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LITERATURA E ENSINO:
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REFLEXÕES E PROPOSTAS

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ú J ,Lrr. 9ônero lonéìi.à r i!.! !re.L.{ qó..r. lc
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Lucrécio Araújo de Sá Júnior


Andrey Pereira de Oliveira
Organizadores

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UNIVERSIDADE FEDERAT DO RIO GRANDE DO NORTE

REITORA REVISORA
Angela Maria paiva Cruz Nara Juscely Minervino de
carvalho Marcelino
vrcE_RErroRA
Maria de Fátima Freire Melo Ximenes CAPA
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Quatro z Dois
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Alva Medeiros da costa
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Humberto Hermenegildo de Araújo
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Willian Eufrásio Nunes pereira

Divìsáo de Servìços Técnicos


Caralogação da publìcação na Fonre UFRN/BibLioreca Cenrral ZiLa Mamede

Lireraturae eosjno: reflexóes e proposrâs / Lucrécio Araúio de Sá Íúnjor; Andrey pereira <ie
Olivcira rOrg:nizadores) Nrrl. RN : f DUFR\, 20t+
(CoJeçáo Ciências da Linguagem ApLicadas ao Ensj no;
v 7)
315 p

ISBN 978-85,425-0033 2

I Lireratura-Estudoeensìno 2 Linguagens Ensioo I Sá,Júnior,LucrécioAraújode


II Oliveìra, Ândrey Pereira de III Titulo IV Sérje

RN/UF/BCZM 2OI4IIO CDD 809


CDU 82:37

Todos os direiros desta ediçáo reservados à EDUFRN UFRN


- Editora da
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LagoaNoval 59 078 9701 NaraL/RN BrasiL
e'maiL: edufrn@edirora ufrn br I www.edirora ufrn br
Telefone: 84 32]5 3236 lFa* 84 32tS 3206
A ABORDAGEM DO POEMA NO
ENsrNo nnÉoto: ALG u MAs ALTERNATIvAs

José Helder Pinheiro Alves


Universidade Federol Campina Grande
Literatura e ensino: reflexões e propostas r

espontânea, fere
[...] a leitura de poemas desestabiliza a leitura
a ordem lógico-referencial de nossos hábitos de compreensão e
o mundo e torna visível o
A eliPse, a concentração,
de todos os níveis do tex
requerem um esforço interpretativo maior do que o habitual em
ouiras leituras. Aprender a ler um poema é aprender a construir
sua coerência, apoiando-se sucessivamente nas "zonas legíveis"
para o leitor que busca o sentido através de entradas sucessivas
(COLOMER , 2001, P. 177)'

r NTRODUçAO
A reflexão sobre questões metodológicas relativas ao ensino de
literatura, no meio acadêmico de Letras, tende, ainda, a ser considerada
coisa menor, assunto para pedagogo. A concepção que perdura é a de
que o professor de literatura ou o crítico literário não deve se pleo-
cupar com este tipo de questão, ]uma vez que está investido por uma
função mais sublime: vivenciar a grande literatura e comunicar a seus
alunos as suas descobertas, as suas reflexões e pesquisas' Chega-se,
inclusive, a denominar de pedagorreia qualqrter tentativa de refletir
sobre questões relativas à formação do leitor literário. Esta visão pre-
conceituosa vem lentamente mudando. Certamente, ela está ligada à
tradição bacharelesca que esteve na origem de nossos cursos de Letras,
entre outras razões.
Sabemos hoje bem antes que Todorov nos trouxesse o seu
belíssimo A literatura em perigo - que o estudante de Letras precisa de
uma formação metodológica mínima que o habilite arealizar um traba-
lho sério de formação do leitor no ensino básico. Para tanto, não é sufi-
ciente o conhecimento de teorias literárias, de leituras críticas. Digo
não é suficiente - o que não quer dizer que estas leituras não sejam
necessáriasl. Aliar um conhecimento metodológico a um conhecimento

I f)iscuto uma possib'ilìdade de articulação entre teoria literária, crítica literárìa e ensino
'frata-sc de uma perspectiva que palte do texto para chegar a uma
om Pirrhciro (200(r).

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. Coleção Ciências da Linguagem Aplicacl,rr ,rr I t lrìí, Literatura e ensino: reflexões e propostas r

