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BELO HORIZONTE
2015
ISTÉFANI PONTES DA COSTA
BELO HORZIONTE
2015
DEDICATÓRIA
Dedico esta monografia aos meus pais, Keila Pontes da Costa e Osvaldo Martins
da Costa, que, apesar de tudo, acreditaram em mim, deram apoio e suporte em meus
estudos no Curso de Graduação em Teatro da UFMG e no Curso de Formação de Ator
do Teatro Universitário da EBAP/UFMG e por, principalmente, me incentivarem a
continuar.
A escolha da carreira de atriz não é uma escolha fácil, já que se parte da premissa
de que é “uma carreira que não te dará futuro” e “nunca te dará dinheiro”. Mesmo
assim, escolhi me tornar atriz e vocês me deram forças e capacidades para investir nesse
sonho. Eu os amo incondicionalmente por isso e jamais esquecerei a importância que
vocês têm na minha formação em Teatro e na minha vida. Muito obrigada!
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Ernani Maletta por aceitar ser meu orientador e por acreditar nesta
monografia e na minha capacidade enquanto futura docente para colocá-la em prática.
Agradeço também pelo seu tempo e sua dedicação impressos nesta monografia. Gestos
como esses são, para mim, profundamente comoventes e fazem com que eu renove,
constantemente, minha esperança na carreira de atriz e professora;
À Prof. Helena Mauro por aceitar ser minha coorientador e por ser uma pessoa
tão amável e atenciosa em relação à nossa amizade e as minha demandas referentes à
monografia. Cada palavra sua guardo em meu coração;
Á Prof. Francesca Della Monica por aceitar fazer parte da minha banca e por ser
essa pessoa incrível, amável e sempre solicita que ela é. Francesca é uma inspiração
para minha vida e deveria ser para o mundo!
À Prof. Mônica Ribeiro por aceitar fazer parte da minha banca e por ter me
oferecido valiosos conselhos referentes à monografia que, sem os quais, esta pesquisa
nunca teria sido a mesma;
À Prof. Marina Marcondes Machado pela atenção que me ofereceu durante esse
semestre sobre a monografia;
Aos alunos do 4º período do Bacharelado do Curso de Graduação em Teatro da
UFMG durante o 1º semestre de 2015 que acreditaram em mim, nesta monografia e me
receberam em sua disciplina com sorrisos e afetos;
Ao LiberaVox pela compreensão e ajuda durante todo o processo de escrita do
TCC;
Aos amigos e família que me apoiaram durante essa árdua tarefa que é formar;
Á Lélia Rolim e ao Vinícius Albricker pelas conversas, confissões e desabafos
ao longo deste semestre;
À Henrique Portugal por confiar em mim e nessa pesquisa possibilitando formas
de continuação do meu estudo;
À Julião Villas, primeiramente, pelo carinho, atenção, apoio e cuidado dedicados
a mim durante meu processo de formatura. Em segundo, pelas leituras e correções
dedicadas a esta monografia. E finalmente, por tudo o que ele representa para mim neste
momento da minha vida.
RESUMO
This monograph is based on the search of principles and procedures that guide
the study of text in the actor’s training processes. Based on the literature review, here is
discussed the importance of the text as one of the elements that compose the theatrical
discourse, whose nature is polyphonic. The present work includes a survey about
professors Helena Mauro, Ernani Maletta and Francesca Della Monica’s work, through
literature research and interviews conducted with them. As a final methodological
procedure, the author of this work lectured ten practical lessons, created by her, to a
group of theater students based on the combination of artistic and pedagogical practices
of these researchers with the theatrical text. As a conclusion and in addition to the plans
of classes and the analysis of their implication, presents some principles and procedures
that were determined by the research conducted.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...............................................................................................................7
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS..................................................................9
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................58
REFERÊNCIAS ............................................................................................................61
ANEXO...........................................................................................................................64
7
INTRODUÇÃO
1
Esta afirmação se baseia nas discussões em turma e nas minhas percepções realizadas sobre o tema, por
ocasião da minha participação na disciplina Pesquisa em Artes Cênicas, ministrada pela Professora
Mônica Ribeiro, no 2º semestre de 2014.
8
estudo sistematizado que seja focalizado no campo do trabalho de texto e da voz falada
do ator.
O meu interesse por esse tema se inicia quando, em um mesmo período – 2º
semestre de 2012 – tive a oportunidade de participar das aulas de dois professores que
fogem a essa regra: Ernani Maletta, professor do Curso de Graduação em Teatro da
UFMG, e a professora Helena Mauro, do Curso de Artes Dramáticas – Formação de
Ator do Teatro Universitário da UFMG2. Ambos tratam o estudo da voz do ator, de
formas distintas, mas que se entrelaçam em um ponto: o foco na palavra. Cada qual a
seu modo – Mauro, a partir de Contos, e Maletta a partir, preferencialmente, de textos
Shakesperianos –, realça o exercício minucioso e complexo que é o trabalho de texto no
Teatro de forma única e singular, no qual buscam dar sentido para cada palavra na frase
e criar uma melodia vocal orgânica. O trabalho de ambos gira em torno de insuflar nos
alunos a busca por imagens que provoquem significados naturais, inerentes e múltiplos
ao texto e na fala.
Primeiramente, tive contato com Helena Mauro ao ingressar no Teatro
Universitário no ano de 2010, onde é professora do Curso de Formação de Ator.
Através das disciplinas Expressão Vocal I, II, III, IV e V, tive contato com o seu
trabalho com estudo de texto e contação de história. Posteriormente, em 2012, conheci o
trabalho de Ernani Maletta no Curso de Graduação em Teatro da UFMG, através da
disciplina Prática Criação Cênica A, e desde então passei a me matricular nas
disciplinas que Maletta oferecia.
Por intermédio de Maletta, entrei em contato com dois objetos de estudos que
são de suma importância para a pesquisa aqui registrada. O primeiro deles é o conceito
de Polifonia Cênica, do qual ele se apropria de maneira singular e que será focalizado
mais adiante. O segundo é a espacialização da voz, expressão que se usa de modo geral
para fazer referência à pesquisa de Francesca Della Monica, com quem tive um feliz
encontro ao final do ano 2012, no qual Della Monica ministrou duas aulas como parte
da disciplina Estudos Vocais e Musicais B, ofertada por Ernani Maletta no Curso de
Teatro da Universidade Federal de Minas Gerais.
A relevância da pesquisa desenvolvida e que deu origem a esta monografia, no
campo da Arte, configura-se então na contribuição que representa para a atual retomada
do trabalho do texto falado, anteriormente referida. Com o intuito de sustentar a
2
O Teatro Universitário da Universidade Federal de Minas Gerais é uma das unidades de ensino da
Escola de Educação Básica e Profissional (EBAP) da UFMG.
9
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
nas diversas disciplinas ministradas pelo professor Ernani Maletta ofertadas pelo
Curso de Teatro da UFMG, às quais venho acompanhando desde 2012;
3
Marco De Marinis é pesquisador e professor italiano no Dipartimento di Musica e Spettacolo da
Universidade de Bologna e possui vários livros publicados sobre a estética teatral, entre eles :Teatro e
Comunicazione (1977), Semiotica del Teatro - L‘Analisi Testuale dello Spettacolo (1982), Il Nuovo
Teatro 1947-1970 (1987) e Mimo e Teatro del Novecento (1993).
4
Cabe comentar que, até então, Della Monica não publicou muitos escritos sobre o seu próprio trabalho,
além de dois artigos que serão oportunamente citados.
5
Ana Hadad é atriz, cantora e professora de Expressão Vocal na Fundação Clóvis Salgado – CEFAR. É
Mestre em Teatro pela Escola de Belas Artes da UFMG com a tese A arqueologia do Trabalho Vocal
proposto por Francesca Della Monica.
10
A palavra, com seu poder de evocar imagens, vai instaurando uma ordem
mágico-poética, que resulta do gesto sonoro e do gesto corporal, embalados
por uma emissão emocional, capaz de levar o ouvinte a uma suspensão
temporal. Não é mais o tempo cronológico que interessa e, sim, o tempo
afetivo. É ele o elo de comunicação (SISTO, 2012 apud MAURO, 2013,
p.8).12
8
Depoimento obtido através de entrevistas e de conversas por e-mail.
9
Valère Novarina é escritor, dramaturgo, diretor de teatro e pintor francês. Em seu livro Diante da
Palavra (2009), aborda o tema da potência da palavra no teatro, onde poder ser ouvida, vista e sentida
pelos espectadores.
10 Constantin Stanislaski foi ator e diretor de teatro em 1897, onde criou o Sistema Stanislavski.
11
Celso Sisto é escritor, ilustrador e contador de histórias. Em seu livro Textos e Pretextos sobre a arte de
contar histórias disserta sobre a função e necessidade do Contador de Histórias
12
Cf. nota 7.
13
Ibidem.
14
As informações aqui registradas sobre as propostas de Mauro foram obtidas por intermédio da Apostila
Contar Histórias Através da Palavra Literária, de entrevistas realizadas com a professora em questão e
das anotações feitas por mim em Diários de Bordo.
15
15
Depoimento obtido em entrevista realizada com Helena Mauro para esta monografia, cuja transcrição
integral se encontra nos Anexos deste trabalho.
16
Cf. nota 7.
16
A partir da minha experiência com Mauro durante os três anos que estudei no
Teatro Universitário da UFMG, posso esquematizar um pequeno percurso didático
sobre o estudo de texto, por intermédio da Contação de História, proposto por ela:
17
Considerações esquematizadas a partir de meus registros de Diário de Bordo no ano de 2012.
19
p.23), nessa disciplina Della Monica propunha o contraponto entre o discurso sonoro e o
visual, por meio do estudo dos ritmos e dos tempos da Paisagem Sonora18.
