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Parte Geral – Doutrina

A Mediação e a Difusão da Cultura da Paz


Heloisa Leonor Buika
Doutoranda e Mestre em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo, Especialista
em Derecho Procesal, Arbitraje e Mediación pela Universidad de Salamanca, Especialista em
Direito Processual Civil e Direito Civil pelas Faculdades Metropolitanas Unidas, créditos de
mestrado em Direito do Trabalho na Pontifícia Universidade Católica, Professora Universitária,
Advogada em São Paulo.

RESUMO: O presente estudo analisa a implementação da mediação judicial e extrajudicial como


meio de solução consensual de conflitos no Brasil por meio do novo Código de Processo Civil, Lei
nº 13.105/2015, e da Lei da Mediação nº 13.140/2015, as quais apontam para um novo modelo de
processo civil que contribui para a difusão da cultura da paz. O estudo demonstra os fundamentos
social, funcional e político da mediação, bem como as normas procedimentais da mediação judicial
e extrajudicial, o papel do mediador e as especificidades das etapas da mediação. Efetua análise
da necessidade de mudança da mentalidade dos operadores do Direito para transformar a cultura
adversarial em cultura da paz.

PALAVRAS-CHAVE: Mediação; cultura da paz.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A mediação e os fundamentos da justiça conciliativa; 2 Legislação perti-


nente à mediação no Brasil; 3 Procedimento da mediação; 3.1 Procedimento da mediação extraju-
dicial; 3.2 Procedimento da mediação judicial; 4 O papel do mediador; 5 Especificidades das etapas
da mediação; 5.1 Pré-mediação; 5.2 Investigação; 5.3 Criação de opções; 5.4 Escolha de opções;
5.5 Avaliação de opções; 5.6 Preparação do acordo; 5.7 Acordo e sua assinatura; 6 Difundindo a
cultura da paz; 7 Notas conclusivas; Referências.

INTRODUÇÃO
As sociedades primitivas utilizavam os métodos consensuais de solução
de conflitos por meio de árbitros ou facilitadores para que se chegasse a um
consenso. A função era de incumbência de uma pessoa respeitável da comu-
nidade como o sacerdote, ancião, cacique, o próprio rei, obtendo-se a pacifi-
cação sem que se recorresse à justiça pelas próprias mãos. Historicamente, os
métodos consensuais de solução de conflitos precederam a jurisdição estatal.
Posteriormente, quando o Estado assumiu todo o seu poder, nasceu o processo
judicial1.

1 GRINOVER, Ada Pellegrini. Os métodos consensuais de solução de conflitos no novo Código de Processo
Civil. Prodireito Direito Processual Civil, v. 1, p. 51-53. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/
arquivos/2016/1/art20160105-01.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2016.
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Sabe-se que a mediação é um instituto antigo, mas, nos dizeres de
Galeno Lacerda2: “Quando as coisas instituídas falham, por culpa de fatores
estranhos à nossa vontade, convém abrir os olhos às lições do passado para
verificar se, acaso, com mais humildade, dentro de nossas forças e limites, não
podem elas nos ensinar a vencer desafios do presente”.
Até o presente, a formação dos acadêmicos de Direito no Brasil está vol-
tada à solução contenciosa e adjudicada dos conflitos de interesse, ou seja, a
solução dos conflitos encontra ênfase por meio do processo judicial, da senten-
ça adjudicada por um juiz togado, o que constitui a solução imperativa proferi-
da pelo representante estatal, ao que Kazuo Watanabe3 menciona: “É a solução
pelo critério do ‘certo ou errado’, do ‘preto ou branco’, sem qualquer espaço
para a adequação da solução, pelo concurso da vontade das partes, à especifi-
cidade de cada caso”.
Salienta Kazuo Watanabe que esse é o modelo padrão ensinado em todas
as faculdades de Direito do Brasil, sem exceção, como também é o modelo de
profissional dos operadores do Direito exigido pelo mercado para as principais
carreiras profissionais, como a advocacia, a magistratura, o Ministério Público
e as procuradorias públicas. Até o presente, as faculdades não oferecem aos
alunos, em nível de graduação, disciplinas obrigatórias voltadas à solução con-
sensual dos conflitos.
No mesmo sentido, na doutrina espanhola, Juan Francisco Mejias
Gomez4 aponta situação semelhante, dizendo que na universidade se ensina
que a qualidade jurídica dos advogados será avaliada pela quantidade de pro-
cessos que resultam vitoriosos, e não pela quantidade de pleitos que evitem ou
que consigam em acordo entre as partes. Salienta que um advogado negociador
é visto como débil, confundindo-se debilidade com a capacidade de diálogo.
O Jurista Rodolfo de Camargo Mancuso5 discorre que no Brasil se desen-
volveu a tendência de se repassar à Justiça estatal os históricos de danos temidos
ou sofridos, “comportamento insuflado pela difundida (e equivocada) ideia de
que por aí se está a exercer cidadania”, realçando que houve a formação de
uma arraigada cultura demandista que desserve a verdadeira cidadania e fo-
menta a crise numérica dos processos judiciais.
Mancuso enfatiza que na sociedade brasileira há uma propensão a repas-
sar às mãos do Estado a tarefa e a responsabilidade de dirimir os conflitos, onde

2 LACERDA, Galeno. Dos juizados de pequenas causas. Revista Ajuris, n. 27, p. 7-8, mar. 1983.
3 WATANABE, Kazuo. Cultura da sentença e cultura da pacificação. In: YARSHELL, Flávio Luiz; ZANOIDE DE
MORAES, Maurício (Org.). Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ,
2005. p. 685.
4 MEJIAS GOMEZ, Juan Francisco. La mediación como forma de tutela judicial efetiva. Madrid: El Derecho y
Quantor, 2009. p. 60.
5 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à justiça. São Paulo: RT, 2011.
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o Judiciário é utilizado como um guichê universal de reclamações que recep-
ciona toda sorte de pretensões, resistências, insatisfações e intolerâncias, ainda
que de pequena monta ou sequer de nenhuma complexidade ou relevância.
Ainda, a tradição cultural brasileira está centrada no processo judicial,
no qual as partes litigam por meio de seus advogados, buscando uma sentença
judicial que lhes seja favorável, proferida por um juiz competente que decide a
controvérsia de forma impositiva. As habilidades dos advogados são avaliadas
pela eloquência de suas palavras ao defender os interesses de seus clientes,
tanto na forma de escrever as suas petições quanto oralmente, nas audiências, e
uma das formas de autodefesa sempre foi o ataque ao adversário.
Em outras palavras, Adolfo Braga Neto6 sintetiza que a sociedade brasi-
leira não só está acostumada, mas também acomodada ao litígio, bem como
ao pressuposto básico de que a justiça só se alcança a partir de uma decisão
imperativa proferida por um juiz togado, que na maioria das vezes se restringe
à aplicação pura e simples da previsão legal, o que explica o vasto número de
normas no ordenamento jurídico nacional.
Os operadores do Direito estudam a melhor maneira de aplicar a legis-
lação prescrita relativa ao caso concreto, na busca de sair vencedor com uma
sentença favorável aos interesses de seu cliente.
A renovação do processo civil brasileiro oriunda da introdução definitiva
dos meios alternativos de solução de conflitos afronta essa tradição cultural
de busca da solução judicial, abalando-a sobremaneira, sendo necessária uma
mudança radical de mentalidade, visando doravante à implantação de uma cul-
tura diametralmente oposta, ou seja, uma cultura de pacificação, em que será
priorizada a autocomposição para a solução das controvérsias.
O presente estudo irá analisar como a mediação poderá contribuir com
essa transformação da cultura da sentença para uma cultura de paz, a partir dos
dispositivos do novo Código de Processo Civil, Lei nº 13.105, de 16 de junho de
2015, e da Lei de Mediação nº 13.140, de 26 de junho de 2015, que regulam a
mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias.