crítico tlrrs olrlrrs i'o rrrt'llrot t;rrrrlrlro l)iìnì lìrrmação dos jovcns prolLs ' .nì livro didático. outro aspecto e a atenção dada à fala do
r'claÇão ao
sttrcs tle lilcr:rlrrr;r lrrl;r :.t' tlr' rrrrrir cl iscussão em andamento, mas.jli .rlrrr. através das entrevistas -, o que revela suas concepções, seus
corìì urÌriì Ir:rtlir,rro ,rle'csses, aspectos sempre esquecidos quando se pensa a abordagem
Ncslc iu ligo, rliscutiremos mais especificamente uma possi- rlrr tcxto literário na escola. o livro traztambémlongas entrevistas
com
bilirlirrlc tlç trabalho com o poema no nível médio. Trata-se de unrir r r rportantes professores, poetas
r
e críticos literários como Alfredo Bosi,
cscolha nascida de uma constatação, como se verá mais abaixo. Nossir l)ccio Pignatari, Haroldo de campos, Nelly Novaes coelho, dentre
abordagem terá três momentos: primeiro discutimos rapidamentc ,utros. Importa salientar que a pesquisa aborda a literatura no primeiro
algumas pesquisas e reflexões sobre o ensino da literatura a partir dit t' .t) segundo gÍaus (terminologias da época, que correspondem, atual_
década de 80 do século passado; a seguir elencaremos alguns problc- rrrcnte, aos ensinos fundamental últimas séries e médio). Não
- - há, na
mas bem antigos - relativos ao ensino desta disciplina e, por último, lrcsquisa, uma referência mais específica ao ensino da poesia. Fala-se
trazemos uma sugestão de abordagem em sala de aula de poemas dc tlc Literatura de modo geral e percebe-se que muitos entrevistados res-
duas poetisas contemporâneas. prndem referindo-se especificamente à leitura de obras de ficção.
O viés escolhido para a abordagem dos poemas é o que tenta Trabalho da maior importância, publicado em 19g3, é o de
aliar conhecimento crítico dos textos a procedimentos metodológicos l.ígia chiappini M. Leite, intitulado A invasão da catedral: literatura
que privilegiam o diálogo do leitor com o texto e não a mera reprodu- c cnsino em debate. A pesquisadora toma como corpus de sua pes-
ção e ìmposição, por parte do professor, de sua leitura. Essa perspectiva rluisa o ensino da literatura no Brasil e na França e justifica seu intento:
foge, portanto, da tradicional aula expositiva e investe no estímulo à "lmpunha a comparação, para saber se os problemas que
enfrentáva-
fala do aluno, e, conseçluentemente, à exposição de suas percepções. rìros na docência e na pesquisa deste ramo das chamadas Humanidades
Trata-se de um trabalho mais difícil, que exige, inicialmente, paciência cra coisa de país subdesenvolvido sob ditadura ou era fenômeno mais
por parte do professor. No entanto, os resultados, quase sempre, são geral da escola capitalista,, (LEITE, 19g3, p. l7). O livro traz,também,
mais expressivos do que se imagina ou espera. Dando suporte a este cnsaios ainda de grande atualidade, como uma reflexão dura sobre a
procedimento está a ideia de uma pedagogia da pergunta, formulada dependência do manual ("Do manual; pelo manual; contra o manual") e
por Paulo Freire há algum tempo. a abertura para se pensar uma "pedagogia da Ad-miração". parte deste
livro é retomada e ampliada numa publicação denominad,a Reinvenção
da catedralt Língua, Literatura, comunicação, novas tecnologias, polí-
1. ENSINO DA LITERATURA: ALGUMAS REFLEXõES tícas de ensino. o pensamento de Língua chiappini articula de modo
denso as questões de ensino às de política de educação vigentes no país.
O ensino da literatura no nível medio, no Brasil, vem sendo Por outro lado, não há propriamente uma metodologia voltada para o
objeto de pesquisa há bem pouco tempo. O primeiro estudo mais abran-
trabalho com a poesia.
gente sobre esta questão, de Maria Thereza Fraga Rocco, foi publicado
Mais recentemente, José Luis Jobim e\\9)publicou um ensaio
em 1981. Trata-se de uma dissertação de mestrado defendida em 19J5,
sobrel líteratura no ensino médio; um modo dever e usar.para o autor.
na Universidade de São Paulo, intitulada Literatura/ensino: uma pro-
blemática. O trabalho de Rocco investiga professores e alunos de esco- a introdução do texto literário em classe deve sempre tcr crìì
las públicas e particulares de São Paulo. Algumas questões observadas conta o universo dos seus receptores, estabelecendo, sc lìlr o
caso, uma "gradação textual" paratrazer ao público cslrrrltrrr(iI
ainda têm bastante atualidade, como a então dependência do professor

formulação teórica mínima;jamais iniciar, nesta fase do ensino, diretamente com a teo-
ria para aplicá-la

140 4
Enslno Literatura e ensino: reflexões e propostas r
' Coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao

d"p9T: paula- mediador entre o aluno e o conhecimento, e não de mero transmissor de


