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Enid Blyton

Os cinco na casa em ruínas

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Série Os Cinco - 15
Editorial Notícias
End Blyton
Os cinco na casa em ruínas
Título original
FIVE ON A SECRET TRAIL
by Methuen and Ca, Ltd.,
London, 1961
Tradução de MARIA DA GRAÇA MOCTEZUMA
Texto digitalizado para ser lido
por Deficientes Visuais

OS CINCO NA CASA EM RUÍNAS


Tudo começou quando o Tim apareceu com um enorme golpe numa orelha. quem adiv
inharia que um facto tão banal daria .origem a mais uma aventura?
A casa em ruínas, o rapaz desconhecido, misteriosos ruídos, não menos misteriosas
luzes, e eis os Cinco na pista de qualquer coisa que não compreendem  e que certam
ente terão de decifrar.
Por que motivo alguém quer assustar os pequenos e afastálos da casa em ruínas? Ond
e fica o túnel que procuram e que oculta ele?
Não é de admirar que os Cinco tenham resolvido investigar. E não nos surpreende t
ambém que se vejam envolvidos em misteriosos acontecimentos, com muitas surpresas 
boas e más  à mistura.

1
Índice
Capítulo I - A Zé fica zangada
Capítulo II - A Ana vai ter com a prima
Capítulo III - A casa de campo abandonada
Capítulo IV - Naquela noite
Capítulo V - Outra vez o mesmo rapaz
Capítulo VI - Uma trovoada durante a noite
Capítulo VII - Estranhos acontecimentos
Capítulo VIII - Novamente juntos
Capítulo IX - As ruínas romanas
Capítulo X - Que vai acontecer
Capítulo XI - Descobertas interessantes
Capítulo XII - Um óptimo esconderijo
Capítulo XIII - À espreita, na casa em ruínas
Capítulo XIV  Uma surpresa
Capítulo XV  Muito bem, Zé!
Capítulo XVI  A passagem secreta
Capítulo XVII - Muitas surpresas
Capítulo XVIII - A saída
Capítulo XIX - Novamente no Casal Kirrin
Capítulo XX - A aventura acaba como começou!

Capítulo I
A Zé fica zangada
- Mãe! Mãe, onde está?  gritou a Zé, correndo para casa.  Depressa, Mãe!
Não houve resposta. A mãe da Zé estava lá fora, ao fundo do jardim, apanhando flore
s. A Zé chamoua mais uma vez, com toda a força.
 Mãe! Mãe! Onde está? É uma coisa urgente!
De repente, perto da Zé abriuse uma porta e apareceu o pai da pequena, furioso
.
 Zé, que barulho vem a ser este? Lembrate de que estou no meio dum trabalho mui
to...
 Ó pai! O Tim magoouse!  interrompeu a Zé.  Ele foi...
O pai olhou para o Tim, que estava atrás da pequena com um ar submisso.
 Magoouse! Até o acho muito bem! Naturalmente enfiou algum espinho numa pata e
tu julgas que é o fim do mundo, desatando a gritar dessa maneira, como se...
 O Tim está ferido!  exclamou a Zé, com lágrimas nos olhos.  Ora veja!
Mas o pai voltara a meterse no escritório, batendo com a porta. A Zé lançoulhe um o
lhar furioso, ficando parecidíssima com o seu irritável pai.
 Antipático!  gritou ela.  E... Oh! Lá vem a mãe. Mãe!
 Santo Deus, que se passa, Zé?  perguntou a mãe, pousando as flores.  Ouvi o teu p
ai gritar e agora és tu que gritas!
 Mãe, o Tim está ferido!  disse a Zé.  Veja! A pequena ajoelhouse ao pé do cão e, com to
o o carinho, puxoulhe para baixo uma das orelhas. Ficou a descoberto um grande go
lpe. O Tim ganiu. A Zé olhou para a mãe com os olhos cheios de lágrimas.
 Não sejas pateta, Zé  disse a senhora.  Foi só um golpe. Como lhe aconteceu isto?
 Ele quis saltar uma vala e não viu um pedaço de arame farpado que lá estava  expli
cou a Zé , O arame raspou na orelha e fezlhe este horrível golpe. Não pára de deitar sangu
e.
A mãe da Zé examinou o golpe. Era bastante profundo.  Leva o Tim ao veterinário, Zé 
disse ela.  Naturalmente tem que levar uns pontos. Parece bastante fundo. Coitado
do Tim. Foi uma sorte não lhe ter apanhado um olho.
 Vou leválo já ao veterinário  disse a Zé, levantandose.  Ele estará no consultório?
 Com certeza. É a hora da consulta  disse a mãe.  Levao já.
Assim, o Tim seguiu com a sua dona pelo caminho que ia ter à linda casinha de
campo onde vivia o veterinário. A Zé ficou mais aliviada ao ver que o senhor não acho
u o caso nada grave.
 Com dois ou três pontos o golpe fica bom num instante  disse ele.  Segurao enqua
nto eu lhe faço o tratamento. Vai doerlhe um bocadinho. Vamos lá. Quieto! Muito bem!
Cinco minutos mais tarde a Zé agradecia de todo o coração ao veterinário.  Obrigado!
Eu estava tão aflita! Agora não há perigo?
 Claro que não. Mas nunca o deixes coçar a ferida  disse o veterinário, lavando as
mãos.  Pode fazerlhe muito mal.
 Mas como poderei impedilo?  perguntou a Zé preocupada.  Repare, já está a coçála com a
ta!
 Então tens que lhe pôr uma rodela de cartão a fazer de coleira  explicou o veterinár
io.  Deve ficar bem direita à volta do pescoço de maneira que as patas não possam chega
r ao golpe por mais que ele tente.
 Mas... mas o Tim não vai gostar nada duma coisa dessas  disse a Zé.  Os cães ficam
muito ridículos com coleiras de cartão como se fossem golas à volta do pescoço. Já tenho v
isto. O Tim vai detestar.
 É a única maneira de evitar que ele coce o sítio do golpe  disse o veterinário.  Adeu
s, Zé, tenho mais consultas a fazer.
A Zé foi para casa com o Tim. Este ia todo satisfeito com o alarido que a peq
uena fizera por sua causa. Quando estavam quase a chegar a casa, sentouse inesper
adamente e levantou uma das patas traseiras para coçar a orelha ferida.
 Não, Tim! Não!  gritou a Zé, assustada.  Tu não podes coçar! Era um sarilho se arrancas
ses o adesivo.
O Tim olhou para a sua dona, admirado. Muito bem! Se a Zé não queria que ele coça
sse, esperaria até se encontrar sozinho.
Mas a Zé sabia ler os pensamentos do Tim tão bem como ele adivinhava os dela!
 Que maçada!  disse ela, de sobrolho carregado.  É preciso fazerte uma coleira de c
artão. Talvez a mãe me ajude.
A mãe ajudoua da melhor vontade. A Zé não tinha jeito para coisas desse género e fic
ou vendo a mãe cortar uma grande rodela de cartão, ajustandoa depois à volta do pescoço d
o Tim e finalmente atoulhe as extremidades com cordéis, para ele não a poder tirar. O
Tim estava muito surpreendido mas permanecia quieto, cheio de paciência.
Logo que a coleira ficou pronta e bem presa ao seu pescoço, o cão afastouse. Dep
ois, levantou uma das patas de trás para coçar a orelha mas, claro está, não conseguiu i
r além da coleira, limitandose a arranhar o cartão.
 Não te importes, Tim  disse a Zé.  Isto é só por uns dias.
A porta do escritório, que ficava próximo, abriuse e apareceu o pai da Zé. Ao ver
o Tim com a sua coleira, parou surpreendido. Depois desatou às gargalhadas.
 Ó Tim! Tu pareces a rainha Isabel I, com a sua gola engomada!  disse ele.
 Não faça troça, pai  pediu a Zé.  Bem sabe que os cães não gostam.
Realmente o Tim parecia ofendido. Voltou as costas ao pai da Zé e foi para a
cozinha. Ouviuse uma sonora gargalhada vinda dali e outra pessoa começou a rirse na
porta que dava para o quintal. Era o leiteiro.
 Ó Tim, para que andas com esse cartão?  perguntou a cozinheira.  Ficas tão bem apan
hado!
A Zé zangouse e continuou amuada durante todo o dia, aborrecendo a família intei
ra. As pessoas eram tão más por se rirem do Tim! Não compreenderiam como era desagradáve
l andar com uma rodela de cartão como aquela. E o Tim não a podia tirar nunca, nem d
e dia nem de noite. Até lhe custava deitarse. A Zé andava dum lado para o outro com u
m ar tão zangado que a mãe começou a impacientarse.
 Ó Zé, não sejas pateta! O teu pai acaba por se aborrecer. O Tim deve usar a rodel
a de cartão pelo menos uma semana, bem sabes. Na verdade parece um tanto cómico quan
do se vê pela primeira vez. Mas ele daqui a pouco nem dará por ela.
 Todos fazem troça dele  disse a Zé, furiosa.
 Há bocado foi ao jardim e uma porção de miúdos puseramse em cima do muro a rir perdi
damente. O carteiro disseme que era uma crueldade. O pai acha que ele fica ridículo
e...
 Ó Zé, não comeces com um dos teus ataques de mau génio  pediulhe a mãe.  Lembrate de qu
a Ana em breve deve estar aqui. E não se divertirá se te portares dessa maneira.
A Zé continuou zangada no dia seguinte. Então, depois de dois dissabores com o
pai por causa do Tim, doutro com dois rapazes que se riram dele e de mais um com
o rapaz dos jornais, resolveu não ficar no Casal Kirrin nem mais um dia!
 Vamos levar a minha barraca de campanha e ficamos sozinhos em qualquer part
e  disse ela ao Tim.  Num sítio em que ninguém te veja até a tua orelha estar melhor par
a poderes tirar esse horrível cartão. Não achas boa ideia, Tim?
 Uuuuf!  fez o Tim, pois achava que todas as ideias da sua dona eram esplêndida
s.
 Até os outros cães fazem troça de ti  disse a Zé, amargamente.  Viste como aquele idi
ota do pêlodearame da Sr.a James ficou parado a olhar para ti? Parecia exactamente q
ue se estava a rir. Eu bem sei que tu não toleras uma coisa destas!
O Tim certamente não gostara mas na verdade não estava tão preocupado com o cartão
como a Zé. Seguiu a pequena até ao quarto e ficou a vêla meter algumas coisas numa male
ta de mão.
 Vamos para qualquer sítio isolado, no campo  disselhe ela.  Armamos a nossa barr
aca junto dum regato e ficaremos aí muito bem instalados até a tua orelha estar melh
or. Partimos esta noite. Levo a minha bicicleta e amarro a bagagem atrás do selim.
E a meio da noite, quando o Casal Kirrin estava escuro e silencioso, a Zé, ac
ompanhada pelo Tim, desceu as escadas com todo o cuidado. Deixou um bilhete sobr
e a mesa da sala de jantar e foi buscar a bicicleta. Amarroulhe a pequena barraca
de campanha e a mala contendo alimentos e outras coisas necessárias.
 Vamos  segredou ela ao surpreendido Tim.
 Partimos já. Eu vou pedalando devagar para que tu possas correr ao meu lado.
Peçote por tudo que não ladres.
Desapareceram na escuridão da noite; o Tim correndo como uma sombra ao lado d
a bicicleta. Ninguém dera pela partida da Zé. O Casal Kirrin continuava em paz e sos
sego e só o portão ficou a bater pois a Zé esqueceuse de o fechar.
Mas pela manhã, que grande sarilho! Joana, a criada, foi a primeira pessoa a
encontrar o bilhete da Zé não percebendo o que faria na mesa da sala de jantar uma c
arta com a letra da pequena. Correu ao quarto de dormir da Zé e espreitou lá para de
ntro.
A cama estava vazia. A Zé não estava lá e o cesto do Tim também estava vazio. A Joa
na foi levar o bilhete à senhora.
 Valhame Deus! A Zé às vezes é muito pateta
 disse ela depois de o ler.  Vê lá tu, Alberto, tanta coisa só por causa do Tim! Ag
ora a Zé foise embora com ele, sabese lá para onde!
O marido pegou no bilhete e leuo em voz alta.
 Querida Mãe: Vou passar alguns dias fora até a orelha do Tim estar melhor. Levo
a minha barraca de campanha e mais algumas coisas. Não se preocupe, por favor. Di
ga à Ana que se quiser vir ter comigo ao fim do Caminho dos Carroceiros, eu depois
levoa ao sítio onde tenciono acampar. Digalhe que vá ao meiodia.
Um beijo da sua Zé.
 Está muito bem!  exclamou o pai da pequena.  Deixaa acampar, se ela assim quer.
Estou farto de a ver malhumorada. Diz à Ana que vá ter com ela pois assim talvez eu c
onsiga estar alguns dias em paz.
 A Zé ficará em segurança  disse a mãe da pequena.  É muito sensata e tem o Tim com ela.
Esta manhã mal a Ana chegue, heide pedirlhe que vá ter com a prima.
Quando a Ana chegou à estação de Kirrin e procurou a Zé e o Tim não os viu. Só a tia es
tava à sua espera, sorrindo como de costume.
 Que se passa?  perguntou a Ana.  Onde estão a Zé e o Tim?
 A Zé foise embora sozinha  disse a tia Clara.  Vamos andando e eu contote.

Capítulo II
A Ana vai ter com a prima
A tia Clara depressa contou à Ana o que se passara com a orelha do Tim e com
a rodela de cartão. A Ana não pôde deixar de sorrir. Ó tia Clara, a Zé tem uma loucura pelo
Tim! Vou ter com ela ao meiodia e claro que também fico acampada um ou dois dias.
O tempo está óptimo! Vai ser muito divertido! O tio Alberto até deve gostar de saber q
ue ficamos fora de casa.
 Como estão o Júlio e o David?  perguntou a tia. Ela era muito amiga dos seus sob
rinhos, irmãos da Ana e portanto primos da Zé.  Não vêm a Kirrin durante estas férias?
 Não sei  respondeu a Ana.  Continuam em França numa excursão do colégio. Sintome difer
ente quando não estou com eles. A Zé vai ficar furiosa ao saber que naturalmente não a
parecem por cá. Eu não chego para a divertir!
Ao meiodia a Ana estava parada pacientemente no fim do Caminho dos Carroceir
os. Este seguia através do campo e terminava num carreiro sinuoso que não ia ter a n
enhum sítio especial. Cresciam por ali grandes arbustos e algumas árvores. A Ana, le
vando às costas uma pasta onde metera as suas coisas, olhava para os campos em red
or, na esperança de descobrir a Zé.
Mas a prima não aparecia.  Que maçada!  pensou a pequena.  Naturalmente mudou de i
deias. Ou talvez o relógio de pulso dela tenha parado e não saiba que horas são. Mas p
ode muito bem calculálas regulandose pelo sol. Quanto tempo terei de esperar?
Sentouse à sombra dum grande arbusto. Não estava ali havia um minuto quando ouvi
u um barulho.
 Pssssst!
A Ana levantouse logo. O som vinha do outro lado do arbusto. Meio escondidos
entre as folhas estavam a Zé e o Tim!  Olá!  disse a Ana, surpreendida.  Não me viste ch
egar? Olá, querido Tim! Como vai a tua orelha? Não achas que fica tão engraçado com a ro
dela de cartão?
A Zé saiu do arbusto.  Escondime aqui porque o pai ou a mãe podiam vir ter comigo
para me levarem para casa  disse ela.  E quis ter a certeza de que não estavam à espe
ra, a pouca distância. Estou muito contente por teres vindo, Ana.
 Claro que tinha de vir  disse a Ana.  Não ficaria sozinha no Casal Kirrin enqua
nto estivesses aqui acampada. Além disso compreendo perfeitamente o que tu sentes
por causa do Tim. A coleira de cartão é muito boa ideia mas fálo parecer um pouco cómico.
Mas eu mesmo assim achoo um amor, palavra!
A Zé ficara muito aliviada por a Ana não se ter rido do Tim, como acontecera co
m a maior parte das pessoas. Sorriu para a prima a quem o Tim deu tantas lambede
las que ela teve de o afastar.
 Vamonos embora  disse a Zé.  Arranjei um sítio lindo para acampar, Ana. Fica perto
dum regato; por isso há bastante água para o Tim beber e para nós também. Trouxeste alg
uma comida?
- Confesso que já tenho pouca coisa.
 Mas eu trouxe toneladas  disse a Ana.
 A tia Clara obrigoume. Ela não está zangada contigo, nem o teu pai; quando me vi
m embora estava fechado no escritório.
A Zé ficou logo com melhor disposição. Deu à Ana uma palmada amigável.  Vai ser bem di
vertido! A orelha do Tim depressa ficará melhor e ele gosta tanto de acampar ao ar
livre como nós. Realmente encontrei um lugar óptimo, no sítio mais isolado de todos e
stes campos. Não há ninguém perto de nós.
Partiram juntas, acompanhadas pelo Tim, que dava uma corrida de vez em quan
do, ao farejar algum coelho.
 Quando chegam o Júlio e o David?  perguntou a Zé.  Daqui a poucos dias. Nessa alt
ura a orelha do Tim já estará curada e nós poderemos voltar para casa para os receber
e nos divertirmos um bocado.
 São capazes de não vir a Kirrin estas férias
 disse a Ana, fazendo logo mudar a expressão da Zé. Esta parou, olhando para a p
rima com um ar desconsolado.
 Não vêm? Mas eles vêm sempre nas férias ou então vamos a qualquer sítio todos juntos!
 exclamou ela , É preciso virem! Sem o David e o Ju, vou sentirme muito triste.
 Por enquanto estão em França, numa excursão  explicou a Ana.  Saberemos se eles ten
cionam continuar ali ou vir para Kirrin quando voltarmos para casa. Não te ponhas
com um ar tão carrancudo.
Mas a Zé sentiase desapontada. As férias que se estendiam à sua frente pareciamlhe
agora longas e monótonas. Os seus dois primos eram sempre tão divertidos! E haviam p
assado juntos por aventuras tão maravilhosas!
 Não teremos nenhuma aventura se os rapazes não vierem  disse a Zé, a meia voz.
 Isso não me importa  afirmou logo a Ana.  Eu tenho um espírito pacífico e não ando se
mpre à procura de qualquer coisa estranha que possa acontecer, como tu e os meus i
rmãos. Talvez estas férias sejam absolutamente pacatas, sem mesmo o cheiro duma aven
tura. Ó Zé, alegrate! Não te ponhas tão triste. É melhor mandarmos um telegrama ao Júlio e ao
David se te sentes assim tão aborrecida.
 Bem me apetece!  confessou a Zé.  Nem quero pensar numas férias sem os rapazes. A
ssim não seremos os Cinco, os Famosos Cinco!
 Uuuuf!  fez o Tim, concordando. Depois sentouse, tentando coçar a orelha, mas o
cartão impediuo. No entanto, não ficou preocupado e correu atrás dum coelho, todo sati
sfeito.
 Acho que tu estás mais preocupada com a coleira de cartão do que o próprio Tim  di
sse a Ana, enquanto caminhavam.  Já estamos perto da tua barraca, Zé? Fica bastante l
onge!
 Subimos por este monte à nossa frente e depois descemos a uma espécie de cova  d
isse a Zé.  Fica perto duma casa de campo abandonada e em ruínas. Primeiro pensava qu
e vivia lá gente mas quando me aproximei mais vi que estava em ruínas. Tem uma grand
e trepadeira de rosas, subindo até pelo lado de dentro. Deve ter sido plantada pel
os seus antigos moradores.
Subiram o pequeno monte e tornaram a descêlo, seguindo por carreiros sinuosos.
É melhor termos cuidado com as cobras  disse a Ana.  Este é o género de sítio onde elas c
ostumam viver. Sinto imenso calor, Zé! Haverá aqui perto algum sítio para tomarmos ban
ho e nadarmos?
 Não sei. Podemos procurar  disse a Zé.
 Até trouxe o meu fato de banho. Repara, já se vê parte da tal casa de campo desab
itada. A minha barraca fica muito perto. Achei melhor acampar próximo do regato.
Em breve chegavam à barraca da Zé. Fizera uma cama lá dentro com tojo e folhas se
cas. Tirando isso, viase apenas um púcaro, uma caixa com biscoitos de cães, algumas l
atas e um grande pão. A Ana achou que a Zé levara muito pouca coisa e sentiuse satisf
eita por ter fornecido bem a sua mala.
 A tia Clara arranjou dúzias e dúzias de sanduíches  disse a Ana.  Recomendou que as
guardássemos nesta lata para não ficarem secas e durarem mais um ou dois dias, até vo
ltarmos para casa. Estou com apetite. Queres provar umas sanduíches?
Sentaramse ao sol, comendo sanduíches de fiambre. A Ana também levara tomates e
as duas pequenas ora davam uma dentadita numa sanduíche ora num tomate. O Tim teve
que se contentar com uma mãocheia de biscoitos de cães e pedacitos de sanduíche de vez
em quando. Depois dalgum tempo o cão levantouse, afastandose.
 Onde vai ele?  perguntou a Ana.  Procurar coelhos?
 Naturalmente vai beber água  disse a Zé.  O regato fica na direcção que ele tomou. Ta
mbém tenho sede. Vamos buscar o púcaro para bebermos água.
Partiram com o púcaro, a Ana seguindo a Zé através do tojo espesso. O regato tinh
a um aspecto encantador. Era evidente que fora utilizado pelas pessoas que havia
m vivido na casa pois tinhamlhe arranjado as margens com grandes pedras brancas e
assim a água, duma limpidez cristalina, corria por um pequeno canal.
 Ai! Está gelada!  exclamou a Ana.  É deliciosa. Sou capaz de beber mais dum litro
.
Quando voltaram do regato, deitaramse no tojo, ao sol, conversando. O Tim co
ntinuava a vaguear dum lado para o outro.
 Isto aqui é tão sossegado  disse a Ana.  Não deve haver ninguém nas proximidades. Só os
passarinhos e os coelhos. É mesmo como eu gosto!
 Quase se não ouve um som  disse a Zé, bocejando.
Mas, exactamente quando acabara de falar, ouviuse um barulho a distância. Um s
om agudo, como o metal batendo a pedra.
 Que será?  perguntou a Zé, sentandose.
 Não faço ideia  respondeu a Ana.  E de qualquer modo é bastante longe. Está tudo tão ca
lmo que os sons ouvemse a grande distância.
Pouco depois o barulho repetiuse por algum tempo, voltando a parar. As peque
nas fecharam os olhos e adormeceram.
A Zé acordou quando o Tim apareceu. Ele sentarase pesadamente sobre os pés da pe
quena, sobressaltandoa.
 Tim! Não faças isso!  disse ela.  Sai de cima dos meus pés! Fizesteme apanhar um sus
to!
O Tim desviouse contra vontade, agarrando qualquer coisa que deixara cair; d
eitouse e começou a chupar. A Zé quis ver o que era.
 Tim! É um osso! Onde o arranjaste?  perguntou ela.  Ana, trouxeste algum osso p
ara o Tim?
 Que estás a dizer?  perguntou a Ana, meio a dormir.  Um osso? Não, não trouxe. Porq
uê?
 Porque o Tim encontrou um, e até tem carne cozida agarrada  explicou a Zé.  Por i
sso não é de nenhum coelho ou de qualquer outro animal que ele tivesse apanhado. Ond
e o arranjaste, Tim?
 Uuuuf!  fez o Tim, e deu o osso à Zé pensando que talvez ela também gostasse de lh
e dar uma chupadela, visto parecer tão interessada.
 Achas que alguém estará acampado aqui próximo?  perguntou a Ana, sentandose a bocej
ar.  No fim de contas os ossos não nascem nos campos! E esse está cheio de carne. Tim
, roubasteo a outro cão?
O Tim abanou a cauda, continuando entretido com o osso. Parecia muito satis
feito.
 Mas é um osso velho  disse a Zé.  Deita mau cheiro. Afastate, Tim. Leva isso para
mais longe.
Os sons agudos e metálicos recomeçaram e a Zé franziu o sobrolho.
 Acho que está alguém acampado aqui próximo, Ana. Anda ver se descobrimos alguma c
oisa. Proponho mudarmos a nossa barraca para outro sítio se estiver alguém aqui pert
o. Vamos, Tim. Enterra esse horrível osso. Por este lado, Ana.