1 A MEDIAÇÃO E OS FUNDAMENTOS DA JUSTIÇA CONCILIATIVA


Entre os meios heterocompositivos temos o processo judicial e a arbitra-
gem, em que a decisão é imposta, e a pacificação das partes pode até chegar
a ocorrer no plano social, mas dificilmente existirá entre elas, haja vista que
sempre haverá a insatisfação daquela que foi vencida, ou quando ocorreu a

6 BRAGA NETO, Adolfo. Alguns aspectos relevantes sobre a mediação de conflitos. In: GRINOVER, Ada
Pellegrini; WATANABE, Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo.
Revolução na prestação jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 63-70, 2008. p. 63.
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sucumbência recíproca, pois, quando o conflito é decidido por um terceiro,
sempre há a esperança de cada parte ser o vencedor da contenda. É a justiça do
perde-ganha, em que aquele que perde se utiliza dos recursos e de outros meios
de impugnação ou resiste ao cumprimento da sentença. A controvérsia levada à
justiça é resolvida, porém permanece o conflito sociológico no âmbito pessoal.
Como expõe Juliana Demarchi7, nas investigações voltadas à resolução
pacífica de conflitos é necessário atentar para a existência de inter-relações es-
pecíficas entre as partes e os conflitos subjetivos. Presentes tais relações, primei-
ramente deve-se detectar o relacionamento entre as pessoas, para depois efetuar
uma análise das questões que ensejaram o conflito. Esse modo de abordagem
leva as pessoas a refletir e a elaborar um novo jeito de atuação no futuro, pois
todo acordo é realizado para regular o futuro do relacionamento entre as partes,
por exemplo, se a sociedade continuará com aqueles sócios, se o contrato de
fornecimento será ou não renovado, etc.
Ainda nesse sentido discorre a autora que a mediação é o meio adequado
de solução do conflito quando há preponderância de aspectos interpessoais,
pois o mediador irá atuar como facilitador do diálogo para que as partes pos-
sam expor as suas dificuldades em um ambiente sigiloso e imparcial. Portanto,
o objetivo precípuo da mediação não é a rapidez do acordo, e sim a condução
das partes à cooperação mútua. O mediador irá utilizar técnicas de negociação
para que as partes, as quais anteriormente eram incapazes de negociar, passem,
por meio de sua intervenção, a um diálogo e à discussão pacífica do problema
e acabem por fazer um acordo.
As estruturas jurídico-políticas sempre se voltaram aos remédios (com
reformas perenes das normas) e quase nunca às causas, deixando à margem
o estudo sobre a crescente litigiosidade, que se dirige à jurisdição sob a for-
ma irrefreável de procedimentos judiciários. No entanto, a capacidade limitada
de solução compulsória dos conflitos tem se mostrado ineficaz e muitas vezes
não resolve o problema, pois apenas agrega estabilidade e indiscutibilidade da
decisão, o que ratifica a inaptidão do Judiciário para recepcionar e solucionar
eficazmente as controvérsias8.
É nesse cenário que a mediação vem plantar as suas raízes e contribuir
com um dos escopos da jurisdição que é a pacificação social. Por se tratar de
um meio autocompositivo, o conflito é solucionado pelas próprias partes, com a

7 DEMARCHI, Juliana. Técnica de conciliação e mediação. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo;
LAGRASTA NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo. Revolução na prestação
jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 49-62, 2008. p. 59.
8 PINHO, Humberto Dalla Bernardino de; PAUMGARTTEN, Michele Pedrosa. Os efeitos colaterais da crescente
tendência à judicialização da mediação. Revista Eletrônica de Direito Processual, Rio de Janeiro, v. 11, p. 9.
Disponível em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/article/view/18068/13322>. Acesso em:
20 fev. 2016.
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ajuda de um terceiro que atuará como mediador, o qual, por meio de técnicas,
fará com que as partes restabeleçam o diálogo e cheguem por elas próprias a
uma solução amigável. Logicamente, ocorrerá a aceitação prévia das bases do
acordo e, consequentemente, com o restabelecimento do diálogo, se dará a
pacificação não somente no plano da sociedade, mas também entre as próprias
partes. Assim, o principal fundamento da justiça conciliativa é a pacificação.
Ada Pellegrini Grinover9, com maestria, discorre a respeito dos funda-
mentos da justiça conciliativa, a saber: fundamento funcional, social e político.
O primeiro fundamento da justiça conciliativa demonstrado pela autora
é o funcional, visto que a utilização da mediação como meio de solução de
conflitos é capaz de desafogar o Judiciário, tendo em vista que, realizando-se a
autocomposição, desnecessária será a intervenção judiciária.
Busca-se a racionalização na distribuição da justiça e, por conseguinte,
a desobstrução dos Tribunais, com a atribuição da solução dos litígios a instru-
mentos institucionalizados que procuram a autocomposição.
Nessa perspectiva, a mediação passa ao status de instrumento utilizado
no quadro do Poder Judiciário, deixando de lado o aspecto negocial do acordo,
para ser considerada via equivalente jurisdicional.
O segundo fundamento da justiça conciliativa apontado por Ada
Pellegrini Grinover é o social, consistente na função estatal de pacificação so-
cial, que, por via de regra, é alcançada pela sentença, mas onde, na grande
maioria dos casos, não é aceita de bom grado pelo vencido, ou seja, a solução
imposta se limita a solucionar parcela da demanda levada a juízo, sem a paci-
ficação da lide sociológica.
Diferentemente do método contencioso de solução de controvérsias que
não atenta aos problemas de relacionamento latentes na base da litigiosidade,
com a mediação há o consenso que previne situações de tensões e rupturas, em
que a coexistência é relevante elemento valorativo.
Por último, tem-se o fundamento político da mediação, que é encontra-
do na participação, ou seja, o mediador e as partes participam da solução do
conflito, visto que a solução não é imposta, mas faz parte do consenso a que as
partes chegaram com a ajuda do mediador que facilitou o diálogo entre elas.
No tocante a esses três fundamentos externaremos nossa opinião na con-
clusão deste trabalho.

9 GRINOVER, Ada Pellegrini. Os fundamentos da justiça conciliativa. In: ______; WATANABE, Kazuo; LAGRASTA
NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo. Revolução na prestação jurisdicional. São
Paulo: Atlas, p. 1-5, 2008. passim.
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Relacionados os três principais fundamentos da mediação, passaremos
a analisar a recente legislação brasileira relativa à implantação da mediação
como meio alternativo consensual de solução de conflitos.