Ao falar de Francesca Della Monica é importante reiterar que a elucidação dos
seus conceitos metodológicos que serão abordados a seguir são provindos do relatório
de pós-doutorado de Ernani Maletta (2011), de um artigo por ele publicado em 2014, na
Revista Urdimento, e da dissertação de mestrado de Ana Hadad (2014), bem como pela
minha participação nas oficinas que Della Monica ofereceu em Belo Horizonte nos anos
de 2012, 2013 e 2014.
Minhas considerações serão feitas, a partir da observação de seu trabalho, da
vivência ativa no próprio corpo de suas técnicas, da conscientização de mim mesma –
no que se refere às minhas capacidades vocais – e das potentes associações imagéticas a
qual tive acesso que resultaram em uma liberdade vocal total. Della Monica possui
inúmeros conceitos e exercícios vocais voltados para todos os aspectos do canto e do
texto no teatro, no entanto, nessa pesquisa, focaremos alguns termos propostos por ela
que serão citados a seguir.
Segundo Maletta (2011), entre os princípios fundamentais da proposta de
trabalho vocal de Della Monica que se referem precisamente às necessidades do ator no
que diz respeito à criação vocal cênica, destacam-se:
Della Monica evita usar o termo projeção vocal, pois acredita que a
noção da palavra projeção está diretamente ligada à ideia de emissão frontal
da voz. A fim de se alcançar uma emissão plena da voz – à qual eu me refiro
dizendo que se está “lançando” a voz em um ângulo de 360º –, Della Monica
utiliza o termo espacialização vocal, e para esclarecê-lo propõe o estudo das
múltiplas dimensões espaciais envolvidas na ação vocal e suas interações
com os diferentes espaços, a saber:
18
Conceito de Paisagem Sonora de Murray Schafer em seu livro A afinação do Mundo, diz que a
Paisagem Sonora é construída a partir de sons do ambiente como um todo concebendo uma única e
grande orquestra musical. Della Monica utiliza este conceito aplicando o à voz.
20
Além desses temas de pesquisa, Della Monica também apresenta a noção das
vogais (-i,-e,-a,-o,-u) que propiciam a realização e a efetivação da linguagem verbal,
pois funcionam como grandes propulsoras da palavra e, consequentemente, são agentes
da criação. Por esse motivo, a vogal é relacionada às nossas funções emocionais,
representativas e imaginativas (HADAD, 2014, p.64).
Ainda a respeito das pesquisas de Della Monica, Maletta (2010, p.25) afirma que
ela alcança seus objetivos didáticos fazendo uso de uma “metodologia explicitamente
polifônica, por meio da qual um discurso filosófico, um discurso plástico e um discurso
musical compõem simultaneamente sua estratégia didática”. Segundo Maletta, sobre as
bases filosóficas do trabalho de pesquisadora italiana, ela própria afirma:
Outra questão importante, que Della Monica destaca como uma de suas mais
recentes preocupações refere-se à escuta, por parte do ator, da voz e da presença de seus
interlocutores durante a sua realização em cena. Em suas próprias palavras:
Uma coisa é importante: nos últimos meses eu descobri uma perspectiva que
é muito importante e que está dando resultados muito bonitos. Ou seja, o que
determinaria a consciência de dois tipos diferentes de escuta. De escuta pelo
ator e não pelo público. Quando um ator está atuando, no mesmo instante que
19
Depoimento obtido em entrevista realizada com Della Monica para esta monografia, cuja transcrição
integral se encontra nos Anexos deste trabalho.
22
ele está atuando e falando ele deve escutar o interlocutor direto ou indireto. A
escuta, que é uma escuta sensorial, por assim dizer, não pode ser uma escuta
que acontece por intermédio do ouvido. É claro, é uma escuta que acontece
por intermédio dos outros sentidos, pelo olhar, pelo cheirar, por tudo. É uma
atenção, vamos dizer assim, ou seja, escutar o interlocutor mantendo uma
atenção febril, eu diria. Isso gera no ator uma atenção incrível e uma
espessura dramatúrgica muito maior. É uma outra forma de escuta que não
acontece depois de ter falado, mas enquanto você está falando. E isso tem
muito a ver com o dialogismo. Por exemplo, você lendo um texto, já
estabelece uma escuta do texto e o texto também escuta você lendo. Ou seja,
a hipótese de Bakhtin, que o escritor está dialogando com você, então está te
escutando, quando está escrevendo, e no momento da leitura tem uma escuta
recíproca.20
20
Ibidem.
23
21
Dentre os vários espetáculos teatrais que Maletta concebeu a direção/preparação vocal e musical, bem
como atuou como arranjador, compositor destacam-se: O Grande Circo Místico, dirigido por João
Fonseca (2014); Mania de Explicação, dirigido por Gabriel Villela (2014); Hamlet, produzido pelo Grupo
de Teatro Clowns de Shakespeare, Natal/RN, direção de Marcio Aurelio (2013); Scene di Woyzeck,
baseado na obra homônima de Georg Büchner e na Ópera Wozzeck de Alban Berg, direção de Federico
Tiezzi/Itália (2013); Os Gigantes da Montanha, produzido pelo Grupo Galpão e dirigido por Gabriel
Villela (2013); Macbeth, texto de Shakespeare, direção de Gabriel Villela (2012); Sua Incelença, Ricardo
III, produzido pelo Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare, direção de Gabriel Villela (2012); Hécuba,
///////texto de Euripedes, direção de Gabriel Villela (2011); Eclipse, produzido pelo Grupo Galpão, com
direção de Jurij Alschtz (2011); Un Sogno nella Notte dell'Estate, dirigido por Massimiliano Civica
(2010); O Soldadinho e a Bailarina, produzido por Luana Piovani e dirigido por Gabriel Villela (2010);
Till, a saga de um herói torto, do Grupo Galpão (2009);Um Homem é um Homem, com o Grupo Galpão,
direção de Paulo José (2006).
24
Eu queria usar uma ideia pra mostrar como entendia essa manifestação
[teatral] e para ajudar a evitar que as pessoas continuem pensando que as
artes se juntem pra montar o Teatro. A manifestação cênica é uma
manifestação formada por um complexo de manifestações simultâneas, que
se baseiam em imagens, movimentos, sons e palavras. O que acontece é que
geralmente se pensa que a manifestação plástica que o Teatro tem é um
empréstimo das Artes Plásticas, que a manifestação do movimento é um
empréstimo da Dança, que a manifestação sonora é um empréstimo da
Música, que a manifestação da palavra é um empréstimo da Literatura. É aí
que mora o problema: não são essas artes que estão emprestando os seus
discursos para o Teatro... na verdade a manifestação teatral já compreende
intrinsicamente cada um desses discursos, como um fio da trama teatral,
independentemente do fato de que, de alguma forma, se refira a cada uma
dessas artes... porque compartilham conceitos. 22
Em sua tese, Maletta (2005, passim) parte da premissa de que o Teatro, por ser
uma arte de natureza polifônica, exige do artista cênico uma atuação polifônica. O
professor evidencia que, no caso do Teatro, o século XX tem como uma de suas
características a tendência em se romper com o “textocentrismo” próprio dos séculos
XVIII e XIX, apesar de afirmar que, mesmo fortemente questionado, o texto jamais foi
completamente eliminado. Nesse ponto, Maletta se referencia em De Marinis, que
comenta:
Creio que em toda a história do teatro ocidental não existiu um outro período
histórico que tenha conhecido um ataque similar àquele movido pelo século
XX contra a palavra como principal meio de expressão dramática (ainda que
– cabe ressaltar de imediato – quase nunca este ataque pretendia promover,
ou de alguma forma promoveu, a sua expulsão completa e definitiva da cena)
(DE MARINIS apud MALETTA, 2011, p. 16).
22
A transcrição integral da entrevista realizada com Maletta encontra-se nos Anexos desta monografia.
25
Maletta ainda cita De Marinis, dizendo que a grande novidade do século XX foi
o fato de se evidenciar a poesia cênica, isto é, a poesia como forma da composição
teatral, de modo que, em vez de se reproduzir a poesia literária na cena, a proposta é
fazer poesia com a cena. (Ibidem, p.17).
De um modo geral, Maletta (2005, passim) comenta que nos processos de
criação do século XX temos em primeiro plano a figura do diretor, no lugar antes
ocupado pelo autor. Assim, o foco central, que anteriormente eram os aspectos
semânticos da palavra, modifica-se para a concepção teatral a partir de novos
parâmetros, tais como o movimento corporal, a sonoplastia, o figurino, a iluminação, o
cenário, etc., mesmo que, muitas vezes, sob a condução autocrática do diretor.
Para o professor,
a polifonia cênica não surge no século XX quando o texto perde seu papel
protagonista, uma vez que ela é a natureza do Teatro, ou seja, o Teatro é
polifônico por natureza. A polifonia é intrínseca ao Teatro e não uma
característica que pode haver ou não. Penso que aquilo que ocorreu no século
XIX, que a supervalorização do dramaturgo, criou uma falsa ideia de que o
Teatro seria principalmente texto, isto é, que a voz do dramaturgo seria
hierarquicamente mais importante, o que, na minha opinião, vai contra a
natureza do Teatro. Na verdade, as outras vozes continuaram criando igual e
simultaneamente a cena, mas em função do endeusamento do autor, parece
que ele é mais importante que os demais criadores. Coisa similar ocorre no
século XX, havendo apenas uma troca de papeis: quem assume o falso papel
protagonista é o diretor. Nesse sentido, era necessário, inicialmente, destituir
o autor de seu posto, para que o diretor o ocupasse. Atualmente, penso que o
que esteja ocorrendo é a revalorização da natureza polifônica do Teatro, na
medida em que o autor e o diretor, em vez de serem vozes hierarquicamente
mais importantes, são tão importantes quanto qualquer uma das outras vozes,
próprias do movimento, das imagens e das diversas sonoridades. 23
23
Depoimento obtido através das gravações das aulas de Ernani Maletta, que acompanhei entre os anos
de 2012 e 2015, e foram transcritas, posteriormente, em meus Diário de Bordo.
