética historicamente associada diferente de Zelig que revela as falsas
ao cinema ficcional e a estética-técnica asserções a partir da inverosimilhança,
utilizada pelo documentário, gerando um efeito paródico. Em This is
posicionando a obra em algum lugar spinal tap os argumentos são acertivos,
entre os gêneros estabelecidos. Os funcionando como uma “janela para o
falsos documentários possuem uma mundo histórico”. Se o público não
característica reflexiva, menos pelas perceber ou não souber de antemão qual
asserções produzidas, e mais pelo é a proposta de Reiner, poderá receber o
questionamento da capacidade do filme como um documentário
próprio documentário em produzir obervativo próximo do jornalismo, sem
asserções, sejam elas do tipo que forem. que isso produza qualquer deslocamento
A grande contribuição dessas obras para de significado. Já para o espectador que
a história do audiovisual é criar um percebe ou sabe da proposta, a recepção
senso crítico sobre um mundo repleto de adquire uma característica reflexiva e
imagens que significam tudo aquilo que metalinguística, que coloca em dúvida o
nos cerca, dentro e fora dos filmes. próprio processo de representação.
Mesmo quando não fazem uma
discussão reflexiva explícita sobre a This is spinal tap possui como
capacidade de representação dos contraponto o cinema direto, condição
documentários, esses filmes produzem que gera um deslocamento que borra a
um ruído ao deslocar os elementos de linha que divide gêneros audiovisuais, a
composição fílmica. partir de dois movimentos, um de
aproximação e outro de distanciamento.
Em outros filmes, os espectadores não O primeiro se constitui no devir
encontram pistas tão fáceis que indicam estético-técnico, através da utilização
a “farsa”, como em This is spinal tap dos mesmos procedimentos. Por
(1982), de Rob Reiner, documentário exemplo, há uma semelhança grande
sobre uma banda de rock filmado no entre esse falso documentário e Gimme
estilo do cinema direto, em que a Shelter (1970), de David Maysles,
câmera acompanha shows, ensaios e Albert Maysles e Charlotte Zwerin,
bastidores de uma turnê. Apesar do uso registro da turnê da banda de rock
irônico das convenções jornalísticas – Rolling Stones. Em ambos os casos, a
que pode servir como pista para concepção da “mosca na parede” é o
identificar a falsidade – o espectador alicerce da estrutura narrativa,
pode acreditar nas asserções e não observando os fatos sem realizar
perceber que a banda foi criada somente interferências que possam direcionar os
para a produção desse falso acontecimentos, em uma tentativa de
documentário. Nesse caso, a proposta é objetividade quase plena. As bandas,
diferente de Zelig, já que o tanto Rolling Stones como Spinal Tap,

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realizam shows, viajam para outras filme narra a vida de um falsário de
cidades, dão entrevistas para a quadros, Elmyr de Hory, em um
imprensa, descansam nos bastidores e formato típico de documentário, mas
conversam com os empresários. Rotinas que possui um conteúdo com elementos
parecidas, filmes semelhantes. O ficcionais. No início, o diretor anuncia
distanciamento está no devir ético, já que só falará verdades na próxima hora,
que a banda Rolling Stones existe em então antes do fim do filme (a duração
outras instâncias para além da tela, já total é de 98 minutos) é anunciada a
Spinal Tap não, sua existência se “farsa” e tudo que foi dito até então fica
restringe ao discurso audiovisual. O em suspenso, sem o espectador saber
distanciamento estaria na veracidade de exatamente o que é verdade e o que é
um e na falsidade de outro. No entanto, mentira. Através de uma narrativa em
algumas considerações são necessárias. espiral, Welles cria um falso
A primeira é que a banda Spinal Tap documentário para contar a biografia de
passou a existir fora das telas, tamanho um falsificador propondo uma
o sucesso que fez, lançando discos e desconstrução de algumas convenções
realizando shows em vários locais do do mundo da arte.
mundo. Então, o distanciamento estaria Hory é um falsificador de quadros de
em uma premissa lógica: uma banda pintores famosos que possui um grande
existiu antes na materialidade e depois
talento ao ponto de confundir os
no discurso audiovisual e a outra próprios autores dos quadros originais.