primeiramente o que for mais fácil para ele' para
tinamente, chegaiao mars difícil (JOBIM' 2009'p' 116)2' conhecimentos; aprendizagem não é um ato solitário, mas de interação
com o outro; [...] o diálogo deve ser permanente, permeando o trabalho
Aseguir,Jobimdiscutearelatividadeentrefáciledifícil,a escolar" (TAVARES ,2007, p. 186) Diferentemente dos trabalhos ante-
de O cortiço' de
partir da comparação entre dificuldades de recepção riores, a pesquisa de Diva Tavares vai a campo realizar experimentos
Oswald de Andrade' A
Aluísio Azevedo, e Sercfim Ponte Grande' de paÍa, a partir deles, propor alternativas. Esta perspectiva vem sendo
discussão proposta pelo pesquisador, por
outro lado' volta-se para a
realizada por pesquisadores em diferentes pontos do país, afinal, não é
narrativa, deixando de lado a poesia' mais possível ficar apenas apontando os problemas sem buscar alterna-
Voltadas especificamente para o trabalho com
o poema no
tivas e, muito menos, esperar uma solução da cabeça de um iluminadoa.
ensino médio, temos a tese de doutorado de
Diva Sueli Silva Tavares'
Se, por um lado, o trabalho com o poema no nível médio ainda
defendidanaUFRNemlgT.T.Centradanumexperimentorealizado está a reclamar pesquisas mais experimentais, que revelem as virtua-
pública' a pesquisa mostra
com alunos do ensino médio de uma escola lidades do trabalho com este gênero, por outro, a literatura infantil foi
que privilegie a aproxtma-
que, quando se investe numa metodologia o setor da literatura que mais recebeu atenção dos pesquisadores que
do leitor e se efetiva uma postura mars
ção do texto com a realidade vêm pensando a problemâtica do ensino. Consequentemente, temos um
leitores -' é possível esti-
dialógica - quer com os textos, quer com os número significativo de livros, de ensaios sobre o trabalho com a nar-
mularojovemparaumaexperiênciadeleiturasignificativa.ostex- rativa infantil e um pouco menos com a poesia na sala de aula5.
ao cânone que perdura
tos escolhidos, por outro lado, não se prendem A questão do ensino da poesia começa a ficar mais esquecida
experiências de lei-
nos livros didáticos, abrindo espaço para outras quando se chega à segunda e terceira fases do ensino fundamental.
para a pesquisadora
tura - como defendem as OCEM3-2006' Está claro Basicamente, o guia dos professores nesta etapa do ensino é o livro
que o problema do ensino da literatura não está
ligado apenas à sele-
didático que, praticamente, não tem avançado numa proposta que, no
Para ela o professor deve desempenhar "o
papel de
çao A" mínimo, incorpore algumas contribuições trazidas pelos documen-
"onteúdos.
2 Esta perspectiva comparece em outÍos pesqulsa(lores Alfredo Bosi em entÍevista a tos parametrizadores Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN),
obras para a escola básica' faz pondera-
Rocco (1981), ioAuguOo .ot"" as escolhas dai Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM) e documentos
de linguagem
ções importantes e bastante
atuais Primeiro sugere "Começar por textos estaduais. Este veículo vem sofrendo várias críticas sobre o modo como
afirma: "Quanto ao tipo de aborda-
acessível que é afinal õ; ;; tem feito." A segt'ìr,
q"t bem o ensino da literatura no secundário trabalha o poema, mas pouquíssimas mudanças são observadas quando
gem crítica u .", ,.guiaá,-iÀot separar
e o ensino da literatura na UniversidadË
A"ho que a abordagem no secundário deverá se trata da abordagem do gênero lírico.
nais flexívei e aberta' E preciso verificar se
o
que na Universidade' a gentc
entes. Ao passo
quais não estão motivados diretamente" (p'
famosa Antologia Nacional' de Carlos Lacrt
seculo XIX. o critério de iniciar o ensino dc Dentre as pesquisas mais recentes a que tivemos acesso, voltadas para o trabalho com a
st os poesia ou/e sua interseção com outros gêneros, apontamos: Farias (2010), Martins (2010)
c sjá
', tlO c Silva (2009).
' con
No âmbito da literatura infantil, os livros de Resende (1993), Aguiar Q007),Paiva et al
1re".,L xvtrt e parte do *r"r,
,.Fase "n,,tl,.l
mesma epoca a"poti. para (2004), Souza Q004) eÍc. são alguns dos livros que apontam para um trabalho significa-
" x\iõ; "J"ïu-,i1,, o critério dos organizadores é explici-
.lFu."In"di"uul".
seiscentista,,Gé""Ì" tivo conr os diferentes gêneros da literatura infantil em sala de aula. Numa perspectiva
tado no pr rtado ju pela fasc contcttt
rnlis geral, que tanto pode ser útil para o ensino médio quanto para o fundamental,
língua' aminho natttritl tltr
porâneae efalava"(l'Alil(l'
tlcstacamos a contribuição de Aguiar & Bordini (1988), com destaque para o método
estudioso, radepoi rt,teltt:ional Dantas (1982) escreveu urna didática da literatura que, em linhas gerais,
&BARRETO,1960,P 7) nrìo viii muito além do que está posto nos livros didáticos, com a exceção de que traz a
possibilidadc de se trabalhar a literatura de cordel.
r Orìentações Curriculares para o Ensino Médio

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142
Litcratura e ensino: reflexões c propostas '
r coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao Enstno

3. Ana Cristina César: comparece em quatro livros, em três tam-


oslivrosdidáticos(LDs)doensinomédiocontinuamaigno-
bém é apenas ciÍada;
rar orientações importantes para o trabalho com a literatura' como as
4. Hilda Hilst: está presente apenas em um livro,
que aparecem nas OCEM, desde 2006' Embora praticamente todos
eles

citem o documento no Manual do Professor, de fato os conteúdos e 5. Henriqueta Lisboa e Gilka Machado não compaÍecem em
as metodologias permanecem os mesmos' Inclusive os
mesmos textos' nenhum deles.
Dentre os livros didáticos mais vendidos, alguns
já estão no mercado
Paralelamente a essa quase ausência da voz lirica feminina,
há mais de 20 anos e praticamente não há, por exemplo' acréscimo constatamos a presença de cerca de vinte poetas (homens), alguns
significativo de textos literários' embora muitos jâ tragam indicações com um enfoque que pode ser considerado razoavel. A disparidade,
o poema de
de livros, de filmes, de sites, etc. Eles limitam-se a abordar portanto, é gritante e permanece não só nos livros didáticos; ela está
uma perspectiva meramente histórica, lançando mão de fragmentos de
presente, também, em dezenas de antologias da poesia moderna e
que iiustram de modo mais claro as características dos estilos de época'
contemporânea.
Puru a situação, a proposta do ENEM, no que se refere à
"o-plicar Esta ausência, ao que nos parece, deixa cada vez mais frágil
abordagem da poesia, pouco favorece como incentivo à leitura - quel a formação de nossos estudantes, no sentido de que o acesso a uma
de livros de poetas em sua totalidade, quer de antologias'6
experiência humana peculiar, que é a da mulher, sobre a qual os alunos
poderiam discutir, se projetar ou mesmo rejeitar, fica fora de nosso já
2. IDENTIFICANDO NOVOS PROBLEMAS frágil ensino de literatura. Este sequestro davoz lírica feminina pode,
sub-repticiamente, significar que as musas da lírica estariam mais pro-
Mas as questões não são apenas estas a apontar' Inúmeras pensas ao homem...

outras nem sequer são percebidas pelos professores e pelos pesquisa- Outra questão - que não será possível enfrentar agora, mas
bastante que é importante apontar ê a ausência da literatura popular nos livros
dores em geral. Destacaremos três questões que nos parecem
problemáticas com relação ao trabalho com o poema' didáticos - ou o uso um tanto equivocado da literatura de cordel. os
Analisando um corpus de cinco livros didáticos - três volumes problemas aqui são os mais diversos: primeiro, relativo à origem do
do terceiro ano do Ensino Médio, série em que se estuda nossa
litera- nome cordel, uma vez que todos afirmam que a denominação é advinda
tlra apartir do Modernismo, e dois volumes únicos, que contemplam do fato de os vendedores colocarem os folhetos pendurados em bastan-

toda a literatura brasileira -, observei que há uma lacuna significativa tes/cordéis. Ora, vários pesquisadores já mostraram que, pelo menos no
com relação à produção de poesia escrita por mulheres' Lembremos Brasil, o que predominou durante mais de cinquenta anos foi o vende-
que se trata de um lastro que recobre nada menos do que oitenta anos dor ambulante e não o ponto fixo de venda. Mas o mais grave é o des-

