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AUTOCOMPAIXÃO:

A ESSÊNCIA DA FELICIDADE
ÍNDICE Prefácio I
Prefácio II
2
3
Olá, tudo bem? 5
Pela ética do cuidado 6
As habilidades para empregabilidade e liderança estão mudando... 7
Nosso percurso 8
Ter por si próprio ódio ou compaixão 10
O sentimento de não ter valor algum 11
A cultura da escassez 12
A vulnerabilidade do ser 14
Que vozes nos habitam? 15
Conexões humanas 18
Sistemas sociais 21
Parceria como forma de valor 23
O que é bem-estar integral? 27
Autocompaixão: a chave para a aceitação de si 28
Cuidando de si mesmo 31
Abrindo o coração no dia-a-dia 32
Autocompaixão e estilos de apego 38
Aprendendo a estar com o sofrimento 39
Cultivando o autoperdão 40
Autoaceitação 41
Bondade em relação a si mesmo 43
Maior bem-estar 46
Expandindo o circulo de cuidado 48
2

PREFÁCIO I
“Há livros que são desinteressantes e sem conteúdo, outros que “Aquele que não sabe ... e pergunta.
são interessantes mas sem muito conteúdo, outros que são Aquele que sabe ... e ensina.
E aquele que ensina ... e pratica!”
desinteressantes mas com algum conteúdo, e finalmente aqueles
que são interessantes e com conteúdo. Esta última definição
Vale a pena conferir as perguntas, os ensinamentos e as práticas
retrata o caso desta obra “AUTOCOMPAIXÃO: A Essência da
contidos nesta pequena grande obra. Boa leitura!
Felicidade” que você está lendo agora. Este livro aborda um
tema que considero de suma importância, a saber, o Propósito
da Vida. Lembro-me bem em uma entrevista com uma repórter, Robert Wong
quando ela me fez a seguinte pergunta: “Sr. Wong, qual o
propósito da vida?” Respondi sem pestanejar: “O Propósito da Consultor, autor e empresário
Vida é viver uma Vida com Propósito!” A repórter exclamou:
www.robertwong.com.br
“Nossa! Esta é a resposta mais curta, precisa e pontual que recebi
até hoje sobre este complexo tema.”

A autora, Gabrielle Picholari, versa sobre esta questão e com


propriedade, pois ela passou por alguns momentos difíceis na sua
própria trajetória de vida e vivenciou algumas crises pessoais que
lhe conferem credibilidade para tratar deste assunto. Pois, como
dizem os entendidos, há três tipos de pessoas que podem sentir-
se realizadas:
3

PREFÁCIO II
O que nos faz felizes? O que destrava nossa curiosidade, nossa Feita de histórias e intensidades, de leituras e conversas, de
aceitação, nossa bondade conosco e com o outro, nossas lentes prática, reflexão e teoria, ela compartilha neste livro exatamente
mais elevadas? Por que, no mundo turvo que vivemos hoje, não o que seu subtítulo propõe, a essência da felicidade. A autora
conseguimos acessar essas lentes com a constância que destrincha, de maneira simples, direta e pessoal, temas
gostaríamos? Nas páginas a seguir, minha amiga Gabi Picholari complexos como sofrimento, cultura da escassez, aceitação,
descortina algumas revelações importantes sobre essas e outras vínculos, bem-estar integral e cuidado. Quando fala de
perguntas. autocompaixão, sua abordagem é precisa ao revelar os três
elementos principais que a constituem: atenção plena, gentileza
Não é contraditório perceber que as manchetes falam tanto de consigo e senso de humanidade comum.
economia e política quando o que as pessoas buscam, no fundo,
é felicidade? Por que, então, parece que isso não é importante, Ao final, são apresentados alguns exercícios práticos para o
quando na verdade é o que mais importa para a maioria de “desbloqueio” da felicidade que ajudam a materializar, na vida
nós? Felizmente, hoje em dia estamos verificando um aumento de cada um e de cada uma, os conceitos abordados.
expressivo nas pesquisas científicas sobre felicidade, que já tem Meditações, elaborações internas e reflexões individuais são um
sido objeto de estudo de vários outros campos do saber há convite à contemplação da única certeza da vida: a mudança.
milênios. De fato, devemos muito do nosso conhecimento sobre Como disse Rubem Alves, “não haverá borboletas se a vida não
um dos assuntos mais urgentes do gênero humano às tradições passar por longas e silenciosas metamorfoses”.
orientais, às sabedorias populares e ancestrais e à filosofia.
Aprendi com a Gabi que a autocompaixão é a base para o
O que precisamos é de um resgate, e isso a Gabi faz muito bem. cultivo do altruísmo consciente. Que este livro sirva como guia
PREFÁCIO II 4

para as longas metamorfoses que escolhermos viver rumo a uma


convivência mais compassiva e feliz. Aproveite a leitura!

 
Alex Bretas

Escritor, facilitador de processos colaborativos e um dos


cofundadores da Multiversidade.

www.multiversidade.org
5

OLÁ, TUDO BEM ?


Este e-book faz parte de um movimento cultural chamado “Olhar Esses desafios são a consequência de um longo processo cultural
Fértil". Os movimentos culturais são convites ao engajamento em de retraimento do princípio feminino, que essencialmente
causas, que façam sentido com os novos valores emergentes, representa a atitude de aceitação diante das coisas, o esperar
que trazem mudanças de atitudes nas sociedades. com paciência e confiança, o permitir que se complete o
Eu idealizei o olhar fértil quando descobri que a depressão é hoje processo de amadurecimento, o entregar-se a uma força em
considerada a doença do século, e que o suicídio é globalmente movimento. Não é à toa que competências como a empatia,
a segunda maior causa de morte de jovens. Pesquisando, eu inteligência emocional e flexibilidade cognitiva têm sido
descobri que esses dados são uma realidade porque nossa consideradas cada vez mais importantes para garantir a
cultura não fomenta o que é necessário para que os indivíduos empregabilidade no mundo contemporâneo. Todas essas
tenham bem-estar integral e realizem seu propósito de vida. habilidades dependem de um princípio feminino saudável, que
Assim, o Olhar Fértil é um movimento cultural idealizado para nos precisa urgentemente ser resgatado a partir do desenvolvimento
dar condições de construir uma sociedade em que possamos ser pessoal de homens e mulheres.
mais saudáveis e viver de uma forma mais plena, fortalecendo Minha intenção ao disponibilizar este livro, é compartilhar um
vínculos humanos, espalhando valores éticos, que são pouco do que eu aprendi, vivendo na própria pele dores e
normalmente associados a valores femininos. É importante inquietações, que me moveram a uma profunda jornada de
deixar claro que os valores femininos habitam em todos nós, autodescobrimento. Sou bem grata a todos que participaram
homens e mulheres, afinal, todos atuamos na vida a partir do dela. Espero poder contribuir na sua!
equilíbrio dinâmico de princípios feminino e masculino de
consciência, e enfrentamos hoje desafios pessoais, interpessoais Com carinho,
e sistêmicos. Gabrielle Picholari
6

PELA ÉTICA DO CUIDADO


“O mais anti-capitalista dos protestos é cuidar de alguém e
cuidar de si. Levar a sério a prática feminilizada e
historicamente invisibilizada de cuidar, alimentar, receber.
Levar a sério a vulnerabilidade, a fragilidade, a
precariedade de cada um e dar apoio, honrar, fortalecer.
Proteger uns aos outros, fazer e praticar comunidade. Um
parentesco radical, uma socialidade de interdependência,
uma política do cuidado.”

Hedva,
(healer norte-coreana)

Bernardo Toro, filósofo e educador colombiano, defende


que o cuidado, as relações ganha-ganha, e o respeito
devem transformar as relações humanas e nos levar a uma
era mais feminina.

“Ou aprendemos a cuidar ou pereceremos”, diz Toro. Ele


afirma que o cuidado é o paradigma central dos novos
valores, que abarcam a educação, segurança pública,
saúde, comunicação e economia.
7

AS HABILIDADES PARA EMPREGABILIDADE E LIDERANÇA ESTÃO MUDANDO:


8

O percurso que te convido a percorrer aqui


é uma espiral ascendente de ampliação de
consciência.

