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EDUCAÇÃO PARA O SÉCULO 21

Mais exercícios, mais repetição e mais testes podem até resultar em uma nota
maior, mas não prepararão o aluno de forma integral e, muito menos, darão
conta de desenvolver todas as competências que ele necessita para
enfrentar os desafios do século 21. Enquanto o mundo abre espaço e cobra
que os jovens sejam protagonistas de seu próprio desenvolvimento e de suas
comunidades, o ensino tradicional ainda responde com modelos criados para
atender demandas antigas. A realidade é que o ser humano é definitivamente
complexo e, para desenvolvê-lo de maneira completa, é necessário
incorporar estratégias de aprendizagem mais flexíveis e abrangentes.

Uma das saídas para reconectar o indivíduo ao mundo onde vive passa pelo
desenvolvimento de competências socioemocionais. Nesse processo, tanto
crianças como adultos aprendem a colocar em prática as melhores atitudes e
habilidades para controlar emoções, alcançar objetivos, demonstrar empatia,
manter relações sociais positivas e tomar decisões de maneira responsável,
entre outros. Uma abordagem como essa pode ajudar, por exemplo, na
elaboração de práticas pedagógicas mais justas e eficazes, além de explicar
por que crianças de um mesmo meio social vão trilhar um caminho mais
positivo na vida, enquanto outras, não.

Longe de ser um modismo, a preocupaç a ̃ o com o desenvolvimento dessas


caracteri ́ s ticas sempre foi objetivo da educa ç a ̃ o e precisa ser entendido como
um processo de formaç a ̃ o integral, que na ̃ o se restringe à transmissa ̃ o de
conteú dos. Então o que muda? Para que consiga alcançar esse propósito,
a inclusão de competências socioemocionais na educação precisa ser
intencional.

“As competências socioemocionais são habilidades que você pode aprender;


são habilidades que você pode praticar; e s ão habilidades que você pode
ensinar”

“A gente está falando de uma mudança de cultura, de compreensão de vida,


do que a gente acredita que é o ser humano, o conhecimento, a aprendizagem
e de qual é o papel da escola”, explica Anita Abed, consultora da Unes co
(organização das Naç o ̃ e s Unidas para a Educaç a ̃ o e Cultura). “O
conhecimento em si deve ser amplamente significativo e prazeroso, algo da
ordem socioemocional”, diz.
A nova visão não implica em deixar de lado o grupo de competências
conhecidas como cognitivas (interpretar, refletir, pensar abstratamente,
generalizar aprendizados), até porque elas estão relacionadas estreitamente
com as socioemocionais. Pesquisas revelam que alunos que têm competências
socioemocionais mais desenvolvidas apresentam maior facilidade de aprender
os conteúdos acadêmicos. No livro “Uma questão de caráter” (Intrínseca, 272
págs), o escritor e jornalista americano Paul Tough vai além, e coloca que o
sucesso no meio universitário não está ligado ao bom desempenho na escola,
mas sim à manifestação de características como otimismo, resiliência e
rapidez na socialização. O livro ainda explica que competências
socioemocionais não são inatas e fixas: “elas são habilidades que você pode
aprender; são habilidades que você pode praticar; e são habilidades que você
pode ensinar”, seja no ambiente escolar ou dentro de casa.

EVOLUÇÃO DO DEBATE

A discussa ̃ o sobre o papel e a importâ ncia das competê ncias socioemocionais


ganhou corpo no mundo inteiro ao longo das ú ltimas dé cadas. Nos anos 90, o
surgimento do Paradigma do Desenvolvimento Humano, proposto pelo PNUD
(Programa das Naç o ̃ e s Unidas para o Desenvolvimento) e a publica ç a ̃ o do
Relató rio Jacques Delors, organizado pela Unesco, representaram um
importante passo para o debate sobre a importâ ncia de uma educaç a ̃ o plena,
que considere o ser humano em sua integralidade.

O primeiro texto coloca as pessoas no centro dos processos de


desenvolvimento e aponta a educação como oportunidade central para
prepará-las para escolhas e ajudá-las a transformar seu potencial em
competências. Já o relatório da Unesco sugere um sistema de ensino fundado
em quatro pilares: (i) aprender a conhecer, (ii) aprender a fazer, (iii) aprender
a ser, e (iv) aprender a conviver.

A partir desse momento, especialistas das mais diversas áreas, como


economia, educação, neurociências e psicologia, começaram a definir quais
seriam as competências necessárias ao alcance dos quatro pilares propostos e
se haveria outros grandes objetivos para o aprendizado. Para isso, os e studos
investigaram a relaç a ̃ o entre desenvolvimento socioemocional e
desenvolvimento cognitivo, bem como o elo de ambos com os diversos
contextos de aprendizagem (escola, fam i ́ l ia, comunidade, ambiente de
trabalho e etc.) e com diversos indicadores de be m-estar ao longo da vida
(renda, saú de e seguranç a, entre outras).

Segundo o especialista em educação de Hong Kong Lee Wing On, as


competências e habilidades listadas por essas pesquisas estão intimamente
conectadas com as chamadas soft skills (habilidades maleáveis, em livre
tradução), que compreendem um conjunto de características sociais,
reguladoras e comportamentais (Heffron, 1997; Heckman e Kaultz, 2012).
Também se relacionam com o conceito de capital social (Putnam, 1995), que
é determinado pelo nível de cooperação entre integrantes de uma
comunidade. Esses conceitos abrangem capacidades que se modificam a partir
de experiências e da interação com outras pessoas (por isso o termo soft, em
contraposição aos menos maleáveis inteligência e conhecimento , tal como
medidos por testes de desempenho e QI).
Mais recentemente, as atenções se voltaram a como levar para as escolas e
disseminar o desenvolvimento de compet ê ncias socioemocionais. Na esteira,
organismos multilaterais como a Organizaç a ̃ o para a Cooperaç a ̃ o e o
Desenvolvimento Econô mico (OCDE) passaram a produzir conhecimento
para apoiar governos e instituiç o ̃ e s a criarem poli ́ t icas e prá ticas voltadas
intencionalmente para a promoç a ̃ o dessas competê ncias, com apoio de
métodos específicos para este fim.

UMA TEORIA: BIG FIVE

Entre os psicólogos, tem crescido o reconhecimento de que é possível analisar


a personalidade humana em cinco dimensões, conhecidas como Big Five:
abertura a novas experiências, extroversão, amabilidade, consciência
(também traduzida como conscienciosidade, do inglês conscientiousness) e
estabilidade emocional (em inglês, usualmente identificada na carga de
instabilidade emocional, ou neuroticism). Os Big Five são resultado de uma
análise das respostas de questionários sobre c omportamentos representativos
de todas as características de personalidade que um indivíduo pode ter.
Quando aplicados a pessoas de diferentes culturas e em diferentes momentos
do tempo, as respostas a esses questionários demonstraram ter a mesma
estrutura, o que deu origem à hipótese de que os traços de personalidade dos
seres humanos se agrupam efetivamente em torno de cinco grandes domínios.

O pioneirismo da teoria é atribuído a Gordon Allport e colegas que, em


meados dos anos 30, buscaram nos dicionário s todos os adjetivos que
poderiam descrever atributos de personalidade (como por exemplo: “amável”,
“agressivo” etc). Na década de 40, Raymond Catell reduziu a lista de adjetivos
para 171 termos e depois os agrupou por afinidade em 35 conjuntos.

A partir dos anos 60, pesquisas de grande amostragem detectaram que cinco
fatores principais resumiam a variação existente. Os autores que mais
contribuíram ao modelo à época, considerados os “pais” da teoria, foram:
Lewis Goldberg, Robert R. McCrae e Paul T. Costa, Jerry Wiggins e Oliver
John.