-da décadade 20 do século passado à primeira decada do século XXl. conhecimento mesmo desta literatura. Os autores de LDs parecem não
observcmos alguns dados relativos à presença da lírica produzida
por ter leitura dos folhetos, não conheceÍ suas especifìcidades, a riqueza de
mulheres: temas e questões abordados nestas obras ao longo do século XX.
l. cecíliaMeireles: comparece em todos os livros observados, A última questão, e talveza mais complexa, diz respeito à meto-
sempre com um poema; dologia de ensino de literatura. Pouquíssimas obras didáticas ostentam
uma abordagem que parta inicialmente da leitura dos poemas para,
2.Adé|iaPrado:compaÍeceem4livros,masemtrêsdeleséapc_
depois, chegar a questões mais amplas de estilo de época, de traços de
nas citada;
autores e de temáticas predominantes, de aspectos históricos e ideoló-
. sour"-, li-ites da abordagem dos textos literários nos livros didáticos, disctttimos gicos presente nos textos. Junte-se a isto a tradição, ainda implacável,
algumas qucstõcs em Pinheiro (2006)

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144
r Coleção Ciências da Linguagem'Aplícadas ao Ensino
Literatura e ensino: reflexões e propostas r

da expositiva, que ceifa do aluno/ouvinte a possibilidade de ler e


auila Diante desta problemâtica, que propostas poderemos fazer?
debater, de partilhar com os demais leitores seus pontos de vistas, suas Que alternativas para um trabalho com a poesia podemos apresentar,
descobertas e, também, de ver questionadas inferências que possam tendo em vista a formação de leitores? Primeiramente, é preciso deixar
fugir do texto lido. Um aspecto fundamental no trabalho com o poema, claro que o caminho que o livro didático vem percorrendo há mais
que é a realização oral, também fica fora da abordagem da maioria dos de cinquenta anos não tem contribuído, como se esperava, para a for-
livros didáticos7. A leitura oral, repetidas vezes, pode se constituir num mação de leitores de poesia. Possivelmente, um dos problemas são os
importante instrumento de aproximação do jovem leitor da poesia' poemas oferecidos no primeiro ano do ensino médio. Certamente, se
Outras questões poderiam ainda ser apontadas, como o pro- selecionarmos alguns sonetos de Camões, teremos grande chance de
blema das bibliotecas públicas no país, sobretudo nos municípios despertar no leitor o interesse pela poesia. Mas nem só de Camões vive
menores, e a ausência da biblioteca escolar ou das salas de leitura. nossa poesia. A poesia medieval, a poesia Barroca - exceto uma certa

Embora tenhamos contado nos últimos anos com programas que levam vertente satírica de Gregório de Matos Guerra não tem conseguido
livros às escolas, como a coleção Literatura em minha casa e, mais chamar a atenção de parte significativa dos jovens. E nem estamos,
recentemente, as constantes aquisições do PNBE (Plano Nacional de ainda, discutindo o método como esses textos são abordados.
Biblioteca E,scolar), não há nas escolas públicas brasileiras do ensino Um caminho que comparece nos Reíerenciais Curriculares
básico, bibliotecários, formação adequada do professor, egresso do
para o Ensino Médio do estado daParaiba sugere que no primeiro e no
curso de Letras, para fomentar o trabalho com a leitura. Ou seja, não segundo ano deveria ser realizado, a partir do estudo dos gêneros lite-
temos, de fato, mediadores de leitura em nossa tradição escolar, e essa rários, não das teorias dos gêneros - de uma conceituação estanque -,
lacuna pode ter sérias consequências no, sempÍe falado, baixo nível de mais leituras de obras. Nesse sentido, pode-se trabalhar, por exemplo,
leitura dos brasileiros8. um bimestre inteiro com a poesia. E é aí o documento traz várias pro-
Toda essa problemática, ao invés de nos desanimar, nos esti- postas, tais como: 1) organização de antologias temáticas envolvendo
poemas de diferentes épocas; ii) antologias organizadas por autores/
mula a pesquisar alternativas , a realizar experimentos que possam sel-
vir de base para políticas de leitura na e para a escola, e, dessa forma, as Drummond, Vinícius, Adélia Prado, Alice Ruiz etc; iii) antologias
contribuir com professores interessados em mudar sua prática e for- por gênero - poetas, poetisas; iv) antologias de cordel; v) antologias
mar adequadamente os estudantes de Letras que irão atuar no ensino com canções etc. Também pode-se trabalhar com antologias por for-
mas da lírica: sonetos, odes, hai kai, epigramas etc. Tais sugestões, con-
básico. É nesse sentido que estamos tentando formular/propor alternati-
vas para o ensino da literatura e, mais especificamente, para o trabalho
tudo, esbarram na metodologia: "como trabalhar?"; "Que abordagens
realizar?".
com o poema.
O trabalho com antologias tem inúmeras vantagens sobre o
LD. A primeira diz respeito ao número de poemas que pode ser bem
3. FORMULANDO UMA PROPOSTA maior. Os livros didáticos avaliados pelo MEC como bons trazem,
no máximo, três ou quatro poemas por autor, digo, dos considerados
grandes poetas. Outra peculiaridade da antologia: pode-se trabalhar
Discutimos um pouco esta questão no artigo denominado "caminhos da abordagem do
poema em sala de aula, In; Graphos: Revista de Pós-Graduação em Letras UFPB. Vol com poemas menos frequentes nos LDs que apresentem outras faces
10, n" 1,2008 do autor. E, por último, pode-se selecionar os poemas atendendo ao
Para quem possa ter dúvida sobre a importância do mediador ou do professor-mediador' horizonte de expectativas dos alunos, visando não só atendê-lo, como
veja-se a importante pesquisa de Michèle Petit (2008). Destaco, sobretudo, o quarto arnpliá-lo.
capítulo .,o papel do mediador" - como importante contribuição para se pensar otl
repronsar a metodologia de ensino de literatuara.