realizou a operação inversa. Esses Coloca-se aqui uma discussão sobre a
movimentos de aproximações e autenticidade das obras de arte, já que o
distanciamentos criam uma descrença falsificador possui uma habilidade
na capacidade de representação dos
muito parecida com a do artista
documentários, afinal pode-se supor que originário da obra. Benjamin (1985) faz
ambos produzem asserções falsas ou, esse questionamento sobre as
igualmente, que ambos fazem asserções consequências da reprodutibilidade das
verdadeiras. Quando comparados, This obras de arte nas sociedades modernas e
is spinal tap e Gimme Shelter são mais conclui que aquilo de único, essencial,
semelhantes do que diferentes e por isso situado no tempo e no espaço se perde
inseridos em uma mesma categoria com a reprodutibilidade técnica porque
classificatória, de modo que o conceito retira o contexto que produz o
de “verdade” deixa de ser um critério significado da obra. O cinema, arte
tipológico. Essa condição acabaria com inventada em uma sociedade moderna e
a divisão entre “falsos documentários” e burguesa, só existe a partir da
“documentários”, visto que uma vez reprodutibilidade, portanto, não possui
eliminada a “verdade”, elimina-se uma “aura” a ser preservada. Welles
também a “mentira”. sabe disso e se autointitula um falsário
Apesar de grande parte dos falsos desde os tempos de Guerra dos Mundos
documentários se utilizar de (1938), o programa de rádio em que
características paródicas, algumas narra a suposta invasão do planeta por
propostas trabalham a intertextualidade marcianos, fato que causou pânico em
entre ficção e documentário de uma muita gente. Seus filmes colocam um
forma mais sofisticada, como Verdades ponto de interrogação sobre a
e mentiras (1975), de Orson Welles4. O
com a proposta do filme, que produz uma
4
O título original F for fake é mais condizente narrativa centrada no conceito de “falso”.

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capacidade de indexação das imagens não é exatamente o seu negócio?
com o mundo histórico porque trabalha Por que a confiaria a Kubrick e
no limiar entre asserções falsas e apenas a ele? Que acordo teria feito
verdadeiras. Em Verdades e mentiras, este último com a Nasa para obter a
Welles foge da paródia, recurso comum objetiva?
aos falsos documentários, já que leva a A teoria levantada pelo documentário é
sério seu personagem. Hory é um que Kubrick produziu o famoso filme
criador que conhece os critérios de do astronauta Neil Armstrong pisando
julgamento dos peritos e por isso é na lua em algum lugar remoto do
capaz de engana-los. O quadro passa a Vietnã. Mesmo que seja verdade que a
ser original a partir do momento em que Apollo 11 tenha de fato chegado à lua, o
o perito assim determina, independente presidente Nixon não queria se arriscar
de quem tenha pintado, seja Hory ou caso algum imprevisto acontecesse e
Vermeer. O herói do filme está preparou um “plano B”. Em um
equiparado com os grandes artistas. contexto de guerra fria, a corrida
Opération lune 5 (2002), de Willian espacial possuía um lugar estratégico
Karel, parte de um evento conhecido, a dentro da política internacional.
chegada da humanidade à lua, e
Karel levanta alguns questionamentos
reconstitui passo a passo a viagem feita
que colocam em dúvida a “veracidade”
pela nave Apollo 11. Através de
do filme feito na lua, como o fato da
entrevistas com cientistas, políticos,
bandeira americana tremular em um
pessoas envolvidas com a Nasa e
local onde não há atmosfera. Além
testemunhas, o documentário vai pouco
disso, a temperatura na lua varia muito
a pouco questionando o feito e defende
em um curto espaço de tempo, o que
a hipótese de que a viagem nunca
poderia ter causado danos mecânicos e
existiu. De acordo com Machado e
óticos nas câmeras, no entanto, as
Vélez (2005, p.14-15)
imagens são límpidas e nítidas. As
Tudo se baseia numa anedota pegadas fundas deixadas pelos
célebre da história do cinema: para astronautas seriam outro indício da
rodar a famosa cena do jantar à luz farsa, já que a gravidade na lua é 1/6 da
de velas, em Barry Lyndon (1975),
gravidade na terra e, portanto, os
e sem o auxílio de nenhuma luz
artificial, o cineasta Stanley
astronautas pesariam aproximadamente
Kubrick teve de emprestar da Nasa 15 quilos, deixando pegadas mais
a lente cinematográfica mais suaves. Outra evidência: a sombra de
luminosa do mundo e considerada a um astronauta está do lado oposto às
única em seu gênero. Essa lente, sombras dos demais objetos do cenário,
capaz de filmar em condições de inclusive de outro astronauta. Para
quase total ausência de luz, teve Karel, isso deixa evidente que haveria
uma concepção técnica jamais uma luz artificial, indicando que a
revelada e nunca se soube de outra produção foi feita em um estúdio.
