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Olá meus amigos do RevisãoPGE, tudo certo?

Sou o Renério de Castro Júnior, Procurador do Estado de Mato Grosso e


membro do RevisãoPGE. Estarei ministrando Direito Administrativo para você neste
curso que pretende apresentar, de forma didática e sintética, porém aprofundada,
todo o conteúdo necessário à aprovação em concursos de advocacia pública.

É fato que uma preparação antecipada, focando naquilo que mais importa para
os concursos de procuradorias, o coloca um passo a frente da ampla maioria dos
concorrentes, é pensando nisto que este curso foi elaborado. O objetivo é ser uma
fonte sucinta, confiável e a mais completa possível para sua preparação.

Todo o nosso extensivo foi pensado de modo a propiciar uma análise completa
dos assuntos que você precisa conhecer para se tornar procurador. Por isso,
apresentamos um material completo em PDF’s, videoaulas sobre todos os temas, além
de simulados realizados e comentados pela própria equipe do RevisãoPGE.

Por vezes, nosso curso será “redundante”, um mesmo assunto que foi visto em
PDF será revisto na videoaula, isso tem uma função, fazer você reestudar aquilo que é
mais relevante, ajudando na fixação dos principais dispositivos legais, jurisprudências e
conceitos doutrinários.

Falando especificamente da nossa disciplina, serão abordados todos os temas


relevantes do Direito Administrativo, com abordagem simples e direta, sem rodeios e
divagações doutrinárias. Como você já deve saber, Direito Administrativo faz parte do
“núcleo duro” da advocacia pública, posso dizer que é praticamente impossível se
tornar procurador sem conhecer muito bem esta disciplina. Portanto, meu objetivo é
bem simples, auxiliá-lo a obter pontuação máxima nas suas próximas provas de
Administrativo.

Posso dizer que este curso é concebido para ser o seu único material de
estudos, isto é, você não precisará adquirir outros cursos ou materiais para estudar
Direito Administrativo. Por falar em outros cursos e matérias, já adianto que estão
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sendo utilizadas as seguintes fontes principais: Curso de Direito Administrativo do


Rafael Carvalho Rezende Oliveira; Manual de Direito Administrativo do Matheus
Carvalho; Direito Administrativo da Maria Sylvia Zanella Di Pietro; Direito
Administrativo Facilitado do Cyonil Borges e Adriel Sá; Direito Administrativo
Descomplicado do Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino; Manual de Direito
Administrativo do José dos Santos Carvalho Filho; e Direito Administrativo (sinopse) do
Ronny Charles L. de Torres e Fernando Baltar. Possivelmente outras obras ainda serão
utilizadas, afinal, o curso não está finalizado quando escrevo estas palavras.

Além disso, também foram utilizadas diversas outras fontes esporádicas,


especialmente o blog www.dizerodireito.com.br editado por Márcio André Lopes
Cavalcante e artigos publicados nos sites www.direitodoestado.com.br e
www.conjur.com.br.

Há mais um detalhe que merece comentários, nos últimos anos, as decisões do


TCU ganharam bastante relevo na provas de Direito Administrativo, especialmente nas
provas CESPE e mais ainda se estivermos falando das carreira da AGU, por isso,
prepare-se para, além de muitos julgados do STF e do STJ, encontrar dezenas (talvez
centenas) de entendimento firmados pelo TCU, o que enriquecerá nossas aulas e trará
profundidade a diversos temas essenciais para as procuradorias.

Para finalizar, nosso curso conta com um “fórum tira dúvidas” respondido por
mim mesmo. O objetivo é que você não carregue nenhuma dúvida consigo. Não sabe
ou não tem certeza se entendeu? É só perguntar no fórum que estarei a sua
disposição. É claro que não sei tudo (bem longe disso), mas não medirei esforços para
encontrar a melhor resposta possível e deixa-lo absolutamente seguro quanto ao que
responder em qualquer fase de um concurso de advocacia pública.

Enfim, aproveite profundamente o curso, tire todas as suas dúvidas e usufrua


destes próximos meses de estudos intensos e, por vezes, sacrificantes. Desse modo,
todo o esforço empregado nessa fase preparatória será recompensado com a alegria
que acompanha a aprovação, nomeação, posse e efetivo exercício nesta maravilhosa
função de advogado público.
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Vamos Juntos!
DIREITO ADMINISTRATIVO – AULA 08
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO
ESTADO
NOÇÕES GERAIS ....................................................................................................... 6
EVOLUÇÃO HISTÓRICA.............................................................................................. 8
TEORIA DA IRRESPONSABILIDADE DO ESTADO .............................................................9
TEORIA DA RESPONSABILIDADE COM CULPA (TEORIA SUBJETIVA CIVILISTA) ............11
TEORIA DA CULPA ADMINISTRATIVA (TEORIA SUBJETIVA ADMINISTRATIVISTA) .......12
TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO (TEORIA OBJETIVA) ...........................................12
TEORIA DO RISCO INTEGRAL (TEORIA OBJETIVA EXTREMADA)...................................15
TEORIA DO RISCO SOCIAL.............................................................................................18
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NA CF/88 .................................................... 19
AGENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO...................................................20
Pessoas jurídicas responsáveis .................................................................................20
Agentes do Estado ....................................................................................................23
Duplicidade das relações jurídicas – aplicabilidade da teoria da dupla garantia .....25
RESPONSABILIDADE OBJETIVA .....................................................................................28
Pressupostos da responsabilidade objetiva .............................................................29
Responsabilidade por atos lícitos .............................................................................30
RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO DO ESTADO .........................................................33
Pessoas sob custódia do Estado – presidiários, hospitalizados e estudantes – teoria
do risco criado...........................................................................................................35
TEORIAS EXPLICATIVAS DO NEXO DE CAUSALIDADE ...................................................38
EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE ........................................................................40
Culpa da vítima (exclusiva ou concorrente) .............................................................40
Caso fortuito e força maior .......................................................................................41
Fato exclusivo de terceiros .......................................................................................42
AÇÕES JUDICIAIS DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO........................................... 43
AÇÃO DE REPARAÇÃO DO DANO .................................................................................43
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AÇÃO DE REGRESSO .....................................................................................................44


DENUNCIAÇÃO DA LIDE ...............................................................................................46
PRAZO PRESCRICIONAL ................................................................................................49
TEMAS ESPECIAIS ................................................................................................... 54
RESPONSABILIDADE POR ATOS LEGISLATIVOS ............................................................54
Leis de efeitos concretos e danos desproporcionais ................................................54
Leis inconstitucionais ................................................................................................55
Omissão legislativa....................................................................................................55
RESPONSABILIDADE POR ATOS JURISDICIONAIS .........................................................57
Erro judiciário ............................................................................................................57
Prisão além do tempo fixado na sentença ...............................................................58
Demora na prestação jurisdicional ...........................................................................59
RESPONSABILIDADE DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES .............................................60
DANOS CAUSADOS POR OBRAS PÚBLICAS ..................................................................62

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NOÇÕES GERAIS

Para iniciar os estudos do tema, devemos estar cientes que o termo


“responsabilidade” é utilizado para qualquer situação em que alguma pessoa (seja
jurídica, seja física) deva responder pelas consequências dos seus atos.
Especificamente para o que estamos estudando, esse alguém é o próprio Estado que,
por possuir personalidade jurídica, também é titular de direitos e obrigações na ordem
civil.

É comum ouvir falar na existência de uma tríplice responsabilidade: a


administrativa, a penal e a civil, inconfundíveis, independentes entre si e,
eventualmente, cumuláveis.

No entanto, a responsabilidade do Estado como pessoa jurídica é sempre civil


(não confundir com a responsabilidade dos agentes que atuam em nome do Estado,
como os servidores públicos). A responsabilidade civil tem como pressuposto a
ocorrência de um dano, isso significa que o sujeito só é civilmente responsável se sua
conduta ou omissão provocar dano a terceiro, dano que pode ser de ordem material
(patrimonial) ou moral.

Quanto à independência das esferas penal, civil e administrativa, comecemos a


análise pelo art. 935 do Código Civil:

CÓDIGO CIVIL
Art. 935. A responsabilidade civil é independente da
criminal, não se podendo questionar mais sobre a
existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor,
quando estas questões se acharem decididas no juízo
criminal.
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Nesse ponto, quero que você preste atenção a um detalhe importantíssimo,


embora, em regra, as esferas administrativa, penal e civil sejam independentes entre
si, essa regra não é absoluta, havendo relativa interdependência entre tais instâncias.
A verdade é que uma vez determinada a existência do fato ou a autoria na esfera
penal, não se pode mais questionar tais elementos nas esferas civil ou
administrativa.

Mas o tema não acaba aí, você precisa estar particularmente atento para o
caso das sentenças penais absolutórias. O funcionamento é simples: a sentença penal
absolutória só influencia as esferas civil e administrativa caso fique provada a
“inexistência do fato” ou a “negativa da autoria”.

Assim, a sentença penal absolutória, tanto no caso em que fundamentada na


falta de provas para a condenação quanto na hipótese em que ainda não tenha
transitado em julgado, não vinculará o juízo cível ou administrativo.

JURISPRUDÊNCIA:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO EX EMPTO. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SENTENÇA PENAL ABSOLUTÓRIA. FALTA DE
PROVAS. TRÂNSITO EM JULGADO. INOCORRÊNCIA. VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL.
IMPOSSIBILIDADE.
(...) 3. A norma do artigo 935 do Código Civil consagra a independência relativa das
jurisdições cível e criminal.
4. Somente na hipótese de a sentença penal absolutória fundamentar-se na
inexistência do fato ou na negativa de autoria está impedida a discussão no juízo
cível.
5. A decisão fundamentada na falta de provas aptas a ensejar a condenação criminal,
como no particular, não restringe o exame da questão na esfera cível. Precedentes.
6. A sentença criminal ainda não transitada em julgado revela-se inapta a irradiar o
efeito vinculante pretendido pelo recorrente.
(Resp 1.164.236-MG, Relator(a): Min. MINISTRA NANCY ANDRIGHI, julgado em
19/02/2013)
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Para fechar este tópico de introdução, é importante saber que a
responsabilidade civil do Estado pressupõe a existência de três sujeitos: o Estado, o
terceiro lesado e o agente do Estado. Neste cenário, a CF/88 disciplina que o Estado é
civilmente responsável pelos danos que seus agentes causarem a terceiros (CF, art. 37,
§6º).

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito
privado prestadoras de serviços públicos responderão
pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem
a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa.

Ou seja, é o Estado quem deverá reparar os prejuízos causados por seus


agentes, pagando as indenizações aos terceiros lesados. É claro que isso não impede o
Estado de, após indenizar a vítima, buscar o ressarcimento correspondente de seus
agentes que tenham agido com dolo ou culpa. Não se preocupe que aprofundaremos
bastante esse assunto no decorrer desta aula.

Passadas estas noções introdutórias, vejamos a evolução histórica da


responsabilidade civil extracontratual do Estado.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Primeiramente, um aviso, este é o único assunto do Direito Administrativo em


que a evolução histórica é realmente relevante para provas de concursos
(especialmente concursos de nível superior), assim, não encare este tópico como
apenas uma “curiosidade”, é na verdade um tema importantíssimo para suas provas
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futuras.
Para bem compreendermos esta evolução, é interessante dividir a
responsabilidade civil do Estado em seis teorias básicas, quais sejam: 1º) Teoria da
irresponsabilidade do Estado; 2º) Teoria da responsabilidade com culpa; 3º) Teoria da
culpa administrativa; 4º) Teoria do risco administrativo; 5º) Teoria da responsabilidade
integral; e 6º) Teoria do risco social. Vejamos cada uma delas:

O Estado não se
Irresponsabilidade responsabiliza pelos
do Estado danos causados por
seus agentes

Há responsabilidade
Responsabilidade
apenas quando atua
com culpa
com culpa/dolo

Precisa comprovar a
Culpa administrativa "falta do serviço" ou
"culpa anônima"
Teorias:
Não se verifica a
culpa, basta haver
Risco administrativo
nexo entre o ato e o
dano

Não admite
Responsabilidade
excludentes de
integral
ilicitude

Socialização dos
riscos. O foco é a
Risco social
vítima, não o
causador do dano

TEORIA DA IRRESPONSABILIDADE DO ESTADO


Por alguns séculos, prevaleceu o entendimento de que o Estado não tinha
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qualquer responsabilidade pelos atos praticados por seus agentes, secularizada na


regra da infalibilidade real inglesa - "the king can do no wrong" - ou francesa - "Le roi
ne peut mal faire" (o rei não pode errar ou o rei não pode fazer mal), que era
extensiva aos seus representantes e auxiliares. Portanto, qualquer prejuízo decorrente
da ação estatal deveria ser considerado de responsabilidade do administrado e por ele
suportado.

Há um ponto relativamente negligenciado por vários livros de Direito


Administrativo e que merece alguma consideração, estou me referido à aplicação da
teoria da irresponsabilidade do Estado no direito brasileiro. Em outras palavras, esta
teoria já teve aplicabilidade no Brasil?

