Por Viviane Machado / fevereiro 10, 2012 / Leitura / Um Comentário
Richard Romancini e Cláudia Lago
O objetivo dos autores é promover uma síntese
sobre a formação e desenvolvimento da comunicação social, em especial do jornalismo impresso, no Brasil. Ao lermos o livro é possível perceber uma forte influência do jornalismo sobre a esfera pública nacional, o que, consequentemente, faz da comunicação social um importante instrumento para a construção de nossa própria história.
O surgimento da imprensa e do jornalismo no
Brasil ocorreu, tardiamente, apenas 14 anos antes da separação do Brasil de Portugal. Alguns dos fatores que levaram a esse atraso são: o processo de colonização voltado para a produção de bens para serem exportados, que impediu o desenvolvimento interno; a predominância do ação ao analfabetismo e o atraso indígena em relação ao aprendizado do português; a falta de urbanização; a falta de iniciativa estatal em relação ao processo colonização do território; a posição periférica do Brasil diante do capitalismo mundial, já que sua economia girava em torno da produção de bens agrícolas e a rigorosa censura por parte de Portugal em relação à imprensa.
Com a chegada do príncipe regente, em 1808, o
país sofreu significantes transformações, entre elas, a abertura de portos, investimentos em economia e urbanização, criação de museus, bibliotecas e escolas. Houve também a criação Imprensa Régia (que durou 14 anos), caracterizada pela censura prévia do governo, que zelava para que não fosse impresso nada contra a religião, o governo e os bons costumes. Os primeiros jornais do país foram A Gazeta do Rio de Janeiro (de chapa branca) e o Correio Braziliense, de caráter combativo.
Durante o período de pré-independência, os jornais,
apesar de possuírem duração efêmera, começaram a se multiplicar. Em um país, cuja sociedade era composta por uma maioria de analfabetos, os jornais, que eram vendidos a preços baixos, eram de grande circulação e popularidade, o que aumentava seu poder diante da esfera pública. Após a revolução Constitucionalista de Portugal, em 1820, os jornais, caracterizados por seu caráter opinativo, passaram a estabelecer um debate a acerca das novas propostas de colonização do Brasil, despertando um sentimento autonomista e nacionalista no povo. Sua influência sobre a opinião pública foi capaz de interferir na ordem dos acontecimentos, que acabaram levando ao afastamento de D. Pedro I. Já durante no período de regências e do Segundo Reinado de D. Pedro, apesar de não contar com a mesma estrutura de países desenvolvidos economicamente, os jornais começam a se desenvolver gradualmente. Graças ao alastramento dos prelos na primeira metade do século XIX, surgiram novas e diferentes publicações, além de estimularem um maior profissionalismo. Além disso, desenvolve-se o sistema de telégrafos e de correios. A imprensa passou a consolidar-se e no cenário político dividia-se em três campos: os conservadores de direita; os liberais de direita e os liberais de esquerda. Os “pasquins”, um tipo de publicação panfletária, crítica e satírica existente desde o período de pré-independência, ganham força e, aliados a outros jornais, transmitiam novas ideologias à população, responsáveis por insuflar as revoltas do período regencial, como a Cabanagem, a Sabinada, a Balaiada e a Guerra dos Farrapos. Durante o Segundo Reinado, além do periodismo, a imprensa avançou ainda mais: a fotografia e a ilustração passaram a entrar nos jornais como forma de complementar a informação. A imprensa ilustrada ganhou força principalmente entre os jornais de cunho satírico, como por exemplo, a Revista Ilustrada, um dos jornais mais populares do século XIX. Entretanto, o aspecto mais marcante da imprensa nessa época foi sua participação nas campanhas de abolição da escravatura e proclamação da república, que levaram a um enfraquecimento da monarquia.