aplicação específica para ela,
exceto a famosa cena de Barry Opération lune produz um argumento
Lyndon. Por que a Nasa bastante convincente sobre um assunto
desenvolveria uma lente dessa que faz parte do imaginário mundial, no
espécie, já que a cinematografia entanto, é um falso documentário, que
não dá indícios disso. Os espectadores
5
O título internacional é The dark side of the são levados a acreditar no argumento,
moon. principalmente por que o filme foi

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produzido para a televisão, veículo em 2005, P. 20)
que as pessoas costumam assistir com Os falsos documentários podem ser
certo grau de distração. O diretor faz classificados em subgêneros, uma forma
uma montagem que intercala de agrupar as diferentes maneiras
depoimentos de personagens inventados éticas-estéticas-técnicas de construção
com entrevistas de pessoas que possuem fílmica. Roscoe e Hight (2001)
um envolvimento “verdadeiro” com a estabelecem três categorias: paródia,
viagem à lua. Nesse ponto, há uma crítica e desconstrução.
intenção clara em borrar as fronteiras
entre ficção e documentário. De acordo A primeira consiste em filmes com um
com Machado e Vélez (2005), existem devir ético puramente ficcional, mas
muitos motivos para se produzir um com uma articulação estética-técnica
falso documentário e, em geral, as historicamente associada ao
razões não são as melhores, como o documentário, que produz asserções
sensacionalismo, oportunismo e falta de assumidamente falsas. A ficcionalidade
seriedade em busca de audiência fácil e é assumida ao máximo para produzir
rápida. As televisões estão cheias de um efeito de paródia. Em geral, as
produtos sobre óvnis e contatos com asserções são inverossímeis e não
extraterrestres, para ficarmos em um constroem um argumento de
exemplo corriqueiro. convencimento da audiência, mas sim
uma sátira. Zelig se enquadra nessa
Mas o fake que estamos analisando categoria.
aqui é diferente. Não foi feito para Já o subgênero “crítica” possui uma
ganhar dinheiro ou sucesso fáceis, estrutura parecida com a anterior, mas
nem para manipular a opinião com uma intencionalidade menos
pública com interesses ideológicos.
cômica e mais atrelada a denúncias
Seu objetivo maior é refletir sobre o
próprio documentário televisivo, sociais, políticas, econômicas e
através de uma apropriação dos midiáticas. Através da ficcionalização, o
códigos, modelos e discursos desse objetivo é chamar a atenção para algum
gênero audiovisual, seja para aspecto do “mundo histórico” e deixar
questionar sua objetividade e a evidente que muitos fatos da
veracidade que este supõe encerrar, “realidade” são tão improváveis que até
seja para demonstrar ao espectador parecem fruto de uma invenção. Recife
a facilidade com que se pode frio (2009), de Kléber Mendonça Filho,
manipular a informação em se encaixa nessa classificação.