26
qual se pode perceber essa influência em suas apresentações teatrais: Grupo Galpão24,
Grupo Espanca!25 e Grupo Quatroloscinco26.
Portanto, o conceito de polifonia foi referencial para a pesquisa por mim
desenvolvida em dois aspectos. Em primeiro lugar, mais explicitamente, pela forma
como é tratado por Maletta, que me dá suporte para justificar a importância do texto – e,
consequentemente, do seu estudo – como voz fundamental à criação teatral. Um
segundo aspecto, que se faz presente neste trabalho de forma implícita, refere-se à
própria noção do termo “entrelaçamento”, uma vez que, ao me propor fazer uma
combinação metodológica das pesquisas de Maletta, Della Monica e Mauro, a fim de
criar os possíveis princípios nos planos de aulas para estudantes de Teatro, em muitos
momentos pude perceber que há um real entrelaçamento, na medida em que os
procedimentos de um alteram significativamente a minha forma de me apropriar dos
procedimentos dos outros. Contudo, tendo em vista que a complexidade dessa análise
ultrapassa os limites desta monografia, considero que este seja um excelente objeto para
uma nova pesquisa.
Ao estudar o conceito de polifonia cênica, por meio dos escritos e aulas de
Maletta, foi inevitável buscar suas relações com as ideias de inter e
transdisciplinaridade, que também contribui para o tratamento do texto teatral. Busquei,
assim, outros pensamentos que pudessem me auxiliar na compreensão dessa complexa
noção. Encontrei nos livros Conhecimento e Transdisciplinaridade, de Ivan Domingues,
e Linguística aplicada e Transdisciplinaridade: questões e perspectivas, de Inês
Signorini e Marilda C. Cavalcanti, definições sobre a Transdisciplinaridade na
Pedagogia. Cito abaixo algumas dessas descobertas, com o intuito de compartilhá-las
com os leitores que se interessarem pelo tema:
24
Grupo Galpão é um grupo de teatro de rua originário de Belo Horizonte sendo fundado em 1982 por
Teuda Bara, Eduardo Moreira, Wanda Fernandes e Antônio Edson.
25
Grupo Espanca! iniciou suas atividades em Belo Horizonte no ano de 2004 e em seus espetáculos
pesquisa a encenação de dramaturgias contemporâneas, propondo discussões sobre os códigos do
fenômeno teatral e a escrita do que eles chamam de “poética da violência”.
26
Grupo Quatroloscinco é um grupo de teatro belorizontino que mantém trabalho continuado de pesquisa
e prática artística baseado principalmente na criação coletiva e autoral sob uma estética contemporânea.
27
27
Esse projeto gerou o Relatório de Pós- Doutorado apresentado à Escola de Belas Artes da UFMG no
ano de 2011.
28
Frente, Direita, Esquerda, Trás, Alto, Baixo, Diagonal alta Direita, Diagonal alta Esquerda, Diagonal
baixa Direita, Diagonal baixa Esquerda, Diagonal central Direita-frente, Diagonal central Esquerda-
frente, Diagonal central Direita-trás, Diagonal central Esquerda-trás
29
extensões sonoras. Além disso, têm relação com a liberdade expressiva, identidade
vocal e com a valorização da expressão dionisíaca da voz – termos recorrentemente
usados por Maletta para se referir à metodologia de Della Monica.
Por meio das leituras, aulas e oficinas que fiz com Mauro, Maletta e Della
Monica, posso então inferir que, para eles, o trabalho de voz no Teatro não pode ser
justificado somente pelo viés das técnicas musculares e esteticistas, mas, sim, deve ser
exercitado a partir do entendimento dos aspectos sonoros, visuais, filosóficos e
subjetivos da voz. Ou seja, para todos, a relação da voz com imagens que potencializam
a fala são fundamentais para a construção de sentindo no texto. É a partir dessa proposta
que surge a minha motivação em desenvolver essa pesquisa: a busca por possíveis
princípios e procedimentos que orientem o estudo de texto na formação do ator, com
base nas pesquisas desses professores e pesquisadores.
As pesquisas de Mauro, Maletta e Della Monica são bastante peculiares e
refletem suas respectivas motivações em discorrer sobre esses temas do universo teatral.
Contudo, por eu ter vivenciado e aprofundado nos estudos de cada pesquisador em
períodos próximos da minha trajetória acadêmica, pude perceber uma ligação entre os
três: a ênfase no texto e na voz do ator durante a emissão vocal. Cada qual, a seu modo,
trás à tona algo que, até onde me foi possível pesquisar, é raro: estratégias para o estudo
da palavra/texto literário, como um dos discursos cênicos que, com igual importância,
criam uma representação teatral.
Essas três visões que abordam a voz do ator e o estudo de texto no Teatro foram
de suma importância para alcançar o propósito da pesquisa registrada nesta monografia,
e conceber os planos de aulas propostos. Por intermédio da combinação de
procedimentos específicos relacionados à voz do ator, pude alicerçar e fundamentar 10
planos de aula que propõe o estudo de texto como foco no aprimoramento do trabalho
de estudantes de teatro.
30
Neste capítulo, será abordado a concepção dos planejamentos das dez aulas
oferecidas como procedimento metodológico final da pesquisa aqui registrada, bem
como o desenrolar de cada uma delas, suas implicações no desenvolvimento dos alunos,
e a reflexão sobre a minha atuação como futura docente no processo de ensino-
aprendizagem.
Desde o semestre passado, a partir do momento em que o Prof. Ernani Maletta
foi convidado29 para dirigir a montagem de um espetáculo30, prevista na ementa da
disciplina Prática de Criação Cênica A, conversávamos sobre a proposta de eu oferecer
essas dez aulas aos seus alunos, e qual seria a melhor forma e momento de desenvolvê-
las. Chegamos ao consenso de que o período ideal seria entre os meses de abril e maio,
quando os alunos já estariam mais envolvidos com o texto e dando início à criação das
cenas.
Antes disso, como uma preparação para a tarefa a ser por mim realizada,
acompanhei todo o processo dos alunos desde o início do semestre letivo:31 o primeiro
contato com o texto, as primeiras leituras dramáticas, as primeiras cenas criadas –
quando a turma foi divida pelo professor em quatro grupos, de modo que cada um deles
buscasse, a cada semana, fazer uma “leitura” do texto de Shakespeare a partir de um
único referencial, definido entre os seguintes: som, movimento, imagem e palavra. O
próprio Maletta explica com mais detalhes a sua proposta:
29
O convite foi feito pelos alunos que, então, cursavam com ele a disciplina Estudos Vocais e Musicais A,
do 3o período do Bacharelado em Interpretação Teatral no segundo semestre de 2014, e que fariam a
Prática de Criação Cênica A ao passar para o 4o período no primeiro semestre de 2015.
30
Como já informado anteriormente, neste semestre foi definido por Maletta e seus alunos a montagem
de A Comédia dos Erros de Willian Shakespeare.
31
A primeira aula da disciplina em questão ocorreu no dia 03 de março de 2015.
31
A partir das entrevistas com Ernani Maletta, Francesca Della Monica e Helena
Mauro, bem como das minhas experiências na Escola de Belas Artes da UFMG e no
Teatro Universitário da UFMG, em relação ao estudo de texto, estruturei as 10
propostas de planos de aula, com 50 minutos cada. Com esse conjunto de aulas – a
serem posteriormente analisadas –, criadas para auxiliar o trabalho de estudantes de
Teatro no âmbito do estudo de texto e das práticas de exercícios cênicos em sala de aula,
meu objetivo era implicar estratégias metodológicas construídas por meio da
combinação das propostas metodológicas dos entrevistados.
Esse trabalho foi divido em quatro fases, a saber, que, como forma de
organização, foram relacionadas a cores:
32
O rodízio de focos, ao qual o professor se refere, pode ser descrito da seguinte forma: na primeira
semana, o grupo 1 tinha como foco a imagem, o grupo 2 o movimento, o grupo 3 a palavra e o grupo 4 o
som; na segunda semana, os grupos, sem perder o trabalho já realizado, intercambiaram os focos; e assim
por diante, com o objetivo de que cada grupo trabalhasse com todos os focos.
33
Cf. nota 17.
32
Obs. O texto a ser decorado pelos alunos ao longo das aulas foi trocado a cada
duas ou três atividades.
Aula 1
Duração: 20 minutos
2. Exercício:
a. Pedir aos alunos que criem, naquele momento, uma pequena frase para ser
decorada (ou usar uma frase já decorada anteriormente). Durante o
exercício, pedir que se concentrem em uma das dificuldades que possuem e
desejam resolver primeiramente.
b. Com as luzes da sala apagadas e com o apoio de uma música – nesta aula,
será usada a música Amèriques, de Edgard Varèse, por meio de um aparelho
de CD –, pedir aos alunos que se espalhem e se posicionem
confortavelmente pela sala. De olhos fechados e em silêncio ouvirão a
música durante um período inicial. Ao ouvirem a música eles devem se
deixar influenciar pelas suas nuances e pelas imagens provocadas pelo som.
Obs.: Procedimento baseado em aulas de Helena Mauro.
c. Orientar os alunos a emitir o texto decorado, quando se sentirem a vontade
para tal, deixando a música guiar a fala e usando, também, o movimento do
corpo durante a emissão da voz.
Duração: 20 minutos.
34
De modo geral, apontam-se dificuldades em conseguir nuances, criar diferentes timbres, manter o
fôlego, etc.
34
Jogo Extra:35 Exercício em roda, pedir aos alunos que emitam, um de cada vez,
um som, prolongamento de notas ou ruídos com a voz. Cada emissão vocal
complementará a outra, dessa forma, eles criaram uma música singular. Depois,
cada um irá ao centro para fazer um pequeno solo, ampliando suas
possibilidades vocais para além do som inicial.
Obs.: Exercício semelhante ao proposto por Ernani Maletta em suas aulas, que
por sua vez se refere a práticas usadas por Della Monica.