Capítulo III
A casa de campo abandonada
As duas pequenas seguidas pelo Tim foram andando, ao sol. A certa altura, a
Ana avistou a casa em ruínas e parou.
 Vamos dar uma vista de olhos pela casa  propôs ela.  Deve ser muito antiga, Zé.
Dirigiramse ao sítio da entrada. Já não havia porta mas apenas um largo arco de pe
dra. Dentro, viase um compartimento espaçoso. O chão fora em tempos de pedra branca,
mas agora cresciam ervas e plantas rasteiras, tendo levantado algumas das pedras
e tornando o chão desnivelado.
Em vários sítios, parte das paredes havia caído e a luz entrava pelas aberturas.
Uma das janelas continuava mais ou menos intacta mas as outras tinham desapareci
do. A um canto viase uma pequena escada de pedra, bastante estragada, que seguia
para o andar superior.
 Está aqui outro arco de pedra que dá para um segundo compartimento, mais pequen
o. Repara no lavadouro e isto devem ser os restos duma bomba.
 Nada aqui tem grande interesse  disse a Zé, olhando em volta.  Os quartos lá de c
ima devem estar em péssimo estado pois metade do telhado desapareceu. Olha, aqui e
stá outra porta, devia ser a de serviço. E esta é mesmo uma porta e não apenas uma arcad
a de pedra.
A pequena deu um empurrão à porta, que imediatamente saiu dos gonzos, caindo so
bre um pátio cheio de plantas silvestres.
 Santo Deus!  exclamou a Zé, sobressaltada.
 Nunca pensei que estivesse tão apodrecida. Fiz com que o pobre Tim apanhasse
um grande susto.
 Aqui há várias dependências ou pelo menos as suas ruínas  disse a Ana, andando pelo
pátio.
 Deviam ser para porcos, galinhas e patos. Olha um tanque sem água!
Estava tudo a cair aos bocados. A construção em melhor estado era aquilo que ou
trora devia ter sido uma cavalariça. Ainda lá se encontravam umas velhas manjedouras
e o chão era de pedra. Um arreio, muito velho, estava preso num grande prego.
 Este sítio tem um ar simpático  observou a Ana.  Às vezes não gosto de certos lugares
antigos. Sintome pouco à vontade, pressentindo que se passaram lá coisas horríveis. Ma
s este é diferente. Deve ter vivido aqui uma família feliz, levando uma vida pacata.
Até quase me parece que estou a ouvir as galinhas a cacarejar e os patos a grasna
r.
 Cá  cá  rá  cá  cá!
 Cuá, cuá, cuá, cuá!
A Ana agarrouse à Zé e as duas pequenas ficaram muitíssimo admiradas ao ouvirem de
repente cacarejar e grasnar. Puseramse à escuta.
 Pareciam mesmo galinhas e patos  disse a Ana.  Mas não tenho a certeza. É impossíve
l que continuem aqui. Agora só faltava ouvirmos um cavalo relinchar.
Não ouviram relinchar mas pareceulhes ouvir um cavalo resfolegando.
Ficaram assustadas. Olharam em volta, à procura do Tim. Mas não o viram em part
e alguma! Onde teria ido?
 Cuá, cuá, cuá, cuá! Cácá  rácá  cá!
 Isto é uma parvoíce  disse a Zé.  Estaremos a imaginar coisas? Ó Ana, há com certeza ga
linhas aqui perto. Vamos procurar pela parte detrás da cavalariça. Tim, onde estás? Ti
m!
A pequena assobiou e logo se ouviu um eco ou coisa parecida.
 Tim!  gritou a Zé, começando a duvidar se estaria ou não no meio dum sonho.
O cão apareceu com um ar um tanto envergonhado. As pequenas viram, com a maio
r das surpresas, que ele tinha uma fita atada à cauda, não parando de a abanar. Uma
fita azul!
 Trazes uma fita na cauda! Tim, que vem a ser tudo isto?  perguntou a Zé, pasma
da.
O Tim foi ter com ela, continuando com um ar envergonhado. A Zé tiroulhe a fit
a.  Quem te atou a cauda?  perguntou.  Quem está aqui? Tim, onde foste tu?
As duas pequenas procuraram em todas as dependências ali próximas mas não encontr
aram nada de especial. Nem uma galinha, nem um pato. nem um porco e, claro está, n
enhum cavalo. Mas, nesse caso, qual seria a explicação? Olharam uma para a outra, co
nfusas.
 E onde teria o Tim arranjado aquela estúpida fita? - disse a Zé, desesperada.  A
lguém lha devia ter atado!
 Talvez fosse alguma pessoa que passasse por aqui. Naturalmente ouviunos e ao
ver o Tim resolveu fazer uma partida  lembrou a Ana.
 Mas só é estranho o Tim consentir que lhe atassem uma fita. Quero dizer, o Tim
não costuma tornarse amigo de pessoas desconhecidas, pois não?
As pequenas desistiram da ideia de continuar o passeio e voltaram para junt
o da barraca da Zé. O Tim acompanhouas. Deitouse ao sol mas de repente deu um salto
e correu para um arbusto ali próximo, tentando meterse por entre a folhagem.
 Que andará ele a perseguir?  disse a Zé.  Parece ter endoidecido. Tim, tu não conse
gues meterte aí com a rodela de cartão à volta do teu pescoço. Tim, estás a ouvirme?
O Tim recuou de má vontade, com o cartão todo amachucado. Atrás dele apareceu um
cãozito rafeiro, cego dum olho, mas com uma expressão de extraordinária vivacidade no
outro. Era branco e preto e tinha uma cauda bastante ridícula, muito fininha e com
prida, que ele abanava alegremente.
 Olha para isto!  exclamou a Zé, perplexa.
 Que andará aquele cão a fazer ali? E como se tornou o Tim tão seu amigo? Tim, não p
ercebo nada!
 Uuuuf!  fez o Tim, levando o rafeiro para junto da Ana e da Zé. Depois, começou
a desenterrar o osso malcheiroso e deuo ao cãozito, mas este não lhe ligou nenhuma im
portância, olhando para longe.
 Isto é muito estranho  disse a Ana.  Daqui a pouco o Tim é capaz de nos aparecer
com um gato!
Imediatamente ouviram miar.
 Miau! Miau! Miaaauuu!
Os dois cães arrebitaram as orelhas e correram para o arbusto. O Tim ficou ma
is uma vez preso pela coleira de cartão, ladrando furiosamente.
A Zé levantouse e dirigiuse ao arbusto.
 Se está ali um gato, não deve ter grande sorte contra dois cães  gritou ela à Ana.  V
em embora, Tim! E tu, cãozinho, sai daí também!
O Tim recuou, agarrando a Zé o outro cão com toda a força.  Segurao, Ana!  gritou el
a.
 É muito manso. Não te morde. Agora vou procurar o gato.
A Ana pegou no cãozito, que a mirava com o seu único olho, muito admirado, não pa
rando de abanar a cauda. Era um rafeiro muito feio. A Zé começou a meterse pela folha
gem até ao espaço que ficava por baixo do arbusto.
Olhou lá para o meio mas ao princípio não conseguiu distinguir nada, pois ia da l
uz do sol e ali estava muito escuro. Depois apanhou um grande susto.
Descobriu uma cara redonda e sorridente, a olhar para ela com uns olhos mui
to vivos e uma madeixa caída para a testa. Tinha um sorriso agradável, mostrando uns
dentes muito brancos.
 Miau! Miau!  fez a tal pessoa.
A Zé voltou para trás a toda a pressa com o coração a bater com força.  Que aconteceu?
 perguntou a Ana.
 Está alguém ali escondido  disse a Zé.
 Não é um gato. É um rapaz idiota que resolveu miar!
 Miau! Miau! Miau!
 Sai daí!  gritou a Ana.  Queremos verte! Deves ser maluco!
Ouviuse um barulho de ramos e folhas a serem afastadas e apareceu uma cabeça f
ora do arbusto. Tratavase dum miúdo com uns doze ou treze anos, baixo mas bem const
ituído e com a cara mais divertida que a Ana vira até àquela altura.
O Tim correu para o pequeno e lambeulhe as mãos, amigavelmente. A Zé ficou pasma
da.
 Como te conhece o meu cão?  perguntou ela.
 Ontem veio ter comigo, a rosnar, quando eu estava no meu acampamento  explic
ou o rapaz.  E eu deilhe um belo osso. Depois viu o meu cãozito, o Jacto, que é a abre
viatura de Avião de Jacto, e tornouse seu amigo e meu também.
 Estou a perceber  disse a Zé, continuando pouco amável.  Não gosto de que o meu cão r
eceba comida de pessoas estranhas.
 Também concordo  disse o pequeno.  Mas achei melhor ele comer o osso do que com
erme a mim! É um lindo cão. Mas fica bastante ridículo com essa rodela ao pescoço. Só gosta
va de que vissem o Jacto a rirse quando o encontrou pela primeira vez!
A Zé fez uma cara de zangada.  Eu vim para aqui para estar sozinha e ninguém faz
er troça do Tim!  disse ela.  Tem um golpe numa orelha. Foste tu o engraçado que lhe a
tou uma fita azul na cauda?
 Foi só por brincadeira  disse o rapaz.
 Já percebi que tu gostas de franzir o sobrolho e ficar zangada. Mas eu gosto
de pregar partidas para andar contente. O teu Tim não se importou nada. Tornouse lo
go amigo do meu cão. Não admira, pois todos gostam do Jacto. Eu estava, ansioso por
saber quem eram os donos do Tim, pois, tal como tu, não gosto de pessoas estranhas
perto de mim quando resolvo acampar. Por isso vim até aqui.
 Estou a perceber. Então foste tu que cacarejaste e tudo o mais?  perguntou a A
na. Ela simpatizava com aquele rapaz idiota, de sorriso franco.
 Que andas a fazer? Estás apenas acampado, resolveste dar um grande passeio a
pé ou andas a estudar botânica?
 Ando a fazer escavações  respondeu o rapaz.  O meu pai é arqueólogo; gosta mais de co
nstruções antigas do que qualquer outra coisa no' mundo. Devo sair a ele.
Houve em tempos uma aldeia romana nesta região e eu conheço um campo onde deve
ter existido parte dela. Por isso vou escavando a ver o que encontro: potes de b
arro, armas e coisas no género. Ora olhem, ontem encontrei isto! Reparem na data.
- O rapaz atiroulhes uma moeda antiga, muito estranha e bastante pesada.  É de 292  d
isse ele.  Pelo menos é o que me parece. Se assim for, a aldeia é muito antiga, não ach
am?
 Havemos de ir visitála  disse a Ana, entusiasmada.
 Não!  disse o rapaz.  Não gosto de ver gente à minha volta quando ando a fazer um t
rabalho sério. Não venham, por favor. Prometo não voltar a incomodálas.
 Está bem. Não vamos  disse a Ana, muito compreensiva.  Mas tu nunca mais nos preg
as partidas estúpidas, combinado?
 Combinado!  disse o rapaz.  Nunca mais me aproximarei de vocês. Só queria ver a q
uem pertencia o cão. Agora voume embora. Adeus!
E, assobiando ao Jacto, partiu a toda a velocidade.
A Zé voltouse para a Ana.
 Que rapaz tão estranho  disse ela.  Confesso que gostava de o ver outra vez! E
tu?

Capítulo IV
Naquela noite
Chegou a hora do lanche, segundo o relógio da Ana e também segundo o apetite do
s três, incluindo o Tim. Este sentia muito calor e passava a vida no regato a bebe
r água. A Ana lastimava não ter um jarro para encher pois era muito aborrecido andar
em sempre dum lado para o outro, só com um púcaro.
Lancharam biscoitos, uma sanduíche cada, e um pau de chocolate um tanto mole.
A Zé examinou a orelha do Tim pela centésima vez naquele dia, chegando à conclusão de q
ue estava muito melhor.
 Não lhe tires a coleira de cartão por enquanto  aconselhou a Ana.  Pode abrir a f
erida se a coçar.
 Mas eu nem sequer penso em tirar o cartão!  afirmou a Zé, bruscamente.  Que vamos
fazer agora? Queres ir dar um passeio?
 Boa ideia  disse a Ana.  Escuta! Não estás a ouvir outra vez os mesmos barulhos m
etálicos? Deve ser o rapaz a trabalhar. Ele é com certeza um grande ponto. Vir para
aqui fazer escavações somente acompanhado pelo seu cómico cãozito! Gostava de ver o que
anda fazendo.
 Prometemoslhe não nos aproximarmos  lembrou a Zé.  Por isso acho que nem devemos i
r espreitar.
 Claro que não!  disse a Ana.  Olha, vamos em sentido contrário, Zé, para nos desvia
rmos do rapaz. Espero que não nos percamos.
 Para que temos o Tim connosco, pateta?  disse a Zé.  Ele até era capaz de encontr
ar o caminho da lua para casa, não é verdade, Tim?
 Uuuuf!  concordou o Tim.
 Ele concorda sempre contigo, Zé  disse a Ana.  Outra coisa, a tarde não está encant
adora? Gostava de saber o que fazem neste momento o Júlio e o David.
A Zé ficou logo com um ar carrancudo. Achava que os seus primos não tinham o di
reito de andar a correr a França quando ela os queria em Kirrin. Estariam a viver
aventuras fantásticas no continente sem terem vontade de ir passar uma só semana a K
irrin? A Zé parecia tão amargurada com os seus tristes pensamentos que a Ana teve de
se rir.
 Animate! Pelo menos eu estou aqui contigo, embora concorde que, comparada co
m o Júlio e o David, eu seja uma péssima companhia, sem espírito de aventura.
Deram um lindo passeio e a meio do caminho sentaramse para verem vários coelho
s a brincar uns com os outros. O Tim sentiuse logo muito infeliz. Para que se sen
tariam a ver aqueles coelhos tolos? Os coelhos eram feitos para serem apanhados!
Porque poria a Zé uma mão firme na sua coleira sempre que se sentavam a observar co
elhos? Gania sem parar enquanto ali estava ao lado da sua dona.
 Calate, Tim! És um palerma!  disse a Zé.  Estragas o espectáculo se eles se assustam
e correm para as suas tocas.
Estiveram a ver os coelhos durante bastante tempo e depois levantaramse, vol
tando para o pequeno acampamento. Quando estavam a chegar, ouviram um assobio, n
um tom baixo. Alguém se encontrava perto da barraca das pequenas. Quem seria?
Contornaram um grande arbusto e quase esbarraram num rapaz. Este desviouse d
elicadamente, sem dizer uma palavra.
 Ah! és tu!  exclamou a Zé, surpreendida.
 Não sei o teu nome. Que fazes aqui? Disseste que não te aproximarias de nós.
O rapaz olhou para elas muito admirado. Uma madeixa de cabelo cobrialhe toda
a testa e ele afastoua para trás.
 Eu não disse nada disso  afirmou ele.
 Ai, isso disseste!  garantiu a Ana.  Bem sabes que disseste! Olha, se tu queb
raste a tua promessa, também não há razão para nós mantermos a nossa. Vamos visitar o teu
acampamento.
 Nunca lhes fiz nenhuma promessa  disse o rapaz, parecendo continuar admirado
.  Vocês são malucas!
 Não sejas idiota!  gritou a Zé, zangada.
 Naturalmente até és capaz de dizer que esta tarde não imitaste uma galinha, um pa
to e um cavalo...
 São doidas!  disse ele, com ar penalizado.
 Completamente doidas!
 Tencionas voltar aqui?  perguntou a Zé.
 Quando me apetecer  respondeu o rapaz.
 A água deste regato é melhor do que a mais próxima da minha barraca.
 Então vamos ver o teu acampamento  disse a Zé, decididamente.  Se tu não cumpres a
tua promessa também nós não cumpriremos a nossa.
 Venham sempre que quiserem  disse o rapaz.  Vocês parecem malucas mas devem ser
inofensivas. Mas não tragam o cão. Pode engolir o meu.
 Bem sabes que o Tim não era capaz de comer o Jacto  disse a Ana.  São bons amigos
.
 Ai sim? Não fazia a menor ideia  disse o rapaz, começando a andar e afastando um
a vez mais o cabelo dos olhos.
 Que pensas de tudo isto?  perguntou a Zé quando o rapaz se retirou.  Nem pareci
a o mesmo desta tarde. Achas que realmente se esqueceu do prometido e de tudo o
mais?
 Não sei  respondeu a Ana, intrigada.  Da primeira vez estava tão alegre e satisfe
ito e agora parecia tão sério!
 Talvez seja um pouco amalucado  disse a Zé.  Já tens sono, Ana? Eu já, embora não per
ceba porquê.
 Eu não tenho muito, mas gostava de me deitar naquela relva macia para ver as
estrelas irem aparecendo no céu  disse a Ana.  Acho que esta noite não durmo na barrac
a, Zé. Naturalmente queres que o Tim fique contigo mas há tão pouco espaço lá dentro que,
com certeza, ele passaria a noite em cima das minhas pernas.
 Eu também durmo ao ar livre  disse a Zé.  Só dormi na barraca na noite passada porq
ue o tempo não estava seguro e podia chover. Vamos buscar mais tojo para fazer uma
espécie de colchão. Depois cobrimos tudo com um cobertor e dormimos em cima.
As duas primas apanharam uma porção de tojo e levaramno para arranjarem a «cama». Em
breve tinham um grande monte e o Tim foi logo deitarse em cima.
 Não é para ti!  gritou a Zé.  Vaite embora! Assim fica a cama toda amassada. Onde es
tá o cobertor, Ana?
Estenderam o cobertor sobre o tojo e foram lavarse no regato. O Tim subiu ou
tra vez para o monte de tojo e fechou os olhos.
 Oh! seu intrujão!  gritou a Zé, empurrandoo para fora dali.  Tu não estás a dormir. Sa
i da nossa cama! Tens aqui um bocado de relva macia para te deitares.
A Zé estendeuse sobre o cobertor e o tojo baixou um pouco sob o seu peso.
 É muito confortável!  disse ela.  Achas que precisaremos dum cobertor para nos co
brir, Ana?
 Eu trouxe um  respondeu a Ana.  Mas não devemos precisar dele pois a noite está q
uentíssima. Olha, já apareceu uma estrela!
Em breve viamse mais cinco ou seis estrelas e depois, à medida que escurecia,
foram aparecendo centenas delas. Estava uma noite linda! .  As estrelas não parecem
grandes e brilhantes?  perguntou a Ana, sonolenta.  Fazem sentirme pequenina, ao p
ensar que se encontram a milhões de quilómetros de distância. Zé, estás a dormir? Não houve
resposta. A Zé não ouvira nem uma palavra pois adormecera profundamente. Tinha uma d
as mãos caída para fora do tojo e pousada no chão.
O Tim aproximouse um pouco mais e deulhe uma lambedela. Depois também ele adorm
eceu.
Não havia luar mas as estrelas brilhavam muito. À meianoite tudo era sossego naq
uele campo pois ficava longe de qualquer estrada, vila ou cidade. Nem mesmo uma
coruja piava.
A Ana não percebeu por que motivo acordou. Ao princípio, não fazia ideia de onde
se encontrava e ficou deitada a olhar para as estrelas, surpreendida, pensando q
ue devia continuar a dormir.
De repente, sentiu sede. Foi aos tropeções até à barraca, que ficava ali mesmo, ten
tando encontrar o púcaro. Não conseguiu e resolveu desistir.
 Faço uma concha com as mãos para beber  pensou ela seguindo até ao pequeno regato.
O Tim ainda esteve para ir atrás dela, mas resolveu ficar com a Zé. Se a sua dona a
cordasse, com certeza não gostaria de que ele tivesse ido acompanhar a Ana. Por is
so, voltou a meter a cabeça entre as patas e adormeceu, deixando uma orelha alerta
por causa da Ana.
A pequenita encontrou o regato facilmente. Guiouse pelo ruído da água a cair, qu
ando começou a ouvilo. Sentouse numa das pedras que ali havia e abaixouse com as mãos e
m forma de concha. A água estava fresquíssima e era delicioso bebêla naquela noite quen
te. Bebeu até não ter mais sede e humedeceu a testa.
Levantouse para voltar para trás. Deu alguns passos e parou. Iria em boa direcção?
Não tinha a certeza.
 Pareceme que vou!  decidiu ela, continuando a caminhar com cuidado e sem faze
r barulho.
Pouco depois, quando pensava estar quase a chegar à cama de tojo, parou assus
tada. Vira de repente uma luz. Brilhara e desaparecera logo em seguida. Lá voltava
a aparecer! Que seria?
Apurando a vista, ela percebeu que seguira um caminho errado, fora na direcção
da casa em ruínas e a luz viera dali!
Não se atreveu a avançar mais. Sentiuse pregada ao chão. Naquela altura ouviu também
um ruído como se alguém estivesse a falar baixinho e o barulho duma coisa a bater n
o chão de pedra da casa de campo. Depois mais uma vez apareceu a luz. Não havia dúvida
; era na casa em ruínas.
A Ana começou a respirar mais depressa. Quem estaria na velha casa? Não se atre
veu a ir espreitar. Só queria ir ter com a Zé e sentirse protegida pelo Tim. Tão depres
sa e tão silenciosamente quanto lhe foi possível ela encontrou o caminho para voltar
ao regato e depois, quase a correr, conseguiu chegar ao sítio onde a Zé continuava
a dormir sossegadamente.
 Uuuuf!  fez o Tim, cheio de sono e tentando lamberlhe a mão. A Ana subiu para o
tojo com o coração a bater apressado.
 Zé!  chamou ela baixinho.  Zé! Acorda! Tenho uma coisa para te contar!

