Академический Документы
Профессиональный Документы
Культура Документы
Reitorá
Maria Valéria Costa Correia
Vice_reitor
José Vieira da Cruz
Diretor da Edufal
Osvaldo Batista Acioly Maciel
Coordenação Editorial
Fernanda Iins
Editoração eletrônicarprogramação
visual trfna*,*ç* 09
Jeane de Santana Joseíá Elídnd souza
Capa Jooquím Tavares dú ConceíçAo
Jeane de Santana Anamoria G. Bueno de FÍeitas
Atana Conçalves. de Carvàllro
MJntns
Iustração/ capa
Jean Carlos da Silva
9,wfta* 19
Carlos EduardoVieíra
Catalogação na forite
Universidadê Federal de Alagoas
_
Departamento de_Tratamento Técnlco da Editora
da Ufal
lntelectuais_da educação e
educação escolar / Josefa Eliana
9rynn t 25
.roaquim favares da Conceição, Souza,-,
Anamaria C. ar"no a" fru-it"-r, Peter Ramus e a escola moderna
orgilizadqs. _ Maceió : EDUFAL, 20r7.
Potrícia Ap. Bioto Cavdlcdnti
lnclui bibliografia.
lSBN: 978-85-59r3-o45_4. @nnz 41
O intelectuais da educação:
1,Educação.2, Cultura escolar. t. H
mediadores das políticas educacionaís no
o. rraptaria's. r. iou-z;, ;;r:i""..i;i;.i't'"ria
4 Memórias' 5 rnterectuais. Estado de Mato Grosso (r997-t998)
conceição, Joaquim Tavares,
org. u. Freitas, Anam".," a. ur"". juillj.l'
Rosil ey Aparecída T elxeir o
CDU:37(o91)
Smões
Edufal - Editora da Universidade Editora aÍiliada:
Federal de Alagoas
C
i*"#Jil[:":I".#1,;l,l'JsA
Cidade Universítária, Maceió/AL
Cep .:57o72_g7o
nmEU
Contatos: www.edufal.com.br
contato@edufal.com .br (gz)
"+:?j*.1,.""F*I
I
| 3zt4-trtlfit3
Viver na ambivalência:
t 6'r &ptuk, B vS
"rr.r.*l^ff
fessora eotiguar Sinhazinha Missão protestante e educação na
traietória intelectual de Eva Mills
Wanderley (r876-1954)
Evelyn de Almeida Orlando
Roberg Jonuário dos
Santos Loyde Anne Carreiro SilvoVeras
lranilson Buriti de Oliveira
B9
Çny,Í,,k I ry7
tíO viaiante do lempo"t o teatro
^"?K r:
Do que há da docência nas aulas de
intelectuaÍs: a pesquisa históría da professora-escritora Lígia Pina
histó.,." O"
no acervo de Júlio César
de Meffo"Or.aiãà
e Souza J osá cenivaldo Martires
Joaquím Tavares da Conceição
ct a u d i a n o d o s a eÍ'::: ::::';::;
&pnm ru 215
9aptula,5 107
A cultura acadêmíca entre â transmissão
lntelectuais e higiene e a materialidade: o que nos revelam os
escolar na
primeira repúbtica: o, artefatos acerca das práticas de estudo na
i_p.urroi
como veículos de divusação formação jurídica na uníversidade
de
ídeias educacionais portuguesa entre os séculos XIX e XXI?