2 LEGISLAÇÃO PERTINENTE À MEDIAÇÃO NO BRASIL


A mediação como um dos meios alternativos de solução de conflitos está
regulada por três dispositivos legais: a) a Resolução nº 125, de 29 de novem-
bro de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); b) os novos dispositivos
do Código de Processo Civil, Lei nº 13.105/2015; e c) a Lei de Mediação (Lei
nº 13.140/2015).
O processo civil no Brasil vive um momento de renovação com a entrada
em vigor do novo Código, Lei nº 13.105/2015, apontando para um novo mo-
delo de processo civil, mais aberto ao diálogo e à colaboração entre as partes,
e em seu art. 3º dispõe várias regras, entre as quais o § 2º, que prescreve que o
Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos, e o
§ 3º estabelece como dever de juízes, advogados, defensores públicos e mem-
bros do Ministério Público o estímulo à conciliação e mediação.
De modo geral, as normas regulatórias são compatíveis e complementa-
res, aplicando-se as suas disposições à matéria, porém existe incompatibilidade
entre algumas regras do novo CPC comparativamente à Lei de Mediação, e,
quando entrarem em conflito, as regras da Lei de Mediação deverão prevalecer
por se tratar de lei posterior que revoga a anterior, e de lei específica, que der-
roga a genérica, e, com isso, como enfatiza Ada Pellegrini Grinover10, formou-
-se no Brasil um minissistema de métodos consensuais de solução judicial de
conflitos.
Quantitativamente, a intensificação da busca por formas alternativas de
resolução de conflitos visa à diminuição da excessiva carga de processos que
abarrota o Judiciário, ou seja, objetiva maximizar o andamento processual e
minimizar o tempo de duração dos processos e o alto custo processual.
No aspecto qualitativo, os meios alternativos de solução consensual de
conflitos intentam atingir um dos escopos da jurisdição, que é a pacificação
social.
A Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu
e continua regendo a Política Pública Nacional de tratamento adequado aos
conflitos por intermédio da utilização de meios consensuais de tratamento de
litígios, como a mediação e a conciliação.

10 GRINOVER, Ada Pellegrini. Os métodos consensuais de solução de conflitos no novo Código de Processo
Civil. Prodireito Direito Processual Civil, v. 1, p. 51-53. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/
arquivos/2016/1/art20160105-01.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2016.
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Embora essa Política Judiciária Nacional de tratamento adequado de
conflitos tenha por objetivo a mudança de mentalidade dos operadores do Di-
reito, das partes envolvidas em litígios e da sociedade em geral na busca por
uma convivência harmônica, após seis anos, ainda há muita relutância na efeti-
va aceitação da cultura da pacificação.
O novo Código de Processo Civil em vários dispositivos incentiva os
meios alternativos de solução de conflitos, e, nos arts. 165 a 175, estabelece as
normas que regerão a conciliação e a mediação.
Em total consonância com a Política Pública disposta na Reso-
lução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, tanto o art. 24 da Lei
nº 13.140/2015, que dispõe sobre a mediação entre particulares como meio
de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito
da Administração Pública, quanto o art. 165 do novo Código de Processo Civil
determinam a criação de centros judiciários de solução consensual de conflitos,
responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação
e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular
a autocomposição.
O Código de Processo Civil e a Lei nº 13.140/2015 são compatíveis quan-
to aos princípios que regem a mediação: imparcialidade, oralidade, informali-
dade, confidencialidade, autonomia da vontade das partes e independência.
Em relação aos mediadores judiciais, estes deverão preencher o requisito
de capacitação mínima, ou seja, obterem certificado por meio de curso reali-
zado por entidade credenciada, conforme parâmetro curricular do Conselho
Nacional de Justiça com o Ministério da Justiça.
Depois de ser aprovado no curso de capacitação que inclui a exigência
de estágio junto aos Centros Judiciários de Solução Consensual de Conflitos
(Cejuscs) e obter o certificado, o que é controlado pelos respectivos Tribunais
de Justiças ou pelos Tribunais Regionais Federais, o mediador poderá requerer a
sua inscrição no Cadastro Nacional e no Cadastro de Tribunal de Justiça ou de
Tribunal Regional Federal.
Com a efetivação do registro, o Tribunal remeterá, ao diretor do foro
da comarca, seção ou subseção judiciária onde atuará o mediador, os dados
necessários para que o seu nome passe a constar da respectiva lista, a qual será
observada na distribuição alternada e aleatória, respeitado o princípio da igual-
dade dentro da mesma área de atuação profissional.
O § 5º do art. 167 do novo Código de Processo Civil restringe a atuação
de mediadores advogados, impedindo-os de exercer a advocacia nos juízos em
que desempenhem as suas funções.
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3 PROCEDIMENTO DA MEDIAÇÃO
A Lei da Mediação nº 13.140/2015 distingue a mediação judicial da
extrajudicial, estabelecendo dispositivos comuns quanto ao procedimento do
mediador que deverá alertar as partes acerca das regras de confidencialidade
aplicáveis ao procedimento de mediação.
Em razão da natureza e da complexidade do conflito, poderão ser ad-
mitidos outros mediadores para funcionarem no mesmo procedimento, o que
ocorrerá a pedido ou com a anuência das partes.
Na condução do processo de mediação, o mediador poderá reunir-se
com as partes, em conjunto ou separadamente, como também poderá solicitar
as informações que entender necessárias para facilitar o entendimento entre
elas.
Se houver processo judicial ou arbitral em curso, as partes poderão re-
querer ao juiz ou árbitro a suspensão do processo por prazo suficiente para a
solução consensual do litígio, para submeterem-se à mediação, sendo irrecorrí-
vel a decisão que suspende o processo com essa finalidade. De qualquer forma,
a suspensão do processo não obsta a concessão de medidas urgentes pelo juiz
ou árbitro em caso de necessidade.
A mediação será considerada instituída na data para a qual for marcada
a primeira reunião de mediação, e, enquanto transcorrer o procedimento de
mediação, o prazo prescricional ficará suspenso.
A partir da instituição da mediação, as reuniões posteriores somente po-
derão ser marcadas com a anuência das partes.
Quando o acordo for celebrado, o procedimento será encerrado com a
lavratura do termo final. Também quando não se justificarem novos esforços
para a obtenção do consenso, o procedimento será encerrado por termo final
por meio de declaração do mediador nesse sentido ou por manifestação de
qualquer das partes.
Na hipótese de celebração do acordo, o termo final de mediação cons-
titui título executivo extrajudicial e, quando homologado judicialmente, título
executivo judicial.

