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"Não tenho ouro nem prata, mas o que tenho eu lhe dou:
em nome de Jesus Cristo, o nazareno,
levante-se e ponha-se a caminhar."
(1 Atos, 3, 1-8)
não para os agentes pastorais - apontam, como aquela que poderia "quem faz, faz também o sentido do que faz". Daí que o método para
estudar metodologia é construir sobre a prática dos participantes, pro-
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processo (com e não para) é garantia do sucesso da proposta que se presentificação, para dar conta do que se pretende no trabalho com aquele
grupo popular concreto, ali presente e a presentificar-se cada vez mais.
traduz em forma de participação ativa, disciplina consciente e criativi-
dade. As dinâmicas levam a identificar diferenças, sem contudo reforçar Como persona, não somos apenas pessoa, mas também personagem,
qualquer hierarquização, preconceito ou discriminação no grupo. isto é, vestimos uma "máscara" que são os títulos, cargos, a versão oficial
e glamourosa da própria vida ... Dá-se um peso exagerado a isto, numa
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demonstração de nobiliarquia (governo dos nobres), como se valesse
mais quem mais títulos e cargos acumula. Muitas vezes os rótulos mais
estado de espírito, Sua disposição. Em seguida, formaram-se grupos que a
escondem que revelam ... A sabedoria popular ensina que "quem quiser
partir das palavras individuais deram-se um nome (p. ex., Rio Amazonas,
mulher bonita, procure em meio de semana, porque de sábado a domin-
Renovação, Puxirum, Utopia) e com elas criaram uma frase que fosse ex-
go toda raposa é bacana". Para Confúcio, "a virtude da humanidade con-
siste em amar os homens; a prudência, em conhecê-Ios". Sinceridade pressão do grupo. Foi o primeiro trabalho coletivo: construção de algo
(sine cera) quer dizer "sem cera", sem máscaras. Todavia, também preci- comum a todos com o que cada um trouxe. Expressão da metodologia
samos delas. O famoso jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues dizia popular; a um só tempo, ponto de partida, finalidade e caminho para chegar.
que se os outros nos conhecessem como nós mesmos nos conhecemos,
ninguém se dava nem "bom dia" ...
Com as "máscaras" e sem as "máscaras", dar-se a conhecer e ser co-
nhecido é decisivo na metodologia popular. Não há processos libertado-
res sem criar vínculos entre as pessoas, sem que se constitua o grupo que 3. Por que pOema?
instaura estes processos. Uma das frases mais citadas de Paulo Freire é
aquela: "ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho, nós nos
libertamos em comunidade". É preciso estabelecer logo e assegurar sem- Nos vários encontros, após as ~presentações em que todos e cada um
pre a confiança, que é o que faz a ponte entre os vários sujeitos envolvidos dos participantes puderam com tranqüilidade falar de si e ouvir dos outros,
no processo: educandos/trabalhadores entre si e com os educadores/ trabalhamos com a letra da música Tocando em frente (Almir Sater e Renato
agentes e estes entre si e com os educandos/trabalhadores. Teixeira) e/ou o poema Metade (Osvaldo Montenegro). Veja anexo.
A técnica ou dinâmica da apresentação deve iniciar e marcar o sentido Cada um escolhe o verso que mais gosta ou com o qual se identifica,
de presentificação. Por isso deve facilitar o mais possível que a própria aquele que melhor expressa seu modo de ser, convicções, disposições,
pessoa se exponha, diga quem é, o que faz, de onde vem, o que traz, o que seu momento. Dizer aos demais qual o verso e por que o escolhe, faz
quer, o que espera ... Normalmente, há uma expectativa da pessoa e do com que os participantes aprofundem a apresentação, começo da pre-
grupo por ocasião da apresentação. Às vezes, porém, impera o formalismo sentificação; são criadas novas identificações, uma vez que vários es-
e superficialismo e se perde um momento-chave do processo. Contudo, é colhem os mesmos versos, pelos mesmos ou outros motivos. Individu-
preciso certa solenidade, faz parte da metodologia popular; o povo é solene, Como
alidades
tal.e diferenças vão sendo marcadas. O grupo vai se constituindo
gosta disto. Uma boa apresentação, bem preparada, com tempo suficiente,
é o melhor começo. Pressupõe, como de resto toda atividade formativa a Ao mesmo tempo, estamos fazendo uma inesperada introdução ao
ser realizada, o ambiente preparado, acolhedor, sugestivo do tema (sem assunto da metodologia do trabalho popular, uma vez que os textos, de
exagero de símbolos) e instigado r da mística com que se vive e trabalha.
