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Jusuçemo o cATnrEIRo
A CUUIURA DE RESISIH\CIA ESCRAVA
lilh!iiâfeS.
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dando todo armado na fazenda-
ResPondendo a um dos questiol''-
Segundocaso
lhoziúos e mais um sujeito que trazia três criouliúos pequenos, ao qual ele
testemuúa [Pedro Fagundes] atropelou, porém não pode agarrar por ter ele 219
gaúado o mato, pôde contudo apaúar o
cavalo". O preto liberto Antonio - apontado
no processo como réu - não foi encontrado
quando dessa apreensá0. No dia seguinte,
o fazendeiro João Pereira Soares conseguiu
efetuar a prisão de Antonio e moveu uma
queixa contra ele na Delegacia de PolÍcia de
Uruguaiana, pedindo que fosse incurso no
artrgo 257 do Código Criminal: "Tirar a
cousa alheia contra a vontade de seu dono,
para si 0u para outro. Penas: de prisão com
trabalho por 2 meses à quatro anos; e de
Negras. Designadas pelo pintor como "beldades multa de cinco a 20Vo do valor furtado",
brasileiras". 1 851 -1 852.
Herrmann Rudolf Wendroth.
Soares não informa como procedeu à
prisão, mas Antonio declarou que estava
num mato com sua carreta buscando ma-
deira para uma casa e na volta foi preso. Em seu auto de qualificação disse cha-
mar-se Antonio Mina, ser liberto, ignorava quem era seu pai, não sabia a ida-
de ("porém representa ter perto de sessenta anos"), era casado, lawador,
africano de Iguá (porto de Mina)e analfabeto. Ele havia sido escravo de Soa-
res e sua famíia e, n0 momento do crime, tiúa alguma lavoura em teras de
uma vizinha de seus ex-seúores, Dona Joaquina Fonseca, na verdade irmã
da esposa de seu ex-seúor. A carta de alforria plena de Antonio foi passada
em Imbúáem 8 de março de 1869, assinada por João Pereira Soares e sua
mulher Maria Inácia da Fonseca Soares. Antonio é descrito na sua caúa de
alforria como sendo da Costa, com 56 anos de idade, e sua seúora, analfabe-
ta, não assinou o documento que a liwou do cativeiro. A rogo da seúora assi-
nou a carta Vicente Osório Rodrigues e, como testemuúas, Augusto Peres de
Farias e Zeferino Ávila Rodrigues (APERS - Liwo de Tabelionato ne 8 - T[ans-
missões e Notas, folha 111 e l72r).
O roubo dos escravos ocoffeu na madrugada de domingo para segunda-
I
HistoriaGemldn
feira e o réu Antonio defendeu-se üzendo que no dia 20 (domingo) estivera na
Rio Grande do Sul
viia de Uruguaiana vendendo melões e outros frutos de sua lavoura, apresen-
tando como testemunha Domingos Barbier, que os comprou. Depois, voltara
para a estância de dona Joaquina Fonseca, onde tem suas lavouras, e ai pou-
Paulo Roberto
Staudt Moreira sara, pois no dia seguinte precisava examinar suas plantações, ústo que lhe
I
disseram que o gado as estragara. Antonio negou durante todo o processo ter
participado do delito, apesar de todas as provas contrárias, e entre suas ale-
220
gações uma soa quase ingênua: ele não poderia planejar atravessar o rio L-ru-
guai, pois "nem sabe nadar".
per-
Queixa montada e réu preso, os documentos apontam para um roubo
petrado por um liberto, com intençáo de obter gaúos pecuniários pessoais.
A impressão primeira sobre o caso começa a mudar quando do depoimento
como testemuúa informante de um dos escravos roubados, o criouliúo Eu-
gênio, filho de Rosa, com 12 anos de idade. Eugênio informou que.pai Anto-
nio" se escondeu no quarto de sua mãe, junto à coziúa, e de lá, na madruga-
da, conduziu uma "trouxa de roupa para de trás do chiqueiro e de ai em um
cavalo picaço conduziu na garupa a ele testemuúa informante até a ponta do
mato". O cúmplice de "pai Antônio" era um crioulo chamado Joã0, que, segun-
do Eugênio, parava há um tempo na casa de
Escravo acorrentado chicoteando outro
Antonio Pedro de Miranda e Castro, despa-
escravo cruciÍicado em pelourinho. Pelotas,
chante da Alfândega, morador na vila de 1851 (?). Herrmann RudolÍ Wendroth.
Uruguaiana. Segundo o depoimento do fllho
mais velho de Rosa, na proximidade do local
onde foram capturados, o "pai Antônio" se-
parara-se deles dizendo "até logo".