3.1 Procedimento da mediação extrajudicial


Na mediação extrajudicial, estabelece a Lei nº 13.140/2015 que qual-
quer pessoa capaz que tenha a confiança das partes e seja qualificada para fazer
a mediação poderá funcionar como mediador, independentemente de integrar
qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação. Caso uma das par-
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tes esteja assistida por advogado ou defensor público, o mediador suspenderá o
procedimento até que todas estejam devidamente assistidas.
A Lei de Mediação ainda estabelece que na mediação extrajudicial o
convite para iniciar o procedimento poderá ser feito por qualquer meio de co-
municação e deverá estipular o escopo proposto para a negociação, a data e o
local da primeira reunião. Se o convite não for respondido pela outra parte em
até 30 dias da data do seu recebimento, será considerado rejeitado.
O art. 22 da Lei de Mediação estipula os parâmetros da previsão contra-
tual de mediação que deverá conter: a) prazo mínimo e máximo para a realiza-
ção da primeira reunião de mediação, contado a partir da data de recebimento
do convite; b) local da primeira reunião de mediação; c) critérios de escolha do
mediador ou da equipe de mediação; d) penalidade em caso de não compare-
cimento da parte convidada à primeira reunião de mediação.
Inexistindo previsão contratual completa no contrato de mediação, deve-
rão ser observados os parâmetros estipulados no § 2º do art. 22, ou seja: a) prazo
mínimo de dez dias úteis e prazo máximo de três meses, contados a partir do
recebimento do convite; b) local adequado a uma reunião que possa envolver
informações confidenciais; c) lista de cinco nomes, informações de contato e
referências profissionais de mediadores capacitados: a parte convidada poderá
escolher, expressamente, qualquer um dos cinco mediadores e, caso a parte
convidada não se manifeste, considerar-se-á aceito o primeiro nome da lista;
d) o não comparecimento da parte convidada à primeira reunião de mediação
acarretará a assunção por parte desta de 50% das custas e dos honorários su-
cumbenciais caso venha a ser vencedora em procedimento arbitral ou judicial
posterior que envolva o escopo da mediação para a qual foi convidada.
Se, contratualmente, as partes se comprometerem a não iniciar procedi-
mento arbitral ou processo judicial durante certo prazo ou até o implemento de
determinada condição, o árbitro ou o juiz suspenderá o curso da arbitragem ou
da ação pelo prazo previamente acordado ou até o implemento dessa condição.
O novo Código de Processo Civil, em seu art. 175, não exclui outras for-
mas de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais
ou realizadas por intermédio de profissionais independentes, que poderão ser
regulamentadas por lei específica, compatibilizando com as diretrizes da Lei
nº 13.140/2015 (Lei de Mediação).

3.2 Procedimento da mediação judicial


O novo Código de Processo Civil é silente quanto ao procedimento de
mediação judicial, cujas regras são ditadas pela Lei nº 13.140/2015, especifica-
mente nos arts. 24 a 29.
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Na mediação judicial, exige a lei que o mediador seja pessoa capaz, gra-
duada há pelo menos dois anos em curso de ensino superior de instituição reco-
nhecida pelo Ministério da Educação e que tenha obtido capacitação em escola
ou instituição de formação de mediadores, reconhecida pela Escola Nacional
de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) ou pelos Tribunais,
observados os requisitos estabelecidos pelo CNJ com o Ministério de Justiça.
Na mediação judicial, inexistindo impedimento ou suspeição, os media-
dores não estão sujeitos à prévia aceitação das partes.
As partes deverão estar assistidas por advogados ou defensores públicos,
ressalvadas as hipóteses previstas na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995,
relativa aos Juizados de Pequenas Causas, cujo art. 9º prevê que, nas causas de
valor até vinte salários-mínimos, as partes poderão ser assistidas por advogado,
ou seja, a obrigatoriedade do acompanhamento por advogado é para causas
acima desse valor, e, na Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001, relativa à ins-
tituição de Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal,
cujo art. 10 prescreve que as partes poderão designar, por escrito, representan-
tes para a causa, advogados ou não.
Caso as partes comprovem insuficiência de recursos, será assegurada as-
sistência pela Defensoria Pública.
Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso
de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de mediação.
O procedimento de mediação judicial deverá ser concluído em até ses-
senta dias, contados da primeira sessão, salvo quando as partes, de comum
acordo, requererem a sua prorrogação. Ocorrendo acordo, os autos serão en-
caminhados ao juiz, que determinará o arquivamento do processo e, desde que
requerido pelas partes, homologará o acordo, por sentença, e o termo final da
mediação e determinará o arquivamento do processo.
Haverá isenção de custas caso o conflito seja solucionado pela mediação
antes da citação do réu.

4 O PAPEL DO MEDIADOR
A função primordial do mediador é auxiliar as partes a resolver o conflito
que as envolve.
Conforme salienta Jordi Nieva-Fenoll11, a principal chave da mediação é
a capacidade de persuasão do mediador, que se utiliza de sua formação para

11 NIEVA-FENOLL, Jordi. Mediação: uma “alternativa” razoável ao processo judicial? Revista Eletrônica
de Direito Processual, Rio de Janeiro, v. 14, p. 213-228, 2014, p. 217. Disponível em: <http://www.
epublicacoes.uerj.br/index.php/redp/article/view/14537/15859>. Acesso em: 23 fev. 2016.
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auxiliar as partes, cuja abordagem deverá ser pacífica, sem suscitar qualquer
ameaça, nem assumir um papel preponderante ou impetuoso que as condi­
cione.
De acordo com Deborah M. Kolb12, a atividade dos mediadores se ba-
seia na perspectiva que tem cada um sobre o seu próprio papel e dos demais
atores que intervêm no processo de mediação. Ditas perspectivas determinarão
as decisões que tomará o mediador a respeito das técnicas que irá utilizar no
momento de contribuir à consecução do acordo.
Em geral, as partes, após um fracassado processo de negociação, chegam
à conclusão de que não são competentes, por elas próprias, de remover os obs-
táculos que as impedem de conciliar, buscando em um terceiro uma forma de
viabilizar a via consensual, que não são capazes de encontrá-la por si.
São três os principais elementos para se estabelecer um processo de
mediação: “A existência de partes em conflito, interesses contrapostos e um
terceiro neutro capacitado a facilitar a busca de um consenso entre as partes
conflitantes, ou seja, o mediador”.
O mediador capacitado e preparado, utilizando-se de técnicas persuasi-
vas, tentará restabelecer o diálogo entre as partes, fazendo com que estas ana-
lisem os pontos de vista da parte oponente e também enxerguem o reverso da
situação, deixando de lado o seu posicionamento pessoal, visando à solução do
problema, e passem a raciocinar sobre a melhor solução para aquela situação
conflitante.
Quando as partes deixam as suas posições e passam a analisar o pro-
blema em si, colocando de lado o antagonismo, visando somente ao leque de
possíveis soluções, conseguirão enxergar que o melhor a fazer é chegar a um
consenso, em que não haverá nem quem ganhe nem quem perca, e sim uma
solução em que todos cedem e todos ganham. Nesse caso, a solução trará não
somente a solução do conflito, mas também a pacificação entre as partes.
Ao contrário, quando a solução é oriunda da imposição por meio de uma
sentença que põe fim à controvérsia, sempre haverá a insatisfação de pelo me-
nos uma das partes, ou de ambas. Nesse caso, o litígio pode ter chegado ao fim,
mas não houve a pacificação, e, se qualquer outra situação suceder no mesmo
sentido, as partes retornarão à contenda. Quando a solução é proveniente do
consenso entre as partes, na reincidência, a pacificação ocorrida entre ambas
sempre facilitará o diálogo e haverá uma nova solução amigável.

