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Potenciais diï¬ culdades e facilidades na educação de


alunos com deï¬ ciência intelectual*

Daísy Cléia Oliveira dos Santos

Universidade Federal de Goiás,

Resumo

Quando o assunto é o ensino escolar dos alunos com de ï¬ ciência

intelectual, não é raro o questionamento sobre o modo de trabalhar com

tais alunos. Para tanto, este artigo procura apresentar uma descrição e

uma compreensão acerca das características da de ï¬ ciência intelectual

em relação ao quadro principal de prejuízo cognitivo (as funções

intelectuais) e adaptativo (as funções sociais, emocionais e práticas),

para, então, de ï¬ nir as possibilidades da prática pedagógica no contexto

escolar. O estudo foi construído a partir de uma pesquisa bibliográ ï¬ ca

sobre a área da de ï¬ ciência intelectual, dos transtornos da aprendizagem

e do desenvolvimento, da inclusão escolar e do ensino especializado.

Embora a de ï¬ ciência intelectual seja um desa ï¬ o no ensino escolar em

face de seu objetivo curricular, tanto na sala de aula comum quanto

no atendimento educacional especializado, é possível estabelecer um

contexto pedagógico prolí ï¬ co tendo em vista os objetivos educacionais

de desenvolvimento pessoal e formação acadêmico-pro ï¬ ssional,

cultural e cidadã. Portanto, fato é que a didática no ensino do aluno

com de ï¬ ciência intelectual precisa ser especí ï¬ ca não só em relação

às peculiaridades do quadro da de ï¬ ciência, como também em relação

à individualidade de cada sujeito. De qualquer modo, mesmo que a

deï¬ ciência intelectual não permita sua reversão completa, uma vez

que consiste em um desenvolvimento neurológico de ï¬ citário, avanços

escolares são possíveis.

Palavras-chave

Deficiência intelectual – Deficiência mental – Educação

especializada – Inclusão.

Contato:

Daísy Cléia Oliveira dos Santos

daisygyn7@gmail.com

* Este artigo é parte do traba-

lho ï¬ nal apresentado ao curso

de Pós-Graduação em Educação

para a Diversidade e Cidadania da

Faculdade de Direito da Universidade

Federal de Goiás (UFG), concluído

em fevereiro de 2012.

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 935
Potential downsides and upsides of the education of
pupils with intellectual handicap*

Daísy Cléia Oliveira dos Santos

Universidade Federal de Goiás

Abstract

When the subject is the teaching of pupils with intellectual handicap,


it is not unusual to question the way of working with them. The

present article seeks to show a description and an understanding


of the features of intellectual handicap in relation to the wider

picture of cognitive (the intellectual functions) and adaptive (the


social, emotional, and practical functions) handicap, so as to then

deï¬ ne the possibilities of the pedagogical practice within the school

context. The study was built based on a bibliographical survey of

the ï¬ eld of intellectual handicap, of learning and development

disorders, of social inclusion, and of special teaching. Although


intellectual handicap poses a challenge to school teaching in view
of its curricular objective, both in an ordinary classroom and in

specialized educational service, it is possible to establish a fruitful


pedagogical context keeping in mind the educational objectives of

personal development and academic-professional, cultural and


citizenship training. Therefore, it is a fact that the didactics of the

teaching of pupils with intellectual handicap needs to be speciï¬ c,

not just with respect to the peculiarities of a handicap situation, but


also in respect to the individuality of each subject. At any rate, even

if intellectual handicap may not allow its complete reversal, since

it consists in a deï¬ cient neurological development, school progress


is still possible.

Keywords

Intellectual handicap – Mental deï¬ ciency – Special education –


Inclusion.

Contact:

Daísy Cléia Oliveira dos Santos

daisygyn7@gmail.com

* This article is part of the ï¬ nal

work presented to the graduate

course in Education for Diversity and

Citizenship of the Law School of the

Federal University of Goiás (UFG),

concluded in February 2012.

936 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 4, p. 935-948, out./dez. 2012.


A educação escolar é mais do que um a aprendizagem. Nessa perspectiva, o presente

processo e um contexto para a promoção da estudo buscou elencar o máximo possível de in-

aprendizagem de conteúdos técnico-teóricos, formaçõesquede ï¬ nemade ï¬ ciênciaintelectual

devendo também promover a convivência hu- – em seus âmbitos cognitivo, comportamental,

mana. Das interações próprias ao contexto es- emocional e social –, a ï¬ m de traçar direciona-

colar, acaba sendo evidenciada a diversidade mentos pedagógicos que promovam a efetiva

humana, uma vez que tais interações fazem educação escolar.

emergir a singularidade de cada sujeito e a ne- A apresentação de uma síntese biblio-

cessidade de práticas de ensino e de interação grá ï¬ ca de um tema tão especí ï¬ co como a ca-

que sejam tanto pluralizadas como individuais. racterização da de ï¬ ciência intelectual, por si