Mdrcid Terezinhd ). O. CÍuz
**r*^oi;r;::"::r::r::: Mdr g,ari do Louro F etÉueirds
131
QyArn f 45
Antonio Manoer o. rr* Abríndo a escola, acendendo as luzesl
"?yK:.1"
defesa da educação prisionat
io vestÇios de uma cultura escolar em uma
romance írvidas perdidasr, escola noturna na província do paraná
(195r)
Moria do Socorro Lima Juarez José TuchinskÍ dos Anios
Anamaria Gonçalves Bueno
de Freitos
&ymrl" lZ 25s
't53 Recordar é viver: Casa do
-
Educando o srasil ,^r
t".r.r".!-Oo Tude de Souza
rrk%: Pequenino e a cultura escolar
e o projeto de Rosemelre Siqueira de Santana
radÍodifusão educativa
do uinistério da Josefd Elidna Souza
rducação e saúde pública
t gni-róiõ
tilJ.fil tSoÁ,ta a, aaÍohza z8z
,., r" orr",," i!í
]opitrlr, t I
Abríndo a escola, acendendo as luzes:
vestígíos de uma cultura escolar em uma
escola noturna na Província do Paraná'
-.!:,.i.ll
de V. Excia. de t4 de abril próximo passado e em que, ao contrário das noturnas, se voltavam à instrução exclusiva
resposta cumpre o grato dever de fazer chegar de crianças, no tempo da infâncial Que culturas escolares teriam
ao conhecimento de V. Excia. que, em sessão produzido? Com o objetivo de oferecer algumas respostas para
extraordinária de hole, criou uma aula noturna
para ãdultos nesta cidade e que será instalada no
essas questÕes, busco neste capítulo investigar o funcionamento,
dia t" de iunho próxírno íuturo sob a regência do organização e a cultura escolar produzida na escola noturna que
professor Líbero Teixeira Braga com quem será foi aberta na cidade da Lapa, na Província do Paraná, em junho de
imediatamente contratado. Deus Guarde V. Excia' t BBz, tomando por fontes o livro de registro de frequência, ofícios,
lt mapas escolares e a legislação escolar'.
Paço da Câmara Municipal da Lapa, 29 de maio
de rB8z (DEAP-PR, AP 660, rB8z, p. t76).
No livro de frequência, iniciado em junho de r88z e encerrado
A inicíativa do presidente em motivar a abertura de escolas em Dezembro de t892, forarn anotados os nomes, a presença diá-
para adultos e a resposta dada pelos vereadores da Lapa, remete ria e as notas que avaliavam a dedicação ao estudo, aproveitamen-
!
a um fenômeno que se processou de forma bastante intensa no to e comportamento de cada um dos alunos. Nos seis primeiros
Paraná e em outras províncias na última década do período impe' meses, também foi registrado o seu grau de adiantamento através
rial: a oferta de educação elementar para adultos trabalhadores
nas chamadas esc0las noturnas. I das classes pelas quais estavam distribuídos. Essas informações
são um vestígio da presença daqueles que frequentavam as aulas
d noturnas da Lapa e de certo modo sobre o modelo de instrução
Essas escolas, em princípio, foram um espaço pensado para
que para eles foi pensado e oferecido naquela escola. Os mapas
jovens e adultos, que já inseridos no mundo do trabalho, deveriam
inserir-se também no mundo da escola, a fim de adquirirem saberes
I escolares, por sua vez, informam - além do que consta no livro de
frequência - sobre as idades, profissões, condições e estado civil
e habilidades consideradas fundamentais para o trabalhador livre da
dos alunos, ajudando a reconstituir um perfil da clientela das aulas
época, num país que vivia os últimos momentos do regime de escra'
noturnas. "lá os ofícios testemunham Ltma forma de comunicação e
vidão e os impactos de uma reforma eleitoral que, em t88t, estabe'
prestação de contas estabelecida entre Líbero Teixeira Braga (que
lecera como um dos critérios para exercício do voto, o ser alfabetiza'
os assina como diretor e professor da escola) e o presidente da
do (PERES,2oo2; SOUSA,2006;COSTA, zooT). Na prática, contudo,
Província Carlos Augusto de Carvalho, dando notícias sobre o fun-
a historiografia aponta que também crianças livres pobres e adultos
cionamento, frequência dos alunos e demais atividades considera-
escravizados, além dos ingênuos (os filhos livres da mulher escrava,
das dignas de serem informadas.
assim nascidos em virtude da lei de z8 de setembro de l87t), vieram
a tomar assento nos bancos dessas instituições de ensino noturnor
A cidade da Lapa surgiu no seculo XVI I I como local estrategico de pouso para os
tornando, com isso, bastante heterogênea a clientela que efetiva'
tropeiros que vinham cle Viamão, na Província cle São Peclro clo Rio Crande do
mente veio a ser atendida por essa modalidade de escolarização Sul, até Sorocaba, em São Paulo, para a 5lrar-rde feira cle muares que anualmen-
(ANANIAS, 2ooo; ANJOS, zott; SILVA, zot4). te se realizava naquela cidade. Em t3 de junho (le 1769, o povoado tornou-se
Freguesia de Santo Antonio da Lapa. Por volta de r8oo, foi consolidada como
Mas, como se organizavam essas escolas? Em que tal organiza- + principal via de acesso a São Paulo, vindo clo sul, a Estrada da Mata, à beira da
ção se aproximava ou se diferenciava daquela das escolas diurna§, ,l
I
qual se desenvolveu, ao longo do seculo XlX, a Vila do Príncipe (títuk: recebido
+ em t8o6), depois cidade da Lapa (elev.'rção alcançada em r87z)
2lB rl9
:i-.:,'.,i.