Meu primeiro contato com a turma na posição de futura docente foi muito boa.
Fui recebida bem por todos os alunos que me escutavam enquanto eu lhes explicava
qual era a finalidade daquelas aulas e o que iríamos trabalhar naquele primeiro dia.
Iniciamos a aula com uma conversa sobre quais seriam as possíveis dificuldades
vocais em relação à emissão sonora do texto de cada um. A maioria das respostas girava
em torno de problemas relacionados à clareza da voz, dicção, sustentação, timbres,
variações rítmicas, projeção e alturas. Em seguida, fizemos o exercício proposto no item
2 do plano acima transcrito, e terminamos com a roda de conversa prevista, sobre como
foi a percepção daquele exercício no corpo e na voz de cada um deles e se houveram ou
não mudanças em suas emissões vocais.
Em resposta, os alunos me disseram que através do exercício com a música é
possível deixar o corpo e a mente suscetíveis à criação de imagens, disponibilidade do
corpo e a descoberta de timbres dos quais ainda não conheciam. Nesta primeira aula,
tive a satisfação de alcançar meus objetivos específicos, referentes a ela, e a percepção
de que havia dado corretamente o primeiro passo em direção ao objetivo geral da
pesquisa.
35
A partir da minha experiência como Monitora Decente no Centro Pedagógico e no projeto Escola
Integrada na escola Aurélio Pires, percebi a necessidade de criar em meus planos de aula um tópico a
mais denominado “Jogo Extra” que possui o mesmo tema da aula. Este novo exercício é adicionado por
último no plano de aula caso sobre tempo ao final da aula para executá-lo.
35
Nas aulas que se seguem, propus o seguinte roteiro: roda de conversa inicial para
explicar sobre qual tema vocal que trabalharíamos no dia, exercício prático sobre o tema
e uma roda de conversa final para relatar quais foram as experiências deles naquele dia.
Aula 2
1. Preparação: Cada aluno estará em pé, disponibilizará seu corpo e desejará dizer
o seu texto decorado de uma forma que todos compreendam.
Obs.: Procedimento usual no trabalho de Ernani Maletta, que tem como
princípio filosófico a ideia de que o desejo de comunicar o sentido do texto é
imprescindível para o sucesso dessa ação. Independentemente da questão do
desejo, Della Monica utilizada uma estratégia semelhante em suas aulas.
Duração: 15 minutos.
2. Exercícios em roda:
a. Velocidade – Todos os alunos, com os braços abertos e para cima, deverão
juntar as palmas de suas mãos, fazendo um grande círculo. Ao primeiro
sinal do professor, os alunos baterão uma palma próximo ao centro de seu
corpo e outra ao encontrar as mãos dos colegas no grande círculo. Eles farão
36
Duração: 25 minutos.
Duração: 10 minutos.
Jogo Extra: Como o tempo da aula é limitado, usar o exercício 2 (b), referente ao
Ritmo, como possível jogo extra.
Nesta segunda aula, os alunos pediram que a aula fosse mais curta, pois iriam
apresentar, logo em seguida, cenas planejadas durante a disciplina para o Ernani e
precisavam se preparar. Aceitei e propus que não fizéssemos a Roda de Conversa final
naquele dia, fazendo- a, então, no dia seguinte. Iniciamos a aula com uma rápida
37
conversa sobre ritmo, andamento e velocidade, e sobre a sua influência na fala. Neste
dia, executamos somente o exercício 2 (a).
Eu estava, então, com a tarefa de encontrar uma forma de realizar o exercício 2b ao
longo das próximas aulas.
Aula 3
1. Preparação:
a. Exercício de relaxamento: separar os alunos em grupos de quatro e pedir
para que se deitem de bruços no chão, uns sobre os outros, durante alguns
minutos (caso algum aluno não consiga suportar o peso dos demais alunos,
este deve sempre procurar ficar por cima dos colegas). Os alunos irão
gargalhar – se for necessário, deverão fazê-lo de forma artificial – e, depois
de algum tempo, alternar as suas posições entre si.
Obs.: Exercício proposto por Helena Mauro em suas aulas, com o objetivo
de buscar a sensibilização dos alunos em relação a liberdade vocal.
b. A seguir, em dupla, serão espalhados pela sala e se sentarão, de olhos
fechados, de costas um para o outro. Cada aluno escolherá um animal e
começará a imitá-lo, vocalmente e depois associando o movimento do
corpo. O professor dirá comandos para a turma, a fim de estimulá-los
38
durante a atividade, como por exemplo: Qual é o som desse animal? O que
ele faz com as patas? E com a coluna? Como é o corpo desse animal? Como
ele anda? Como ele caça (ou foge do caçador)? Como ele se relaciona com
os outros animais? Etc.
Obs.: Na contação de história proposta por Mauro, pode-se usar a
alternância de timbres para variar as intenções do texto ao se referir a
personagens diferentes ou entre narrador e personagem. Por não se usar
figurino, maquiagem ou adereços que caracterizem cada personagem da
história, essa diferenciação se dá, exclusivamente, através da voz.
.
Duração: 20 minutos.
Duração: 20 minutos.
Duração: 10 minutos.
-Nessa aula percebi que mudar algo no corpo usando a voz do animal me
permitiu encontrar nuances na voz e no texto que eu não conhecia antes.
- O exercício comigo não funcionou, eu escolhi a minhoca! Que voz tem uma
minhoca?
- Eu era uma borboleta, e durante o jogo a Aline, que era uma gata, me deu
uma patada, então eu tive que morrer!
- Uma introdução maior da aula e uma duração maior do exercício faz com
que a gente tenha uma imersão maior no personagem. (comparação da 3º aula
com a 1º que possuiu uma introdução maior ao exercício)37
Assim, pude concluir, então, que para alguns alunos o objetivo proposto da aula
foi alcançado através da percepção de “nuances” em suas vozes. Porém, alguns alunos
se ativeram, exclusivamente, ao comando em relação ao animal e suas características
reais, e não conseguiram abstrair sobre o exercício buscando variações vocais de acordo
com a imagem/lembrança que cada animal pode suscitar, modificando, assim, a voz.
Isso faz com que eu me questione acerca da necessidade ou não da Roda Conversa
Inicial e sobre a forma da condução do exercício.
Obs.: ainda não foi possível suprir a falta do exercício 2.b da terceira aula, que não foi
devidamente realizado.
36
Essa noção de “despertar” recursos vocais foi referenciada a partir da entrevista de Ernani que está na
sessão ANEXO dessa monografia. Segundo ele, todos nós já possuímos vários recursos vocais que são
importantes para uma boa emissão vocal do texto. No entanto, com o passar dos anos, acabamos por
“esquecê-las”, fazendo-se necessário então o uso de exercícios para “despertá-las” novamente.
37
Frases registradas em meu Diário de Bordo que foram ditas pelos alunos durante as aulas.
40
Aula 4
1. Introdução:
a. Apresentar as diferentes pontuações (.), (,), (...), (!) e (?) e suas respectivas
entonações, exercitando-as com o dizer de frases como “Hoje eu comi arroz,
feijão, batata, couve,”, deixando-a incompleta, ou, “Hoje eu comi arroz,
feijão, batata, couve.”, finalizada, ou “Ah... não sei...”, em supensão.
b. Chamar a atenção dos alunos para as características próprias dos
regionalismos na forma de falar, em particular dos cidadãos mineiros de um
modo geral – o “mineirês” –, que tendem a não pronunciar ao final das
palavras, o “r”, “s” e “ndo”.
c. Fazer referência, também, à pausa, ressaltando que não é um elemento sem
intenção, mas sim, uma interrupção da fala preenchida de sentido. Nesse
sentido, o ator precisará manter a relação com o interlocutor e a atenção do
público no decorrer de sua duração.
Duração: 15 minutos.
2. Exercício:
a. Os alunos se posicionarão em dois círculos de igual número, um dentro do
outro, formando, assim, pares ao longo do círculo. Os atores do círculo de
fora ficarão com uma cópia impressa do texto dos atores do círculo de
dentro e, enquanto o ator do círculo de dentro diz o seu texto, o ator do
círculo do lado de fora perceberá se o seu colega está dando as intenções de
pontuação, pausa e de finalização das palavras. Cada vez que o observador
perceber uma intenção dúbia de pontuação ou de finalização, ele baterá uma
palma. O aluno que está dizendo o texto sairá do círculo e esperará até
outro aluno também receber uma palma, e, então, trocarão de lugar. Quando
todos os alunos do círculo de dentro tiverem terminado seus textos, os
círculos se inverterão.
b. Nos mesmo círculo, os atores escolherão um momento do texto para dar
uma pausa longa antes de continuar a frase. O observador deve perceber se a
pausa dada teve algum efeito no texto (suspense, atenção, esquiva,
incerteza, etc.). Quando todos os alunos do círculo de dentro tiverem
terminado seus textos, os círculos se invertem.
Duração: 25 minutos.
3. Roda de conversa: Perguntar para eles como foi esse exercício para cada um. O
que funcionou e o que não funcionou? O que poderia ter faltado/acrescido para
que funcionasse?
Duração: 10 minutos.
- Trabalhar a pontuação é muito bom para a gente entender o que o texto está
querendo dizer, mas às vezes não funciona porque fica muito marcadinho. Isso
não é bom para a cena. Nesse caso as pausas são mais interessantes.
As conversas que temos em sala de aula são de suma importância para mim, pois
a partir delas posso alterar/enriquecer minha didática e modificar pontos nos planos de
aula a fim de atingir, da melhor maneira possível, meus objetivos. Nesta aula, a partir
das duas observações acima e de outras, eu e os alunos pudemos sistematizar um
pequeno roteiro de leitura inicial ideal do texto para a melhor compreensão de suas
palavras, pontuações e intenções, a saber:
38
Ibidem.
43
Aula 5
Duração: 10 minutos.