t47
146
. Coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao Ensino
Literatura e ensÌno: reflexões e propostas r

Embora pouco privilegiadas na atualidade, as antologias têm


[...] a tentativa de apenas "reproduzir" o que o outro estabelece,
uma história e uma contribuição importante para o trabalho com a lite- além de equivocada em termos teóricos, não desenvolve o sen_
Íafi)ra. No âmbito específico da poesia brasileira, temos várias anto- so crítico de ninguém, e prejudica também a formação de um
logias de grande mérito. Destaque para as organizadas por Manuel discurso próprio do aluno, que entendemos dever ser formado a
Bandeira, sobre a poesia romântica e parnasiana; por Sérgio Buarque partir do confronto com, da avaliação de, da analogia com, da
crítica de outros discursos (JOBIM, 2009 p. l2l).
de Holanda, sobre a poesia colonial; por Andrade Muricy, sobre a poe-
sia simbolista; além das de Péricles da Silva Ramos, sobre a poesia Pode-se, também, sugerir uma espécie de líteratura compa_
Moderna. Anterior a todas estas, não podemos esquecer a importân- rada, visando estimular o jovem leitor a discutir sobre o modo çomo
cia que teve a Antologia nacional, organizada por Carlos de Laet e determinado tema é abordado por um poeta, por uma poetisa ou por
Fausto Barreto, cuja primeira edição é de 1895 e que continuou sendo poetas de diferentes momentos históricos. Ou seja, pode-se lançar mão
publicada até a década de 60 do seculo XX. Embora não fosse uma de uma antologia composta tanto de poemas que tratam do mesmo
antologia apenas de poemas, aparte que contemplava a poesia pode ser tema - em épocas diferentes ou de uma mesma época quanto do tra-
-
considerada bastante consistente dentro dos critérios da época em que balho comparativo entre a poesia e outras artes. A título de exemplo, o
foi concebida. As antologias favorecem uma abordagem mais vertical diálogo da poesia com a dança, com as artes plásticas e, especialmente,
de um autor ou de um tema e pode estimular o jovem leitor a buscar as com a MPB poderá ser de grande valiae.
obras dos poetas e poetisas estudados. É mais provável que a partir de Tendo em vista a quase ausência da voz lírica feminina em
uma boa antologia o leitor saia em busca de obras pontuais de determi- livros didáticos e antologias poéticas que circulam no mercado edito-
nados poetas. E é isto o que se e espera. rial, faremos uma proposta de trabalho com a poesia no ensino médio
Pesquisas realizadas em várias universidades brasileiras têm apartir da obra de duas poetisas contemporâneas. A abordagem, como
mostrado que a abordagem colaborativa parece ser a mais adequada, se verá, não se fecha na obra das autoras; antes, busca diálogos com a
quando se pensa em formação de leitores. Nesse sentido, as reflexões tradição lírica brasileira. Trata-se de um caminho possível, que visa,
de Teresa Colomer Q007) são de grande importância. minimamente, suprir uma ausência grave. Espera-se que essa sugestão,
Para a pesquisadora espanhola, a leitura compartilhada traz mais do que modelo, sirva de estímulo ao professor pararealizar expe-
vantagens das mais diversas, como riências diferenciadas, a partir de sua vivência com a poesia.

Compartilhar as obras com outras pessoas é importante por_


que torna possível beneficiar-se da competência dos outros para
4. TRABATHANDO COM A LíRICA FEMININA
construir o sentido e obter o prazeÍ de entender mais e melhor
os livros. Também porque permite experimentar a literatura em
sua dimensão socializadora, fazendo com que a pessoa se sinta A
proposta que apresentaremos agora tem três objetivos: 1)
parte de uma comunidade de leitores com referências e cumpli_ oferecer um conjunto de poemas de autoria feminina, tendo em vista
cidades mútuas (COLOMER, 2007, p. l43). a quase ausência da poesia de mulheres nos LDs; 2) sugerir possibili-
dades de abordagem, tendo em vista sempre a leitura compartirhada
Esta perspectiva, por outro lado, foge da aula expositiva, da
leitura do professor e do livro didático como verdades acabadas a que o
e Sobre as possibilidades de trabalho entre poesia e canção, há várias pesquisas. Dcstaco
aluno-leitor tem que se submeter. Referindo-se à questão da interpreta-
a tesede verônica de Fátima Gomes de Moura (2009) que estuda as possibili<.latlos tlr:
ção de uma autoridade, Jobim Q009) afirma que abordagem das letras de canção, no ensino médio, de uma perspectiva quo apruxirrrir
estamodalidadeartísticadapoesia.Veja-setambémotrabalhodeJulianaAnrarll J)irrlg
(2000), que traz sugestões de abordagem da canção na sala dc aula a partir.tlo sous clc
mentos poéticos.