Para dar conta de conduzir esta investigação, decidi desen' De fato, se passarmos em revista os registros dos seis primei-
volvê-la num recorte cronológico de curta duração: de junho a de' ros meses de funcionanrento da escola regida por Líbero Braga,
zembro de t882, por ser o período no qual são mais abundante3 muitas dessas normas e práticas configuradoras da cultura esco-
os vestígios sobre o funcionamento da escola noturna da Lapa. lar podem ser identificadas. O quadro abaixo sintetiza uma página
Embora reconheça que um recorte temporal reduzido possa têr desse livro e as informações que nos servirão de ponto de partida,
suas desvantagens, também defendo que não é menos fecundo ajudando-nos a "abrir a escola":
para o conhecimento histórico, na medida em que as experiênclat
analisadas na curta duração podem, como afirmou Le Roy Ladurlc
sobre as duas semanas do Carnaval de Romans, "iluminar e revQ'
lar culturas e conflitos de uma época" (LE RoY LADURIE, 2oo2, p.
385), oferecendo referências para a compreensão de um mesmo E bastante raro encontrar, nos dias atr:ais, livros cle tnatrícr:las e frequência
fenômeno - no nosso caso, as culturas escolares nas escolas no' de alunos do seculo XiX. No caso deste livro, etr especial, parece ter sido con-
na média ou longa duração. servado junto do acervo cla Câmara Municipal cla Lapa, acervo que, na década
turnas para adultos trabalhadores -
de r99o, foi transferido para a Casa da Memória da Lapa, onde foi por mim
consultado entre 2oo9 e 2o1o.
744
___ . jl,. :r.. .,i --.
Quadro r - lnÍormações Registradas pelo professor sença ou ausência dos seus discípulos, noite após noite, durante
Líbero Teixeira Brãga para o mês de iunho de 1882
todo o tempo de funcíonamento da escola.
Notas
Mês de lunho
Tôtâl
A quinta coluna 'ídedicação ao ensino,, contém o registro de
Dedicação Aproveita- Comporta
Noites letivas deste mês aô Estlrdo mento mento como o professor percebia em seus alunos o empenho e o desejo
de aprender, a sua dedicação. Conforme uma convenção por ele
Fonte: Livro de Frêquência da Escola Noturna
adotada (mas alterada já no primeiro mês) a dedicação ao ensino
A análise da primeira coluna do livro de frequência nos dá uma podia ser caracterizada como N (nenhuma), p (pouca) e M (muita).
ideia do número de alunos matriculados entre iunho e novembro Embora não tenha incluído nessa (onvenção, utiliza com constân-
de t882. Em iunho foram 39 matrículas, em julho 8, em agosto 10 e cia"A", que conforme se deduz, se refere a,,alguma dedicação,,,
em setembro 1. Em outubro mais 5 e em novembro outras 2, num um provável meio termo entre a pouca e muita dedicação. As ano-
total de 65 matrículas. Muitos desses alunos abandonaram a esco' tações dessa coluna são resultado de um modo de olhar e perce_
la ao longo desse período, de forma que eram 38 os que a frequen' ber, próprios do professor, que embora nem sempre possam ter
tavam efetivamente no final do mês de novembroa. correspondido ao real empenho dos alunos, refletem a maneira
como eram vistos no interior da escola por aquele que tinha o po-
A terceira coluna, das noites letivas de cada mês, revela que
der de descrever e inscrever condutas.