Tal aspecto, além de ser fascinante por desve- só, já é importante, bem como sua associação

lar a especi ï¬ cidade humana, torna a educação a práticas educacionais que viabilizem ações

escolar um desa ï¬ o perante a promoção integral efetivas e evitem ações com forte potencial de

do desenvolvimento e da formação do aluno, prejuízo ou com efeitos insu ï¬ cientes. A título

considerando sua singularidade. de exemplo da importância de uma pesquisa

A educação inclusiva assumiu fortemen- bibliográ ï¬ ca, toma-se o desenvolvimento das

te essa responsabilidade de abarcar métodos e atualizações semânticas, como no caso da ter-

re flexões que possam garantir a todo e qualquer minologia da deï¬ ciência


intelectual, que ex-
aluno o direito à educação formal (escolar). Com cluiu o uso do termo de ï¬ ciência
mental com o

o aluno que possui de ï¬ ciência intelectual não é propósito de evidenciar o dé ï¬ cit no nível cog-

diferente, mesmo que as características próprias nitivo e minimizar a associação errônea com as

desse quadro impeçam a aquisição su ï¬ cien- doenças mentais (SASSAKI, 2005). Assim, com

te dos conteúdos propostos pelos programas este estudo, pretendeu-se detalhar aspectos da

curriculares. A pessoa com de ï¬ ciência intelec- de ï¬ ciência intelectual que in fluenciam os pro-
tual possui condições estruturais e funcionais cessos de desenvolvimento e aprendizagem no

que comprometem a adaptação ao ambiente e contexto escolar, via descrições técnicas, teóri-

a ampla aquisição de informações. Nesse caso, cas, cientí ï¬ cas e re flexivas. Além disso, visou-
o processo de ensino-aprendizagem tradicio- -se propor sugestões teóricas, técnicas e críticas

nal das escolas passa a ser insu ï¬ ciente para a (análises re flexivas) que possam potencializar o
promoção educacional do aluno, de modo que trabalho educacional geral junto ao aluno com

estratégias especializadas se fazem altamente de ï¬ ciência


intelectual.

necessárias (BATISTA; ENUMO, 2004; BRASIL,

2006, 2007, 2010; MANTOAN, 2006; RIBEIRO, A caracterização da deï¬ ciência


2009; SÁNCHEZ, 2005; SASSAKI, 2005). intelectual
Uma limitação, seja ela estrutural ou

funcional, não elimina a possibilidade de A terminologia da área dos transtornos

aprendizagens e de adaptações ao meio. Como da aprendizagem e do desenvolvimento de ï¬ ne

aponta Banaco (1997), as potencialidades hu- deï¬ ciência


como uma condição resultante de um

manas não podem ser tomadas como cristaliza- impedimento, ou seja, como uma limitação em al-

das (ou ï¬ xas), uma vez considerado o poder da gum nível que compromete determinados desem-

in fluência externa na determinação do compor- penhos (OMS, 1995; AMERICAN PSYCHIATRIC

tamento. Em face da possibilidade da aquisição ASSOCIATION, 1995; SASSAKI, 2005). Assim,

de competências, torna-se importante a elabo- deï¬ ciência


corresponde a uma habilidade em dé-

ração de de ï¬ nições claras referentes aos qua- ï¬ cit, uma perda ou uma anormalidade (no senti-

dros especíï¬ cos das di ï¬ culdades, para que es- do estrutural, estatístico, e não cultural, como nas

tratégias de ação especializadas potencializem noções pejorativas de bom e ruim).Ade ï¬ ciência

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 937

intelectual é um tipo singular de de ï¬ ciência, com além de limitações adaptativas em pelo menos

suas características e distinções em relação às de- duas das seguintes habilidades: comunicação,

mais de ï¬ ciências; por isso não se fala em pesso- autocuidado, vida no lar, interação social, saú-

as com de ï¬ ciências intelectuais


, mas em pessoas de e segurança, uso de recursos da comunidade,

com de ï¬ ciência intelectual. autodeterminação, funções acadêmicas, lazer e

Quanto a essas peculiaridades termino- trabalho. Outro critério para sua identi ï¬ cação é

lógicas, ainda, faz-se necessária a distinção a manifestação antes dos 18 anos de idade.

relativa à substituição do ultrapassado termo A de ï¬ ciência intelectual não signi ï¬ ca,

deï¬ para o atual deï¬


ciência mental ciência in- necessariamente, uma incapacidade, já que

telectual. O termo deï¬ ciência mental


gera con- esta se refere à impossibilidade, mesmo que

fusão com a doença mental, sendo que esta momentânea, de atuação especí ï¬ ca (AAIDD,

consiste em um transtorno do tipo psicopato- 2011; OMS, 1995; AMERICAN PSYCHIATRIC


lógico. Segundo Sassaki (2005), cada vez mais ASSOCIATION, 1995). Por exemplo, para a ati-
se tem ï¬ rmado a rejeição pelo termo mental vidade de gerência em determinada empresa,
ã i l l l d i di ã d
em comparação ao termo intelectual, tal como uma pessoa cadeirante tem condição de execu-
estabelecem a Organização Pan-Americana da tar suas tarefas laborais, diferentemente de uma

Saúde e a Organização Mundial da Saúde, na pessoa depressiva que sequer consegue sair de

Declaração de Montreal sobre deï¬ ciência inte- casa e, assim, encontra-se incapaz. Como evi-

lectual, de outubro de 2004. denciado no exemplo, em de ï¬ ciência intelectual

De acordo com a CID-10 (OMS, 1995), não se considera a pessoa como incapaz, pois,

a Classi ï¬ cação estatística internacional de do- de pessoa para pessoa, as limitações podem va-

enças e problemas relacionadas à saúde , dos riar quanto à forma e ao grau de comprometi-

tipos diagnósticos em F70-F79, a de ï¬ ciência mento (OMS, 1995; AMERICAN PSYCHIATRIC

intelectual corresponde a um desenvolvimento ASSOCIATION, 1995; BRASIL, 2010; RIBEIRO,

incompleto do funcionamento intelectual, ca- 2009); nesse mesmo sentido, as possibilidades

racterizada, essencialmente, por um comprome- de adaptação e aprendizagem não são extre-

timento das faculdades que determinam o nível madas, mas justi ï¬ cadas pela peculiaridade de

global de inteligência, ou seja, das funções cog- cada sujeito. Assim, as pessoas com de ï¬ ciência

nitivas. As funções cognitivas correspondem à intelectual possuem tantas diferenças entre si

capacidade de aprender e compreender, sendo como todos os demais. Nesse sentido, conside-

funções superiores que se estabelecem a partir ra-se que a de ï¬ ciência intelectual pode até ser

do sistema nervoso central. Elas englobam as estrutural, mas não deve ser construída – ainda

capacidades de linguagem, aquisição da infor- mais pela falta de estimulação adequada, pois,

mação, percepção, memória, raciocínio, pensa- por mais severo que seja o comprometimento, a

mento etc., as quais permitem a realização de capacidade de aprender é intrínseca.