Sim, mas com ressalvas. Explico:

Durante a vigência da Constituição de 1824 (Brasil Império), a doutrina aplicou


a teoria da dupla personalidade do Estado (ou teoria do fisco), que dividia os atos
administrativos em duas espécies, atos de império e atos de gestão. Os atos de
império seriam aqueles unilaterais e praticados com o Poder Extroverso; os atos de
gestão, por sua vez, seriam aqueles que o Estado praticava na condição de “quase”
particular, atuando em relativa igualdade com os administrados.

Pois bem, nesta divisão proposta pela doutrina da época (Brasil Império), o
Estado poderia ser responsabilizado pelos atos de gestão praticados com culpa ou
dolo por seus agentes, porém, jamais poderia ser responsabilizado pelos atos de
império. Assim, quanto a estes atos (de império), adotava-se a teoria da
irresponsabilidade do Estado.

Para fechar este tópico, veja que a teoria “regalista” ou “feudal” (outros
nomes para a irresponsabilidade do Estado) era própria dos estados absolutistas e teve
como marco de superação o caso conhecido como Aresto Blanco, muito bem
explicado por Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

HISTÓRICO DO ARESTO BLANCO


O Tribunal de Conflitos é o órgão da estrutura francesa que decide se uma causa vai
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ser julgada pelo Conselho de Estado ou pelo Poder Judiciário.


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Em 8 de fevereiro de 1873, sob a relatoria do conselheiro David, o Tribunal de


Conflitos analisou o caso da menina Agnès Blanco que, brincando nas ruas da cidade
de Bordeaux, foi atingida por um pequeno vagão da Companhia Nacional de
Manufatura de Fumo. O pai da criança entrou com ação de indenização fundada na
ideia de que o Estado é civilmente responsável pelos prejuízos causados a terceiros
na prestação de serviços públicos.

O Aresto Blanco foi o primeiro posicionamento definitivo favorável à condenação do


Estado por danos decorrentes do exercício das atividades administrativas. Por isso, o
ano de 1873 pode ser considerado o divisor de águas entre o período da
irresponsabilidade estatal e a fase da responsabilidade subjetiva.

TEORIA DA RESPONSABILIDADE COM CULPA (TEORIA


SUBJETIVA CIVILISTA)
Também conhecida como teoria civilista ou teoria intermediária, a teoria da
responsabilidade subjetiva foi a primeira tentativa de enquadrar o dever estatal de
indenizar particulares por prejuízos decorrentes da prestação de serviços públicos.
Como vimos acima, o marco inicial desta teoria foi o Aresto Blanco.

A teoria subjetiva estava apoiada na lógica do Direito Civil na medida em que o


fundamento da responsabilidade é a noção de culpa/dolo1. Daí a necessidade de a
vítima comprovar a ocorrência cumulativa de quatro requisitos: a) ato; b) dano; c)
nexo causal; d) culpa ou dolo.

A doutrina reconhece o avanço representado pela teoria civilista em relação ao


período anterior, porém, ressalva que a teoria subjetiva nunca se ajustou
perfeitamente às relações de direito público diante da hipossuficiência do
administrado frente ao Estado. A dificuldade da vítima em comprovar judicialmente a
ocorrência de culpa ou dolo do agente público prejudicava a aplicabilidade e o

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Observe que para os fins do Direito Administrativo, especialmente em se tratando da
responsabilidade extracontratual do Estado, é irrelevante se o fato foi praticado com culpa ou
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dolo, em ambas as hipóteses e qualquer que seja a teoria adotada, os efeitos jurídicos são os
mesmos. Portanto, não faz diferença se o agente público atuou com intenção de lesar (dolo),
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com culpa, erro, falta do agente, falha, atraso, negligência, imprudência, imperícia. Em todos
estes casos, há igual responsabilidade subjetiva do Estado.
funcionamento prático da teoria subjetiva.

Por isso, foi necessária a criação de uma doutrina mais adequada ao Direito
Administrativo, nascendo, assim, a teoria da culpa administrativa.

TEORIA DA CULPA ADMINISTRATIVA (TEORIA SUBJETIVA


ADMINISTRATIVISTA)
Esta teoria procurou desvincular a responsabilidade do Estado da ideia de culpa
do agente estatal. Fala-se, então, em culpa do serviço público, em que o terceiro
lesado não precisava identificar o agente estatal causador do dano. Para caracterizar
a responsabilidade do Estado, basta comprovar que o serviço público não funcionou
ou funcionou de forma insatisfatória, mesmo que fosse impossível apontar o agente
responsável pela falha.

Segundo Cyonil Borges e Adriel Sá, a teoria da culpa administrativa (ou culpa
anônima) pode se consumar de três modos diversos:

1. o serviço não existe (ex: incêndio em uma casa em área não coberta
pelo Corpo de Bombeiros);
2. o serviço existe, funciona bem, porém, atrasou-se (ex: há cobertura do
Corpo de Bombeiros, contudo, demoraram quatro horas para chegar ao
incêndio e a casa queimou-se por completo);
3. o serviço existe, porém, funcionou mal (o Corpo de Bombeiros chegou
a tempo, contudo, não havia água no caminhão).

Por fim, tenha em mente que a teoria da culpa administrativa possui


aplicabilidade atual no direito brasileiro, especialmente em os casos de omissão
administrativa (mais a frente, veremos o assunto com riqueza de detalhes).

TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO (TEORIA OBJETIVA)


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Também chamada de teoria da responsabilidade sem culpa ou teoria


publicista, afasta a necessidade de comprovação de culpa ou dolo do agente público e
fundamenta o dever de indenizar na noção de risco administrativo (art. 927, parágrafo
único, do Código Civil).

CÓDIGO CIVIL
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187),
causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em
lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem.

Interpretando este dispositivo, Alexandre Mazza diz que quem presta um


serviço público assume o risco dos prejuízos que eventualmente causar,
independentemente da existência de culpa ou dolo. Assim, a responsabilidade
prescinde de qualquer investigação quanto ao elemento subjetivo.

A teoria do risco administrativo serve de fundamento para a chamada


responsabilidade objetiva do Estado, que tem merecido o acolhimento dos Estados
modernos, inclusive do Brasil, desde a Constituição de 1946.

Como afirma Hely Lopes Meirelles: “na teoria da culpa administrativa exige-se a
falta do serviço; na teoria do risco administrativo exige-se, apenas, o fato do serviço”,
ou seja, a atuação estatal que provocou o dano. Nesse contexto, é interessante
observar a lição dada pelo citado doutrinador:

TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO E SOLIDARIEDADE SOCIAL


A “teoria do risco administrativo” baseia-se no risco que a Administração Pública
assume ao atuar em nome da coletividade, risco esse consubstanciado na
possibilidade de seus atos acarretarem danos a certos membros da comunidade,
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impondo-lhes um ônus não suportado pelos demais. Para compensar essa


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desigualdade individual, oriunda das atividades da própria Administração, todos os


outros integrantes da coletividade devem concorrer para a reparação do dano,
através das indenizações pagas pelo erário. Com a repartição do ônus financeiro da
indenização, evita-se que somente alguns suportem os prejuízos causados por uma
atividade desempenhada pelo Estado no interesse de todos. Portanto, o risco e a
solidariedade social são os suportes dessa doutrina.

A teoria do risco administrativo também reconhece a desigualdade jurídica entre o


Estado e os administrados, decorrente da supremacia estatal. Para a teoria, seria
injusto que aqueles que sofressem danos patrimoniais ou morais decorrentes da
atividade do Estado precisassem comprovar a existência de culpa da
Administração ou de seus agentes para que tivessem direito à reparação.

Prosseguindo no assunto, peço sua especial atenção para um detalhe: na teoria


do risco administrativo permite-se que o Estado comprove a culpa do pretenso lesado,
de forma a eximir o erário, integral ou parcialmente, do dever de indenizar.

Assim, ao contrário do que podemos ser induzidos a pensar, a culpa não é


completamente irrelevante na teoria objetiva do risco administrativo. A culpa não
precisa ser demonstrada pelo particular que pede a indenização contra o Poder
Público. No entanto, se o Estado demonstrar que houve culpa por parte do particular
que pleiteia a indenização, exime-se de responsabilidade, podendo, inclusive, acionar
o particular para que honre com os prejuízos.

Em outras palavras, ainda que a teoria do risco administrativo não demande a


prova da culpa estatal ou do agente público, é possível ao Estado, visando excluir ou
atenuar a indenização, demonstrar a ocorrência das excludentes de
responsabilidade, especialmente a culpa exclusiva ou concorrente da vítima, fato de
terceiro, o caso fortuito e a força maior.

É justamente na aplicabilidade das excludentes de ilicitude que reside a


principal diferença entre a teoria do risco administrativo e a teoria do risco integral.
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TEORIA DO RISCO INTEGRAL (TEORIA OBJETIVA
EXTREMADA)
Pela teoria do risco integral, o Estado funciona como segurador universal,
indenizando os prejuízos suportados por terceiros, ainda que resultantes da culpa
exclusiva da vítima ou de caso fortuito ou força maior. Assim, basta a existência do
evento danoso e do nexo de causalidade para que haja a obrigação de indenizar, sem
a possibilidade de que o Estado alegue excludentes de sua responsabilidade.

O ordenamento jurídico brasileiro adotou, como regra, a teoria do risco


administrativo, mas parcela da doutrina e da jurisprudência defende a adoção do risco
integral em situações excepcionais. Exs.: responsabilidade por danos nucleares (art. 21,
XXIII, d, da CRFB); responsabilidade da União perante terceiros no caso de atentado
terrorista, ato de guerra ou eventos correlatos, contra aeronaves de matrícula
brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo, excluídas as
empresas de táxi aéreo (art. 1.º da Lei 10.744/2003).

Quanto à responsabilidade por danos nucleares, devemos fazer a ressalva de


que nem toda a doutrina é unânime em sua classificação como “risco integral”, isso
porque o dispositivo constitucional não prevê nada mais do que a pura e simples
responsabilidade objetiva, veja:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 21. Compete à União:
(...)
XXIII - explorar os serviços e instalações nucleares de
qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a
pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a
industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus
derivados, atendidos os seguintes princípios e condições:
(...)
d) a responsabilidade civil por danos nucleares
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independe da existência de culpa;


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Pela simples leitura do dispositivo parece claro que o constituinte derivado
apenas previu uma forma objetiva (“independe da existência de culpa de culpa”) de
responsabilidade do Estado, sendo realmente uma extrapolação da doutrina classificar
os danos nucleares como modalidade de responsabilidade pela teoria do risco integral.

Contudo, Sergio Cavalieri Filho (doutrinador que você sempre deve levar em
consideração quando falamos de responsabilidade civil) entende que a
responsabilidade por danos nucleares é integral, veja a fundamentação: “temos na
Constituição uma regra especial para a responsabilidade por danos nucleares, pelo
que inaplicável a regra do art. 37, § 6º. E assim é porque o constituinte quis estabelecer
um regime de responsabilidade mais severo para o dano nuclear em razão do seu
altíssimo risco. Lá (art. 37, § 6º) a responsabilidade da Administração Pública é
fundada no risco administrativo, aqui (21, XXIII, d) a responsabilidade por dano
nuclear é fundada no risco integral (…). Uma simples comparação entre os dois textos
é suficiente para se chegar a esta conclusão. A responsabilidade pelo risco
administrativo exige a relação de causa e efeito entre a atividade estatal e o dano
('responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros',
diz o texto do art. 37, § 6º), razão pela qual as causas de exclusão do nexo causal
afastam a responsabilidade do Estado. Ao disciplinar a responsabilidade por dano
nuclear, entretanto, a Constituição não exige nenhuma relação causal; fala
simplesmente que a responsabilidade independe de culpa. Ademais, não haveria
sentido para uma regra especial se tivéssemos aqui a mesma disciplina geral da
responsabilidade civil da Administração”.

Por outro lado, Alexandre Mazza aponta que: “a Lei de Responsabilidade


Civil por Danos Nucleares – Lei n. 6.653/77, prevê diversas excludentes que afastam o
dever de o operador nuclear indenizar prejuízos decorrentes de sua atividade, tais
como: culpa exclusiva da vítima, coflito armado, atos de hostilidade, guerra civil,
insurreição e excepcional fato da natureza (arts. 6º e 8º). Havendo excludentes
previstas diretamente na legislação, impõe-se a conclusão de que a reparação de
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prejuízos nucleares, na verdade, sujeita-se à teoria do risco administrativo.


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Portanto, ainda permanece a divergência doutrinária quanto à aplicação da
teoria do risco integral para danos nucleares. Se você tiver que enfrentar o tema em
uma primeira fase de concursos, especialmente CESPE, recomendo que adote a
posição segunda a qual a teoria do risco integral é aplicável para danos nucleares,
assim foi cobrado na prova de analista do TST em 2013: “A responsabilidade civil do
Estado em relação aos danos decorrentes de atividades nucleares de qualquer natureza
independe da existência de culpa, tendo sido adotada, nesse sentido, a teoria do risco
integral” (alternativa correta).