Capítulo V
Outra vez o mesmo rapaz
A Zé não acordava nem por nada. Começou a resmungar quando a Ana a abanou e depoi
s deu meia volta, quase caindo da pequena cama de tojo.
 Ó Zé, acorda por favor!  pediu a Ana, em voz baixa.
Tinha medo de falar alto pois podia alguém ouvila. Quem sabia o que poderia ac
ontecer se ela chamasse a atenção para aquele pequenino acampamento!
A Zé acordou por fim, bastante zangada.
 Que aconteceu, Ana?  perguntou ela num tom de voz que parecia muito alto no
meio do silêncio da noite.
 Chiu!  fez a Ana.  Chiu!
 Mas nós estamos aqui sozinhas! Podemos fazer o barulho que quisermos  disse a
Zé, surpreendida.
 Zé, peçote que ouças! Está alguém na casa em ruínas!  disse a Ana.
Por fim a Zé ouviu e percebeu, sentandose imediatamente.
A Ana contoulhe a história toda, embora, à medida que a ia relatando, não a achass
e digna de grande interesse.
A Zé então falou ao Tim.
- Tim!  disse ela em voz baixa.  Vamos ver uma coisa, sim? Anda connosco e co
nservate calado!
Depois deslizou para fora da cama e pôsse em pé.  Tu ficas aqui  disse ela à Ana.  O
Tim e eu vamos com cuidado, sem fazermos barulho, para ver se descobrimos alguma
coisa.
 Oh! não! Eu não posso ficar aqui sozinha  declarou a Ana, aflita e levantandose d
um pulo.  Também quero ir. Tendo o Tim connosco, não me importo nada. Só me admira ele
não ter ladrado às pessoas que estavam na casa em ruínas.
 Naturalmente pensou que eras tu a andar dum lado para o outro  disse a Zé, e a
Ana concordou.
Seguiram pelo carreiro que ia até à casa em ruínas. O Tim mantinhase mesmo ao pé da
dona. Ele bem sabia que não lhe era permitido avançar sem que as pequenas o mandasse
m. Tinha as orelhas arrebitadas e prestava a maior atenção.
Com todas as precauções, chegaram perto da casa de campo. Podiam distinguirlhe o
s contornos na noite estrelada e pouco mais. Não se via ali nenhuma luz a brilhar
e também não parecia haver qualquer barulho.
Os três ficaram quietos e calados por uns cinco minutos. Depois o Tim fez um
movimento. Aquilo era muito aborrecido! Porque não o deixariam ir a correr, para d
escobrir se estava ali alguém?
 Pareceme que se não encontra na casa vivalma!  segredou a Zé à Ana.  Devem terse ido
embora. A não ser que tenhas sonhado tudo, Ana!
 Não sonhei!  afirmou a Ana, indignada.  Vamos um pouco mais adiante e mandamos
o Tim procurar na casa. Se lá estiver alguém ele háde logo ladrar.
A Zé deu um pequeno empurrão ao Tim.
 Vai!  disse ela.  Vai procurar, Tim.
O Tim, satisfeito, correu como uma seta através da escuridão. Foi até à casa em ruína
s mas era impossível as pequenas vêlo. Elas deixaramse ficar à escuta, parecendolhes que
os seus corações batiam muito alto! Não se ouvia o mais pequeno ruído a não ser o das pata
s do Tim correndo sobre a pedra.
 Não é possível que esteja ali alguém  disse por fim a Zé.  Doutra maneira o Tim já teri
farejado quem quer que fosse. És uma pateta, Ana. Foi tudo um sonho!
 Não foi nada um sonho  disse a Ana, novamente indignada.  Sei perfeitamente que
estava ali alguém, até mais do que uma pessoa, pois tenho a certeza de que ouvi fal
ar baixinho.
A Zé levantou a voz.  Tim!  gritou ela, fazendo com que a Ana se sobressaltasse
.  Tim! Nós mandámoste procurar uma coisa que não existe mas agora vamonos embora!
O Tim saiu da casa em ruínas e, obedientemente, foi ter com a Zé.
 A Ana teve um pesadelo  disse a Zé, rindo.
 E foi tudo, Tim!
A Ana ficou zangada, mesmo muito zangada.
Não disse nem mais uma palavra e voltou com a prima para a cama de tojo. Subi
u para o seu lado e virouse de costas voltadas para a Zé. Se ela assim o queria, qu
e pensasse ter sido tudo um sonho!
Mas quando a Ana acordou pela manhã, recordando todos os acontecimentos da no
ite anterior, também começou a desconfiar, um pouco envergonhada, se na verdade não te
ria sonhado o que vira e ouvira na casa em ruínas.
 O Tim certamente teria apanhado quem ali estivesse  pensava ela.  E como o Ti
m ficara muito calmo, ninguém devia encontrarse na casa. E por que razão se encontrar
ia? Era uma parvoíce!
Por isso, quando a Zé falou sobre o sonho da Ana, a pequenita nem se defendeu
. Na verdade ela não estava absolutamente certa do que acontecera. Resolveu conters
e quando a Zé fez troça, nem sequer respondendo.
 Vamos ver o acampamento do rapaz  propôs a Zé, quando acabaram de comer umas san
duíches um tanto secas e uns biscoitos.  Estou a começar a sentirme aborrecida. Só desej
o que a orelha do Tim fique boa depressa. Nessa altura vou logo para casa.
Partiram as duas com o Tim. Ouviram um barulho ao aproximaremse do acampamen
to do rapaz e então apareceu um cãozito pequeno ladrando como se quisesse dar as boa
svindas.
 Olá, Jacto!  disse a Ana.  Não deixes o Tim levar mais outro osso dos teus!
As duas pequenas continuaram até chegarem a um campo que tinha um aspecto mui
to estranho. Fora quase todo escavado e nalguns sítios viamse covas bastante fundas
. Seria possível o rapaz ter escavado aquilo tudo sozinho?
 Olá! Onde estás?  gritou a Zé. Então viu o rapaz examinando qualquer coisa num fosso
que ele próprio abrira. O pequeno saltou para cima. Depois fez uma cara muito zan
gada.
 Oiçam, vocês prometeram não vir importunar-me  gritou ele.
 Vocês são más! Só as raparigas são capazes de quebrar assim uma promessa.
 Ora, estou a gostar disso!  exclamou a Zé, admirada.  Foste tu que quebraste a
tua promessa! Sempre gostava de saber quem foi ao nosso acampamento ontem à tarde!
 Não fui eu  disse logo o rapaz.  Eu cumpro sempre as minhas promessas. Agora vãose
embora e cumpram as vossas. Meninas! Ufa!
 Bem, nós também não podemos ter lá muito boa opinião a teu respeito  disse a Zé, aborre
ida. ? Vamonos embora. Não nos interessa ver as tuas estúpidas escavações. Adeus!
 Adeus e boa viagem!  gritou o rapaz com mau modo, voltando ao seu trabalho.
 Acho que ele é completamente doido  disse a Ana.  Primeiro faz uma promessa. De
pois ontem à tarde, quebraa e chega a dizer que não a fez. E hoje afirma que fez uma
promessa e que a cumpriu embora nós tenhamos quebrado a nossa. É idiota!
Seguiram por um pequeno carreiro passando por umas árvores plantadas em fila.
Estava ali sentada uma pessoa a ler. Quando as pequenas passaram, ela olhou par
a cima.
As duas pequenas pararam, pasmadas. Era outra vez o rapaz! Mas como fora el
e para ali? Haviam acabado de o deixar metido no fosso! A ana reparou no título do
livro que ele estava a ler. Santo Deus, era um título complicado, qualquer coisa
sobre arqueologia.
 Mais uma das tuas partidas, não é verdade?  perguntou a Zé com ironia, parando em
frente do rapaz.  Deves ser um belo corredor para teres chegado aqui tão depressa.
Realmente és muito engraçado! Mesmo muito, muito engraçado!
 Outra vez as mesmas miúdas meio parvas!  resmungou o rapaz.  Não quererão vocês deixa
rme em paz? Ontem disseram uma série de parvoíces e hoje continuam na mesma.
 Como chegaste aqui tão depressa?  perguntou a Ana, intrigada.
 Eu não vim depressa. Vim devagar, lendo o meu livro pelo caminho  respondeu o
rapaz.
 Mentiroso!  exclamou a Zé.  Deves ter corrido a toda a velocidade. Por que razão
andas sempre a fingir? Nós vimoste há dois ou três minutos.
 Agora são vocês as mentirosas!  exclamou o rapaz.  Acho as duas detestáveis. Vãose emb
ora, deixemme sossegado e nunca mais me apareçam!
O Tim não gostou do tom de voz do rapaz e pôsse a rosnar. O pequeno olhou para o
cão.
 E tu, calate também  disse ele.
A Ana puxou pela manga do casaco da Zé.
 Vamos  pediu ela.  Não vale a pena ficarmos aqui a discutir. O rapaz é maluco, é do
ido varrido, e nós não conseguimos fazer com que ele tenha juízo.
As pequenas afastaramse seguidas pelo Tim. O rapaz não lhes ligou nenhuma impo
rtância. Tinha os olhos postos no livro, que parecia absorverlhe toda a atenção.
 Nunca tinha encontrado ninguém tão doido  disse a Ana, um tanto intrigada.  A pro
pósito, Zé, não achas que podia ter sido o rapaz quem esteve na casa em ruínas, na noite
passada?
 Acho que não. Já te disse que deves ter sonhado  respondeu a Zé, com firmeza.  Embo
ra ele seja suficientemente idiota para ir visitar uma casa abandonada a meio da
noite. Talvez até achasse ser a melhor altura. Ó Ana, repara! Naquela clareira há uma
lagoa! Julgas que podemos tomar banho?
A lagoa tinha um aspecto muito convidativo. As pequenas desceram para a ver
mais de perto.
 Havemos de nadar um bocado, esta tarde,  disse a Zé.  E depois pareceme melhor i
rmos ao Casal Kirrin buscar mais provisões. As sanduíches que nos restam estão de tal
maneira secas que já não sabem bem. E como a orelha do Tim ainda não está boa teremos de
ficar aqui mais alguns dias.
 Está bem  disse a Ana.
Voltaram ao acampamento. À tarde vestiram os fatos de banho e foram até à lagoa.
A água era bastante profunda, pouco fria e muito limpa. Passaram uma hora divertid
a, nadando e jogando à bola. Depois vestiramse contra vontade, começando a pensar na
grande caminhada até ao Casal Kirrin.
A mãe da Zé ficou muito surpreendida ao ver as duas pequenas e o Tim. Disselhes
logo que levassem mais alimentos e mandouas pedir à Joana tudo quanto ela lhes pude
sse arranjar.
 É verdade! Tive notícias do Júlio e do David  disse a senhora.  Voltaram de França e
devem estar aqui dentro de um ou dois dias. Digolhes que vão ter com vocês ou pensam
voltar em breve para casa?
 Digalhes que nos vão buscar mal cheguem!  pediu a Zé, encantada. Os Cinco estaria
m novamente juntos! Era maravilhoso!
 Deixemme as indicações para eles seguirem e assim poderem encontrálas  disse a mãe.
 Depois os rapazes ajudamvos a trazer a bagagem.
Que divertido, que divertido! O Júlio e o David outra vez! Iriam acontecer im
ensas coisas extraordinárias, como sempre! Que divertido!

Capítulo VI
Uma trovoada durante a noite
Também era divertido voltar ao pequeno acampamento. Estava já a escurecer pois
tinhamse demorado no Casal Kirrin para saborearem uma bela refeição. O Tim também comer
a um grande prato de carne e legumes; depois sentarase e dera um grande suspiro c
omo se quisesse dizer:
 Que delícia! Ainda era capaz de comer outro tanto!
Contudo ninguém lhe ligou importância e por isso levantouse e foi dar uma volta
pelo jardim para se certificar se tudo estaria como quando partira, um ou dois d
ias antes. Ao chegar a altura de partir para o acampamento, o Tim ouviu a Zé assob
iarlhe.
 Esta tarde ninguém se riu do Tim!  observou a Ana  Nem mesmo o teu pai.
 Ora, foi a mãe que lhe pediu  respondeu a Zé.  Mas de qualquer maneira eu disse q
ue havia de estar fora até a orelha do Tim melhorar e tenciono manter a minha pala
vra.
 Eu até gosto  disse a Ana.  A única coisa que me preocupa um bocadinho é pensar que
anda gente durante a noite na casa em ruínas.
 Foi tudo um sonho  observou a Zé.  Tu acabaste por o admitir.
 Pois sim, mas de qualquer maneira sempre gostava de ter a certeza de que fo
i tudo um sonho  disse a Ana, enquanto subiam pelo Caminho dos Carroceiros.
 Mas agora, como a noite se aproxima, começo a pensar que não foi um sonho e é uma
ideia pouco agradável.
 Não sejas palerma  disse a Zé, impacientandose.  Não podes mudar de opinião dessa mane
ira. E além de tudo o mais lembrate de que temos o Tim. Ninguém se atreve a meterse co
m ele, não é verdade, Tim?
Mas o cão ia mais à frente na esperança inútil de, pela primeira vez na vida, apanh
ar um coelho. Àquela hora havia tantos, espalhados pelos campos! Espreitavam aqui,
metiamse com o Tim, acolá, e mostravam os seus rabitos em pompon branco logo que o
cão fazia um gesto para os perseguir.
As duas pequenas chegaram sem novidade ao acampamento. A barraca continuava
armada e a cama de tojo, lá fora, tapada com o cobertor. Puseram a bagagem no chão,
com um suspiro de alívio, e foram beber água ao regato.
A Zé bocejou.  Estou cansada. Queres ir para a cama? Ora espera, talvez fosse
boa ideia irmos até à casa em ruínas para termos a certeza de que esta noite ninguém nos
importunará.
 Eu não quero ir  declarou a Ana.  Está muito escuro.
 Então vou eu com o Tim  disse a Zé, afastandose. Voltou passados cinco minutos, c
om a lanterna de algibeira, acesa, para ver o caminho, pois estava muito escuro.
 Não há nada de especial  disse ela.  Só encontrei um morcego voando à volta daquele c
ompartimento maior. O Tim ficou maluco quando ele quase lhe ia tocando no nariz.
 Então foi quando ele ladrou, penso eu  disse a Ana, já instalada na cama de tojo
.  Eu ouvio. Vem deitarte, Zé. Estou cheia de sono.
 Tenho que examinar a orelha do Tim mais uma vez  disse a Zé, fazendo incidir a
luz da lanterna sobre a cabeça do cão.
 Despachate  pediu a Ana.  Deve ser a milésima vez que olhas hoje para a ferida d
o Tim.
 Pareceme muito melhor  disse a Zé, fazendo uma festa ao Tim.  Vou ficar tão satisf
eita quando puder tirarlhe este horrível cartão! Estou convencida de que ele o detest
a.
 Pois eu julgo que nem dá por isso  disse a Ana.  Zé, vens ou não? É impossível manterme
acordada por mais tempo.
 Vou já  respondeu a Zé.  Não, Tim, não dormes na nossa cama! Já a noite passada te diss
e o mesmo. Quase não há espaço suficiente para a Ana e para mim.
A Zé subiu com cuidado para a cama de tojo e deixouse ficar deitada, olhando p
ara as estrelas.
 Esta noite sintome feliz  disse ela.  O Júlio e o David vêm para Kirrin! Ficava fu
riosa ao pensar que não chegava a vêlos nestas férias. Quando calculas que devem chegar
, Ana?
Não houve resposta, pois a Ana estava a dormir. A Zé deu um suspiro. Apetecialhe
planear com a prima o que fariam quando chegassem os rapazes. A orelha do Tim d
evia estar boa dentro de um ou dois dias e os rapazes podiam ajudálas a levarem tud
o do pequeno acampamento até ao Casal Kirrin. E depois podiam passar os dias a nad
ar, a andar de barco, podiam ir à pesca ou divertirse com... com... com...
E naquele momento a Zé adormeceu também! Nem sentiu um aranhiço passar sobre a su
a mão hesitando se havia de tecer uma teia entre os dedos da pequena. Nem ouviu um
ouriço passar ali perto, embora o Tim desse por ele e arrebitasse uma orelha. Est
ava realmente uma noite muito calma!
O dia seguinte foi muito animado. Arranjaram um belo pequeno almoço com algum
as das provisões adquiridas na véspera. Depois andaram muito atarefadas a juntar mai
s tojo para a cama pois com o peso das pequenas ficara bastante dura e pouco con
fortável.
 Agora vamos nadar!  propôs a Zé. Vestiram os fatos de banho, puseram uns casacos
curtos sobre os ombros e partiram para a lagoa. No caminho viram o Jacto a cert
a distância, acompanhado pelo rapaz. O Jacto correu para elas e fez uma grande fes
ta ao Tim.
 Não se preocupem!  gritoulhes o rapaz.  Eu continuo a cumprir a minha promessa.
Não me aproximo do vosso acampamento. Jacto, anda cá!
As pequenas não ligaram importância ao sorridente rapaz mas não resistiram a faze
r uma festa ao simpático cãozito. O Jacto parecia uma flecha, sempre a correr dum la
do para o outro.
As pequenas seguiram para a lagoa, parando decepcionadas ao aproximaremse. A
lguém estava lá, nadando vigorosamente!
 Quem será?  disse a Ana.  Santo Deus, este campo isolado parece estar cheio de
gente!
A Zé observava o nadador com a maior das surpresas.
 Ó Ana, é o rapaz!  exclamou ela.  Repara, tem o cabelo caído sobre os olhos. Mas...
mas...
 Mas nós acabámos de o ver seguir na direcção oposta!  disse a Ana, também admirada.  Qu
e extraordinário! Não é possível ser o rapaz!
Aproximaramse um pouco mais. Sim, era o mesmo rapaz.
 Voume já embora!  gritou ele.  Não me demoro nada!
 Como vieste tu até aqui?  gritoulhe a Zé.  Nós não te vimos voltar para trás, a correr.
 Já aqui estou há mais de dez minutos  respondeu ele.
 Mentiroso!  gritou logo a Zé.
 Ah! parvalhona como sempre!  gritou também o rapaz.
Depois saiu da água, afastandose na direcção das fossas que andava a escavar. A Zé o
lhou em volta à procura do Jacto mas não o viu.  Talvez também esteja na lagoa  disse el
a.  Vamos tomar banho, Ana. Devo confessar que acho aquele rapaz muito estranho.
Naturalmente considera divertido encontrar pessoas e depois voltar para trás, volt
ando a aparecer!
 Só o achei simpático na primeira vez que o encontrámos  disse a Ana.  Agora não chego
a percebêlo. Oh! a água não está com uma temperatura agradável?
Nadaram durante bastante tempo, saíram para se deitar sobre a relva, ao sol,
e depois tornaram a tomar banho. A certa altura sentiram algum apetite e resolve
ram voltar para o acampamento.
O dia passou depressa. Não viram mais o rapaz estranho nem o Jacto. De vez em
quando ouviam o barulho de metal a bater na pedra, vindo do sítio onde naturalmen
te o rapaz continuava a escavar a velha aldeia romana.
 Ou o que ele julga ser uma velha aldeia romana  observou a Zé.  Eu achoo tão maluc
o que até é capaz de confundir umas ruínas romanas com um acampamento de escuteiros!
Naquela noite deitaramse novamente na cama de tojo mas não viram estrelas no céu
. Havia apenas algumas nuvens um pouco escuras e o tempo não estava tão quente.
 Espero que não vá chover  disse a Zé.  Se viesse uma grande carga de água a nossa bar
raca não serviria de muito. Podíamonos meter lá dentro mas ela não é feita de pano impermeáve
l. Achas que choverá, Ana?
 Penso que não  respondeu a Ana, cheia de sono.  De qualquer maneira não tenciono
levantarme a não ser que seja obrigada a isso. Estou bastante cansada.
As duas pequenas em breve adormeceram. No entanto, o Tim continuava acordad
o. Ouvira um trovão longínquo e ficara inquieto. O Tim não tinha medo das trovoadas ma
s não lhe agradavam em especial. Eram umas coisas semelhantes a enormes cães ladrand
o no céu e que deitavam umas luzes de vez em quando. Mas nunca conseguira agarrar
esses cães nem sequer assustálos.
O Tim fechou os dois olhos mas continuou com uma orelha arrebitada, à escuta.
Ouviu novo trovão e sentiu um grosso pingo de chuva cair no seu focinho preto
. Depois, caiu outro pingo na rodela de cartão, fazendo um grande barulho. O cão sen
touse, rosnando. A chuva tornouse intensa e em breve grandes pingos caíam sobre as c
aras das duas pequenas adormecidas. A certa altura, houve um trovão tão forte que am
bas acordaram assustadas.
 Que aborrecimento! É uma trovoada!  exclamou a Zé.  Está a chover. Vamos ficar enso
padas!
 É melhor metermonos dentro da barraca  disse a Ana no momento em que um relâmpago
cortava o céu iluminando tudo por uns segundos.
 Não vale a pena  respondeu a Zé.  Já deve estar toda encharcada. A única coisa a faze
r é metermonos na casa em ruínas. Pelo menos teremos um telhado para nos abrigarmos,
ou melhor, o chão do primeiro andar, pois o telhado desapareceu. Anda!
A Ana não tinha a mais pequena vontade de se abrigar na velha casa mas viu qu
e não havia outra solução. As duas primas apanharam o cobertor e correram debaixo de c
huva; a Zé levava a sua lanterna acesa, para ver o caminho. O Tim também corria, lad
rando.
Chegaram à entrada da casa e meteramse lá dentro. Que alívio abrigaremse da chuva!
As duas pequenas ficaram a um canto, muito juntas uma à outra. Puxaram o cobertor
para se cobrirem mas em breve sentiram calor resolvendo afastálo.
A trovoada passou mesmo ali por cima com vários trovões fortíssimos e muitos relâmp
agos. A chuva foi-se tornando cada vez mais fraca acabando por parar. Apareceu u
ma estrela seguindose outras à medida que as nuvens da trovoada eram afastadas pelo
vento.
 Não podemos voltar para a barraca; temos que ficar aqui  disse a Zé.  Vou buscar
os nossos sacos para fazerem de almofadas. Poderemos deitarnos sobre o cobertor.
A Ana foi com a prima ajudando a transportar os sacos.
Daí a pouco as duas pequenas estavam deitadas a um canto, sobre o cobertor, c
om as cabeças em cima dos sacos e o Tim junto a elas.
 Boa noite  disse a Ana.  Vamos tentar dormir outra vez. Que aborrecimento, aq
uela trovoada!
Em breve voltaram ambas a adormecer. Mas Tim mantinhase acordado. Sentiase in
quieto.
E de súbito desatou a ladrar de tal maneira que as pequenas acordaram muito a
ssustadas.
 Tim! Que se passa? Ó Tim, que foi?  perguntou a Zé, segurandoo pela coleira com t
oda a força.
 Não nos deixes! Porque te assustaste?
Capítulo VII
Estranhos acontecimentos
O Tim parou de ladrar e tentou libertarse da mão que a Zé pusera sobre a sua col
eira. Mas ela não consentiu. A Zé não se assustava facilmente, mas com a trovoada, aqu
ela estranha casa em ruínas e ainda por cima o Tim tão excitado, desejava que ele não
se afastasse.
 Que foi?  perguntou a Ana num murmúrio, muito aflita.
 Não sei. Nem faço a menor ideia  respondeu a Zé, também em voz baixa.  Talvez não seja
nada de importante. Naturalmente a trovoada pôlo nervoso. Vamos ficar acordadas dur
ante algum tempo para ver se ouvimos qualquer coisa anormal.
Deixaramse estar muito quietas no seu canto, continuando a Zé a segurar o Tim
com firmeza. O cão rosnou uma ou duas vezes mas não voltou a ladrar. Por isso a Zé con
cluiu que realmente devia ter sido a trovoada que o assustara.
Ouviuse novo trovão. Voltava a tempestade ou então rebentava outra.
A Zé sentiuse aliviada.  Não é nada, Ana. Devem ter sido os relâmpagos e os trovões a d
istância que enervaram o Tim. Tu és pateta, Tim. A assustarnos duma maneira dessas!
A tempestade tornarase mais forte e o Tim ladrava outra vez, furioso.
 Está calado! Fazes mais barulho do que os trovões!  disse a Zé, aborrecida.  Não vás lá
ara fora apanhar chuva, Tim! Está recomeçando a cair com toda a força. Só serve para fic
ares encharcado e depois hásde querer pôrte mesmo ao pé de mim, para eu ficar também toda
molhada. Já te conheço!
 Não o deixes ir, Zé  pediu a Ana.  Gosto de o ter aqui connosco. Santo Deus, que
tempestade! Espero que não caia nenhuma faísca nesta velha casa.
 Bem, pensando que ela deve estar aqui há uns trezentos ou quatrocentos anos e
já assistiu a milhares de trovoadas, espero que saia sem novidade de mais esta!  d
isse a Zé.  Onde vais, Ana?
 Vou espreitar pela janela  respondeu a pequena  ou pelo lugar onde em tempos
ficava a janela! Gosto de ver os campos a serem iluminados de repente por um relâm
pago voltando em seguida à escuridão.
Dirigiuse à janela. Nessa altura surgiu um relâmpago e a Ana olhou para os campo
s que repentinamente se tornaram visíveis para voltarem a desaparecer como por enc
anto.
A Ana deu um grito de repente e recuou até junto da prima.  Zé... Zé...
 Que aconteceu?  perguntou a Zé, aflita.
 Está ali alguém!  disse a Ana, agarrandose à prima.  Vi pessoas, só por um instante, q
uando apareceu o relâmpago.
 Pessoas? Mas que género de pessoas?  perguntou a Zé, admirada.  Quantas?
 Não sei. Foi tudo muito rápido. Deviam ser duas ou três. Estavam em pé, paradas e à c
huva.
As duas pequenas gritaram e o Tim desatou a ladrar.
 Ana, devem ser umas árvores!  disse a Zé, com ironia.  No outro dia, reparei que
ali há duas ou três árvores juntas.
 Não eram árvores  afirmou a Ana.  Tenho a certeza. Porque andarão pessoas cá fora, co
m este temporal? Estou com medo!
A Zé estava absolutamente segura de que a Ana vira o grupo de árvores que sabia
estar ali perto, pois devia parecer pessoas, visto assim ao clarão rápido dum relâmpa
go.
A pequena animou a Ana.  Não te preocupes! É o mais natural deste mundo, imagina
r ver coisas à luz dum relâmpago. Se houvesse pessoas aqui perto, o Tim teria ladrad
o. Ele havia de...
 Mas ele ladrou!  exclamou a Ana.  Não acordámos com os seus latidos?
 Foi só por a trovoada voltar  afirmou a Zé.  Bem sabes que ele fica zangado quand
o ouve trovões.
Naquele momento viuse outro grande relâmpago seguido do barulho dum trovão.
Nessa altura as duas pequenas gritaram e o Tim desatou a ladrar furiosament
e, fazendo o possível por se libertar da Zé.
 Viste aquilo?  perguntou a Ana, com a voz a tremer.
 Vi, sim! Vi! Ó Ana, tu tens razão! Alguém estava a espreitar pela janela! E se nós
vimos a pessoa, ela também nos deve ter visto a nós. Que estará a fazer aqui, a meio d
a noite?
 Eu bem te dizia que tinha visto duas ou três pessoas  lembrou a Ana, ainda a t
remer.  Esta devia ser uma delas. Talvez vissem a casa à luz dos relâmpagos e resolve
ssem abrigarse aqui, mandando uma delas à frente para ver que tal era.
 Talvez. Mas que podem fazer por aqui a estas horas?  disse a Zé.  Não deve ser co
isa boa. Amanhã vamos para casa, Ana. Quem me dera que os rapazes aqui estivessem.
Eles saberiam arranjar um bom plano!
- A trovoada está outra vez a afastarse  disse a Ana.  O Tim também parou de ladra
r, felizmente. Não o deixes sair daqui, Zé. Nunca se sabe. Aquelas pessoas podem faz
erlhe mal. E além disso sintome mais segura quando ele está connosco.
 Eu nem por sombras pensava em deixálo ir  disse a Zé.
 Tu estás a tremer, Ana. Não é caso para ficares assim tão assustada. O Tim não consen
tiria que te fizessem mal.
 Bem sei. Mas não foi nada agradável ver à luz do relâmpago uma pessoa a espreitar p
ela janela!  disse a Ana.  Agora não consigo dormir mais. Vamos jogar a qualquer coi
sa para nos refazermos do susto.
Resolveram jogar ao analfabeto, com animais. Cada uma por sua vez tinha que
pensar no nome dum animal começado por A, marcando um ponto quem conseguisse lemb
rarse de mais nomes. Depois seguiase o B, o C, o D, etc.
Já iam no é quando ouviram um som muito reconfortante.
 O Tim está a ressonar  disse a Zé.  Dorme profundamente. Ressona como um elefante
.
 «E» para elefante  disse logo a Ana.
 Batoteira! Era a minha vez!  disse a Zé.  Está bem. «E» para égua.
 «E» para engolemoscas  disse a Ana, depois de uma pausa.
 Não é permitido. Inventaste esse nome!  disse a Zé.  Mais um ponto para mim.
Quando chegaram à letra M e a Ana ganhava por dois pontos, despontava o dia.
Foi um grande alívio para as duas pequenas verem o céu a clarear para o lado do
nascente e saberem que em breve nasceria o sol. Sentiramse logo muito mais anima
das. A Zé chegou a levantarse e foi corajosamente até à janela donde não se via nada além d
os campos serenos, com árvores, arbustos e grandes pedaços de relva.
 Fomos umas palermas em ficarmos tão assustadas  observou a Zé.  Acho que afinal não
é preciso voltarmos para casa. Detesto fugir seja do que for. Os rapazes fariam t
roça de nós.
 Não me importo nada com isso  disse a Ana.  Eu voume embora. Se os rapazes estiv
essem connosco, ficava. Mas nem sequer sabemos quando virão! Pode ser que apareçam só
na próxima semana. E eu não quero passar aqui outra noite.
 Está bem, está bem  disse a Zé.  Faz como quiseres. Mas por favor diz aos rapazes q
ue foste tu quem quis fugir e não eu!
 Fica descansada  disse a Ana.  Agora estou a sentirme outra vez cheia de sono.
Acho que é por ter aparecido a luz do dia e tudo estar tão tranquilo. Vou dormir.
A Zé sentia o mesmo. Aconchegaramse no cobertor e adormeceram logo. Só acordaram
bastante tarde e mesmo assim foi preciso que as despertassem. Doutra maneira te
riam ainda dormido mais horas, extenuadas com a noite perdida e com o susto apan
hado.
Acordaram com uma coisa que andava à volta delas sem parar. O Tim ladrou.
As pequenas sentaramse, um tanto aturdidas.
 Oh! é o Jacto!  exclamou a Ana.  Jacto, tu vieste ver se nós estamos bem?
 Uuuuf. Uuuuf!  fez o Jacto rebolandose pelo chão.
O Tim começou a brincar com ele, fingindo que o queria comer. Depois alguém cha
mou o Jacto em voz alta.
As pequenas olharam para cima. O rapaz estava à porta, com o seu sorriso fran
co.
- Olá, suas dorminhocas! Vim saber como se encontram depois daquele terrível te
mporal. Bem sei que prometi não voltar a incomodálas mas estava um pouco preocupado p
or vossa causa.
 Foste muito gentil  disse a Ana, levantandose e sacudindo o pó da saia.  Estamos
bem mas passámos uma noite muito estranha. Nós...
A Zé fezlhe um sinal com um ar severo e ela calouse imediatamente. A Zé pretendia
avisar a prima de que não devia falar sobre as pessoas que haviam visto. Teriam e
las alguma coisa a ver com aquele rapaz? A Ana calouse, falando a Zé em vez dela.
 Não foi uma trovoada horrível? Como te abrigaste?
 Muito bem. Dormi numa das minhas trincheiras e a chuva não chegou a molharme.
Bem, adeus! Anda, Jacto!
O rapaz foise embora com o cão.
 Foi muito simpático  disse a Ana.  Esta manhã não parecia maluco. Estava absolutame
nte normal. Nem mesmo nos contradisse! Afinal pareceme que simpatizo com ele.
Foram até à barraca, que estava toda ensopada, e tiraram de lá uma lata de sardin
has para comerem com pão com manteiga. Quando estavam a abrir a lata, ouviram alguém
assobiar.
 Lá vem outra vez o rapaz  disse a Ana.
 Bom dia. Não quero incomodálas mas gostava de saber como se encontram depois daq
uela trovoada  disse o rapaz, com um ar muito sério.
As raparigas olharam para ele, pasmadas.
 Olha, não comeces a fazerte maluco outra vez  disse a Zé.
 Sabes muito bem que estamos óptimas pois já falámos contigo a esse respeito.
 Não falaram nem eu sabia nada  afirmou o rapaz.  Eu vim aqui só por delicadeza. T
enho pena de que continuem as mesmas idiotas.
Depois foise embora.
 É fantástico!  exclamou a Ana, um pouco irritada.  Quando recomeçávamos a simpatizar
com ele, pensando que não era maluco, desata a fazer das suas! Naturalmente julga
que tem muita graça. É mesmo burro!
Puseram as suas coisas ao sol, para secarem, e só ao meiodia e meia hora começar
am a fazer as malas pensando regressar ao Casal Kirrin. A Zé não tinha grande vontad
e de partir mas a Ana estava bem decidida. Não tencionava passar outra noite naque
le campo.
A Zé estava a atar um embrulho à sua bicicleta quando ouviram o som de vozes. E
ntão o Tim parecia ter endoidecido. Ladrava sem parar e desatou a correr por um ca
rreiro a toda a velocidade, com a cauda a abanar.
 Oh! Não pode ser! Não pode ser o Júlio e o David!  exclamou a Zé, encantada e desata
ndo a correr atrás do Tim.
Mas eram! Eram o Júlio e o David. Ali vinham eles, muito carregados com as su
as coisas, todos sorridentes. Viva! Viva! Os Cinco Famosos estavam mais uma vez
juntos!