Para ressaltar a importância do tema, John, que atua como professor de


psicologia na Universidade da Califórnia em Berkley e é autor do The Big
Five Personality Test, um dos mais robustos testes de avaliação dos traços de
personalidade, analisa que pela primeira vez na história é possível entender o
que acontece com os traços de personalidade. “Temos a chance de conectá -
los às escolas, e as competências socioemocionais são atributos que não
podemos subestimar”, afirma.
O professor de Berkley explica que a teoria dos Big Five tem sido comprovada
por diversos pesquisadores independentes ao redor do mundo. “É incrível que
estudiosos do Brasil também encontrem as mesmas respostas. Isso significa
que as pessoas podem trabalhar ju ntas em busca do que funciona, ao invés de
ficar dizendo que isso é meu ou seu. Eu não sou dono da teoria dos Big Five
e você não precisa me pagar royalties (compensações). Ela (teoria) funciona
como um código aberto”.

Domínios do Big Five

Grande parte das experiências desenvolvidas por pesquisadores utiliza escalas


e testes para medir aspectos particulares da personalidade e enquadrá -los em
ao menos um dos domínios dos Big Five. Abaixo, o esquema proposto por
John e Srivastava (1999) e citado em Almlund et al (2011) para enquadrar os
domínios capturados por escalas e testes nos cinco grandes grupos dos Big
Five:

Abertura a novas experiências: tendência a ser aberto a novas experiências


estéticas, culturais e intelectuais. O indivíduo aberto a novas experiências
caracteriza-se como imaginativo, artístico, excitável, curioso, não
convencional e com amplos interesses.
Consciência: inclinação a ser organizado, esforçado e responsável. O
indivíduo consciente é caracterizado como eficiente, organi zado, autônomo,
disciplinado, não impulsivo e orientado para seus objetivos (batalhador).

Extroversão: orientação de interesses e energia em direção ao mundo externo


e pessoas e coisas (ao invés do mundo interno da experiência subjetiva). O
indivíduo extrovertido é caracterizado como amigável, sociável,
autoconfiante, energético, aventureiro e entusiasmado.
Amabilidade: tendência a agir de modo cooperativo e não egoísta. O
indivíduo amável ou cooperativo se caracteriza como tolerante, altruísta,
modesto, simpático, não teimoso e objetivo (direto quando se dirige a
alguém).
Estabilidade Emocional: previsibilidade e consistência de reações
emocionais, sem mudanças bruscas de humor. Em sua carga inversa, o
indivíduo emocionalmente instável é caracterizado como preocupado,
irritadiço, introspectivo, impulsivo, e não -autoconfiante.

No infográfico abaixo, entenda a ligação entre grupos do Big Five e traços de


personalidade. O desenvolvimento das competências socioemocionais pode
ser benéfico tanto para um bom desempenho em matemática, como para ter
sucesso nas artes e, por que não, felicidade (clique em cada elemento para
ativar suas conexões).

IMPACTO

Aproximar o ambiente escolar do desenvolvimento de competências


socioemocionais cria espaço para um aprendizado m ais completo e tem
impacto no bem-estar ao longo de toda a vida. Isso porque, segundo o
pesquisador Oliver John, seres humanos são uma espécie muito sociável,
como as formigas e as abelhas, e suas características podem, sim, ser
aprimoradas antes e depois do período escolar.

É quase um lugar comum dizer que o mundo atual é complexo demais para
caber no currículo das escolas, mas o importante, segundo o pesquisador belga
Filip de Fruyt, é entender “por que algumas pessoas conseguem lidar melhor
com essa complexidade do que outras”. Para dar conta dessa tarefa, as escolas
do século 21 precisam descobrir como inspirar seus alunos enquanto eles
aprendem. Com estudos orientados e projetos, é possi ́ v el ajudar os alunos a
conhecerem o que gostam de estudar, como preferem aprender, o que os faz
desistir, em que costumam errar, quais emo ç o ̃ e s os dominam quando
fracassam ou sa ̃ o provocados. Em especial, estimul á -los a descobrir quais sa ̃ o
seus sonhos e de que forma persistir em alcan ç á -los.

Os resultados desta mudança de postura são sentidos na própria sala de aula,


como mostram pesquisas promovidas pelo Instituto Ayrton Senna e pela
OCDE. Alunos mais responsá veis, focados e organizados aprendem em um
ano letivo cerca de um terço a mais de matem á tica do que os colegas que
apresentam essas competê ncias menos desenvolvidas. Em português, os
efeitos são semelhantes, e alunos mais abertos e protagonistas têm seu
aprendizado impulsionado em um terço.
Com este novo cenário, abre-se a possibilidade de melhorar os índices de
desempenho tradicionalmente avaliados e, ao mesmo tempo, promover as
novas aprendizagens. Além disso, surge uma importante ferramenta para
reduzir as desigualdades dentro do sistema educativo e de elevar sua
qualidade, diminuindo inclusive os níveis de evasão. Segundo o artigo A
importância socioeconômica das características da personalidade, assinado
pelo professor Daniel D. Santos, da FEA -USP (Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo), o
diferencial de um indivíduo com estas competências bem desenvolvidas
também é sentido no mercado de trabalho e seu efeito é reco mpensado na
forma de maiores salários e menor período de desemprego.

EDUCAÇÃO.DOC - COMPETÊNCIAS DA NOVA ESCOLA

NA REDE ESCOLAR
CURRÍCULO

Sociedade decide currículo socioemocional no Canadá

Em 2009, o Ministério da Educação de Ontário, no Canadá, alterou as


diretrizes curriculares para que contemplasse o desenvolvimento de
habilidades socioemocionais nos alunos. A mudança se deu a partir de uma
necessidade percebida pelo distrito em formar os jovens de maneira mais
completa, tanto para o mercado de trabalho, quanto para a vida adulta em
geral. A rede de escolas de sua capital, Ottawa, desenvolveu um projeto
interessante para responder a essas novas demandas. Os seus resultados,
mesmo que ainda não tenham sido sistematizados, já estão sendo percebidos
pela comunidade escolar e servem de inspiração para redes de ensino de todo
o mundo.

No Canadá, os ministérios da Educação são regionais e cada distrito possui


autonomia para decidir como colocar em prática as diretrizes do governo. O
distrito de Ottawa possui 150 escolas, 70 mil alunos e 8.500 funcionários,
sendo cerca de 5 mil deles, professores e assistentes pedagógicos.

Jennifer Adams é a diretora de Educação dessa rede e, segundo ela, a diretri z


do ministério de atribuir às escolas a responsabilidade de promover a
aprendizagem, mas também o bem -estar dos estudantes, se somou a uma
necessidade que já era sentida pela comunidade escolar: a formação dos
estudantes para a vida. Para atrelar aos cont eúdos acadêmicos o
desenvolvimento de habilidades socioemocionais, a rede elaborou um plano
de ação que envolveu professores, gestores, empresários, representantes da
comunidade e os próprios alunos.

Em um primeiro momento, diretores e gestores fizeram uma reflexão sobre


quais habilidades gostariam que os estudantes tivessem quando deixassem a
escola. Já com esse pensamento aguçado, fizeram uma grande consulta
pública, envolvendo professores, estudantes, funcionários das escolas,
membros da comunidade e empresários locais no debate.

“O que surgiu claramente desse processo foi que o papel da escola não pode
se restringir apenas às competências acadêmicas, mas que tem toda uma gama
de habilidades sociais que precisam ser desenvolvidas. Entre elas, as
principais são: criatividade, espírito inovador e colaborativo, estar aberto a
novas ideias e lidar com desafios”, conta Adams.

Iniciar essa mudança pela consulta pública, explica a diretora, foi importante
para deixar claro os principais pontos a serem trabalhado s e para o
entendimento de que essas habilidades deveriam ser consideradas desde o
início da vida escolar até o último dia de aula, através de um trabalho
constante e de desenvolvimento crescente, sempre estimulando a evolução.
“Assim, quando os alunos deixarem a escola e entrarem, não apenas no
mercado de trabalho, mas na vida adulta, serão pessoas mais preparadas e
seguras”.
A diretora também ressalta que, com o passar dos anos, desde que o trabalho
foi iniciado, as escolas perceberam que alunos estão obt endo melhores
resultados acadêmicos nas disciplinas tradicionais. “Conforme melhoramos o
desenvolvimento das habilidades sociais nos alunos, o desempenho
acadêmico acompanha os resultados positivos. E a melhora do desempenho
estimula o desenvolvimento das habilidades sociais. É uma relação de
equilíbrio e de troca”, pondera Adams.