em iunho houve 20 noites de aula, em julho z6 (seriam 27,seno
dia t3 o professor não tivesse se ausentado por estar doente). Em A sexta coluna "aproveitamento,, diz respeíto ao resultado
agosto foram z5 noites, em setembro 24, outubro z6 e novembro obtido por cada aluno ao final de mais um mês de frequêncía às
z4 noites. É de se crer, a partir do registro diário das aulas, quê aulas noturnas. Esse aproveitamento - também conforme conven-
elas ocorriam em seis das sete noites da semana, excetuando-se ção de Líbero Braga - era ídentificado pelos mesmos critérios aci-
as semanas onde ocorria algum feriado, como foi o caso das noitet ma mencionados, com a diferença de que ,,muita dedicação,, nem
de 7 e 8 de setembro, em que não houve aulas5. Esta coluna tam" sempre era sinônímo de "muito aproveitamento,, e vice_versa, o
bém informa sobre a rotina de matrículas na escola: espaços em que demarca que o grau de percepção do professor em relação à
branco seguidos de anotações de frequência que dizem respeÍto I dedicação do aluno e o seu aproveitamento podia levar em conta
um novo nome, índicam que não havia um dia em especial durantt outros âspectos que não deixaram vestígios nessa fonte, ao passo
o qual os alunos podiam pedir ingresso, de forma que a qualqucr que pode ser também indicativo de que, por maíor ou menor es_
noite, um novo colega podia sentar-se ao lado de um aluno mall forço que um escolar demonstrasse, sempre havia a possibilidade
antigo. Por fim, foi nessa coluna que o professor registrou a prc de que talentos, aptídões e afinidades com os saberes ensínados
e aprendidos também tivessem seu peso no aproveitamento dos
4 Tais números bem como os demais que compõe esta seção foram levantadtlr alunos trabalhadores.
a partir das iníormações constantes entre as folhas 1 a9 do Livro de Frer;tl0tt
cia da Escola Noturna. A sétima coluna, "comportamento,,, demonstra que o modo
de proceder do aluno no processo de ensino-aprendizagem era de-
5 AO que parece, tratâ-se nesse caso em particulàr de uma data cívica - o,tttl
versário da lndependência do Brasil - e uma data religiosa, a festa da Natlvl vidamente observado e tinha também seu lugar na configuração da
dade de Nossa Senhora, respectivamente.
lectuais da educação ê (últurà esaolâr Abrindo a escol§, §cendendo as luzes:
cultura escolar da escola noturna, embora não seia possível perce" a t5, dos meses de janeiro, abril, julho e outubro,,(fRnnNÁ, rg57,
ber por meio de que práticas o código de conduta foi sendo cons' arl. 3l). Todavia, a partir do Regulamento de $74 (o terceiro em
truído no cotidiano escolar. Esse comportamento podia ser registra- vigor na Província), a referída proibição foi retirada, sendo fran-
do como E (exemplar), O (ótimo), B (bom), M (mau) e P (péssimo). queada a matrícula aos alunos em qualquer época do ano (PRRR-
NÁ, r874), permissão - a julgar pelo silêncío acerca da matéria no
Quanto ao horário de funcionamento da escola, método adota" dispositívo legal - mantída no quarto Regulamento Ceral da lns-
do e matérias ensinadas, em mapa enviado à lnspetoria Geral da lns' trução Pública do Paraná, de r876, ainda em vigor no ano de rBBz.
trução Pública, datado de 4 de iulho de t8Bz, Líbero informava que Destarte, temos que a liberdade de receber alunos a gualquer dia
Esta aula funciona, durante todos os dias úteis, do ano, não era prerrogativa ou particularidade da escola notur-
t
das 6 horas da tarde às horas da noite; são le- na em função de sua clientela, mas prática corrente também nas
cionadas nela, alternadamente, todas as maté-
escolas diurnas paranaenses.
rias que constituem instrução primária, inclusive
contabilidade e doutrina cristã e sua classifica- quanto ao método de ensino, o Regulamento Geral de lns-
ção e a seguinte: t" classe, à qual pertencem os trução Pública de 1876 prescrevía que o método oficial de ensino
analfabetos e principiantes; z'classe à qual per-
adotado na Província era o "simultâneo por cÍasses,, (PARANÁ,
tencem os de leitura, escrita e contabilidade sim-
ples ou rudimentares;3'classe à qual pertencem 1876, art. 3r). Como consequência de sua adoção, após serem pe-
os de leitura corrente, e§crita ditada, gramática, riodicamente examinados para passar de uma classe à outra (art.