Capítulo VIII
Novamente juntos
Houve um tal entusiasmo à chegada dos pequenos que ao princípio ninguém conseguia
fazerse entender. O Tim ladrava o mais alto que podia e era impossível obrigálo a cal
arse.
A Zé gritava e o Júlio e o David riam. A Ana abraçava os rapazes, sentindose orgul
hosa por ter dois irmãos tão simpáticos.
 Ju! Nunca pensámos que viessem tão depressa!  disse a Zé encantada.  Fiquei radiant
e quando os vi!
 Fartámonos da comida francesa  disse o David.  O Júlio andava enjoado, eu emagreci
e o calor era sufocante! Na próxima vez só iremos quando o tempo estiver mais fresc
o.
 Passávamos a vida a pensar em Kirrin e em vocês duas  disse o Júlio dando uma palm
ada amigável à Zé.  Acho que realmente andávamos com saudades. Por isso fizemos as malas
mais cedo do que tencionávamos e voámos para casa.
 Vocês regressaram de avião?  perguntou a Zé.  Que sorte! E depois vieram logo para
aqui?
 Passámos uma noite com os pais, em nossa casa  continuou o Júlio.  Esta manhã apanhám
os o primeiro comboio que passava por aqui e afinal de contas vocês não estavam em K
irrin!
 Por isso metemos os nossos apetrechos de campismo em malas mais pequenas e
viemos logo ter com vocês  disse o David.  Ouve lá, Zé, não consegues que o Tim pare de la
drar? Estou a ficar surdo!
 Calate, Tim!  ordenou a Zé.  Deixa os outros fazerem também barulho. Reparaste na
coleira de cartão, Júlio?
 Era impossível não ter reparado!  disse o Júlio.  Fica muito bem apanhado, não achas?
Ah! Ah! Pareces um cão do tempo da rainha Isabel I, Tim. Foi o que nos disse o ti
o Alberto e realmente tem razão.
 Fica bastante cómico  disse o David.  Até os gatos devem fazer troça de ti, ó Tim!
A Ana olhou para a Zé. Santo Deus, como ela deveria ficar zangada ao ouvir o
Júlio e o David a fazerem troça do Tim! Com certeza ia ter um dos seus ataques de ma
u génio!
Mas a Zé limitouse a sorrir. Chegou mesmo a dar uma pequena gargalhada.
 Fica engraçado, não fica? Mas ele não' se importa!  disse ela.
 Sabem, nós viemos acampar porque a Zé não gostava de ouvir as pessoas a troçarem...
 começou a Ana, pensando que a Zé não conseguiria suportar os ditos dos irmãos acerca do
Tim. Mas a prima deitoulhe um tal olhar que ela calouse logo. A Zé não gostava de que
apontassem as suas fraquezas à frente do Júlio e do David. Orgulhavase de se portar
exactamente como um rapaz e tinha a certeza de que os seus dois primos haviam de
a achar «mesmo uma menina», se soubessem do barulho que ela fizera por as pessoas t
roçarem da coleira do Tim!
 Olhem lá, vocês estavam a fazer as malas?  perguntou o Júlio ao ver o embrulho ama
rrado à bicicleta da Zé.  Que aconteceu?
 Estávamos um pouco aborrecidas e a Ana... Nessa altura foi a vez de a Zé recebe
r um olhar de reprovação da Ana. Bem percebia o que a prima queria dizer: «Não contei na
da sobre ti; por isso não contes nada sobre mim. Não digas que eu estava com medo».
 E... a Ana julga que se passa aqui qualquer coisa estranha  continuou a Zé, qu
e estivera disposta a dizer que a prima se sentia assustada e insistira em volta
r para casa.  E achámos que não era coisa para nós duas sozinhas tentarmos descobrir. S
e vocês aqui estivessem, nem por sombras pensávamos em ir para Kirrin.
 Mas que querem dizer com «qualquer coisa estranha»?  perguntou o David.
 Bem, começou assim: Nós...  principiou a Zé. Mas o Júlio interrompeua.
 Se há uma história para ouvir, que ela seja contada a acompanhar uma refeição, não ac
ham melhor? O David e eu não comemos nada desde as seis da manhã. Estamos esfomeados
!
 Boa ideia!  aprovou o David, começando a abrir um grande embrulho que tirara d
uma das malas.
 Trouxemos um almoço para fazermos um piquenique. Tudo preparado pela tia Clar
a. "E já lhes digo, é soberbo! Naturalmente ficou tão satisfeita por se ver livre de nós
que se esmerou imenso! Trouxemos uma maravilhosa carne assada. Ora reparem! Se
não a repartirmos com o Tim, vai durar séculos. Vaite embora, Tim. Isto não é para ti!
A Zé sentiase tão feliz que mal podia falar. Fora divertido acampar com a Ana, m
as com os primos era incomparavelmente melhor! Sempre tão alegres, tão espirituosos,
tão cheios de personalidade e contudo tão simples! A Zé tinha vontade de cantar a ple
nos pulmões! Naquela manhã o sol estava novamente muito quente e secara os campos co
mpletamente.
Pouco tempo depois os Cinco sentavamse sobre a relva, à volta dum belo almoço.
 Não vendia a ninguém o meu apetite nem por cem contos  declarou o David.  E agora
, quem vai trinchar esta magnífica peça de carne?
Como não tinham pratos tiveram de comer a carne assada em sanduíches. O David l
evara mostarda e ia barrando com ela as fatias de carne antes da Zé as meter dentr
o do pão.
 Ó Tim, esta é a única maneira de termos a certeza de que tu não queres nem uma dent
adinha das nossas formidáveis sanduíches  disse o David.
 Não gostas nada de mostarda, pois não? Ju, onde está a carne que nós trouxemos para
o Tim?
 Está aqui. Pff! Tem um cheiro desagradável  disse o Júlio.  Tim, não te importas de i
res saboreála para um sítio retirado?
O Tim foi logo sentarse ao lado do Júlio.
 Não sejas desobediente  disse o Júlio, empurrandoo com suavidade.
 Ele não deve ter percebido o que quer dizer «retirado»  observou a Zé, rindo.  Tim, f
ora daqui!
O Tim compreendeu logo e levou a sua carne para um pouco mais longe. Cada u
m dos pequenos pegou num tomate muito vermelho para o ir saboreando com as sanduíc
hes.
 Estão óptimas!  exclamou a Ana.  Santo Deus, nem consigo acreditar que ontem à noit
e tivéssemos assistido a coisas tão estranhas.
 Ah! contame tudo  pediu o David.
E assim, a Ana primeiro e depois a Zé contaram o que acontecera. A Ana falou
sobre a noite em que vira uma luz na casa em ruínas, ouvira passos e alguém a falar
em voz baixa.
 Nós convencemonos de que eu tinha sonhado  disse ela.
 Mas agora mudámos de opinião. Achamos que realmente vi e ouvi o que lhes contei
.
 E depois?  perguntou o Júlio, servindose da terceira sanduíche.  Pareceme uma históri
a muito interessante. É mesmo o género de histórias dos Cinco!
A Zé falou sobre a trovoada durante a noite e como tinham sido obrigadas a de
ixar a cama de tojo para se abrigarem na casa em ruínas. Depois contou que a Ana v
ira à luz dum relâmpago duas ou três pessoas lá fora. E como ambas haviam visto em segui
da alguém a espreitar pela janela.
 Que esquisito!  disse o Júlio, intrigado.  Deve haver qualquer história. Mas qual
? Não há nada que me pareça notável neste campo solitário!
 Há os restos duma antiga aldeia romana, Júlio  disse a Ana.  E anda por lá um rapaz
a examinála, a ver se consegue encontrar alguma coisa antiga digna de interesse.
 É um rapaz completamente maluco  acrescentou a Zé.  Parece não saber o que diz. And
a sempre a contradizerse, ou melhor, diz as maiores mentiras que se possam imagin
ar.
 Acha divertido encontrarnos num certo lugar e depois dar umas voltas e apare
cer noutro ponto muito diferente  contou a Ana.  Às vezes chego a simpatizar com ele
mas outras achoo a coisa mais parva que tenho visto!
 Tem um cãozito só com um olho, chamado Jacto  disse a Zé. O Tim soltou logo um lat
ido ao ouvir aquele nome.  Tu gostas do Jacto, não é verdade, Tim?
 Tudo isso parece muito interessante  disse o David.  Passame o cesto dos tomat
es, Ju, antes que comas todos. Obrigado. Como ia a dizer, acho tudo muito intere
ssante. Um cão só com um olho, um rapaz maluco, os restos duma aldeia romana e pesso
as que andam por casas arruinadas a meio da noite, espreitando pelas janelas...
 Não sei como vocês duas não arrumaram as vossas coisas e foram para casa  disse o
Júlio.  Devem ser muito mais valentes sem a nossa companhia do que eu julgava!
A Zé viu o olhar que lhe lançou a Ana e riuse com um ar trocista mas não disse nad
a. A Ana ficou muito vermelha e resolveu confessarse.
 Eu disse à Zé que queria ir para casa esta manhã pois apanhei um grande susto na
noite passada. A Zé não queria, claro está, mas tinha que me acompanhar. Agora, com vo
cês aqui, as coisas são diferentes.
 Ficamos, Ju?  perguntou o David.  «Ter medo ou não, eis a questão!»
Todos se riram.
 Se vocês voltarem para casa eu ficarei aqui sozinha, só para lhes mostrar  decla
rou a Ana.
 Minha querida Ana!  disse o David.  Ficamos todos, claro está. Pode não haver nad
a de especial mas também pode haver qualquer coisa. É difícil saberse. Havemos de desco
brir o que se passa. A primeira coisa a fazer é ir visitar as ruínas romanas e o rap
az maluco. Estou com vontade de o conhecer. Depois havemos de passar uma vista d
e olhos pela casa em ruínas.
O Tim aproximouse, na esperança de apanhar uns pedacitos do almoço, mas o Júlio af
astouo.
 Tu cheiras demasiado a carne crua  disse ele.  Vai beber água. A propósito, há algu
ma coisa para bebermos?
 Há, sim  disse a Zé.  Temos um lindo regato que não fica longe. Vamos levar para lá a
sobremesa e o púcaro. Infelizmente só temos um e por isso não podemos trazer a água par
a aqui. É melhor sentarmonos à beira do regato e servirmonos do púcaro, um de cada vez.
Os rapazes acharam o regato muito agradável. Agruparamse ali à volta e cada qual
foi enchendo o púcaro para matar a sede. Entretanto iam comendo fatias do delicio
so boloinglês feito pela Joana.
 Agora, meninas, desfaçam novamente as vossas malas e embrulhos  disse o David,
quando acabaram a refeição.  Estou a sentirme entusiasmado. Vamos também abrir a nossa
bagagem, Ju.
 Está bem. Onde pomos as nossas coisas?  perguntou o Júlio, olhando em redor.  Ach
o melhor não as deixarmos dentro daquela barraca tão pequena havendo perto um rapaz
maluco e um cão zarolho. Ambos deviam apreciar o resto da carne assada.
 Mas está muito calor para deixarmos os alimentos ao sol  disse a Zé.  O melhor é pôlos
na casa em ruínas. Até podíamos lá arrumar tudo, não acham? Se chover de noite não teremos
o aborrecimento de andar a meter tudo na casa, à chuva e às escuras.
 Concordo contigo  disse o David.  Então vamos mudar para a casa em ruínas. Que di
vertido! Venham todos!
Passaram a meia hora seguinte levando as coisas para a velha casa, arrumand
oas no chão ou nas prateleiras. A Zé encontrou um canto escuro ao lado da chaminé onde
pôs os alimentos pois receava que o Jacto, embora parecesse um cão bem simpático, fare
jasse a carne e comesse a maior parte das provisões.
 Bem, agora estão prontos para ir visitar a aldeia romana e o rapaz maluco? En
tão vamos embora! Os Famosos Cinco vão partir novamente e ninguém sabe o que poderá acon
tecer!