2. Exercício 1:
a. Espalhados pela sala, os alunos se deitarão pelo chão e procurarão relaxar e
aquietar a mente ouvindo músicas que se adequem a esse objetivo – nesta
aula, será usada música do Reiki39.
b. Em seguida, cada ator, em separado, registrará por meio de desenhos e/ou
textos, em uma folha de papel, as imagens que lhe ocorrerão sobre o seu
texto, a partir das minhas indagações: Onde acontece a cena? Quais os
objetos estão na cena? Quais são as cores da cena? Quem são os
personagens? Qual é a situação? Existe conflito? Qual é o clima do texto?
Qual é a “sensação” que esse texto te transmite? Etc.
Obs.: Procedimento proposto a partir de aulas semelhantes de Helena
Mauro na busca de imagens/memórias que “preencham” as palavras durante
39
Opto por utilizar músicas relacionadas ao Reiki, por elas conterem, de alguma forma, mecanismos que
auxiliam a aquietação da mente, o relaxamento corporal e mental e a imersão em qualquer exercício
proposto.
44
Duração: 15 minutos.
3. Exercício 2: Em dupla, cada ator dirá o texto para o colega pensando nessas
imagens que concebeu e tentará transmitir, vocalmente através do texto, as
mesmas imagens para o seu colega. O ouvinte irá dizer quais imagens ele pôde
perceber e analisarão se as imagens ditas e as imagens ouvidas são similares.
Obs.: Exercício similar é praticado nas aulas de Ernani Maletta, com o objetivo
de intensificar a importância das imagens na palavra.
Duração: 15 minutos.
Duração: 10 minutos.
Jogo Extra: Pedir aos alunos que procurem associar o texto a alguma
situação/memória por eles vivida (Nos exercícios em geral, se busca a criação da
memória a ser aplica ao texto, mas pode-se usar uma memória já existente do
próprio ator. Neste caso, não existe relação com o conceito de Memória Emotiva
de Stanislavski).
cenas respaldadas por imagens, foi perceptível a existência de semelhanças nas imagens
ditas e ouvidas pelos alunos. Um aspecto interessante desse jogo foi como os alunos
ficaram felizes ao “acertarem” a imagem um do outro, por perceberem que é possível
transmitir uma imagem através da voz, e esta ser compreendida pelo público. Uma das
frases que registrei durante a Roda de Conversa final que me trouxe a constatação de
estar trabalhando a favor dos objetivos, aos quais me propus foi:
Aula 6
1. Preparação:
a. Explicar a importância dos verbos, que geram ação e dão movimento ao
texto, e que são fundamentais para se dizer o texto com o sentido definido
pelas regras linguísticas segundo as quais ele foi escrito. Diferenciar os
verbos transitivos (e de ligação) dos intransitivos.
b. Pedir para que marquem no texto os verbos e escolham um ou dois verbos
que geram e/ou guiam determinadas ações no texto.
40
Cf. nota 37.
46
2. Exercício:
a. Ao longo da sala, cada grupo refará alguma cena escolhida por eles. Cada
ator escolherá em seu texto um ou mais verbos e criarão uma sequência de
três gestos que caracterizem o(s) verbo(s), com início, meio e fim da ação.
b. Cada ator, após repetir e decorar sua sequência, irá dizer o texto
simultaneamente aos gestos, deixando-os influenciar a fala, e ao mesmo
tempo, disponibilizando seu corpo para ser por ela influenciado.
c. Repetirão a cena para os colegas, sem os gestos, mas mantendo a intenção
da fala.
Duração: 30 minutos.
Duração: 10 minutos.
Jogo Extra: Fazer o mesmo exercício com um gesto que se oponha ao verbo
escolhido por ele.
- Esses exercícios fazem com que o texto vá para o corpo e deixe de ser mental.
- Seria bom se você pudesse direcionar a escolha do verbo no texto para gerar
as ações, os gestos e tal. Do jeito que foi, eu fico muito perdido e não consigo
escolher o melhor verbo.42
41
“Pega-dos-nomes” é um jogo de pega-pega normal, mas que para não ser pego, o aluno precisar ter o
pensamento rápido para dizer o nome de outro aluno que também esteja jogando. O aluno que teve o
nome dito se transforma no novo pega. Sai do jogo o aluno que foi pego e não conseguiu dizer o nome de
nenhum aluno, se tiver dito o seu próprio nome ou se disse o nome de um aluno que não está no jogo ou
já foi eliminado.
42
Cf. nota 37.
48
Aula 7
Duração: 10 minutos.
2. Exercício:
a. Todos os alunos irão para o lado externo do prédio do Teatro e cada grupo
fará sua cena de olhos fechados, focalizando os conceitos de Della Monica e
procurarão sentir corporalmente a sua diferença.
b. A partir de algumas ponderações minhas e de outros alunos, refarão a cena
novamente de olhos fechados, buscando sentir corporalmente a diferença da
emissão vocal.
c. Por fim, todos refarão suas cenas de olhos abertos.
43
É importante observar que, na turma, há alunos que já fizeram anteriormente a disciplina Estudos
Vocais e Musicais A, com Maletta e, portanto, já conhecem as bases do pensamento de Della Monica, mas
há também alunos que não a fizeram.
49
Duração: 30 minutos.
3. Roda de Conversa final: Perguntar aos alunos qual foi a diferença da sensação
interna ao fazer o exercício.
Duração: 10 minutos.
Em decorrência do Festival de Tortas,44 tive que iniciar a aula com uma hora de
atraso em relação ao que foi programado, pelo fato dos alunos estarem demasiadamente
envolvidos com o festival. Realizamos a aula, inicialmente em sala com a Roda de
Conversa Inicial, e em seguida, demos continuidade, de acordo com o plano de aula
sugerido acima, em um gramado próximo à saída da Universidade Federal de Minas
Gerais pela Avenida Antônio Carlos. O trabalho na área externa do prédio foi proposto
a fim de que os alunos obtivessem uma maior sensibilização do espaço e de seus corpos
ao fazerem o exercício em um lugar novo e pouco usual para aulas.
A Roda de Conversa final também ocorreu nas dependências externas do prédio,
do qual obtive como retorno os seguintes pensamentos:
44
O Festival de Tortas foi um evento proposto pela turma em comunhão com Ernani Maletta com a
intenção de arrecadar fundos para a disciplina para o espetáculo decorrente da disciplina Prática de
Criação Cênica A.
50
- Exercícios de voz no geral são difíceis porque são muito abstratos, mas os
exercícios da Francesca são bons porque dão concretude ao trabalho.
- Acho que por minha voz ser mais aguda é difícil pensar em mandar a voz
para as laterais.
- Pra mim é mais fácil perceber essas mudanças quando estou sozinho, quando
têm outras pessoas me olhando eu não escuto. 45
45
Cf. nota 37.
51
Aula 8
Duração: 10 minutos.
“Deus” chamará cada grupo de jogadores, que, atendendo pelos nomes de seus
personagens, deverão abrir e fechar os olhos assim que solicitados, bem como
46
Máfia (também conhecido como Mafioso ou Cidade Dorme) é um jogo de interpretação de
personagens em grupo, onde é preciso ter estratégia, senso de sobrevivência e ter a capacidade de
perceber quando as pessoas estão mentindo. O jogo se passa em uma cidade imaginária onde os cidadãos
e a máfia estão em conflito direto, lutando para sobreviver (Descrição retirada do site:
http://pt.wikihow.com/Jogar-M%C3%A1fia )
52
cumprir as instruções dadas pelo juiz. Tudo deverá ser feito silenciosamente,
para que a identidade de cada um não seja descoberta.
Duração: 25 minutos.
Duração: 10 minutos.
Jogo Extra: Em uma roda, cada aluno dirá o texto olhando para um interlocutor e
direcionando sua voz para outro interlocutor. Este, por sua vez, baterá uma
palma para mostrar, ao aluno que diz o texto, que se sentiu incluído durante a
fala dele.
53
Aula 9
47
Cf. nota 37.
54
Cronograma da atividade:
Duração: 15 minutos.
Duração: 25 minutos.
Duração: 10 minutos.
Aula 10
Objetivo: Explorar tudo o que foi feito anteriormente, a fim de construir uma
paisagem sonora.
Estratégia: Reconstruir as cenas sem o uso do texto visando a ampliação da
paisagem sonora do texto.
Cronograma da atividade:
1. Exercício:
a. Os grupos que foram previamente criados para a criação das cenas na
disciplina Prática de Criação Cênica A serão divididos pela sala, a fim de
ensaiarem e apresentarem uma nova versão da cena. Eles tentarão mesclar
todo o conhecimento adquirido nas aulas anteriores para reconstruir a cena a
partir de sons que possam ser produzidos por meio de elementos presentes
na sala onde está sendo realizada a aula (chão, cortina, porta, etc.), objetos
(latas, papel, bacias, etc.) e instrumentos musicais, que podem ser
ressignificados48. Assim, tentarão construir uma paisagem sonora diferente
para cada cena. Nesse sentindo, ao retirar a fala e trabalhar outros elementos
sonoros da cena, intenta-se a busca de outros meios de contribuição de
sentindo para o texto que não seja, somente, o vocal.
Obs.: Proposta de exercício baseada nas aulas de Helena Mauro sobre
paisagem sonora e histórias populares.
Duração: 15 minutos.
48
Trata-se do uso não convencional do instrumento musical proposto por Ernani Maletta. Nele, o objetivo
é “tirar sons” do instrumento musical de formas variadas buscando sons que não sejam o natural do
instrumento, Por exemplo, utilizar a madeira que é feita o violão e “tirar sons” de percussão, em vez de se
utilizar as cordas.
56
Duração: 20 minutos.
Duração: 15 minutos.
Jogo Extra: Por essa ser a última aula, caso sobre tempo ao final da aula, não
haverá jogo extra e sim, mais tempo para a Roda de Conversa final.