A doutrina majoritária aponta outras quatro hipóteses em que é aplicável a


teoria do risco integral:

HIPÓTESES ATUAIS DE APLICAÇÃO DA TEORIA DO RISCO INTEGRAL


nas relações de emprego público, a ocorrência de
eventual acidente de trabalho impõe ao Estado o dever de
ACIDENTES DE
indenizar em quaisquer casos, aplicando-se a teoria do
TRABALHO
risco integral;

o pagamento da indenização do DPVAT é efetuado


mediante simples prova do acidente e do dano decorrente,
SEGURO OBRIGATÓRIO
independentemente da existência de culpa, haja ou não
PARA AUTOMÓVEIS
(DPVAT) resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade
do segurado (art. 5º da Lei n. 6.194/74);

a União assume despesas de responsabilidade civil perante


terceiros na hipótese da ocorrência de danos a bens e
pessoas, passageiros ou não, provocados por atentados
ATENTADOS terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos,
TERRORISTAS EM
ocorridos no Brasil ou no exterior, contra aeronaves de
AERONAVES
matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de
transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi-
aéreo (Leis n. 10.309/2001 e 10.744/2003);
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DANOS AMBIENTAIS por força do art. 225, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal,


Página
parte da doutrina sustenta que a reparação de prejuízos
ambientais causados pelo Estado seria submetida à teoria
do risco integral, esta é a posição que prevalece no STJ (o
tema é estudado com detalhes no Direito Ambiental).

Como explicado nos parágrafos acima, há forte divergência

DANOS NUCLERARES doutrinária quanto à aplicabilidade da teoria do risco


integral para danos nucleares.

Para fechar a evolução histórica da responsabilidade do Estado, é salutar


conhecermos a teoria do risco social, embora pouco explorada, esta teoria já ganha
alguma aplicabilidade no direito brasileiro. Encare este último tópico como um
aprofundamento doutrinário, muita atenção para provas discursivas e orais.

TEORIA DO RISCO SOCIAL


Segundo José dos Santos Carvalho Filho: “tem-se desenvolvido a teoria do risco
social, segundo a qual o foco da responsabilidade civil é a vítima, e não o autor do
dano, de modo que a reparação estaria a cargo de toda a coletividade, dando ensejo
ao que se denomina de socialização dos riscos – sempre com o intuito de que o lesado
não deixe de merecer a justa reparação pelo dano sofrido. A referida teoria, no fundo,
constitui mero aspecto específico da teoria do risco integral.”

Para Cyonil Borges e Adriel Sá, a Lei Geral da Copa (Lei 12.663/12) adotou tal
teoria em seu art. 23, veja:

LEI 12.663/12
Art. 23. A União assumirá os efeitos da responsabilidade
civil perante a FIFA, seus representantes legais,
empregados ou consultores por todo e qualquer dano
resultante ou que tenha surgido em função de qualquer
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incidente ou acidente de segurança relacionado aos


Página
Eventos, exceto se e na medida em que a FIFA ou a vítima
houver concorrido para a ocorrência do dano.

Segundo os citados autores: “o artigo atribui à União o dever de reparação por


atos praticados por terceiros; logo, não se está diante da teoria do risco
administrativo, conforme estabelecido no art. 6º do art. 37 da CF/1988. É que, por
essa, exige-se que a conduta danosa advenha de ato de agente público, nessa
qualidade. Note também, que a responsabilidade da União não será ilimitada, por
serem previstas excludentes de responsabilização, donde se conclui não se tratar de
risco integral”.

Assim, o art. 23 da Lei da Copa configura a chamada “teoria do risco social”,


uma vez que se trata de risco extraordinário assumido pelo Estado, mediante lei, em
face de eventos imprevisíveis, em favor da sociedade como um todo.

Assim, essa teoria é uma forma de compartilhamento objetivo dos danos por
toda a coletividade, de modo que o prejuízo suportado por um particular seja
ressarcido por toda a coletividade. Tal teoria ainda carece de maior robustez
doutrinária, de forma que sua cobrança em provas não deve ser frequente.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NA CF/88

O legislador constituinte de 1988 seguiu uma tradição que remonta à


Constituição Federal de 1946, adotando como regra a teoria da responsabilidade
objetiva do Estado. O dispositivo fundamental para a responsabilidade civil do Estado
é o art. 37, § 6º, da CF/88, embora já o tenhamos citado acima, vale a pena relembrá-
lo:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
19

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito


Página

privado prestadoras de serviços públicos responderão


pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem
a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa.

Antes de analisarmos em mais detalhes este parágrafo § 6º, é interessante que


você conheça um julgado do STF em que foi declarada inconstitucional uma lei distrital
que ampliava de forma irrazoável a responsabilidade do Estado, veja:

JURISPRUDÊNCIA:
É inconstitucional lei estadual (distrital) que preveja o pagamento de pensão especial a
ser concedida pelo Governo do Estado (Distrito Federal) em benefício dos cônjuges de
pessoas vítimas de crimes hediondos, independentemente de o autor do crime ser ou
não agente do Estado. Tal lei amplia, de modo desmesurado (irrazoável), a
responsabilidade civil do Estado prevista no art. 37, § 6º, da CF/88.
STF. Plenário. ADI 1358/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 4/2/2015 (Info 773).

Para melhor compreender o § 6º devemos entender quem são as pessoas


responsáveis, quais são os agentes públicos e o que seria o “nessa qualidade”, vamos a
este tema.

AGENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO


Comecemos a análise por aqueles que respondem pelos danos causados, ou
seja: “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos”.

Pessoas jurídicas responsáveis


20

A regra constitucional faz referência a duas categorias de pessoas sujeitas à


Página

responsabilidade objetiva: as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas


de direito privado prestadoras de serviços públicos.

A responsabilidade objetiva prevista no art. 37, §6º, da CF/88 alcança:

• Todas as pessoas jurídicas de direito público (administração direta, autarquias


e fundações de direito público), independentemente das atividades que
exerçam;
• As pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos
(empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas de
direito privado que prestem serviços públicos);
• As pessoas privadas, não integrantes da Administração Pública, que prestem
serviços públicos mediante delegação (concessionárias, permissionárias e
detentoras de autorização de serviços públicos).

Atenção com um detalhe: não se aplica o § 6º do art. 37 para as empresas


públicas e as sociedades de economia mista que se dedicam à exploração de
atividade econômica, por força do art. 173, § 1º, da CF, que impõe sejam elas regidas
pelas normas aplicáveis às empresas privadas. Em consequência, estão elas sujeitas à
responsabilidade subjetiva comum do Direito Civil.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta
Constituição, a exploração direta de atividade econômica
pelo Estado só será permitida quando necessária aos
imperativos da segurança nacional ou a relevante
interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa
pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias que explorem atividade econômica de
produção ou comercialização de bens ou de prestação de
serviços, dispondo sobre:
(...)
21

II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas


Página
privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis,
comerciais, trabalhistas e tributários;

Mais um ponto merece especial atenção, o STF, modificando sua tradicional


jurisprudência, passou a entender que as concessionárias e permissionárias de serviço
público respondem objetivamente pelos danos causados por seus empregados, ainda
que a vítima não esteja na condição de usuária de serviço público:

JURISPRUDÊNCIA:
CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO.
PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO.
CONCESSIONÁRIO OU PERMISSIONÁRIO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO A TERCEIROS NÃO-USUÁRIOS DO
SERVIÇO. RECURSO DESPROVIDO.
I – A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de
serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do
serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal.
II - A inequívoca presença do nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano
causado ao terceiro não-usuário do serviço público, é condição suficiente para
estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado.
III – Recurso extraordinário desprovido.
(RE 591.874-RG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe 18.12.2009)

RESPONSABILIDADE CIVIL – SERVIÇO PÚBLICO – FURTO – POSTO DE PESAGEM –


VEÍCULO.
A teor do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, há responsabilidade civil
de pessoa jurídica prestadora de serviço público em razão de dano decorrente de
crime de furto praticado em posto de pesagem, considerada a omissão no dever de
vigilância e falha na prestação e organização do serviço.
(RE 598356, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em
22

08/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-153 DIVULG 31-07-2018 PUBLIC 01-08-2018)


Página
Agentes do Estado

Como pessoa jurídica que é, o Estado não pode praticar, por conta própria,
qualquer ato e, portanto, não pode causar qualquer dano a ninguém. Sua atuação se
consubstancia por seus agentes, pessoas físicas capazes de manifestar vontade real.
Entretanto, como essa vontade é imputada ao Estado, cabe a este a responsabilidade
civil pelos danos causados por aqueles que o fazem presente no mundo jurídico.

O conceito de agente público pode ser encontrado no art. 2º da Lei de


Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92):

LEI 8.429/92 (IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA)


Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei,
todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou
sem remuneração, por eleição, nomeação, designação,
contratação ou qualquer outra forma de investidura ou
vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas
entidades mencionadas no artigo anterior.

Você pode notar como o conceito é bastante amplo, de modo a abranger desde
os servidores concursados e estáveis, até agente honoríficos e sem remuneração,
como os mesários e membros do Tribunal do Júri. Até os empregados terceirizados
podem ensejar a responsabilidade extracontratual:

JURISPRUDÊNCIA:
Responsabilidade civil e processual civil. Recurso especial. Indenização por danos
morais decorrentes de ato ilícito. Legitimidade passiva. Empresa tomadora de serviços.
Funcionário terceirizado. Atuação como preposto. Precedentes. Responsabilidade
objetiva.
- O fato do suposto causador do ato ilícito ser funcionário terceirizado não exime a
tomadora do serviço de sua eventual responsabilidade;
23

- A jurisprudência do STJ entende como preposto aquele que possui relação


Página
dedependência ou presta serviço sob o interesse de outrem. Precedentes;
- O acórdão recorrido fixou a responsabilidade objetiva da concessionária de serviço
público, por ter o acusado agido na qualidade de agente da recorrente.
Recurso especial não conhecido.
(REsp 904.127-RS, Rel. Min. Nancy Andrigui, 03/10/2008)

Contudo, para que haja responsabilidade do Estado, não basta que seja agente
público, é preciso que o ato tenha sido praticado “nessa qualidade”.

Desse modo, as pessoas jurídicas responderão pelos danos que seus agentes,
nessa qualidade, causarem a terceiros. A expressão “nessa qualidade” indica a adoção
da teoria da imputação volitiva, de Otto Gierke, segundo a qual apenas são atribuídos
à pessoa jurídica os atos do agente público durante o exercício da função. Assim, o
Estado não responderá caso o dano tenha sido causado pelo agente público fora do
exercício da função estatal.

Observe que, para a jurisprudência do STF, a qualidade de agente público é


mantida quando, mesmo fora do horário de trabalho, o agente público se utiliza de
meios fornecidos pelo Estado (há julgados em sentido diverso, mas este é o
posicionamento majoritário), o exemplo clássico é do policial militar que comete crime
com a arma ou o uniforme da corporação:

JURISPRUDÊNCIA:
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO (CF, ART. 37, § 6º). POLICIAL MILITAR,
QUE, EM SEU PERÍODO DE FOLGA E EM TRAJES CIVIS, EFETUA DISPARO COM ARMA
DE FOGO PERTENCENTE À SUA CORPORAÇÃO, CAUSANDO A MORTE DE PESSOA
INOCENTE. RECONHECIMENTO, NA ESPÉCIE, DE QUE O USO E O PORTE DE ARMA DE
FOGO PERTENCENTE À POLÍCIA MILITAR ERAM VEDADOS AOS SEUS INTEGRANTES NOS
PERÍODOS DE FOLGA. CONFIGURAÇÃO, MESMO ASSIM, DA RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO PODER PÚBLICO. PRECEDENTE (RTJ 170/631). PRETENSÃO DO ESTADO
DE QUE SE ACHA AUSENTE, NA ESPÉCIE, O NEXO DE CAUSALIDADE MATERIAL, NÃO
24

OBSTANTE RECONHECIDO PELO TRIBUNAL “A QUO”, COM APOIO NA APRECIAÇÃO


Página

SOBERANA DO CONJUNTO PROBATÓRIO. INADMISSIBILIDADE DE REEXAME DE


PROVAS E FATOS EM SEDE RECURSAL EXTRAORDINÁRIA. PRECEDENTES ESPECÍFICOS
EM TEMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ACÓRDÃO RECORRIDO
QUE SE AJUSTA À JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE CONHECIDO
E IMPROVIDO.
(RE 291.035-SP, Rel. Min. Celso de Mello, Info 421)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL


OBJETIVA DO ESTADO. ARTIGO 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. Crime praticado por
policial militar durante o período de folga, usando arma da corporação.
Responsabilidade civil objetiva do Estado. Precedentes. Agravo regimental a que se
nega provimento.
(RE 418023 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 09/09/2008,
DJe-197 DIVULG 16-10-2008 PUBLIC 17-10-2008 EMENT VOL-02337-04 PP-00741 RTJ
VOL-00207-03 PP-01206)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO


EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO. ATO
OMISSIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. AGENTE PÚBLICO FORA DE SERVIÇO.
CRIME PRATICADO COM ARMA DA CORPORAÇÃO. ART. 37, § 6º, DA CF/88. 1.
Ocorrência de relação causal entre a omissão, consubstanciada no dever de vigilância
do patrimônio público ao se permitir a saída de policial em dia de folga, portando o
revólver da corporação, e o ato ilícito praticado por este servidor. 2.
Responsabilidade extracontratual do Estado caracterizada. 3. Inexistência de
argumento capaz de infirmar o entendimento adotado pela decisão agravada. 4.
Agravo regimental improvido.
(RE 213525 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em
09/12/2008, DJe-025 DIVULG 05-02-2009 PUBLIC 06-02-2009 EMENT VOL-02347-05
PP-00947 RTJ VOL-00209-02 PP-00855)
25

Duplicidade das relações jurídicas – aplicabilidade da


Página

teoria da dupla garantia


O já citado art. 37, § 6º, CF/88, apresenta duas relações jurídicas com pessoas
diversas e fundamentos jurídicos igualmente diversos. Na primeira parte do
dispositivo, regula a relação jurídica entre o Estado e o particular prejudicado pelo
dano, sendo aquele considerado civilmente responsável por danos causados a este. O
fundamento jurídico dessa relação reside na responsabilidade objetiva do Estado,
assim, fica dispensada a prova da culpa.