12 KOLB, Deborah M. Los mediadores. Traducción de Servicio Técnico de Traducciones Celer, S.A. Madrid:
Centro de Publicaciones Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, 1989. p. 43.
RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 89
Nesse sentido, Juliana Demarchi13 observa que muitas vezes, ao narrar a
situação que veio a ensejar o conflito e deu início ao procedimento de media-
ção, as partes permanecem em suas posições, abstendo-se de revelar os seus
reais interesses. Nesses casos, necessário se faz proceder à investigação dos
interesses das partes, mediante a formulação de perguntas aos mediados pelo
mediador. Esses questionamentos têm a função de possibilitar às partes a expo-
sição de seus anseios e aflições, e não a satisfação de meras curiosidades.
No nosso sentir, a revelação dos anseios e das aflições relacionados ao
problema pelas partes irá permitir o afloramento dos seus reais interesses, des-
vencilhados de suas posições, o que possibilitará ao mediador uma melhor con-
dução do procedimento de mediação.
A função do mediador é extremamente importante, cabendo a ele es-
tabelecer a sua credibilidade como uma terceira pessoa imparcial e explicar
o processo e as etapas da mediação para as partes, favorecendo uma atitude
de cooperação, inibindo a confrontação frequentemente utilizada pelo sistema
judicial tradicional.
Outra função do mediador é equilibrar o poder entre as partes, favo-
recendo a troca de informações entre elas e facilitando, assim, o diálogo e a
negociação entre ambas.
Deve também o mediador manter uma atitude de não julgamento, evi-
tando o juízo de valor sobre as questões ou pessoas; a percepção do valor
de uma solução aceitável para ambas as partes; acreditar na capacidade das
pessoas de encontrar solução; ter sempre em conta a importância da relação;
assegurar o equilíbrio nas negociações; manter a neutralidade; buscar a equi-
dade nas negociações (verificar se o acordo é justo e satisfatório, não na ótica
dele, mas sim das partes); dirigir a entrevista e assumir o controle; saber quando
interromper uma discussão não apropriada, mantendo sempre escuta ativa e
atitude calorosa.
O mediador, mediante uma percepção aguçada, deverá identificar aqui-
lo que não foi dito, estabelecendo um diálogo produtivo firmado no respeito,
utilizando uma linguagem neutra, desprovida de qualquer juízo de valor.
Os litigantes escondem a dor, a raiva, deixando-os atrás do seu semblan-
te, e isso em parte ocorre porque eles têm pudor ao mostrar os seus reais sen-
timentos, ou seja, camuflam sob a aparência dos propósitos reputados menos
comprometedores e mais adequados à situação14.

13 DEMARCHI, Juliana. Técnica de conciliação e mediação. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo;
LAGRASTA NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo. Revolução na prestação
jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 49-62, 2008. p. 59.
14 MARTELLO, Maria. Il giudice civile di fronte alla mediazione: la cultura ed il significato della mediazione nella
società moderna, 2014. p. 11. Disponível em: <http://www.judicium.it/admin/saggi/569/M.%20Martello.
pdf>. Acesso em: 10 mar. 2016.
90 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA
Portanto, o mediador deverá captar nas entrelinhas da conversa com as
partes o real sentido que as levou a gerar o conflito, para melhor condução do
procedimento de mediação.
Ademais, o mediador deve apresentar as seguintes qualidades: a) a auten-
ticidade: as pessoas autênticas desenvolvem um conhecimento de si próprias,
uma segurança e uma capacidade de fazer com que ao seu redor exista um
clima de confiança e serenidade; b) a capacidade de escuta ativa: permite a
coleta de informações e contribui para a definição da situação; c) a capacidade
de entrar na relação: a utilização de uma linguagem neutra facilita o estabele-
cimento da relação; d) a capacidade de não dramatizar: dar aos fatos as suas
devidas proporções; e) a arte de bem resumir a situação: assegurar que todos os
participantes tenham a mesma compreensão dos fatos; f) a aptidão de ressaltar
os aspectos positivos e estimular os esforços dos participantes; g) a capacidade
de ver e criar alternativas; h) a capacidade de abertura às diferenças culturais;
i) a persistência e a perseverança15.
Conforme Juliana Demarchi16, é necessário respeitar a identidade das
pessoas envolvidas e o conjunto de todos os elementos que compõem a sua
concepção de vida, tais como valores sociais e familiares, relações afetivas, am-
bições profissionais, etc., pois, sem a consciência de tais elementos, a aborda-
gem do conflito pode levar à incompleta compreensão da situação conflituosa,
dado que o mediador pode pretender avaliar o conflito com base em seus pró-
prios preconceitos (pré-concepções de realidade) e paradigmas, sem alcançar
a compreensão dos diferentes valores e percepções das pessoas conflitantes.
Adverte Humberto Dalla Bernardina de Pinho17 (2011) que, caso a via
consensual esteja irremediavelmente obstruída, por conta de um relacionamen-
to já desgastado pelo tempo, pelas intempéries de uma ou ambas as partes e,
ainda, pela falta de habilidade de lidar com o conflito, será necessário recorrer
à adjudicação ou decisão forçada, por meio da arbitragem ou da jurisdição
estatal.

5 ESPECIFICIDADES DAS ETAPAS DA MEDIAÇÃO


O procedimento de mediação se desdobra em várias etapas a serem per-
corridas sob a condução do mediador, as quais irão auxiliar a chegada de uma

15 EGGER, Ildemar. O papel do mediador, 2005. Disponível em: <http://www.egger.com.br/ie/mediacao.htm>.


Acesso em: 2 abr. 2016.
16 DEMARCHI, Juliana. Técnica de conciliação e mediação. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo;
LAGRASTA NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo. Revolução na prestação
jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 49-62, 2008. p. 50.
17 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. A mediação no direito brasileiro: evolução, atualidades e possibilidades
no projeto do novo Código de Processo Civil. Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. 14, n. 89, jun. 2011. Disponível em:
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9685&revista_caderno
=21>. Acesso em: 31 jan. 2016.
RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 91
solução consensual do conflito. São elas: pré-mediação; investigação; criação
de opções; escolha das opções; avaliação das opções; preparação para o acor-
do e o acordo18.

5.1 Pré-mediação
É uma importante etapa do procedimento de mediação, pois é o primeiro
contato das partes com o meio adequado de solução do conflito. Nessa fase,
as partes conhecerão o mediador, que propiciará a construção de uma aborda-
gem apropriada com as partes, facilitando o nascimento de sua confiança no
procedimento.

5.2 Investigação
Terá início com a primeira reunião, momento em que o mediador irá
esclarecer as normas do procedimento de mediação, receberá o contrato de
mediação e tentará conhecer, por meio de perguntas aos mediados, com escuta
ativa e atenta às várias formas de comunicação verbal e não verbal. Essa etapa é
fundamental para que o mediador incentive e conquiste a confiança das partes.
Nessa oportunidade, o mediador tomará conhecimento da realidade das pes-
soas, dos fatos e dos respectivos pontos de vista, bem como de toda a estrutura
que gerou o conflito.

5.3 Criação de opções


Essa etapa exige bastante criatividade do mediador, cabendo-lhe esti-
mular e levar os mediados à reflexão de possíveis opções de solução, quando
será firmado um compromisso entre todos, no qual as ideias trazidas não serão
objeto de avaliação nem de tomada de decisões.

5.4 A escolha de opções


O mediador auxiliará as partes para que façam a melhor escolha entre as
diversas opções e ideias discutidas, sempre considerando seus interesses, suas
necessidades, seus desejos e seus anseios. Saliente-se que este auxílio é reali-
zado por intermédio da avaliação entre os mediados, e não com sugestões ou
escolha do mediador.

18 BRAGA NETO, Adolfo. Alguns aspectos relevantes sobre a mediação de conflitos. In: GRINOVER, Ada
Pellegrini; WATANABE, Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo.
Revolução na prestação jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 63-70, 2008. p. 57, passim.
92 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA
5.5 Avaliação de opções
Nessa etapa é realizada uma projeção para o futuro das opções de so-
lução apontadas, com a avaliação de cada uma das possibilidades escolhidas,
lembrando Adolfo Braga Neto19 que “deverá estar dentro dos parâmetros da
estrutura onde está alicerçada a realidade que os cercam”.

5.6 Preparação do acordo


O termo final será elaborado conjuntamente, com tudo o que os media-
dos escolheram e identificaram como solução que atenda a seus interesses e
necessidades. As palavras utilizadas deverão conter os objetivos almejados e
contemplar os seus devidos valores, expressando com exatidão as responsabili-
dades de cada uma das partes.