Capítulo IX
As ruínas romanas
Os Cinco caminhavam juntos. O Tim ia atrás de todos, radiante por estar novam
ente com os seus quatro amigos. Passava o tempo a roçarse pelos pequenos para lhes
fazer lembrar a sua presença.
Quando chegaram perto da antiga aldeia viram um rapaz sentado à sombra dum ar
busto, a ler.
 Lá está o rapaz de quem lhes falámos  disse a Zé.  Reparem!
 O aspecto dele é muito vulgar  observou o David.  E está bem absorvido no seu liv
ro. Naturalmente resolveu fingir que não deu por nós!
 Vou falarlhe  disse a Zé, chamando o rapaz quando se aproximaram.
 Olá! Onde foi o Jacto?
O rapaz olhou para cima, contrariado.  Como heide saber?
 Ele estava contigo esta manhã  disse a Zé.
 Não é verdade  respondeu o rapaz. 
Nunca anda comigo. Por favor não me aborreçam. Estou a ler.
 Lá recomeça ele!  disse a Zé aos outros.  Esta manhã veio vernos com o Jacto e agora a
firma que o cãozito nunca o acompanha! É absolutamente maluco!
 Ou apenas muito mal educado  disse o David.  Não vale a pena ligarmoslhe importânc
ia. Se ele não anda a escavar as ruínas romanas talvez possamos ir já visitálas sem sermo
s importunados.
Foram andando devagar até ao acampamento. Quando ali chegaram ouviram alguém as
sobiando enquanto cavava. Com a maior das surpresas, a Zé olhou para a parte super
ior da trincheira aberta. Ia quase caindo lá dentro, de tal maneira ficara pasmada
!
Estava ali o rapaz, assobiando enquanto cavava cuidadosamente. Ele afastou
o cabelo da testa a transpirar e viu a Zé e os outros. Fez um ar surpreendido.
 Como conseguiste chegar aqui tão depressa?  perguntou a Zé.  Tens asas?
 Eu tenho passado a tarde neste sítio  respondeu o rapaz.  Pelo menos estou aqui
há uma hora, acho eu.
 Mentiroso!  exclamou a Zé. O rapaz ficou muito zangado e desatou a gritar.
 Estou farto de vocês duas e agora, para nada faltar, trazem os vossos amigos.
Naturalmente julgam que podem vir descomporme ainda mais!
 Não sejas palerma  disse o David, sentindose tão intrigado com aquele rapaz como
a Zé e a Ana haviam estado. Como conseguiria ele correr por outro caminho e meterse
na trincheira tão depressa? Divertirseia pregando partidas naquele género? Na verdade
não tinha aspecto de maluco.
 Este campo pertencete?  perguntou o Júlio.
 Claro que não. Não sejas parvo  respondeu o rapaz.  Foi o meu pai que descobriu e
stas ruínas há algum tempo e deume licença para trabalhar aqui durante as férias.
Ando muito divertido. Querem ver os meus achados?
O rapaz apontou para uma espécie de prateleira onde se encontrava um vaso que
brado, uma coisa parecida com um broche, outra com um alfinete e parte duma cabeça
esculpida em pedra. O Júlio ficou logo muito interessado e saltou para dentro da
trincheira.
 São tudo coisas muito curiosas  disse ele.  E encontraste algumas moedas?
 Encontrei três  respondeu o rapaz, metendo a mão na algibeira.  Primeiro encontre
i esta e ontem descobri as outras duas, que estavam juntas. Devem ter centenas e
centenas de anos.
Naquela altura todos os outros estavam também na cova. Olhavam em volta com m
uito interesse. Era evidente que o lugar fora bem escavado por peritos e agora o
rapaz ia trabalhando sozinho aqui e ali, esperando descobrir qualquer coisa que
tivesse ficado por desenterrar.
O David a certa altura saiu da trincheira e começou a saltar sobre grandes pe
dregulhos e lajes. De repente, viu um coelho.
O animalzinho olhou para o pequeno, muito assustado, e depois desapareceu a
trás duma pedra. Voltou a espreitar o David, que lhe achou muita graça. O pequeno fo
i até à pedra com precaução mas o coelho fugiu. No entanto, em breve apareceram mais doi
s ou três a espreitar. O David ajoelhouse olhando para trás da pedra. Viu um buraco e
scuro.
Acendeu a sua lanterna e meteua no buraco, procurando ver se o coelhito esta
ria ali ou se aquilo seria a entrada para alguma toca.
Cheio de surpresa viu que o buraco era enorme. Parecia descer, descer, desc
er, e a luz da lanterna não conseguia chegar ao fundo.
 É demasiado largo para ser uma toca de coelho  pensou o David.  Gostava de sabe
r até onde vai. Posso perguntar ao miúdo.
Voltou para o sítio onde o rapaz continuava a mostrar os seus achados ao Júlio,
falando animadamente.  Ora ouve  começou o David.  Há uma abertura muito interessante
atrás duma daquelas pedras. De que se trata?
 Ah! O meu pai disseme que já foi explorada e que servia apenas para armazém. Era
onde guardavam carne, mercadorias e outras coisas no género. Actualmente não se enc
ontra lá nada. Não tem interesse. Até pode ser que não tenha nada a ver com ruínas romanas
.
 Ora reparem, está aqui mais uma prateleira com coisas  disse a Zé, ao encontrar
num outro sítio da trincheira uma pequena colecção de objectos antigos sobre uma prate
leira rudimentar.  Estas também são tuas?
 Aquelas? Não  disse o rapaz.  Não têm nada a ver comigo. Não lhes toques, por favor.
 Então a quem pertencem?  insistiu a Zé, curiosa.
O rapaz fez de conta que não ouvira a pergunta e continuou a conversar com o
Júlio. Então, a Zé pegou numa linda jarra dourada.
 Eu dissete que NÃO mexesses!  gritou o rapaz, tão zangado que a Zé ia deixando cair
a jarra, com o susto.  Põe isso no seu lugar. E vaite embora daqui se não és capaz de f
azer o que te pedem.
 Calma, menino, calma  disse o Júlio.  Não é preciso gritareslhe dessa maneira. O teu
cão ia morrendo de susto. É melhor irmonos embora, acho eu.
 Não gosto de que venham importunarme demasiado  disse o rapaz.  Anda sempre gent
e aqui à volta. Já tive de correr com uma porção de pessoas.
 Pessoas?  perguntou o Júlio, lembrandose da história da Ana sobre as pessoas para
das na noite anterior perto da casa em ruínas e do homem espreitando pela janela. 
Que género de pessoas?
 Ora! Umas pessoas muito aborrecidas, querendo descer aqui abaixo para fazer
em explorações. É fantástico a quantidade de idiotas que andam por este campo solitário  di
sse o rapaz voltando a pegar na enxada e recomeçando a trabalhar. Depois sorriu.  Não
me refiro a ti. Realmente tu sabes qualquer coisa sobre este género de trabalho.
 Veio aqui alguém, ontem à noite?  perguntou o Júlio.
 Pareceme que sim  respondeu o rapaz.  O Jacto ladrou sem descanso. Talvez esti
vesse assustado com a trovoada embora isso não costume acontecer.
 Como te chamas?  perguntou o David.
 Rui Lawdler  disse o rapaz. O David deu um assobio.
 Santo Deus, o teu pai é o célebre explorador Sir John Lawdler?  perguntou ele. O
rapaz fez um sinal afirmativo.
 Assim não admira que te interesses tanto por arqueologia!  exclamou o David.  O
teu pai tem feito trabalhos muito importantes sobre esse assunto, não é verdade?
 Vamonos embora, David  chamou a Zé.  Talvez ainda tenhamos tempo para um banho n
a lagoa. Nós esquecemonos de vos falar sobre isso.
 Está bem  disse o David.  Vamos, Júlio. Adeus, Rui.
Foram até à casa velha para vestirem os fatos de banho. Pouco depois corriam pe
la relva até à lagoa.
 Olha, o Rui anda a nadar!  exclamou o David, surpreendido. Na verdade, encon
travase ali um rapaz com o cabelo caído para a testa, como de costume.
 Olá, Rui!  gritou a Zé.  Anda nadar connosco!
Mas o rapaz já ia a sair da água. O David gritoulhe:  Espera um pouco. Não te vás emb
ora! Nós gostávamos de tomar banho contigo, Rui.
O rapaz voltouse com um ar provocante.
 Não sejas idiota!  gritou ele.  Eu não me chamo Rui!
E, deixando os quatro pequenos atrás de si, pasmados, correu pela relva, desa
parecendo.
 Afinal de contas é maluco!  disse a Ana.
 Não lhe liguem importância. Vamos tomar banho. A água deve estar muito agradável.
Depois do banho sentaramse a descansar e começaram a sentir um certo apetite. 
Embora eu não perceba como qualquer de nós possa sentir apetite, depois de termos co
mido ao almoço, entre os quatro, cerca de cinquenta sanduíches  observou o David.
Foram vestirse e depois lancharam bolo de frutas, biscoitos e rodelas de ana
nás enlatado. O sumo de ananás foi diluído em água fresca do regato tornandose numa bebid
a deliciosa.
 Agora, vamos examinar a casa  propôs o David.
 Já o fizemos, a Ana e eu  disse a Zé.  Por isso penso que não devem encontrar nada
de extraordinário.
Passaram uma revista metódica à casa em ruínas e até subiram pela escada de pedra a
os dois compartimentos do andar superior, embora estes só tivessem uma pequena porção
de parede e quase nenhum telhado.
 Nada de especial  disse o David, descendo a escada.  Agora vamos visitar as d
ependências embora estejam muito arruinadas.
Examinaram tudo, chegando por fim à velha cavalariça. Estava escuro lá dentro poi
s as janelas eram muito pequenas. Só passados alguns segundos conseguiram distingu
ir o que os rodeava.
 Velhas manjedouras  disse o David, tocandolhes.  Sempre gostava de saber há quan
to tempo estão fora de uso e...
 Olhem!  exclamou de repente a Zé.  Há aqui uma coisa esquisita. Ó Ana, repara. Esta
parte do chão não tinha ontem nada de especial, pois não?
A Ana olhou para o grande bloco de pedra branco onde a Zé se encontrava. Era
evidente que tinha sido levantado pois os bordos não tinham musgo, como as outras
pedras, assentando agora no chão ligeiramente inclinado.
 Alguém esteve interessado nesta pedra ou no que está por baixo!  disse o David ,
Talvez escondessem aqui qualquer coisa.
 Aqueles homens na noite passada... foi por isso que aqui vieram  disse a Zé.  M
eteramse nesta cavalariça e levantaram a pedra. Mas por que motivo?
 Em breve descobriremos!  afirmou o Júlio  Vamos todos agarrála e depois levantamola
.
Capítulo X
Que vai acontecer?
Quarenta dedos estiveram muito ocupados, tentando mover a pedra. Por fim o
Júlio conseguiu agarrála por um dos cantos. Tentou levantála e ela cedeu um pouco.
 Ajudame deste lado, David  disse o Júlio. O irmão meteu também os seus dedos fortes
e depois de algumas tentativas a pedra foi levantada!
Caiu para o outro lado com estrondo e o Tim desatou a ladrar, saltando para
longe. Todos olharam para o espaço onde ela estivera, ficando muito desapontados!
Não havia ali absolutamente nada! Nem mesmo um buraco! Viase apenas a terra es
cura e bem batida. Nada mais.
Os pequenos, intrigados, não tiravam os olhos daquela terra dura e seca. A Zé o
lhou por fim para o Júlio.
 É esquisito, não achas? Para que teriam levantado esta pedra pesada se não havia
nada aqui escondido?
 Quem a levantou com certeza não descobriu nem escondeu fosse o que fosse  diss
e o Júlio.
 Mas por que motivo teria levantado uma pedra tão pesada, tornando a pôla no seu
lugar?
 Evidentemente procurava qualquer coisa que não estava aqui  disse a Ana.  Talve
z se tenha enganado na pedra. E é possível que haja alguma coisa muito interessante
por baixo da verdadeira pedra. Mas qual será?
Sentaramse a olhar uns para os outros. O Tim sentouse, também, sem perceber por
que fariam tanto alarido acerca duma banal pedra branca. O Júlio fartouse de pensar
.
- Pelo que contaste, Ana, quanto a teres visto uma luz nesta casa na primei
ra noite em que aqui estiveste, teres ouvido vozes, e verem aqui as tais pessoas
na noite passada, parece que alguém anda à procura com urgência de qualquer coisa aqu
i à volta.
 Qualquer coisa que está por baixo duma pedra  disse a Zé.  Será algum tesouro?
O Júlio abanou a cabeça.  Não. Custame a acreditar que haja algum tesouro escondido
nesta casa. Os seus moradores eram certamente bastante pobres. O mais que podia
m ter escondido era algumas moedas de ouro e, se assim fosse, com certeza há muito
teriam sido encontradas.
 Sim, mas alguma pessoa do nosso tempo pode ter escondido aqui qualquer cois
a de valor, talvez uma coisa roubada  lembrou a Ana.
 É possível que tenhas razão. Nunca se sabe. Certamente um assunto urgente e impor
tante para alguém  disse o David.  Naturalmente as pessoas que foram incomodar o Rui
tinham qualquer relação com isto.
 É muito provável  disse o Júlio.  Mas com certeza concluíram estar aqui aquilo que pr
ocuram. E devem ter ficado bem contrariados, Zé, quando te viram neste sítio com a A
na, na noite passada. Por isso alguém foi espreitar à janela. Queriam ver se vocês est
avam a dormir. Mas enganaramse!
 Não sei se continuo a querer aqui ficar ou se prefiro irme embora  disse a Ana,
assustada.  Se não encontraram o que queriam devem voltar outra vez, durante a noi
te.
 Que importa? Temos o Tim connosco!  lembrou o David.  Não me vou embora daqui só
porque alguém tem o hábito de levantar pedras grandes.
O Júlio riuse.  Nem eu. E não vejo porque não havemos de ir nós mesmos levantar algum
as pedras! Podemos chegar a um resultado interessante.
 Bem. Então está decidido que ficamos!  disse o David.  E tu, Ana?
 Claro que fico  respondeu a pequena, não o desejando nada mas sabendo que não su
portaria ficar separada dos outros.
Os Cinco andaram por algum tempo à volta da casa em ruínas, tentando descobrir
de que lado teriam aparecido as pessoas que as pequenas haviam visto na noite an
terior.
 As silhuetas que eu vi primeiro à luz do relâmpago estavam mais ou menos ali  di
sse a Ana, apontando.  Vamos ver se há algumas pegadas. Chovia a cântaros e o chão devi
a estar todo enlameado.
 Boa ideia  aprovou o David.
Foram todos até ao ponto que a Ana indicara. Mas tratavase dum pedaço de terreno
cheio de plantas rasteiras, sendo difícil de dizer se alguém passara por ali.
 Vamos procurar na parte de fora da janela onde vocês viram uma pessoa a espre
itar  lembrou o David. E ali fizeram uma descoberta! Mesmo em frente da janela vi
amse bem marcadas duas solas de sapato. Uma estava ligeiramente alastrada, como s
e a pessoa tivesse movido um pé para o lado enquanto esperava, a outra era mais níti
da.
O David tirou do bolso uma folha de papel.  Vou tirar a medida disto  disse e
le  vou fazer um esboço do desenho das solas. Eram solas inteiras de borracha; repa
rem nas marcas. Talvez fossem solas de Ceilão.
O David mediu as pegadas.  Deve ser mais ou menos o tamanho dos sapatos que
tu calças, Ju.
Depois, cuidadosamente, desenhou no papel a marca das solas.
 És um autêntico detective, David  disse a Ana, cheia de admiração. O pequeno riuse.
 Qualquer pessoa é capaz de copiar as marcas deixadas pelas solas!  disse ele. 
O mais difícil é atribuirlhes um dono.
 Calculo serem já horas de jantar, se é que alguém quer jantar  disse a Zé.  São oito e
meia. É inacreditável como o tempo passou tão depressa!
 Na verdade não tenho grande apetite  disse o David.  Hoje lanchámos muitíssimo bem.
 Se não têm grande apetite, é melhor não gastarmos a nossa preciosa comida  disse a Zé.
 Se comermos tudo muito depressa teremos de passar a vida a ir a casa buscar
mais provisões.
Resolveram todos não jantar. Arranjaram um canto confortável na casa em ruínas e
cada um comeu uma fatia de bolo e um biscoito, com um refresco de sumo de ananás p
reparado com água do regato. A Zé tivera a brilhante ideia de encher de água a lata va
zia do ananás e assim cada qual por sua vez ia enchendo dali o púcaro.
 Está a escurecer  disse o Júlio.  Vamos dormir dentro da casa ou fora?
 Dentro  respondeu logo o David.  Devemos tornar as coisas o mais difíceis possíve
l aos visitantes nocturnos.
 Tens razão  concordou o Júlio.  Até aposto que vão ficar pouco satisfeitos ao encontr
arem aqui o Tim. Acham que precisamos de tojo para fazermos umas camas? Deve ser
difícil partilharmos todos o mesmo cobertor.
Em breve levavam para casa braçadas de tojo. Puseramno no compartimento da fre
nte, em dois cantos, pois os rapazes acharam melhor ficar no mesmo quarto das ra
parigas, para o caso de surgir algum perigo.
 É preciso uma enorme quantidade de tojo para se fazer uma cama macia  disse o
David, experimentando a sua.
 Os meus ossos parece que atravessam tudo até ao chão.
 Podemos cobrir o tojo com os nossos impermeáveis  lembrou o Júlio.  Sempre háde ajud
ar. As pequenas podem ficar com o cobertor. Não precisamos de nos cobrir pois está m
uito quente.
Quando acabaram já era noite. A Zé deitouse na sua cama de tojo e bocejou.  Vou d
ormir  declarou ela.  Não precisamos de ficar de guarda, pois não? Se alguém se aproxima
r, o Tim ladrará logo.
 Também acho que não vale a pena fazermos turnos para ficar sempre alguém de vela 
disse o Júlio.  Chegate para lá, David. Não me deixas espaço quase nenhum.
O Júlio foi o último a adormecer. Esteve durante algum tempo a pensar na pedra
que haviam levantado. Era evidente que alguém esperava encontrar qualquer coisa al
i por baixo. Mas porque calcularia ser aquela pedra e não outra? Teriam um mapa? S
e assim fosse ele devia mostrar uma pedra errada ou talvez quem a procurasse tiv
esse lido mal o mapa.
Mas antes que pudesse fazer mais raciocínios o Júlio estava a dormir. O Tim tam
bém dormia, satisfeito por ter os quatro pequenos ao seu cuidado. Tinha uma orelha
alerta como de costume, mas sem prestar grande atenção. Contudo era o bastante para
ouvir um ratito correr pelo chão fora. Foi mesmo suficiente para dar por uma aran
ha trepando pela parede. Pouco depois adormecia profundamente e nem sequer ouviu
um ouriço que passou lá fora.
Mas qualquer coisa fez com que a certa altura a sua orelha se arrebitasse n
ovamente. Um barulho chegou à casa, tornandose cada vez mais alto. Era um barulho m
uito estranho!
O Tim acordou e pôsse à escuta. Chamou a Zé com a pata, sem saber se havia de ladr
ar ou não. Ele bem sabia não dever ladrar quando os mochos piavam. Mas aquilo não era
nenhum mocho! Talvez a Zé percebesse do que se tratava.
 Quieto, Tim  disse a Zé, sonolenta. Mas o cão continuou a chamála com a pata. Daí a i
nstantes também ela ouviu o barulho e sentouse logo na cama.
Que coisa horrível! Pareciam gemidos e gritos cortando a noite, como se tives
se acontecido uma grande desgraça.
 Júlio! David! Acordem!  chamou a Zé, sentindo o coração a bater apressadamente.  Está a
passarse qualquer coisa anormal.
Os rapazes acordaram logo e a Ana também.
Sentaramse a ouvir os estranhos sons. Que seria aquilo? Lá voltavam outra vez,
tornandose progressivamente mais altos e depois diminuindo para recomeçarem daí a mo
mentos.
O David sentiu os cabelos a poremse em pé. Saltou da cama de tojo e correu à jan
ela.  Depressa! Venham ver!  gritou ele.  Que é aquilo?
Juntaramse perto da janela e o Tim desatou a ladrar com toda a força. Em silênci
o, os pequenos presenciaram um espectáculo muito estranho.
Viamse luzes azuis e verdes, aqui e ali, por vezes muito intensas, por vezes
quase apagadas. Uma curiosa luz branca e redonda deslocavase vagarosamente no ar
.
A Ana agarrouse à Zé, respirando a custo.
 Achas que vêm para aqui?  disse ela.  Deus queira que não! Deus queira que não! Não g
osto nada disto. Que se passa, Júlio?
 Era bom que estes barulhos horríveis acabassem  disse o David. - Fazemme dores
de cabeça. Percebes alguma coisa de tudo isto, Ju?
 Passase qualquer coisa muito estranha  disse o Júlio.  Vou lá fora com o Tim ver s
e consigo descobrir.
E antes que alguém o pudesse impedir, o Júlio saiu, com o Tim ladrando a seu la
do.
 Ó Júlio, volta para aqui!  chamou a Ana, ouvindo os passos do irmão a afastaremse.
Esperaram todos, muito emocionados, perto da janela até que as luzes estranhas se
começaram a apagar. Depois, através da escuridão, ouviram os passos do Júlio aproximandos
e. [
 Ju! Que foi?  perguntou o David, quando o irmão chegou à entrada.
 Não sei, David  respondeu o Júlio, muito intrigado.  Nem faço a menor ideia. Talvez
consigamos descobrir amanhã de manhã.

Capítulo XI
Descobertas interessantes
Os quatro pequenos sentaramse às escuras falando sobre os horríveis barulhos e s
obre as luzes de cores. A Ana sentouse muito chegada ao irmão. Estava assustadíssima.
 Quero voltar para Kirrin  disse ela.  Vamos amanhã. Não estou a gostar disto.
 Há pouco não consegui ver nada de especial  disse o Júlio, intrigado, com um braço à v
olta da cintura da Ana.  Pareceume chegar muito perto daqueles sons agudos mas qua
ndo me aproximei mais, eles pararam. E embora o Tim ladrasse e corresse dum lado
para o outro, pareceume não haver ninguém por ali.
 Chegaste às luzes?  perguntou o David.
 Fiquei muito próximo mas o mais extraordinário é que, vistas de perto, me parecer
am mais altas. Não estavam no chão como eu pensava. O Tim devia ter apanhado quem an
dasse por ali mas não encontrou ninguém.
 Uuuuf!  fez o Tim, desconsolado. Ele não estava a gostar daquela história.
 Se ninguém fez barulho nem acendeu as luzes então ainda é pior  disse a Ana.  Vamos
para casa, Júlio. Amanhã!
 Está bem  disse o Júlio.  Também não me sinto particularmente entusiasmado com tudo i
sto. Mas meteuse uma ideia na minha cabeça que eu gostaria de pôr em prática amanhã.
 Qual foi?  perguntou o David.
 Bem, pode haver alguém que a todo o custo nos queira pôr fora daqui  disse o Júlio
.  E talvez tencione levantar outras pedras e examinar este lugar meticulosamente
, sendo impossível fazêlo enquanto nós andarmos por aqui. Por isso experimentou assusta
rnos!
 Deves ter razão, Júlio!  exclamou o David.  Aqueles barulhos e aquelas luzes seri
am o bastante para afastar uma pessoa duma vez para sempre. Eram horríveis! Quando
amanhecer vamos procurar bem aqui à volta a ver se conseguimos descobrir algum si
nal do malandrão.
 Pois sim; mas é muito esquisito o Tim não o ter encontrado  observou o Júlio.  O Ti
m consegue sempre farejar quem esteja escondido. Amanhã temos que procurar por tod
os estes sítios.
 E se não encontrarmos nada, vamos para casa?  perguntou a Ana.
 Está bem, prometote  disse o Júlio, abraçando a irmãzita. - Está descansada; se tu não
iseres não passaremos aqui nem mais uma noite. E agora vamos todos tentar dormir o
utra vez.
Custoulhes bastante a adormecer depois de todos aqueles acontecimentos a mei
o da noite. A Ana estava sempre à espera de ouvir novamente os mesmos barulhos mas
tal não aconteceu. A pequena conservava os olhos bem fechados, não se desse o caso
de se ver mais luzes pela janela.
A Zé e os rapazes continuavam também acordados pensando e tornando a pensar nos
barulhos e nas luzes que aparentemente não eram provocados por ninguém. Sobretudo o
Júlio estava muito intrigado.
Somente o Tim não se preocupava com o assunto. Adormeceu antes dos pequenos e
mbora conservasse uma orelha bem alerta, arrebitando a outra quando a Zé se mexia
ou o David conversava em voz baixa com o Júlio.
Como lhes custou a adormecer, acordaram bastante tarde. O Júlio foi quem prim
eiro despertou, ficando a olhar para o tecto baixo, cheio de surpresa. Onde esta
ria? Em França? Não! Claro que estava na velha casa em ruínas!
Acordou o David, que começou a espreguiçarse.
 Lembraste daqueles barulhos e das luzes?  disse o David.  Fizeramnos apanhar um
grande susto. Parece uma estupidez, quando agora pensamos como ficámos aflitos.
 Estou convencido de que alguém nos quis amedrontar para nos irmos embora  diss
e o Júlio.  Aqui só os atrapalhamos. Naturalmente querem fazer alguma busca e não podem
, por nossa causa. Tenho uma certa vontade de levar as pequenas para casa, David
, e voltar só contigo.
 A Ana talvez vá mas a Zé não háde querer  respondeu o David.  Bem sabes como ela é; um
utêntico rapaz, tão corajosa como qualquer de nós. É melhor não tomarmos nenhuma resolução an
es de termos examinado o terreno aqui à volta, esta manhã. Concordo que tudo deve te
r sido um truque para nos afastar.
 Está bem  disse o Júlio.  Vamos acordar as pequenas. Zé! Ana! Suas dorminhocas! Lev
antemse e preparem o pequeno almoço! Para que servem as raparigas se não para arranja
rem as refeições?
Como o Júlio pretendia, a Zé sentouse, furiosa.
 Tu também podes ir fazer o teu...  começou ela. Mas desatou a rir ao ver a cara
divertida do primo.
 Eu só queria fazerte arreliar  disse o Júlio.  Vamos todos tomar banho na lagoa.
Partiram satisfeitos, gozando o calor do sol, acompanhados pelo Tim, que não
parava de abanar a cauda. Quando se aproximaram da lagoa, viram o rapaz boiando
descansadamente.
 Lá está o Rui!  disse a Ana.
 Sempre quero ver se ele esta manhã admite chamarse assim!  observou a Zé.  Lembrams
e de como ele nos disse que se chamava Rui e pouco depois o negou? É mesmo palerma
! Ainda não percebi se ele é completamente maluco ou se apenas acha divertido contra
dizerse constantemente.
Chegaram à lagoa. O rapaz acenoulhes, sorrindo:
 Venham! A água está formidável!
 Esta manhã chamaste Rui?  perguntou a Zé. O rapaz pareceu surpreendido.
 Claro que sou o Rui!  afirmou ele.  Não sejas idiota!
Nadaram imenso. O Rui parecia uma enguia, nadando por baixo de água, agarrand
o os outros pelas pernas, mergulhando, afastandose rapidamente, sempre a nadar, e
mergulhando outra vez logo que os outros pensavam têlo apanhado.
Por fim, sentaramse todos à beira da lagoa, aquecendose ao sol.
 Ó Rui, ouviste alguma coisa estranha na noite passada?  perguntou o David.  Ou
então viste alguma coisa?
 Não vi nada, mas pareceume ouvir alguém, ao longe, a gritar e a gemer  disse o Ru
i.  Só ouvia uma vez por outra, quando o vento soprava daquela direcção. O Jacto não fico
u nada satisfeito. Foi esconderse por baixo das minhas pernas.
 Nós também ouvimos a mesma coisa mas muito próximo  disse o Júlio.  E vimos umas luze
s estranhas.
Discutiram o assunto por algum tempo, mas o Rui não podia ajudálos, pois não estiv
era suficientemente perto dos barulhos para os ouvir com tanta clareza como os o
utros pequenos.
 Estou com apetite  disse a Zé, por fim.  Só consigo pensar em carne assada, tomat
es e queijo. Acho que já é tempo de voltarmos para a casa em ruínas.
 Está bem  disse o Júlio.  Adeus, Rui! Até breve. Adeus, Jacto!
Foramse todos embora, com os fatos de banho quase secos pelo sol.
 O Rui estava muito simpático, esta manhã  observou a Ana.  Por que razão se fará ele
de parvo de vez em quando?
 Olhem, não é ele que vai a correr por aquele caminho, ali à direita?  perguntou a
Zé, de repente.  Como chegaria ali tão depressa? Ainda agora o deixámos ao pé da lagoa!
Na verdade parecia o Rui! Chamaramno mas ele nem sequer olhou em volta ou di
sse adeus, embora talvez tivesse ouvido. Os pequenos continuaram o seu caminho,
intrigados. Como podia a mesma pessoa ser tão diferente de cada vez que a encontra
vam? E qual seria o fim em vista?
Prepararam um belo pequeno almoço e depois de lhe fazerem as honras foram ver
se conseguiam descobrir qualquer coisa que explicasse os estranhos aconteciment
os da noite anterior.
 Os barulhos pareciam vir daqui, quando eu saí da casa, ontem à noite  disse o Júli
o, parando perto do pequeno grupo de árvores.  E segundo calculei as luzes também est
avam aqui perto mas bastante mais altas do que a minha cabeça.
 Mais alto do que a tua cabeça!  repetiu o David, confuso.  Parece muito estranh
o.
 Eu não acho!  exclamou a Ana.  Não é mesmo nada estranho! Reparem naquelas árvores. A
s tais pessoas não poderiam ter trepado para lá e feito depois os barulhos com quais
quer instrumentos esquisitos, acendendo as luzes de cores?
O Júlio fitou as árvores por uns momentos e depois voltouse para a Ana, sorrindo
.
 Tens toda a razão. És uma rapariga inteligente. Sem dúvida estava alguém ali em cim
a, talvez duas pessoas, uma fazendo os barulhos com qualquer instrumento carnava
lesco e a outra queimando fogo de vista dalgum tipo especial, do que não faz barul
ho, ou então agitando balões iluminados.
 E era por isso que as luzes te pareciam tão altas quando aqui chegaste!  disse
o David.
 Deviam atirálas das árvores para nos assustarem e elas ficavam pairando no ar  co
ntinuou a Ana.  Felizmente eram só essas simples coisas idiotas que nos meteram tan
to medo. Nunca mais me assustarão.
 E isso também explica outra coisa  disse a Zé.  Explica o Tim não ter encontrado ni
nguém. Quem quer que fosse estava em segurança em cima das árvores! Naturalmente nem s
e atreviam a respirar enquanto o Tim andava lá por baixo!
 Eu também estava intrigado com isso  confessou o Júlio.  Parecia uma coisa demasi
ado fantasmagórica, pois até o próprio Tim não conseguia encontrar ninguém. Só luzes e barul
hos!
 Olhem o que está ali!  exclamou o David, apanhando qualquer coisa do chão.  É um ba
lão vazio, verdepálido.
Agora podemos ter a certeza de que as luzes eram balões iluminados por qualqu
er processo e largados para pairarem no ar.
 Muito bem!  disse o Júlio.  Deviam ter arranjado uma porção de coisas esquisitas pa
ra nos assustarem e nos porem a andar daqui.
 Pois não conseguirão o que pretendem!  afirmou a Ana, inesperadamente.  Eu, pelo
menos, não me vou embora. Não me assustam só com aquelas parvoíces da noite passada.
 Querida Ana!  exclamou o Júlio, batendolhe amigavelmente nas costas.  Então ficamo
s todos. E eu tive uma ideia!
 Qual?  perguntaram os outros.
 Vamos fingir que resolvemos irmonos embora  disse o Júlio.  Arranjamos as coisas
e vamos acampar para qualquer outro sítio. Mas o David e eu escondemonos aqui esta
noite e ficamos a espiar quem apareça, para vermos o que procuram!
 Isso é um plano maravilhoso!  disse o David, satisfeito.  Vamos pôlo em prática. And
a uma aventura no ar! E ela háde encontrarnos preparados para a receber!