tarefas como leitura, escrita, cálculos, concep- Analogamente à mudança semântica de

tualização, sequência de movimentos, dentre de ï¬ ciência mental para de ï¬ ciência intelectual,

outras (MALLOY-DINIZ et al., 2010). as noções de incapacidade e anormalidade, que

Assim, a característica fundamental da advêm do modelo médico, re fletem uma sinto-


deï¬ ciência intelectual é o signi ï¬ cativo prejuízo
matologia ï¬ xa. Contudo, a determinação de in-

cognitivo. Além disso, a Associação Americana capacidade do sujeito dependerá da impossibili-

de De ï¬ ciência Intelectual e do Desenvolvimento dade a que essa incapacidade se refere, sendo ela

(AAIDD, 2011) de ï¬ ne de ï¬ ciência intelectual uma condição e, portanto, passível de alteração.

como um funcionamento intelectual (QI) infe- Como o ambiente é dinâmico e o ser hu-

rior à média, havendo limitações signi ï¬ cativas mano possui potencial de adaptação e mudan-

das competências práticas, sociais e emocionais, ça, o desenvolvimento humano pode variar.

938 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais di ï¬ culdades e facilidades na educação de alunos com de ï¬ ..
ciência.

O enfoque educacional e de aprendizagem Sobre o desenvolvimento da linguagem

transpõe o modelo médico para uma ênfa- na de ï¬ ciência intelectual, merece destaque o

se na funcionalidade (AAIDD, 2011; CASTRO; fato de ser comum um dé ï¬ cit na produção da

ALMEIDA; FERREIRA, 2010; MALLOY-DINIZ linguagem, como problemas com a morfologia

et al., 2010; PALANGANA, 2001; VYGOTSKY, e, em decorrência disso, a construção de frases

1998). Um ambiente escolar que trabalhe as curtas e simples. Devido à limitada capacidade

necessidades de cada aluno tem potencial para expressiva, ocorrem poucas interações diárias

superar di ï¬ culdades, ou ao menos para ame- que favoreçam o aperfeiçoamento, o que acaba

nizá-las. Na de ï¬ ciência intelectual, mesmo gerando uma realimentação: como as pesso-

que um maior desenvolvimento e uma maior as não entendem muito bem o relato daquele

evolução sejam possíveis, a completa reversão com de ï¬ ciência intelectual, então ele acaba por

do quadro não o é (AAIDD, 2011; AMERICAN não insistir na fala. Entretanto, a fala é o ele-

PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 1995; FLETCHER mento primordial para o maior desenvolvimen-

et al., 2009; MALLOY-DINIZ et al., 2010). to dos demais processos cognitivos (CASTRO;

Vale destacar, ainda, que o quadro da ALMEIDA; FERREIRA, 2010; FLETCHER et al.,

deï¬ ciência intelectual é fundamentalmen- 2009; MALLOY-DINIZ et al., 2010).

te marcado por uma inteligência geral com-

prometida, ou seja, o prejuízo cognitivo é a O ensino escolar do aluno com


principal característica diagnóstica, corres- deï¬ ciência intelectual
pondendo a: restrito raciocínio lógico, restrita

capacidade de planejamento, solução de pro- A educação escolar tem por fundamento

blemas de ï¬ citária, fraco pensamento abstrato, atender a todos, mesmo quando há necessidade

baixa fluidez da aprendizagem, memorização de adaptar a estrutura escolar e as práticas de

restrita, baixa coordenação visuoespacial e ensino a cada criança, uma vez que as diferen-

lateralidade, esquema corporal di ï¬ cultado, ças humanas são naturais. Seguindo esse prin-

limitada atenção, limitada generalização, cípio, num processo histórico surgiu a educação

prejuízo da capacidade expressiva (princi- inclusiva, com o objetivo central de fortalecer,

palmente a verbal), de ï¬ citária capacidade de nas instituições escolares, equipes de trabalho

percepção, ausência de autodirecionamento que se preocupem em atuar e ï¬ cazmente peran-

etc. Além disso, tal quadro também é marca- te uma variada gama de situações envolvendo

do por uma restrição e por um comprometi- alunos com necessidades educacionais especiais
mento dos seguintes aspectos: capacidade de (singulares), de modo que eles, em sua singula-
responsabilidade, autonomia, observância das ridade, tenham a possibilidade de desenvolver
regras sociais iniciativa ocupacional inter tanto suas capacidades cognitivas quanto as so
regras sociais, iniciativa ocupacional, inter- tanto suas capacidades cognitivas quanto as so-
dependência, segurança pessoa (presença de ciais. A perspectiva da inclusão escolar não se

ingenuidade), controle emocional (manifesta- restringe à superação das di ï¬ culdades do aluno

do tanto com agressividade quanto com pas- ou à socialização, mas tem como proposta fa-

sividade), desenvolvimento neuro-psicomotor, vorecer a emancipação intelectual por meio da

assumência de papeis sociais (heteronomia incorporação de novos conhecimentos, de acor-

social), interação interpessoal, autocuidado re- do com a possibilidade de ampliar o que já se

ferente à saúde e higiene, estruturação da ex- conhece e de favorecer o desenvolvimento geral

periência (AAIDD, 2011; CASTRO; ALMEIDA; (BATISTA; ENUMO, 2004; BRASIL, 2010; LIMA,

FERREIRA, 2010; AMERICAN PSYCHIATRIC 2009; MANTOAN, 2006; SÁNCHEZ, 2005).