Por outro lado, a parte final do texto faz menção à relação jurídica pertinente
ao direito de regresso, dela fazendo parte o Estado (ou a pessoa jurídica de Direito
Privado prestadora de serviço público) e o agente. Ao dizer que o Estado pode exercer
seu direito de regresso contra o agente responsável nos casos de culpa ou dolo, a
CF/88 vinculou as partes à teoria da responsabilidade subjetiva ou com culpa. Ou
seja, o Estado só pode ressarcir-se do montante com que indenizou o lesado se
comprovar a atuação culposa de seu agente.

A partir de tal duplicidade de relações, cresceu na doutrina e na jurisprudência


um intenso debate quanto à possibilidade de o particular lesado ajuizar a demanda
indenizatória em face do Estado, do Estado e do agente, ou apenas do agente. Em
outras palavras, poderia o particular processar diretamente o agente causador do
dano? Ou deveria processar tão somente a pessoa jurídica responsável?

Após algumas idas e vindas, prevaleceu no Supremo Tribunal Federal que: a


ação de reparação deve ser movida contra a Administração (pessoa jurídica), e não
contra o agente que causou o dano.

Isso porque, nos termos do art. 37, §6º, da CF/88, é a própria pessoa jurídica
(de direito público ou de direito privado prestadora de serviço público) que responde
objetivamente pela reparação dos danos causados a terceiros por seus agentes. Por
consequência, quem deve figurar no polo passivo da ação de indenização movida pelo
particular é a pessoa jurídica, e não o agente público; este tampouco poderá figurar
em conjunto com a pessoa jurídica, na posição de litisconsorte.
26

Essa é a teoria da ação regressiva como dupla garantia, segundo a qual a ação
Página

regressiva (Estado X agente público) representa garantia em favor: A) do particular:


possibilitando-lhe ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito público, ou de
direito privado que preste serviço público, dado que possuem maior patrimônio para
fazer frente ao pagamento da indenização; B) do próprio agente público: que somente
responde administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional
se vincular, protegendo-se, assim, de eventual “assédio judicial” praticado por
particulares.

JURISPRUDÊNCIA:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO DE
REPARAÇÃO DE DANOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO: § 6º DO ART. 37
DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. AGENTE PÚBLICO. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD
CAUSAM. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da RE n. 327.904,
Relator o Ministro Carlos Britto, DJ de 8.9.06, fixou entendimento no sentido de que
"somente as pessoas jurídicas de direito público, ou as pessoas jurídicas de direito
privado que prestem serviços públicos, é que poderão responder, objetivamente,
pela reparação de danos a terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos
agentes, agindo estes na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas
comuns". Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento”.
(RE nº 470.996/RO-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJe de 11/9/09)

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO


ESTADO: § 6º DO ART. 37 DA MAGNA CARTA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM.
AGENTE PÚBLICO (EX-PREFEITO). PRÁTICA DE ATO PRÓPRIO DA FUNÇÃO. DECRETO DE
INTERVENÇÃO. O § 6º do artigo 37 da Magna Carta autoriza a proposição de que
somente as pessoas jurídicas de direito público, ou as pessoas jurídicas de direito
privado que prestem serviços públicos, é que poderão responder, objetivamente,
pela reparação de danos a terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos agentes,
agindo estes na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas comuns. Esse
mesmo dispositivo constitucional consagra, ainda, dupla garantia: uma, em favor do
particular, possibilitando-lhe ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito
27

público, ou de direito privado que preste serviço público, dado que bem maior,
Página

praticamente certa, a possibilidade de pagamento do dano objetivamente sofrido.


Outra garantia, no entanto, em prol do servidor estatal, que somente responde
administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se
vincular. Recurso extraordinário a que se nega provimento”.
(RE nº 327.904/SP, Primeira Turma, Relator o Ministro Carlos Britto, DJ de 8/9/06)

Uma ressalva é importante, embora este seja o posicionamento do STF, há


bastante divergência na doutrina, José dos Santos Carvalho Filho, por exemplo,
entende que: “o fato de ser atribuída responsabilidade objetiva à pessoa jurídica não
significa a exclusão do direito de agir diretamente contra aquele que causou o dano”.

Do mesmo modo, Celso Antônio Bandeira de Mello entende que “a vítima pode
propor ação de indenização contra o agente, contra o Estado ou contra ambos, como
responsáveis solidários, no caso de dolo ou culpa”.

Enfim, caso o tema seja cobrado em uma prova objetiva, marque o


posicionamento do STF, exceto se a questão claramente mencionar o entendimento
doutrinário do assunto.

RESPONSABILIDADE OBJETIVA
Embora já tenhamos falado da responsabilidade objetiva quando analisamos a
evolução histórica das teorias, mais alguns aspectos merecem ser analisados.

De início, tenha em mente que o entendimento dominante na doutrina e


jurisprudência é que apenas as condutas comissivas (praticadas por ação e não por
omissão) ensejam a responsabilidade objetiva do Estado. Em casos de omissão
aplicaremos a responsabilidade subjetiva, conforme veremos mais a frente nesta
mesma aula.

No mais, conforme a teoria do risco administrativo, o Estado tem o dever de


indenizar o dano sofrido de forma injusta pelo particular, não importando se há falta
28

do serviço ou culpa/dolo do agente público. Existindo o dano, o Estado tem a


Página

obrigação de indenizar, veja o seguinte julgado do STF:


JURISPRUDÊNCIA:
Responsabilidade civil do Estado: caracterização: morte causada a particular por
agente da Polícia Rodoviária em serviço: irrelevância, nas circunstâncias do caso, de ter
sido o servidor absolvido por legítima defesa de terceiro, se a agressão a esse não
atribuída à vítima, mas a outrem, não atingido.
(RE nº 229.653/PR, Primeira Turma, Relator o Sepúlveda Pertence, DJe de 12/06/2001)

Pressupostos da responsabilidade objetiva

Como ensina José dos Santos Carvalho Filho, para configurar-se a


responsabilidade objetiva, bastam três pressupostos:

• O primeiro deles é a ocorrência do fato administrativo, assim


considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva,
legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público.
Ainda que o agente estatal atue fora de suas funções, mas a pretexto de
exercê-las, o fato é tido como administrativo, no mínimo pela má
escolha do agente (culpa in eligendo) ou pela má fiscalização de sua
conduta (culpa in vigilando).
• O segundo pressuposto é o dano. Já vimos que não há falar em
responsabilidade civil sem que a conduta haja provocado um dano. Não
importa a natureza do dano: tanto é indenizável o dano patrimonial
como o dano moral. Logicamente, se o dito lesado não prova que a
conduta estatal lhe causou prejuízo, nenhuma reparação terá a
postular.
• O último pressuposto é o nexo causal (ou relação de causalidade) entre
o fato administrativo e o dano. Significa dizer que ao lesado cabe
apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta
estatal, sem qualquer consideração sobre o dolo ou a culpa. Se o dano
decorre de fato que, de modo algum, pode ser imputado à
29

Administração, não se poderá imputar responsabilidade civil a esta;


Página
inexistindo o fato administrativo, não haverá, por consequência, o nexo
causal. Essa é a razão por que não se pode responsabilizar o Estado por
todos os danos sofridos pelos indivíduos, principalmente quando
decorrem de fato de terceiro ou de ação da própria vítima.

Quanto aos elementos acima descritos, o STF já se manifestou no sentido de


que "os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade
civil objetiva do Poder Público compreendem:

• a auteridade do dano;
• a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento
positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público;
• (e) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do
Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em
conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não,
do comportamento funcional (RTJ 140/636); e
• a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ
99/1155 - RTJ 131/417).

Quanto à aplicação da teoria da responsabilidade objetiva da Administração, O


aspecto mais importante é que o dever de indenizar o prejudicado surge sem que se
faça necessária qualquer investigação sobre o elemento culpa da conduta
administativa. Por conseguinte, decisões lícitas do governo são suscetíveis, em alguns
casos, de ensejar a obrigação indenizatória por parte do Estado.

Responsabilidade por atos lícitos

Para melhor compreender o assunto, veja este trecho do julgamento do STF no


“caso VARIG”. Na sequência, observe um julgado em que o STJ negou a indenização
em prol das empresas privadas:
30

JURISPRUDÊNCIA:
Página
RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. RESPONSABILIDADE DA UNIÃO POR DANOS CAUSADOS
À CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO DE TRANSPORTE AÉREO (VARIG S/A). RUPTURA DO
EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO DECORRENTE DOS EFEITOS DOS
PLANOS “FUNARO” E “CRUZADO”. DEVER DE INDENIZAR. RESPONSABILIDADE POR
ATOS LÍCITOS QUANDO DELES DECORREREM PREJUÍZOS PARA OS PARTICULARES EM
CONDIÇÕES DE DESIGUALDADE COM OS DEMAIS. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA
LEGALIDADE, DO DIREITO ADQUIRIDO E DO ATO JURÍDICO PERFEITO.
(...)
9. Indenização que se impõe: teoria da responsabilidade objetiva do Estado com base
no risco administrativo. Dano e nexo de causalidade comprovados, nos termos do
acórdão recorrido.
10. O Estado responde juridicamente também pela prática de atos lícitos, quando
deles decorrerem prejuízos para os particulares em condições de desigualdade com
os demais. Impossibilidade de a concessionária cumprir as exigências contratuais com
o público, sem prejuízos extensivos aos seus funcionários, aposentados e pensionistas,
cujos direitos não puderam ser honrados.
11. Apesar de toda a sociedade ter sido submetida aos planos econômicos,
impuseram-se à concessionária prejuízos especiais, pela sua condição de
concessionária de serviço, vinculada às inovações contratuais ditadas pelo poder
concedente, sem poder atuar para evitar o colapso econômico-financeiro. Não é
juridicamente aceitável sujeitar-se determinado grupo de pessoas – funcionários,
aposentados, pensionistas e a própria concessionária – às específicas condições com
ônus insuportáveis e desigualados dos demais, decorrentes das políticas adotadas, sem
contrapartida indenizatória objetiva, para minimizar os prejuízos sofridos, segundo
determina a Constituição.
(...)
(RE 571969, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 12/03/2014,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-181 DIVULG 17-09-2014 PUBLIC 18-09-2014)
O Ministério da Fazenda editou a Portaria nº 492/1994, reduzindo de 30% para 20% a
alíquota do imposto de importação dos brinquedos em geral. Com a redução da
31

alíquota, houve a entrada de um enorme volume de brinquedos importados no Brasil,


Página
oriundos especialmente da China, sendo estes bem mais baratos que os nacionais.
Como resultado, várias indústrias de brinquedos no Brasil foram à falência e, mesmo
as que permaneceram, sofreram grandes prejuízos. Uma famosa indústria de
brinquedos ingressou com ação contra a União afirmando que a Portaria, apesar de ser
um ato lícito, gerou prejuízos e que, portanto, o Poder Público deveria ser condenado
a indenizá-la. O STJ não concordou com o pedido.
Não se verifica o dever do Estado de indenizar eventuais prejuízos financeiros do setor
privado decorrentes da alteração de política econômico-tributária no caso de o ente
público não ter se comprometido, formal e previamente, por meio de determinado
planejamento específico.
A referida Portaria tinha finalidade extrafiscal e a possibilidade de alteração das
alíquotas do imposto de importação decorre do próprio ordenamento jurídico, não
havendo que se falar em quebra do princípio da confiança.
O impacto econômico-financeiro sobre a produção e a comercialização de mercadorias
pelas sociedades empresárias causado pela alteração da alíquota de tributos decorre
do risco da atividade próprio da álea econômica de cada ramo produtivo.
Não havia direito subjetivo da indústria quanto à manutenção da alíquota do imposto
de importação.
STJ. 1ª Turma. REsp 1492832-DF, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 04/09/2018
(Info 634).

Assim, podemos observar que, para a configuração do dever de indenizar em


casos de atos lícitos, é necessária a ocorrência de danos anormais e específicos.
Conforme Matheus Carvalho, isso ocorre porque nos atos lícitos: “o dano deve ser
certo, valorado economicamente e de possível demonstração. Nos atos ilícitos não
ocorre esse aditivo porque a conduta por si só já gera o dever de indenizar, haja vista a
violação direta ao princípio da legalidade”.

Ademais, a responsabilização do Estado em caso de condutas lícitas se baseia


no princípio da isonomia. Isso porque, embora legal, o ato administrativo gerou
32

anormal e específico dano a determinado indivíduo, não sendo justo que este arque
Página

com todo o prejuízo de um ato que feito em prol da coletividade.