Capítulo XII
Um óptimo esconderijo
Os Cinco passaram um dia muito divertido. Ao fim da tarde decidiram que era
altura de executarem o plano do Júlio e guardaram tudo como se fossem partir.
 Naturalmente está alguém a observar o que fazemos  disse o David.  E como deve fi
car satisfeito ao vernos preparados para partir!
 Como poderão espreitarnos?  perguntou a Ana, olhando à sua volta, como se esperas
se ver alguém atrás dum arbusto.  O Tim farejaria logo qualquer pessoa que estivesse
aqui escondida!
 Ora, essa pessoa não estará a distância de o Tim lhe sentir o mais leve cheiro  di
sse o David.
 Deve encontrarse a vários quilómetros daqui.
 Então como poderá vernos ou saber que vamos partir?
 Ó Ana, não sei se já ouviste falar em binóculos  começou o David, muito sério.  São uma
isas que servem para ver ao longe...
A Ana ficou muito vermelha e deu uma palmada ao David.  Não sejas idiota! Clar
o que é isso! Alguém deve estar no monte, com um binóculo virado para a casa em ruínas.
 Naturalmente até sei onde está essa pessoa  disse o David.  Notei que uma pequena
luz brilha de vez em quando no monte aqui em frente. É tal e qual a luz do sol re
flectida pelo vidro. Por isso o nosso observador deve estar sentado no cimo do m
onte, não perdendo um só dos nossos movimentos.
A Ana virouse, tentando olhar para o monte.
 Não quero ver ninguém parado a olhar para ali  disselhe logo o Júlio energicamente.
 É um disparate fazer a tal pessoa perceber que nós sabemos estarmos a ser observado
s.
Continuaram a guardar as suas coisas e em breve iam levando para o pátio da c
asa o que estava arrumado. A Zé foi lá para fora amarrar as suas coisas à bicicleta; a
ssim o observador do monte podia ver bem todos os seus movimentos.
O Júlio estava a dobrar cuidadosamente algumas das suas roupas quando a Ana l
he disse:
 Vem aí alguém!
Todos olharam em volta, preparados para verem um desconhecido de aspecto si
nistro. Mas viram apenas uma camponesa caminhando apressada com um xaile pela ca
beça e um cesto no braço. Ela parou perto dos Cinco.
 Boa tarde  disse o Júlio, delicadamente.  Está um lindo dia!
 Maravilhoso!  concordou a mulher.  Estão aqui acampados? Tiveram sorte com o te
mpo.
 Mas agora vamonos embora  disse o Júlio.  Temos dormido na casa em ruínas mas agor
a decidimos irmonos embora. A casa é muito, muito antiga?
 É sim. E dizem que acontecem ali coisas esquisitas durante a noite  contou a m
ulher.
 Bem o sabemos!  exclamou o Júlio.  A noite passada ficámos bastante assustados, p
osso garantirlhe, com barulhos horríveis e luzes que faziam lembrar fantasmas.
Por isso resolvemos não ficar lá mais tempo.
 Fizeram bem  disse a mulher.  Não fiquem ali! Afastemse deste sítio o mais que pud
erem! Eu garantolhes que não era capaz de passar aqui durante a noite! Para onde vão
agora?
 Bem, a nossa casa fica em Kirrin  disse o Júlio, dando uma resposta vaga.  Conh
ece? Fica na baía Kirrin.
 É um lindo sítio  respondeu a mulher.  Pois não devem passar aqui outra noite! Boa
tarde!
Afastouse apressadamente e em breve os pequenos perderamna de vista.
 Continuem a fazer as malas  disse o Júlio aos outros.  O homem do binóculo ainda
está no monte. Agora mesmo vi as lentes a brilhar!
 Ó Júlio, porque contaste certas coisas à mulher?  perguntou a Ana.  Tu não costumas f
alar tanto quando estamos no meio de qualquer coisa estranha.
 Minha querida Ana, tu não és nada desconfiada. Queres dizer com isso que tomast
e aquela mulher pelo que ela pretendia parecer. Uma camponesa duma quinta próxima?
 disse o Júlio.
 E não era?  perguntou a Ana, surpreendida.  Parecia exactamente. Não tinha pintur
as na cara, usava um xaile velho e sabia tudo acerca da casa em ruínas.
 Ana, as camponesas não usam dentes de ouro  disse o Júlio.  Não reparaste quando el
a sorriu?
 E tinha o cabelo pintado  acrescentou a Zé.  Eu notei que era quase branco na r
aiz e escuro na parte de cima.
 E as mãos, repararam?  perguntou o David.
 Uma mulher do campo faz uma porção de trabalhos pesados e as suas mãos nunca pode
m ser brancas e macias mas sim morenas e fortes. As mãos daquela mulher eram tão bra
ncas como as duma princesa!
 Realmente também reparei  disse a Ana.
 E lembrome de que ela às vezes falava como uma mulher do campo e outras não.
 Ora aí tens!  exclamou o Júlio.  Ela deve fazer parte dos mariolas que tentaram a
ssustarnos na noite passada. Quando a pessoa que está no monte a observarnos lhes co
municou que parecia estarmos a arranjar as coisas para partir, mandaramna aqui ce
rtificarse. Por isso fingiu ser uma camponesa mas 'felizmente nós não somos tão estúpidos
como ela pensava.
 Mas tu desempenhaste muito bem o teu papel!  disse o David ao irmão, rindo.  O
grupinho deve vir aqui esta noite para levantar todas as pedras que conseguirem
encontrar. E nós dois vamonos divertir imenso a espreitálos.
 Tenham cuidado para que não os vejam, sim.  pediu a Ana.  Onde tencionam escond
erse?
 Ainda não sabemos  respondeu o David.  Agora vamonos embora para acamparmos em q
ualquer outro sítio que não possa ser facilmente descoberto. Tu e a Zé podem lá dormir c
om o Tim, esta noite, o Júlio e eu voltamos para aqui.
 Eu também quero vir  declarou logo a Zé.  A Ana fica bem com o Tim.
 Desta vez não pode ser, Zé  disse o Júlio.
 Quanto menos pessoas vierem espreitar, melhor. Desculpa, mas tens de ficar
com a Ana.
A Zé pôsse logo mal disposta. O Júlio riuse e bateulhe no ombro.
 Sua encantadora cara de zangada! Ficate lindamente! Continua, Zé! Zangate mais
um bocadinho!
A Zé riuse contra vontade ficando outra vez bem disposta. Ela detestava ser po
sta de parte em qualquer coisa mas compreendia perfeitamente que não servia para n
ada ficarem uma porção de pessoas à espreita, naquela noite. Pois bem, faria companhia
à Ana.
Dava ideia de que a pessoa do monte se fora embora, pois já não se via o sol br
ilhar nas lentes do binóculo quando o apontava para os Cinco.
 A mulher mascarada de camponesa deve ter convencido o homem de que nos vamo
s embora  disse o Júlio,  Alguém se lembra dum sítio para onde possamos ir? Não demasiadam
ente longe mas impossível de ser visto pela pessoa do binóculo, caso ela ainda estej
a no monte.
 Eu conheço um bom lugar  disse a Zé.
 Do outro lado do regato há um arbusto enorme. Por baixo da folhagem, que cheg
a ao chão, ele tem um espaço vazio. É uma espécie de gruta feita de ramos e folhas.
 Pareceme um bom sítio  disse o Júlio.
 Vamos procurálo.
A Zé seguiu à frente, tentando lembrarse com precisão do sítio em que ficava o arbus
to. O Tim seguiaa, continuando com a rodela ao pescoço, a qual se tornava agora bas
tante mais incómoda. A Zé parou pouco depois de passarem pelo regato.
 É mais ou menos aqui  disse ela.  Lembrome de que ainda ouvia o barulho do regat
o quando encontrei o espaço vazio por baixo do arbusto. Ah! lá está ele!
Realmente era um arbusto enorme, verde e com bastantes espinhos pelo lado d
e fora, e algumas flores amareladas. Por baixo ficava um espaço onde a terra era m
uito fina, quase arenosa.
O tronco principal, pois era um verdadeiro tronco o que suportava o arbusto
, não ficava mesmo no meio e por isso o espaço era maior. O Júlio segurou com uma folh
a de papel pardo os ramos que tapavam a entrada para aquele esconderijo, pois es
tavam cheios de espinhos.
 Há bastante espaço para vocês duas e para o Tim. Coitado! Ele vai ter dificuldade
em passar para dentro e para fora com a sua coleira de cartão!
 Tiralha!  aconselhou o David.  A orelha agora está praticamente curada. Mesmo qu
e a coce não lhe deve fazer grande mal. Ó Tim, palavra que vais ficar irreconhecível,
sem o teu cartão!
 Está bem  disse a Zé, dando mais uma olhadela à orelha. Esta continuava coberta co
m um adesivo mas era certo que estava quase boa. A Zé cortou a linha que prendia a
s duas extremidades da rodela e depois torceua de maneira a sair do pescoço do cão.
Ficaram todos a olhar para o Tim, que parecia muito surpreendido. Não parava
de abanar a cauda, como se quisesse dizer:  Estão a tirarme essa coisa? Não percebo po
rquê!
 Ó Tim, tu agora, sem a rodela de cartão, pareces despido!  exclamou a Ana.  No en
tanto, é bom voltar a verte assim. Ouve, Tim, esta noite vais tomar conta de mim e
da Zé, não vais? Bem sabes que andamos metidos numa aventura!
 Uuuuf!  fez o Tim.  Uuuuf! Sim, ele bem sabia.

Capítulo XIII
À espreita, na casa em ruínas
Começava a desaparecer a luz do dia e por baixo do arbusto estava mesmo muito
escuro. Os Cinco, incluindo o Tim, tinham conseguido meterse todos lá dentro. Para
pouparem as pilhas, acendiam só uma lanterna de cada vez.
Daí a pouco resolveram jantar. A carne assada estava naquela altura praticame
nte acabada, mas ainda havia alguns tomates e bastante bolo.
O Júlio abriu a última lata de sardinhas e arranjou umas sanduíches para ele e o
David levarem. Também embrulhou duas enormes fatias de bolo e meteu na algibeira q
uatro paus de chocolate.
 Precisamos de qualquer coisa que nos faça passar o tempo, enquanto estivermos
à espera, esta noite  disse ele, rindo.  Não sei se aparecerão as luzes e os gritos mas
é pouco natural. Teriam como assistência apenas uma casa vazia.
 Espero que tenham cuidado  disse a Ana.
 Ana, é a sétima vez que repetes isso  observou o David.  Não sejas pateta. Ainda não
percebeste que o Júlio e eu nos vamos divertir? Vocês é que devem ter cuidado.
 Porquê?  perguntou a Ana, surpreendida.
 Devem ter cuidado com aquela aranha preta, ali pendurada  disse o David.  E p
restem atenção, não vá algum ouriço sentarse em cima das vossas pernas. E vejam se alguma c
obra quererá compartilhar convosco este esconderijo tão quentinho e além disso...
 Agora és tu o pateta!  interrompeu a Ana, dandolhe uma palmada.  Quando pensam v
oltar?
 Estaremos aqui exactamente na altura em que nos ouvires afastar os ramos do
arbusto  disse o Júlio.  Ouve, David, podemos ir andando, não te parece?
 Óptimo!  disse o David, saindo para fora do arbusto com o maior cuidado, para
se arranhar o menos possível.  Santo Deus, quem havia de dizer que isto tem tantos
espinhos!
As pequenas ficaram sentadas, muito quietas, quando os rapazes se afastaram
do arbusto. Tentaram ouvir os passos deles mas não conseguiram. O Júlio e o David c
aminhavam pela relva, no maior silêncio.
 Espero que eles tenham...  recomeçou a Ana. Mas a Zé fez um movimento de impaciênc
ia.
 Se dizes isso outra vez doute uma bofetada, Ana. Palavra que dou.
 Eu não ia dizer o mesmo  afirmou a Ana.  Ia só dizer assim: Espero que eles tenha
m sorte, esta noite. Gostava de voltar para Kirrin para andarmos de barco e toma
rmos banho de mar.
 E saborearmos os cozinhados da Joana  acrescentou a Zé.  Salsichas com cogumelo
s e tomates.
 E linguado frito, acabado de pescar, com batatas coradas  disse a Ana.  Até par
ece que estou a sentir o cheiro.
 Uuuuf  fez o Tim, farejando, de focinho no ar.
 Olha! Ele percebeu o que eu disse!  exclamou a Ana.  É tão inteligente!
Tiveram uma grande conversa sobre a inteligência do Tim e este ficou a ouvir,
abanando a cauda com tanta força que levantava imenso pó.
 Vamos dormir  propôs a Ana.  Não podemos passar a noite conversando e não é por ficar
mos acordadas que ajudamos os rapazes.
Enrolaramse num cobertor, ficando bem juntas, não para se aquecerem, pois a no
ite estava quente, mas por haver muito pouco espaço. A Ana apagou a lanterna e fic
aram logo na mais completa escuridão. O Tim pôs o focinho sobre o estômago da Zé.
 Ó Tim, tem mais cuidado  disse ela, zangada.  Olha que eu jantei muito bem!
A Ana riuse e puxou a cabeça do Tim para ao pé dela. Era reconfortante ter ali o
fiel Tim. Concordava com a Zé; aquele era o melhor cão do mundo.
 Sempre gostava de poder adivinhar o que fazem os rapazes neste momento  diss
e ela, depois duma pausa.  Talvez estejam no meio dalguma aventura fantástica!
Mas não estavam! Naquele momento o Júlio e o David sentiamse mesmo muito aborrec
idos. Tinham ido com todas as precauções até à casa em ruínas, não acendendo nunca as suas l
anternas, com medo de denunciar a sua presença. Tinham discutido anteriormente qua
l o melhor lugar para se esconderem e haviam chegado à conclusão de que seria boa id
eia subir a pequena escada de pedra no interior da casa e esconderemse nos quarto
s sem telhado, lá em cima.
 Não têm tecto e quase não têm paredes  disse o David.  Poderemos espreitar para todos
os lados e ninguém háde imaginar que estamos mais acima, observando tudo. Ainda bem
que a noite está tão estrelada. Quando nos habituarmos à pouca luz seremos capazes de
distinguir tudo perfeitamente. Só é pena não haver luar.
Aproximaramse da casa, parando a cada passo e apurando os ouvidos ao mais pe
queno ruído, com a respiração suspensa.
 Por enquanto nem se vê a luz duma lanterna  disse o David ao ouvido do Júlio.  Co
m certeza ainda não está aqui ninguém. Vamonos meter dentro de casa o mais depressa pos
sível, para subirmos as escadas.
Entraram em bicos de pés na casa em ruínas, continuando a não acender as lanterna
s. Foram às apalpadelas até à escada de pedra e subiramna, fazendo o menor barulho possív
el. Como retinham a respiração os seus corações pareciam bater mais alto.
 Ouves as pancadas do meu coração?  segredou o David ao Júlio, quando por fim chega
ram ao andar superior, o dos quartos sem telhado.
 O meu também bate desordenadamente! Bem, chegámos até aqui sem novidade. Agora pr
ecisamos ter o maior cuidado, não vá haver por aqui algumas pedras soltas onde possa
mos tropeçar, denunciando assim a nossa presença.
Afastaram algumas pedras soltas e depois sentaramse, silenciosamente, sobre
um resto de parede entre os dois compartimentos em ruínas. Soprava um vento quente
e tudo estava tranquilo, excepto a trepadeira de rosas que subia pela velha cas
a e abanava ligeiramente com o vento fazendo um leve barulho. O David roçou a mão po
r um espinho, arranhandose. A trepadeira crescia por toda a parte, arrastandose pe
lo chão, cobrindo as paredes e até mesmo subindo por aquilo que restava da chaminé.
Já ali estavam havia uns três quartos de hora quando o Júlio fez um sinal ao Davi
d.
 Lá vêm eles!  segredou.  Repara, por aquele lado!
O David olhou em volta, avistando uma pequenina luz a moverse na escuridão.
 Uma lanterna!  murmurou ele.  E mais outra! Parece uma procissão. Avançam devagar
.
As pessoas que se aproximavam faziam muito pouco barulho. Dirigiamse à velha c
asa e depois as luzes dispersaram.
 Vão certificarse se nós realmente nos fomos embora  segredou o Júlio ao irmão.  Espero
que não venham cá acima.
 Vamos escondernos atrás da chaminé, não se dê esse caso  segredou o David.
Levantaramse com o maior cuidado, dirigindose para o sítio onde ficavam os rest
os da chaminé, que parecia uma sombra negra contra a noite estrelada. A chaminé era
bastante grande, embora estivesse quase a cair. Os dois rapazes chegaramse a ela,
do lado contrário àquele onde se encontrava a escada de pedra.
 Vem alguém a subir!  murmurou o David, pois o seu ouvido apurado distinguia o
som de passos nos degraus de pedra.
 Espero que fique preso na trepadeira, pois está um grande ramo mesmo no cimo
da escada.
 Psiu!  fez o Júlio.
Alguém subiu até ao alto das escadas e soltou uma praga.
 Óptimo!  pensou o David.  Picouse na trepadeira!
A luz duma lanterna passou pelos quartos em ruínas, pelas paredes meio caídas e
pelos restos da chaminé. Os rapazes retiveram a respiração, ficando como estátuas. A lu
z brilhou em volta por mais um momento e depois ouviuse uma voz falando para baix
o.
 Não está aqui ninguém. Os miúdos foramse embora. Podemos continuar o nosso trabalho.
Os rapazes respiraram fundo. Estavam salvos, pelo menos naquela altura. Os
recémchegados, lá em baixo, puseramse à vontade. Falavam em voz alta e acenderam várias la
nternas. Depois acenderam também dois lampeões e a casita ficou muito bem iluminada.
 Por onde começamos?  perguntou uma voz.  Ouve lá, Josefina, onde está o plano?
 Trouxeo comigo. Vou estendêlo no chão  disse uma voz que os rapazes logo reconhece
ram. Era a «camponesa» que falara com eles naquela tarde.
 Não serve de muito  continuou a mesma voz.  O Paulo não tem grande jeito para des
enho.
Com certeza o grupo estava naquele momento a observar o plano. Ouviramse vária
s vozes.
 Só sabemos ao certo que temos de encontrar a tal pedra branca com umas dimensõe
s determinadas. Conhecemos essas medidas mas não sabemos onde ela se encontra, emb
ora calculemos que deva ser aqui. Já procurámos na antiga aldeia romana e concluímos q
ue não há ali pedras do tamanho indicado.
O Júlio fez um sinal ao David. Naturalmente algum dos visitantes de que o Rui
se queixara devia fazer parte daquele grupo. Mas que andariam a procurar atrás du
ma pedra?
Tiveram a resposta um minuto mais tarde.
 Se tivermos de levantar todas as pedras destes sítios, assim faremos  disse um
a voz arrastada.  Acima de tudo quero encontrar o tal caminho secreto. Se não o enc
ontrarmos e se não descobrirmos os tais esquemas, teremos de ir para o asilo dos p
obres, passar o resto das nossas vidas.
 Ou para a prisão!  comentou alguém.
 Não penses nisso  respondeu a voz arrastada.  É o Paulo quem irá para a prisão.
 O Paulo não conseguirá fazer um desenho melhor do que este?  perguntou a voz da «c
amponesa». Não percebo metade do que aqui está escrito.
 Ele está doente e meio maluco  disse alguém.
 Não vale a pena pedirlhe coisa alguma. Passou tais aflições para fugir com os esqu
emas que ia morrendo. Não serve de nada perguntarlhe seja o que for.
 Não consigo perceber esta palavra aqui  disse a mulher.  AGRA, que significa?
 Não sei. Ora espera! Talvez seja AGUA. Com um U em vez de R. Onde fica o poço? Há al
gum na cozinha? Deve ser água! Até aposto que há uma pedra branca por cima do poço. E de
ve ser por ali o caminho secreto para o esconderijo.
O Júlio apertou o braço do irmão. Estava tão entusiasmado como o homem lá em baixo. O
s pequenos prestavam a maior atenção, apurando os ouvidos.
 Aqui está o velho lavaloiças e isto devem ser os restos duma bomba. O poço deve fi
car por baixo desta pedra. Reparem, ela corresponde exactamente às medidas que nós s
abemos! Ao trabalho! Despachemse! Ao trabalho!