ASSOCIATION, 1995; FLETCHER et al., 2009; Um estudo desenvolvido por Lima (2009)

MALLOY-DINIZ et al., 2010; SÁNCHEZ, 2008; avaliou que, para 63% dos pais de ï¬ lhos com

TAVARES; ALARCÃO, 2005). de ï¬ ciência intelectual, a aprendizagem e o

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 939

desenvolvimento são o principal motivo para os com a prática social. Desse modo, a partir das

ï¬ lhos estudarem na rede regular de ensino, en- considerações de Batista e Enumo (2004), Brasil

quanto 21% tiveram a socialização como moti- (2006, 2007, 2010), Castro, Almeida e Ferreira

vador. Tal estudo enfatiza a importância que a (2010), Fletcher et al. (2009), Malloy-Diniz et al.

educação escolar vem tomando em relação ao (2010), Sánchez (2008), Smith e Strick (2008) e

trabalho junto a alunos com de ï¬ ciência intelec- Vygotsky (1998), o currículo e o planejamento

tual, bem como o avanço histórico e técnico da propostos ao aluno com de ï¬ ciência intelectual

inclusão escolar. deve gerar experiências em um ambiente:

Tendo em vista que o comportamento do • em que seja possível defnir ou reForçar

indivíduo está intimamente ligado ao processo a identidade do aluno (quem ele é, seu valor

de aprendizagem, é fundamental que o ensino pessoal, sua cultura);

escolar não privilegie a mera aquisição formal • sem discriminações e que promova

de informações, na qual se adota a estratégia segurança, relação interpessoal, contingências

de transmissão ou explicação de conteúdos. O positivas e bem-estar pessoal;

professor deve criar condições para que o alu- • que permita a acessibilidade ao am -

no não aceite depressa demais as informações biente físico e a acessibilidade instrumental

sem que estas sejam consistentemente recebi- (materiais e recursos que minimizem as di ï¬ cul-

das, assimiladas e aplicadas a alguma situação dades sensoriais e motoras);

prática (real), seja via experiência ou associação • em que, assim como em relação aos

com situações vivenciadas (BATISTA; ENUMO, demais alunos sem de ï¬ ciência, as práticas de

2004; CASTRO; ALMEIDA; FERREIRA, 2010). ensino considerem as fases de desenvolvimento

Devido ao grau de limitação imposto do aluno, as quais podem prolongar-se por um

pela determinação neurológica, mesmo que o tempo maior;

professor possa fazer muito no ensino escolar • com práticas motivadoras, alegres e

junto a alunos com de ï¬ ciência intelectual, al- aï¬ rmativas; com estratégias ricas em estimu-

guns conteúdos e objetivos educativos especí- lação e diversi ï¬ cadas quando necessário (por

ï¬ cos serão inatingíveis, inclusive nos casos em exemplo, recursos audiovisuais, objetos de di-

que há um nível moderado de limitações. Mais ferentes materiais, cores e texturas). Vale desta-

do que destrinchar o conteúdo curricular, deve- car que as contingências de ensino devem partir

-se priorizar aquilo que pode ser assimilado pelo de habilidades que o aluno já possui para, en-

aluno, a ï¬ nal, caso não ocorra a assimilação, tão, evoluir gradualmente naquilo que ainda é

não haverá a aquisição (aprendizagem), a me- preciso desenvolver ou adquirir. Desse modo, é

morização e, consequentemente, a recuperação possível gerar condições para que o aluno acer-

e a aplicação (CASTRO; ALMEIDA; FERREIRA, te mais do que erre, receba mais reforço imedia-

2010; FLETCHER et al., 2009; MALLOY-DINIZ to e feedback. Assim, promove-se a motivação,

et al., 2010; SÁNCHEZ, 2008; SMITH; STRICK, a autocon ï¬ ança e o aumento de comportamen-

2008; TAVARES; ALARCÃO, 2005). tos almejados pelos objetivos escolares;

Mesmo que a apreensão de todo o con- • com atividades mais tranquilas nos

teúdo curricular pelo aluno com de ï¬ ciência momentos de maior enfoque nos conteúdos

intelectual seja signi ï¬ cativamente limitada, há curriculares, uma vez que o estado emocional

a possibilidade de um efetivo desenvolvimen- livre de tensão, estresse, medo, irritabilida-

to de suas potencialidades, tal como propõe a de e ansiedade pode permitir maior atenção e

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional concentração;

(Lei nº 9.394, de 1996) em relação aos objetivos • que utilize momentos – os quais con-

educacionais centrados nos processos formati- sistirão em minutos – de descanso prede ï¬ nidos

vos e no vínculo com o mundo do trabalho e e com duração de tempo necessária de acordo

940 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais diï¬ culdades e facilidades na educação de alunos com de ï¬ ..
ciência.
com as particularidades do aluno, de modo a generalização de um nível muito inferior de

permitir uma maior tranquilidade e, consequen- dotação intelectual na de ï¬ ciência intelectual;

temente, uma maior possibilidade de aquisição. • que utilize estratégias para o aperfei -