forma poética, faJam da construção - pessoal e coletiva, intersubjetiva,
(Embora os responsáveis pela atividade formativa até possam prover ma-
permanente e interminável - da vida, da personalidade, da história, que
teriais que ajudem na arrumação do ambiente, é melhor que a própria desafia a todos e cada um - metades a se completarem, solitária e soli-
ambientação seja (re)criada pelos participantes.)
dariamente -, e da capacidade suficiente que todos e cada um têm para
Em alguns encontros, ainda como dinâmica de integração, solicitamos tal ("o dom de ser capaz e ser feliz" - Tocando em freme).
que cada participante escolhesse uma palavra que expressasse a si, seu
A forma poética, presente também nas máximas e ditos populares
bastante usados no módu!o, emociona, envolve, desarma, aproxima. Ven-
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publicidade (em que brasileiros são campeões). Alguém já disse que "a O acordo (do latim accordare, derivado de cor, cordis _ coração:
comparação é a cesta onde o povo leva a mensag'em para casa". combinar, con-vir, con-cor-dar, sintonizar os corações) visa não tanto
As máximas e ditos populares trazem de forma concisa e bela a sabedo- garantir ordem e disciplina, mas sobretudo co-responsabilizar o grupo
ria (do latim sapere = saborear) da cultura popular. Resgatá-Ios no contexto pela construção do encontro, em vista dos objetivos que mobilizaram
da formação de agentes populares tem o duplo objetivo de aprender seus os participantes a vir para o encontro, colocá-Jos diante do desafio da
ensinamentos, quando vêm a propósito do assunto em pauta, e familiari- autoformação coletiva, a ser assumido livre e compartilhadamente por
zar-se com o modo de pensar do povo, que não é intelectualista, antes é um todos e cada um. Aos assessores, ainda que proponham. cabe facilitar e
modo de ser, intrinsecamente ligado à experiência concreta (sensorial) de não impor regras. Não há outro modo de proceder. A "educação para a
liberdade" assim o exige.
vida. Além de inúmeras citações no decorrer dos encontros, distribuímos
aleatoriamente, ao fim das discussões, em torno da proposta metodológica.
uma frase para cada participante. As frases eram ditos populares, máximas
de filósofos, citações bíblicas, expressões de literatos, que diziam algo sobre
os conteúdos do módulo, iluminando-os. Cada participante se comprome-
teu em vivenciar a que lhe coube, zelar pela experimentaçào do que ali dizia,
trazê-Io oportunamente à baila.
--
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5. Metodologia: o que é?
(onte)(to artlda) .
Histórico- P Eu + Grupo valoreslsentlmt>ntos
pr~ticas (omexta
A partir da apresentação, em diálogo com o grupo, é possível destacar as Cultura' (Pon.to de {idéoido; Hisfórico-
---!-....
+ Metodologia =- Caminho -> Fim
(Ponto de chegada)
Também já é possível propor uma primeira arrumação como sistematiza-
ção das falas. Vai aqui um exemplo. A partir do poema, e de forma saborosa,
o grupo constrói uma primeira definição de Metodologia: a) Caminho
(jeito, forma, postura), b) que nasce de convicções - toda pessoa é capaz
(mesmo que esse potencial esteja latente), c) com o obietivo de ser feliz,
como protagonista da história, d) no contexto em que esta é vivida. Comen-
5.1. Ponto de partida
tários: a metodologia é como uma estação rodoviária, nela se integra ponto
de passagem, ponto de partida e ponto de chegada; no entanto, as meto-
dologias são diferentes: o mesmo gesto (abraçar as crianças, por exemplo)
O ponto de partida é sempre cada pessoa e tudo o que ela é e traz e que
pode ser feito por pura tática em busca de votos ou pode nascer de profun-
passa a ser considerado como o potencial para o processo individual!