Outro ponto positivo do meu contato com os alunos foi a abertura entre nós para
o diálogo. Houve alguns dias no decorrer do mês que estivemos juntos, onde eu precisei
abrir mão de algumas aulas que daria no dia para que os alunos ensaiassem,
apresentassem suas cenas ou para outras finalidades que a Montagem exigia (Bazar,
Festival de Tortas, etc.). Por parte deles também houve a mesma cooperação e
disponibilidade em negociar outras datas para que eles não perdessem minhas aulas.
Quanto às dificuldades que enfrentei, reitero o fato de não ter conseguido manter
o interesse dos 20 alunos da turma, de modo que trabalhei com uma média de 8/9
alunos. Somente na primeira aula e na aula 8 tive a maior parte da turma presente. Posso
atribuir essa pequena evasão a vários motivos, entre eles à minha pouca experiência em
lecionar para estudantes de Teatro.
Acredito que ainda existam muitos pontos em minha didática como professora
que precisam ser trabalhadas para uma melhor desenvoltura, dos quais destaco:
minha dicção vocal, já que, vez ou outra acabo embolando as palavras por
pensar mais rápido do que consigo falar – citando Della Monica, ela em suas
aulas comenta sempre que “a velocidade do pensamento é maior do que a
velocidade da palavra”;
a velocidade da minha fala, que credito à minha ansiedade e ao nervosismo em
explicar o que pretendo falar;
minha pouca habilidade em exemplificar o que estou falando, devido à minha
pouco experiência como docente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Princípios:
1. Tratar o texto como voz da polifonia cênica, igualmente importante nos
processos de criação teatral – e, mesmo em processos nos quais a
palavra não se encontra explícita, implicitamente se preserva na cena.
2. A consciência dos parâmetros que constituem e alteram o fenômeno
vocal.
3. O fundamental uso de imagens na emissão vocal, para ampliar o sentido
e as possibilidades comunicativas da palavra;
4. A consciência da espacialização vocal e das diversas dimensões
espaciais da voz, durante a emissão vocal;
5. A noção básica de linguísticas do idioma no qual o texto foi escrito;
6. A consciência do conceito de interlocutores diretos, indiretos,
específicos e genéricos, a fim de incluir um maior número de
espectadores na fala.
Procedimentos:
1. Exercícios que trabalhem com a estrutura/construção da frase, de
acordo com as regras linguísticas do português;
2. Exercícios que associem movimentos corporais ao texto;
59
REFERÊNCIAS
COSTA, Istéfani Pontes da. Diários de Bordo I. Belo Horizonte: Teatro Universitário
(UBAP/UFMG), 2011, 2012, 2013, NÚMERO DE FOLHAS ESCRITAS (37f.). Notas
de aulas ministradas pela Profa. Helena Leite Mauro, nas disciplinas Expressão Vocal I,
II, III, IV e Interpretação Dramática IV do Curso de Formação de Ator.
COSTA, Istéfani Pontes da. Diários de Bordo II. Belo Horizonte: Escola de Belas
Artes da UFMG, 2012, 2013, 2014, 2105. (79f.). Notas de aulas ministradas pelo Profa.
Ernani Maletta, nas disciplinas Prática de Criação Cênica A, Estudos Vocais e
Musicais A, Estudos Vocais e Musicais B, Estudos Vocais e Musicais C do Curso de
Graduação em Teatro da EBA/UFMG.
COSTA, Istéfani Pontes da. Diários de Bordo III. Belo Horizonte: Escola de Belas
Artes da UFMG, 2012, 2013, 2014.(22f.). Notas de aulas ministradas pela Profa.
Francesca Della Monica, nas oficinas por ela ministradas nas datas: novembro de 2012,
4 a 7 de Novembro de 2013. 17 a 19 de maio de 2014.
MALETTA, Ernani de Castro. Ação Vocal e Atuação Polifônica. In: MERISIO, Paulo;
CAMPOS, Vilma (Orgs.). Teatro: Ensino, Teoria e Prática. Uberlândia: Editora da
Universidade Federal de Uberlândia. No prelo. p.1-11. 2009
MALETTA, Ernani de Castro. A dimensão espacial e dionisíaca da voz com base nas
propostas de Francesca Della Monica: resgatando liberdade expressiva e
identidade vocal. Revista Urdimento, v.1, n.22, p.39 – 52. 2014.
NOVELLY, Maria C. Jogos Teatrais: Exercícios para Grupos e Sala de Aula. São
Paulo. 12ºed. Papirus Editora.p.17-45. 2010.
SISTO, Celso. Textos e pretextos sobre a arte de contar histórias. 1 ed. Chapecó:
Argos. p. 04-22. 2001.
SPOLIN, Viola. O Jogo Teatral no Livro do Diretor. São Paulo: Perspectiva. 2º ed. p.
13-15. 2008.
SPOLIN, Viola. Jogos Teatrais: o fichário de Viola Spolin. São Paulo: Perspectiva.
2ºed. p.8. 2008.
64
ANEXOS
- Como você sintetizaria a ideia de Polifonia Cênica? Por que optou por diferenciá-
la da Polifonia na Música?
49
Durante a entrevista, havia a presença de outras duas pessoas, membros do LiberaVox – Grupo de
Pesquisa sobre a Vocalidade e a Musicalidade da Polifonia Cênica/CNPq, liderado por Maletta, que
acompanharam as suas respostas às perguntas por mim formuladas, sem se manifestar.
66
não necessariamente tem que ser a voz falada, ou ser sonora. “Voz”, no sentido da
etimologia, é a manifestação do desejo, da vontade, do pensamento, da necessidade ou
do sentimento do agente da voz. Então, uma pessoa pode mostrar a sua voz por meio de
um gesto. Por exemplo, quando uma pessoa está com raiva e dá um soco na cara da
outra. Numa conceituação mais profunda e ampla, ela demonstrou a voz dela,
demonstrou naquele momento o desejo de agredir o outro ou a raiva que ela tem
daquela pessoa, e não necessariamente ela precisaria ter gritado, berrado, falado
qualquer coisa ou ter feito qualquer som, porque a “voz” é a manifestação do que a
pessoa tem desejo de expressar. É a manifestação do ser. Eu falo que a voz é o
fenômeno que mostra o ser se manifestando. Na verdade, o que estou dizendo não é
uma metáfora... é mais complexo ainda. Estou dizendo que o gesto é voz, o movimento
é voz, imagem é voz se ela, naquele momento, tem a função de manifestar o sentimento
do agente que a está produzindo.
Partindo desse princípio, de que polifonia é uma diversidade simultânea de
manifestações, a gente pode usar para isso uma expressão interessante, que é “o ponto
de vista que se tem sobre uma coisa”. Por exemplo, quando faço uma reunião para
definir determinadas regras e cada uma das pessoas se manifesta dando o seu ponto de
vista particular sobre um tema, logo as pessoas estão expressando as suas vozes, que é
uma manifestação. Uma das pessoas pode não falar nada pela boca dela, mas pode
distribuir uma imagem e isso é a voz dela, isso é a manifestação dela, é o desejo de se
manifestar. Então, a polifonia, quando eu reúno num evento único diversos pontos de
vista sobre um determinado tema, não é a somatória desses pontos de vista, mas um
único ponto de vista que surge em função do entrelaçamento deles.
O Teatro é uma manifestação que se expressa por intermédio de diversos pontos
de vista simultâneos, sendo eles: sonoro, verbal (da palavra), imagético e corporal. Na
medida em que eu focalizo essas vozes (focalizo a separação) fica parecendo que eu
estou sendo contraditório ao próprio fenômeno que é um entrelaçamento, mas na
verdade eu realmente focalizo com o objetivo de mostrar que cada uma delas
isoladamente não é Teatro. Porque, quando a gente vê um fenômeno teatral, não
significa que na hora que eu estou assistindo ao fenômeno teatral, digo: “Ah, eu estou
vendo o movimento + voz + palavras + imagem, que virou Teatro”, não é isso! Eu não
individualizo pra entender o movimento, eu vejo o movimento em si, mas para entender
a complexidade desse fenômeno eu preciso entender que ele tem uma trama que de
alguma maneira se refere a esses quatro pontos de vista.
Por exemplo, na medida em que os alunos focalizam apenas um desses discursos,
para fazer Teatro eles vão perceber que não se pode ter só aquele discurso.50 A ausência
dos outros vai ser extremamente importante para mostrar a necessidade da presença
deles. É aquela velha história, eu só lembro que fazia falta quando eu perco, porque
quando eu tenho não percebo que existe... aí, quando eu não tenho mais, eu penso “uai
gente, alguma coisa está errada”.
Então, se eu for traduzir polifonia em uma única frase, eu diria: a polifonia é a
manifestação simultânea de diversos pontos de vistas hierarquicamente iguais, sem
nenhuma distinção hierárquica. Polifonia tem duas palavras chaves: simultaneidade e
equipolência. Ou seja, está tudo ao mesmo tempo e nenhuma coisa é mais importante
que a outra. Isso é o fenômeno: equipolente e simultâneo.
50
O professor faz referência aos alunos da disciplina Prática de Criação Cênica A, por ele ministrada
neste primeiro semestre de 2015. Como uma das primeiras atividades da disciplina, a turma foi dividida
em quatro grupos; cada grupo deveria fazer uma proposta de cena focalizando apenas uma das instâncias
discursivas, entre quatro: imagem, movimento, palavra e som.
67
- Em relação aos exercícios de texto que você propõe em sala de aula, quais são os
parâmetros nos quais você se baseia para criá-los? Existe algum mote ou foco
principal?
pessoa a fazer desse jeito é a obrigação de acertar sem saber muito bem o quê,, que leva
ao desespero causado pelo medo de não acertar. Assim, o corpo responde se travando
ainda mais.