televisão, ou ainda para propor uma
utilização subversiva do O terceiro subgênero, “desconstrução”,
documentário, como formato para a não assume sua ficcionalidade de modo
criação de um imaginativo trabalho que as asserções sobre o “mundo
de ficção, à maneira do War of the histórico” buscam o mesmo tipo de
Worlds (1938), célebre programa legitimação dos documentários
radiofônico de Orson Welles. O tradicionais. O espectador é levado a
documentário fake de Karel, sem depositar credibilidade na ética proposta
abrir mão da dúvida sobre a
e, portanto, a acreditar na relação
veracidade das imagens da Lua, que
ele definitivamente semeia na indexadora com a “realidade”
cabeça do espectador, é também apresentada. Esse é o tipo de filme cujos
uma denúncia do modo de espectadores se sentem enganados
funcionamento do sistema quando descobrem a farsa. Dentro da
midiático. (MACHADO E VÉLEZ, proposta de classificação de Roscoe e

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Hight, esse é o subgênero que mais com que proliferassem situações às
produz uma análise metalinguística, quais já não sabíamos como reagir, em
quando subverte a relação do filme com espaços que já não sabíamos como
os espectadores, incentivando um qualificar”. (DELEUZE, 2016, p. 373)
debate – e uma dúvida - sobre o poder
indexatório das imagens. As descrições orgânicas do cinema
clássico produzem situações sensório-
Das falsidades motoras já que pressupõem a
independência do objeto que está sendo
Por mais que as tipologias ajudem a filmado. As descrições cristalinas, por
organizar o pensamento em torno desse sua vez, remetem a situações óticas e
subgênero audiovisual, esse tipo de sonoras puras, não mais se referindo a
classificação não se detém de maneira um objeto externo. A passagem da
mais atenta a questões relevantes, como imagem-movimento para a imagem-
por exemplo, sobre a conceituação do tempo substitui a representação indireta
falso. A “postulação da verdade” está de tempo - articulada pelo sistema
presente no gênero documentário desde sensório-motor – por uma representação
o seu início, fato que coloca a dualidade direta do tempo – produzida pela
verdade/falsidade no centro da imagem-ótica e sonora pura.
discussão, seja entendendo os termos
como uma oposição, seja como O segundo ponto a ser analisado é a
complementaridade. De um jeito ou de relação entre real e imaginado. Na
outro, essa questão se apresenta como descrição orgânica o real está dado, é
elemento central para a compreensão anterior e é representado no cinema pela
das dimensões éticas-estéticas-técnicas continuidade, por conexões legais,
dos documentários. causais e lógica. Mesmo que história
apresentada tenha descontinuidades, os
Deleuze (2007) estabelece uma pontos de raccord e o encadeamento
discussão que oferece um suporte para lógico permitem uma representação dita
além da criação de uma tipologia. Ao realista. Mesmo o sonho e o imaginário,
conceituar as potências do falso, o autor quando estão presentes nesse tipo de
estabelece três pontos a serem filme, são apresentados de forma
analisados: o primeiro se refere às específica, enfatizando que aquilo não
descrições, sendo uma orgânica e outra corresponde a realidade. Na descrição
cristalina. A descrição que pressupõe a cristalina o real perde sua característica
independência do objeto é chamada de de objeto independente, possibilitando
orgânica, já que a realidade apresentada outras relações que não à causal e
é anterior a descrição que a câmera faz lógica. O virtual se desconecta de sua
dela. “Chamamos, ao contrário, atualização, promovendo
cristalina a descrição que vale por seu indiscernibilidade entre o real e o
objeto, que o substitui, cria-o e apaga-o imaginário. A descrição passa a ser
a um só tempo” (ibid, p.155). referir a outras descrições, por isso o
cinema moderno produz situações
A diferença entre as formas de sonoras e óticas puras.