Nosso ponto de partida é a desconexão que


enfrentamos hoje individual e coletivamente,
e caminharemos corajosamente a novas
possibilidades de atuar no mundo,
contribuindo para a revolução do altruísmo.
9
10

TER POR SI PRÓPRIO ÓDIO OU COMPAIXÃO


“De todas as doenças, a mais selvagem é menosprezar nosso ser.” Para remediar o ódio de si, os médicos ocidentais destacaram a
Montaigne necessidade de ajudar seus pacientes a desenvolverem mais a
  benevolência em relação a si mesmos adotando terapias baseadas
Durante um dos seus encontros com cientistas, o Dalai Lama ouviu no conceito de compaixão por si próprio.
um psicólogo falar do ódio de si mesmo. Ele virou-se para o  
tradutor, acreditando ter compreendido mal, depois dirigiu-se ao O obstáculo principal para muitas pessoas que têm uma imagem
psicólogo e perguntou: “O que você disse foi ódio de si? É negativa delas mesmas e adotam comportamentos autodestrutivos,
impossível, não se pode querer o mal para si próprio.” provém também do fato de que a possibilidade de felicidade lhes foi
  por longo tempo recusada. O simples desejo de ser feliz provoca
O psicólogo explicou ao Dalai Lama que infelizmente o ódio de si nelas o ressurgimento de recordações de acontecimentos
próprio é um mal frequente no Ocidente. Seguiu-se uma longa traumatizantes. Essas pessoas chegam então a voltar essa violência
conversa e, após ter ouvido as explicações dos cientistas, o Dalai contra si próprias, em vez de esperar por uma felicidade que sempre
Lama reagiu: “Compreendo um pouco melhor agora. Isso parece lhes escapa.
um profundo mal-estar, uma doença do si-mesmo. As pessoas não
desejam fundamentalmente sofrer, mas se culpam por não ser tão Entretanto, a partir do momento em que aceitam pelo menos a ideia
talentosas ou felizes quanto desejariam.” de que é preferível não sofrer, o que via de regra é uma iniciativa
  difícil, elas estariam dispostas a adotar maneiras de ser e agir que lhes
O psicólogo explicou-lhe que era apenas uma dimensão do permitam escapar do círculo vicioso do sofrimento. Um outro ponto
problema, e que algumas pessoas sofrem abusos e violências de essencial parece ser a tomada de consciência de um potencial de
forma contínua a ponto de chegar a pensar que se sofrem tanto, é mudança. Com muita frequência, as pessoas que agridem a si
porque são fundamentalmente maus. Também explicaram ao Dalai mesmas consideram-se fundamentalmente culpadas, e condenadas
Lama que alguns chegam a ferir a si mesmos voluntariamente, e a ser o que são. É verdade que somos o resultado de uma infinidade
que a automutilação é praticada por 10 a 15% dos adolescentes de fatores incontroláveis (tal como a maneira como fomos tratados na
europeus. O Dalai Lama permaneceu alguns instantes silencioso, infância), mas podemos agir no nosso presente para construir novos
visivelmente comovido. caminhos.
11

O SENTIMENTO DE NÃO TER VALOR ALGUM


Não é raro que algumas pessoas sejam atormentadas pela
impressão de que são indignas de serem amadas,
desprovidas de qualquer qualidade e inaptas à felicidade.
Tais sentimentos resultam do menosprezo e das críticas
reiteradas dos pais ou dos próximos. Acrescenta-se a isso
um sentimento de culpa quando essas pessoas julgam-se
responsáveis pelas imperfeições que atribuem a si.
Assaltadas por pensamentos negativos, não param de se
censurar e se sentir isoladas dos outros.

Alguns estudos sugerem que a solidão extrema é mais


perigosa que o fumo. Trata-se de uma dor em nosso “corpo
social” que precisa ser remediada se quisermos levar uma
vida saudável. As pessoas solitárias são como peixes
nadando longe de um cardume, expostos aos predadores.
A tensão constante que uma ameaça desse tipo exige está
associada a níveis muito mais altos de cortisol pela manhã –
é lutar ou fugir antes mesmo de o dia começar. Com o
tempo, a solidão prolongada prejudica nosso equilíbrio
hormonal e danifica o sistema nervoso.

Infelizmente, a solidão está se tornando uma epidemia. Isso


com certeza terá implicações mais sérias, tanto em termos
de sofrimento individual quanto de custos públicos de
saúde. Um estudo sociológico descobriu que cerca de 25%
dos americanos não têm com quem se abrir.
12

A CULTURA DA ESCASSEZ
Uma pesquisa britânica similar, de 2012, revelou que mais de
um quinto dos participantes se sentiam sozinhos a maior
parte do tempo – e um quarto deles relataram que
passaram a se sentir ainda mais sozinhos ao longo da
pesquisa, que durou cinco anos.

Não há dúvida de que existe uma ligação entre a solidão


disseminada na atualidade e a ênfase da cultura
contemporânea na autonomia e no estilo de vida
individualista, que tendem a enfraquecer as conexões
sociais. Com o declínio da interação ao vivo, temos grandes
chances de que a geração mais jovem experimente a
solidão de forma ainda mais aguda.

Numerosos estudos já mostraram que os vínculos sociais da


vida real são a cura para a solidão – o que não é nenhuma
surpresa. Abrir o coração aos outros, se preocupar com as
pessoas e permitir que nosso coração seja tocado pela
bondade dos demais – vivendo a vida de modo a expressar
a compaixão essencial – são as medidas capazes de criar
fortes conexões sociais. Nascemos para estabelecer
vínculos. Nossa ânsia por conexão – não apenas com nossos
irmãos humanos, mas também com os animais – é tão
profunda que determina nossa experiência da felicidade.

Cultura é o jeito que fazemos as coisas e ela representa um


A CULTURA DA ESCASSEZ 13

emaranhado complexo de situações sem o questionamento do Brené Brown, especialista em vergonha e vulnerabilidade, chegou a
porquê estamos fazendo dessa forma. Uma cultura somente é uma conclusão bem importante, que pode não ser exatamente a sua
desconstruída, quando uma parcela significativa de pessoas própria questão, mas é para um grande número de pessoas.
começa a questionar. É preciso fomentar algum tipo de  
comportamento que venha a substituir o comportamento antigo. Não nos damos muitas vezes o que precisamos pois não nos sentimos
merecedores. E não nos sentimos merecedores pois não nos sentimos
Preencha a seguinte frase: “Eu tenho medo de não ser... o bons o bastante. Estou falando de uma cultura formada em torno da
bastante.” escassez. Vamos compreender no que isso se manifesta?
A ideia é que você responda a primeira coisa que vier à cabeça,  
sem ficar racionalizando, beleza? Escassez: o problema de nunca ser bom o bastante.
 
E aí, como foi pra você preencher essa frase? Veio algo de Nunca ser bom o bastante.
imediato ou de repente não veio nada? Veio apenas uma palavra Nunca ser perfeito o bastante.
ou vieram várias? Nunca ser magro o bastante.
Nunca ser poderoso o bastante.
90% das pessoas que preenchem esse exercício pensam em mais Nunca ser bem-sucedido o bastante.
de uma palavra antes mesmo da frase ter sido completada. E as Nunca ser inteligente o bastante.
respostas mais comuns tem a ver com ser bom ou perfeito o Nunca ser correto o bastante.
bastante. Nunca ser seguro o bastante.
  Nunca ser extraordinário o bastante.
Essa situação interna de escassez é uma tendência mental que é a
base do ciúme, da cobiça, do preconceito e das nossas interações Comparação com a perfeição. As mulheres em especial são a todo
com a vida. Segundo a antropóloga e ativista Lynne Twist, vivemos tempo cobradas da perfeição. Comparar nossa humanidade
numa cultura da escassez, que tem como base a vergonha, imperfeita com algo que não existe, que é a perfeição.
comparação e desmotivação.
14

A VULNERABILIDADE DO SER
Não encontramos espaço para sermos vulneráveis ao
sentirmos que temos pouco. Na raiva e no medo, precisamos
nos defender e nos agarrar ao que a gente tem. Daí fica
mesmo difícil confiar nos outros. O sentimento de que somos
dignos de amor e aceitação desaparecem, impedindo que
criemos vínculos com outras pessoas. Mas os vínculos sociais
são considerados por Maslow como a terceira maior
necessidade do ser humano, logo após as necessidades
fisiológicas. Então dá pra perceber o quanto faz mal não
aceitarmos quem somos?
 
A crise que vivemos hoje é a oportunidade de vasculhar as
perguntas que ainda não foram feitas, para que possamos
caminhar para uma cultura de abundância, e de
reconhecimento de quem somos de verdade.

Em termos de autoconhecimento, podemos pensar que se


os julgamentos são construções que criam realidades, que
realidade estou construindo? Que realidade quero construir?
Os julgamentos não fazem somente parte da explicação de
um problema, mas também mostram algo sobre nosso
observador. A minha maneira de julgar o mundo mostra o
observador que sou. Um julgamento fala mais de quem julga
do que da pessoa que está sendo julgada. E se é a
declaração sobre mim mesmo, o que esse julgamento fala
sobre mim?
15

QUE VOZES NOS HABITAM?


Em muitas ocasiões, não refletimos se os julgamentos emitidos nos profundas, frutos de traumas vividos até os sete anos de idade, e que
pertencem. Ou se simplesmente nos apropriamos de julgamentos ainda não foram trazidos à consciência.
coletivos, disponíveis ao alcance da mão. Em geral, esses
julgamentos nos possuem, e não somos nós que os possuímos. No diagrama a seguir, a parte protetora/controladora, hesitante e a
mente racional formam um time que quer consertar a vida da pessoa
Minha intenção aqui é simplificar ao máximo diversas linhas de indo contra o que está acontecendo, trazendo à tona uma parte que
desenvolvimento humano que estudam as vozes internas que nos calcula muito bem os riscos a serem tomados. Isso acaba acionando
habitam, as nossas contradições, e mecanismos de defesa que autocrítica e tensão. A pessoa acaba se oprimindo ao invés de se
vamos criando para não deixar nossas partes vulneráveis à mostra. ajudar.