148
I4.)
F r coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao Ensino Literatura e ensino: reflexões e propostas r

(coLoMER,2007);3) mostrar que é possível lançar mão de elementos AS PALAVRAS


teóricos num tmbalho que visa a aproximação do leitor com o textos A palavra
e não a simples assimilação de conceitos e procedimentos analíticos. essa rédia
A primeira observação a ser feita é que o professor não ini- me governa.
cie apresentando a autora escolhida para ser estudada como suas A palavra
características, obras, traços de seu estilo, curiosidades da vida, etc essa lâmina
-, tendência ainda muito forte, velha herança da crítica biográfica e, me reparte.
ao mesmo tempo, talvez, uma forma de o professor mostrar que sabe, Ai de mim
que conhece. Portanto, que comece lendo e discutindo os poemas. Se o que sou tantas
jovem leitorla se sentir estimulado, a busca pelas informações sobre os e tão sem arte
autores serârealizada com a maior naturalidade' é a que em chão de silabas
Imaginemos que fôssemos levar para sala de aula poemas da se prosterna.
poetisa paraibana, radicada em Recife, Lenilde Freitasro. começaríamos Ai de mim
com os poemas que seguem: que sou tantas
l a procurar-te
CONFIDÊNCIAS palavra
que não és
Hoje o dia nasceu pobre
e és eterna
e continua sem nada.
(p.e)
A fartura é lembrança vaga
que mais e mais se evapora MOMENTO
e o resto da noite encobre.
A poesia se aproxima
Jâretornaram aos seus reinos marca sua presença
as estrelas perfumadas
-hóspede de poucas horas - ou esteve sempre aqui
Padece o mundo em seu leito como sinal de nascença?
Não é fácil rir agora (p.e)
(Poema de Desvios)
Como se observa, os poemas são curtos, o que facilita uma
primeira leitura mais rápida. Mas é sempre aconselhável ler mais de
uma vez, diria mesmo, ler pelo menos umas três vezes e, se possível,
em voz alta. Esta repetição vai aproximando o leitor da poesia e favo-
Ì0 A poetisa Lenilde Freiras nasceu em campina Grande, mas vive em Recife há muitos
anos. É mestre em Teoria da Literatura pela UFPE, poeta e tradutora. Publicou 7)eçvio.ç recendo a percepção de certos aspectos que passam desapercebidos à
e Esboço de Eva (1981), Cercanias (1989), Espaço neutro (199I), Grãos na eira
(200I),
primeira leitura. É importante conscienti zar osjovens leitores de que
,4 c.asa encantada (2009). Em 2010 publicou A corça no campo, antologia com poe-
rilrrs rlc toda sua obra. Lenilde já ganhou alguns prêmios o Nesllê de Poesia e Prêmio
a leitura de poesia ïequer um tempo diferenciado, como todo trabalho
l,rr ritt.,rytlu,ambos em São Paulo. os poemas de LeniÌde citados neste artigo são do livro reflexivo. um ir e vir constante ou um desconfiar de si quando o texto
t tt tttt\ ntt li r a (2001), mas também podem ser encontrados em A corsa no campo'

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pareceu muito simples é também uma atitude a ser cultivada. A poesia aconselhável iniciar definindo metalinguagem. O leitor poderá che-
nem sempre se entrega à primeira vista, sobretudo se o leitor não tem gar ao conceito a partir de sua própria reflexão. Estimular uma refle-
uma experiência acumulada de leitura. Claro, não iniciar falando da xão sobre as diferentes denominações dirigidas às palavras "rédia" e
função poética ou, simplesmente, mostrando a diferença entre a lingua- "lâmina" - que sentido as palavras podem ter para nós? Quando uma
gem poética e a jornalística, por exemplo. Essa atitude tem como base a palavra é rédidÌ Quando é lâmina? A partir da reflexão sobre o sentido
predominância do conceito e não a vivência com o texto. Cas palavras na vida dos leitores, é possível aproximá-los de modo mais
Poderíamos começaÍ, portanto, pela leitura e discussão de significativo do poema. Outro aspecto relevante é instigar os alunos a
"Confidências". O título já anuncia a temática: revelação de algo pes- destacarem expressões do poema que fogem do modo comum de se falar.
soal, particular. No caso, um estado de espírito, poderíamos dizer, tm Por exemplo, ao lermos 'Ai de mim/ que sou tantas", que identidade é
tanto para baixo. Um procedimento adequado é partir de algumas pala- esta? Por que o eu lírico se diz tantas? Esta experiência é particular
vras: sugerir que observem, por exemplo, a palavra que dá título ao dela? Ou também nós poderemos ser tantos/as? Em que circunstâncias?
poema, além de outras, como "pobre", "sem nada", "lembrança vagd', Novamente, chamar a atenção para o fato de que a vivência posta no
"evapota", "encobre", tudo na primeira estrofe. São palavras e expres- poema, de algum modo, é - ou poderá também ser - nossa. O que pro-
sões que apontam para um campo semântico de desencanlo. A segunda cura esse eu lírico? Que significado tem "procurar palavras"? Por que
estrofe denuncia a passagem do tempo, que nem por isso trouxe novo as palavras são e não são eternas? Que sentido pode-se atribuir a esta
ânimo ao eu lírico: "as estrelas jâpartiram, e o mundo padece 'em seu antítese? Questionar os alunos para saber se conhecem outros poemas
leito"'. Alguns aspectos da linguagem devem ser destacados: o eu lírico que falam das palavras. Seria interessante aqui indicar o importante
denomina o "dia" como pobre, deslocando sua sensação, seu estado de poema de Carlos Drummond de Andrade, "O lutador", e numa aula
espírito para o dia, e a noite vai encobrir este dia que já parece conta- posterior, discuti-lo e compará-lo como o de Lenilde Freitas. Também
minado pelo sombrio. Na segunda estrofe, a denominação se volta para valeria à pena citar o poema de Cecília Meireles, do Romanceiro da
o mundo - que "padece em seu leito". Confirma-se no verso final o Inconfidêncic, o "Romance LIII ou do Carreiro", que inicia assim:
estado do eu lírico - "Não é fácil rir agort'. Mas não basta apenas dizer
o que estamos apontando. Antes, fazer pergtntas que levem a estas Ai, palavras,ai, palavras,
que estranha potência a vossa!
descobertas e, sobretudo, a outras que certamente serão feitas. Aqui a
atitude madura do professor consistiria em não ter a sua leitura como
Ai, palavras, ai, palavras,
sois do vento, ides no vento,
acabada e mais correta. De fato, ouvir o outro, interrogá-lo, contribuir
no vento que não retorna,
para que organize seu pensamento, fazê-lo sempre retornar ao texto
e em tão rápida existência,
contribui para que se torne mais preciso.
tudo se forma e transforma
Como fazer para que os leitores conversem/reflitam sobre
poema, articulem-no com sua vida, suas experiências? Certamente, Sois do vento, ides no vento,
após várias leituras, começa a despontar um processo de interação. E e quedais, com sorte nova!
importante fazer com que confrontem pontos de vista, retornem sem- Ai, palavras , ai, palavtas,
pre ao texto, reflitam sobre o objeto estético. que estranha potência a vossa!
Os dois poemas seguintes trazem uma reflexão sobre as pala- Todo o sentido da vida
vras e própria poesia. Mas esta informação não precisa ser dada.
a principia à vossa porta;
Ela deve ser inferida ao longo da leitura. Logo, também aqui não é o mel do amor cristaliza