As pessoas às vezes são muito sincrônicas, no sentido em que a Francesca fala: ela
fala palavra por palavra, porque ela está tão preocupada em não errar a palavra, em não
passar pela vergonha de trocar uma palavra pela outra, que ela acaba errando de tão
nervosa que ela está. Durante a leitura, como ela foca a palavra, ela não foca a relação
das palavras entre si, então ela vai ler palavra por palavra. Quando ela lê palavra por
palavra, ela dá entonações que só teriam sentido se as palavras fossem isoladas, mas não
têm sentido quando estão em relação com três ou mais palavras seguidas. Por exemplo,
quantas pessoas começam a ler uma frase e só descobrem que é uma interrogação na
última palavra... Então, para atender ao sinal de interrogação, ela simula um desenho
sonoro de interrogação que não tem sentido nenhum com o que ela leu anteriormente. O
que acontece muito é as pessoas lerem muito rápido, como uma saída pra ficar livre
daquilo, mas se você perguntar alguma coisa sobre o que ela leu, ela não vai saber. Na
verdade, ela não está prestando atenção naquilo que ela está lendo... ela está prestando
atenção nas sílabas que ela está juntando pra articular e não errar..
Vou dar um exemplo da Música: a pessoa que lê a primeira vista em Música
começa a desenvolver essa habilidade pela capacidade de perceber que determinados
fenômenos se repetem. Então, por exemplo, a pessoa sabe que em um determinado
estilo musical, toda vez que aparecer o acorde X é bem provável que, depois dele,
apareça o acorde Y. Então, isso vai desenvolvendo na pessoa uma capacidade de, na
hora em que ela vê uma coisa, já sabe... ela já intui o que vem depois. É como se na
leitura do texto você, ao encontrar determinadas construções linguísticas, já soubesse
que deveria pensar nessa ou naquela ideia.
No fundo... nós todos, por mais diferentes que sejamos, para nos comunicarmos
precisamos estabelecer alguns tipos de mecanismos, que não são recriados a cada
segundo. Ou seja, existem formas, estruturas, que mesmo não sendo idênticas, acabam
nos conduzindo pra ideias específicas. Tem horas, por exemplo, que a gente sabe que
determinadas adversativas levam a gente pra algum lugar. Se o autor começa com
“entretanto”, a gente já sabe mais ou menos o que ele vai querer dizer... você sabe que
quando tem uma conjunção adversativa na primeira palavra – um “mas”, um
“entretanto”, um “todavia”, um “contudo” –, essas palavras sozinhas já te dão um clima
do que virá depois. Você já sabe que a pessoa vai falar uma coisa que, de alguma
maneira, vai de encontro, em oposição ao que estava vindo antes. É como se seu corpo
já se preparasse para criar uma entonação ou uma estrutura rítmica que tem a ver com
essa adversativa. Quando eu leio textos de alunos que usam adversativas
incorretamente, é muito engraçado... A gente lê, cria uma expectativa e depois vem um
negócio que não tem nada a ver com aquilo. Tem gente que põe “mas” em qualquer
circunstância, quase como se fosse uma interjeição... e muitas vezes não quer criar uma
situação adversativa...
A minha preocupação é entender o texto como está escrito, que tem uma lógica
própria, independente daquela que eu queria que ele tivesse – como diz Francesca,
entender o sentido do texto antes de interpretá-lo. Eu acho que a estratégia principal que
se deve usar é a prática da leitura buscando o sentido completo da frase. Porque na hora
que eu busco o sentido completo da frase, as relações entre as palavras passam a ser
mais importantes do que as próprias palavras isoladamente. São essas relações que eu
tenho que estabelecer.
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Uma das estratégias é descobrir quais são as palavras fundamentais de uma frase,
das quais não se pode abrir mão para que seja preservado o seu sentido. Eu chamo isso
de exercício do Telegrama, como uma proposta para que os atores leiam e encontrem
esses focos, ou seja, palavras que, se eu abrir mão de uma delas, é bem provável que o
interlocutor não entenda o que eu quero realmente dizer.. Com isso, eu quero buscar o
mínimo de palavras que, por meio das relações entre elas, crie o entendimento. Depois,
devemos fazer uma espécie de “análise morfológica e sintática”, que exercite a minha
capacidade de perceber, à primeira vista, como uma palavra se relaciona e modifica a
outra.
Outro exercício que eu gosto muito de propor tem o propósito de conscientizar as
pessoas daquilo que eu chamo de “pecados mortais da leitura”. Normalmente, o que a
gente faz e que atrapalha muito a nossa vida é criar melodias e estruturas que se
repetem, sem entender porque se repetem, e ficam se repetindo o tempo inteiro. Essas
estruturas fazem com que a gente tenha melodias e ritmos muito parecidos, desenhos
para o agudo e para o grave muito parecidos, independentemente daquilo que eu estou
falando. Então é muito comum que as pessoas comecem as frases sempre do mesmo
jeito, que elas terminem sempre do mesmo jeito, que elas escolham uma palavra que,
apenas por estar no meio da frase, é enfatizado para evitar que a leitura seja monótona.
Na verdade, quando eu desejo de verdade dizer alguma coisa a uma pessoa,
preciso realmente que ela entenda o que digo. Por isso, meu corpo se disponibiliza para
que eu crie determinadas formas de dizer as palavras e criar as relações entre elas, sem
perceber racionalmente o que fiz. Porém, na hora de uma leitura teatral, esse desejo real
não existe, isto é, se uma personagem deseja dizer à outra que a ama, não significa que o
ator que faz a personagem também sinta verdadeiramente o mesmo. Então eu tenho que
inventar outro desejo: o desejo de que a plateia acredite que eu estou dizendo uma
verdade. Para tanto, devo em primeiro lugar conhecer os parâmetros, os recursos que
fazem com que a gente altere o jeito de dizer a coisa. Assim, estimulo as pessoas a ter
consciência desses fenômenos, que fazem com que as palavras mudem de sentido:
velocidade, ritmo, entonações (do grave para o agudo e vice versa), timbre, entre outros.
Muitas vezes, peço às pessoas às vezes para lerem textos, sem qualquer tipo de
julgamento ou expectativa, usando artificialmente determinados parâmetros, para que
ela tenha consciência deles. Por exemplo, proponho ler o texto começando rápido e
terminando lento ou vice-versa, com ou sem regularidade rítmica, com variações
exageradas de graves e agudos... Tudo isso para que sejam incorporadas essas
possibilidades, o que facilitaria para o corpo se disponibilizar e atender aos nossos
desejos de,parecermos críveis ao espectador..
Outro exercício que me agrada muito usar é estimular o corpo a encontrar as
formas de atender aos desejos de comunicação por meio de imagens. Para tanto,
associado a tudo que disse acima, peço aos alunos que desenhem imagens que julguem
relacionadas ao sentido do texto que está dizendo. Em seguida, os alunos trocam entre si
os desenhos, de modo que, cada um, vai procurar dizer o texto com um sentido sugerido
pelas imagens que o colega criou. Acredito que esse exercício estimule nossa
capacidade de criar e utilizar imagens como produtoras de sentido.
Então, resumindo isso tudo que eu disse: a ideia é colocar o corpo à disposição
para reagir ao desejo de comunicação do falante, estimulado pelo conhecimento das
regras linguísticas que ajudam a perceber as relações entre as palavras da frase, pela
consciência dos vícios de leitura que devem ser evitados, e por imagens que produzam
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palavra. Ou seja, essa estratégia primeira, lógica, determina o atingimento das imagens
que cada palavra chama. É aquilo que Ezra Pound fala, ou seja, o surgir da dança das
imagens, da dança da lógica, da dança da melodia. Ou seja, essa estratégia, que é lógica,
que determina também o respiro amplo da frase, significa também estabelecer o
relacionamento entre o ator, entre o cantor e os objetos que as palavras chamam, que
são diferentes por causa das memórias das vidas diferentes de cada um. Então, isso é um
objeto para preencher a palavra com as suas imagens. As memórias são estabelecidas
pelas memórias que são corporais, que vêm pelas portas sensoriais. Isso, então, significa
também acordar o corpo, significa acordar o corpo que começa a ficar presente na
matéria da voz. Então a voz fica com corpo, e não sem corpo, por intermédio do
processo que a memória – que é um processo lógico – determina. Isso é a primeira
estratégia que, geralmente eu faço, e que não é fácil.
Isso também determina outra pesquisa, que é a pesquisa da estrutura musical, da
estrutura rítmica, da estrutura das repetições, das ocorrências que são contidas na frase
mesma. É isso é uma outra estratégia, pois no guia, por exemplo, nas dinâmicas, nas
acelerações, nas dinâmicas do timbre, nas dinâmicas dos volumes, nas escolhas também
das alturas.
Uma outra pesquisa é a da pesquisa da pontuação, não somente no que se refere
às pausas – as porções do silêncio –, mas também porque cada pontuação determina
uma articulação do pensamento, que pode desenvolver uma velocidade diferente com
meus curtos circuitos mentais determinam. A pontuação pode determinar uma variação
de olhar, de ponto de vista, de perspectiva, pode determinar uma mudança de relação,
ou seja, o que eu estou falando para um ou dois interlocutores, de repente, o meu
interlocutor vira outro, por exemplo, pode virar um interlocutor genérico. A pontuação
pode ser a entrada de um lugar diferente de relação, de olhar, e de espacialização, e
também de posição da cena.
Isso é claro, falando, a descrição pode ser sistemática, mas tem também o meu
relacionamento com o texto. É claro que para enfrentar um texto você tem que ter uma
capacidade lógica, uma capacidade iconográfica de fazer uma tradução imediata entre
palavra e imagem, pois o Teatro na verdade... a definição em grego da palavra teatro é o
lugar onde a palavra se transforma em imagem, de onde por intermédio da voz você
permite ao público olhar, ver uma situação. Então, o que eu faço com os atores é
acordar estratégias para que a palavra e o pensamento possam ter uma tradução. Uma
tradução imagética.
- Durante as suas aulas, quais são as estratégias/exercícios usados por você para
alcançar o afloramento da palavra e do pensamento nos atores?