análises e aritmética, ou contabilidade em geral 3z), ao final, os alunos ensinados por tal método deveriam prestar,
até proporções e 4' classe à qual pertencem os sempre no mês de novembro de cada ano, o exame final (art. 33),
que depois de examinados prévia ou parcialmen-
com o qual se daria por concluído seu processo de escolarização.
te, forem considerados aptos a fazerem exame
final de habititação. A frequência destes alunos é
A prática dos exames periódicos e do exame final, de que fala-nos
mais ou menos regular e o método adotado é o Líbero Braga, era também outro ponto que unia as culturas escola-
simultâneo e em certos casos também o mútuo. res diurnas à cultura escolar noturna.
(DEAP-PR, AP 660, r882, p' zt5).
Já em relação às matérias, no contraponto entre a pouca mi-
A partir dessas informações, tem-se a impressão, num primel' nudência do relato do professor Líbero e â sua afirmação de que
ro momento que, de maneira geral, a rotina e o cotidiano das au' ensinava todas as de que se compunha a instrução primária, elas
las noturnas na cidade da Lapa pouco diferiam da rotina das aulas parecem corresponder ao que vinha prescrito no artigo 9" do Re-
diurnas da Província no tocante à maleabilidade nas matriculat, gulamento de r876, quando estabelecía que
aos métodos de ensino, às matérias, o modo de avaliar e as preo
O ensino elementar compor-se-á:
cupações com o comportamento e conduta dos alunos.
t'. De lnstrução moral e religiosa
No que diz respeito à maleabilidade do calendário para acel
zo De leitura e de escrita
tação de matrículas, na década de t85o, quando passou a vigorat
o primeiro Regulamento Ceral de lnstrução Pública do Paran*{, 3" De noções gerais de gramática nacional
fora estabelecido que "as escolas só poderão receber alunos dtl I
7.4tt
,-*,".*" , *
"rr-.ã**., *'-
que as crianças que moravam mais distante das escolas, ao inter-
4" De elementos de aritmética e desenho linear'
compreendendo o estudo do sistema métrico; ("') romperem as lições para o almoço, acabassem por não retornar
para o período da tarde, como reclamava um professor da Lapa,
6'De geografia e história, particularmente da Pro-
Pedro Fortunato de Souza Magalhães Júnior, em 188o (ANJOS,
víncía. (PARANÁ, t876, art' 9')'
zot3). )á nas cídades - como era o caso da própría Lapa - duas
Por fim, também era demarcado na legislação vigente no Pa- sessões diárias, de três horas cada (das nove ao meio dia e da uma
profes-
raná, ainda que nas entrelinhas, que, dentre os deveres do às quatro da tarde), perfazendo, não obstante, tambérrr seis horas
sor primário, estava o de zelar pelo comportamento e a conduta diárias de trabalhos escolares (PARANÁ, t876, art. t7z). Em maio
dos escolares, ao í'procurar inspirar aos seus alunos os sãos precei- de t882, porém, essa diferença entre escolas de vilas e cidades foi
tos da moral e da religião" (PARANA, 1876, art' 101, § J") e "guardar abolida, sendo estabelecida uma única sessão para os trabalhos
nas escolas o silêncio, o respeito e a regularidade" (ldem, ibidem' escolares, de sete horas diárias, das nove da manhã até quatro da
§ 5"). Coisa que, por meio
da escrituração no livro de matrículas e tarde (PARANA, t882, art. 4').
frequência, Libero tratava de fazer na escola noturna mantida pela
Ora, na escola noturna regida por Líbero Teixeira Braga, em
Câmara MuniciPal da LaPa.
t882, não apenas o horárío das aulas era, obviamente, diferencia-
do (das seis às nove da noite), como o total das horas em que du-
Acendendo as luze§
ravam os trabalhos escolares equivaleria a menos da metade do
Apesar das consideráveis semelhanças entre o que o pro então praticado nas escolas diurnas. Seria essa considerável dife-
fessor Líbero Braga afirmava fazer com seus alunos (adultos) da rença um indício de que a educaçãr: noturna era tratada com me-
escola noturna e aquilo que igualmente os professores primários nor importância do que a educação diurna dada às crianças?