Nessa linha estratégica também pode ser utili- çoamento da capacidade expressiva oral, do

zado o cantinho do sossego, um lugar na escola repertório verbal e da organização do pensa-

ou na própria casa do aluno para ele ir sempre mento, por meio de apresentação de relatos

que precisar relaxar, e onde pode haver objetos subjetivos, contação de histórias, apresentação

por ele preferidos; de perguntas durante a aula, descrição de ima-

• que, devido ao prejuízo da atenção, gens, uso de linguagem variadas etc.;

utilize de comandos para chamar a atenção do • que selecione conteúdos curriculares

aluno apenas nos momentos em que isso se ï¬ - mais importantes e passíveis de efetiva compre-

zer necessário, evitando a apresentação dos co- ensão – é a denominada adaptação curricular;

mandos a todo momento; • que reconheça interesses que o aluno

• em que o professor leve o aluno a pen - já possui, a ï¬ m de favorecer a valorização, a

sar e verbalizar sobre aquilo que está sendo motivação e o vínculo com o professor, o qual

transmitido, uma vez que, na de ï¬ ciência inte- está partilhando de aspectos pessoais do aluno;

lectual, o processamento da informação ocorre • que valorize a prática do brincar, a qual

mais por recepção do que por ativação (ação) consiste em uma abordagem natural para o desen-

– o raciocínio lógico é possível desde que es- volvimento humano, favorece o pensar e o fanta-

timulado para tal. Além disso, tal estratégia siar – até porque tal clientela apresenta dé ï¬ cit de

gera consciência perante aquilo que está em abstração e contato com a realidade objetiva;

aprendizagem; • que utilize recursos frequentes para o

• que trabalhe a memória associativa, incentivo e a evolução da escrita (por exemplo,

via informações contextualizadas. Logo, o uso canetas coloridas, folhas de papel – reduzidas

de conhecimentos a partir do concreto não se gradativamente de tamanho –, pinceis durante

restringe à dimensão física; as atividades de pintura etc.). O treino da escri-

• em que, mesmo sendo utilizadas es- ta, ainda, deve ser organizado de tal modo que

tratégias que favoreçam a transferência de a atividade seja reconhecida como necessária

um conteúdo para que a compreensão seja para a vida diária;

consistente e permanente e para que ocorram • que estabeleça instruções diretas so -

generalizações, certas repetições (num senti- bre comportamentos considerados adequados

do quantitativo) de um conteúdo deverão ser no ambiente escolar e social, possibilitando a

estabelecidas para que a memorização ocorra; aprendizagem de regras comuns para o con-

quanto maior é o comprometimento (dé ï¬ cit), vívio coletivo (por exemplo, conservação de

maior é a necessidade de repetições. A estimu- objetos e do ambiente; silêncio em atividades

lação adequada/precisa também será necessária comuns que o requerem). Algumas evidências

em certos momentos para a evocação 1; sobre problemas de comportamento de crianças

• que estimule a curiosidade e desa ï¬ e o que possuem certo tipo de transtorno ou de ï¬ ci-

aluno, a ï¬ m de gerar um repertório permanente ência intelectual indicam a permissividade e até

de iniciativa e exploração ativa; a indiferença de professores e pais em relação

• que não superestime as potenciali- aos comportamentos considerados socialmen-

dades do aluno, tendo em vista a frequente te inadequados (sejam eles de aprendizagem

ou psicológicos), o que geralmente ocorre por

complacência (BANACO, 1997; SMITH; STRICK,


1- Evocação signi ï¬ ca a recuperação de um conteúdo memorizado a partir

de estímulos relacionados à situação original ou por meio de tempo e esforço


2008). Nos casos de de ï¬ ciência intelectual, ob-

novos para reaprender e atingir um desempenho semelhante ao original. serva-se alta possibilidade e importância do

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 941

ensino e da aprendizagem de comportamentos maior di ï¬ culdade em executar as atividades

socialmente considerados adequados; escolares e a possibilidade de baixa autoestima

• que utilize atividades em blocos para pode gerar uma maior ocorrência de estresse

que o aluno siga uma única instrução (aquela e sua respectiva manifestação comportamen-

própria da atividade em questão), de modo que tal. A intervenção imediata é importante por

ele não tenha outros elementos que desviem a não possibilitar a emissão de comportamentos

atenção e, assim, conclua toda a atividade, possa mais extravagantes e desvantajosos em rela-

prosseguir com as demais (tendo em vista que ção ao que é desejado num ambiente escolar

tal aluno demonstra baixa consistência no de- e social, bem como por evitar que tais com-

senvolvimento das atividades) e receba o reforço portamentos sejam reforçados (por exemplo,

imediato; quando o professor retira o aluno da sala para

• que promova não só a minimização se acalmar apenas depois de ele ter emitido
das di ï¬ culdades, como o desenvolvimento de comportamentos mais drásticos, como jogar
novas habilidades e o aperfeiçoamento de ha- objetos, gritar, levantar-se);
bilid d i i l já i V l i l i F F id
bilidades positivas que o aluno já possui. Vale • que articule inFormações Fornecidas
destacar que comportamentos desejados (por pelos familiares para, por exemplo, utilizá-las

exemplo, atenção, escrita, leitura, uso dos ma- a ï¬ m de exempli ï¬ car conteúdos curriculares

teriais escolares, participação nas brincadeiras) e promover o reconhecimento (valorização) e

dos alunos com de ï¬ ciência intelectual são fa- a motivação;

vorecidos pelo convívio com modelos de com- • que gere no aluno e na Família o in -

portamentos de alunos sem a de ï¬ ciência. Esse teresse permanente pela aprendizagem e pelo