Entre o fim do século XIX e início do século XX a
imprensa periódica passa a se desenvolver mundialmente e começa a atingir a grande massa da população. Surgem as agências de notícias, responsáveis por suprir o noticiário internacional dos jornais. Após o fim da Primeira Guerra Mundial, o monopólio de agências, que antes era detido pela Inglaterra, França e Alemanha, passa a ser dos Estados Unidos. Com isso, o modelo de produção jornalístico dos EUA difunde-se mundialmente, influenciando os jornais, inclusive os do Brasil, com ideologias voltadas para a liberdade de imprensa e objetividade. Estabelecem- se padrões de produção como o lead, o uso da pauta e a padronização gráfica, além da adoção do ombudsman.
Já na primeira fase da república o jornalismo
brasileiro passa por um processo de transição: por um lado, ele deixa de fazer parte de um processo de produção artesanal para tornar-se um negócio, uma empresa estruturada. Por outro, ele perde seu caráter opinativo, sendo substituído pelo jornalismo de informação. Nesse período surge Assis Chateubriand, umas das figuras mais emblemáticas do jornalismo brasileiro, dono de uma rede de jornais – Os Diários Associados – e precursor da implantação da TV no país. Outra figura marcante é Irineu Marinho, pai de Roberto Marinho, que funda o Jornal O Globo. Em contraponto ao caráter empresarial que a grande imprensa assume, surgem jornais produzidos por grupos sociais específicos, como a imprensa negra, o periodismo operário e alguns meios para a divulgação do modernismo.
É durante as primeiras décadas do século XIX que
ocorre o auge da imprensa operária, a imprensa voltada para a classe proletária emergente. Ainda na década de 30 surge o rádio, que junto aos jornais impressos passam a noticiar fatos como a Segunda Guerra Mundial. Em 1950, surge a primeira emissora de TV. A partir da revolução de 1930 e a ocupação da presidência pelo gaúcho Getúlio Vargas e suas políticas de caráter populista inicia- se uma nova fase da história brasileira. Nesse período, há um controle mais severo da imprensa, ao mesmo tempo em que ela adquire mais força graças à industrialização e a melhoria das condições sociais, que aumentaram o mercado consumidor. A primeira influencia exercida pelo rádio no processo político brasileiro foi em 1932, durante a revolução Constitucionalista, na qual apoiava a elite paulista em defesa da reconstitucionalização do país. Predominavam no país duas ideologias políticas: os Integralistas (que criaram a Ação Integralista Brasileira – ABI) e os Comunistas (que criaram a Aliança Nacional Libertadora – ANL). Em 1935, uma tentativa mal-sucedida de golpe contra o governo federal por parte do Partido Comunista Brasileiro (PCB) estimulou o autoritarismo. A imprensa passa a ser fortemente censurada e são criados órgãos de repressão política. O país viveu em estado de sítio até 1937.
Com a institucionalização do regime ditatorial em
1937, a repressão à imprensa é ainda mais intensificada: novos jornais são proibidos e as liberdades civis são desrespeitadas. É nesse clima repressivo que ocorre uma descendência na arte da caricatura de imprensa. Em 1939, o governo cria o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Esse órgão era responsável por coordenar a censura ao jornalismo, controlando e manipulando a opinião pública. Além disso, eram exibidos programas radiofônicos como o “A Hora do Brasil” e cinejornais de exibição obrigatória em cinemas, que tratavam o Estado Novo como “o ápice dos ideais da Revolução de 1930”. Com essa política de produção de sua própria imagem, Getúlio Vargas ficou conhecido como o “o pai dos pobres”.
Para noticiar a Segunda Guerra Mundial, surge em
1941 o programa de rádio Repórter Esso, que durante seus 27 anos de duração obteve grande audiência. Com o apoio do Brasil aos EUA durante a guerra, a autoridade do Estado Novo foi ameaçada. Com isso, setores da sociedade e a imprensa uniram-se em prol da redemocratização do país. Surge nesse período o repórter comunista Carlos Lacerda, um dos piores inimigos políticos de Getúlio Vargas. Em 1945 são anunciadas as eleições para a presidência. A partir daí, inicia-se um período de 18 anos de democracia, em que surgiram, inclusive, jornais de cunho comunista como o “Hoje”, publicado em São Paulo.