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Literatura e ensino: reflexões e prop
r coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao Ensino

Passemos agora a alguns poemas de outra poetisa, esta bem


seu perfume em vossa rosa;
mais conhecida, sobretudo, porque enveredou também pelo vies da
sois o sonho, sois a aludacia,
canção. Observemos estes poemas da poetisa paranaense Alice RuizÌt:
calúnia, fúria, derrota'...
tl 6)
tem os que passam
(MEIRELES, 1994, 57 5157 e tudo se passa
com passos já passados
A possibilid ade da leitura comparativa é sempre estimulante'
"os poemas apre-
Nesse sentido, várias perguntas poderiam ser feitas: tem os que partem
atestam sua afir-
sentam alguma apro"ìmãçao? Qual? Que imagens da pedra ao vidro
importante o professor
mativa? tã que se diferenciam?"' Aqui, seria deixam tudo partido
situaropoemadeCecílianocontextodolivrodeCecíliaMeireles:o
a situa-
Romanceiro da Inconfidência, quie problematiza poeticamente etem, ainda bem,
çáo A" nossos inconfidentes'
No são os que deixam
No
algo potentes, capazes de matar, avaga impressão
.ritun o, mesmo ò l"ito, não saben
eita
de ter ficado
para todos nós' as
uma projeção de caráter mais pessoal, uma vez çlue' (p.24)
nos parali-
palavras trazem essa "potên cit' capaz de nos impulsionar'
.u., ,to, indignar' A leitura comparativa entre o poema de Lenilde e abz
por parte do aluno, no sorrlso
de cecília Meireles favorecerá uma consciência,
na poesia' mas também dos teus olhos
sobre o valor e o sentido das palavras - não só
na vida em geral. alto risco
Com relação ao tercerro poema' uma entrada seria discutir encaro
podem ser consl-
sobre a presença da poesia na vida' Que experiências
poesia pode sempre estar tudo que quero
deradas poéticas? Temos consciência de que a
Paru não é mais preciso
por perto, mesmo que não notemos, não tomemos consciênciiÌ
próprio profes- (p. 5s)
.udu t"ito., qual o sinal de nascença da poesia? Epara
o
sobre a poesia de Lenilde
sor? Pode se fechar este módulo apreciativo e agora Maria?
inacessível' fora
Freiras reforçando a ideia de que a poesia não é algo o amor acabou
de nosso alcance. Ao contrário' é algo que está
próximo e pode' com a filha casou
como que for-
muito proveito para nós, leitores, estar sempre próxima' o filho mudou
percepção das coisas'
talecendo e cultivando nossa sensibilidade, nossa teu homem foi pra vida
Todas as questões suscitadas poderiam tornar-se um
questto-
que tudo cria
nârioparaserrespondidoindividualemecanicamente'Noentanto'não a fantasia
a leitura partilhada,
nos parecer ser este o melhor caminho. Incentivar
o enfientamento com o texto, a descoberta de suas potencialidadcs r Alic , lìrrttttt llt tt'rt tlttt'r'ttlllvrt
parece-nos o percurso ()' \(tÌltilt Trrrlrrlrr/1 IUN l)'
semânticas, mesmo que muitos não se envolvam, oom
Itaì Jttbttli t'otlt rt llvttt l''rr'
metodologico mais adequado, quando se acredita e se está comprolnc- I lttiiiul )llllll' ttltthttt tl+'
V<'r's
tido com a formação de leitores' lrri kais. Os poomas citados ncstc artigo são do livro l)rtì's an rrrrr (200t()

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r Coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao Ensino Literatura e ensino: reflexões e propostas r