deveriam fazer com os respectivos alunos (crianças) nas escolas Como tem demarcado a historiografia, uma das lutas que a
diurnas segundo a legislação paranaense, se acendermos as luzes escola precisou travar para afirmar-se no BrasÍl do século XIX foi
para iluminar alguns outros elementos anteriormente menciona aquela que dizia respeito à conquista do tempo da infância para si,
dos, de modo mais detalhado - os relativos ao tempo de dura retirando o monopólio que sobre ele, até então, era exercido pela
entre dois métodos
ção dos trabalhos escolares e a combinação família ou pelo mundo do trabalho (FARIA FILHO,:oo8). Já caso
de ensino - emergem certas peculiaridades que parecem indicar
de adultos trabalhadores (e mesmo das crianças trabalhadoras e
a existência não somente de uma cultura escolar, semelhante às ingênuos) que frequentavam as aulas noturnas, essa, ao que pare-
das demais escolas diurnas, mas, também, de uma cultura escolar ce, seria uma luta perdida, já que, irremediavelmente, boa parte do
noturna, isto é, específica da instrução de adultos trabalhadores' tempo desses alunos não poderia ser monopolizada pela escola,
O tempo de duração clos trabalhos escolares, nas escolas diur pelo simples fato de .iá ser abocanhado pelas diferentes atividades
nas do Paraná, foi estabelecido de forma diferenciada no Regul;l que exerciam para si ou para seus senhores, como as de carpintei-
mento de lnstrução Pública de r876. Nas vilas e povoados, unr't ro, sapateiro, alfaiate, pedreiro, pintor, ferreiro, açougueiro e lor-
única sessão diária de seis horas, das nove da manhã até às três d'r naleiro, por sinal, informadas pelo próprio Líbero Braga em um dos
tarde (PARANÁ, t876, art' t7z), muito provavelmente para evitrrr mapas escolares por ele enviados à presidência da Província em
agosto de t88z (DEAP-PR, AP 665, rB8z, p.3).
)Qí
histórica (DAVIS, 1987) das prováveis razões pelas quais "em cer-
tos casos", Líbero teria recorrido a esse expediente na escola no-
turna. Retomemos e cruzemos, para tanto, algumas informações z" Classe, Ío Banco 2" Classe,2" Banco 2'Classe
presentes no livro de frequência da escola noturna, em um mapa Leitura Aritmética "Leitura, escritã, contabilidade simples ou
escolar de iulho de tBSz e na legislação paranaense acerca da apli- rudimentares"
Aritmética Escrita
cação do método simultâneo6.
Escrita Doutrina Cristã
Em junho de t8Bz, ao tomar ciência dos conhecimentos pré-
Doutrina Cristã Cramática
vios dos trabalhadores matriculados em sua aula noturna, Líbero
3" Classe, banco único J" Classe
Teixeira Braga os distribuiu ao longo das quatro classes segundo
Leitura "Leitura corrente, escrita ditada, gramátaca,
as quais decidiu organizar sua aula. Por sinal, ele mesmo nos for-
análises e aritmética ou contabilidade em
neceu informações sobre isso, página atrás. Ocorre que, também a Gramática
geral até proporções"
legislação educacional paranaense, em um regulamento de r857 (o Aritmética
único versando sobre o tema, jamais revogado, o que leva a supor 6eometria
ter continuado válido ao longo de todo o período provincial), esta-
4" CIasse
belecia regras acerca de tal organizaçáo. Confrontemos, assim, a
Preparação para exames finais
norma legal e a prática docente do nosso professor (Quadro z).