Como se pode notar, no caso do Resp 1.492.832/DF (acima exposto), não
houve um dano específico, sendo certo que não existe dever do Estado de indenizar o
setor privado por eventuais prejuízos financeiros decorrentes da alteração de política
econômico-tributária, salvo se o Poder Público tivesse se comprometido com este
setor econômico, formal e previamente, por meio de planejamento específico, ou seja,
se o Estado tivesse combinado uma determinada ação econômica que não foi
cumprida.

RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO DO ESTADO


No tópico acima analisamos os casos de responsabilidade por atos comissivos
do Estado (vimos que a regra é a responsabilidade objetiva). Agora, veremos a
responsabilidade na hipótese de omissão do Poder Público.

Quando há omissão, regra geral, existe a necessidade de se averiguar a culpa


para a responsabilização do Estado. Assim, nas hipóteses de danos provocados por
omissão do Estado, a sua responsabilidade civil passa ser de natureza subjetiva, na
modalidade culpa administrativa. Nesses casos, a pessoa que sofreu o
dano, para ter direito à indenização do Estado, tem que provar a culpa da
Administração Pública (lembrando que o ônus da prova será do particular).

Portanto, o entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante é de que na


responsabilidade do Estado por omissão prevalece a teoria da culpa administrativa,
também chamada de teoria da "falta do serviço", segundo a qual o lesado deve
demonstrar que o Estado tinha o dever legal de agir e que falhou no cumprimento
deste dever legal. O elemento subjetivo da culpa não precisa estar identificado,
motivo pelo qual se chama “culpa anônima”, não individualizada, pois o dano não
decorreu de atuação de agente público, mas de omissão do poder público.

Veja dois casos em que o STF entendeu que, por se tratar de omissão do Poder
Público, há de ser verificada a hipótese de culpa administrativa do Estado:
33

JURISPRUDÊNCIA:
Página
A Turma negou provimento a recurso extraordinário no qual se pretendia, sob a
alegação de ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, a reforma de acórdão do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio Grande do Norte que, entendendo caracterizada na espécie a
responsabilidade objetiva do Estado, reconhecera o direito de indenização devida a
filho de preso assassinado dentro da própria cela por outro detento. A Turma, embora
salientando que a responsabilidade por ato omissivo do Estado caracteriza-se como
subjetiva - não sendo necessária, contudo, a individualização da culpa, que decorre,
de forma genérica, da falta do serviço -, considerou presente, no caso, o nexo de
causalidade entre a ação omissiva atribuída ao Poder Público e o dano, por competir
ao Estado zelar pela integridade física do preso. Precedentes citados: RE 81602/MG
(RTJ 77/601), RE 84072/BA (RTJ 82/923).
RE 372472/RN, rel. Min. Carlos Velloso, 4.11.2003. (RE-372472)

Por entender ausente o nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao Poder
Público e o dano causado a particular, a Turma conheceu e deu provimento a recurso
extraordinário para, reformando acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul, afastar a condenação por danos morais e materiais imposta ao
mesmo Estado, nos autos de ação indenizatória movida por viúva de vítima de
latrocínio praticado por quadrilha, da qual participava detento foragido da prisão há
4 meses. A Turma, assentando ser a espécie hipótese de responsabilidade subjetiva
do Estado, considerou não ser possível o reconhecimento da falta do serviço no caso,
uma vez que o dano decorrente do latrocínio não tivera como causa direta e
imediata a omissão do Poder Público na falha da vigilância penitenciária, mas
resultara de outras causas, como o planejamento, a associação e própria execução do
delito, ficando interrompida, portanto, a cadeia causal. Precedentes citados: RE
130764/PR (RTJ 143/270), RE 172025/RJ (DJU de 19.12.96) e RE 179147/SP (RTJ
179/791).
RE 369820/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 4.11.2003. (RE-369820)
34

Abaixo, um interessante julgado em que foi declarada a responsabilidade por


Página

omissão da concessionária de serviço público:


JURISPRUDÊNCIA:
Foi encontrado um cadáver humano em decomposição em um dos reservatórios de
água que abastece uma cidade.
Determinado consumidor ajuizou ação de indenização contra a empresa pública
concessionária do serviço de água e o STJ entendeu que ela deveria ser condenada a
reparar os danos morais sofridos pelo cliente.
Ficou configurada a responsabilidade subjetiva por omissão da concessionária
decorrente de falha do dever de efetiva vigilância do reservatório de água.
Além disso, restou caracterizada a falha na prestação do serviço, indenizável por dano
moral, quando a Companhia não garantiu a qualidade da água distribuída à população.
O dano moral, no caso, é in re ipsa, ou seja, o resultado danoso é presumido.
STJ. 2ª Turma. REsp 1492710-MG, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em
16/12/2014 (Info 553).

A responsabilidade subjetiva do Estado comumente se aplica a situações em


que há dano em decorrência de atos de terceiros, não agentes públicos (ex: multidões)
ou de fenômenos da natureza (ex: enchente ou vendaval). Nesses casos, para se
atribuir ao Estado a responsabilidade civil pelo prejuízo, há necessidade de se provar a
culpa administrativa.

Por outro lado, caso se verifique que o dano decorreu exclusivamente de atos
de terceiros ou fenômenos da natureza, sem qualquer omissão culposa da
Administração, esta não terá a obrigação de indenizar. Portanto, a responsabilidade
pela falta do serviço só existe quando o dano era evitável.

O que acabamos de analisar se refere à regra geral para os casos de omissão


estatal, vejamos agora os casos específicos em que o Estado tem o dever especial de
guarda (ou dever de custódia) para com algumas pessoas específicas.

Pessoas sob custódia do Estado – presidiários,


35

hospitalizados e estudantes – teoria do risco criado


Página
Para o STF, quando o Estado tem o dever legal de garantir a integridade de
pessoas ou coisas que estejam sob sua proteção direta (ex: presidiários e
hospitalizados) ou a ele ligadas por alguma condição específica (ex: estudantes de
escolas públicas) o Poder Público responderá por danos ocasionados a essas pessoas
ou coisas, com base na responsabilidade objetiva prevista no art. 37, §6º, mesmo que
os danos não tenham sido diretamente causados por atuação de seus agentes.

Portanto, excepcionalmente, o Estado responde objetivamente pela sua


omissão no dever de custódia dessas pessoas ou coisas.

A responsabilidade objetiva nesses casos decorre de uma omissão específica


do Estado, que possibilitou a ocorrência do dano. A omissão específica, que enseja a
responsabilidade objetiva para a Administração, difere da omissão genérica, que
gera a responsabilidade subjetiva.

JURISPRUDÊNCIA:
O STF decidiu que a responsabilização objetiva do Estado em caso de morte de
detento somente ocorre quando houver inobservância do dever específico de
proteção previsto no art. 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal (RE 841526/RS).
Não haverá responsabilidade civil do Estado se o Tribunal de origem, com base nas
provas apresentadas, decide que não se comprovou que a morte do detento foi
decorrente da omissão do Poder Público e que o Estado não tinha como montar
vigilância a fim de impedir que o preso ceifasse sua própria vida.
Tendo o acórdão do Tribunal de origem consignado expressamente que ficou
comprovada causa impeditiva da atuação estatal protetiva do detento, rompeu-se o
nexo de causalidade entre a suposta omissão do Poder Público e o resultado danoso.
STJ. 2ª Turma. REsp 1305259/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em
08/02/2018.

Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em


36

seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico,


Página

é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, a obrigação


de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em
decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.
STF. Plenário. RE 580252/MS, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Gilmar
Mendes, julgado em 16/2/2017 (repercussão geral) (Info 854).

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO


ESTADO POR MORTE DE DETENTO. ARTIGOS 5º, XLIX, E 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL.
(...)
3. É dever do Estado e direito subjetivo do preso que a execução da pena se dê de
forma humanizada, garantindo-se os direitos fundamentais do detento, e o de ter
preservada a sua incolumidade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição
Federal). 4. O dever constitucional de proteção ao detento somente se considera
violado quando possível a atuação estatal no sentido de garantir os seus direitos
fundamentais, pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil
objetiva estatal, na forma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. 5. Ad
impossibilia nemo tenetur, por isso que nos casos em que não é possível ao Estado
agir para evitar a morte do detento (que ocorreria mesmo que o preso estivesse em
liberdade), rompe-se o nexo de causalidade, afastando-se a responsabilidade do
Poder Público, sob pena de adotar-se contra legem e a opinio doctorum a teoria do
risco integral, ao arrepio do texto constitucional. 6. A morte do detento pode ocorrer
por várias causas, como, v. g., homicídio, suicídio, acidente ou morte natural, sendo
que nem sempre será possível ao Estado evitá-la, por mais que adote as precauções
exigíveis. 7. A responsabilidade civil estatal resta conjurada nas hipóteses em que o
Poder Público comprova causa impeditiva da sua atuação protetiva do detento,
rompendo o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso. 8.
Repercussão geral constitucional que assenta a tese de que: em caso de inobservância
do seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição
Federal, o Estado é responsável pela morte do detento. 9. In casu, o tribunal a quo
assentou que inocorreu a comprovação do suicídio do detento, nem outra causa capaz
37

de romper o nexo de causalidade da sua omissão com o óbito ocorrido, restando


Página
escorreita a decisão impositiva de responsabilidade civil estatal. 10. Recurso
extraordinário DESPROVIDO.
(RE 841526, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 30/03/2016,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-159 DIVULG 29-07-2016
PUBLIC 01-08-2016)

RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO POR DANOS CAUSADOS A ALUNOS NO


RECINTO DE ESTABELECIMENTO OFICIAL DE ENSINO.
- O Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos estabelecimentos da
rede oficial de ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua
integridade física, devendo empregar todos os meios necessários ao integral
desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em responsabilidade civil
pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno.
- A obrigação governamental de preservar a intangibilidade física dos alunos, enquanto
estes se encontrarem no recinto do estabelecimento escolar, constitui encargo
indissociável do dever que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a todos os
estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público nos
estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa obrigação, e vulnerada a
integridade corporal do aluno, emerge a responsabilidade civil do Poder Público pelos
danos causados a quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda, vigilância
e proteção das autoridades e dos funcionários escolares, ressalvadas as situações que
descaracterizam o nexo de causalidade material entre o evento danoso e a atividade
estatal imputável aos agentes públicos”
(RE 109.615, Rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma, DJ 2.8.1996).

TEORIAS EXPLICATIVAS DO NEXO DE CAUSALIDADE


O nexo de causalidade, embora já abordado acima, merece uma explicação um
pouco mais detalhada.
38

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira, diversas teorias procuram explicar o


Página

nexo causal, especialmente nas hipóteses de causalidades múltiplas ou concausas,


cabendo destacar as seguintes:

• Teoria da equivalência das condições (equivalência dos antecedentes


ou conditio sine qua non): de acordo com a presente teoria, elaborada
por Von Buri, todos os antecedentes que contribuírem de alguma forma
para o resultado são equivalentes e considerados causas do dano. A
eliminação hipotética de uma dessas condições afastaria a ocorrência
do resultado. A principal crítica à teoria é o regresso infinito do nexo de
causalidade, acarretando insegurança jurídica e injustiça (ex.: em caso
de homicídio, a responsabilidade seria estendida ao fabricante da
arma).
• Teoria da causalidade adequada: elaborada por Ludwig von Bar e
desenvolvida por Johannes von Kries, a teoria considera como causa do
evento danoso aquela que, em abstrato, seja a mais adequada para a
produção do dano. Vale dizer: os antecedentes do evento não são
equivalentes, devendo ser considerado como causa do dano apenas o
antecedente que tiver maior probabilidade hipotética, a partir daquilo
que normalmente ocorre na vida em sociedade, de produzir o resultado
danoso. O problema dessa teoria é imputar o dano a alguém a partir de
mero juízo de probabilidade (e não de certeza), que, em razão da
ausência de critérios precisos, é pautado por incertezas.
• Teoria da causalidade direta e imediata (ou teoria da interrupção do
nexo causal): os antecedentes do resultado não se equivalem e apenas
o evento que se vincular direta e imediatamente com o dano será
considerado causa necessária do dano. Apesar de sofrer críticas,
notadamente por restringir o nexo causal, dificultando a
responsabilização nos casos de danos indiretos ou remotos, a teoria da
causalidade direta e imediata foi consagrada no art. 403 do CC.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 130.764, assentou que a


teoria adotada no Brasil é a do dano direto e imediato, também denominada teoria da
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interrupção do nexo causal, que “só admite o nexo de causalidade quando o dano é
Página

efeito necessário de uma causa, o que abarca o dano direto e imediato sempre, e,
por vezes, o dano indireto e remoto, quando, para a produção deste, não haja
concausa sucessiva”.

EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE
Como já exposto, o direito brasileiro, em regra, adota a responsabilidade
objetiva na variação da teoria do risco administrativo. Menos vantajosa para a vítima
do que a do risco integral, isso porque a teoria do risco administrativo reconhece
excludentes da responsabilidade estatal, enquanto a teoria do risco integral não as
aceita.

Vejamos cada uma das excludentes.