é um dos principais aspectos que justi ï¬ cam a crescimento pessoal, uma vez que é caracterís-

educação inclusiva, em contraposição ao argu- tica do ser humano a possibilidade da mudança

mento de ser mais favorável o aprendizado de e da vivência de aprendizagens e experiências

alunos com de ï¬ ciência intelectual em salas de variadas por toda a vida;

ensino especializado (e dedicado a eles) do que • que leve em conta as características

em salas de ensino regular; peculiares de cada aluno, já que o quadro da

• que compartilhe decisões e objetivos de ï¬ ciência intelectual pode variar de aspectos e

escolares com a família, inclusive para incen- intensidade; além disso, há as particularidades

tivar a responsabilidade e o envolvimento dos que a personalidade impõe até mesmo no pro-

pais em práticas de ensino fora do ambiente es- cesso de aprendizagem;

colar. Além disso, é necessário trabalhar com a • que promova interações sociais, pois o

família as competências almejadas na escola, a ser humano tem necessidade intrínseca do ou-

ï¬ m de reforçar a memorização; tro para seu desenvolvimento potencial e como

• que apresente comandos de alerta para ser relacional e dialógico. As interações inter-

aquilo que deve ser aprendido. Enquanto alunos pessoais também são positivas por permitirem

sem de ï¬ ciência aprendem facilmente por obser- que o aluno se reconheça como parte integrante

vação e imitação, os alunos com de ï¬ ciência in- de um grupo, tendo favorecidas sua autoestima

telectual precisam de direcionamento frequente; e sua afetividade;

• em que confitos sejam reconhecidos e • em que, nas atividades coletivas e grupais,

resolvidos pací ï¬ ca e imediatamente, tendo em o educador atue sistematicamente como mediador

vista os iniciais sinais de estresse e irritabilida- a ï¬ m de compensar as limitações cognitivas supe-

de, uma vez que alguns indivíduos com de ï¬ ci- riores dos alunos com de ï¬ ciência intelectual;

ência intelectual podem apresentar uma mar- • que tenha o mínimo possível de alte -

cada impulsividade e um fraco autocontrole ração nas atividades básicas (disciplinas, aten-

emocional. Além disso, tais alunos podem ter dimento educacional especializado, esportes),

942 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais di ï¬ culdades e facilidades na educação de alunos com de ï¬ ..
ciência.

obedecendo a horários regulares. Isso não sig- mento; a aquisição dos conteúdos que foram se-

ni ï¬ ca, porém, que alterações repentinas da ro- lecionados no planejamento; o desenvolvimento

tina sejam prejudiciais, mas elas devem ser bem atual; a forma como o aluno se porta e usa re-

dosadas e planejadas, principalmente quando cursos nas situações de aprendizagem; o que ele

envolverem atividades de conteúdos curricula- é capaz de fazer mesmo com a mediação de ter-

res, pois as mudanças poderão gerar indeseja- ceiros; a autonomia; a relação grupal. A avalia-

da ansiedade e insegurança. Castro, Almeida e ção não precisa ser necessariamente escrita, mas

Ferreira (2010) destacam que, nas aulas e ativi- pode ser realizada por meio do uso de indicado-

dades improvisadas, os alunos com de ï¬ ciência res de avaliação; além disso, é importante que as

intelectual tendem a ï¬ car alheios às explica- potencialidades do aluno sejam comparadas com

ções, a causar maior agitação e a demonstrar seus próprios parâmetros, e não com os resulta-

maiores reações emocionais, colocando também dos dos demais alunos da turma.

o professor em estado de tensão e angústia;

• que faça uso de tecnologias assistivas Considerações sobre o ensino


(TAs) e tecnologias de informação (TIs) para especializado do aluno com
integrar as estratégias de estimulação dos pro- deï¬ ciência intelectual
cessos cognitivos. As TAs são recursos, equi-

pamentos e serviços utilizados para ampliar as O Ministério da Educação, por meio da

habilidades funcionais das pessoas com de ï¬ ci- Secretaria de Educação Especial, especi ï¬ ca que

ência e promover maior independência e inclu- o ensino especializado (políticas públicas, servi-

são (BERSCH, 2008). O uso de jogos favorece ços de apoio, atendimento educacional especia-

o raciocínio lógico, a função psicomotora, a lizado etc.) deve ser destinado ao aluno quando

concentração, o seguimento de regras, o levan- houver ao menos um dos seguintes prejuízos:

tamento de hipóteses, a curiosidade, os interes- no desenvolvimento cognitivo, na motricidade,

ses, a noção temporal e o reforço dos acertos na comunicação, na competência socioemocio-

por possibilitar um feedback rápido do próprio nal, na aprendizagem, ou na capacidade adap-

desempenho, estimulando a memória, a capaci- tativa (BRASIL, 2006).

dade perceptiva, a motivação, a solução de pro- O ensino especializado junto aos alunos

blemas, o seguimento do ritmo próprio na exe- com de ï¬ ciência intelectual deve envolver bene-

cução da atividade, o reconhecimento e o treino fícios que vão além do acréscimo dos conteúdos

da intencionalidade, a consciência da ação etc.; curriculares, tendo em vista ganhos educacio-


• que demande o cumprimento das tarefas nais; a maximização do desenvolvimento; a
a ï¬ m de estabelecer o repertório de persistência; redução do isolamento, do estresse e da frus-
• que integre o desenvolvimento das tração que podem ser vivenciados pelo aluno
• que integre o desenvolvimento das tração que podem ser vivenciados pelo aluno
inteligências múltiplas nas áreas: da comuni- e pela família; a independência e autonomia;

cação, musical, lógico-matemática, espacial, ci- a maior produtividade pessoal; e competências

nestésica, interpessoal e intrapessoal2 ; permanentes que reduzam futuras necessidades