5.7 Acordo e sua assinatura


Atingidos os interesses e as necessidades dos mediados, o termo final
retratará todos os compromissos assumidos na superação do conflito e receberá
o tratamento jurídico necessário.
Mesmo não sendo prescindível a presença de advogado, o mediador tem
o dever ético de exigir que as partes tenham informações legais suficientes sobre
tudo o que estiver sob análise e possa ser objeto de decisão.

6 DIFUNDINDO A CULTURA DA PAZ


Para se tratar do tema da solução de conflitos, deve-se primeiramente
abordar a questão da cultura à qual pertencem as partes envolvidas.
São várias as definições de cultura, pois inclui ideias, sentimentos e pen-
samentos, em um emaranhado de significados, valores e crenças que caracte-
rizam cada grupo, comunidade, setor social e que orientam e determinam a
conduta dos indivíduos.
A cultura é uma integração de regras de conduta apreendidas que carac-
terizam os membros de uma sociedade, assim como suas crenças e seus valores
são utilizados para interpretar os elementos que guiam a relação de um indiví-
duo com outras pessoas. Trata-se do perfil de um grupo social em relação a suas
instituições sociais. O seu estudo provê uma percepção, uma compreensão ou
uma possibilidade de conhecer a forma em que as sociedades manejam aspec-

19 Idem, p. 67.
RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 93
tos sociais, tais como maneiras de negociação, valores e estratégias que ajudam
a interpretar situações e comportamento de outros20.
Para Flora Katz21, o modelo coerente para se compreender um sistema
cultural se constrói pela vinculação entre crenças, opiniões e formas de afeto,
visto que esses elementos possibilitam o exame e a observação dos conflitos
existentes entre pessoas e instituições.
Os conflitos sempre existiram e sempre subsistirão, e a visão positiva
dos conflitos permite visualizá-los com naturalidade, o que facilita a sua admi-
nistração. Os conflitos não devem ser vistos como obstáculos; pelo contrário,
devem ser encarados como normais, não sendo bons nem ruins, e é a resposta
que se dá aos conflitos que os tornam positivos ou negativos. A questão é como
resolvê-los, se por meios coercitivos ou pacíficos.
Cada sociedade tem a sua formação cultural, e, sob o aspecto do trata-
mento de conflitos, o Brasil, desde a época de seu descobrimento, segue o que
recebeu de herança das ordenações do Reino de Portugal, ou seja, os litígios
sempre foram solucionados por meio do órgão encarregado do poder de julgar,
que aplicava o direito convencional ao caso concreto, ou seja, as controvérsias
sempre são levadas ao Judiciário para que este solucione o problema por meio
de uma decisão imperativa proferida por um juiz imbuído de poder decisório.
Ao ser proferida a decisão, a parte vencida, normalmente inconformada,
poderá recorrer a órgão superior que manterá a decisão ou a reformará, poden-
do gerar novo inconformismo. Diz-se que esse sistema é pertencente à “cultura
da sentença”.
A existência da cultura da sentença está intimamente ligada ao conflito,
pois, em qualquer comunidade onde vivem, atuam ou trabalham as pessoas,
sempre haverá divergências de opiniões entre cônjuges, irmãos, parentes, ami-
gos, sócios, vizinhos, pessoas de distintas etnias, etc. Sempre existirão incom-
patibilidades na maneira de satisfazer objetivos ou divergências de valores, opi-
niões ou crenças, o que gera a controvérsia.
No Brasil, o movimento de evolução da “cultura da sentença” para a
“cultura da pacificação” foi sintetizado por Kazuo Watanabe22 em um artigo
destinado a homenagear Ada Pellegrini Grinover, a qual, desde longa data, se
dedica à conciliação e mediação. Nesse artigo, Watanabe enfatiza a necessi-
dade da mudança de mentalidade dos operadores do Direito para o cultivo da
pacificação social.

20 KATZ, Flora. Negociar y mediar el conflicto. Buenos Aires: Legis Argentina, 2010. p. 21.
21 Idem, ibidem.
22 WATANABE, Kazuo. Cultura da sentença e cultura da pacificação. In: YARSHELL, Flávio Luiz; ZANOIDE DE
MORAES, Maurício (Org.). Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ,
p. 684-690, 2005. p. 684.
94 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA
No mesmo sentido discorre Antonio Rodrigues de Freitas Jr.23, mencio-
nando que não se pode negar a difusão da mediação como meio capaz de
oxigenar a mentalidade dos integrantes da comunidade do Direito, com previ-
sibilidade na produção de efeitos culturais e comportamentais. Além disso, não
se pode olvidar que a difusão da cultura da paz, com o crescente emprego da
mediação e de outros meios alternativos de administração de conflitos, possa
produzir efeitos, igualmente saudáveis, na atuação do Judiciário, não somente
sob o ângulo da sua funcionalidade, mas também da sua eficácia.
No nosso sentir, a mediação, como um dos meios consensuais de so-
lução de conflitos, deve ser analisada como instrumento eficaz de conduzir
pessoas que se encontram em desentendimento, com relacionamento abalado,
ou até mesmo rompido, a passar por um procedimento que possibilitará o res-
tabelecimento do diálogo, com ênfase no fortalecimento da relação, e acordar
sobre a melhor forma de chegar a um consenso, pondo fim ao conflito até então
existente.
Logo, o principal objetivo da mediação é pacificar as partes envolvidas
no conflito, fazendo com que se restabeleça o diálogo entre elas, pois, quando
há discórdia sobre algum ponto específico, cada qual focaliza a sua própria
proteção e se torna incapaz de ver além das suas próprias necessidades, ou seja,
cada um efetua a interpretação do problema utilizando os seus parâmetros cul-
turais e valores, em geral não coincidente com o pensamento da parte adversa.
Se observarmos com um olhar mais amplo, perceberemos que a media-
ção preconiza e objetiva levar a paz social à sociedade, visto que integra a von-
tade dos cidadãos em viver bem e em harmonia. Por conseguinte, tem-se que a
mediação objetiva a harmonização das pessoas, o que corrobora a implantação
da cultura voltada à pacificação, que se coloca diametralmente em oposição à
cultura de conflituosidade até aqui vivida em decorrência do sistema da solução
imperativamente adjudicada pela sentença.
No entanto, faz-se necessária uma mudança de conceitos, ou seja, a
substituição da cultura do litígio pela mediação, à qual deverão aderir todos os
operadores do Direito.
O amplo acesso à justiça preconizado por Mauro Cappelletti na década
de 80 do século passado já previa mudanças na estrutura dos Tribunais, como
o uso de pessoas legais ou paraprofissionais, além de modificações no direito
substantivo destinadas a evitar litígios ou facilitar a sua solução e a utilização de