Mesmo após a chegada do presidente Dutra ao
poder, Getúlio ainda articulava seu retorno à presidência. Esse fato é comprovado pela entrevista dada pelo político ao jornalista Samuel Wainer, em 1949. A entrevista saiu em “O Jornal”, de Assis Chateubriand e obteve grande repercussão. Em 1951 Vargas assume novamente o poder, porém sem o apoio da imprensa. O único jornal que apoiava o presidente era “A Última Hora”fundado por Wainer. O restante da imprensa, influenciada pelas duras críticas expressas por Carlos Lacerda, era claramente contra o governo. A própria TV Tupi foi usada como instrumento de ataque ao presidente. Com uma tentativa de assassinato de Carlos Lacerda por parte do chefe da Guarda Presidencial, Gregório Fortunato, as críticas ao presidente aumentam. Os membros da Aeronáutica também se voltam contra o chefe de governo, uma vez que durante o ataque, quem acabou morrendo foi o major Rubens Vaz. Com o aumento das críticas e a pressão para a renúncia, Getúlio se suicida em 5 de Agosto de 1954, antes de concluir seu mandato.
A partir daí segue-se um período relativamente
calmo para a imprensa, com a eleição de Juscelino Kubstickek e mais tarde de Jânio Quadros. Sete meses após sua posse, Jânio renuncia ao cargo e quem o assume é João Goulart, em 1961. O governo de Jango foi conturbado e marcado por uma visível polaridade social quanto á sua aprovação. Em 1964, houve o golpe militar, que tirou o presidente do poder. Inicia-se então o período de ditadura, que rompe com o ciclo democrático iniciado em 1964. A imprensa, que apoiou majoritariamente o golpe junto com parte da sociedade civil, incluindo os conservadores, passou a se revelar contra ele, vivendo um período de perseguições, censura e exílios.
Com o pretexto de assegurar a segurança nacional
contra o comunismo e combater a corrupção, os militares passaram a deter o poder e a praticar uma política de “linha-dura”, que resultou na perda das liberdades civis e cujos dissidentes eram calados com fortes censuras ou eram violentamente torturados e mortos. Paralelo á isso, a política de desenvolvimento econômico permitiu maiores avanços tecnológicos, que contribuíram para o desenvolvimento do jornalismo, em especial, da TV. Nesse período surgiram as primeiras faculdades dessa área no país e há o seu reconhecimento como profissão em 1969. A rede Globo sofreu grandes investimentos, sendo utilizada estrategicamente como forma de garantir a popularização e a legitimidade do governo militar.
Apesar do desenvolvimento, a censura à imprensa
era evidente. Surge então a imprensa alternativa de linguagem renovadora, que buscava dar notícias que os jornais tradicionais se recusavam a publicar. Em 1964 é baixado o primeiro Ato Institucional, o AI 1, decreto que alterava a estrutura institucional do país sem a consulta ao congresso. Em sequência, vieram o AI 2 e o AI 3. O AI5, o mais terrível ato institucional foi baixado em 1968, sendo conhecido como “o golpe dentro do golpe”. O AI5 dava ao presidente o poder de fechar temporariamente o congresso e intervir em estados e municípios. Além disso, procurou dar respaldo jurídico aos instrumentos de censura elaborando uma legislação casuística e com brechas para a interpretação repressiva. A tortura tornou-se um instrumento comum de repressão e a censura à imprensa foi institucionalizada, tanto por meio da censura prévia (fiscalização do material produzido pelos jornais antes de sua circulação) e da autocensura (bem mais abrangente, que informava aos veículos os assuntos cuja publicação era proibida).
Como se não bastasse, a imprensa sofreu outras
formas de repressão, como atentados de bomba, invasões de redações e bancas, prisões, inquéritos, pressões contra os donos dos veículos e violência física. Os chefes de governo se negavam a dar satisfações de seu governo e a comunicação pública da época resumia-se à exploração dos fatos positivos e ao apagamento dos negativos por meio das práticas repressivas. As propagandas de governo divulgavam slogans otimistas e autoritários, como “Ninguém segura este país” e “Brasil: ame-o ou deixe-o”.