Vou trazer um exemplo bastante típico. Quando nos deparamos É importante perceber que a parte hesitante da pessoa é poderosa e
com grandes desafios nos relacionamentos, carreira, saúde, é na verdade aparece para protegê-la. Todas as partes, até mesmo as
natural que uma parte nossa sinta dor, questionando o porquê de que nos atrapalham estão apenas trabalhando para nos proteger, e
estarmos nos colocando numa situação com riscos e sem controle. por isso, quanto maior a nossa capacidade de observar os
movimentos da mente acolhendo todas essas vozes, mais seremos
No diagrama a seguir, a pessoa, que é superficialmente capazes de integrá-las e escolher quais delas alimentaremos.
comunicativa, sentimental, disposta e aventureira, começa a
confrontar-se com “partes menores”, que estão por trás do que as Trata-se de um processo que pode ser demorado dependendo do
pessoas veem. Essas partes, no caso, representam uma grande campo de dor envolvido, que acaba acionando diversos mecanismos
necessidade de proteção e controle que geram uma tensão e de autossabotagem. Esse assunto é complexo, mas o importante aqui
irritabilidade no momento em que a pessoa mais precisa da própria nesse livro é percebermos o impacto positivo que acolher todas essas
força para poder encarar com coragem os desafios. vozes pode ter em nossas vidas.

Facilitar esse diálogo interno seria o processo de ir revelando as


vozes que te motivam e as que te desmotivam, até chegar nas
camadas mais profundas, que geralmente abrigam dores
16

DIAGRAMA DE VOZES INTERNAS SOBRE-


CARREGADA

A figura ilustra o exemplo das vozes internas


presentes em alguém que é superficialmente AUTO- AVENTUREIRA
comunicativa, sentimental, disposta e aventureira.
Porém, internamente residem “partes menores”, que
CRÍTICA
geram conflitos. Essas partes, no caso, representam
uma grande necessidade de proteção e controle
que geram uma tensão e irritabilidade no momento
em que a pessoa mais precisa da própria força para
poder encarar com coragem os desafios.
“TENSÃO” HESITANTE

Criança interior
PERFEC-
Distorções do cuidado CRIANÇA CIONISTA
INTERNA
Mecanismos de sobrevivência

Como te percebem
PROTETOR/ DISPOSTA
SOLITÁRIA CONTROLADOR

CALCULISTA
RACIONAL

HOMEM DE
COMUNICATIVA NEGÓCIOS SENTIMENTAL
(adaptado de The Voice Dialogue
Facilitator’s Guide Handbook, part 1)
17

A ÉTICA DO CUIDADO

QUAL O IMPACTO QUE


NOS CONHECER,
ACEITAR E ACOLHER
PODE TER NO MUNDO DE
HOJE?
18

CONEXÕES HUMANAS
Em muitas ocasiões, não refletimos se os julgamentos emitidos nos Para uma criança, mesmo uma experiência pequena de falta de
pertencem. Ou, se simplesmente nos apropriamos de julgamentos amor e aceitação, pode se transformar em algo grandioso e lhe trazer
coletivos, disponíveis ao alcance da mão. Em geral, esses muita dor.
julgamentos nos possuem, e não somos nós que os possuímos.
Quando nos tornamos adultos, levamos conosco as memórias
Podemos afirmar que um dos maiores medos - senão o maior medo inconscientes dessas dores das nossas necessidades não atendidas. E
dos seres humanos - é o medo do isolamento, e que é da natureza começamos a desenvolver a nossa couraça, uma espécie de
humana buscar criar vínculos. mecanismo de defesa, máscaras que nos impedem de mostrar quem
realmente somos, nos impedem de buscar o amor e a aceitação no
A pesquisadora Brené Brown define vínculo como sendo a energia outro e nos impedem de criar conexão e formar vínculos reais com
criada entre pessoas quando elas se sentem vistas, ouvidas e outras pessoas.
valorizadas; quando elas podem dar e receber sem julgamento. E
quando falamos em sermos vistos, ouvidos e valorizados, estamos A ligação eu/outro é o cerne do que nos torna humanos. Há fortes
dizendo também que, intrinsecamente ligada à nossa necessidade evidências científicas de que muitas coisas parecem depender de
de formar vínculos, está a nossa necessidade de amor e aceitação. nossa capacidade de nutrir compaixão por nós mesmos. Dos
E a partir desse entendimento começamos a explorar os desafios transtornos de ansiedade ao esgotamento no trabalho, das questões
que enfrentamos para estabelecer vínculos reais e empáticos com de relacionamento à motivação, nossa autocompaixão (o cuidado e
outras pessoas. a bondade que devotamos a nós mesmos) ou a falta dela, faz uma
grande diferença.
Segundo a Epigenética - novo ramo da Genética - esses desafios
começam a se formar antes mesmo de nascermos, pois as crenças Quando não a desenvolvemos, é difícil nos aceitarmos, e somos
são transmitidas quando ainda estamos no útero em formação. menos tolerantes e bondosos com nós mesmos. Essa deficiência pode
Porém, na nossa primeira infância, quando vivenciamos as primeiras se manifestar de variadas formas desagradáveis em nossa vida e nas
experiências de falta de amor e aceitação, experienciamos a interações com os outros, especialmente com aqueles que amamos.
realidade a partir do cérebro límbico, ou seja, o cérebro emocional.
19

PONTOS PARA REFLEXÃO:

●  Reconhecer nosso potencial de mudança permite que acontecimentos traumatizantes - aqueles que
contribuem para o círculo vicioso de sofrimento e a manutenção do ódio de si - não impeçam o florescer da
autocompaixão.

●  Os adultos trazem consigo memórias inconscientes de suas primeiras experiências envolvendo a falta de amor
e aceitação e, a partir daí, desenvolvem uma couraça que os impede de formar vínculos reais com outras
pessoas.

●  A nossa cultura contemporânea individualista contribuiu para o enfraquecimento das conexões sociais. Sabe-
se hoje que a solidão extrema é mais perigosa que o fumo.

●  Vivemos numa cultura que fomenta o medo da escassez, o que contribui para sentimentos como o ciúme e a
cobiça, a vergonha e a vulnerabilidade, o que prejudica as nossas interações com a vida. Com a escassez
interna, impedimos que a vulnerabilidade e a conexão humana estabeleça-se. Já podemos escolher
caminhar para a cultura da abundância.

●  O nosso profundo anseio por conexão humana contribui para a nossa experiência da felicidade.

●  Facilitar nosso diálogo interno pode nos ajudar a reconhecer as vozes que nos motivam, e as que
desmotivam. É necessário treinar nossa capacidade de observar os movimentos da mente, acolhendo todas
essas vozes, para assim caminhar em direção à nossa própria integração.
20
21

SISTEMAS SOCIAIS
Na jornada de lidar com as dores que nos impedem de nos aceitar, Se, ao analisar cada ambiente ou sistema social, você respondeu
é importante percebermos que a necessidade de buscar “sim" para as perguntas anteriores, esse é um ambiente que opera a
confiança fora de nós, é apenas um processo que nos ajuda a partir do paradigma da escassez.
reconhecer a confiança que já habita dentro de nós, mas que por Se você conseguiu identificar algum ambiente que vive na cultura da
diversas razões, não conseguimos acessar. escassez, responda as perguntas abaixo:
1) Nesse ambiente que você identificou e que opera a partir da
Para compreender se os ambientes nos quais você vive contribuem cultura da escassez, você consegue estar vulnerável?
com o bloqueio da sua vulnerabilidade (mesmo que Se você respondeu não para a pergunta anterior, responda:
ocasionalmente), antes de mais nada, é preciso identificar se esses 2) Se você estivesse vulnerável nesse ambiente o que poderia
ambientes operam a partir do paradigma da cultura da escassez. acontecer de ruim?
3) Se você estivesse vulnerável nesse ambiente o que poderia
Exercício: Pense em todos os ambientes ou sistemas sociais dos acontecer de bom?
quais você faz parte (família, sala de aula, trabalho, comunidade, 4) Existem crenças nas quais você acredita acerca da vulnerabilidade
grupo de mulheres, grupo de amigos, etc) e sobre cada ambiente, que ainda impedem você de abraçar esse comportamento? Se sim,
responda se os componentes abaixo se fazem presentes: quais são?
Vergonha: O medo do ridículo e a depreciação são usados para Na minha jornada pessoal, eu precisei buscar novas formas de viver
controlar as pessoas? Apontar culpados é uma prática comum? para começar a me libertar das minhas autocríticas, o que me
Humilhações e linguagens abusivas são frequentes? O fortaleceu, me trazendo esperança. Fui viver em três ecovilas ao redor
perfeccionismo é uma realidade? do mundo, que pregam uma cultura de paz que tem, entre muitos
Comparação: Há competição, comparação e disputa o tempo princípios, a comunicação não-violenta, para entrar em contato com
todo? Há um modo ideal de ser ou um tipo de habilidade que é outras perspectivas do que é se relacionar.
usado como medida de valor para todos? Compreenda um pouco sobre o que é comunicação não-violenta
Desmotivação: As pessoas estão com medo de correr riscos e tentar assistindo a este vídeo: http://bit.ly/2mF3rM0 (importante para
coisas novas? As pessoas têm medo de expor suas opiniões? As acompanhar os próximos conceitos!)
pessoas precisam se esforçar para serem ouvidas?
22

“A empatia tem seu perigo; a compaixão não. Compaixão vai além da


capacidade de se colocar no lugar do outro; ela nos permite compreender o
sofrimento do outro sem que sejamos contaminados por ele. A compaixão nos
protege desse risco. A empatia pode acabar, mas compaixão nunca tem fim.
Na empatia, às vezes cega de si mesma, podemos ir em direção ao
sofrimento do outro e nos esquecermos de nós. Na compaixão, para irmos ao
encontro do outro, temos que saber quem somos e do que somos capazes.”