O currículo inclui, por exemplo, estratégias para trabalhar resiliência com os


alunos, a fim de que, quando se depararem com problemas difíceis de
matemática, eles não desistam até encontrarem uma solução.

Na implantação dessa nova política pedagógica, a participação e engajamento


dos professores foi fundamental. Eles tiveram que deixar para trás o papel de
único detentor do conhecimento para assumir uma postura de mediador, de
facilitador da aprendizagem, estimulando discussões que ultrapassem os
limites dos conteúdos factuais. “Por exemplo, para explicar o papel do Canadá
na Segunda Guerra Mundial, o professor aborda menos fatos ou datas, coisas
que qualquer um pode acessar facilmente, e vai falar mais sobre como os
líderes canadenses mostraram resiliência no período”, exemplifica Adams.

Para viabilizar essas mudanças, os docentes da rede passaram por


capacitações e atividades de formação. “Mostramos para os professores que
eles iam ter suporte para se adaptar, que eles mereciam ter diferentes frentes
de apoio para ajudá-los a lidar com as necessidades dos alunos”, afirma
Adams.

Outro intuito do desenho do novo currículo é promover o pensamento crítico


dos estudantes. Por isso, os p rofessores são incentivados a realizar atividades
cujos objetivos e metas são definidos conjuntamente com os alunos, que
trabalham em duplas ou em pequenos grupos, para estimular a colaboração, a
criatividade e a inovação.

“Os docentes são encorajados a escolher recursos de aprendizagem que


auxiliem os alunos a falar explicitamente sobre habilidades socioemocionais.
Por exemplo, quando se estuda um romance, eles podem ser questionados
sobre como o personagem principal demonstra resiliência, ou qualquer outr a
habilidade, e depois comparar esse comportamento com o de outros
personagens de outros livros ou filmes”, ilustra a diretora.
O maior desafio para os professores, no entanto, foi aumentar o uso de
tecnologias na sala de aula, segundo a diretora. As escolas da rede são adeptas
do Bring Your Own Device, em que os alunos levam seus próprios
equipamentos, como celulares e tablets, pa ra usar em sala de aula. “Estamos
tentando criar um ambiente onde a tecnologia é um suporte para boas práticas
educacionais”, diz a diretora, que completa: “Para isso, estimulamos que os
alunos ajudem a desenvolver a capacidade de seus professores de usar essas
tecnologias de formas que façam sentido no processo de aprendizagem dentro
da escola”.

Uma das maneiras escolhidas para assegurar que todos entendessem a


importância dessa mudança foi inserindo no boletim escolar os conceitos de
avaliação dessas competências antes das notas das disciplinas tradicionais.
Os alunos também passam por processos de autoavaliação, que os permitem
analisar seu processo evolutivo e identificar as ações da escola que
garantiram esse desenvolvimento.

FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Ceará prepara professor para escola com a cara da juventude

Despertar o interesse e garantir a aprendizagem do estudante do ensino médio


estão entre os maiores desafios da educação brasileira. O mais recente alerta
veio com a divulgação dos resultados do Índi ce de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb) de 2013, em que o país repetiu os 3,7 registrados em
2011 e ficou abaixo da meta proposta pelo MEC (Ministério d Educação) de
3,9. Apesar do quadro desolador, existem, sim, experiências que buscam virar
a chave para dar sentido à experiência escolar e valorizar o aluno.

Foi diante desse cenário que o estado do Ceará começou a mudar a cara de
suas escolas. Em 2009, levou aos colégios a metodologia do programa
Com.Domínio Digital, realizado em parceria com o Instituto Aliança, que
oferecia aulas de tecnologia da informação no contraturno escolar. Dois anos
mais tarde, a Secretaria de Educação do Estado do Ceará (Seduc) percebeu a
necessidade de realizar uma maior integração desses conteúdos à grade
regular das escolas, após a Unesco divulgar um protótipo curricular que
defendia o protagonismo estudantil, a interdisciplinaridade, o ensino baseado
em projetos, a pesquisa e a abordagem de competências socioemocionais.
“A gente percebe que um fator crítico é a relação do profissional e da
instituição com o jovem, sua visão de mundo e seus anseios”

O primeiro passo foi pensar em um currículo que tivesse a cara da juventude.


“A gente percebe que um fator crítico é a relação do profissional e da
instituição com o jovem, sua visão de mundo e seus anseios”, diz Rogers
Vasconcelos, coordenador de aperfeiçoamento pedagógico da Seduc. “Era
importante que a história de vida dos alunos fosse pauta curricular. Estudantes
tinham que ter espaço para conhecer suas características e h abilidades sociais,
para falar de ética, sexualidade e projeto de vida”, diz.

Por mais que precisasse de ajustes, esse novo desenho curricular não colocou
tudo abaixo. Em vez disso, buscou articular o ensino das áreas de
conhecimento com ciência, pesquisa e trabalho, entendidos como eixos
integradores. Em 2012, a entrada dessas novas práticas na sala de aula da rede
estadual foi noticiada pelo Porvir. Inicialmente, o projeto foi adotado por 12
escolas (oito em Fortaleza, duas na região metropolitana e duas no interior)
que já participavam do Com.Domínio Digital. “Elas nos relatavam o quanto a
metodologia do projeto fazia com que o estudante tivesse autoestima elevada,
perspectiva positiva sobre a família e seu projeto de vida. Por isso, decidimos
casar o Com.Domínio Digital e os protótipos [da Unesco] com o que a gente
tentava implantar nas escolas”, afirma

Nascia ali o que ficou conhecido como “Núcleo Trabalho, Pesquisa e Práticas
Sociais”. De acordo com Vasconcelos, a partir do momento em que o
estudante é desafiado por um projeto, ele consegue enxergar a totalidade do
que lhe é ensinado, ao contrário do que acontece quando se trabalham as
disciplinas de forma isolada. “Quando desenvolve um projeto de pesquisa, o
estudante pode aproveitar o que estudou em história, física e química. É
vivendo a experiência da busca que ele consegue aprender de forma
integrada”. Desde 2012, o programa mais que triplicou a quantidade de
envolvidos, que já somam 25,6 mil estudantes em 87 escolas.

O ensino médio redesenhado no Ceará


Novo curso, novo aluno, novo professor
Para que a escola se apresentasse como um espaço para o aluno se manifesta r
e ter autonomia em seu próprio aprendizado, foi preciso olhar de uma outra
maneira também para a formação de professores. Isso porque o professor do
Núcleo exerce um papel de agente mobilizador e articulador dentro das
escolas, atuando com os demais docentes e com a equipe gestora, formada por
diretor e coordenadores pedagógicos.

Ao longo de 2012, equipes do Instituto Aliança e dos professores que deram


o pontapé inicial dos núcleos desenvolveram atividades diversas, com foco
em cinco grandes ações: 1) articulação de gestores, professores do Núcleo,
professores da Escola, técnicos da Seduc; 2) criação e estruturação do
material didático-pedagógico; 3) capacitação por imersão, continuada e em
serviço 4) monitoramento e avaliação do processo e 5) sistematiza ção da
prática.

“A metodologia busca provocar no professor uma reflexão sobre suas práticas,


crenças e sobre seu olhar diante de alunos com multiplicidade de sonhos e de
desejos com os quais ele vai ter que conviver na escola”

O conteúdo oferecido pelo Núcleo é implantado gradativamente até completar


o ciclo do ensino médio. São duas aulas semanais de duas horas para o
Desenvolvimento de Práticas Sociais (DPS) acompanhadas de uma hora de
Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), que facilitam a aquisiçã o de
habilidades digitais necessárias para a elaboração das pesquisas.

“A metodologia busca provocar no professor uma reflexão sobre suas práticas,


crenças e sobre seu olhar diante de alunos com multiplicidade de sonhos e de
desejos com os quais ele vai ter que conviver na escola”, explica Eveline
Corrêa, coordenadora do Instituto Aliança. Segundo ela, o importante é que o
docente entenda que isso também representa um ganho, e não um problema.
“Se tentar pela força, nunca vai chegar a um diálogo genuíno”.