Fonte Instrução 6eral de Ordem para as escolas (r856)
quadro 2 - A organização das classes de ensino simultâneo na legislação paranaense
DEAP-PR, AP 660, r882, p, 2í5.
e na escola noturna municipal da Lapa em 1882.
a"],"u
leduais da edu.àção e (sltura escolaÍ brindo a escoto, acendendo os luzest
Craças ao livro de frequêncía e ao mapa enviado pelo profes- crita, contabilidade símples ou rudimentares. Em seguida, o segun-
sor em julho de 1884, temos condições de saber não só como ele do maior contingente de alunos trabalhadores (rz alunos) ocupava
organizou sua aula em classes, mas, quantos, dos 39 alunos que a 1u classe, sendo, provavelmente, analfabetos e principiantes. Fi-
foram matriculados no primeiro mês de funcionamento da escola, nalmente, outros to alunos constituíam, por aquela época, o grupo
estavam em cada uma das classes, o que nos fornece maís um tan- dos mais adiantados na escola, estudando, na 3" classe, a leitura
to de evidências a serem consideradas para a construção de nossa corrente, escrita ditada, gramática, análises e aritmética ou conta-
interpretação sobre a brícolagem entre os métodos simultâneo e bilidade geral até proporções.
mútuo (Tabela t)
É oportuno registrar, a partir dessa informação, que, apesar
Tabela , - quantitativo de alunos distribuídos pelas classes de não contar na ocasião com alunos já em condições de prestar
da €scola noturna municipal da Lapa em iunho de r882.
exames finais, o professor tenha se preocupado em prever que,
ao tê-los em tal ponto de adiantamento, conviria coloca-los em
uma classe que os preparasse mais imediatamente para a realiza-
(a n al f ab eto s e p ri ncí pi antes) ção dos exames escolares, exames que, como já tive oportunidade
de demonstrar em relação às escolas dÍurnas (ANJOS, 2o1í), eram,
dentre outras coisas, uma espécie de atestado da capacidade do
professor em exercer a contento seu ofício de ensinar e do Estado
em produzir e organizar a instrução pública primária. Muíto pro-
3'Classe
vavelmente, sabedor dessa importância, é que Líbero Braga - ele
(leitura corrente, escríto dítodd, gramátíca, análises e próprio, no passado, professor público primário (FRANÇA, zot4)
aritmétíca ou contabílidade em geral até proporções)
- se adiantara em formular uma tática para que, com os adultos,
esse tipo de situação fosse trabalhada de forma diferenciada, asse-
gurando-se de obter o êxito de seus pupilos trabalhadores quando
chegasse a hora do exame final.
ção, procurareí evidenciar as respostas às quais foi possível chegar Uma trama na História: a criança no processo de
ao Iongo desta investigação historiográfica. escolarização primária nas últimas décadas do período imperial
(Lapa, Província do Paraná, r866-tBB6) (Mestrado em Educação).
Quanto à organização, num primeiro momento, pode-se afir-
Programa de Pós'Craduação em Educação, Universidade Federal do
mar que a escola noturna da Lapa se organizava de modo seme-
Paraná. Curitiba, zott.
lhante às escolas diurnas, em que pese a diferença de público aten-
dido por ambas as modalidades de instrução. Todavia, algumas BLOCH, Marc. A apologia da História ou o Ofício do Historiador. Rio
de -Janeiro: Zahar, zo1t.
especificidades parecem permitir que se fale na existência de uma
cultura escolar noturna - isto é, um coniunto de normas e práticas CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano í: artes de fazer.
- própria da instrução noturna de adultos trabalhadores. Petrópolis: Vozes, t 999.
O elemento central dessa cultura, a julgar pelas evidências in- COSTA, Ana Luiza Jesus da. A luz das Lamparinas: As escolas
noturnas para trabalhadores no munÍcípio da Corte. ln: 3o" REUNIÃO
terrogadas, seria a relação que professor e alunos tiveram de esta-
NACIONAL DE PESqU ISADORES EM EDUCAÇÃ O, 2oo7, Anais...
belecer com o tempo escolar disponível para o ensino e aprendizado
Caxambu, MC.
dos conteúdos os quais essa modalidade de escolarização se pro-
punha a ensinar, a um público que dividia seu tempo entre os ban DEAP-PR. Mapa demonstrativo do estado da Escola Noturna
Municipal desta cidade desde o dia de sua abertura até hoje. Lapa, 04
cos escolares e as oficinas e campos, onde exerciam seus diferentes
de julho de tB8z. AP 660. tBBz, p. zt5, documento manuscríto.
ofícios e ocupações. Uma cultura escolar de modo algum menor orr
mais simplificada que a das escolas diurnas, mas, antes, perpassada Ofício da Câmara Municipal da Lapa ao Presidente da
pela complexídade da clientela e da realidade educacional de qucr Província Carlos Augusto de Carvalho. AP 656. t89z, p. t76,
documento manuscríto.
essa e, possivelmente, as demais escolas noturnas, se tornaram pal
co nas últimas décadas c1o período provincial paranaense. Ofício do professor Líbero Teixeira Braga ao presídente da
Província Dr. Carlos ALlgusto de Carvalho. Lapa, tT de agosto de tBBz.