• que avalie criteriosamente os progres - relativas a educação especial, cuidados com a

sos especí ï¬ cos (por exemplo, leitura, escrita, saúde e reabilitação (BRASIL, 2006, 2007, 2010).

verbalização, coordenação motora ï¬ na) e que Uma importante marca do ensino es-

tenha um registro deles a ï¬ m de que objetivos pecializado é o atendimento educacional es-

apropriados sejam progressivamente traçados; pecializado (AEE), uma abordagem de ensino

• em que a avaliação seja capaz de de - sustentada legalmente e caracterizada por uma

monstrar a evolução progressiva do desenvolvi- prática de ensino simultânea ao ensino que

ocorre na sala de aula comum. No AEE, objeti-


2- Para maior detalhamento, consultar sobre a teoria das inteligências

múltiplas, de Howard Gardner. va-se um aprendizado diferente dos conteúdos

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 943

curriculares estabelecidos no ensino comum, que não signi ï¬ ca que este deva ser construído

procurando criar condições para o aluno ultra- em conjunto (BRASIL, 2010). Ao professor do

passar as barreiras impostas pela de ï¬ ciência. AEE cabe, ainda,

A partir da concepção estabelecida em

Atendimento educacional especializado em de- preparar material especí ï¬ co para uso na

ï¬ ciência mental
, de Batista e Mantoan (2007), sala de recursos; orientar a elaboração

o processo de conhecimento deve dar-se na de materiais didático-pedagógicos que

dimensão subjetiva . Enquanto o conhecimento possam ser utilizados pelos alunos nas

acadêmico refere-se à aprendizagem do conteú- classes comuns do ensino regular; indi-

do curricular, o AEE trabalha “a forma pela qual car e orientar o uso de equipamentos e

o aluno trata todo e qualquer conteúdo que lhe materiais especí ï¬ cos e de outros recursos

é apresentado e como consegue signiï¬ cá-lo” existentes na família e na comunidade.

(p.20). Assim, o AEE do aluno com deï¬ ciência (ALVES; GOTTI, 2006, p. 270)

intelectual deve priorizar o desenvolvimento de

habilidades necessárias a cada momento; tal Muitos professores, principalmente do

atendimento não se trata de um período extra ensino fundamental, alegam não se senti-

de reforço dos conteúdos acadêmicos ensinados rem preparados e motivados para a docência

na sala de aula comum. A perspectiva é de uma de grupos tão diversi ï¬ cados como no caso

construção particular de conhecimento impor- da de ï¬ ciência intelectual (CARVALHO, 2004;

tante para a vida acadêmica e geral do aluno. ROSSATO; LEONARDO, 2011). Entretanto,

Para desenvolver o AEE, é imprescindível como bem apontado por Dias (2010), tanto o

que o professor conheça o aluno e suas particu- ensino regular em sala de aula comum quan-

laridades (para além de sua condição cognitiva). to o AEE do aluno com de ï¬ ciência intelectual

Ele então atua de modo a desenvolver compe- não requerem uma abordagem pedagógica in-

tências que ajudem o aluno a ter autonomia in- teiramente nova e diferenciada. Por se tratar de

telectual e adaptativa (de convívio na comuni- um campo considerado distintivo, costuma-se

dade). O trabalho deve enfocar as competências supor o uso de procedimentos didáticos ditos

de ï¬ citárias e o aperfeiçoamento de competênciasespeciais, o que de certa forma se deve a uma

consideradas adequadas (BRASIL, 2007, 2010). necessidade de caracterizá-los também pela

Em face de di ï¬ culdades muito individu- diferença. A ideia de procedimentos didáticos

ais, o professor do AEE deve intervir imediata e especiais torna complexa a prática pedagógi-

consistentemente, objetivando não só a rápida ca junto ao aluno com de ï¬ ciência, sendo que aí

aquisição de determinada competência, como estão envolvidos os mesmos processos de apren-

também a capacidade funcional (que é mais dizagem – porém, em ritmo e grau inferiores. A

permanente). Mesmo que os conteúdos do AEE inclusão escolar, nesse sentido, tem carecido mais

não precisem ser relacionados diretamente com de uma abordagem técnica do que de uma pers-

o ensino da sala de aula comum, é importante a pectiva re flexiva.


interação entre os professores do AEE e da sala

de ensino comum para uma maior efetividade Considerações ï¬ nais


do trabalho de ambos. Por consequência, o pro-

fessor do ensino regular tem a possibilidade de O constante desenvolvimento e a apren-

conhecer mais peculiaridades do aluno, ao pas- dizagem são possíveis em casos de de ï¬ ciência

so que o professor do AEE pode ter acesso ao intelectual, e a capacidade humana tem como

modo como o aluno se comporta na sala de aula característica intrínseca a possibilidade da mu-

comum. Essa relação cooperativa deve ocorrer dança. Com práticas de ensino e estimulação pró-

inclusive com o compartilhamento do plano, o prias a cada limitação e a cada potencialidade do