No começo, temos que abrir as perspectivas para os atores. Por exemplo, vocês
conhecem muito bem as minhas metáforas, as minhas imagens. Eu utilizo a metáfora da
“outra margem do rio”, utilizo a metáfora de “subir em cima da árvore”. Agora, uma
outra imagem que eu estou utilizando, é que o ator ou o cantor deveria utilizar é a
gestualidade vocal de um garçom que oferece uma taça de champanhe. O gesto é amplo,
o gesto é de oferecer... não joga a taça para o cliente, mas oferece. Oferecer o corpo
dele, antes de oferecer a bandeja, já sugere a disposição para oferecer. E isso deveria
ser, na minha opinião, o ataque da voz. ou seja, estabelecer todos os espaços, o corpo do
ator que deve reagir aos diferentes espaços, às diferentes relações e que tem que
considerar o espaço vazio entre as palavras como espaço de projetação dramatúrgica.
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Sim. Uma coisa é importante: nos últimos meses eu descobri uma perspectiva
que é muito importante e que está dando resultados muito bonitos. Ou seja, o que
determinaria a consciência de dois tipos diferentes de escuta. De escuta pelo ator e não
pelo público. Quando um ator está atuando, no mesmo instante que ele está atuando e
falando ele deve escutar o interlocutor direto ou indireto. A escuta, que é uma escuta
sensorial, por assim dizer, não pode ser uma escuta que acontece por intermédio do
ouvido. É claro, é uma escuta que acontece por intermédio dos outros sentidos, pelo
olhar, pelo cheirar, por tudo. É uma atenção, vamos dizer assim, ou seja, escutar o
interlocutor mantendo uma atenção febril, eu diria. Isso gera no ator uma atenção
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incrível e uma espessura dramatúrgica muito maior. É uma outra forma de escuta que
não acontece depois de ter falado, mas enquanto você está falando. E isso tem muito a
ver com o dialogismo. Por exemplo, você lendo um texto, já estabelece uma escuta do
texto e o texto também escuta você lendo. Ou seja, a hipótese de Bakhtin, que o escritor
está dialogando com você, então está te escutando, quando está escrevendo, e no
momento da leitura tem uma escuta recíproca.
Mas isso, no que se refere ao ator atuando, determina uma presença, uma
capacidade de fazer surgir imagens incríveis no texto. E o corpo do ator fica numa
situação de reação permanente. Antes – um ano ou dois anos atrás – eu sempre falava
isso: depois de ter falado tem que manter as portas sensoriais, a escuta, bem abertas,
pois é o momento do seu interlocutor. Mas agora te falo, não somente depois de ter
falado, tem que manter essas portas sensoriais abertas enquanto você está falando. Isso,
eu acho que seja uma das últimas conclusões da minha pesquisa, mas que está dando
resultados magníficos! O último ator que fala uma palavra está em um estado de
presença ativa permanente.
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Nas nossas aulas no Teatro Universitário, você sempre pontuava questões a fim de
direcionar o olhar dos alunos que estivessem escutando o conto e realizar a
apreciação crítica ao final. Quais são esses parâmetros?
tipo de encadeamento sonoro, uma musicalidade aparente, rasa, sem compreensão de sentidos. É
uma melodia de leitura, ou seja, como se ele estivesse lendo. A meu ver, é muito chato e pouco
verdadeiro. É um desafio retirá-la da voz. Para isso, é preciso entender o texto, mas também
“quebrar a quarta parede” que separa o artista do público. Escutar e perceber os ouvintes, se
abrir para relacionar com o momento presente, um estado do “aqui e agora”, tornando viva a sua
narração. Isto é um princípio fundamental da arte de narrar histórias.
A apreciação é baseada nesses princípios para que os alunos consigam desenvolver a
percepção sobre o fazer artístico do contador de histórias, do narrador oral. Um fazer no qual o
estudo do texto é a “peça chave” para conhecer o quê e o como será narrado. Além dos pontos
que citei, posso acrescentar outros a serem observados e que se correlacionam, como por
exemplo, perceber se a fala está audível ou se está rápida, se a respiração está equilibrada ou
não, se o narrador não está “comendo o final da frase”, se a fala está monocórdia, “chapada”,
com poucas nuances de intenções, sem planos sonoros que sugerem hierarquização e
encadeamento das ideias do texto. É preciso tramar uma rede de significações. Perceber qual é a
ideia principal, os pensamentos que são complementares e os comentários. Observar se o
narrador desenha sonoramente o texto e propõe planos de intenções. Estou falando sobre
organicidade. Uma fala orgânica é assimétrica, as intenções são maleáveis e musicais. A frase
pode sair do grave e ir para o agudo conforme a intenção. Mas não adianta desenhá-la sem antes
entender o sentido, se não a fala fica completamente formal e falsa, e isso distancia do ouvinte.
É necessário perceber a orquestra que é regida pelas palavras e pelo pensamento. É um processo
de trabalho que precisa de tempo para amadurecer e, na medida em se aprofunda, é possível
lapidar e cuidar dos detalhes. Isso faz a diferença.
Portanto, o exercício da apreciação está pautado nos seguintes parâmetros a serem
observados:
Compreensão do texto,
Apropriação da palavra,
Jogo entre memória, pensamento e narração oral,
Organicidade da fala,
Estado de presença/relação com os ouvintes de forma natural e sem
interpretações de personagens,
Utilização dos recursos técnicos e expressivos: espacialização da voz,
articulação (dicção), nuances sonoras, modulação da voz e musicalidade.
Encadeamento das ideias do texto e a relação com a construção de planos
sonoros e rítmicos: dramaturgia vocal.
Além dos exercícios de escuta e apreciação já mencionados acima, você faz outros
tipos de exercícios com os alunos?
2) Imaginar que você tem um baú a sua frente. É o seu baú de memórias. Você abre o baú
e o que vê? O que você tira dentro dele? O que aparece em suas mãos? Deixar sair da
sua mente os elementos da sua história. Ele é importante por quê? Trabalhar com sua
imaginação e intuição. Evitar racionalizar. Permitir que sua mente “brinque” com esses
elementos, brinque de fazer associações. Trabalhar com os sentidos. Construir afetos.
Ganhar informações sobre o objeto - ou até mesmo uma pessoa, um animal, etc – que
você tirou do fundo do baú. Perceber cor, cheiro, textura, som, volume. E assim, você
vai fortalecendo sua imaginação e fazendo conexões.
3) Trabalhar com ações físicas para “incorporar” as imagens, fazê-las chegarem até os
músculos, registrando no corpo as impressões e sensações. É um trabalho também sobre
memória. Você escolhe uma situação da história e se coloca dentro dela. (É um jogo
dramático). Estímulo: Veja o personagem X. O que ele está fazendo agora? Veja o que
ele faz. Você é esse personagem agora. Assuma-o em você, no seu corpo e reaproprie
das ações dele. E assim por diante. Nesse momento não tem fala. Esse é um exercício
essencial na segunda fase do projeto de contação de histórias, que faço com os alunos
do TU, pois é o momento em que o ator trabalha seu conto no contexto da representação
teatral. Posteriormente, são incluídas no jogo as ações vocais. Mas esse exercício pode
ser feito também na primeira parte da narração oral.
4) Caminhar pelo espaço e deixa sair frases do texto, livremente, sem se preocupar com a
lógica e concatenações entre elas. É possível fazer inúmeros desdobramentos a partir
desse mote inicial. Por exemplo: sua fala sofrerá influência do ritmo da caminhada;
incluir pausas na caminhada e perceber o que isso te afeta; parar e contactar um colega,
olhando para ele e, subitamente, contar um pequeno trecho da história, uma frase.
Deixar-se influenciar pelo momento, pelo instante de relação e reagir vocalmente. E
assim por diante. É um jogo. Esse exercício é muito bom para o aluno está com uma
forma “congelada” de dizer o texto e está fechado, sem reações. O inusitado faz ele se
desequilibrar, e isso é bom para descontruir uma forma pré-estabelecida. É bom também
para trabalhar prontidão e reação.
5) A mesma dinâmica do exercício anterior, mas agora o aluno vai dizer com as suas
palavras algum pequeno trecho da história. Esse exercício pode ser feito antes do que
foi citado acima, por exemplo.
sentido. Agora coloca o comentário no meio. Como você vai dizê-lo? Quantos planos
sonoros você pode desenhar a partir do sentido? E assim por diante.
Sim. É perceptível ver durante o trabalho que a fala do ator torna-se mais flexível,
ganha ritmos e entonações conectadas ao sentido. O ator vai apropriando da palavra. Porque está
compreendendo o texto. É interessante, porque o aluno toma consciência do que estava faltando
em relação à compreensão do texto. Sua motivação para o trabalho aumenta, muitos alunos
verbalizam com surpresa “nossa, agora eu estou entendendo o texto!”. Quando você apropria da
historia, ela não escapole de você, está em seu “corpomemória”, e ela sairá da sua boca,
quentinha, aquecida por você. Mas tudo é um processo, a “ficha” cai para cada aluno em
tempos diferentes. Mas normalmente eu vejo resultados satisfatórios com esses exercícios.
Ressalto a importância do trabalho de estudo de texto para o ator, em suas diversas
dinâmicas, para melhorar o trato com a palavra na atuação e até mesmo como narrador oral. Eu
estou falando disso porque estou pensando sobre ensino-aprendizagem. Percebo em sua vida
escolar, no Teatro Universitário, por exemplo, que o aluno amadurece seu trabalho de ator,
experimenta formas de se fazer teatro, trabalha seu corpo e sua voz, estuda história do teatro,
trabalha a palavra e o texto. Mas, de maneira geral, não é fácil acessar e (res)significar as suas
experiências com a palavra e o texto. Levar o que se aprendeu para outros contextos. É ainda
uma zona frágil. O trabalho com a palavra é uma investigação minuciosa. É preciso ler, estudar,
treinar. Precisa também de orientação.
Você tem mais alguma informação que gostaria de compartilhar para contribuir com a
monografia?