A morte é um dia que vale a pena viver


(Ana Cláudia Quintana Arantes)
23

PARCERIA COMO FORMA DE VALOR


Na minha jornada para retomar a confiança em mim
mesma, eu busquei experiências que me tirassem da zona
de conforto e me fizessem confiar nas pessoas. Uma delas foi
mochilar pela Europa fazendo Couchsurfing, em outras
palavras, dormindo de favor na casa de pessoas
completamente desconhecidas.

A parceria tem sido cada vez mais considerada como um


valor emergente no nosso mundo em transição. Ampliar as
perspectivas viajando e conhecer outras culturas é sempre
bom, porém, podemos ver aplicativos de compartilhamento
de objetos entre vizinhos como o Tem Açúcar, e de caronas
como o Bla Bla Car, ficando a cada dia mais famosos e bem
aceitos.

As pessoas estão sentindo cada dia mais a necessidade de


compartilharem os seus sentimentos, vivências e experiências
para fortalecerem vínculos reais, sentirem-se pertencentes a
uma comunidade e a experienciarem uma felicidade
genuína.

Copie e cole o link abaixo no seu navegador para conhecer


o mais longo estudo sobre felicidade feito até hoje no
mundo e compreender quais são os elementos essenciais
que permitem que ela exista:

http://bit.ly/1XsGUka
24

“A fundação da árvore de consciência é a autoconfiança. A espontaneidade, que é


uma expressão da autoconfiança, é bloqueada e contaminada pelo medo de não
receber amor. Esta é a ilusão básica que sustenta a miséria no mundo: a ideia de
que somos carentes e precisamos receber algo de fora.
Quanto mais realizamos, mais temos desejos. Isso ocorre porque eles nascem da
carência, e a carência não pode ser suprida de fora para dentro. Ela é um estado
emocional no qual acreditamos não ter o que precisamos. O que pode nos libertar
desse estado é o reconhecimento de que tudo que estamos buscando
compulsivamente fora de nós existe em abundância dentro de nós.
 
A completude somente é alcançada quando o ser e o fazer se alinham. ”

Sri Prem Baba


(Psicólogo e Líder Humanitário)
25
26

BEM-ESTAR INTEGRAL
(conceito criado pela Dra. Roberta Ribeiro,
baseado na teoria integral de Ken Wilber)
27

O QUE É BEM-ESTAR INTEGRAL?


A Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como
um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e
não somente a ausência de enfermidades. A saúde é
considerada mais um valor da comunidade do que do
indivíduo.

Indo um pouco além dessa definição, disseminar o conceito


do bem-estar integral é perceber que o bem-estar na vida
moderna se refere não somente à dimensão física, mas inclui
aspectos subjetivos como o equilíbrio emocional, a clareza
mental e o despertar espiritual; bem como os aspectos
culturais e socioambientais - tais quais os recursos
financeiros, naturais e as relações interpessoais.

Todas essas dimensões do bem-estar são interdependentes e


conectadas, assim como a relação entre nosso mundo
interno e externo.

Nas próximas páginas do livro, falarei sobre um tema que


tenho percebido que é de extrema relevância, não apenas
ao seu próprio bem-estar, mas à promoção da saúde como
um valor comunitário. É impossível chegar nesse ideal sem
tocar reflexões existenciais, observação da mente e
portanto, autoconhecimento.
28

AUTOCOMPAIXÃO: A CHAVE PARA A ACEITAÇÃO DE SI


A compaixão de si é tão central à nossa felicidade quanto a que 2) Gentileza consigo, que é o contrário da autocrítica. Aqui é
nutrimos pelos outros – se não até mais -, e, mesmo assim, para importante ressaltar que a autocrítica não é discernimento, pois ele é
muitas pessoas parece tão estranha e desconfortável quanto andar importante pra distinguir o que é benéfico ou não. Porém, a
por aí plantando bananeira. Se ainda não estamos acostumados autocrítica tem a ver com julgamentos moralizadores em que
com isso, é necessário começarmos a desenvolver esta prática. acreditamos que tem algo de errado com a gente, é a voz interna
que nos culpa pela experiência que está acontecendo,
Quanto menos autocentrados e mais voltados para o mundo, mais principalmente quando sofremos. A gentileza então tem a ver com a
felizes somos, mas a autocompaixão é totalmente diferente de disposição de um cuidado amoroso, sem cobrança consigo mesmo.
narcisismo. É possível cuidar de si ao mesmo tempo que se está  
atento aos sentimentos e às necessidades de outras pessoas ao seu 3) O terceiro elemento tem a ver com o senso de humanidade
redor. Os benefícios para a saúde mental e física que advêm da comum que se contrapõe ao elemento do isolamento, que nos
autocompaixão nos permitem inclusive cuidar melhor dos outros. lembra que todos passamos por muitas experiências emocionais
A autocompaixão tem 3 elementos principais: semelhantes, o que nos ajuda a conectar com as pessoas.
  1) Atenção plena é reconhecer as coisas que acontecem sem
resistência e sem se superidentificar com o que chega. É saber que E a autopiedade?
a mudança é a lei da vida, e que nada do que acontece nos Tem muita gente que pensa que a autocompaixão tem a ver com
determina. Tem a ver com lidar com os acontecimentos com vitimismo. Na autopiedade não reconhecemos nossas
abertura, receptividade, não-julgamento e curiosidade. Ou seja, potencialidades nem responsabilidade de cuidar do que precisa ser
você aceita o que vier, para então poder tomar alguma ação a cuidado.
respeito. É importante entender que aceitar o que acontece não  
tem nada a ver com passividade, pois não é possível transformar Quando falamos de gentileza consigo e fazemos um contraponto
sem antes aceitar. Sabe aquele ditado “aceita que dói menos”, com a autocrítica, chega a ser difícil acreditar que vamos evoluir sem
pois é, cabe muito aqui. O nosso sofrimento é menor quando se cobrar, na nossa cultura parece até que ficaremos preguiçosos,
resistimos menos a ele e simplesmente aceitamos o que se sem responsabilidade, como se fôssemos seres estáticos. Mas somos
apresenta, tomando as ações necessárias para lidar com o que seres em processo de transformação e aprendizado, e aí a gentileza
vier. acaba deixando o processo mais fácil, gostoso e fluido.
AUTOCOMPAIXÃO: A CHAVE PARA A ACEITAÇÃO DE SI 29

Tem pesquisas que mostram que as pessoas mais autocríticas são as De acordo com a pesquisadora Kristin Neff, uma das principais
que mais procrastinam. Quanto mais a gente se critica, maior vai pesquisadoras sobre autocompaixão, a melhor maneira de se
ser a expectativa em relação ao resultado, e isso vai fazer com que contrapor à autocrítica obsessiva consiste em compreendê-la, em ter
a pessoa aceite menos desafios pois nunca se sente pronta pra compaixão para com ela, depois substituí-la por uma reação mais
assumir nenhum deles. benevolente. Deixando-nos comover pelo sofrimento que sentimos
  devido ao menosprezo por nós mesmos, reforçamos nosso desejo de
Também não podemos criticar a autocrítica. Ela tem algo a nos cura. Finalmente, após ter batido a cabeça contra as paredes por
dizer e muitas vezes está tentando nos proteger. Segundo Paul tempo suficiente, acabamos por decidir que isso basta, e buscar o fim
Gilbert, pesquisador e médico inglês, na autocrítica patológica, que das dores que causamos a nós mesmos.
constitui um tipo de assédio interior, uma parte de si acusa
constantemente uma outra, que odeia e despreza. Achamos mais Segundo Gilbert, um dos problemas daqueles que se autocriticam de
seguro nos autocensurarmos do que provocar a ira daqueles que maneira excessiva é que não dispõem de recordações reconfortantes
nos abusam, correndo assim o risco do aumento da violência. Às que possam ser evocadas quando se sentem mal, especialmente
vezes chegamos a nos antecipar e nos autocriticar para neutralizar recordações de tratamentos benévolos ou afetuosos. Focam na parte
o risco de sermos humilhados pelos outros. Diminuindo-nos, crítica de si mesmos, aquela que tem tendência a controlá-los e a
esperamos atrair um pouco de simpatia. Mas verificamos que em dominá-los, mas têm dificuldade em fazer subir à consciência e a
muitos casos quem adota essa estratégia esconde uma profunda visualizar imagens benévolas e compassivas. Um dos papéis da terapia
ira por quem o maltratou, acrescida de um sentimento de é ajudar a instaurar uma relação calorosa consigo mesmos.
vergonha.
Para isso, podem ser utilizadas diversas técnicas como sugerir que
Esses sentimentos se manifestam geralmente desde a infância, logo imaginem a maneira como uma pessoa benévola consideraria sua
depois dos maus-tratos infligidos por seus próximos; provocam situação, e adotar o ponto de vista daquela pessoa. Ou ainda, é
distúrbios psicológicos graves, tais como inúmeras formas de fobias proposto que imaginem uma parte deles mesmos, ou que uma pessoa
sociais, angústia, depressão e agressividade voltada para si mesmos imaginária manifesta bondade e uma profunda compaixão para com
ou para os outros. A privação de amor e a autodesvalorização eles, e que evoquem essa imagem quando a autocritica surgir
podem assim conduzir ao desespero, até ao suicídio. novamente.