Capítulo XIV
Uma surpresa
Em breve se ouviu o ruído de respirações ofegantes, intercaladas com várias pragas,
enquanto o grupo tentava levantar a pedra que estava perto da bomba. Era com ce
rteza muito pesada e muito difícil de levantar pois através dos anos quase se tornar
a parte integrante do chão.
 Ora que estopada! Tenho as mãos a arder!  exclamou uma das vozes.  Emprestame es
sa ferramenta, Tom. Tu não sabes servirte dela!
Depois de grandes esforços a pedra foi finalmente levantada.  Lá vem ela!  disse
uma voz. A pedra devia terse levantado tão de repente que, segundo parecia, a maior
parte dos homens caíra pesadamente no chão.
Os dois rapazes estavam ultrainteressados e entusiasmados. Como eles desejav
am ir espreitar! Mas era impossível. Deviam limitarse a ouvir e a calcular o que os
homens faziam só pelas suas palavras.
 Sempre há aqui um poço. Mas a água fica muito no fundo! E parece negra como breu.
Fezse um silêncio enquanto o poço foi examinado à luz das lanternas. Depois, uma v
oz cheia de desespero, a que era muito arrastada, disse:
 Este não é o caminho secreto! Quem poderia meterse pela água dentro? É um pequeno poço
vulgar e nada mais! A tal palavra não deve querer dizer água.
 Está bem, patrão. Mas nesse caso que significa?  perguntou a mulher.  Eu não sei. I
sto não é um plano, é uma charada! Porque não teria o Paulo feito um desenho mais claro
para indicar onde se encontra a pedra? Limitouse a fazer uma data de garatujas e
nós só conseguimos perceber que se encontra neste campo, próximo desta casa. E o camin
ho secreto fica atrás da tal pedra!
 A única coisa a fazer é ir procurar atrás de dúzias de pedras pesadíssimas  disse outr
a voz.  Estou farto! Já levantámos pedras em toda a parte, na antiga aldeia e aqui, e
continuamos sem saber onde está o que nos interessa.
 Calate!  ordenou a voz arrastada, agora com aspereza.  Se tivermos de deitar a
baixo esta casa em ruínas, se tivermos de levantar todas as pedras das redondezas,
eu não me importo, pois tudo se resume na questão de ficarmos ricos ou continuarmos
pobres. Quem quiser pode irse embora; mas é melhor ter cuidadinho!
 Acalmese, patrão, acalmese!  disse a mulher.  Estamos todos metidos nisto. Faremo
s o que nos mandar. Agora levantaremos mais algumas pedras. Com as medidas que o
Paulo escreveu no mapa, não há assim tantas!
Depois, enquanto o grupo ia levantando pedra após pedra, seguiuse um espaço de t
empo muito aborrecido para os dois rapazes escondidos. Aparentemente nada foi en
contrado por baixo de qualquer das pedras.
Os homens dirigiramse às dependências deixando a mulher na casa. Os rapazes julg
aram que ela tinha ido com eles e o Júlio mexeu-se um pouco, pois começava a sentirse
entorpecido por ter estado quieto durante tanto tempo.
A mulher devia ter bom ouvido pois deu logo sinal.  Quem está aí? És tu, Tom?  grit
ou ela.
Os rapazes endireitaramse, ficando novamente como estátuas. A mulher não disse m
ais nada. Pouco depois, os homens voltaram, conversando. Parecia que eram três.
 Nada!  disse o homem da voz arrastada.
 Acho melhor voltarmos a procurar nas ruínas romanas.
 Vai ser difícil, encontrandose já ali alguém  disse a mulher.
 Podemos armar uma discussão com ele  respondeu o homem, zangado.
O Júlio ficou aflito. Aquilo significaria que o Rui corria perigo? Era melhor
ir avisálo.
 Já estou farta de aqui estar  disse a mulher.  Vamonos embora. A pedra não deve en
contrarse neste sítio. Estamos a perder tempo.
Para grande alívio dos rapazes, os três homens e a mulher saíram da casa e foramse
embora. O Júlio e o David inclinaramse sobre a parede meio abatida do quarto onde
estavam vendo as luzes das lanternas tornaremse cada vez menos distintas, à medida
que os homens se afastavam, seguindo pelo campo fora. Muito bem! Já podiam voltar
para junto da Ana e da Zé.
 Estou completamente entorpecido  disse o David, estendendo os braços e as pern
as.  Bem, Júlio, ficámos a saber muita coisa, não achas? É evidente que um homem chamado
Paulo roubou uns esquemas valiosos. Talvez se trate dum plano de guerra ou de qu
alquer outra coisa no género.
Depois escondeu o esquema num lugar que ele conhecia, nestas redondezas; e
para lá ir é preciso levantar uma pedra dum tamanho determinado.
 E nós sabemos quais são as medidas pois já vimos a que eles levantaram na cavalar
iça  disse o Júlio.  Proponho voltarmos lá e medila. Ou então medimos a que fica por cima d
o poço. Naturalmente a verdadeira pedra está em qualquer ponto da antiga aldeia. O m
elhor é contarmos ao Rui e deixálo entrar no segredo. Ele háde ajudarnos.
 Que esquisito, encontrarmonos metidos num negócio destes  disse o David,  Tudo p
or a Zé não gostar que façam troça do Tim com a sua rodela ao pescoço! Foi o Tim o causado
r de tudo isto. Os rapazes desceram os degraus de pedra e, claro está, o David não s
e lembrou da trepadeira que o prendeu por um pé fazendoo ir aos tropeções pelas escadas
abaixo.
 Ai!  gritou o pequeno, agarrandose ao Júlio com tanta força que este também ia cain
do.
 Desculpa. Foi outra vez a trepadeira. Fiquei com a perna toda arranhada. Ac
ende a lanterna, pelo amor de Deus.
Mediram cuidadosamente a pedra que ficava ao pé do lavaloiças e depois saíram da c
asa em ruínas, dirigindose ao regato na esperança de encontrarem o arbusto onde estav
am as pequenas. Primeiro tentaram meterse por baixo dum outro arbusto mas por fim
descobriram o que queriam. O Tim soltou um ligeiro latido de boasvindas.
 Júlio! David! São vocês?  perguntou a Ana quando os rapazes se meteram no esconder
ijo.
 Vocês demoraramse SÉCULOS! Nós não dormimos nem um minuto. Está quieto, Tim! Este luga
r é demasiado pequeno para andares aos saltos dum lado para o outro.
Os rapazes sentaramse no chão e acenderam as lanternas. O Júlio relatou os curio
sos acontecimentos e as duas pequenas escutaramno com o maior interesse. A Zé ficou
entusiasmadíssima.
 É fantástico como se descobriu tanta coisa em tão pouco tempo! Que vamos fazer ag
ora?
 Devemos avisar o Rui logo pela manhã e depois é melhor entrarmos em contacto co
m a polícia  disse o Júlio.  Nós sozinhos não podemos impedir os homens de examinarem as r
uínas e quando eles encontrarem a tal pedra podem facilmente descobrir o que quere
m e iremse embora.
 Tenho pena de não vos ter acompanhado  disse a Zé.
Conseguiram arranjar espaço para todos se deitarem e dormirem, pois estavam m
uito fatigados. Algumas horas mais tarde, quando rompia a aurora, o Tim levantou
a cabeça, rosnando. A Zé acordou logo.
 Que se passa, Tim? Eu não ouço nada! Mas com certeza o Tim ouvia qualquer coisa
!
A Zé acordou o Júlio e fêlo prestar atenção ao rosnar contínuo do Tim.
 Porque não parará de rosnar?  perguntou ela.  Eu não ouço nada ! E tu?
 Também não  respondeu o Júlio, prestando atenção.  Acho desnecessário irmos lá fora pro
r às escuras o que faz o Tim rosnar. Naturalmente é qualquer coisa sem importância. Al
gum ouriço ou um esquilo. Calate, Tim. Já rosnaste bastante!
Começava a amanhecer embora continuasse a mais completa escuridão por baixo do
arbusto.
Por que motivo rosnaria o Tim? Os três homens com a mulher teriam voltado? Ou
seria apenas um dos ouriços que ele detestava?
Por fim o cão parou de rosnar e, pondo o focinho sobre as patas, fechou os ol
hos. A Zé fezlhe uma festa.
 Bem, aquilo que o preocupava já se foi embora. Estás bem instalado, Júlio? Há pouco
espaço e faz muito calor.
 Quero levantarme bem cedo para irmos avisar o Rui; depois podemos ir nadar n
a lagoa  disse o Júlio, bocejando.
Apagou a lanterna e voltou a adormecer.
Acordaram tarde. O David foi o primeiro e olhou logo para o relógio de pulso.
Ficou admirado.
 Já são oito e meia! Ju, Ana, Zé, acordem! É quase meiodia!
Todos se sentiam moídos e saíram debaixo do arbusto com tenções de tomarem um banho
e irem ter com o Rui. Quando chegaram perto das ruínas, pararam, muito admirados.
Dentro da trincheira alguém estava a chorar alto, duma maneira tão sentida que
os Cinco ficaram aflitos. Que poderia ter acontecido? Correram até à borda da trinch
eira e olharam lá para baixo.
O rapaz ali estava, deitado de bruços, soluçando. De vez em quando, levantava a
cabeça e voltava a baixála.
 Rui! Rui! Que aconteceu?  gritou o Júlio, dando um salto, indo cair ao lado do
rapaz.  Magoastete? O Jacto feriuse? Que se passa?
 Foi o Rui! Desapareceu! Levaramno!  disse o rapaz, entre soluços.  E eu fui tão ma
u para ele! Agora partiu para nunca mais voltar.
 O Rui desapareceu? Mas tu és o Rui!  disse o Júlio, cheio de surpresa.  Não te perc
ebo!
Agora estava certo de que o rapaz era maluco, falando sobre si próprio daquel
a maneira. O Júlio deulhe uma pequena palmada no ombro.
 Olha, tu estás doente. Vem connosco. Precisas de ser visto por um médico.
O rapaz pôsse em pé dum pulo, mostrando a sua cara manchada e molhada pelas lágrim
as.
 Não estou nada doente! Já lhe disse que o Rui desapareceu. Eu não sou o Rui. Ele é
o meu irmão gémeo. Nós somos os dois muito parecidos.
Ficaram todos de boca aberta. Só depois de alguns momentos conseguiram habitu
arse àquela ideia e depois, claro está, muita coisa ficou explicada! Não conheciam um r
apaz maluco mas apenas dois rapazes normais que eram gémeos. Não existia, como havia
m suposto, um rapaz passando o tempo a contradizerse, aparecendo inesperadamente,
umas vezes simpático outras antipático.
 Gémeos! Porque não pensámos nisso há mais tempo?  exclamou o Júlio.  Julgávamos que só
tia um de vocês! Nunca os vimos juntos!
 Pois não. Nós zangámonos, zangámonos horrivelmente  explicou o rapaz, outra vez com lág
imas nos olhos.  E quando os gémeos se zangam, são zangas a valer; é pior do que em qua
lquer outro caso. Nessas alturas detestamonos. Nunca andamos juntos, nunca comemo
s juntos, nunca dormimos na mesma barraca! Já nos zangámos muitas vezes mas não como a
gora! Eu fazia de conta que ele não existia e ele portavase da mesma maneira.
 Que grande sarilho!  exclamou o Júlio, admirado e confuso.  Agora contame o que
aconteceu para estares assim tão triste. Conta depressa!
 A noite passada o Rui quis fazer as pazes comigo  começou o rapaz.  Mas eu não qu
is. Deilhe um encontrão e afasteime. Mas esta manhã estava arrependido e vim procurálo pa
ra fazermos as pazes e... e...
O pequeno parou, recomeçando a chorar. Todos se sentiam pouco à vontade.
 Anda, contanos!  pediu o Júlio, com delicadeza.
 Cheguei só a tempo de o ver brigar com dois homens, gritando e dando pontapés.
Depois eles conseguiram agarrálo e levaramno!  contou o rapaz.  Eu caí na trincheira e m
agoeime numa perna. E na altura em que consegui levantarme, o Rui tinha desapareci
do já não se encontrando aqui ninguém.
O rapazito voltouse, recomeçando a soluçar.  Nunca heide perdoar a mim mesmo! Nunc
a! Se ontem à noite tivesse feito as pazes com o Rui, poderia têlo ajudado!

Capítulo XV
Muito bem, Zé!
Foi a Ana quem tentou consolar o rapaz. Dirigiuse a ele e conseguiu que se s
entasse numa pedra, a seu lado.
 Deixame ver a tua perna  pediu a pequena.  Está bastante magoada. Olha, vou ligála.
Não estejas tão aflito. Havemos de te ajudar. Nós sabemos o que aconteceu, não é verdade,
Júlio?
O rapaz olhou para a Ana, cheio de gratidão, limpando as lágrimas com o lenço que
ela lhe deu. O David entregou à irmã outro lenço maior para ligar a perna do rapaz, q
ue estava arranhada e dorida. Ele devia ter caído no fundo da trincheira, amedront
ado por ver o seu irmão a brigar com os homens.
 Como sabem vocês o que aconteceu?  perguntou ele ao Júlio.  Conseguem fazer o Rui
voltar? Digam que sim! Não tenho desculpa! Ele é meu irmão gémeo e eu não estava a seu la
do quando precisava de mim!
 Agora não ensopes o meu lenço  disse a Ana.
O pequeno sorriulhe tristemente, voltandose outra vez para o Júlio.
 Chamome Henrique Lawdler e tanto eu como o Rui temos uma paixão por coisas ant
igas. Passamos a maior parte das férias juntos, fazendo escavações para encontrarmos c
oisas como aquelas.
O pequeno fez um sinal com a cabeça, indicando a pequena prateleira de relíquia
s que os quatro já haviam visto.
 O Rui contounos tudo isso  disse o David.
 Mas nunca se referiu a ti. Ficámos muitas vezes intrigados pois julgávamos que
tu e ele eram a mesma pessoa. Por isso não conseguimos perceber uma porção de coisas q
ue ambos diziam. Vocês são tão, tão parecidos!
 Já lhes expliquei que cada um de nós fingia ignorar a existência do outro  disse o
Henrique.
 Nós somos assim. Gostamos muitíssimo um do outro mas quando nos zangamos somos
terríveis!
 Podes descrevernos como eram as pessoas com quem o Rui estava a brigar.  perg
untou o David.
 Já aqui tinham vindo noutro dia e queriam que o Rui se fosse embora para exam
inarem este terreno  disse o Henrique, voltando a limpar as lágrimas.  O Rui foi um
tanto malcriado com eles. Até o ouvi dizer que lhes atiraria com pedras; ele tem m
uito génio quando o fazem zangar.
 E desta vez eram as mesmas pessoas.  perguntou o David.  Para que lado levara
m o Rui?
 Para ali  disse o Henrique, apontando.
 Já procurei por todos os lados mas eles eclipsaramse! É extraordinário!
 Vamos procurar outra vez  propôs o Júlio.
 Talvez encontremos qualquer coisa. Calculo que os homens levassem o Rui por
ele saber demasiado. Talvez tenham encontrado aqui o que procuravam e notassem
que o Rui os estivera a observar.
 Então chegámos tarde!  exclamou a Zé, profundamente desapontada.  Conseguiram o que
pretendiam e por isso desapareceram, nunca mais podendo ser apanhados. Naturalm
ente, nesta altura vão a fugir de automóvel e levam o Rui com eles para o pequeno não
os denunciar antes de se encontrarem em segurança, noutro país.
 Não!  exclamou o Henrique.  Não me digam que o Rui foi raptado!
 Vamos dar uma volta por aqui  propôs o Júlio. Seguiram todos por entre as várias e
scavações, procurando qualquer coisa que nem sabiam bem definir.
Pouco depois desistiram. Havia muitíssimas pedras de todos os tamanhos. E além
de tudo o mais para que serviria encontrar a verdadeira pedra? O grupo dos malan
drões tinha fugido, levando com certeza o que procurava. Na verdade, se o Rui os não
tivesse descoberto ninguém saberia da sua presença naquele campo nem que tinham enc
ontrado uma coisa importante.
 Não vale a pena  disse o Júlio, por fim.  É um sítio demasiado extenso para sabermos
onde devemos procurar qualquer coisa que nos ajude. É melhor irmos buscar as nossa
s coisas ao arbusto e depois voltarmos para Kirrin a fim de avisar a polícia. É a únic
a coisa sensata que resta fazer.
 Vem connosco, Henrique  disse a Ana ao pequeno.  Anda contarnos tudo o que sab
es.
 Está bem  respondeu o Henrique.  Heide fazer tudo para o Rui voltar. Nunca mais
brigarei com ele. Nunca mais! Pensar que...
 Não recomeces com a mesma história  pediu a Ana.  O Tim fica tão triste que até tem a
cauda caída!
O Henrique sorriu mais uma vez, cheio de tristeza. Puseramse todos a caminho
, seguindo na direcção do arbusto. Só quando ali chegaram e tiraram para fora as latas
das conservas e mais alimentos, juntamente com o cobertor e outras coisas, só então
, perceberam como estavam cheios de apetite.
 Ainda não tomámos o pequeno almoço. Levantámonos há imenso tempo e já é muito tarde. Es
a morrer de fome  disse a Zé.
 Se acabarmos com todas as provisões, escusamos de carregar com as latas  obser
vou o David.  E se arranjássemos uma refeição? Mais dez minutos aqui não podem fazer gran
de diferença.
Ficaram satisfeitos por não serem obrigados a sentaremse outra vez por baixo d
o arbusto. Juntaramse todos ao sol, discutindo os últimos acontecimentos.
 Quando o Tim começou a ladrar, por volta das seis horas da manhã, foi por ter o
uvido aquela gente passar de mansinho em direcção às ruínas romanas  lembrou a Zé.
 Deves ter razão  disse o Júlio.  Com certeza procuraram muito bem por toda a part
e até o Rui acordar e aparecer, furioso. Foi uma pena eu não ter saído debaixo do arbu
sto quando o Tim ladrou, para seguir aqueles malandros.
 Alguém tem sede?  perguntou a Zé.  Vou ao regato buscar água. Onde está a lata do ana
nás?
A Ana entregoua à prima. Esta seguiu por um carreiro que ia ter ao regato. Ao
aproximarse ouviu a água a cantar.
 O barulho da água a correr é tão agradável  pensou a Zé.
Água! Que despertaria esta palavra na sua memória? Quem estivera a falar sobre ág
ua? Ah! fora o David e o Júlio, ao voltarem da casa em ruínas, na noite anterior. Ha
viam contado que no plano estava escrita uma palavra que tanto podia ser AGRA co
mo ÁGUA.
 Gostava de saber ao certo  disse a Zé para consigo, enquanto enchia a lata na ág
ua do riacho. Ficou a olhar para a corrente saltitando por entre as pedras.
Nessa altura uma outra palavra surgiu no seu pensamento.
 Pedras! Água! Seria possível? Será possível que uma destas pedras seja a que procur
avam? Esta aqui deve corresponder às medidas.
A Zé ficou a olhar para a tal pedra. Estava metida num sítio um pouco alto, atrás
do lugar onde a água nascia correndo para o canal ladeado por pedras mais pequena
s. Haveria algum esconderijo atrás dela?
A Zé, de repente, atirou com a lata e foi ter com os outros, a correr.Júlio! - Júl
io! Talvez tenha encontrado a pedra! Ela tem estado a olhar para nós todo este tem
po.
O Júlio ficou surpreendido e o mesmo aconteceu com os outros. Olharam para a
Zé, sem perceberem nada.
 Que estás tu a dizer, Zé?  perguntou o Júlio, dando um pulo.  Anda mostrarme!
A Zé correu até ao regato, seguida por todos. Apontou para a pedra branca, atrás
da nascente.
 Aquela!  exclamou.  É do tamanho indicado, não acham? E está perto da ÁGUA, tal como
dizia no plano; só com a diferença que eles liam AGRA.
 Como eu gostava de saber se tens razão  disse o Júlio entusiasmado.  Pode ser. Nu
nca se sabe. Algumas vezes os regatos vêm de passagens subterrâneas.
 Vamos ver se conseguimos levantar a pedra  disse o David, com a cara muito v
ermelha.
 Pareceme muito pesada.
Começaram às voltas com a pedra, ficando todos molhados, pois de vez em quando
caíam no regato. Mas ninguém se importava. O entusiasmo era indescritível. O Henrique
também ajudava, mostrando ter muita força.
A pedra moveuse ligeiramente para um lado e ali ficou. Mais empurrões, mais pu
xadelas.
 Pareceme que temos de ir buscar ajuda  disse por fim o Júlio. - É muito pesada e
está muito metida na terra.
 Talvez com o auxílio dalguma das minhas ferramentas  lembrou o Henrique.  Estou
habituado a usálas quando aparecem pedras pesadas. Podemos levantála com mais facilid
ade se utilizarmos as ferramentas apropriadas.
O Henrique desapareceu a correr. Os outros sentaramse por uns momentos, a de
scansar.
 Que trabalho este, para um dia assim tão quente!  exclamou o Júlio.  Ainda bem qu
e o Henrique se lembrou das suas ferramentas. É exactamente o que nos falta!
 Que engraçado ele e o Rui serem gémeos!  observou a Zé.  Não me tinha passado tal coi
sa pela cabeça.
 Mas eles portavamse duma maneira muito idiota. Fingiam sempre que se tratava
apenas dum rapaz e nenhum deles se referia ao outro. Gostava de saber para onde
levaram o Rui. Julgo que não deve correr grande perigo. Mas a família dele vai fica
r preocupadíssima.
 Lá vem o Henrique  disse a Ana, depois duma pausa.  Um de nós devia ter ido com e
le para o ajudar. Traz dúzias de ferramentas!
O que ele fora buscar tornouse realmente muito útil, especialmente uma grande
tenaz de ferro. Quando o Júlio e o Henrique a utilizaram, a pedra começou logo a mov
erse.
 Está a dar de si! Cuidado! Olhem que vai cair mesmo no regato!  gritou o David
.  Cuidado, meninas!
A pedra levantouse até ficar a prumo e depois caiu no canal por onde corria a ág
ua. As cinco crianças olharam para a grande abertura que a pedra deixara.
O Júlio inclinouse, olhando lá para dentro.  Há um grande buraco  disse ele.  Passemme
a minha lanterna.
No meio de grande excitação, o Júlio fez brilhar a luz da lanterna dentro da aber
tura. Depois voltouse para os outros, radiante.
 Pareceme que acertámos! Há aqui um túnel que vai descendo. Alargase depois da entra
da.
É impossível descrever o entusiasmo dos pequenos. A Zé deu um soco no David e a A
na fez uma festa ao Tim com tanta força que ele até ganiu. O Henrique, esquecendo as
suas tristezas, sorria encantado.
 Vamos já entrar?  perguntou o David. - É preciso alargar um pouco a abertura. A
terra e as plantas tornaramna mais pequena. Temos que a alargar.
 E depois vamos explorar o túnel  exclamou a Zé, com os olhos muito brilhantes.  U
m túnel secreto, só conhecido por nós. Vamos explorálo depressa!