23 FREITAS JR., Antonio Rodrigues de. Conflitos de justiça e limites da mediação para a difusão da cultura da
paz. In: SALLES, Carlos Alberto de (Coord.). As grandes transformações do processo civil brasileiro. São
Paulo: Quartier Latin, p. 509-534, 2009. p. 510.
RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 95
mecanismos privados ou informais de solução de litígios. O autor reconhecia
a necessidade de correlacionar e adaptar o processo civil ao tipo de litígio24.
O Brasil, até agora adepto a levar as contendas para o Judiciário resolvê-
-las, em que a intervenção de um juiz é imprescindível para proferir uma de-
cisão imperativa, hoje revela a necessidade de se adotarem outras formas de
solução de controvérsias para atender aos anseios da sociedade.
Até o presente, os cursos de Direito não ensinam como negociar antes de
propor ou contestar um litígio, tampouco os juízes, como bacharéis em função
específica, uma vez que não dispõem de tempo nem disposição para conciliar25.
Relembra José Carlos de Mello Dias26 que os chineses, influenciados por
Confúcio, utilizam-se da mediação, há centenas de anos, como meio de resol-
ver contendas.
Acreditava Confúcio que seria possível construir um paraíso na terra se os
homens pudessem entender e solver pacificamente os seus problemas. Em toda
a China ainda vigoram Comitês Populares de mediação que se encarregam de,
informalmente, propiciar entendimento entre as partes conflitantes.
Conforme afirma Caetano Lagrasta Neto27, o instituto milenar do Direito
chinês, baseado na filosofia de Confúcio, denominado shuo full, presume a
persuasão pelo diálogo, iniciando-se nos lares, chegando às ruas, ao bairro, até
se transformar em uma grande assembleia, objetivando demover os litigantes,
pois, segundo a filosofia, somente as pessoas destituídas de bom senso recorrem
ao Judiciário.
Ao mencionarmos o hábito chinês de resolver as contendas na informali-
dade sem a presença marcante da decisão imperativa emanada de um poder es-
tatal, pretendemos demonstrar que a cultura chinesa difere da cultura ocidental,
principalmente aquela existente nos países da civil law, onde, na existência de
uma controvérsia, o pensamento coletivo induz a acessar a máquina judiciária
em busca de uma solução, em que as partes expõem os seus desentendimentos,
apresentando as suas razões e provas, e ficam na expectativa de que a decisão
estatal emanada por um juiz togado defina pôr fim ao litígio, na ânsia de que
essa decisão lhes seja favorável.

24 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 1988. p. 71. No mesmo sentido: PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as
reformas do processo civil. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 16.
25 MELLO DIAS, José Carlos de. A mediação vista como forma de pacificação de conflitos. In: SALLES, Carlos
Alberto de (Coord.). As grandes transformações do processo civil brasileiro. São Paulo: Quartier Latin,
p. 569-577, 2009. p. 570.
26 Idem, p. 571.
27 LAGRASTA NETO, Caetano. Mediação, conciliação e suas aplicações pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
In: ______; GRINOVER, Ada Pellegrini, WATANABE, Kazuo (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo.
Revolução na prestação jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 11-17, 2008. p. 13.
96 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA
Obviamente, a solução oriunda da aplicação de parâmetros preestabe-
lecidos na lei ao caso concreto não será totalmente favorável a todas as partes,
deixando o vencido insatisfeito com a decisão. Nesse sentido, o Judiciário po-
derá colocar um fim à controvérsia, porém não estabelecerá a pacificação das
partes conflitantes.
No nosso sentir, a mediação é um dos meios ideais para garantir a pa-
cificação, uma vez que no procedimento, após a aplicação de várias técnicas
pelo mediador, o diálogo se restabelece, gerando uma solução proveniente das
próprias partes que inicialmente não se entendiam.
O acordo gerado por vontade das partes conflitantes é visto como a me-
lhor solução, não havendo nem vitorioso nem vencido, ou seja, obtém-se um
acordo em que todos ganham e saem satisfeitos e, consequentemente, pacifi-
cados.
É nesse sentido que entendemos que a finalidade da mediação é a pacifi-
cação das pessoas e da sociedade em geral, pois, se dentro de uma comunidade
tudo se resolver pacificamente, a harmonia irá imperar e será implantada uma
nova cultura voltada à paz.
A Ministra Ellen Gracie, quando presidente do Supremo Tribunal Federal,
lançou, em 2008, por meio do Conselho Nacional de Justiça, o “Movimento
pela Conciliação”, com o objetivo de “mobilizar os operadores da Justiça, seus
usuários, os demais operadores de Direito e a sociedade, para promover a cons-
cientização da cultura da conciliação, implementar a Justiça de conciliação e,
a longo prazo, a pacificação social”28.
Por essa iniciativa, em todo o Judiciário brasileiro há um trabalho dedica-
do à conciliação que perdura até os dias de hoje.
A arraigada cultura litigiosa não é privilégio somente do Brasil, como
também não o é o movimento voltado à cultura da paz. Exemplo disso é ve-
rificado na Diretiva nº 2008/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho da
União Europeia, que estabelece diretrizes para facilitar o acesso a modalidades
alternativas de solução de conflitos e fomentar a resolução amistosa de litígios,
promovendo o uso da mediação a ser aplicada em litígios transfronteiriços em
assuntos civis e mercantis, bem como incentiva a implantação da mediação
para conflitos internos de cada Estado-membro.
A Diretiva define a mediação em seu art. 3 como

28 WATANABE, Kazuo. A mentalidade e os meios alternativos de solução de conflitos no Brasil. In: ______;
GRINOVER, Ada Pellegrini; LAGRASTA NETO, Caetano (Coord.). Mediação e gerenciamento do processo.
Revolução na prestação jurisdicional. São Paulo: Atlas, p. 6-10, 2008. p. 10.
RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA...................................................................................................................... 97
um procedimento estruturado, seja qual for seu nome ou denominação, em
que duas ou mais partes em um litígio intentam voluntariamente alcançar por si
mesmas um acordo sobre a resolução de seu litígio com a ajuda de um media-
dor. Este processo pode ser iniciado pelas partes, sugerido ou ordenado por um
órgão jurisdicional ou prescrito pelo direito de um Estado-membro.

Nos dizeres de Marta Blanco Carrasco29, a importância da mediação vem


determinada fundamentalmente pela constatação de que uma adequada prote-
ção ao cidadão não consiste exclusivamente no reconhecimento de uma varie-
dade exaustiva de direitos subjetivos, mas sim do seu reconhecimento efetivo.
Em muitos Estados-membros da União Europeia a confiança pública na
administração da justiça encontra-se em baixa. Esse autor também não visualiza,
no âmbito individual de cada Estado-membro, a mudança cultural que levou
os Estados Unidos a um melhor acesso à justiça; ao contrário, há uma atitude
generalizada e uniforme que faz com que muitos esperem que seja o Estado a
tomar iniciativa de introduzir reformas, dando início a essa mudança cultural30.
No entanto, em atendimento e objetivando a transposição da Diretiva
nº 52/2008/CE internamente, a Espanha promulgou:
a) a Lei nº 5, de 6 de julho de 2012, relativa à mediação em assuntos
civis e mercantis, estabelecendo um regime geral da instituição da
mediação na Espanha, com o objetivo de impulsionar o seu desen-
volvimento como instrumento complementar de administração de
justiça;
b) o Real Decreto nº 980, de 13 de dezembro de 2013, que desen-
volve determinados aspectos da Lei nº 5/2012 com quatro aspectos
fundamentais de regulação legal: a formação do mediador; a sua
publicidade por meio de um registro dependente do Ministério de
Justiça; a garantia de sua responsabilidade; e a promoção de um
procedimento simplificado de mediação por meios eletrônicos;
c) a Ordem nº JUS/746, de 7 de maio de 2014, que trata dos arts. 14 e
21 do Real Decreto nº 980/2013 e cria um fichário de mediadores
e instituições de mediação que desenvolvem a sua atividade profis-
sional amparadas nas disposições da Lei nº 5/2012.
A Itália, para atender a Diretiva nº 52/2008/CE, implementou, em sua
legislação interna, a edição da Lei nº 69, de 18 de junho de 2009, a qual dis-
põe sobre matéria relativa ao desenvolvimento econômico e às alterações do