Antônio, que ao longo de todo o proces-
so manteve-se insistentemente na tese de
sua absoluta inocência no caso, teve ainda de
assistir, angustiado, a um segundo depoi-
mento, ainda mais constrangedor a sua afir-
mação de nada ter feito. Foi chamada a de-
por a escrava Rosa, solteira, com 39 anos de
idade. Rosa iluminou e afastou a nebulosida-
de que poderia ainda estar anuviando a rea-
lidade do ocorrido, Perguntado o que sabia
do ocorrido: "Respondeu que tendo seu se-
úor forrado ao réu presente e querendo também dar carta de liberdade a ela
informante, sua seúora se opôs, e como já tivesse ela informante dado onze
crias, achou que isso era injustiça da parte de sua seúora, e que chegou ate a Volum2
Império
recusar o preço dela informante pela sua liberdade"'
Assim, depois de ter gerado 11 fllhos, que aumentaram o capital de seu
seúor, Rosa achava que merecia a liberdade. Antônio e Rosa eram parceilos,
lusticando o
integrantes da dura realidade de uma famflia de escravos, porém que só o pri- caüveiro
meiro recebeu a alforria como lecompensa por seus bons serviços. O casal de
escravos, descartada a liberdade sem ônus ou condiçã0, ainda tentou cgmpral 221
a alforria, o que lhes foi
negado. Era necessário
pensff uma reformu-
lação dos proietos fami-
liares e, conversando na
própria estância de
onde haüam fugido, de-
cidiram, "üsto lhe recu-
sarem a liberdade e
ainda mesmo pagando",
buscarem outras solu-
Família de negros. Moradores itinerantes do campo, residindo num
carretão. 1851. Herrmann Rudolf Wendroth. ções. O réu ocultou-se
em seu quarto uma noi-
te"até que se fecharam
as portas" e dali fugiram com seus filhos. segundo Rosa, não iam para corrien-
tes, mas "viúam para esta üla a ver se encontravam quem comprasse a ela
informante e seus filhos".
Pressionado por esses depoimentos que colocavam em dúüda sua ale-
gação de inocência, Antônio Mina foi novamente inquirido sobre a relaçào que
mantinha com a cativa crioula Rosa. Teve de admitir que a conhecia e que ela
era sua parceira: "e que com ela tem viüdo sempre como o cão com o gato, isto
é, sempre de ponta um com outro".
Mesmo assumindo coúecê-la e com ela manter relações íntimas e fami-
liares, apesar de não coabitarem, Antônio depôs que "nunca se importou com
a liberdade" de Rosa, jamais conversaram sobre isso e, se acaso houvessem
falado, ele "teria procurado disperpersuaü-la de fugir". Alforriado em 1g69,
Antonio compartilhava com Rosa a expectativa de que a liberdade não era
uma concessão dos seúores, mas uma conquista. Perguntado pelas autori-
dades judiciárias se era "estimado" por seus ex-senhores, Antonio respondeu
"que era, pelo muito que lhes tiúa servido".
Feita a queixa, apresentadas as provas e ouúdas as testemunhas, o de-
HistóriaCflraldo
Rio Grantle d,o SuL
legado de PolÍcia de uruguaiana, Joaquim do Nascimento costa da cunha e
Lima, considerou "justo" que Antonio Mina fosse incurso no ar.tigo 257, com-
binado com o 269 do código criminal do Império ("Roubar, isto é, fuúar fazen-
do üolência à pessoa ou às cousas. Penas: de galés por 1 a 8 anos"), e decreto
Paulo Roberto
Staudf -\.{oreira 138, de 15 de outubro de 1837 ("Fazendo extensivas ao derito de fuúo de es-
cravos as penas e mais disposições estabelecidas para o de roubo"). conclur-
aal dos os autos na esfera policial, foram enüados ao juiz de direito da comarca
ie Alegrete para que desse continuidade a0 processo. Em dezembro de 1g70
-ri aberta a sessão dojúri presidida pelojuiz de direito Evaristo de Araújo e
f rntra, sendo nomeado para defender Antonio o advogado Matias Teixeira de
-{lmeida.
o advogado Matias de Almeida, em seu arrazoado, baseia a contestação
que faz à pena imposta a Antonio, procurando descaracterizar o crime de rou-
bo. afinal o réu não teria desejadofuúar os escravos para si: "Quando estives-
se provado que o Réu ajudou a Escrava Rosa e seus filhos a fugirem, o que se
nega, apenas teria concorido a ajudar a essa escrava a levar a efeito o seu pro-
ieto de subtrair-se com seus filhos a escravidã0, indo gozar da liberdade em
um outro país onde não é permitido o cativeiro".
o juiz de direito cintra simpatizou com as declarações do advogado
llatias e em sua sentença absolveu Antonio Mina:
houve é certo a tirada da cousa alheia contra a vontade de seu dono, mas o
que a tirava não t nha intenção de torná-la sua propriedade e nem também a
tirava para outro, visto como a sua intenção era levar esses escravos a Repú-
blica do Uruguai, a Ílm de recuperarem a sua Iiberdade, que o senhor lhes
neSava,
deixar testamento, apenas deixando três Íilhos: Uquilidia Soares de Farias (ca-
sada com o tenente-coronel Ceciliano de Farias Correia, 30 ano$, Joáo Batista
Soares (30 anos) e Manoel Antonio Soares (28 anos). Nesse inventário, o
bem avaliado pelo maior valor foi uma parte de campo cito na sesmaria do
lmbahá, "que estava o inventanado de posse", por cinco contos de réis, APERS
- 2o Cartório Cível de Uruguaiana, inveniariante: IYaria Fonseca Soares 1893,
maço I auto no 38,
Resistências
Volume2
Genovese pôde eliminar a polaridade dos conceitos de resistência e acomoda- Império
ção dirigindo ambos a um sentido comum, retirando-os dos limites estreitos
que tradicionalmente confinavam, na lrteratura a respeito do assunto, a imagem
dos escravos rebeldes e dos submissos. Transformou tais noçoes em 'duas
lustiçando o
íormas de um mesmo processo pelo qual os escravos aceitavam o que não cativeiro
poderia ser evitado e simultaneamente lutavam, individualmente ou como gru-
po peia sobrevivência tanto moral tanto fÍsica',
229
Segundo ainda Wiessenbach (1998, p. 27), Genovese conseguiu, com isso,
HisLcria&raldn
Rio Grandn dn Sul
Paulo Roberto
Staudt Moreira
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