   
AUTOCOMPAIXÃO: A CHAVE PARA A ACEITAÇÃO DE SI 30

Os exemplos anteriores são a base da maior parte das meditações extrema não percebem que são capazes de bondade para com eles
de autocompaixão conduzidas pela Dra. Kristin Neff. Mais adiante mesmos. Por isso, solicita-se que comecem por identificar essa
neste livro, teremos alguns exercícios que nos preparam para entrar possibilidade, mesmo que sintam de maneira muito fraca, para em
um pouco melhor nas meditações que requerem uma habilidade seguida vivificá-la. Indo um pouco além aqui, inconscientemente,
de visualização. Algumas delas, serão disponibilizadas por e-mail essas pessoas não se sentem merecedoras de paz e de amor. É
por áudio e em Encontros Intimistas (workshops presenciais). importante não distanciar demais “essas pessoas”, pois cada um de
nós pode ter algum nível de rejeição inconsciente limitando o
Encorajar as pessoas a terem compaixão pelos seus erros e crescimento de alguma área da vida. Marisa Peer, reconhecida
inadequações permite com que elas tenham uma visão mais clara hipnoterapeuta, que já atendeu a família real britânica e grandes
delas mesmas quando uma autoverificação é necessária. Ou seja, jogadores de futebol, diz que quando alguma coisa trava e não flui
é possível ter maior clareza das próprias limitações, e isso se dá bem, ela sempre começa o tratamento revendo as crenças em
porque não é necessário esconder de si mesmo suas falhas para relação ao sentimento de rejeição presentes na pessoa.
evitar a própria autocrítica. E isso é benéfico na hora de corrigir
padrões de comportamentos nocivos, trazendo bom-humor e Indivíduos que tem autocompaixão evidenciam maior saúde mental
atenção. do que os que não tem, pois na hora de lidar com a dor e o fracasso,
eles não se condenam. Essa atitude de apoio em relação a eles
Se um paciente se automutila, por exemplo, pede-se a ele que mesmos é associada a menores índices de depressão, ansiedade,
tente sentir compaixão pela sua lesão. É necessário também auxiliar menos perfeccionismo e maior satisfação na vida. Além disso, a
os pacientes a compreenderem que a maneira com a qual autocompaixão tem um elemento de proatividade em relação aos
confrontam suas emoções nunca será objeto de qualquer comportamentos que promovem a manutenção do bem-estar como
desaprovação. Assim, lhes é explicado que não é “mal” se comer bem, ter tempo livre para não se sobrecarregar de trabalho,
automutilar, que isso é compreensível levando em conta o que eles entre outros.
viveram, mas que poderiam considerar uma maneira diferente de
superar suas dificuldades. Agora que vimos as vantagens e desvantagens de nos nutrir
emocionalmente com uma atitude autocompassiva, vamos praticar?
Neff aponta que aqueles que adquiriram hábitos de autocrítica
31

CUIDANDO DE SI MESMO
“Se eu mesmo não tenho paz, como posso ajudar outros a
encontrá-la?
(Tsongkhapa)

Sri Ramana Maharashi foi considerado o grande


representante da sabedoria milenar da Índia no século XX.
Certa vez lhe perguntaram: “Como deveríamos tratar aos
outros?”, e ele respondeu: “Não existem outros.”

Forte, né? Mas com frequência, somos nossa própria “pessoa


difícil”. De fato, é complicado sermos generosos conosco
numa cultura de competição, individualismo e
fragmentação. E mesmo quando escolhemos sermos
empáticos, é necessário respeitar nossos próprios limites para
não fadigar. E a única forma de ampliar nossos limites é
aprender a abrir nossos corações conosco.

Um dos benefícios favoritos da prática do amor, bondade e


compaixão, é que ela nos ajuda a enfrentar a inveja e o
ressentimento. Poucos de nós sequer admitimos – até para
nós mesmos – que sentimos inveja, mas se deixada sem
tratamento, pode se transformar em ressentimento, que por
sua vez, fecha nossos corações. A prática do amor-bondade
e da compaixão, por se basear essencialmente em desejar
bem aos outros, nos condiciona a nos alegrar com a boa
sorte alheia. Esse é o antídoto mais poderoso contra o
problema da inveja e do ressentimento.
32

ABRINDO O CORAÇÃO NO DIA-A-DIA


No Ocidente, desde os tempos de Aristóteles, definimos a
humanidade principalmente em termos racionais. Apenas
recentemente viemos a reconhecer que também somos
seres emocionais, dotados de sensibilidade estética e
espiritualidade. Nós nos sentimos mais vivos quando somos
tocados e comovidos pelas outras pessoas e pelo mundo ao
redor, quando nos sentimos conectados aos outros, quando
encontramos significado e propósito – em outras palavras,
quando nos importamos com algo além de e maior que nós
mesmos. Isso nos torna humanos e nos faz seguir em frente.
Nós fomos criados para estabelecer vínculos.

No entanto, o cuidado pressupõe receptividade, uma


abertura de nossa parte. Um coração endurecido não pode
ser tocado, não pode receber as bênçãos que chegam até
ele. Às vezes o coração se fecha porque fomos feridos e
temos medo de que isso volte a acontecer. Acreditamos
que alguém nos decepcionou ou se aproveitou de nós,
então nos colocamos em guarda. Pensamos que apenas os
estúpidos têm o coração aberto. Podemos ter sido
magoados por um amigo ou familiar, ou por alguém do
trabalho – ou talvez todo o sistema seja opressivo e
explorador. De uma forma ou de outra, todo mundo sente
mágoas. Às vezes durante nossa “educação”, caímos no
cinismo e perdemos o contato com o nosso coração
afetuoso. Mas a autoproteção pode se tornar um hábito, nos
alienando dos outros, de nós mesmos e diminuindo o campo
ABRINDO O CORAÇÃO NO DIA-A-DIA 33

eletromagnético do nosso coração, o que nos deixa inclusive mais Exercício: Estabelecendo uma intenção
suscetíveis a doenças, pois enfraquece nosso sistema imunológico.
Encontre uma postura confortável para se sentar. Se puder, sente-se
Como abrir o coração? em uma almofada no chão ou numa cadeira, com as solas dos pés
Além de meditações que veremos, temos a vida cotidiana para tocando o chão – o que traz a sensação de uma base sólida. Se
praticar! Cada oportunidade de sermos bondosos – e de nos preferir, pode deitar de barriga para cima. Quando encontrar sua
sentirmos elevados pela bondade dos outros – é uma chance para postura, relaxe quanto puder, se necessário fazendo alguns
abrir e aquecer o coração. É importante tomar consciência alongamentos, sobretudo nos ombros e nas costas. Então, com os
quando essas situações surgem, em vez de apenas passar para a olhos fechados, inspire fundo de três a cinco vezes, observando a
próxima ação. Podemos usar a arte também para nos inspirar. movimentação da sua caixa torácica na inspiração e expiração. A
seguir, com uma expiração longa e lenta, expulse todo o ar. Se isso
Na tradição tibetana, a compaixão é reconhecida como o mais ajudar, você pode exalar pela boca. Inspire... e expire.
alto ideal espiritual e a mais alta expressão de nossa humanidade.
Mesmo a palavra em tibetano para compaixão, nyingjé, que Quando se sentir mais calmo, contemple as seguintes perguntas: “O
literalmente significa o “rei do coração”, demonstra que a que eu valorizo profundamente? O que, no fundo do meu coração,
compaixão é uma prioridade. A cultura tibetana é o principal desejo para mim mesmo, meus entes queridos e o mundo?”
recurso que Thunten Jinpa, ex-monge e pesquisador, tem utilizado
para desenvolver treinamentos de inteligência emocional em Concentre-se um pouco nessas questões e veja se surge alguma
Stanford e Harvard. reposta. Se não houver uma resposta específica, não se preocupe,
apenas fique com as perguntas em aberto. Pode ser difícil se
Todo treinamento tem início com o estabelecimento de uma acostumar com isso, uma vez que no geral queremos respostas.
intenção consciente. Existe relação entre o grande volume de Acredite que as próprias perguntas estão funcionando mesmo – e
informação que recebemos no cotidiano e sentimentos difusos de especialmente se não encontrar respostas prontas. Se e quando as
estarmos sobrecarregados e estressados. A intenção consciente, respostas surgirem, reconheça-as e preste atenção a quaisquer
aplicada a esse ou qualquer outro agente estressor, funciona como pensamentos e sentimentos que elas possam trazer.
um filtro a esses sentimentos negativos que nascem do estresse.
ABRINDO O CORAÇÃO NO DIA-A-DIA 34