descrição marcam a passagem da
imagem-movimento do cinema clássico Os documentários tradicionalmente se
para a imagem-tempo do cinema alinham à descrição orgânica, já que
moderno, sendo a Segunda Guerra pressupõe a dualidade verdade/falsidade
Mundial o corte. “Por que a guerra é o em termos de oposição. A maioria dos
corte? É que o pós-guerra na Europa fez documentários se propõem a busca pela

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verdade, condição que coloca a principalmente em Jean Rouch e Agnès
dualidade real/imaginado também em Varda
termos opostos. O que se propõe é
O essencial é isso: como o novo
produzir algum tipo de representação
regime da imagem (a imagem-
que esteja atrelada à realidade em tempo direta) opera com descrições
detrimento de situações imaginadas. óticas e sonoras puras, cristalinas, e
O terceiro ponto diz respeito à narração. narrações falsificantes, puramente
Na orgânica, os personagens reagem às crônicas. É ao mesmo tempo que a
situações na tentativa de revolver os descrição deixa de pressupor uma
realidade, e a narração, de remeter
conflitos existentes. Isso é o que os
uma forma do verdadeiro: daí o
roteiristas chamam de plot, ou seja, a documenteur, de Agnès Varda, em
situação-problema, com a qual os que o documentário descreve
personagens precisa lidar. Ao final, em situações apenas óticas e sonoras
geral, tudo é resolvido e os problemas (os muros, a cidade), em favor de
solucionados. Cinema clássico. uma história que não faz mais que
invocar a abolição da verdade, que
A narração cristalina pressupõe
seguir os gestos desconectados da
personagens que mais presenciam do heroína. (DELEUZE, 2007, p. 165)
que reagem às situações. São videntes e
não actante. 6 Do ponto de vista O cinema de Varda deixa de remeter a
narrativo significa uma redução de um “eu estive lá, eis aqui a prova”,
movimentos e ações, além de como a tradição do documentário
diminuição do ritmo. Alguns filmes não clássico postula. Primeiro porque ela
possuem plot e mesmo quando possuem subverte a objetividade, já que propõe
os personagens não necessariamente filmes afetivos que partem da
reagem a ele. É o fim das relações subjetividade da própria diretora, como
causais e lógicas por isso os falsos em Os catadores e eu (1999), que se
raccord, a retomada do plano fixo e trata de um encontro entre ela e pessoas
duradouro. Desse modo, o tempo deixa que vivem de pegar coisas nas ruas. Ela
se estar subordinado ao movimento e mesma se coloca na posição de uma
passa a ser descrito de forma direta. catadora de imagens, fugindo de uma
narrativa orgânica baseada numa
Os falsos documentários possuem a
realidade a priori. Nesse sentido, as
potência de recolocar essas questões em
imagens perdem sua força de
outros termos, na medida em que
representatividade ao abrir espaços para
deixam de entender as dualidades
outras potências.
verdade/falsidade e real/imaginado
como oposições. Por mais que a Apesar de Deleuze concentrar sua
consolidação da imagem-tempo tenha análise no cinema ficcional, sua
acontecido no cinema ficcional, em filosofia oferece um suporte bastante
movimentos conhecidos como a rico para se pensar as articulações
nouvelle vague e os cinemas novos éticas-estéticas-técnicas dos falsos
(alemão, brasileiro, japonês), pode-se documentários, principalmente quando
encontrar experimentações nesse trata da “imagem bifacial”
sentido em documentários,
Em termos bergnosianos, o objeto
6
O termo vidente possui a conotação de “quem real reflete-se num imagem
vê” e não no sentido “quem prevê o futuro” especular tal como no objeto virtual
como é usual em português. Por isso a oposição que, por seu lado e ao mesmo
entre vidente e actante. tempo, envolve ou reflete o real: há

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“coalescência” entre os dois. Há veraz, realmente-veraz em vez de
formação de uma imagem bifacial, ficticiamente-veraz. Só que a
atual e virtual. É como se uma veracidade na narrativa não havia
imagem especular, uma foto, um deixado de ser uma ficção. (Ibid, p.
cartão-postal se animassem, 182)
ganhassem independência e
passassem para o atual, com o risco Em seu processo de denúncia dos
de a imagem atual voltar ao clichês, os falsos documentários
espelho, retomar lugar no cartão- constroem uma critica à descrição
postal ou na foto, segundo um orgânica através da negação da
duplo movimento de liberação e de preexistência do objeto enquanto tal.
captura. (Ibid, p. 88) Antes de representarem uma suposta
Nesse sentido, há uma realidade, as imagens fazem referências
indiscernibilidade entre real e às próprias imagens – ao mesmo tempo
imaginário, entre físico e mental, entre passadas e presentes, nessa espiral de
percepção e lembrança, que se remetem coalescência infinita. Se muitos dos
umas às outras, trocando de posições falsos documentários não chegam a
constantemente entre o atual e o virtual. propor uma descrição cristalina, eles,
Essas imagens coalescentes não se pelo menos, negam a descrição
confundem, nem se fundem, apesar de orgânica. Em Opération Lune, por
serem indiscerníveis, formando assim a exemplo, há uma coexistência do real
imagem-cristal, ao mesmo tempo atual e com imaginário, da verdade com a
virtual, passado e presente. Quando a mentira, sem que se estabeleça uma
imagem virtual se torna atual, é visível e relação de hierarquia. Nós, os
límpida como um espelho e, ao espectadores, não sabemos qual a
contrário, quando a imagem atual se fronteira entre uma instância e outra.