Culpa da vítima (exclusiva ou concorrente)

Ocorre a culpa exclusiva da vítima quando ficar comprovado que o prejudicado,


na verdade, foi o único responsável pelo resultado danoso, então ele não é vítima, e
sim o próprio causador do dano, devendo, portanto, arcar com os prejuízos causados a
si mesmo.

Neste caso, não há que se falar em responsabilidade do Poder Público.

Como explica Alexandre Mazza: “diferente é a solução para os casos da


chamada culpa concorrente, em que a vítima e o agente público provocam, por culpa
recíproca, a ocorrência do prejuízo. Nesses casos, fala-se em concausas. Exemplo:
acidente de trânsito causado porque a viatura e o carro do particular invadem ao
mesmo tempo a pista alheia. Nos casos de culpa concorrente, a questão se resolve
com a produção de provas periciais para determinar o maior culpado. Da maior
culpa, desconta-se a menor, realizando um processo denominado compensação de
culpas. A culpa concorrente não é excludente da responsabilidade estatal, como
40

ocorre com a culpa exclusiva da vítima. Na verdade, a culpa concorrente é fator de


Página

mitigação ou causa atenuante da responsabilidade”.


No caso de suicídio envolvendo paciente internado em hospital público, o
STF já se manifestou que a responsabilidade extracontratual do Estado fica
excluída pela culpa exclusiva da vítima:

JURISPRUDÊNCIA:
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE
EXTRACONTRATUAL DO ESTADO. SUICÍDIO DE PACIENTE EM HOSPITAL PÚBLICO.
INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CAUSAL ENTRE O EVENTO E A ATUAÇÃO DO ENTE PÚBLICO.
1. A discussão relativa à responsabilidade extracontratual do Estado, referente ao
suicídio de paciente internado em hospital público, no caso, foi excluída pela culpa
exclusiva da vítima, sem possibilidade de interferência do ente público.
2. Agravo regimental improvido.
RE 318725/RJ, rel. Min. Ellen Grace, 16.12.2008.

Caso fortuito e força maior

Não há consenso doutrinário quanto ao que seria o caso fortuito e a força


maior. Alguns autores dizem que caso fortuito decorre de eventos da natureza e força
maior da conduta humana; outros autores afirmam exatamente o contrário.

ATENÇÃO COM A DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA

A posição majoritária da doutrina e da jurisprudência que considera “caso


fortuito” e “força maior” como se fossem a mesma coisa. Nesse sentido, tanto o
caso fortuito como a força maior constituem fatos imprevisíveis, não imputáveis à
Administração e que podem romper a necessária causalidade entre a ação do
Estado e o dano causado.

Contudo, Celso Antônio Bandeira de Melo e Maria Sylvia Zanella Di Pietro


têm uma posição que, embora minoritária, deve ser levada em consideração, haja
vista a “moral” dos citados doutrinadores com as bancas examinadoras de
concursos.
41
Página

Para tais autores, a força maior é um evento externo à Administração de


natureza imprevisível e irresistível, que rompe o nexo de causalidade entre a ação
estatal e o prejuízo sofrido pelo particular (ex: tornados, guerras e revoltas
populares).

O caso fortuito, por sua vez, seria um evento interno, ou seja, decorrente de
uma atuação da Administração, mas com resultados anômalos, tecnicamente
inexplicáveis e imprevisíveis (ex: queda de um poste de energia elétrica ou o
entupimento repentino de um bueiro).

Portanto, para os autores, somente as situações de força maior eximem a


responsabilidade objetiva civil da Administração Pública, mas não os eventos
internos enquadrados como caso fortuito.

Outro aspecto que merece atenção é a aplicabilidade da teoria civilista do


fortuito externo. Em situações de roubos e furtos em transportes coletivos, o STJ vem
entendendo, predominantemente, que sem a prova da culpa, não há como
responsabilizar a empresa concessionária de transporte, já que ela própria assume a
condição de lesada juntamente com os passageiros (RESP 294610/RJ). Assim, como a
segurança não está relacionada ao serviço prestado pela empresa de transporte, o STJ
entende que ocorre a excludente de responsabilidade conhecida como “fortuito
externo”; caso a segurança fosse parte integrante do serviço público prestado, seria o
caso de “fortuito interno” e, portanto, não haveria excludente de responsabilidade.

Para fechar esse assunto, você precisa prestar bastante atenção a mais um
aspecto: na ocorrência de algum evento imprevisível que tenha causado dano a
terceiros, deve-se analisar se houve omissão por parte do Estado (ou do prestador do
serviço público) quanto a providências de sua incumbência para evitar o prejuízo. Caso
fique caracterizada a omissão culposa, a responsabilidade do Estado não será afastada,
sendo aplicável a responsabilidade subjetiva por culpa administrativa e consequente
dever de indenização por parte da Administração.
42

Fato exclusivo de terceiros


Página
Quanto ao fato exclusivo de terceiros é mais uma hipótese de excludente da
responsabilidade civil da Administração Pública. Tal excludente ocorre quando o
prejuízo pode ser atribuído a pessoa estranha aos quadros da Administração Pública.

Um exemplo de fato exclusivo de terceiros ocorre no dano causado por


multidões a bens particulares. Nessa situação observa-se se a Administração poderia
evitar o tumulto, a fim de preservar o patrimônio das pessoas. Se ficar comprovada a
omissão estatal, não há como afastar a responsabilidade civil do Estado; caso
contrário, se os danos decorreram exclusivamente dos atos da multidão enfurecida,
sem que o Poder Público pudesse fazer algo para contê-la, então o fato
não acarreta a responsabilidade civil do Estado.

AÇÕES JUDICIAIS DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO

Vencidos os estudos das diversas formas e teorias que embasam a


responsabilidade extracontratual do Estado, precisamos agora analisar alguns aspectos
relevantes das ações judiciais que envolvem o tema.

AÇÃO DE REPARAÇÃO DO DANO


Uma vez efetuada a ofensa ao patrimônio do lesado, a reparação do dano pode
ser acertada através de dois meios: o administrativo e o judicial.

Embora seja raro de ocorrer na prática, o particular pode formular seu pedido
indenizatório ao órgão competente da pessoa jurídica responsável, formando-se,
então, processo administrativo com manifestação dos interessados e produção de
provas, chegando-se a um resultado final sobre o pleito indenizatório.
43

Não havendo acordo na esfera administrativa, ao particular caberá ajuizar a


Página

adequada ação judicial de indenização, que seguirá o procedimento comum (art. 318,
CPC). O foro da ação vai depender da natureza da pessoa jurídica: se for a União,
empresa pública ou entidade autárquica federal, a competência é da Justiça Federal
(art. 109, I, CF); se for de outra natureza, competente será a Justiça Estadual.

Como já vimos acima, a jurisprudência do STF adotou a teoria da dupla


garantia, de modo que o agente público causador do dano não deve ser colocado no
polo passivo da demanda indenizatória ajuizada pelo lesado. Assim, competirá à
Fazenda Pública apresentar a devida ação de regresso.

AÇÃO DE REGRESSO
A parte final do art. 37, §6º, da CF/88 autoriza que a pessoa jurídica condenada
por responsabilidade civil do Estado mova ação regressiva contra o agente cuja
atuação acarretou o dano, desde que seja comprovado dolo ou culpa na atuação do
agente (lembre-se que a responsabilidade do agente pública é sempre subjetiva). A
inexistência do elemento subjetivo (dolo ou culpa) no caso concreto exclui a
responsabilidade do agente público na ação regressiva.

Em razão do princípio da indisponibilidade, a propositura da ação regressiva,


quando cabível, é um dever imposto à Administração, e não uma simples faculdade.

Resumindo, são pressupostos para a propositura da ação regressiva:

a) condenação do Estado na ação indenizatória;


b) trânsito em julgado da decisão condenatória (não precisa aguardar o
levantamento do precatório);
c) culpa ou dolo do agente;
d) ausência de denunciação da lide na ação indenizatória.

O item “b) trânsito em julgado da decisão condenatória” merece uma


explicação mais detalhada.

É que a Lei 4.619/65, que trata das ações regressivas, dispõe em seu art. 2º que
44

“O prazo para ajuizamento da ação regressiva será de sessenta dias a partir da data
Página

em que transitar em julgado a condenação imposta à Fazenda”.


Contudo, parte relevante da doutrina (com alguns julgados do STJ) entende que
o direito de regresso do Estado em face do agente público surge com o efetivo
desembolso da indenização. Ou seja, apenas após o pagamento do precatório o ente
público estaria apto a apresentar a ação de regresso.

JURISPRUDÊNCIA:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. SEGURO. AÇÃO
REGRESSIVA. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. OBRIGAÇÃO PRINCIPAL. ADIMPLEMENTO.
SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
1. O termo inicial da contagem do prazo prescricional para a ação de regresso por
culpa exclusiva de terceiro é a data do adimplemento da obrigação, data em que se
efetiva o dano patrimonial e exsurge para o interessado o direito ao ressarcimento.
Precedente específico desta Terceira Turma: REsp n. 949.434/MT, Relatora a Ministra
Nancy Andrighi, DJe de 10/6/2010.
2. Na espécie, a recorrida foi condenada judicialmente a indenizar alguns de seus
passageiros, vítimas de acidente de veículo (ônibus), ocasionado por culpa exclusiva do
motorista da empresa ora agravante. Assim, confirma-se o entendimento do Tribunal
de origem de afastar a alegada prescrição trienal da pretensão, porque somente após
o cumprimento da obrigação principal, a qual, segundo o próprio acórdão recorrido,
ainda nem se efetivou, é que teria início o prazo prescricional trienal previsto no art.
205, § 3º, V, do Código Civil. Aplicação da Súmula 83/STJ.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp 644.963/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA
TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 25/05/2015)

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO


REGRESSIVA. DIES A QUO DE INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL: CONCRETO E
EFETIVO PAGAMENTO, PELO ESTADO, DO VALOR A QUE FOI CONDENADO.
Não há que se falar em ação regressiva sem o ocorrer de um dano patrimonial
concreto e efetivo. A decisão judicial, transita em julgado, nada obstante possa refletir
45

um título executivo para o Estado cobrar valor pecuniário a que foi condenado
Página

satisfazer, somente vai alcançar o seu mister, se executada. Até então, embora o
condenar já se faça evidente, não se pode falar em prejuízo a ser ressarcido,
porquanto o credor tem a faculdade de não exercer o seu direito de cobrança e, nesta
hipótese, nenhum dano haveria, para ser ressarcido ao Erário. O entender diferente
propiciaria ao Poder Público a possibilidade de se valer da ação regressiva, ainda que
não tivesse pago o quantum devido, em evidente apropriação ilícita e inobservância
de preceito intrínseco à própria ação regressiva, consubstanciado na reparação de
um prejuízo patrimonial. Demais disso, conforme a mais autorizada doutrina, por
força do disposto no §5º do art. 37 da Constituição Federal, a ação regressiva é
imprescritível. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 949.434/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
18/05/2010, DJe 10/06/2010)

Ante a divergência, recomendo que, para provas de concursos, verifique se o


enunciado está cobrando a letra fria da lei (nesse caso, basta o trânsito em julgado
para a propositura da ação de regresso), ou se está fazendo referência aos julgados do
STJ (nessa situação, se fará necessário o pagamento do precatório).

DENUNCIAÇÃO DA LIDE
Se você gosta de estudar divergências doutrinárias e jurisprudenciais, temos
mais uma para você. A (im)possibilidade de denunciação da lide nas ações de
indenização por responsabilidade extrapatrimonial do Estado é um assunto que,
embora antigo, ainda não foi pacificado.

O art. 125, II, do Código de Processo Civil prevê que:

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL


Art. 125. É admissível a denunciação da lide, promovida
por qualquer das partes:
(...)
46

II - àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a


Página
indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem for
vencido no processo.

Como já adiantei, existem divergências doutrinárias e jurisprudenciais a


respeito da aplicação ou não do instituto da denunciação à lide às ações civis contra o
Estado. Não obstante, a posição majoritária da doutrina e da jurisprudência é no
sentido da inaplicabilidade da denunciação à lide pela Administração a seus agentes.

Ou seja, para a corrente majoritária, a Administração não pode, já na primeira


ação (isto é, na ação de indenização movida pela pessoa que sofreu o dano), trazer
para o processo (denunciar à lide) o agente público que causou o dano.

A Lei 8.112/90 também corrobora o entendimento pelo qual a denunciação da


lide é inaplicável, pois, se a lei determina o ajuizamento de ação regressiva, é porque
não caberia a denunciação no processo indenizatório:

LEI 8.112/90
§ 2º Tratando-se de dano causado a terceiros, responderá
o servidor perante a Fazenda Pública, em ação regressiva.

Assim, temos alguma segurança para afirmar que, na esfera federal, o instituto
da denunciação à lide, por expressa disposição legal, não é aplicável nos processos
em que se discute a responsabilidade civil objetiva do Estado por danos causados a
terceiros.

Contudo, existem julgados do STJ e posições doutrinárias que admitem a


denunciação à lide quando o próprio denunciante chamar o agente público ao
processo, ou seja, quando o particular lesado, ao entrar com a ação de indenização,
arguir a culpa do agente público.

