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infraestrutura no Brasil
Recentemente, o problema – que é de fato real e urgente – ganhou novos contornos, com
a Medida Provisória 868, editada no apagar das luzes do governo de Michel Temer e
provavelmente endossada, já naquele momento, pela gestão eleita de Jair Bolsonaro.
Trata-se de um dispositivo que altera o marco regulatório do setor de saneamento no
Brasil e que, a rigor, tem como objetivo central permitir que se entregue a oferta de tal
serviço público a empresas privadas, fazendo consolidar um modelo de atendimento que,
na verdade, se tentou implementar no país durante a década de 1990, no âmbito da agenda
de privatizações do governo FHC, sem êxito significativo naquele momento, embora com
algum avanço. Hoje, os operadores privados de saneamento estão presentes em 6% dos
municípios brasileiros e enxergam possibilidades colossais de ampliação desse número,
caso a MP 868 se converta em lei.
Hoje, a empresa canadense não mais se apresenta como prestadora de serviços públicos,
mas sim como uma das maiores investidoras e gestoras globais de ativos alternativos –
de imóveis (shoppings, galpões logísticos, imóveis residenciais, alojamentos para
estudantes, concessionárias de automóveis, etc), passando por operações de infraestrutura
nos mais variados segmentos (portos, ferrovias, rodovias, eletricidade e gás, transmissão
de energia, telecomunicações, agropecuária, etc), até alcançar investimentos de private
equity, com foco na aquisição e operação de negócios de alta rentabilidade 3, em que
justamente se inclui a compra e a gestão da BRK Ambiental, cujas ações estão distribuídas
entre a canadense (70%) e o Fundo de Investimento do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço – FI-FGTS (30%).
1
https://www.brookfieldbrasilra.com.br/pt/a-brookfield-no-mundo. Acesso em 10 de agosto de 2019.
2
Idem.
3
Idem.
4
Idem.
Enfim, a descrição sobre a atuação da canadense ainda merecia ressalvas quanto à sua
presença também no mercado imobiliário e no agronegócio, mas do que se pôde registrar
até aqui, nos parece que estamos diante de uma determinada lógica de produção e de
gestão do território que transborda, como dizíamos há pouco, as especificidades de uma
leitura setorial, que, ampliada em telescópio, nos aponta mais do que um modus operandi,
mas quiçá uma determinada racionalidade, bastante distintiva, aliás, do estágio atual do
capitalismo financeirizado. Infraestrutura real, projetada, produzida, implementada, se
transmuta em ativo gerido num portfólio de investimentos em fundos privados e públicos,
capazes de garantir retorno seguro aos acionistas – certamente de maneira independente
de seus resultados enquanto atendimento efetivo à população demandatária, ou seja,
destituída de qualquer sentido público que tal produção poderia (ou deveria) implicar.
Como hipótese, acreditamos que a experiência narrada deste determinado caso nos pode
iluminar processos espoliativos ainda mais críticos no cenário atual de avanço neoliberal,
em que o Estado se postula como regulador dos mercados não para a garantia do interesse
público, mas para o seu justo contrário – as sobrerregulações via medidas provisórias, tal
como a MP 868 nos sugere, revelam intervenções no sentido de precisamente normatizar
e respaldar de legalidade a dominância financeira.