Para tratar do impacto das dificuldades enfrentadas no dia a dia em sala de


aula, a formação de professores tem como foco o desenvolvimento
da autoestima do docente. Esse acaba sendo o maior desafio para o professor
do Núcleo, segundo a professora Ana Izab ela Nascimento, da Escola Estadual
de Ensino Médio João Mattos, localizada no bairro Montese, em Fortaleza,
no Ceará. “A relação entre professor e aluno numa disciplina de Núcleo é
sempre holística, porque está sempre na construção do Eu. Você está mudando
sua maneira de pensar e sua subjetividade”, diz. Ela conta que um facilitador
de sua relação com os estudantes foi a proximidade. “A principal conquista
aconteceu quando eles perceberam que eu estava disponível sempre que eles
precisavam. O trabalho não aconteceu somente na escola, mas também quando
eu estava em casa aos finais de semana, com emails, leituras e tutorias”.

O caminho para inserção da nova metodologia também precisa vencer alguns


obstáculos. Dentro das próprias escolas, existem professores qu e criticam a
proposta que supostamente tira espaço de matérias cognitivas como física e
matemática e “do conteúdo para o Enem”. Além disso, o trabalho de formação
que é intencionalmente mais participativo e questionador, deixa alguns com
o “pé atrás”. “Eles começam o ano questionando, mas mudam quando chega
a época da apresentação das pesquisas e percebem os meninos mais
motivados”, diz Eveline.

Ao mesmo tempo em que tenta tirar o educador da “zona de conforto”, a


metodologia o abastece para garantir maior segurança, com matriz curricular,
fichas pedagógicas e planos de aula. Além do material teórico, a formação
docente é apoiada em dinâmicas de grupo, supervisão técnica e estudos
temáticos. Nas reuniões, discute-se, por exemplo, o papel da escola pública e
do ensino médio e os professores participam de experiências que depois
realizarão com seus alunos. Logo no terceiro encontro de formação, acontece
o exercício chamado “Memória fotográfica”, quando cada educador apresenta
ao grupo uma fotografia marcante de seu passado. “Essa atividade fala muito
e fortalece o pertencimento e a identidade, porque eles passam a ser
reconhecidos por aquilo em que se dizem fortes”, diz Eveline. Ao reproduzir
a atividade com seus aluno, o professor já “sentiu na pele” os seus re sultados.

Por conta de experiências como essa, a professora Maria Flávia Coelho, do


primeiro ano da escola João Mattos, se diz transformada. Ela conta que
sempre se preocupou em inovar e “não deixar alunos parados”, mas essa
formação específica para o Núcl eo a ajudou a adotar um novo posicionamento
na sala de aula. “A preocupação com o bem -estar do aluno e seu protagonismo
era o que faltava. Hoje ainda dou aula de geografia em outra escola e percebo
como mudei nas minhas ações”. A estratégia tem dado
resultados com estudantes cada vez mais comunicativos e tomando a
iniciativa para envolver os demais em debates e atividades em grupo. “Eu
lembro da escola da Ponte, em Portugal, em que educadores atuam como
colaboradores. Hoje em dia, não cabe mais o autoritari smo em sala de aula.
Autoridade é importante, porém ter na cabeça que você é um colaborador
muda a forma de ver o aluno. Você passa a respeitar, a entrar na vida do aluno
e a entender por que ele não participou hoje, mas vai participar na próxima
aula”.

AVALIAÇÃO

Rio de Janeiro é pioneiro em monitoramento de competências


socioemocionais

Gestores e educadores que já desenvolvem intervenções e projetos voltados


para as competências socioemocionais dos estudantes frequentemente sentem
a necessidade de identificar se suas ações estão de fato causando algum
impacto positivo no desenvolvimento dos alunos. Apesar de muitas vezes o
resultado ser visível para aqueles que convivem com os jovens, poucos
métodos foram testados até hoje para indicar com mais prec isão esses efeitos.
Com o objetivo de ajudar a suprir essa lacuna, o Instituto Ayrton Senna reuniu
pesquisadores e divulgou, neste ano, um sistema de avaliação de
competências socioemocionais para ser usado por redes de ensino.

Um dos pressupostos da proposta é que a dinâmica de ensino e aprendizagem


proporciona um contato entre professores e estudantes que vai além da mera
transmissão de conteúdo e que, todos os dias, cada educador identifica como
andam seus alunos em relação à persistência, curiosidade e vontade de
aprender, sua capacidade de concentração, entre outras competências. Muitas
vezes, esses aspectos até são considerados no momento da avaliação de
desempenho, mas de maneira subjetiva e sem subsidiar práticas educativas
mais adequadas para suprir as necessidades específicas dos estudantes.

O trabalho de construção e uso de uma ferramenta de monitoramento de


competências socioemocionais tem, portanto, o papel de definir melhor os
critérios de observação dessas habilidades e utilizar esses indicador es para
orientar a própria atuação docente.

“Assim como no aspecto cognitivo, a avaliação de competências é uma etapa


essencial do processo educativo para identificar obstáculos, priorizar
objetivos e replanejar ações ao longo da trajetória escolar sem cai r no
achismo”

“Assim como no aspecto cognitivo, a avaliação de competências é uma etapa


essencial do processo educativo para identificar obstáculos, priorizar
objetivos e replanejar ações ao longo da trajetória escolar sem cair no
achismo”, afirma Tatiana Filgueiras, Coordenadora de Avaliação e
Desenvolvimento do Instituto Ayrton Senna. “No entanto, esse
monitoramento tem especificidades e não basta replicar métodos ou práticas
das avaliações de conteúdo”, defende.

Para construir o primeiro instrumento esco lar de avaliação dessas


competências em larga escala no Brasil, a equipe do Instituto contou com
apoio da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico) e reuniu os pesquisadores Daniel Santos, economista da USP, e
Ricardo Primi, psicólogo da Universidade São Francisco.

Em 2011, o grupo iniciou uma ampla revisão de instrumentos internacionais


voltados para avaliação de características pessoais, entre elas as competências
socioemocionais. Mais de 100 testes passaram pela análise, para que s e
pudesse identificar os itens mais adequados para o trabalho no ambiente
escolar que permitissem a interpretação de resultados pelo viés das cinco
dimensões relacionadas ao desenvolvimento pleno do ser humano (no campo
da psicologia, são as dimensões definidas pela teoria do Big Five).
Após o trabalho de seleção, os pesquisadores consultaram outros especialistas
em educação, construíram novos itens para o questionário brasileiro e
confirmaram, com análises estatísticas, que o novo instrumento era confiável
e captava aspectos socioemocionais a partir do autorrelato, ou seja, quando
os alunos falam sobre suas próprias características e habilidades.

Em outubro de 2013, com apoio da Secr etaria Estadual de Educação do Rio


de Janeiro, cerca de 25 mil estudantes do 5º e do 9º ano do ensino fundamental
e do 3° ano do ensino médio participaram da aplicação piloto desse
instrumento, denominado de sistema SENNA (sigla em inglês para “Avaliação
Nacional de Socioemocionais ou Não -cognitivas”). Além do questionário com
até 92 itens, o sistema coleta informações socioeconômicas e permite o
cruzamento com resultados cognitivos dos alunos e informações sobre
o ambiente de aprendizagem.

Resultados
Os resultados preliminares da aplicação do questionário indicam que jovens
com competências socioemocionais mais desenvolvidas tendem a ter melhor
desempenho escolar, e que é possível estimular essas competências com ações
promovidas por políticas públicas direcionadas para este fim. Ter em casa
mais de uma estante de livros, por exemplo, aumenta 40% a chance de uma
criança ser mais aberta a novas experiências, e alunos com essa característica
altamente desenvolvida tendem a conseguir um desempenho melhor em
português.

Isso porque, mantendo-se constantes as características familiares e da escola,


foi possível estimar, que ao elevar a abertura a novas experiências de um
aluno, o aprendizado pode ter um ganho de até um terço do ano letivo na
disciplina. Já para matemática, o desempenho pode ser elevado em um terço
do ano letivo com um aumento na dimensão da consciência.
Dentre os aspectos estudados sobre o desenvolvimento das competências
socioemocionais, o incentivo ao estudo pelos familiares tem o maior impacto
para estimular nos seus filhos aspectos como consciência, amabilidade e
abertura a novas experiências. Por exemplo, 23% da diferença entre alunos
com alta e baixa consciência seria eliminada caso os pais do aluno com baixa
consciência os incentivasse a estudar.