944 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais di ï¬ culdades e facilidades na educação de alunos com de ï¬ ..
ciência.
aluno com de ï¬ ciência intelectual, torna-se pos- O ensino escolar de alunos com de ï¬ ci-

sível atingir objetivos escolares fundamentais, o ência intelectual ainda é uma problemática de

que não signi ï¬ ca que o quadro de de ï¬ ciência pesquisas e estudos atuais. Entretanto, o pro-

intelectual possa ser completamente revertido, fessor, tanto do ensino regular como do ensino

dada sua determinação neurológica fundamen- especializado, não estará tateando no escuro

tal. Entretanto, a escolarização é positiva por si quando o assunto é a de ï¬ ciência intelectual,

só, por constituir-se como processo-chave para pois muitos são os estudos e direcionamentos

a máxima formação humana e social, não po- que evidenciam possibilidades educacionais e

dendo ser negada a nenhuma pessoa, mesmo em pedagógicas (ALVES; GOTTI, 2006; BATISTA;

casos de grave comprometimento funcional e/ou ENUMO, 2004; BERSCH, 2008; BRASIL, 2006,

estrutural (como a paralisia cerebral). 2007, 2010; CASTRO; ALMEIDA; FERREIRA,

A educação na área da de ï¬ ciência inte- 2010; CARVALHO, 2004; DIAS, 2010; FLETCHER

lectual deve atender às necessidades educacio- et al., 2009; LIMA, 2007; MALLOY-DINIZ et al.,

nais especiais sem se desviar dos princípios bá- 2010; RIBEIRO, 2009; ROSSATO; LEONARDO,

sicos da educação proposta às demais pessoas. 2011; SÁNCHEZ, 2005; SÁNCHEZ, 2008;

Para tanto, o aluno é inserido numa abordagem SMITH; STRICK, 2008). Diante das descrições e

educacional que inclui o ensino escolar regular deï¬ nições referentes a essa temática, ao pro-

(que ocorre na sala de aula comum) e o ensino fessor é possível certa autonomia via experi-

especializado (o qual compõe o AEE e se esta- mentação pedagógica contínua, pois a partir da

belece nas salas multifuncionais). Mesmo que a observação direta (próxima) do aluno são evi-

de ï¬ ciência intelectual consista em um quadro dentes as necessidades educacionais (sejam elas

clínico distintivo, cada necessidade é única e cognitivas, emocionais, comportamentais ou

gera a necessidade de tratamento subjetivo. sociais) e as tentativas progressivas de trabalho.

A princípio, o professor que atuará junto A angústia sentida em relação ao modo

ao aluno com de ï¬ ciência intelectual não pre- de trabalhar junto a alunos com de ï¬ ciência

cisará saber tudo sobre a de ï¬ ciência, não sen- intelectual, como destacam Carvalho (2004) e

do exigida uma habilidade técnica além de sua Mantoan (2006), não pode exclusivamente se

formação pedagógica. Desse modo, o professor restringir ao quadro clínico dessa clientela, uma

irá atualizando-se e aprendendo conforme cada vez que os próprios alunos sem de ï¬ ciência não

caso (aluno) especí ï¬ co, uma vez que o aluno conseguem obter uma apreensão de todo o con-

com de ï¬ ciência intelectual é passível dos mes- teúdo curricular, o que ocorre devido a motivos

mos processos de aprendizagem que os alunos diversos (motivação, história de aprendizagens,

sem a de ï¬ ciência. condição intrapessoal, saúde, condição social

As limitações e possibilidades educacio- etc.). Além disso, por mais dinâmico que seja

nais do aluno com de ï¬ ciência intelectual não o processo de ensino-aprendizagem do aluno

requerem intervenções complexas em relação às com de ï¬ ciência intelectual, o ensino escolar

práticas pedagógicas comuns, mas exigem do não terá potencial de ação su ï¬ ciente para pro-

professor uma atuação mais próxima, frequente mover determinadas mudanças.

e particular em relação a cada objetivo escolar e Para que o ensino nesses casos seja mais

às habilidades envolvidas para que as metas se efetivo, deve-se, em suma, criar condições para

realizem. Assim, estudos de caso, planejamento a atuação ativa do aluno, o uso de situações

individualizado e materiais de apoio são alguns aplicadas (contextualizadas), o uso de um con-

dos elementos importantes para a atuação do pro- teúdo curricular funcional, o trabalho de ha-

fessor junto ao aluno com de ï¬ ciência intelectu- bilidades positivas e não só a redução das li-

al, e não diferem dos princípios e das estratégias mitações, o desenvolvimento da capacidade

também utilizados com alunos sem de ï¬ ciência. de aprender (em contraposição à apreensão

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 935-948, out./dez. 2012. 945

quantitativa de conteúdos) etc. Também vale ou critérios para o ensino escolar do aluno com

destacar que as intervenções escolares não se deï¬ ciência intelectual. O objetivo foi apenas

restringem aos alunos com de ï¬ ciência intelec- apontar possibilidades de ação em relação ao

tual, mas envolvem os demais alunos, como nas quadro geral e comum da de ï¬ ciência intelec-

situações em que o professor deverá atuar como tual, além de destacar a importância de estudos

mediador tendo em vista a promoção de intera- que evidenciem dados pormenorizados sobre as

ções coletivas. características peculiares na de ï¬ ciência intelec-

O presente trabalho não teve a preten- tual e recursos técnicos para o ensino escolar

são de estabelecer um modelo de intervenção efetivo e o bem-estar geral do indivíduo.


946 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais diï¬ culdades e facilidades na educação de alunos com de ï¬ ..
ciência.

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Recebido em: 07.06.2012

Aprovado em: 06.08.2012

Daísy Cléia Oliveira dos Santos é psicóloga e mestre em Processos Clínicos e Psicopatológicos pela Universidade Católica

de Goiás (UCG).

948 Daísy Cléia Oliveira dos SANTOS. Potenciais di ï¬ culdades e facilidades na educação de alunos com de ï¬ ciência. ..

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