Por último, desenvolva um conjunto de pensamentos como sua Que todos os seres alcancem a felicidade e suas causas.
intenção consciente – para o dia de hoje, por exemplo. Você pode Que todos os seres sejam livres do sofrimento e suas causas.
pensar: “Hoje, que eu esteja mais consciente do meu corpo, da Que todos os seres nunca sejam separados da alegria que é livre de
minha mente e das minhas palavras quando interagir com os tristeza.
outros. Que eu evite ao máximo ferir aos outros deliberadamente. Que todos os seres permaneçam equânimes, livres das distorções do
Que eu me relacione comigo mesmo, com os outros e com os apego e da aversão.
acontecimentos ao meu redor com generosidade, compreensão e
menos julgamentos. Que meu dia transcorra de modo a estar O amor-bondade é o desejo de que alguém seja feliz; a compaixão é
afinado com meus valores mais profundos.” Assim, crie o tom do o desejo de que alguém fique livre de sofrimento.
dia.
Para que nossas motivações possam se tornar cada vez mais
As intenções também podem nos ajudar a ter mais autocontrole, o alinhadas com nossas intenções, o Dalai Lama uma vez sugeriu um
que pode fazer com que toda a nossa vida pareça muito menos modo simples de verificar nossas motivações, fazendo a nós mesmos
fora de controle. Esse é um modo de exercer o controle onde ele é as perguntas a seguir:
possível, e grande parte do estresse vem da sensação de que
nossas vidas estão fora do controle. Quando estabelecemos uma Isso é só para mim ou para os outros?
intenção pela manhã, estamos fazendo uma escolha do tipo de Pelo benefício de poucos ou de muitos?
dia que queremos ter. Estamos tomando a vida em nossas mãos em Para agora ou para o futuro?
vez de esperar que ela apenas aconteça. Podemos vacilar ou
esquecer nossa intenção completamente por alguns períodos do Essas questões nos ajudam a esclarecer nossas motivações e ter
dia, mas o próprio ato de estabelecer e restabelecer uma intenção consciência crítica da razão de querermos cuidar de nós mesmos e o
nos mostra que temos uma escolha que, por si só, pode nos dar impacto positivo que isso pode trazer ao mundo. A bondade, tem
uma sensação mais intensa de controle. Outra razão é que a muitos benefícios não intencionais, como veremos a seguir, e é
intenção é uma forma de preparação. interessante perceber que quando o cuidado vem com metas
compassivas, no nível emocioanal, cuidadores motivados pelo
As intenções por trás da compaixão são: ecossistema se sentem mais tranquilos, lúcidos e amorosos.

 
35

PONTOS PARA REFLEXÃO:


●  Alguns ambientes que frequentamos exacerbam o sentimento de escassez e
inibem a nossa vulnerabilidade como manifestação do nosso ser dificultando a
conexão que tanto ansiamos.

●  Aprender a se comunicar de forma não-violenta pode contribuir para a criação


de um espaço empático que permita, inicialmente, demonstrarmos as nossas
necessidades.

●  A empatia permite iniciarmos um diálogo construtivo, enquanto a compaixão nos


permite permanecer nesse lugar de compreensão sem que o sofrimento do outro
nos enfraqueça.

●  A importante lição é saber que os bons relacionamentos nos mantém saudáveis e


felizes. Abertura, receptividade, não-julgamento e curiosidade são características
importantes da atenção plena necessária ao desenvolvimento da
autocompaixão.
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PONTOS PARA REFLEXÃO:


●  A gentileza consigo representa, no processo de construção da autocompaixão, o
cuidado amoroso que neutraliza a autocrítica.

●  O senso de humanidade comum é o sentimento de pertencimento que nos auxilia


a criar conexões e a sair do nosso isolamento como um movimento de
desenvolvimento da autocompaixão.

●  Diante da autocrítica, pare e imagine como uma pessoa benévola agiria. Nesse
exercício, aprenda como a bondade e a autocompaixão podem agir para
neutralizar sentimentos de autodesvalorização. Em seguida, comece por identificar
a possibilidade de agir bondosamente consigo mesmo.

●  A prática do amor, bondade e compaixão contribui para o enfrentamento de


sentimentos como a inveja e o ressentimento, pois abre os nossos corações
promovendo um antídoto poderoso de cura.
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38

AUTOCOMPAIXÃO E ESTILOS DE APEGO


Todos nós temos capacidade de sentir compaixão por nós mesmos, À medida que vamos crescendo, segundo os pesquisadores, nossa
mas nem todos nos relacionamos com ela da mesma maneira. De capacidade de nos acalmar vai se desenvolvendo a partir das nossas
acordo com pesquisadores da área, nossas diferenças têm muito a primeiras experiências – um processo de lembrança emocional, por
ver com os mecanismos de proteção que criamos para lidar com assim dizer. Lá no fundo, se temos um estilo de apego seguro,
desafios e decepções na vida. Estudos de desenvolvimento infantil acreditamos que estamos seguros e bem – ou pelo menos
e personalidade afirmam que a ativação e o estabelecimento do acreditamos nessa possibilidade porque já a conhecemos.
que os cientistas conhecem como sistema afiliativo durante os Idealmente, essas memórias permanecem como um cobertor de
primeiros anos de vida da criança são muito importantes. Esse segurança para situações de estresse. Assim, nosso estilo de apego
sistema afilitativo, ou de cuidado, como também pode ser afeta nossos hábitos de regulação emocional, o que tem uma
chamado, é associado a sentimentos de segurança, proximidade e influência importante sobre nosso limiar de autocompaixão na idade
contentamento e está ligado à nossa produção natural de adulta.
opiáceos e de hormônios como a oxitocina (às vezes referida como
“hormônio do aconchego”). Se nossas primeiras experiências não foram tão ideiais assim,
precisamos construir aquela sensação de calor e segurança a partir
Idealmente através dos cuidados que recebe, o bebê passa a do zero durante a idade adulta. Isso não é fácil, mas é bem possível,
reconhecer os pais como fonte de conforto, tranquilidade e por já termos a matéria-prima – nossa experiência do sofrimento e
segurança. A partir dessas primeiras experiências, o bebê cria nossa capacidade humana natural de sentir compaixão.
memórias emocionais de segurança e tranquilidade e não esquece
mais. Nesse cenário feliz, o bebê seria abençoado com o que os Se não estamos entre os sortudos cujo estilo de apego é seguro,
psicólogos chamam de um estilo de apego seguro. Segundo o podemos aprender a sentir compaixão por nós mesmos justamente
trabalho de John Bowlby e Mary Ainsworth, estudiosos da teoria do por causa disso. Ao mesmo tempo, nossa personalidade pode ser
apego, existem quatro estilos principais: seguro, preocupado- mais flexível e adaptável à mudança do que pensamos.
ansioso, desapegado-evitativo e assustado-evitativo. No entanto,
esses conceitos se aplicam não apenas aos primeiros anos, mas Para isso, o início do processo consiste em aprender a distinguir entre a
também à forma como afetam nossa personalidade, sobretudo voz da “observação”e a do “julgamento” em nossos pensamentos.
nossa maneira de estabelecer relacionamentos ao longo da vida.

 
39

APRENDENDO A ESTAR COM O SOFRIMENTO


A voz da observação reconhece fatos, enquanto a do julgamento Para sermos verdadeiramente compassivos em relação a nós
se limita a interpretá-los. Se passamos por alguma situação mesmos, precisamos examinar se nos aceitamos e nos perdoamos.
estressante em aeroportos, por exemplo, frequentemente ideias Quando nutrimos ressentimento e inimizade por alguém, não
preconcebidas, suposições e generalizações cheias de carga conseguimos sentir compaixão e preocupação genuínas por essa
emocional emergem como reação ao que de fato aconteceu. Um pessoa. O mesmo vale para nós mesmos. Assim como a compreensão
livro que recomendo sobre este tema é “Comunicação Não- nos leva a perdoar os outros, compreender nossos pensamentos e
Violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e ações como parte da condição humana faz nascer o autoperdão.
profissionais”, do Marshall Rosenberg. Além, claro, do trabalho da Somos apenas humanos. Precisamos dessa compreensão e do
coach de comunicação autêntica, Carolina Nalon, que trouxe num autoperdão que flui a partir dela.
dos vídeos sugeridos neste livro conceitos importantes já aqui
tratados. Marshall Rosenberg, o criador do método da comunicação não-
  violenta (CNV), fala, sobre essa ideia: “Um aspecto importante da
A partir de nossa experiência cultural, do nosso meio social e da autocompaixão é a capacidade de abraçar empaticamente as duas
nossa infância, cada um internalizou uma representação de si partes de nós mesmos: a que se arrepende de alguma ação passada
mesmo, um conceito que exerce uma influência poderosa em e a que realizou aquela ação.”
nosso cotidiano – porque afeta a forma de percebermos nós
mesmos e o mundo. Quando nos julgamos de forma muito dura e recusamos nos perdoar
David Kelley, fundador do Instituto de Design de Stanford, diz que os por algo que fizemos, na verdade estamos atacando aquela parte de
conceitos rígidos que temos sobre nossa criatividade nos impedem nós que realizou a ação, de maneira consciente ou inconsciente.
de criar. Ele afirma, a partir do princípio da confiança criativa, que Porém, sem entender nossa individualidade por completo, não
a criatividade é inata em todos. Na compaixão também existe uma seremos capazes de aceitá-la por completo – e, sem compreensão e
capacidade destemida pelo fato de sabermos que a aptidão para aceitação, não podemos aprender com os erros.
sentí-la já está dentro de nós. Isso pode ajudar a acabar com as
dúvidas e os medos que muitas vezes bloqueiam a expressão da A seguir, assista ao vídeo da Carolina Nalon ensinando um prático
nossa parte mais generosa. exercício para exercer a autoempatia: http://bit.ly/2nKsHCk
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CULTIVANDO O AUTOPERDÃO
No treinamento para compaixão ensinado em Stanford, são
utilizados os seguintes exercícios.