Em 1974, no governo de Ernesto Geisel, o país
passou por um processo controlado de abertura política, que era definida como “lenta, gradual e segura”. Um dos objetivos dessa abertura era o de restabelecer a hierarquia militar, abalada pelo regime linha-dura. Esse processo continuou durante o governo Figueiredo. Em 1976 ocorreu o fim da autocensura e em 1978 o AI5 foi revogado. É possível perceber que os jornais que perceberam essa abertura e adotaram uma política editorial mais alternativa, como a “Folha de São Paulo” adquiriram grande popularidade. Um exemplo disso é a campanha de “Diretas Já”, para o sucessor do general Figueiredo. O ciclo autoritário terminou em 15 de Janeiro de 1985, com a vitória de Tancredo Neves. Entretanto, devido a doença e posteriormente à morte de Tancredo, quem assume o cargo é José Sarney.
O governo de transição de Sarney ampliou a
liberdade de imprensa, segundo a própria ideia de democracia em vigor, ao mesmo tempo em que resultou em uma maior concentração dos meios de comunicação. O modelo de mídia que mescla entretenimento e informação desenvolveu-se e, aliado ao desenvolvimento tecnológico (informatização), passou a produzir materiais simbólicos responsáveis por influenciar fortemente as massas sociais. Se por um lado, o novo jornalismo, caracterizado por uma visão empresarial, impedia um maior pluralismo, sua participação no processo de redemocratização foi fundamental para a divulgação de novos planos econômicos e políticos, influenciando nas tomadas de decisões, etc.
Um exemplo da forte influência exercida pelos
meios de comunicação foi sua capacidade de dar visibilidade à campanha para presidência de Fernando Collor de Mello, eleito em 1989 e mais tarde, de provocar, por meio de denúncias, o processo de impeachment, que levou a renúncia do então presidente e á prisão de seu aliado Paulo César Farias. A partir de 1992, sucedem-se os governos de Tancredo Neves e Fernando Henrique Cardoso. O conturbado período econômico, caracterizado pela alta inflação, fez com que o “Plano real” (que estabilizou a inflação) desse grande popularidade a FHC, um dos motivos pelos quais o ex-presidente elegeu-se duas vezes. Entre as medidas de seu governo estão a abertura e a privatização do setor de telecomunicações, com a criação da Agência Nacional de Telecomunicações, a ANATEL. Esse período de privatizações, é justamente o apontado por muitos pesquisadores como maior responsável pela oligopolização do setor.
A partir da década de 1990 a internet passa a
ganhar popularidade no Brasil, em especial com a introdução de provedores gratuitos como o IG. Nessa época surge a primeira versão de jornal on- line, a do Jornal do Brasil. A TV acabo também é iniciada pelos grupos Abril (TVA) e Globo (NET). Em 2002, Lula assume a presidência do Brasil. A crise econômica vivida pelos meios de comunicação faz com esses pressionem o governo Lula para uma política de continuidade do governo FHC. O realinhamento do partido afastou seus membros mais esquerdistas do centro do poder, aproximando o governo de uma política mais direitista. Entretanto, o PT sempre teve uma plataforma em prol da democratização dos meios de comunicação. Nesse sentido, o governo atuou na criação de órgãos de regulamentação da área, como a Agência Nacional para o Cinema e o Audiovisual (Ancinav) e o Conselho Federal de Jornalismo (CFJ). O CFJ durou pouco tempo graças as duras críticas feitas pelos grandes conglomerados de comunicação, que acusavam o governo Lula de ser contra a liberdade de imprensa. A falta de empenho do governo de levar a discussão a diante, inclusive entre os setores da sociedade, fez com que as medidas adotadas se tornem insuficientes. O escândalo do “Mensalão” foi o de maior visibilidade no governo de Lula. O escândalo foi potencializado por Roberto Jefferson, então deputado e presidente do PTB, que graças a denúncias de corrupção que sofreu, decidiu denunciar publicamente todos os envolvidos. Em relação a esse escândalo, os autores chamam a atenção para a falha dos mecanismos de fiscalização do poder público, incluindo o Jornalismo, que foram incapazes de descobrir por meio de investigações praticas como essa, que acabam por prejudicar a população e consequentemente, o exercício da cidadania.