Os dados indicaram que filhos de mães menos escolarizadas são tão ou mais
conscienciosos que filhos de mães mais escolarizadas. Esse fato chama
atenção para o potencial da abordagem socioemocional para alavancar o
desempenho educacional dos alunos mais economicamente vulneráveis, uma
vez que pais com menor escolaridade e recursos econômicos não parecem
estar em desvantagem em relação aos pais mais favorecidos economicamente.
Para o economista Daniel Santos, agora é preciso amadurecer a for ma de usar
essas informações em políticas públicas. “O principal é que a individualidade
de cada aluno será respeitada, o intuito não é homogeneizar pessoas, e sim
desenvolver estratégias para tornar a educação mais eficaz”, disse.

“Importante lembrar que nesse tema não podemos definir qual competência é
bom ter em maior ou menor grau, é um conjunto de características que cada
pessoa tem em uma combinação diferente”

O psicólogo Ricardo Primi reforça que, diferentemente das avaliações


cognitivas, a socioemocional não busca estabelecer um nível ideal de
pontuação. “Importante lembrar que nesse tema não podemos definir qual
competência é bom ter em maior ou menor grau. Trata -se de um conjunto de
características que cada pessoa tem em uma combinação diferente”,
completou.

Próximos passos
Em conjunto com os consultores internacionais Oliver John e Filip de Fruyt,
a equipe responsável pelo sistema de avaliação atualmente analisa a validação
de novos itens para ampliar a abrangência dos resultados. A perspectiva é
aprimorar a ferramenta por meio da aplicação em outras redes de ensino.

Como esse modelo de avaliação se destina a oferecer informações em larga


escala para políticas públicas, seu formato é abrangente para que possa
ser comparável, de modo a permitir análi ses e trocas de experiência entre
diferentes sistemas educativos. Por isso, oferece informações sobra as cinco
dimensões da teoria do Big Five.

Cada um desses domínios, no entanto, pode ser percebido através de um


conjunto de diferentes comportamentos e at itudes no cotidiano. Esse nível
mais detalhado e específico fornece indicadores das atividades observáveis
em sala de aula e demanda outro formato de avaliação, considerado formativo,
por ter com caráter pedagógico e buscar o redirecionamento das práticas. O
sistema SENNA também possibilita essa análise com um instrumento
específico, organizado como um roteiro de avaliação.

Os instrumentos de avaliação socioemocional compõem um conjunto que


conta ainda com material de apoio e um programa para facilitar a in serção de
dados e geração de devolutivas. O sistema está em fase de finalização. “Agora
é o momento de garantir que essas ferramentas sejam usadas para alavancar o
potencial dos alunos; da mesma forma como nos testes cognitivos, é preciso
tomar cuidado para que a utilização não sirva a propósitos de fazer ranking
ou metas e outros usos menos pedagógicos”, defendeu Tatiana.

DENTRO DA ESCOLA ABORDAGEM TRANSVERSAL

Em Nova York, KIPP dá atenção aos micromomentos

A discussão sobre formar um ser humano completo também está presente nos
Estados Unidos, onde a rede de escolas charter (instituições públicas de
administração privada) KIPP (sigla em inglês para “Programa Conhecimento
é Poder”) aplica uma metodologia direci onada a impulsionar o desempenho
acadêmico de alunos de baixa renda e conduzi -los ao mundo universitário e a
uma vida feliz.
De acordo com dados da rede, 44% dos que se formaram em suas escolas de
ensino básico há pelo menos 10 anos concluíram o ensino sup erior, dado
acima da média americana e quatro vezes maior que o índice para estudantes
com mesmo nível socioeconômico. Com 58 mil alunos em 162 unidades
espalhados por 20 estados dos EUA, a KIPP é aberta a todos, não importando
antecedentes acadêmicos ou condição financeira. Só em Nova York, cujo
trabalho tem influenciado outras unidades do país a adotarem a mesma
estrutura para desenvolvimento de caráter, são cerca de 4.200 alunos (97%
deles negros ou hispânicos), divididos em 11 escolas.

Para fazer com que estudantes provenientes de meios socialmente sensíveis


consigam alçar voo, a KIPP se concentra no desenvolvimento de sete
competências: entusiasmo, determinação, autocontrole, otimismo, gratidão,
sociabilidade e curiosidade. O trabalho com os alunos é fe ito de maneira
transversal, o que significa dizer que não se dá por meio de disciplinas ou
aulas específicas. “Quando ensino sobre a Grande Depressão e Franklin
Roosevelt, não falo só da história de uma nação em dificuldade e de um
homem que enfrentou um grande desafio. O importante é ter certeza que, ao
fim do curso, o aluno diga que entendeu a história e o que é preciso fazer para
ter determinação e ser bem-sucedido em tempos difíceis”, explica Mitch
Brenner, professor de história dos Estados Unidos na es cola de ensino médio
KIPP NYC College Prep High School e na unidade de ensino fundamental
KIPP Academy, onde também é vice-diretor.
Brenner está envolvido diretamente com o desenvolvimento dessa
metodologia desde 2007. Ele conta que o conceito de trabalhar duro e ser
gentil sempre fez parte das bases da instituição, mas o ponto de inflexão para
mudança no perfil das aulas veio quando sua equipe teve contato com
pesquisas e livros como Aprenda a ser otimista, de Martin Seligman,
professor e pesquisador de psicologia na Universidade da Pensilvânia. “Claro
que existe valor em dizer para alguém trabalhar duro, mas a competência de
trabalhar duro é resultado de determinação. Por outro lado, o autocontrole
acompanha a amabilidade. Todas essas coisas nos abrem no vas portas e um
novo conjunto de lentes para vermos o mundo”, diz Brenner.
Além da integração de mão dupla com a teoria cognitiva, a KIPP também se
baseia em outros seis pilares para implementar competências
socioemocionais: acreditar em cada aluno, identi ficar competências,
apresentar exemplos da ficção e do mundo real, ajudar cada estudante a sentir
efeitos positivos, encorajar a mentalidade de desenvolvimento de caráter e,
por fim, registrar e discutir progressos regularmente.

“Crianças que vão mal sentem dificuldade em detectar o que fazem bem e
algumas estão justamente procurando por essas estratégias. Temos que ajudá -
las com isso”

O trabalho trouxe benefícios que vão além da sala de aula e, segundo Brenner,
entender a correlação entre os traços de pers onalidade permitiu ao grupo de
professores ter uma conversa mais rica com os estudantes. “É preciso ser o
mais específico possível com as crianças sobre comportamentos percebidos,
suas notas e anotações. As que vão mal sentem dificuldade em detectar o que
fazem bem e algumas estão justamente procurando por essas estratégias.
Temos que ajudá-las com isso”, explica.

Um dos métodos usados em sala de aula pela KIPP é encorajar alunos a pedir
ajuda. Quando isso ocorre, o professor é estimulado a adotar elogios p úblicos
para mostrar que se trata de um sinal de força, não de fraqueza. Para que a
harmonia se espalhe por todo o ambiente escolar, o reconhecimento de um
bom trabalho também acontece durante os chamados “micromomentos”,
pequenas interações que ocorrem centenas de vezes dentro e fora da sala de
aula, segundo diz Brenner. “Alguns são grandes, outros nem tanto, mas
quando vemos uma criança tratar uma outra com gentileza, queremos
reconhecer essa competência imediatamente. Quanto mais as crianças
viverem isso, mais será internalizado”. Para reforçar esse processo, as paredes
da escolas têm cartazes de incentivo e professores também passam uma caixa
com palavras de reconhecimento durante suas aulas e, dependendo do assunto
tratado, abre-se espaço para jogos de improviso e dramatização.