da crença que valoriza as pessoas; e são diferentes também porque são grupal. As pessoas constituem o grupo, que não é o somatório dos indiví-
diferentes as pessoas envolvidas e os contextos que as envolvem.
duos, mas o conjunto das interações coJetivas, interpessoais, vividas nas
Assim, do grupo e com o próprio grupo se extrai uma primeira defi- diversas circunstâncias previstas e imprevisíveis do encontro. Cada gru-
nição de metodologia que inclui um ponto de partida (concepções, con- po é um, vai construindo sua personalidade própria, o que torna impró-
vicções), a construção de um caminho (método, posturas, instrumentos) prios pré-julgamentos e transposições de conceitos. É preciso abrir-se
e um ponto de chegada (objetivos, finalidades). Os três momentos cons- inteiramente para as pessoas, o grupo, o processo.
tituem uma unidade dialética, têm uma coerência interna, uma dinâmica
O pressuposto básico, aqui, é a convicção e constatação de que todo ser
relacional de interdependência e mútua determinação. é capaz. A pessoa tem um valor em si mesma, uma dignidade fundamental
A condicioná-Ios decisivamente está o contexto histórico-cultural e um potencial de dignificar-se cada vez mais, não importa sua condição
em que se dão. Sem considerar o contexto social concreto, o método social, nem mesmo seu grau de consciência. Como tal não pode ser
acaba se tornando algo único e válido para todas as situações em todos coisificada, manipulada, desrespeitada. É uma brasa que carrega o dom de
os lugares, em todas as épocas. O que é um perigoso equívoco. Por soprar a cinza que a recobre, sempre ... Ao dizer que toda pessoa é capaz
exemplo, em tempos de neoliberalismo, é de suma importância méto- afirma-se que eu sou capaz, tu és capaz e por isso nós somos capazes.
dos de educação que incentivem a solidariedade no mundo, uma vez Negar, ou desconhecer a existência do eu e do outro, do diferente com ca-
que o processo de globalização avança e atinge todas as culturas e con- pacidade é afirmar a impossibilidade da capacidade coletiva do coletivo.
textos. É visível como o individualismo se insinua e toma conta das Por isso, lemos individualmente e em grupo, interiorizamos, nos convence-
relações, dos valores, dos modos de pensar das pessoas e grupos. Em mos e então cantamos: "cada um de nós compõe a sua história e cada ser
contexto de supervalorização da vida urbana e esvaziamento da vida no em si carrega o dom de ser capaz, de ser feliz" (Tocando em frente).
campo, é fundamental proporcionar situações pedagógicas que façam O otimismo fundamental a respeito do humano, que informa toda
a crítica destas imposições ideológico-culturais. Graficamente:
~
,~ ação educativa, não deve descambar para um "oba-oba" inconseqüente,
~.'-.' •...... pouco sério, que será frustrante porque deformador. Esta postura indis-
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Método se relaciona também com a opção pelas formas de luta e as Saber é diferente de ter/acumular conhecimentos. Essa identificação,
ferramentas organizativas - as que envolvem as pessoas como atores, as comumente, gera distorções graves, como a do líder que fez todo o trajeto
das organizações populares, freqüentou sabe lá quantos cursos, en-
que buscam a partilha no exercício do poder, as que estão abertas ao novo
contros, assembléias, depois não sabia mais conversar com a mulher em
e as que são eficazes.
casa ... A propósito, é muito conhecido o verso de Agostinho Neto, o
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Diz a sabença popular: "quem não sabe para onde vai, não chega lá Se me aproximo dois passos,
nunca" ou, noutra conclusão, "vai a qualquer lugar" ou, noutra ainda, ela avança dois passos.