torna virtual, é opaca e invisível, como Algumas experiências, como o cinema
um cristal recém-retirado da terra. verdade de Jean Rouch, conseguem
A história do documentário foi construir uma descrição cristalina, na
construída a partir de alguns alicerces medida em que o atual e virtual estão
construídos através de oposições entre trocando de posição o tempo todo. Em
dualidades: sujeito versus objeto; real Crônicas de um verão (1960), Rouch e
versus imaginário; ficção versus Morin concebem um filme em que são,
documentário; verdade versus mentira. ao mesmo tempo, sujeitos e objetos,
A teoria deleuziana não considera as quando deixam a posição confortável
dualidades enquanto oposições, mas detrás da câmera e passam para frente
como instâncias coexistentes e por isso dela. Essa perspectiva participativa dos
propõe a construção de outro alicerce. diretores borra a concepção de um
objeto preexistente, que existe
Quando se aplicava o ideal ou independentemente da câmera, e que
modelo de verdade ao real, muita seria passível de uma descrição
coisa mudava, pois a câmera se orgânica. Nessa nova condição, o objeto
dirigia a um real preexistente, mas, se constrói junto com o filme,
em outro sentido, nada tinha
internamente a ele. Essa experiência é
mudado nas condições da narrativa:
o objetivo e o subjetivo foram radicalizada em La pyramide humanei
deslocados, não transformados; as (1961), quando Rouch decide pedir para
identidades se definiam de outra alunos de uma escola se
maneira, mas continuavam autorepresentarem tornando o racismo
definidas; a narrativa continuava latente em um comportamento evidente.

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A partir desse pressuposto, as situações diante do conhecimento puro sem
experienciadas foram criadas para o consequências, ele é indiferente;
filme e não ocorreriam dessa mesma diante das verdades talvez
maneira em outras circunstâncias. Aqui perniciosas e destrutivas, ele tem
as dualidades – real versus ficção, disposição até mesmo hostil (Ibid,
p. 64)
verdade versus mentira – não se
relacionam hierarquicamente, mas sim Quando Nietzsche recusa o conceito de
através de uma coexistência verdade, ele está tentando escapar dessa
indiscernível. lógica e não enaltecendo a ideia de falso
ou de aparência. Até porque a busca
A própria concepção de verdade, no
pelo que seria a “verdade pura” é
cinema de Rouch, está atrelada ao
ingrata, já que o processo do
processo de colonização. Se opor à
conhecimento passa pela linguagem e
verdade, não é se opor ao verdadeiro,
portanto estabelece a relação entre os
mas ao discurso dominante, produzindo
humanos e as coisas, metáforas
uma função fabuladora dos dominados.
antropomórficas que organizam o
O chamado cinema-verdade questiona o
“nosso” mundo, mas não “o” mundo em
processo de dominação quando passa a
si. Mesmo quando acreditamos saber
criar outras verdades.
algo da coisa em si, nos restringimos a
Deleuze se baseia na obra de Nietzsche metáforas construídas por nós mesmos.
para desenvolver o conceito de falso. O que é a verdade, portanto? Um
Ao recusar o conceito de verdade, batalhão móvel de metáforas,
Nietzsche não vai simplesmente para o metonímias, antropomorfismos,
lado oposto, ele busca superar a enfim, uma soma de relações
dualidade verdade/aparência, da humanas, que foram enfatizadas
maneira como ela é colocada pela poética e retoricamente,
metafísica. O próprio conceito de transpostas, enfeitadas, e que, após,
verdade surge a partir da necessidade de longo uso, parecem a um povo
vida em sociedade, ou seja, a sólidas, canônicas e obrigatórias: as
formulação de designações verdades são ilusões, das quais se
esqueceu que o são, metáforas que
uniformemente válidas e obrigatórias
se tornaram gastas e sem força
que compõem a vida em comum, para sensível, modas que perderam sua
que a “guerra de todos contra todos” efígie e agora só entram em
desapareça do mundo. (NIETZSCHE, consideração como metal, não mais
2014, p. 63) como moedas (Ibid. p.66).