Assim, para o STJ, nas ações de indenização fundadas na responsabilidade


civil objetiva do Estado, a denunciação à lide não é obrigatória, se inserindo na seara
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da discricionariedade do denunciante:
Página
JURISPRUDÊNCIA:
RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO
ESTADO. MORTE DECORRENTE DE ERRO MÉDICO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. NÃO
OBRIGATORIEDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Nas ações de indenização fundadas na responsabilidade civil objetiva do Estado
(CF/88, art. 37, § 6º), não é obrigatória a denunciação à lide do agente supostamente
responsável pelo ato lesivo (CPC, art. 70, III).
2. A denunciação à lide do servidor público nos casos de indenização fundada na
responsabilidade objetiva do Estado não deve ser considerada como obrigatória, pois
impõe ao autor manifesto prejuízo à celeridade na prestação jurisdicional. Haveria em
um mesmo processo, além da discussão sobre a responsabilidade objetiva referente à
lide originária, a necessidade da verificação da responsabilidade subjetiva entre o ente
público e o agente causador do dano, a qual é desnecessária e irrelevante para o
eventual ressarcimento do particular. Ademais, o direito de regresso do ente público
em relação ao servidor, nos casos de dolo ou culpa, é assegurado no art. 37, § 6º, da
Constituição Federal, o qual permanece inalterado ainda que inadmitida a
denunciação da lide.
3. Recurso especial desprovido.
(REsp 1089955/RJ, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
03/11/2009, DJe 24/11/2009)

De todas as posições doutrinárias, a que me parece mais equilibrada e coerente


é a de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a doutrinadora defende a impossibilidade
da denunciação da lide, se o autor da ação contra o Estado a propõe com base na
culpa anônima do serviço ou apenas na responsabilidade objetiva decorrente do
risco. Porém, se a ação é fundada na responsabilidade objetiva do Estado, com
arguição de culpa do agente público, a denunciação da lide é cabível como também é
possível o litisconsórcio facultativo ou a propositura diretamente contra o agente
público. Ou seja, para a autora, cabe à vítima decidir contra quem irá propor a ação de
48

indenização.
Página
PRAZO PRESCRICIONAL
Como se sabe, o direito do lesado à reparação dos prejuízos tem natureza
pessoal e obrigacional. Assim, da mesma forma que ocorre com os direitos subjetivos
em geral, não podem eles ser objeto da inércia de seu titular, sob pena do surgimento
da prescrição.

Depois de alguma oscilação na jurisprudência, o atual entendimento do STJ é


no sentido de "que a prescrição contra a Fazenda Pública, mesmo em ações
indenizatórias, rege-se pelo Decreto 20.910/1932, que disciplina que o direito à
reparação econômica prescreve em cinco anos da data da lesão ao patrimônio material
ou imaterial." (STJ, AgRg no REsp 1106715/ PR, julgado em 3.5.2011, Dje 10.5.2011).

DECRETO-LEI 20.910/32
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos
Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação
contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual
for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados
da data do ato ou fato do qual se originarem.

Portanto, prescreve em cinco anos o prazo para ajuizamento das ações


indenizatórias em face do Estado.

Também vale o mesmo prazo de cinco anos para os pedidos de indenização em


face das concessionárias de serviços públicos, veja o que diz o STJ:

JURISPRUDÊNCIA:
É de 5 anos o prazo prescricional para que a vítima de um acidente de trânsito
proponha ação de indenização contra concessionária de serviço público de transporte
coletivo (empresa de ônibus).
O fundamento legal para esse prazo está no art. 1º-C da Lei 9.494/97 e também no
art. 27 do CDC.
49

STJ. 3ª Turma. REsp 1277724-PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em
Página
26/5/2015 (Info 563).

Vale ressaltar que há diversos julgados dos tribunais superiores aplicando o


princípio da actio nata para o prazo prescricional das ações indenizatórias em face do
Estado. Esta teoria (actio nata) defende que o prazo prescricional para a ação de
indenização se inicia na data em que se tiver o efetivo conhecimento da lesão (e seus
efeitos). “Segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, o
termo inicial do prazo prescricional das ações indenizatórias, em observância ao
princípio da actio nata, é a data em que a lesão e os seus efeitos são constatados.”
(STJ. AgRg no REsp 1248981/RN).

Também é valido lembrar que caso o Poder Público tenha reconhecido


administrativamente o débito, o termo inicial do prazo prescricional de 5 anos para
que servidor público exija seu direito será a data desse ato de reconhecimento. Para o
STJ, o reconhecimento do débito implica renúncia, pela Administração, ao prazo
prescricional já transcorrido:

JURISPRUDÊNCIA:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO
REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. PROMOÇÃO
RECONHECIDA ADMINISTRATIVAMENTE. PARCELAS RETROATIVAS. PRESCRIÇÃO
QUINQUENAL CONFIGURADA.
1. O reconhecimento administrativo do débito importa em renúncia ao prazo
prescricional já transcorrido, sendo este o termo inicial a ser levado em consideração
para a contagem da prescrição qüinqüenal. Precedentes: AgRg no AREsp 50.172/DF,
Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 13/04/2012; AgRg no Ag
1.218.014/RJ, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 04/10/2010; AgRg no Ag
894.122/SP; Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 04/08/2008.
2. No presente caso, apesar do reconhecimento administrativo do débito, ocorrido em
02/05/2002, ter importado renuncia à prescrição, sua publicação deve ser tida como
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termo inicial para a contagem da prescrição quinquenal do Decreto-Lei 20.910/32.


Página

Assim, com o ajuizamento da presente ação ordinária em 11/07/2008 deve ser


reconhecida a prescrição, considerando que ultrapassado o prazo quinquenal.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AgRg no AREsp 51.586/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 13/11/2012, DJe 22/11/2012)

Há mais um entendimento importante do STJ, para esta corte, as ações de


indenização por danos morais decorrentes de atos de tortura ocorridos durante o
Regime Militar de exceção são imprescritíveis:

JURISPRUDÊNCIA:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. PRISÃO POLÍTICA. REGIME MILITAR. IMPRESCRITIBILIDADE.
INAPLICABILIDADE DO ART. 1º DO DECRETO 20.910/1932. ANISTIADO POLÍTICO.
CONDIÇÃO RECONHECIDA. DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO.
REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997. MP 2.180-
35/2001. LEI 11.960/2009. NATUREZA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA.
IRRETROATIVIDADE.
1. As ações indenizatórias por danos morais decorrentes de atos de tortura ocorridos
durante o Regime Militar de exceção são imprescritíveis. Inaplicabilidade do prazo
prescricional do art. 1º do Decreto 20.910/1932. Precedentes do STJ.
(REsp 1374376/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
07/05/2013, DJe 23/05/2013)

Aqui uma ressalva se faz importante. Somente são imprescritíveis as


indenizações por tortura cometida durante o regime militar, em caso de tortura
cometida nos dias atuais aplica-se o prazo prescricional quinquenal. E para não restar
qualquer dúvida quanto ao termo inicial deste prazo prescricional, veja o seguinte
julgado do STJ:

JURISPRUDÊNCIA:
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PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESO


Página
CUSTODIADO PELA POLÍCIA FEDERAL. TORTURA SEGUIDA DE MORTE.
AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS
CONFIGURADOS. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. JUROS MORATÓRIOS. TERMO
INICIAL. EVENTO DANOSO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDA.
3. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o termo a
quo da prescrição da ação indenizatória, nos casos em que não chegou a ser ajuizada
ação penal, é a data do arquivamento do inquérito policial. Prescrição afastada na
hipótese em comento.
(REsp 1443038/MS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em
12/02/2015, DJe 19/02/2015)

Assim, temos que:

• Se tiver sido ajuizada ação penal contra os autores do crime: o termo


inicial da prescrição será o trânsito em julgado da sentença penal.
• Se o inquérito policial tiver sido arquivado (não foi ajuizada ação penal):
o termo inicial da prescrição da ação de indenização é a data do
arquivamento do inquérito.

No mais, quanto às ações propostas pelo Estado que objetivam o


ressarcimento ao erário, há relevante parcela da doutrina e jurisprudência que
entendem ser imprescritível, tendo em vista o disposto na parte final do § 5º do art. 37
da CF/88:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos
praticados por qualquer agente, servidor ou não, que
causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas
ações de ressarcimento.
52

Contudo, o STF, em sede de repercussão geral, decidiu que é prescritível a


Página

ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil


decorrente de acidente de trânsito (prazo de três anos, na forma do art. 206, § 3º, V,
do CC), o que não abarcaria as infrações ao direito público, como os de natureza penal,
os decorrentes de atos de improbidade, entre outros.

JURISPRUDÊNCIA:
CONSTITUCIONAL E CIVIL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE.
SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO.
1. É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito
civil.
2. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 669069, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2016,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-082 DIVULG 27-04-2016
PUBLIC 28-04-2016)

Uma coisa precisa ficar muito clara para você: as ações de ressarcimento por
atos de improbidade administrativa continuam imprescritíveis. Inclusive, este é o
teor de recente julgamento do STF em repercussão geral (o julgamento ainda não tem
acórdão publicado, por isso, cito a notícia oficial do site do STF:

JURISPRUDÊNCIA:
Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 897 da repercussão geral, deu
parcial provimento ao recurso para afastar a prescrição da sanção de ressarcimento e
determinar o retorno dos autos ao tribunal recorrido para que, superada a preliminar
de mérito pela imprescritibilidade das ações de ressarcimento por improbidade
administrativa, aprecie o mérito apenas quanto à pretensão de ressarcimento.
Vencidos os Ministros Alexandre do Moraes (Relator), Dias Toffoli, Ricardo
Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio. Em seguida, o Tribunal fixou a seguinte
tese: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de
ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”, vencido o Ministro
Marco Aurélio. Redigirá o acórdão o Ministro Edson Fachin. Nesta assentada,
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reajustaram seus votos, para acompanhar a divergência aberta pelo Ministro Edson
Página

Fachin, os Ministros Luiz Fux e Roberto Barroso. Presidiu o julgamento a Ministra


Cármen Lúcia. Plenário, 8.8.2018.

TEMAS ESPECIAIS
Para fecharmos a aula e você poder ter a segurança de que gabaritará qualquer
questão envolvendo responsabilidade civil do Estado, precisamos abordar alguns
temas que, por suas peculiaridades, merecem uma análise em separado. Vamos a eles.

RESPONSABILIDADE POR ATOS LEGISLATIVOS


Via de regra, a atuação legislativa não acarreta responsabilidade civil do
Estado, especialmente porque a própria existência do Estado pressupõe o exercício da
função legislativa com a criação de direitos e obrigações para os indivíduos. Lembre-se
que as normas jurídicas costumam ser gerais e abstratas, que afasta, em princípio, a
configuração de efeitos (danos) individualizados, assim, não há porque se falar em
responsabilidade estatal.

Contudo, a doutrina majoritária e a jurisprudência reconhecem que a


responsabilidade do Estado legislador pode surgir em três situações excepcionais: a)
leis de efeitos concretos e danos desproporcionais; b) leis inconstitucionais; e c)
omissão legislativa.

Leis de efeitos concretos e danos desproporcionais

Primeiramente, tenha claro que leis de efeitos concretos são aquelas que não
possuem caráter normativo, não detêm generalidade, impessoalidade e nem
abstração. São leis exclusivamente formais, pois, embora elaborados com devido rito
legislativo, possuem destinatários certos, determinados.
54
Página

Do mesmo modo que ocorre com os atos administrativos individuais, a lei de


efeitos concretos pode acarretar prejuízos às pessoas determinadas, gerando, com
isso, responsabilidade civil do Estado.

Assim, são pacíficas a doutrina e a jurisprudência no sentido de que as leis de


efeitos concretos podem ser impugnadas através das ações em geral, inclusive o
mandado de segurança, sendo interessado aquele cuja órbita jurídica seja hostilizada
pelos seus efeitos. Igualmente, não é difícil concluir que, se uma lei de efeitos
concretos provoca danos desproporcionais ao indivíduo, fica configurada a
responsabilidade civil da pessoa jurídica federativa de onde emanou a lei,
assegurando-se ao lesado o direito à reparação dos prejuízos.

Leis inconstitucionais

Como ensina José dos Santos Carvalho Filho: “se o dano surge em decorrência
de lei inconstitucional, a qual evidentemente reflete atuação indevida do órgão
legislativo, não pode o Estado simplesmente eximir-se da obrigação de repará-lo,
porque nessa hipótese configurada estará a sua responsabilidade civil”.

Muita atenção a um detalhe, a responsabilização do Estado depende da


declaração de inconstitucionalidade da lei pelo STF, seja no controle concentrado,
seja no difuso (embora haja parcela da doutrina que defenda ser apenas o controle
concentrado apto a ensejar a responsabilização estatal, é majoritário o entendimento
de que a lei declarada inconstitucional por controle difuso também pode embasar a
responsabilidade do Estado). Sem a declaração do Supremo, não há que se cogitar a
responsabilidade estatal por lei inconstitucional.

Por óbvio, não basta a declaração de inconstitucionalidade para configuração


da responsabilidade, sendo imprescindível a comprovação do dano concreto pela
incidência da lei inconstitucional.
55

Omissão legislativa
Página
Enquanto nos dois pontos anteriores, leis inconstitucionais e leis de efeitos
concretos, é praticamente pacífico o dever estatal de indenizar. O caso das omissões
legislativas ainda é bem controvertido na doutrina.