AP 665. 1882, p. ), documento manuscrito.
FARIA FILHO, Luciano Mendes de. O processo de escolarização em Documentação Educacional Paranaense no período de 1854 a 1889.
Minas Cerais: questões teórico-metodológicas e perspectivas de Brasília: INEP, 2oo4.
análise. ln: VEIGA, Cynthia 6reive; FONSECA, Thaís Nívea (orgs.).
Regulamento da lnstrução Pública Primária - r de setembro
Historia e historiografia da educação no Brasil. Belo Horizonte:
del874. ln: MIGUEL, Maria Elisabeth Blanck; MARTIN, Sônia Dorotéa.
Autêntica, 2oo8, p. 77 -98.
(orgs.) Coletânea da Documentação Educacional Paranaense no
BASTOS, Maria Helena Câmara (orgs.)A escola elementar no período de t854 a í889. Brasília: INEP, 2004.
século XIX: o método monitorial/ mútuo. Passo Fundo: EDUPF, í999.
Regulamento de 8 de abril de 1857 - De ordem geral para as
FRANçA, Franciele Ferreira. A arte de ensinar: meandros do ofício escolas. ln: MIGUEL, Maria Elisabeth Blanck; MARTIN, Sônia Dorotéa.
de mestre de primeiras letras na Província do Paraná (t857-1884) (orgs.) Coletânea da Documentação Educacional Paranaense no
(Mestrado em Educação). Programa de Pós-Craduação em Educação, período de t854 a t889. Brasília: INEP, 2oo4.
Universidade Federal do Paraná. Curitiba, zot4.
Regulamento Orgânico da lnstrução Pública. De t6 de julho
SOUZA, Gizele de. Modos de fazer, modos de ensinar: os de t876. ln: MIGUEL, Maria Elisabeth Blanck; MARTIN, Sônia Dorotéa.
métodos de ensino na História da Educação públíca paranaense na (orgs.) Coletânea da Documentação Educacional Paranaense no
segunda metade do século XlX. Linguagem, Educação e Sociedade. período de t854 a 1889. Brasília: INEP, 2oo4.
Teresina, n.17r2o1j.
PERES, Eliane Teresinha. Tempto de Luz: os cursos noturnos
CINZBURG, Carlo. Os pombos abriram os olhos: Conspiração Popular masculinos de instrução primária da Biblioteca Pública Pelotense
na ltália do século XVll. ln: A micro-história e outros ensaios. Rio de (r87 5-t 9t), Pelotas: Seiva Publícações, z ooz.
Janeiro: DIFEL, 1991, pp.131-142.
SILVA, Noemi Santos da. O "Batismo da lnstrução": proietos e práticas
JULIA, Dominique. A cultura escolar como obieto histórico. Revista de instrução formal de escravos, libertos e ingênuos no Paraná
Brasileira de Históría da Educação. Campinas, n.1,p.9-44,jan-jun zoot. Provincial. (Mestrado em Hístória). Programa de Pós-Graduação em
História, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, zot4.
LE ROY LADURIE, E. O Carnaval de Romans. São Paulo: Companhia
das Letras, 2ooz. SOUSA, lone Celeste Jesus de. Escolas ao Povo: Experiências de
Escolarização de Pobres na Bahia - t87o a r89o. (Doutorado em
LESAGE, Pierre. A pedagogia nas escolas mútuas no século XlX. ln:
História). Programa de Estudos Pós-Graduados em História, Pontifícia
FARIA FILHO, Luciano Mendes de; BASTOS, Maria Helena Câmara
Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, zoo6.
(orgs.)A escola elementar no século Xlrc o método monitorial/
mútuo. Passo Fundo: EDUPF, 1999, p.5-15.
LIVRO DE FREqUÊNCIA da Escola Noturna Municipal r88z-:892. Caixa
't6, códice manuscríto.