Na Infinity Middle School, outra unidade KIPP de Nova York para ensino
fundamental, antes mesmo da implantação do conteúdo de caráter, já ocorriam
os KIPP Circles, períodos de 20 a 30 minutos em que as turmas são divididas
em grupos e os alunos trocam ideias e ajudam uns aos outros a melhorar suas
atitudes e resultados acadêmicos. “Nos círculos, os alunos discutem o que
entenderam das minhas aulas e se estão aplicando o que aprenderam”, disse a
diretora da escola e professora Leyla Bravo-Willey, em entrevista recente ao
Porvir.
Além do trabalho dentro dos muros da escola, a KIPP busca se aproximar das
famílias para mostrar como as competências estão se desenvolvendo, mesmo
quando as notas parecem escondê-las. “Nas reuniões trimestrais eu digo que
me importo com as notas do 1º trimestre, mas me preocupo mais com as do
4º, porque estas mostram como o aluno cresceu e como enfrentou desafi os
durante um ano inteiro. Você pode mostrar às famílias quanta determinação o
aluno demonstrou e dizer que sabemos quem são seus filhos”, conclui
Brenner, da KIPP Academy Middle School.

POR PROJETOS

Aula de práticas sociais resgata o aluno na João Mattos (CE)

Um aluno encontra nas palavras do professor o conforto que perdeu em casa.


Em outra turma, um grupo se mobiliza para mudar a cabeça de colegas sobre
os estudos e superar o fracasso. Na sala ao lado, um projeto de pesquisa
compara o índice de leitura de diferentes bairros da cidade. Problemas
familiares, fracasso e projetos são comuns a muitos alunos e colégios, mas na
Escola de Ensino Fundamental e Médio João Mattos, de Fortaleza, no Ceará,
esses elementos só foram incorporados com a entrada de uma nova disciplina
que mudou a forma de ensinar e de aprender.

Chamada de Núcleo de Trabalho, Pesquisa e Práticas Sociais, ela está presente


na escola desde 2012, quando a Secretaria de Educação do Estado do Ceará
começou uma experiência para deixar o ensino médio “com a cara da
juventude“. Neste novo desenho da grade curricular, 646 alunos, divididos
em três turnos (manhã, tarde e noite), têm aulas de Desenvolvimento de
Práticas Sociais (DPS) e de técnicas de pesquisa, ambas com destaque para
os aspectos socioemocionais. “Nenhuma disciplina [tradicional] trabalha com
o que se faz em DPS, como a questão da identidade, da perspectiva de futuro
e da interação e integração com os colegas. A pesquisa também olha para
autonomia e sugere uma ação que trata do protagonismo”, diz Iane Nobre,
coordenadora pedagógica da escola.

As aulas de Desenvolvimento de Práticas Sociais acontecem duas vezes por


semana, por duas horas, e são acompanhas por mais uma hora semanal de
Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), onde alunos aprendem a
lidar melhor com o mundo digital para desenvolver suas pesquisas. Em geral,
as aulas começam com a introdução de um tema pelo professor, que estimula
a participação do aluno com o conhecimento prévio que ele já possui. A parte
de desenvolvimento inclui debates, trabalho em grupos e, ao final, uma
avaliação em que o aluno é estimulado a colocar no papel o que aprendeu
naquele dia.

Apesar do estudo sobre o impacto da reorganização curricular na rede do


Ceará ainda estar em fase de finalização, a coordenadora do João Mattos
aponta que a entrada da nova disciplina foi um fator importante para a redução
da evasão em 6% entre 2012 e 2013. E é fácil descobrir po r quê. “Com o
tempo, fomos ganhando confiança e notando que essas oficinas estavam
fazendo muito bem para os nossos alunos e completavam sua formação. A
gente consegue ver dentro da sala de aula um aluno mais crítico, mais
positivo, com mais perspectiva de futuro e percebendo que estudar vai trazer
benefício”, diz Iane.

“No Núcleo, você é convidado a se abrir mais, a dizer coisas que o professor
de matemática ou de português não pergunta. Às vezes, são coisas que a gente
não consegue nem dizer em casa ou com os amigos”, descreve Maxwell Matos
da Silva, 17, aluno do terceiro ano. A autonomia conquistada em sala de aula,
segundo conta, conseguiu evitar com que ele e outros amigos que também
gostam de dançar break seguissem pelo “mau caminho”.

E nem só de atividades dentro da sala de aula vive a nova disciplina. Maxwell


descreve que, quando o projeto de oficinas de Núcleo começou a “bombar”,
foi como o “WhatsApp de hoje em dia”. Com outros amigos, sugeriu a criação
de um Festival de Talentos, que logo teve autor ização da diretoria e ganhou
as redes sociais. Como era a primeira edição, conseguiu assegurar a
participação de amigos que não estudavam na escola. Resultado? Primeiro
lugar em dança. “Foi muito massa mesmo”, diz Maxwell.
Um dos pontos altos da nova metodologia desenvolvida na sala de aula é que
alunos ganham maior capacidade para se expressar e também perdem o medo
de encarar as diversas esferas públicas quando precisam de informações para
a sala de aula. Autora de um proj eto sobre violência sexual, Anna Thays
Santos, 17, também do segundo ano, conversou com meninas que já tinham
sido vítimas de abuso, mas teve que ir além. “Pude conhecer o drama e
cheguei a visitar o Conselho Tutelar, onde conversei com uma psicóloga e
com uma pessoa que tomava conta dos casos”, diz.

Por outras vezes, a realidade da comunidade em que vivem choca os próprios


estudantes, como no projeto sobre educação em que Antônio Matheus da
Silva, 17, saiu às ruas e descobriu que tanto alunos de escolas pú blicas quanto
particulares do bairro da Parangaba, próximo à João Mattos, tinham índices
de leitura alarmantes. “Foi complicado achar duas escolas para a gente usar
como modelo. Tivemos que andar debaixo de sol às 10 horas da manhã e às
vezes não podiam nos atender porque estavam em aula ou reunião”, diz.
“Nosso projeto descobriu que alunos leem muito pouco. Alguns não têm
prática de leitura e outros não são incentivados em hipótese alguma a ler”,
conclui.

“No Núcleo, você é convidado a se abrir mais, a di zer coisas que o professor
de matemática ou de português não pergunta. Às vezes, são coisas que a gente
não consegue nem dizer em casa ou com os amigos”

Apesar de ter implantado um método inovador, a João Mattos sofre com


alguns problemas que atingem outras escolas, como a repetência. Ainda
assim, ao abrir espaço para um maior protagonismo do aluno, é possível tratar
com criatividade e naturalidade esse e outros assuntos considerados tabus
dentro da sala de aula. Quem poderia falar melhor sobre fracasso esc olar e as
dificuldades de fazer tudo de novo do que um grupo com alunos que tinham
vivenciado tal experiência negativa? “A gente descobriu que muitos alunos
não eram interessados pelos estudos por causa de influência dos colegas ou
por medo de levantar a mão quando o professor pergunta se eles sabem o
conteúdo”, diz Martinara Melo, 18. “Ter cinco alunos repetentes tomando a
frente sobre esse tema foi o suficiente para acordar o restante da turma. Muita
gente não tinha coragem de dizer o que aprendeu, não se soltava”.
O “resgate” por meio de projetos também conseguiu mudar a opinião de
Jennifer Jéssica de Souza, 19, do segundo ano. “Antes vinha só por vir mesmo.
Era aquela matéria ‘decoreba’. Agora, não. Você tem curiosidade para
pesquisar o que vai ter que estudar, saber por que está aprendendo e fica mais
integrado com a escola”. A metodologia também serve para acabar com
preconceitos, sem motivo, com uma ou outra disciplina. No caso de Jéssica,
História. “Eu não me interessava muito, mas fui fazer um trabal ho sobre a
história do meu bairro e fui criando uma paixão sobre a história como um
todo”, conta.

Perto de concluir o ensino médio na João Mattos, Thainá Porto, 17, mais uma
integrante do grupo que criou o Festival de Talentos, conta que as aulas
funcionam como uma barreira para problemas que o aluno carrega de fora
para dentro dos muros da escola e ressalta o apoio emocional que recebeu. “A
gente estava triste por problemas de casa e, nas aulas de Núcleo, se aprende
sobre outras coisas como família, resilência e talentos. Saía do foco das
matérias e chegava melhor em casa”. E qual a principal lição das aulas de
Núcleo? “É uma disciplina para qualquer tipo de aluno e todo mundo tem
voz”.
ESCOLA JOÃO MATTOS - TODO MUNDO TEM VOZ

RELAÇÃO ADULTO X ALUNO

Autonomia para o aluno e abertura do professor fazem a diferença

Diante de um aluno com lugar cativo na “turma do fundão”, que colecionava


advertências, a professora Ana Lúcia Viana tinha poucas alternativas. Todas
as soluções comuns para lidar com a indis ciplina já haviam sido tomadas e se
mostrado ineficazes para contornar um comportamento que tinha o claro
objetivo de dominar a classe e atrapalhar a vida do professor, visto como
inimigo.