desta Maria?
que você sonhou Que condições sociais são estas que interferem no destino
apagou Também atentar para o modo como a poetisa ]ultlliza a expressão popu-
à luz do dia lar "Maria vai com as outras", para conferir-lhe um sentido mais grave.
e agora Maria? Trazer o poema de Drummond e estimular a análise comparativa é,
val com as outras mais uma vez, um procedimento que pode render uma significaliva
vai viver vivência com os dois poemas. Apontar as peculiaridades da vivência
com a hipocondria feminina postas no poema de Alice Ruiz e, retomar, se já tiver discu-
(p. 163) tido, o conceito de intertextualidade. Por certo, se o aluno não conhece
o poema de Drummond, compteenderá que os sentidos dos textos se
O s trê s po emas tematizam situaçõ e s humanamente p eculiare s, constroem aparïtr das mais complexas relações'
numa linguagem musical, em que estão presentes repetições, rimas, poemas?
Quantas aulas levaríamos para trabalharmos estes
versos curtos. Ao mesmo tempo, expõem a compreensão da diversi- Para responder a esta pergunta, é preciso atentar para uma questão
dade de experiências, dos desejos, e do curioso diálogo com Drummond metodologica central: cada turma tem seu ritmo, sua experiência espe-
a partir de uma perspectiva bem pessoal da experiência feminina.
cífica de leitura. Se se tratar de uma turma que tenha uma experiência
Iniciar o diálogo apartir de um dado da linguagem, com alunos de partilhamento de leitura, talvez possamos fazer em pouco tempo:
do nível médio, pode ser bastante proveitoso. por exemplo, no primeiro duas aulas, por exemplo. Por outro lado, se se está iniciando a vivência
poema, chamar a atenção - às vezes, nem precisamos fazê-lo para a com o poema, talvez seja necessário um tanto de paciência, uma vez
sonoridade e a possível aproximação entre som e sentido.Isto parece que os alunos tendem a ficar calados, a não arriscar seus palpites ou,
ficar mais patente na segunda estrofe. Pedir que leiam várias vezes e melhor dizendo, a expor suas hipóteses de leitura. Quando se pensa
em voz alta, para perceberem que a aliteração do lpl pode sugerir a em formar leitores, a preocupação não deve ser apenas quantitativa -
ideia de quebra, de algo que se esfacelou. Se nenhum aluno levantar dar a conhecer o maior número de autores, cumprir um planejamento,
esta hipótese, levantá-la e colocá-la em discussão. comparar a sonori- um cronograma, como se faz constantemente. Se lermos os poemas de
dade das duas estrofes, observando que o mesmo lpl asstmeum caráter forma mais detida - qualquer que seja o poeta ou poetisa -, tetemos
diferente. observar também o tempo verbal nas estrofes - o que poderá mais chances de fixar imagens, de guardar na memória alguns versos,
ajudar a compreender as diferenças. A terceira estrofe revela um cará- de estabelecer pontes com nossas vivências e, até, de estabelecermos
ter mais suave algo não se partiu tão fortemente, e mesmo tendo ido, comparações entre autores. Portanto, parece-nos que quando o objetivo
deixou um pouco de si. o que estas três estrofes dizem dos nossos de nosso trabalho é a formação de leitores, demorar-se um pouco mars
relacionamentos afetivos? Mais rtma yez, a ponte com a vida se faz sobre os poemas poderá ter um resultado mais significativo'
necessária neste trabalho de formação de leitores. Saber que a poesia
fala da vida nossa de cada dia pode ser uma portaparairmos formancJo
leitores mais atentos. s. REFLEXõeS rlruRls
Chegamos ao terceiro poema. Novamente indagar se o pocma
lembra outro poema. Se não, conversar inicialmente sobre o texto crc Trazer a voz feminina configurada na poesia, alem de sanar
Alice. O que ele aponta relativo à condição feminina? eue aspectos tla ou, no mínimo, corrigir - uma deficiência de nossos livros didáticos
experiência da mulher podem ser discutidas a partir do conhecimcnto o antologias, antigas e contemporâneas, também favorece aos jovens
o accsso a vivências que dificilmente a voz masculina saberia figurar
dos próprios alunos? chamar a atenção, se não observaram, parir o torn
crrbora ha-ja algumas exceções. o apagamento da lírica feminina do
trágico de que se revestem os quatro versos finais da primcira cstrolc.

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r Coleção Ciências da Linguagem Aplicadas ao Ensino Literatura e ensino: reflexões e propostas r

livro didático pode ser driblado pelo profissional comprometido com a CIORDEIRO, Euda. A literatura na l" série do ensino médio: voz do aluno e
formação de leitores que conhecem tanto a expressão masculina quanto clo professor. Dissertação de Mestrado. João Pessoa/Campina Grande, UFPB,

feminina de nossa rica tradição lírica. Tirdo isso alicerçado numa meto- 2002.
dologia que privilegia o diálogo texto x leitor e texto x leitor x professor. DANTAS, José Maria de S. Didática da literatura. Rio de Janeiro: Forense
As duas poetisas trouxemos aqui, para exemplificar essa pro- Universitária , 1982.
posta de trabalho, podem ser melhor apre sentadas se trouxermos outros FARIAS, Alyere S. Encontro com Lalino e Cancão: estranhamentos e pare-
poemas para apreciação. Quisemos mostrar que, mesmo com três poe- cenças na vivência do texto literário em sala de aula. Dissertação de Mestrado.
mas, é possível estabelecer um diálogo significativo com a poesia. E POSLE/UFCG, 2OIO.
evidente, contudo, que este número deveria ser acrescido. E o professor F'REITAS, Lenilde. A corça no campo. Recife: Ed. da Autora, 2010.
ou professora que acompanhou esta leitura atê aqri, espero que se sinta Grãos na eira. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.
estimulado a conhecer estas e outras grandes poetisas de nossa língua.
.IOBIM, José Luis. 'A
literatura no ensino médio: um modo de ver e usar".
E para finalizar, mais uma vez a voz das poetisas , agora para o leitor, In: ROSING, Tania M. K. & ZILBERMAN, Regina (Org.). Escola e leítura:
na sua solidão, degustar a poesia: velha crise, novas alternativas. São Paulo: Globall/.BL,2009.
pensar letras LAEI Carlos de; BARRETO, Fausto. Antologia nacional: coleção de excer-
sentir palavras tos dos principais escritores da língua portuguesa do 20o ao 13' século. 37" ed.
a alma cheia de dedos Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1960.
(Alice Ruiz) MEIRELES, Cecília. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.
PAIVA, Aparecida; MARTINS, Aracy; PAULINO, Graça; VERSIANI,
voo Zélia (org). Democratizando a leitura: pesquisas e práticas. Belo Horizonte:
Coruja construo meu palco CEALE/AUTÊNTICR, 2004. (Coleção Literatura e Educação)
na duração de um espanto. PETIT, Michele. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva. Tradução:
Calco meu voo no não canto Celina O. de Souza. São Paulo: Editora 34,2008.
sem camuflados gemidos. PINHEIRO, Hélder. "Reflexões sobre o livro didático de literatura". In:
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