Exercício: Perdoando a si mesmo

Sente-se numa posição confortável e relaxada. Faça de três


a cinco respirações profundas, enchendo o peito a partir do
abdome e soltando o ar depois. Permaneça em silêncio
alguns segundos.

Agora pense numa situação em que você fez algo que


desejaria não ter feito e depois se censurou por isso. Talvez
você tenha explodido com alguém que ama e ficou se
sentindo mal em razão disso. Ou pode ser algo que só afetou
você, como ter gastado demais numa compra, e o deixou
sentindo culpado e envergonhado depois.

Não é importante lembrar os detalhes do incidente, a não


ser que isso o ajude a evocar a reação emocional que
experimentou naquele momento. O essencial é recordar
como você se deixou cair em julgamentos negativos. Fique
em silêncio com essa reflexão.

Então se pergunte: “Por que será que reagi de modo tão


ríspido?”
“Qual era a necessidade não atendida que eu estava
tentando suprir quando fiz aquiilo?” Pode ser que, quando
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CULTIVANDO O AUTOPERDÃO AUTOACEITAÇÃO


perdeu a paciência, você estivesse precisando de respeito e se Infelizmente, para a maioria das pessoas na cultura moderna, a
sentiu desrespeitado pelo outro. Talvez precisasse ser ouvido, e não sensação de ser aceito por completo, com todos os defeitos, é rara,
era isso que estava acontecendo. Fique um pouco com essas se não inteiramente desconhecida. Se tivermos sorte, temos alguém
reflexões. na vida com quem nos sentimos totalmente à vontade. Essa pessoa
nos faz sentir que sua estima e sua afeição por nós não dependem do
Agora reconheça que, embora o que você fez (digamos que que conquistamos na vida ou de algo que precisamos fazer por ela.
xingou alguém, por exemplo), tenha sido uma atitude inábil, a Na verdade, sentimos que ela entra em contato direto com nosso
necessidade por trás da sua ação era legítima. No caso de ter próprio ser. Práticas meditativas também podem lhe oferecer a
gastado demais e se sentir envergonhado, talvez você estivesse sensação de aceitação incondicional. Iremos praticar algumas delas
desanimado e deprimido, precisando de um empurrãzinho em encontros presenciais, mas por ora, vamos continuar com um
emocional. Com consciência deles, permita-se experimentar exercicio do Treinamento em Compaixão.
sentimentos como tristeza, decepção e remorso em vez de culpa e
vergonha. Faça uma pausa e fique com esses sentimentos. Exercício: Aceitando a si mesmo

Ao entrar em contato com a necessidade subjacente que o levou Mais uma vez, faça de três a cinco respirações profundas, enchendo
a agir daquela maneira, fique com ela por um tempo. o peito a partir do abdome e soltando o ar suavemente. Permaneça
alguns segundos em silêncio.
Agora, expirando o ar, lenta e completamente, libere qualquer
tensão no corpo, deixe de lado qualquer rigidez da mente e, Agora traga à sua mente uma imagem que representa para você,
refletindo sobre seus pensamentos anteriores de autocensura, diga amor, cuidado, sabedoria e força. Leve o tempo que for necessário
em silêncio para si mesmo: “Eu posso abrir mão disso. Eu vou fazer para esse pensamento compassivo permear a sua mente. Não é
isso.” necessário ter uma imagem realista; o essencial é sentir sua presença.

Por fim, imagine que você se sente livre e expansivo em seu peito, e Agora imagine que, na presença dessa imagem, você se sente
então expire plenamente mais algumas vezes. completamente você mesmo – nada mais, nada menos.

 
42

AUTOACEITAÇÃO
Não há necessidade de fingimento de tentar ser alguém que
você não é. Não há julgamento nem voz crítica. Em vez
disso, o que você encontra é a simples aceitação, calorosa
e terna. Alimente-se dessa sensação de aceitação
incondicional. Como se sente? Sente seu coração batendo
mais devagar, uma liberação de tensão em algum lugar do
corpo, uma sensação de desapego?

Retenha essa imagem compassiva enquanto continua


respirando. Ao inspirar, visualize raios de luz cálidos
emergindo da imagem e tocando todas as partes do seu
corpo. Conforme esses raios chegam até você, imagine que
o acalmam, aliviam seu sofrimento e lhe dão força e
sabedoria. Permaneça com esse pensamento por algum
tempo, em silêncio.
Repita essa sequência de visualização de raios de luz
inspirando em você sentimentos de segurança, serenidade e
total tranquilidade.
Se achar que essa prática da imagem não funciona bem no
seu caso, pode tentar um outro método que sugere
retomarmos situações da vida em que nos sentimos vistos,
ouvidos e reconhecidos por alguém que demonstrou
preocupação conosco num momento difícil da vida.
No consultório, eu percebo que a hipnose também é um
instrumento bastante eficiente.
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BONDADE EM RELAÇÃO A SI MESMO


Muitas pessoas sentem que são menos pacientes consigo mesmas
do que seriam com os outros. Na prática da autocompaixão,
aprendemos a mudar isso e a dirigir nossa bondade e nossa
preocupação naturais a nós mesmos. Abrimos os círculos de
compaixão que criamos e nos deixamos entrar.

No Treinamento de Compaixão, a seguinte visualização é utilizada.

Exercício: Bondade em relação a si mesmo

Imagine que você é uma criança pequena, um bebê, talvez, livre


mas ainda vulnerável, correndo pra lá e pra cá, derrubando
algumas coisas pelo caminho. Ou, se for mais fácil, imagine uma
época da infância da qual consiga se lembrar. Você sentiria um
impulso instintivo de proteger essa criança? Em vez de julgamentos
negativos, críticas e repressão, não sentiria ternura e carinho? Deixe
que esses sentimentos de ternura por seu eu criança preencham
seu coração e então repita silenciosamente as seguintes frases:

Que você seja livre da dor e do sofrimento.


Que você seja livre do medo e da ansiedade.
Que você experimente paz e alegria.
Que você seja livre da dor e do sofrimento.
Que você seja livre do medo e da ansiedade.
Que você experimente paz e alegria.

 
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PONTOS PARA REFLEXÃO:

●  Nosso sistema afiliativo determina o nosso estilo de apego, que por sua vez
influencia a nossa personalidade e a forma como nos relacionamos com os outros.

●  Exercite a compaixão consigo e comece a encontrar aquele lugar de aceitação


incondicional dentro de si mesmo. Valide-se todos os dias!

●  Pratique exercícios que o permitam desenvolver a autocompaixão. Respire, reflita,


sinta.
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MAIOR BEM-ESTAR
Treinar a compaixão contribui para um relacionamento mais É verdade que às vezes pessoas muito bondosas se magoam e não se
positivo com outras pessoas, pois nos tornamos gratos pelas pessoas recuperam com facilidade. Talvez sejam mais sensíveis ao sofrimento
mais importantes em nossa vida ao lhes desejarmos felicidade e dos outros e focadas em excesso no bem-estar alheio. É útil lembrar a
libertação do sofrimento. A compaixão também fortalece nosso distinção entre empatia e compaixão. A empatia é muito importante
senso de propósito de vida, e há evidências sugerindo que um para dar origem à compaixão, mas ficar encalhado na zona de
maior propósito está correlacionado com saúde física e empatia pode ser exaustivo e levar a sentimentos de impotência e
longevidade. esgotamento. Por isso, a autocompaixão é tão importante para nos
nutrirmos e criarmos o espaço interno para sentirmos compaixão, um
Por fim, o treino da compaixão tem tudo a ver com crescimento estado interno mais poderoso, no qual empenhamos nossa energia
pessoal, a última dimensão do bem-estar psicológico. Um esforço em desejar aos outros que se livrem do sofrimento e procuramos fazer
consciente para transformar nossa perspectiva de vida e mudar o algo a respeito. A bondade é a expressão dessa compaixão por meio
modo como nos relacionamos com nós mesmos e com os outros da ajuda prestada, uma forma básica de altruísmo. É a
seres humanos – ou seja, estarmos envolvidos num processo autocompaixão que pode garantir um equilíbrio saudável entre a
consciente e comprometido de crescimento – é necessariamente nossa preocupação conosco e com os outros. Assim, não caímos em
algo que faz com que nos vejamos como seres em constante extremos.
aperfeiçoamento. Quando a bondade chega até nós, sentimos relaxamento,
Talvez o maior benefício do treinamento de compaixão para a reconhecimento e valorização, nos sentimos afirmados. Quando
saúde mental seja o fato de nos tornarmos mais resilientes. Um ajudamos alguém devido a uma preocupação genuína por seu bem-
estado de mente compassivo é necessariamente menos estar, nossos níveis de endorfina – o hormônio associado à sensação
preocupado consigo, mais relaxado, menos inibido. Não é exagero de euforia – aumentam, causando o que conhecemos como “o
dizer que é a nossa conexão com os outros que nos torna livres. prazer de ajudar”. Os estudos nos quais os participantes eram
Segundo Thupten Jinpa, que coordena o Treino de Cultivo de orientados a estender a compaixão aos outros de forma consciente,
Compaixão em Stanford, quando o ego é resiliente, não há apontam que a satisfação advinda de uma ação altruísta é efeito
necessidade de erguer muros e colocar máscaras para nos dela, não seu objetivo. Esta é a “pegadinha” - feliz – da compaixão:
proteger. Podemos parar de nos esconder e apenas ser. quanto mais ajudamos os outros, mais saímos ganhando.
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“COMO EXPANDIR O CÍRCULO


MORAL E DESENVOLVER O
LIDERANÇA
ALTRUÍSMO?
COMPASSIVA
O ALTRUÍSMO PODE SER UMA
SOLUÇÃO REAL E PRAGMÁTICA
PARA O MUNDO HOJE?”