Ana Lúcia era recém-chegada à Escola Estadual Professora Altina Mor aes, de
Araçatuba (SP), que integrava o grupo de escolas participantes do Programa
SuperAção Jovem, do Instituto Ayrton Senna. No projeto, o professor deixa
de ser transmissor de conteúdo e a metodologia é centrada no aluno para
ajudá-lo a descobrir paixões, interesses e sonhos. O processo de aprendizagem
abre espaço para o posicionamento dos estudantes sem que o professor abra
mão de estruturá-lo e servir como referência para mostrar: para onde
queremos ir, onde estamos, como estamos indo e quem são os responsáveis
por sua condução.
Os professores estimulam e distribuem as falas, a participação e a liderança
dos alunos, mas, em uma atividade tradicional como a leitura, o objetivo e a
execução das ações são diferentes para cada turma. Por isso, desde a primeira
aula do projeto Sala de Leitura no 8º B, a estratégia de Ana Lúcia tomou
um caminho próprio, e resgatou a confiança que Marcos havia perdido. Antes
de tudo, a educadora evitou dizer um lacônico “ler é b om”, colocou na lousa
os objetivos da atividade e se apresentou como “a professora que faria com
que eles (alunos) gostassem de ler”. Mas a resposta de Marcos, um dos líderes
da turma, foi lançar uma carteira na direção de Ana Lúcia e gritar: “Eu não
gosto de ler e nunca vou ler na minha vida”.

Para manter a autoridade perante à turma, a receita tradicional pediria uma


resposta em tom elevado, o que foi imediatamente descartado. Como previam
os planos, a aula continuou naquela tarde e voltou a acontecer no dia seguinte,
para a surpresa do próprio Marcos. “Você está aqui de novo? Achei que não
fosse voltar”, disse o adolescente, segundo relato da professora. Esse foi um
acontecimento importante, porque mostra que, apesar de mudar o foco das
aulas, a atitude do professor não deve ser confundida com paternalismo. O
cartão de visita não tinha nenhuma palavra de conforto, mas Ana Lúcia
manteve a obstinação de mudar a maneira com que a classe encarava o
processo de leitura. Primeiro, iniciou discussões sobre o prot agonismo do
estudante e estimulou as atividades em grupo. Em seguida, para traçar um
raio-x de cada aluno, passou a circular durante o intervalo para conversar e
conhecer a história de cada um. “Eu precisava ver meu aluno de forma
diferente. Toda essa reação negativa que acontece durante a aula tem um
motivo e eu precisava saber o porquê”, conta Ana Lúcia.

A liberdade com que conduzia a aula revelou -se a chave para que Marcos
puxasse um primeiro livro na estante. Foi o ponto de partida para uma
mudança em sua vida, e ele passou a usar a influência que exercia sobre
colegas de forma positiva, em atividades em grupo para desenvolvimento de
competências como comunicação e colaboração. De aluno “convidado” a
mudar de escola, passou novamente a se diferenciar do s demais, mas de um
jeito diferente. “Ele não desenvolveu habilidades só de leitura. Ele começou
a ter consciência de quem ele era e de quem gostaria de ser”, avalia a
professora. Antes de cada novo projeto, o vínculo entre Ana Lúcia e Marcos
era renovado, pois a professora tinha abertura suficiente para entender os
interesses dele e, com reciprocidade, trocava percepções sobre o que já
enxergava por trás de suas atitudes.

Motivada com a mudança “brusca” acontecida com Marcos ao longo de apenas


um ano, Ana Lúcia aconselha todos os professores a buscarem dar mais
atenção ao contato com seus alunos. “Ouça, dê atenção às questões e às raivas
deles, porque isso nos dá condição de preparar uma aula melhor, que é o que
eles querem”. Por sua vez, Marcos contou de f orma emocionante, durante a
12ª edição da “Série de Diálogos – O Futuro se Aprende”, que sua
transformação de pior aluno da classe para o melhor entre todas as turmas só
aconteceu quando foi visto de outra maneira dentro da escola: “O valor de um
professor na vida do aluno é muito grande. Quando um professor acreditou
em mim, a minha mudança aconteceu”.

RECURSOS PEDAGÓGICOS

Jogos criam ponte entre diversão e aprendizagem

Dentre os recursos usados para desenvolver as competências


socioemocionais, os jogos ocupam um lugar privilegiado. Com eles, enquanto
as crianças se divertem é possível detectar, aprimorar e avaliar características
como trabalho em equipe, resiliência, liderança e reação à contrariedade. É
nesse momento de descontração que, ao mesmo tempo, possui regras e
estratégias, que se consegue colocar os estudantes em situações do mundo
real e permitir que adquiram conhecimento por esforço próprio e na relação
com os demais colegas.

Desde o ensino infantil até o ensino médio, os diferentes tipos de j ogos e


atividades acompanham as necessidades específicas de cada faixa etária. Por
exemplo, primeiro servem para despertar o senso de colaboração e despertar a
comunicação, depois partem para o incentivo da criatividade e do controle
da impulsividade. Eles podem ser analógicos, como jogos de tabuleiro, ou
digitais, via uso de tablets, computadores e celulares. Em comum, guardam a
intencionalidade e a capacidade de registrar o progresso do aluno.

Inseto ajuda a identificar sentimentos


Um dos programas que tem como objetivo desenvolver tais competências é o
“Amigos do Zippy”, da Associação pela Saúde Emocional de
Crianças (ASEC), que é direcionado a turmas do 1° ou do 2° ano do ensino
fundamental. Nele, sem ouvir “esta solução é boa e aq uela é ruim”, as crianças
aprendem a enfrentar as dificuldades do dia a dia, a identificar seus
sentimentos e a explorar a melhor maneira de lidar com eles. “Quando
enfrentamos dificuldades, elas geram sentimentos com os quais temos que
lidar. E isso só acontece na prática”, diz Tânia Paris, presidente da ASEC.
Para ajudar os pequenos O projeto começa com alunos de seis anos pois,
segundo Tânia, “nesta idade eles não automatizaram reações aos sentimentos
e apresentam um padrão de comportamento maleável, que não precisa de
desconstrução e que pode gerar hábitos com mais facilidade ao longo da
vida”, completa.

O programa possui seis módulos, com carga horária de uma hora, a serem
percorridas durante 24 semanas. Mas onde entra o Zippy? Zippy é o nome de
um inseto, mais precisamente um bicho -de-pau, que vira amigo das crianças
durante todo o curso. Nas atividades em sala de aula, pôsteres ilustram cenas
da história e ajudam as crianças a desenvolver empatia. Além disso, são
usados bonecos de papel e uma “caixa su rpresa” com cartões que as crianças
sorteiam para fazer as dramatizações. Em geral, cada classe tem um Zippy,
que pode viajar para a casa de cada aluno. Mesmo estando no início da
alfabetização, as crianças são incentivadas a escrever um diário do inseto
como atividade complementar.

O primeiro módulo trata dos sentimentos e a criança aprende a identificar


raiva, tristeza, nervosismo e saber o que fazer para se sentir melhor.
O segundo, com aulas baseadas em dramatização, aborda a comunicação,
como se expressar e como escutar. As atividades que impactam a timidez e
favorecem o melhor desempenho nas aulas de língua portuguesa. Segundo
Tânia, professores também se renovam a partir deste ponto. Ela narra a
história vivida por uma professora do Rio de Janeiro, qu e participou do curso
de formação e, logo no dia seguinte, ao voltar para a sala de aula, se deparou
com uma situação difícil. Um aluno que havia tirado nota 2 em uma prova
resolveu desafiá-la rasgando o exame na hora da devolução. Em vez de nova
reprimenda, a professora preferiu perguntar se haveria algo que ela pudesse
fazer para ajudá-lo. Silêncio. A resposta veio somente ao final da aula, quando
o menino finalmente se abriu e confidenciou: “Tem uma coisa que você pode
fazer: ensinar a matéria que eu não sei”, disse ele. “Quando uma professora
conta um evento desse para a gente, ela o faz com lágrimas nos olhos, porque
percebe que todas as técnicas tradicionais só estavam piorando a situação”,
conta Tânia, que vê no apoio à criança um momento para que ela consiga se
soltar e veja na escola um espaço privilegiado em que ela deseje estar.