Assim, o impulso à verdade não se O processo de construção da verdade
origina na ideia do verdadeiro, mas nas como um conceito a ser alcançado é um
suas consequências relacionadas à vida mecanismo antropomórfico de reduzir o
social comum. Portanto, o mentiroso mundo ao universo humano. O homem
também está usando as mesmas é tomado como medida de todas as
designações, dentro da dualidade coisas e o erro, de acordo com
estabelecida, só que com os pólos Nietzsche, é trocar as metáforas pelas
invertidos. coisas mesmas, ou seja, a verdade se
É também em um sentido restrito reduz ao processo de antropomorfização
semelhante que o homem quer do mundo, carregando consigo uma
somente a verdade: deseja as carga valorativa muito grande, julgando
consequências da verdade que são a todos a partir desses parâmetros. Por
agradáveis e conservam a vida; isso, Nietzsche vai negar o mundo

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verdadeiro, construído sob essas Nichols (ibid.), “esperamos nos
metáforas, mas como ele está colocando envolver com filmes que se envolvem
as questões em outros termos, já que o com o mundo”, mas é importante
objetivo é ir além da dualidade, ele vai refletirmos que tipo de envolvimento é
negar também o mundo aparente. Com esse. Seguindo essa lógica, trata-se do
o fim de um dos elementos, a dualidade envolvimento verdadeiro, já que todo o
deixa de fazer sentido. processo de legitimação passa por essa
Nesse sentido, a potência do falso na instância. Os documentários são, antes
arte possibilita uma liberdade de criação de mais nada, tribunais de justiça, locais
inviável dentro de uma perspectiva onde a vontade moral aflora e aponta.
moral. Deleuze diz que a narração Os falsos documentários deslocam o
falsificadora escapa do sistema de devir ético-estético-técnico ao desfazer
julgamento a que narração orgânica a oposição verdade/mentira, rompendo,
ainda se refere. Para ele, a nouvelle portanto, com a perspectiva de
vague rompeu com a forma de verdade indexação ao mundo histórico. O que se
para substituí-la por potências da vida e, abre a partir de então é uma potência
sugere ainda, que Orson Welles foi o criadora que escapa da vontade moral.
cineasta que sempre lutou contra o
sistema de julgamento a favor do afeto.
Verdades e mentiras é o exemplo mais Referências
contundente porque trata de um BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas, vol. 1.
personagem falsário da arte, sendo que Magia e técnica, arte e política. São Paulo:
a própria construção fílmica se baseia Brasiliense, 1985.
em uma narração falsificadora. Há uma DELEUZE, Gilles. A imagem-tempo (Cinema
sobreposição de falsos que desmonta 2). São Paulo: Brasiliense, 2007.
qualquer tentativa de julgamento de um DELEUZE. Gilles. Dois Regimes de Loucos.
personagem polêmico, ao mesmo tempo São Paulo: Editora 34, 2016
bandido e artista. MACHADO, Arlindo; VÉLEZ, Marta Lucía.
Documentiras e fricções: o lado escuro da
Conclusão lua. Revista Galáxia, São Paulo, nº 10, p. 11-30,
O conceito de potência do falso abre um dez. 2005.
leque enorme de possibilidades para a NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário.
produção de documentários, já que Campinas: Papirus, 2005
retira o caráter de oposição entre NIETZSCHE, Friedric. Sobre verdade e
algumas dualidades. O rompimento com mentira no sentido extramoral. In: Obras
a perspectiva platônica de uma divisão incompletas. São Paulo: Editora 34, 2014
entre mundo sensível e mundo aparente RAMOS, Fernão Pessoa. Mas afinal...o que é
gera novas formas de articulação entre mesmo documentário? São Paulo: Editora
imagens e sons. Senac São Paulo, 2008, Universidade Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006
Os documentários sempre estiveram ROSCOE, Jane; HIGHT, Craig. Faking it:
atrelados à vontade moral, na medida mock-documentary and the subversion and
em que constroem um discurso fundado factuality. Manchester: Manchester University
na vontade de verdade. A própria Press, 2001
construção do devir ético-estético-
técnico dos documentários, desde o
Recebido em 2016-11-15
início, atrelada à ideia de indexação Publicado em 2017-08-04
pressupõe essa vontade. Como lembra

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