(MATTHIEU RICARD)

• 
48

EXPANDINDO O CÍRCULO DE CUIDADO

“A sobrevivência global depende do desenvolvimento da fazendo todo mundo meditar pra mostrar que com treinamento
compreensão até então pouco considerado: a compaixão por mental, nossas intenções mudam, e podemos ser motivados pela
estranhos.” solidariedade e encarar o altruísmo como uma solução real e
(Paul Ekman) pragmática para a maior parte das questões globais.

Nesse trajeto que fizemos até aqui - a partir da desconexão até a Podemos perceber que a tal revolução do altruísmo proposta tem
compaixão -, estamos falando sobre como nos libertar de uma bastante a ver com o amadurecimento dos seres humanos, e com a
cultura que tem seu fundamento no medo. E que a mudança dos coragem de cada um em descobrir e seguir seu propósito de vida.
nossos paradigmas interiores tem um grande papel nisso. Imaginem Não é sobre criar um trabalho com propósito, mas sobre criar uma
só um mundo com mais pessoas comprometidas a agirem pra vida com sentido.
terminar com o sofrimento do outro e gerar felicidade, sem  
esquecerem de si mesmas? Enxergar o trabalho como algo que está separado do propósito e do
sentido da vida faz parte de uma visão fragmentada de mundo que
É exatamente isso que o Matthieu Ricard, biólogo molecular e nós estamos ultrapassando.
monge, considerado o homem mais feliz do mundo e o cérebro  
mais estudado em Harvard, junto com o Richard Davidson, um As pessoas que me procuram para fazer um coaching de propósito de
renomado neurocientista, têm tentado fomentar, trazendo vida, buscam, em realidade, amadurecer, serem quem são, e
argumentações bastante lógicas. harmonizar o trabalho com o ritmo natural de suas vidas.
Simplesmente porque isso é sustentável, para cada indivíduo e para o
Se nos preocupamos com nossos amigos e família, por que não mundo.
podemos nos importar com toda a humanidade quando tomamos
decisões importantes? Se você não tivesse que ganhar dinheiro nem agradar alguém, o que
  você faria da sua vida? O que faria com o seu tempo?
Isso porque se você tem consideração pelos outros, vai se
preocupar em tornar o mundo um lugar melhor. Então esses
cientistas participaram do último Fórum Econômico Mundial,
EXPANDINDO O CÍRCULO DE CUIDADO 49

“A síntese da maturidade é a tranquilidade de ser o que se é.” SUSTENTAR O BEM, O PRAZER POSITIVAMENTE ORIENTADO E O BOM É O
(Eduardo Gianetti) MAIOR DESAFIO NO NOSSO PLANETA.

Essas reflexões existenciais acabam surgindo ao longo da vida. Rick Podemos utilizar o nosso tempo com sabedoria e significado, ou não.
Jarrow, consultor em desenvolvimento humano e facilitador em Para mim, a autocompaixão como combustível da compaixão, é a
alinhamento vocacional, aponta que à medida que trabalhamos chave para uma vida repleta de significado.
para a autêntica manifestação da carreira, vamos descobrir a
necessidade de recuperar uma profunda confiança em nós Todos os temas aqui trazidos são amplos e profundos, mas espero
mesmos e nos outros. As terapias podem ser muito úteis para isso e sinceramente que algumas das reflexões e sugestões oferecidas aqui
podem ser necessárias se quisermos passar para um estado de possam te ajudar a perceber que ao colocar a compaixão no centro
maior funcionalidade. Em termos de experiência meditativa, o de sua vida, é possível testemunhar sua capacidade em contribuir
nosso nível de confiança se revela facilmente por nossos padrões para a transformação do mundo!
de respiração.

É por isso que eu considero todos esses temas tão conectados.


Jarrow ainda diz que nessa busca por mais propósito, no que diz
respeito ao mundo interior, a regra básica é confiar em tudo que se
apresenta – isso é válido em particular para a meditação e para ser
honesto e claro em relação a ela.

Sri Prem Baba, psicólogo e líder humanitário, diz que o nosso


propósito está sempre relacionado com inovação, que vai
contribuir com a evolução da espécie humana rumo ao que ela
pode chegar. Para encontrá-lo, é preciso olhar pra dentro, ver o
que faz sentido e transbordar isso pra fora.
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RESUMINDO:
●  Compaixão: a última dimensão do bem-estar psicológico.

●  Saiba distinguir a empatia da compaixão. A empatia é muito importante para dar


origem à compaixão, mas ficar encalhado na zona de empatia pode ser exaustivo
e levar a sentimentos de impotência e esgotamento. Por isso, a autocompaixão é
tão importante para nos nutrirmos e criarmos o espaço interno para sentirmos
compaixão, um estado interno mais poderoso, no qual empenhamos nossa
energia em desejar aos outros que se livrem do sofrimento e procuramos fazer algo
a respeito.

●  Se todos nos empenharmos em desenvolver a compaixão, poderemos transformar


aspectos internos que nos impedem de colocar nossos dons e talentos a serviço de
algo maior que nós mesmos. A compaixão nos aproxima do nosso propósito de
vida. Podemos fomentar a revolução do altruísmo treinando para sermos
motivados pela soliedariedade!
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REFERÊNCIAS

JINPA, T (2016). Um coração sem medo, Rio de Janeiro: Sextante.

LOPEZ, Gabrielle Stephanie Picholari. UMA ANÁLISE DA AUTOCOMPAIXÃO SOB A PERSPECTIVA DO EMPREENDEDORISMO SOCIAL. Trabalho
de conclusão de curso: Pós-graduação Latu Sensu em Bases da Medicina Integrativa apresentado ao Instituto Israelita de Ensino e
Pesquisa Albert Einstein, São Paulo, 2016.

Neff, K.D., Kirkpatrick, K.L., & Rude, S.S. (2007). Self-compassion and adaptive psychological functioning. Journal of Research in Personality,
41(1), 139-154.

Neff KD; Vonk R (2009). Self-compassion versus global self-esteem: two different ways of relating to oneself. J Pers;77(1):23-50.

Neff, KD (2009). The Role of Self-Compassion in Development: A Healthier Way to Relate to Oneself. Hum Dev;52(4):211-14.

Neff, K. & Germer, C. K.. (2013). Self-compassion in clinical practice. Wiley Periodicals, 69, 1-12.

Ricard, M (2015). A revolução do altruísmo, São Paulo: Palas Athena.

Tichener, E (1909). Elementary psychology of the thought processes.

http://www.nudeyogagirl.com/

http://www.fernandalenz.com/
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“MINHA MISSÃO É AJUDAR PESSOAS A SE SENTIREM BEM E CAPAZES


DE CRIAR SEU PRÓPRIO CAMINHO DE DESENVOLVIMENTO.”
GABRIELLE PICHOLARI

Gabrielle Picholari acredita que o autoconhecimento é a maior ferramenta de cura que


existe. Há 8 anos, dedica-se ao desenvolvimento integral do ser humano e pesquisa, ao
redor do mundo, medicinas integrativas e processos de autotransformação. Formada em
Administração, com Master em Gestão Ambiental pela UNSW (Austrália), iniciou sua carreira
na área de RH da IBM e depois seguiu atuando em consultorias de Inovação e
Sustentabilidade como CoCriar e MateriaBrasil. Formou-se terapeuta integrativa no Hospital
Albert Einstein. Atualmente segue a formação em Yoga com o Professor Marcos Rojo. É
facilitadora pelo Instituto Ecosocial e formada em Coaching para o bem-estar integral pela
MedIntegral. Também é parte da Rede Ubuntu, que apoia o Eupreendedorismo. Atua
acompanhando jovens no processo individual ou coletivo de reconhecimento de seus
potenciais e construção da autoestima, para que encontrem seu verdadeiro propósito e
vivenciem mais bem-estar, autoconfiança e felicidade. Sua realização é promover
conexões e compartilhar conhecimento. Com esse intuito, idealizou o movimento Olhar
Fértil.

11 986 742 223 | gabrielle@olharfertil.co | olharfertil.co


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PARCEIROS
AGRADEÇO!
Se quiser saber mais, estou à disposição:
gabrielle@olharfertil.co | www.olharfertil.co

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