O terceiro módulo trata dos relacionamentos, como encarar a rejeição fazer


novos amigos, o que abre terreno para que na fase seguinte sejam abordado
como resolver conflitos. Na fase seguinte, as crianças participam de aulas
sobre como se acalmar, lidar com a raiva e demonstrar solidariedade a algum
colega vítima de bullying. No módulo cinco, sobre mudanças internas, abre -
se espaço para desenvolver a resiliência e como supera r perdas. O sexto
módulo, que fecha o “Amigos do Zippy”, chama -se ‘nós sabemos lidar com
dificuldades’. Aqui, as crianças aprendem a pedir ajuda e a saber quais
situações podem ou não ser mudadas. “O que se discute são coisas como
briguei com amigo e posso voltar a ser amigo? Posso. Mas vai depender dele
também querer.”

Implantado desde 2004, o projeto já recebeu 220 mil crianças e hoje está em
35 cidades do país, envolvendo 832 professores e 402 escolas e instituições
de ensino.

Jogo, método e professor-mediador


Outro programa direcionado às escolas é o elaborado pela empresa israelense
MindLab, que leva o programa Mente Inovadora a 1000 unidades de ensino
brasileiras. Nele, alunos de 4 a 17 anos, professores e familiares
compartilham responsabilidades por tarefas que acontecem na escola e em
casa, pois além do material para sala de aula existe um portal com jogos e
livros de atividades que demandam a participação dos pais.

O MenteInovadora usa alguns métodos, chamados metacognitivos, que


funcionam como instrumentos criadores e organizadores do pensar, do fazer
e da tomada de posição diante de situações -problema. Eles partem do
princípio de que, quando estamos conscientes quanto à maneira como
pensamos, podemos aprender e crescer mais e melhor. A intenção é contribuir
para o desenvolvimento de atitudes responsáveis, seja em família, nas
relações sociais ou no trabalho.

Os métodos são apresentados por meio de metáforas, como as imagens


culturais do “Método do Semáforo” e “Método do Detetive” (veja infográfico
abaixo), ligadas a certas habilidades que permitem o jogar certo e o jogar
bem.
No começo da vida escolar, o aluno é estimulado a trabalhar em grupo e a
usar o próprio corpo como peça em tabuleiros gigantes, colocados no chão.
Na adolescência, a interação é mais digital, mas também envolve a troca com
outro colega.

Os jogos da MindLab, segundo a pedagoga e diretora Sandra Garcia, estão


baseados em três pilares: jogo, método e professor -mediador. “O jogo permite
simular as situações do cotidiano e os métodos fazem as crianças pensarem
em como agir em determinadas circunstâncias”, explica. As aulas são
realizadas uma vez por semana, têm duração de 50 minutos e ficam sob
responsabilidade de um professor que pode vir das mais diversas disciplinas,
como matemática, geografia ou português. Ele não é um especialista, mas
passa por uma formação com experiência de trabalho mediado para então
aplicar a metodologia em sala. “O mediador pode fazer com que o aluno
reflita, veja o que precisa melhorar, mudar ou continuar fazendo para
conquistar seu objetivo. É uma seriedade lúdica”, diz Sandra.

No final da aula, há espaço para a “hora da conversa”, com discussão sobre o


que foi assimilado e alunos são estimulados a relacionar as situações de jogo
com situações extraclasse. Abaixo, você encontra três exemplos de jogos
disponíveis no portal MindLab.net e como cada um trabalha o socioemocional
nos estudantes.
CONHEÇA OS JOGOS
OLYMPUS
MOVE IT
POOOOLIES
Caso o jogo não carregue, baixe e instale o plugin
Para habilitar o som, clique no primeiro ícone do canto superior direito
OLYMPUS
Pratique habilidades para planejamento antecipado e aprenda a pavimentar o caminho
para a vitória.

MOVE IT
Pedro precisa da sua ajuda para movimentar os móveis pela casa. Sáo 15 níveis até você
se tornar um expert.

POOOOLIES
Identifique oportunidades, ameaças e ajude os Poooolies a formar uma sequência de
quatro antes do oponente.
Desenvolvido por MindLab

Jogo por empatia e compaixão


Nos Estados Unidos, o desenvolvimento de competências socioemocionais
também tem atraído interesse de nomes da indústria dos jogos. O sociólogo,
historiador e empreendedor norte-americano Trip Hawkins, fundador da
Electronic Arts, produtora das séries de jogos de futebol americano Madden
e do FIFA, é um dos que decidiram se dedicar aos softwares educativos. Em
março deste ano, sua mais nova empresa, a If You Can Company, lançou o
IF… (Se…), jogo para crianças de 6 a 12 anos excl usivo para o tablet Apple
iPad, que já alcançou 500 mil downloads na App Store.

“O poder do aprendizado com jogos sempre me atraiu, porque você faz


escolhas e vê as consequências”, diz Hawkins. Seja dentro de casa ou na
própria empresa, que produz jogos qu e se destacam pela simulação de
competição, o ambiente competitivo sempre fez parte de sua rotina. “Durante
os últimos 10 anos, me preocupava pensar sobre qual legado minha geração
deixaria para nossas crianças. E eu decidi que queria fazer algo sobre isso ”,
conta.

A virada veio quando matriculou suas filhas em uma escola que se dedica a
ensinar competências socioemocionais, como empatia e compaixão, a The
Nueva School, em San Mateo, no estado da Califórnia. Aos poucos, uma de
suas filhas começou a corrigir seu comportamento. Nascia ali a ideia para
criarção do IF…, cujo nome é inspirado no poema do escritor Rudyard
Kipling.
Para o desenvolvimento do IF.., Hawkins diz ter usado o pla no pioneiro para
o ensino de socioemocionais elaborado há sete anos pelo estado de Illinois e
também escolas como a KIPP e Anchorage School, do Alasca. Além de ex -
programadores da Electronic Arts, fazem parte da If You Can Company
representantes do site Casel.org, do Yale Center for Emotional Intelligence e
do The Institute for Social and Emotional Learning, fundado por ex -
responsáveis pelo plano pedagógico da The Nueva School.

Dentro do jogo, as crianças criam um avatar de cachorro e se aventuram por


Ziggurat, mundo comandado por campos de energia. Um guru chamado
YouDog ajuda na resolução de perguntas envolvendo competências
socioemocionais, como gratidão, cooperação, paciência e trabalho em equipe.

Hawkins diz que IF… é projetado para ser jogado de 30 a 4 5 minutos por
semana, com supervisão de pais ou professores, e que seu principal trunfo é
“transferir habilidades para o mundo real”. Um painel de controle permite a
um pai ou a um professor receber um relatório sobre como a criança está se
saindo em cada capítulo. IF… tem interface em inglês e seu primeiro episódio
é gratuito; para os demais, é necessário assinar.

COMO FAZ
Que competências socioemocionais precisam ser desenvolvidas? Como deve
ser a formação dos professores para lidar com esse desafio? Que cuidados são
necessários na avaliação? O desenvolvimento intencional de capacidades que
extrapolam os conteúdos cognitivos ainda suscita muitas perguntas entre
gestores e profissionais de educação.

Para encontrar respostas a essas indagações, Inspirare, Po rvir e Instituto


Ayrton Senna promoveram um evento da Série Diálogos O Futuro se Aprende,
no qual pesquisadores, professores, empreendedores, gestores e alunos
debateram questões conceituais e práticas relacionadas ao tema e construíram
uma série de recomendações para orientar o trabalho com as competências
socioemocionais.

Veja o resultado desse diálogo e saiba como planejar políticas públicas e


atividades para o cotidiano das escolas brasileiras:

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