"qualquer caminho o leva até lá". Daí a importância de se ter claro o que Se caminho dez passos,
se quer com os processos populares, de organização, de formação, de luta
ela se apressa em deslocar-se
ete. Esta clareza, em nível mais profundo, é perpassada pelas convicções,
dez passos mais adiante.
pelos valores e sonhos compartilhados. Em nível mais concreto e imedia-
to, refere-se às escolhas metodológicas para fazer o percurso até lá, ou Mesmo que eu continue caminhado
seja, os métodos e técnicas têm de ser objetivamente condizentes. Esque- não consigo alcançá-Ia jamais.
maticamente: finalidade "objetivos" metas.
Então para que serve a utopia?
Ninguém vence se recolhendo; é preciso vontade de superação, cren- Só para isto, nada mais:
ça nos sonhos, imaginação de um desenho viável do futuro. A saída popu- PARA CAMINHAR.
lar não está situada no modelo dominante, nem mesmo em seu remendo.
Está no processo de forjar homens e mulheres novos e protagonistas que
se empenham na transformação da sociedade e de si mesmos. "O socia-
lismo não existe, o que existe são socialistas. Ame socialistas, dê à luz
Afinal, o que é método popular?
socialistas, crie socialistas, eduque socialistas, prepare socialistas. Aí che-
Método de trabalho popular é o modo como você
gamos ao socialismo." (Mylton Severiano, 2002)
articula tipos de atividade, conteúdos e maneiras de
As pessoas e os grupos populares trazem mais que sua realidade e sua
fazer, tendo em vista alcançar objetivos de
própria compreensão dela, trazem também aspirações não conscientes.
libertação pessoal e coletiva, num determinado
"O povo sabe o que quer, mas também quer o que não sabe", disse Gilber- contexto histórico-cultural.
to Gil. Aqui entram a compreensão da realidade e a intencionalidade do
educador/agente. Juntam-se as expectativas de todos os envolvidos no
processo educativo e estas se tornam o ponto de chegada e apontam para
o horizonte (metas, objetivos, finalidade, rumo, projeto).
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6.1. Formal-hierárquica-autoritária
É uma concepção hierárquica porque se baseia na e sustenta a relação
superior X inferior, que se traduz por sabido X ignorante, dominante X
dominado, rico X pobre, homem X mulher, branco X negro, jovem X
velho, Norte X Sul ete. Como tal, produz uma metodologia conservadora,
pois não modifica relações, antes as mantém e justifica ideologicamente,
alimentando o modelo de "subir na vida", de escalada social, pelo qual
ascender-se-ia a posições superiores pelo esforço pessoal, pelo trabalho,
como se não fosse pelos privilégios de classe ... Mais que isso, esse subir
na vida se faz pela via da competição em que a lei é o vale-tudo, "quem
não tem competência não se estabelece", "quem for mole que se quebre",
---li
a lei de Gérson, o individualismo ...
Nos encontros, construímos com os participantes, a partir de suas É formal porque centrada na forma ou mesmo, se poderia dizer, na
experiências, Rum trabalho em grupos, os traços e os fundamentos desta fôrma. Importam as exterioridades, as técnicas, os aparatos, que já vêm
concepção. Reproduzimos aqui nossas conclusões. prontos e se aplicam indistintamente a diferentes pessoas ou grupos. A
Denomina-se metodologia autoritária a estratégia de procedimentos, realidade é reduzida a fórmulas, preconcebida e engessada pelos concei-
métodos e posturas com a finalidade explícita ou implícita de domesti- tos pré-elaborados por quem sabe e pode, para quem não sabe e não tem
car, controlar, submeter os outros, grupos ou pessoas, crianças, adoles- como, se não apreender, captar, decorar, reproduzir. .. Nega-se a idéia de
tempo como história e tudo vira reprodução do mesmo, sem chance de se
centes ou adultos. É aquela que busca a manutenção da ordem e a repro-
transformar, evoluir.
dução do sistema de dominação como forma de manter o privilégio do
grupo no poder. É engendrada a partir das elites, é a pedagogia das cJasses
dominantes. Por isso deve causar maior estranheza quando encontrada
no interior das cJasses dominadas.