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira: “em relação aos casos em que a
própria Constituição estabelece prazo para o exercício do dever de legislar, o
descumprimento do referido prazo, independentemente de decisão judicial anterior, já
é suficiente para caracterização da mora legislativa inconstitucional e consequente
responsabilidade estatal”.

Ainda segundo o mesmo autor: “nos demais casos, a inexistência de prazo para
o exercício do dever de legislar por parte do Poder Legislativo impõe a necessidade de
configuração da mora legislativa por decisão proferida em sede de mandado de
injunção ou ação direta de inconstitucionalidade por omissão”.

Contudo, a questão não pacífica no STF, sendo bem conhecido o entendimento


do Supremo de que a omissão no dever de enviar a proposta de Reajuste Geral Anual
aos servidores não acarreta ao ente público o dever de indenizar (RE 548.967/PR).

Enfim, o tema ainda carece de maior construção doutrinária e jurisprudencial,


para embasar eventuais respostas em provas discursivas e orais, é interessante
conhecer a opinião de José dos Santos Carvalho Filho: “Pensamos, todavia, que a
evolução da responsabilidade civil estatal deve avançar mais e
conduzir a solução mais rigorosa e menos condescendente com as omissões do Estado.
Se é certo que inexiste, como regra, prazo certo para o exercício da função legislativa,
não menos certo é que o reconhecimento da mora no caso de expressa previsão
constitucional quanto ao prazo para legislar deve implicar, por sua própria natureza, a
responsabilidade civil do Estado e o dever de indenizar, uma vez que tal inação reflete
inaceitável abuso de poder. Na verdade, é desnecessária decisão judicial que figure
como condição dessa responsabilidade. A indevida leniência com os abusos estatais
não ajuda em nada e, ao revés, contribui para a perpetuação desse tipo de
inconstitucionalidade.”
56
Página
RESPONSABILIDADE POR ATOS JURISDICIONAIS
De início, perceba que para os atos administrativos praticados pelos
agentes do Poder Judiciário (juízes ou não), incide regularmente a responsabilidade
civil objetiva do Estado. Portanto, não se deve confundir os atos jurisdicionais típicos
(que, em regra, não geram responsabilidade civil para o Estado) com os atos
administrativos praticados pelos agentes do Poder Judiciário.

Quanto aos atos judiciais típicos, a doutrina mais tradicional afirma que a
atividade jurisdicional não implica responsabilidade civil do Estado, salvo as hipóteses
expressamente previstas no ordenamento jurídico.

No entanto, atualmente, se reconhece que a responsabilidade do Estado por


atos judiciais pode ocorrer em três hipóteses: a) erro judiciário; b) prisão além do
tempo fixado na sentença; e c) demora na prestação jurisdicional.

Erro judiciário

Na hipótese de o indivíduo ser condenado por erro judiciário, terá direito à


reparação do prejuízo. No caso, a responsabilidade do Estado é objetiva, isto é,
independe de dolo ou culpa do magistrado. Veja a redação do inciso LXXV do art. 5º da
CF/88:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro
judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo
fixado na sentença;

Muita atenção com um aspecto, para a doutrina majoritária, o erro judiciário


que enseja a responsabilização civil do Estado restringe-se à esfera penal. Em outras
57

palavras, erros judiciais em demandas cíveis não geram o dever de indenizar.


Página

É válido lembrar, ainda, que segundo o STF, a prisão preventiva, desde que
adequadamente fundamentado, não se confunde com o erro judiciário.
Interpretação diversa, de acordo com o STF, implicaria total quebra do princípio do
livre convencimento do juiz, afetando de modo irremediável sua segurança para
apreciar e valorar provas.

JURISPRUDÊNCIA:
O Supremo Federal entende que a responsabilidade objetiva do Estado não se aplica
nas hipóteses de prisão preventiva em que o réu, ao final da ação penal, venha a ser
absolvido ou tenha sua sentença condenatória reformada na instância superior.
Nesses casos, não cabe ao prejudicado pleitear do Estado indenização ulterior por
dano moral.
(STF. RE 429.518/SC. DJ de 28/10/04)

No mais, por força do que dispõe o art. 143 do novo Código de Processo Civil, o
magistrado responderá “civil e regressivamente” por perdas e danos quando, no
exercício de suas atribuições, proceder com dolo ou fraude, assim como quando
recusar, omitir ou retardar, sem motivo justo, providência que deva ordenar de ofício,
ou a requerimento da parte.

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL


Art. 143. O juiz responderá, civil e regressivamente, por
perdas e danos quando:
I - no exercício de suas funções, proceder com dolo ou
fraude;
II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo,
providência que deva ordenar de ofício ou a requerimento
da parte.

Prisão além do tempo fixado na sentença


58

A prisão além do tempo fixado na sentença também configura a


Página
responsabilidade civil do Estado. Contudo, como nos lembra Rafael Carvalho Rezende
Oliveira, é bom esclarecer que o descumprimento do prazo de prisão pode decorrer da
atividade jurisdicional ou da atividade prestada pelo Executivo no tocante à
administração penitenciária.

No primeiro caso, a responsabilidade surge pela má prestação jurisdicional e a


prisão além do tempo fixado na sentença configura, em última análise, uma espécie de
erro judiciário objetivo ou qualificado, aplicando-se o art. 5.º, LXXV, da CF/88.

No segundo caso, o erro foi cometido pela administração penitenciária a cargo


do Poder Executivo (lembre-se que é o Poder Executivo quem administra os presídios),
e a responsabilidade seria fundamentada pelo art. 37, § 6.º, da CF/88.

Demora na prestação jurisdicional

A demora na prestação jurisdicional pode ensejar a responsabilidade do


Estado, tendo em vista a violação do direito fundamental à razoável duração do
processo consagrado no art. 5.º, LXXVIII, da CF/88.

Por ser bastante elucidativo, é importante conhecer esse recente julgado do


STJ:

JURISPRUDÊNCIA:
RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO.
LESÃO. DESPACHO DE CITAÇÃO. DEMORA DE DOIS ANOS E SEIS MESES. INSUFICIÊNCIA
DOS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS DO PODER JUDICIÁRIO. NÃO ISENÇÃO DA
RESPONSABILIDADE ESTATAL. CONDENAÇÕES DO ESTADO BRASILEIRO NA CORTE
INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO CARACTERIZADA.
(...)
59

3. A administração pública está obrigada a garantir a tutela jurisdicional em tempo


Página

razoável, ainda quando a dilação se deva a carências estruturais do Poder Judiciário,


pois não é possível restringir o alcance e o conteúdo deste direito, dado o lugar que a
reta e eficaz prestação da tutela jurisdicional ocupa em uma sociedade democrática. A
insuficiência dos meios disponíveis ou o imenso volume de trabalho que pesa sobre
determinados órgãos judiciais isenta os juízes de responsabilização pessoal pelos
atrasos, mas não priva os cidadãos de reagir diante de tal demora, nem permite
considerá-la inexistente.
4. A responsabilidade do Estado pela lesão à razoável duração do processo não é
matéria unicamente constitucional, decorrendo, no caso concreto, não apenas dos
arts. 5º, LXXVIII, e 37, § 6º, da Constituição Federal, mas também do art. 186 do Código
Civil, bem como dos arts. 125, II, 133, II e parágrafo único, 189, II, 262 do Código de
Processo Civil de 1973 (vigente e aplicável à época dos fatos), dos arts. 35, II e III, 49, II,
e parágrafo único, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, e, por fim, dos arts. 1º e
13 da Lei n. 5.478/1965.
5. Não é mais aceitável hodiernamente pela comunidade internacional, portanto, que
se negue ao jurisdicionado a tramitação do processo em tempo razoável, e também se
omita o Poder Judiciário em conceder indenizações pela lesão a esse direito previsto
na Constituição e nas leis brasileiras. As seguidas condenações do Brasil perante a
Corte Interamericana de Direitos Humanos por esse motivo impõem que se tome uma
atitude também no âmbito interno, daí a importância de este Superior Tribunal de
Justiça posicionar-se sobre o tema.
(REsp 1.383.776/AM, Rel. Ministro OG FERNANDES, julgado em 06/09/2018).

RESPONSABILIDADE DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES


Nos termos do art. 236 da CF/88, "os serviços notariais e de registro são
exercidos em caráter privado, por delegação cio Poder Público". O ingresso na
atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não
se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de
provimento ou de remoção, por mais ele seis meses. São particulares que prestam
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serviço público em nome próprio e são considerados servidores públicos para fins
Página

penais, bem como para a lei de mandado de segurança.


O tema da responsabilidade civil dos notários e registradores é dos mais
controversos, seguindo Rafael Carvalho Rezende Oliveira encontramos três correntes
doutrinárias:

1. responsabilidade direta e objetiva do Estado, uma vez que os notários


e registradores exercem função pública, mediante aprovação em
concurso público, razão pela qual se enquadram no conceito de agente
público. Haveria, ainda, responsabilidade pessoal e subjetiva dos
notários e registradores. A vítima pode acionar o Estado e este tem a
ação regressiva em face do titular do cartório; ou a vítima pode acionar
diretamente o titular do Cartório, que terá ação regressiva contra seu
funcionário causador do dano (art. 22 da Lei 8.935/1994; art. 38 da Lei
9.492/1997 e art. 37, § 6.º, da CRFB). Nesse sentido: Rui Stoco.
2. responsabilidade pessoal e objetiva dos notários e registradores, em
razão da prestação de serviço público delegado, e subsidiária do Estado,
na forma do art. 37, § 6.º, da CRFB e art. 22 da Lei n.º 8.935/1994.88
Nesse sentido: Hely Lopes Meirelles, Sergio Cavalieri Filho.
3. responsabilidade solidária e objetiva dos notários, registradores e
Estado, na forma do art. 37, § 6.º, da CRFB e art. 22 da Lei 8.935/1994.
Nesse sentido: Yussef Said Cahali.

Por força de mudança legislativa, parte da doutrina passou a entender que a


responsabilidade civil dos tabeliães atualmente é de natureza subjetiva, conforme
expressamente previsto no art. 22 da Lei 13.286/2016:

LEI 13.286/2016
Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente
responsáveis por todos os prejuízos que causarem a
terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos
substitutos que designarem ou escreventes que
autorizarem, assegurado o direito de regresso.
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Parágrafo único. Prescreve em três anos a pretensão de


Página

reparação civil, contado o prazo da data de lavratura do


ato registral ou notarial.

No entanto, o STF ainda não decidiu em definitivo a controvérsia, encontrando-


se pendente de julgamento o recurso extraordinário que teve a repercussão
geral sobre a matéria reconhecida (RE 842846 RG/SC). O STJ, por sua vez, possui
decisões conflitantes, ora reconhecendo a responsabilidade direta e objetiva do
Estado, ora reconhecendo a responsabilidade pessoal e objetiva dos notários e
registradores e subsidiária do Estado.

Como você pode notar, o tema ainda é bastante nebuloso, sendo certo que o
nosso curso será devidamente atualizado assim que julgado o citado recurso
extraordinário com repercussão geral.

DANOS CAUSADOS POR OBRAS PÚBLICAS


Para analisar a responsabilidade civil por danos decorrentes de obras públicas
temos que verificar se o dano foi causado (I) pela própria natureza da obra, ou seja,
pelo só fato da obra; (II) ou pela má execução da obra.

Na primeira situação, o Estado responde diretamente e objetivamente,


inexistindo responsabilidade da empreiteira (ex: obra que aumenta consideravelmente
a poluição sonora de determinada localidade, prejudicando seus moradores). Na
segunda situação, a empreiteira responde primariamente e de maneira subjetiva,
havendo, no entanto, responsabilidade subsidiária do Estado (ex: rodovia mal
construída que causa acidentes de automóveis).

Assim, quando a simples existência da obra pública é a causa do dano, não


havendo atuação culposa da empresa contratada, a responsabilidade deve ser
atribuída objetivamente ao Estado, uma vez que o dano foi causado por ato
administrativo que determinou a realização da obra.
62

Por outro lado, quando os danos foram causados pela má execução da obra, a
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empreiteira possui responsabilidade primária e subjetiva quando atua culposamente,


acarretando danos a terceiros, subsistindo a responsabilidade subsidiária do Estado,
conforme previsão contida no art. 70 da Lei 8.666/93:

LEI 8.666/93
Art. 70. O contratado é responsável pelos danos causados
diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes
de sua culpa ou dolo na execução do contrato, não
excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a
fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão
interessado.

Por fim, vale destacar que não ocorre a responsabilidade solidária entre o
Estado e a empreiteira, até porque a solidariedade não se presume, nos termos do art.
265 do Código Civil.

Bem, meu amigo, por hoje é só.

Não se esqueça que nosso curso conta com um fórum tira dúvidas, então,
qualquer comentário, esclarecimento ou correção que queira fazer quanto aos temas
desta aula, fique a vontade.

Bons estudos!

Renério de Castro Júnior


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proibida a reprodução total e parcial ou divulgação comercial sem a autorização prévia e expressa
do autor (artigo 29).

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