29 BLANCO CARRASCO, Marta. La alternativa de la mediación en conflictos de consumo: presente y futuro.


Anuario Jurídico y Económico Escurialense, El Escorial: Real Centro Universitario Escorial-María Cristina,
p. 129-152, 2009. p. 32.
30 BERLINGUER, Aldo. Hacia un modelo europeo de mediación. Pamplona: Aranzadi, 2013. p. 2.
98 R���������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDC Nº 103 – Set-Out/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA
Código de Processo Civil, com o art. 60 introduzindo o instituto da mediação,
delegando ao Governo a edição de um decreto legislativo destinado a regula-
mentá-la nos âmbitos civil e comercial.
Em atendimento ao art. 60 da Lei nº 69/2009, foi editado o Decreto Legis-
lativo nº 28, de 4 de março de 2010, com o escopo de regulamentar a mediação
na Itália.
O Decreto Legislativo nº 28/2010 estabelece a mediação obrigatória para
diversos assuntos elencados, recebendo críticas de boa parte da doutrina que
discute a sua constitucionalidade, na questão da violação à garantia de acesso
à justiça31.
Para efetuar a transposição da Diretiva nº 52/2008 do Parlamento Euro-
peu e do Conselho da União Europeia, Portugal editou a Lei nº 29, de 19 de
abril de 2013, que estabelece os princípios gerais aplicáveis à mediação do
país, bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos media-
dores e da mediação pública, definindo a mediação e o mediador:
Mediação: “A forma de resolução alternativa de litígios, realizada por
entidades públicas ou privadas, através da qual duas ou mais partes em litígio
procuram voluntariamente alcançar um acordo com assistência de um media-
dor de conflitos”.
Mediador de conflitos: “Um terceiro, imparcial e independente, despro-
vido de poderes de imposição aos mediados, que os auxilia na tentativa de
construção de um acordo final sobre o objeto do litígio”.
Para regulamentar a Lei nº 29/2013, foram editadas, em Portugal, a Por-
taria nº 344/2013, que atribui à Direcção Geral da Política de Justiça (DGPJ)
a competência para organizar a lista de mediadores de conflitos, bem como
os requisitos de inscrição, a forma de acesso e divulgação dela, e a Portaria
nº 245/2013, que confere também à DGPJ a competência para certificar as en-
tidades formadoras de cursos de mediação de conflitos.
O exemplo estrangeiro da Espanha, da Itália e de Portugal, que efetuaram
a transposição da Diretiva nº 52/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho da
União Europeia, editando leis e decretos para, inclusive, implantar a mediação
internamente em seus respectivos sistemas de solução de conflitos, demonstra
a preocupação desses países com a mudança de mentalidade de uma cultura

31 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de; PAUMGARTTEN, Michele Pedrosa. L’esperienza italobraziliana
nell’uso della mediazione in risposta alla crisi dell monopolio statale di soluzione di conflitti e la garanzia
di accesso alla giustizia. Diritto.it., 2012. Disponível em: <www.diritto.it/docs/33346-lesperienza-italo-
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adversarial para uma cultura que tenta pacificar os conflitos existentes em sua
sociedade, a exemplo do Brasil.
É indubitável que a recente legislação brasileira, como o novo Código de
Processo Civil, Lei nº 13.105/2015, está direcionada à solução consensual dos
conflitos, pois há expressa previsão de que o Estado irá promover, sempre que
possível, a solução consensual das controvérsias, bem como incentiva e esta-
belece como dever dos operadores do Direito, juízes, advogados, defensores e
promotores públicos estimular a conciliação e a mediação.
Também a Lei de Mediação nº 13.140/2015 regula e estabelece dispo-
sições gerais de como deverão ser os procedimentos da mediação judicial e
extrajudicial.
Essa legislação volta-se ao restabelecimento do diálogo das partes que
estão envolvidas em um conflito para afastá-las do modelo adversarial, corro-
borando a difusão da cultura da paz.

7 NOTAS CONCLUSIVAS
No tocante aos fundamentos da mediação, nossa posição é de concor-
dância com os três fundamentos da mediação apontados por Ada Pellegrini
Grinover, quais sejam, funcional, social e político, mas ousamos discordar da
ordem de importância atribuída pela autora, pois entendemos que antes do fun-
damento funcional deva estar o fundamento social, pois a mediação já existia
nos primórdios da civilização e sempre objetivou a pacificação social, antes
mesmo da existência de um modelo adversarial estatal representado pelo Poder
Judiciário.
Portanto, a nosso ver, o fato de que a mediação venha a contribuir com
o descongestionamento do Judiciário corresponde a uma consequência da fun-
ção primordial da mediação como meio da pacificação social.
A pacificação social como um dos escopos da jurisdição é o principal
objetivo da mediação, como era antigamente, quando inexistia o poder estatal
interferindo na administração da justiça.
Quanto à restrição prevista no § 5º do art. 167 do novo Código de Proces-
so Civil, relativa à atuação de mediadores advogados, impedindo-os de exercer
a advocacia nos juízos em que desempenharem as suas funções, essa restrição
não deveria existir, ou não deveria abranger a Comarca em sua totalidade, pois
as Comarcas das capitais dos Estados brasileiros possuem vários foros regionais,
o que impede o mediador de desempenhar a sua profissão em todos eles.
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Além disso, até o momento, a mediação judicial é realizada por media-
dores de forma voluntária e graciosa, o que restringe sobremaneira o exercício
da advocacia pelo profissional do direito que se dedica à cultura da paz.
O novo Código de Processo Civil brasileiro inaugurou um novo mode-
lo de processo civil voltado ao espírito colaborativo e prescreveu no § 3º do
art. 165 que o mediador auxiliará os interessados a compreender as questões
e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento
da comunicação, identificar as soluções consensuais por si próprios, adotando,
dessa forma, a mediação passiva.
Com isso, o modelo exige do mediador muito mais habilidade no trata-
mento dados às partes, pois deverá ser perceptivo na detecção dos reais interes-
ses, que na maioria das vezes encontram-se ocultos sob as posições das partes,
e utilizar com cuidado as técnicas de persuasão para que elas cheguem a um
consenso, sem que façam sugestões de possíveis soluções para o problema.
A Lei de Mediação nº 13.140/2015 complementa a novo Código de Pro-
cesso Civil, ao estabelecer o procedimento da mediação judicial e extrajudicial.
Tanto a Lei de Mediação quanto o novo Código de Processo Civil irão
regular a mediação judicial e a mediação extrajudicial, contribuindo com a
mudança gradativa da cultura da sentença (adversarial) para a cultura da paz.
Os Cejuscs, criados em conformidade com a Resolução nº 125/2010 do
Conselho Nacional de Justiça, já são uma realidade e funcionam contribuindo
com o escopo da pacificação social.
Conclui-se que essa nova legislação implementa a mediação como meio
efetivo de solução de conflitos, representando um grande passo a caminho da
pacificação social.
Obviamente que a difusão da cultura da paz se fará gradualmente, mas
acreditamos que trará uma experiência positiva que atrairá crescentes adesões
ao movimento pacifista.

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