Capítulo XVI
A passagem secreta
Os pequenos estavam tão excitados que até se empurravam uns aos outros. O Júlio a
fastouos.
 Vamos ser sensatos! Todos ao mesmo tempo não podemos fazer a abertura maior.
Deixemnos trabalhar a mim e ao Henrique, com a ajuda das ferramentas, que depress
a ficará pronta.
Um minuto depois o buraco fora alargado o suficiente para mesmo o Júlio poder
passar.
 Ora aqui está!  disse ele, arquejante mas muito satisfeito.  Eu vou à frente. Tod
os têm lanternas? Vamos precisar delas. Lá em baixo deve estar muito escuro.
O Júlio entrou pela abertura. Primeiro teve que engatinhar mas depois a passa
gem começou a descer, tornandose de repente muito mais larga. Já podia caminhar de pé,
embora curvado.
Chamou os companheiros.  Sigamme! Agarremse uns aos outros pela cintura, para
não caírem. A escuridão aqui é completa.
Atrás do Júlio seguiu a Zé, depois a Ana, em seguida o David e por último o Henriqu
e. O Tim foi com a Zé, claro está. O entusiasmo era geral e ninguém conseguia falar se
m ser aos gritos.
 Eu doute uma ajuda!
 Santo Deus, que escuro!
 Sintome como uma raposa a entrar no covil!
 Não me empurres, Tim!
 Oh! Felizmente já me posso pôr de pé! Quem teria feito esta passagem? Um coelho g
igante?
 Naturalmente foi cavado noutros tempos, pela água. Não empurres, Tim!
 A água não corre pelo monte acima, minha burra! Segurate ao meu casaco, Henrique
. Não te deixes ficar para trás.
O Júlio, por vezes muito curvado, avançava cuidadosamente através do estreito túnel
que continuava a descer. Em breve este tornouse mais largo e mais alto, sendo en
tão possível caminhar normalmente.
 Julgas ser este o verdadeiro caminho secreto?  perguntou a Zé, depois de algum
tempo.  Parece que não vamos dar a parte nenhuma.
 Não te posso dizer. E com certeza não o saberemos até encontrarmos qualquer coisa
escondida, se isso chegar a acontecer!
O Júlio parou de repente ao ouvir um barulho estranho. Cada um dos pequenos c
hocou logo com o da frente, apanhando todos um grande susto.
 Que se passa, Ju?
A lanterna do Júlio fez brilhar dois pares de olhos assustados. O pequeno rius
e.
 Não se aflijam. São dois coelhitos que resolveram utilizar a nossa passagem. Há vár
ios buracos na parede do túnel; devem ser tocas de coelhos. Até aposto que lhes esta
mos a pregar um grande susto.
Continuaram a avançar pelo túnel por mais algum tempo e de súbito o terreno que a
té aí fora arenoso passou a ser de terra batida. A passagem tornouse novamente mais b
aixa e os pequenos voltaram a caminhar curvados, o que era muito incómodo.
O Júlio parou uma vez mais. Ouvira outro barulho. Que seria?
 Água!  exclamou ele.  Deve haver por aqui uma corrente subterrânea. Que engraçado!
Estão todos bem?
 Estamos!  gritaram em coro.  Continua, Júlio. Deixanos ver a água.
O túnel terminou de repente e o Júlio encontrouse numa pequena gruta, com o tect
o bastante alto. Quase no meio passava uma corrente de água, nem muito grande nem
muito rápida. Serpenteava por um pequeno canal, que devia ter cavado durante cente
nas de anos.
O Júlio iluminou a corrente com a lanterna. A água parecia muito escura, brilha
ndo à luz da lanterna. Os outros foram saindo do túnel, ficando a olhar para a corre
nte subterrânea. Parecia um tanto misteriosa, passando através da gruta e desaparece
ndo num buraco da rocha.
 Que curioso!  exclamou o David.
 Isto é vulgar  começou o Henrique.  Nalguns sítios desta área o terreno por baixo dos
nossos pés está cheio destas correntes subterrâneas. Algumas chegam lá fora apenas como
riachos, outras acabam por se juntar e outras ainda vão correndo, não se sabe para
onde.
O Júlio ia examinando a gruta.
 O nosso túnel terminará aqui?  perguntou ele.  Será neste sítio que devemos procurar
os tais esquemas?
 Podemos examinar bem a gruta e ver se tem alguma saída  propôs o David.
Utilizando as lanternas os Cinco separaramse e o Tim acompanhou a Zé, não parece
ndo nada surpreendido com aquela aventura subterrânea.
 Encontrei aqui outro túnel, saindo da gruta!  exclamou o David.
 Mal acabara de dizer isto a Ana também os chamou.
 Venham ver! Há aqui outro túnel!
 Por qual deles devemos seguir?  perguntou o Júlio.  Que aborrecimento terem apa
recido dois!
 O tal homem  como se chamava ele?
 o Paulo, terá marcado no seu mapa o caminho subterrâneo?  perguntou a Zé.  Não compre
endo como poderia ele esperar que qualquer pessoa 'encontrasse o seu esconderijo
, havendo várias passagens a escolher para seguir até lá.
 Tens razão!  disse o Júlio.  Vamos ver se encontramos por aqui alguma coisa que n
os ajude.
Pouco depois o David fazia outra descoberta.
 Está tudo explicado! Devemos seguir pela passagem que eu encontrei há pouco. Há u
ma seta na parede, feita a giz branco.
Todos se juntaram à volta do David. Este levantou a lanterna e viram a seta b
ranca, riscada na parede.
O Júlio ficou satisfeito.
 Óptimo! Isso ajuda muito! Mostranos que seguimos pelo caminho exacto e que est
e sempre é a passagem secreta escolhida pelo Paulo. Vamos!
Entraram no túnel, deixando para trás a pequena corrente subterrânea.
 Alguém faz uma ideia da direcção que seguimos?  perguntou o David.  Leste, oeste, n
orte ou sul?
O Henrique tinha uma bússola e consultoua.
 Acho que vamos mais ou menos na direcção da aldeia romana  disse ele.
 Ah! Isso é interessante  observou o Júlio.
 Naturalmente este túnel foi utilizado noutros tempos.
 O Rui e eu vimos um mapa da aldeia, certamente como era no seu tempo  disse
o Henrique.
 Aparecem lá imensos túneis e grutas. Mas nunca pensei em explorar nenhuma delas
! O meu pai aconselhounos a não nos metermos em tal empresa, por causa dos tectos a
batidos e outras coisas assim.
O túnel de repente bifurcouse. Uma das passagens era ampla e a outra muito ape
rtada. O Júlio seguiu pela mais larga por achar a outra demasiado estreita. Mas de
pois dum minuto ou dois, parou, intrigado.
 Há aqui uma parede de rocha. O túnel terminou! Temos de voltar para trás. Natural
mente devíamos ter seguido pela passagem mais estreita.
Voltaram para trás, ficando o Henrique na dianteira. Mas meteuse na cabeça do Ti
m que havia de ir à frente, começando a furar pelas pernas dos pequenos.
Chegaram à bifurcação. O Henrique iluminou a segunda abertura, a mais apertada. A
li, bem visível, na parede direita, estava uma seta traçada a giz!
 Fomos uns idiotas  disse o David.  Nem quisemos olhar para os sinais do trânsit
o! Segue em frente, Júlio!
O túnel era na verdade muito estreito e as paredes formadas por rocha dura e
irregular.
Houve muitos «Ahs!» e «Ohs!» quando cotovelos e joelhos batiam de encontro às rochas.
E depois, mais uma vez apareceu uma parede de pedra em frente do Júlio, que n
ovamente se viu obrigado a parar!
 Também não podemos ir por aqui  disse ele.  Há outra parede a interromper o túnel.
Houve várias expressões de desânimo.
 Não é possível!
 Repara bem, Ju! Vira a lanterna para o chão e para o tecto!
O Júlio iluminou o tecto e ficou radiante.
 Há uma abertura lá em cima!
 E vês alguma seta branca?  perguntou o Henrique.
 Vejo! E está a apontar para cima, em vez de apontar para a frente  disse o Júlio
.  Continuamos no bom caminho. Agora temos de subir lá para cima. Mas como?
A Zé, que se encontrava mesmo atrás do Júlio, fez a luz da sua lanterna incidir n
as paredes. 
 Repara!  exclamou ela.  Podemos facilmente chegar à abertura. Há uma espécie de deg
raus, feitos com pedras. Repara, Júlio!
 É verdade  disse o Júlio.  Conseguimos subir sem grande custo. Zé, vai tu primeiro:
Eu doute uma ajuda.
A Zé ficou radiante por ir à frente. Segurou a lanterna com os dentes e começou a
subir pelas pedras, ajudada pelo Júlio. Chegou à abertura e percebeu logo que era m
uito fácil passar por ela.
 Mais um empurrão e fico lá dentro  gritou ao Júlio. E com mais um pequeno esforço a
Zé rolava pelo chão da gruta que ficava em cima.
 Venham depressa!  gritou ela, entusiasmada.  Deve ser aqui que estão escondidos
os tais esquemas. Estou a ver qualquer coisa numa pedra. Despachemse!
Os outros apressaramse a subir. O David estava tão entusiasmado que escorregou
pelos degraus e ia esborrachando o pobre do Henrique, ao cair sobre ele. Por fi
m, todos conseguiram passar para a outra gruta, incluindo o Tim, que foi o mais
difícil.
O Henrique subiu sem nenhuma dificuldade.
 Estou habituado a este género de coisas  disse ele.  O Rui e eu temos explorado
uma grande quantidade de túneis e grutas, em montes e outros lugares.
A Zé virou a lanterna para uma grande pedra lisa. Encontravase ali uma mala de
couro castanho e, ao lado dela, viase uma grande seta marcada na própria pedra.
O Júlio não cabia em si de contente. Pegou logo na mala.
 Santo Deus, espero que tenha alguma coisa dentro!  disse ele.  É muito leve. Pa
rece estar vazia.
 Abrea  gritaram todos. Mas o Júlio não conseguia. Estava fechada à chave e esta não s
e encontrava ali!

Capítulo XVII
Muitas surpresas
- Está fechada à chave e não consigo abrila  disse o Júlio, abanandoa com toda a força c
omo se com isso fizesse saltar fora o seu conteúdo.
 Assim não sabemos se contém alguma coisa de valor ou não  disse o Júlio profundament
e desapontado.  Pode ter sido tudo um truque do tal Paulo. Naturalmente levou os
esquemas com ele e deixou a mala, só para enganar os outros.
 Não conseguiremos cortar o couro para a abrir?  lembrou a Zé.
 Acho que não. É feita dum couro muito forte e seria preciso uma faca especial p
ara o cortar. Um canivete vulgar não serviria de nada  disse o Júlio.  O melhor é sermos
optimistas e fazermos de conta que apanhámos os esquemas. Se não estão aqui é uma pouca
sorte. Alguém os deve ter, nesse caso.
Todos olharam para a mala que constituía um autêntico suplício de Tântalo. Teriam d
e esperar imenso tempo até saberem se os seus esforços haviam sido bem sucedidos.
 Que fazemos agora?  perguntou a Zé, sentindose desapontada.  Temos de voltar por
aqueles túneis? Apeteceme ir outra vez para o ar livre. E a vocês?
 Também me apetece!  disse o Júlio.  Acho que o melhor é descermos por aquele buraco
.
 Esperem!  exclamou a Ana, reparando em qualquer coisa.  Olhem, que significa
aquilo?
A pequena iluminou com a lanterna vários sinais na parede. Havia mais setas f
eitas a giz e, embora parecesse estranho, uma série delas ia através da parede da pe
quena gruta até ao buraco do chão e outra série seguia horizontalmente e em sentido co
ntrário.
 Achas que isto é só para embaraçar as pessoas?  perguntou o David, atrapalhado.  Sa
bemos muito bem que o caminho para sair daqui é pelo buraco, pois foi por onde vie
mos.
 Talvez a outra linha de setas queira indicar que há outra saída  sugeriu a Zé.
Todos olharam à volta do pequeno quarto de pedra. Parecia não haver mais nenhum
a saída.
 Onde está o Tim?  perguntou de repente a Ana, virando a lanterna para todos os
lados.  Não está aqui! Teria caído pela abertura? Não o ouvi ladrar!
Houve um grande alarido.
 Tim, Tim, Tim! Onde estás?
A Zé assobiou e o som fez um eco repetido. Depois ouviuse latir em qualquer síti
o. Todos se sentiram aliviados.
 Onde estará? Donde veio o latido?  disse o David.  Pareceme que não foi do buraco
lá de baixo.
Ouviuse mais um latido e o barulho das patas do Tim. Então, para pasmo geral,
o Tim apareceu na pequena gruta como por encanto. Parecia ter saído da parede!
- Tim! Onde estiveste?  perguntou a Zé, correndo para ele. Nessa altura viu qu
alquer coisa na parede.
 Que grandes idiotas somos nós!  exclamou ela.  Exactamente atrás desta pedra, que
forma uma espécie de prateleira, há outra passagem!
E assim era! Tratavase duma passagem muito, muito estreita e completamente e
scondida por causa da grande pedra que a tapava. Ficaram a olhar para a abertura
à luz das lanternas. As setas seguiam pela parede até ali.
 Nem olhámos para esse sítio!  disse o David.  Mas de qualquer forma era bem difícil
de descobrir. Ora eu já sei uma coisa certa sobre esse tal homem chamado Paulo.
 O que é?  perguntou a Ana.
 É magro; pele e osso!  disse o David.  Só um autêntico magrizela conseguiria passar
por esta abertura! Duvido de que tu consigas, Júlio, pois és o maior de nós todos.
 E se experimentássemos';  propôs a Zé.  Que lhes parece? Por aqui pode ser um camin
ho mais curto, mas também pode ser mais comprido e mais difícil.
 Não deve ser mais comprido  disse o Henrique.  Pelos meus cálculos devemos estar
muito próximos da aldeia romana. É natural que a passagem vá ali dar, embora eu não perc
eba como. O Rui e eu explorámos bem esses terrenos.
De repente, o David lembrouse de qualquer coisa que lhe chamara a atenção nas ruín
as romanas, o grande buraco atrás da pedra onde vira o coelhinho, haveria um ou do
is dias. Que lhe dissera o Rui? Explicara existir ali uma grande cova subterrânea
mas provavelmente tratavase apenas duma espécie de armazém para comida e outras coisa
s.
 Henrique  começou o David com vivacidade.  Não irá dar a um enorme buraco que o Rui
me disse uma vez não ter interesse pois devia ser apenas um sítio para armazenagem?
 Deixame pensar  disse o Henrique.  Sim, pode lá ir ter. A maioria destas passage
ns subterrâneas ligam um sítio a outro. Duma maneira geral não param de repente, pois,
quase sempre foram usadas como passagens secretas para as pessoas se porem em f
uga ou qualquer coisa assim. Creio que deves ter razão, David. Estamos muito próximo
s da aldeia romana e podemos perfeitamente concluir que, se continuarmos por aqu
i em vez de voltarmos para trás, iremos lá sair e talvez à grande pedra!
 Então vamos!  disse o Júlio.  Com certeza será um caminho mais curto.
Tentaram passar pela pequena abertura que partia da gruta. O David passou s
em dificuldade e os outros também. Mas o pobre do Júlio viuse em grandes apuros e qua
se desistiu.
 Não devias comer tanto  disse o David com pouca delicadeza.  Tenta outra vez, J
u! Eu puxote pelos braços!
O Júlio, lamentandose, acabou por passar.
 Estou feito numa passa  disse ele.  Agora se alguém se tornar a meter comigo po
r causa do meu apetite, leva um puxão de orelhas.
A passagem tornouse logo mais larga o que agradou a todos. Seguia sempre a d
ireito, descendo tanto que os cinco pequenos escorregavam de vez em quando e o T
im, sem saber como, deu por si a correr. Mas de repente pararam!
Desta vez não era uma parede de pedra o que interrompia o caminho mas sim out
ra coisa.
 O tecto desabou!  disse o David.  Olhem para a terra que está aqui amontoada! E
stamos perdidos!
Na verdade parecia não haver solução. Tinham caído do tecto, terra, pedras e pedaços
de rocha, impedindo completamente a passagem. Não valia a pena tentarem qualquer c
oisa. Só lhes restava voltarem para trás.
 Que maçada!  exclamou o David dando um pontapé no montículo de terra.  Não serve de n
ada continuarmos aqui, temos de voltar para trás. A minha lanterna já começa a falhar
e a tua, Zé, também deve ter a pilha quase gasta. É melhor não perdermos tempo. Se as no
ssas lanternas se apagarem depois tudo será muito difícil.
Deram meia volta, sentindose desapontadíssimos.
 Anda, Tim!  chamou a Zé. Mas o Tim não queria sair dali. Estava muito quieto em
frente do montículo de terra, parecendo intrigado e arrebitando as orelhas, com a
cabeça à banda. De súbito soltou um latido.
Todos se sobressaltaram pois o latido fez um eco muito estranho.
 Calate, Tim!  ordenou a Zé, quase zangada.  Que se passa? Vemte embora!
Mas o Tim não lhe obedeceu. Começou a bater com a pata no montículo de terra e pe
dras, ladrando sem parar.
 Que será?  perguntou o Júlio, alarmado.  Tim, que aconteceu?
O Tim não lhe ligou importância e continuou a escavar a terra, atirandoa, mistur
ada com pedras, para cima dos pequenos.
 Deve haver qualquer coisa atrás do monte de terra que ele quer apanhar  disse
o David.  Ou talvez alguém! Mandao calar, Zé, para nos pormos à escuta, pois talvez cons
igamos ouvir algum ruído.
Só a muito custo a Zé conseguiu fazer calar o Tim. Prestaram todos a maior atenção
e logo ouviram um som.
 Béu, béu, béu!
 É o Jacto!  gritou o Henrique, fazendo com que os outros novamente se sobressa
ltassem.
 Jacto! Então o Rui também deve ali estar, pois o Jacto nunca o deixa. Mas que f
ará o Rui aqui? Talvez esteja ferido. RUI! RUI! JACTO!
O Tim recomeçou a ladrar com toda a força, escavando a terra ainda com mais ent
usiasmo.
 Se ouvimos o Jacto ladrar, este montículo não pode ser muito grande  gritou o Júli
o aos outros, com toda a força, para ser ouvido apesar dos latidos do Tim.  É melhor
tentarmos passar por ele. Dois de nós podem trabalhar com o Tim. Não é possível trabalha
rmos todos ao mesmo tempo pois o túnel é muito estreito.
Então começou uma grande azáfama. Mas não durou tanto como o Júlio supunha, pois de r
epente o montículo de terra começou a dar de si enquanto os pequenos trabalhavam, ap
arecendo uma pequena abertura no cimo, mesmo ao pé do tecto.
O David quis subir pela terra mas o Júlio chamouo logo.
 Tem cuidado, palerma. O tecto aqui deve estar pouco seguro. Pode voltar a c
air e tu ficas subterrado. Avança com cautela!
Mas antes do David prosseguir, apareceu uma pequena figura no cimo da terra
que abatera, correndo por ali abaixo, abanando a cauda e ladrando!
 Jacto! Ó Jacto! Onde está o Rui?  gritou o Henrique. O cãozito saltou para os braços
do pequeno, tentando lamberlhe a cara e ladrando alegremente.
 RUI!  chamou o Júlio.  Estás aí? Uma voz muito fraca fezse ouvir.
 Quem me chama? Respondeulhe uma confusão de vozes.
 Somos nós! E o Henrique! Vamos ter contigo sem demora!
E na verdade cada um foi subindo com cuidado pelo monte da terra que abater
a. O Tim, claro está, subiu e desceu a toda a velocidade!
Do outro lado havia um túnel, evidentemente a continuação daquele por onde as cri
anças tinham seguido. Ali estava sentado o Rui, muito pálido. O Jacto saltou para ci
ma dele e fezlhe tanta festa como se o não visse havia um mês e não apenas um ou dois m
inutos.
 Olá!  disse o Rui, com voz fraca.  Eu estou bem. Só tenho um pé torcido. Que bom vo
cês...
Antes de acabar a frase, o Henrique estava junto do irmão e abraçavao muito como
vido.
 Rui! Ó Rui! Fui um idiota em não ter feito as pazes contigo. Que te aconteceu?
Realmente estás bem? Ó Rui, agora somos amigos outra vez, sim?
 Atenção, Henrique  disse o Júlio com delicadeza.  Ele está a desmaiar. Agora vamos ma
nter a calma para tudo correr bem. Abana o teu lenço à frente dele, para apanhar um
pouco de ar. Desmaiou devido à comoção.
Uns momentos depois o Rui abria os olhos e sorria.
 Desculpem!  disse ele.  Agora estou bem. Só espero que isto não seja um sonho e q
ue vocês estejam realmente aqui!
 Garantote que estamos!  afirmou o David.  Prova um bocadito do nosso chocolate
e depois terás a certeza de que somos verdadeiros.
 Boa ideia!  disse o Júlio.  Vamos todos comer um pau de chocolate. E também tenho
alguns biscoitos na minha algibeira. Podemos ir conversando ao mesmo tempo. Apa
nha, Rui. Aqui vai um biscoito!

Capítulo XVIII
A saída
Em breve o Rui contou a sua história. Era mais ou menos como os outros tinham
calculado.  Esta manhã estava a dormir profundamente com o Jacto a meus pés  contou e
le.  De repente, o cão começou a ladrar e como eu não percebesse o motivo levanteime e v
i quatro pessoas nas ruínas.
 As quatro pessoas nossas conhecidas  observou o David, e o Júlio respondeulhe c
om um sinal afirmativo.  Continua, Rui.
 Andavam a procurar qualquer coisa, levantando pedras e examinando tudo  cont
inuou o Rui.  Griteilhes, zangado, mas limitaramse a rir. Então um dos homens que est
ava a ver se conseguia levantar uma pedra (aquela pedra que tapa o túnel subterrâneo
, lembraste, Henrique?) deu um grito e disse: «Encontrei! A entrada é por aqui!»
O Rui calouse, parecendo zangado.
 Bem  prosseguiu.  Largueilhes o Jacto e como eles se atreveram a darlhe tremend
os pontapés avancei eu também.
 És um rapaz às direitas!  disse o David, com admiração.  Conseguiste deitálos por terra
 Claro que não  respondeu o Rui.  E um dos homens iame fazendo perder os sentidos
. Bateume na cabeça e eu fui logo ao chão, atordoado. Só o ouvi dizer:
«Agarrem o miúdo senão pode ir buscar alguém e nós não conseguiremos descer lá abaixo pa
a trazermos os esquemas». Depois outro homem disse assim: «Nesse caso vamos leválo conn
osco». Foi então que me agarraram, arrastandome pela abertura.
 Mas como conseguiram descer por aquele grande buraco?  perguntou o Henrique,
admirado.
 É tão a pique que é preciso uma corda.
 Mas eles tinham uma boa corda  disse o Rui, saboreando os biscoitos e o choc
olate e parecendo muito melhor.  Um dos homens levava uma corda enrolada à volta da
cintura. Ataram uma ponta à pedra que nós não conseguimos deslocar, Henrique, e depoi
s deslizaram por ela. Desceram todos menos a mulher. Esta disse que preferia fic
ar lá em cima, de guarda. Escondeuse atrás dum arbusto, a certa distância.
 Eu não dei por ela, quando quis ir ter contigo! disse o Henrique.  Nem pensei e
m procurar nos arbustos! E que te aconteceu depois? Também desceste?
 Sim, desci. Farteime de gritar e espernear sem nenhum resultado. Obrigaramme
a descer pela corda e eu caí antes de chegar ao fim, torcendo um pé. Gritei por soco
rro mas eles arrastaramme, dandome grandes empurrões.
 Que feras!  exclamou o Henrique, indignado.  Umas autênticas feras!
 Ouvi um deles dizer que com certeza saía um túnel daquele buraco, pois estava m
arcado no mapa do Paulo, e depois devo ter desmaiado; o pé doíame imenso. Quando reco
brei os sentidos estávamos todos aqui, os três homens e eu, ao lado deste monte de t
erra, embora eu não saiba ao certo como aqui chegámos. Eles devem terme arrastado.
 E foi tudo?  perguntou o Júlio.
 Ainda falta. Os homens ficaram furiosos ao ver a terra que abatera e logo q
ue começaram a tirála rolou uma pedra acertando em cheio num deles. Depois disto tive
ram receio de continuar. Trocaram algumas palavras, decidindo ir buscar umas fer
ramentas e voltar outra vez para ver se conseguiam desimpedir a passagem.
 Santo Deus!  exclamou o Júlio, aflito.  Nesse caso estarão de volta dum momento p
ara o outro, não é assim?
 É natural. Deixaramme aqui pois não sabiam que fazer de mim, visto eu não poder ca
minhar. Acho que parti um osso do tornozelo. E como não podia sair daqui sem ajuda
, fiquei à espera daqueles brutos.
Começaram todos a sentirse pouco à vontade ao pensarem que três homens violentos p
odiam aparecer dum instante para o outro.
 É muito longe, daqui até à abertura por onde tu desceste?  perguntou o Júlio.
O Rui não sabia. Desmaiara, como dissera, e nem mesmo calculava por que camin
ho haviam seguido.
 Não pode ser longe  disse o Henrique.  Deve valer a pena tentarmos encontrar a
abertura, vermos se os homens lá deixaram a corda e sairmos por ali. Se o Rui tem
na verdade um pé partido é impossível percorrer todo o caminho por onde viemos.
 Tens razão  disse o Júlio, pensativo.  Então continuamos em frente. Mas vamos com c
uidado, sem fazer barulho, pois podemos ter a pouca sorte de encontrar os homens
pelo caminho.
 Partimos já?  perguntou a Zé.  E o Rui?
O Júlio ajoelhouse em frente do rapaz, examinandolhe o tornozelo.  Eu fiz um peq
ueno curso de enfermagem  disse ele.  Por isso tenho obrigação de perceber se tens a p
erna partida ou um simples entorse.
Observou o tornozelo inchado, com a maior atenção.
 Não está partido, segundo me parece. Vou tentar ligálo, bem apertado, com dois lenço
s grandes. Dáme o teu lenço, David.
Os outros seguiram com admiração os movimentos do Júlio ligando com destreza e se
m hesitações o tornozelo inchado do Rui.
 Ora aí está  disse ele por fim.  Talvez consigas caminhar, coxeando. É natural que
doa, mas não te deve fazer grande mal. Experimenta. Deves tirar o sapato pois o te
u pé está inchado demais para ficar calçado.
O Rui, embora cambaleando, ficou de pé, ajudado pelo Henrique. Tentou apoiarse
no pé magoado e conseguiu caminhar, coxeando, embora isso fosse bastante doloroso
. Sorriu para os outros, que mostravam todos enorme ansiedade.
 Está óptimo!  disse ele.  Vamonos embora! É melhor evitarmos esbarrar com os homens.
Felizmente temos connosco o Jacto e o Tim.
Seguiram pela passagem, com as lanternas acesas, como habitualmente, para v
erem o caminho. O túnel, ali, era bem espaçoso e depressa chegaram a uma enorme cova
subterrânea.
 Ah! Este é o buraco que eu vi por baixo da pedra onde se escondeu o coelho  di
sse o David.
 Encontrávamonos perto das ruínas, tal como pensávamos. Surpreendeme que ao explorar
em esta cova não tenham descoberto as passagens subterrâneas.
 Naturalmente quem as explorou, ao chegar ao pedaço de tecto abatido, julgou q
ue não havia nada para além  disse o Rui.  Ou talvez tivessem medo de avançar, não desabas
se o tecto outra vez. É uma coisa muito perigosa, como sabes. Muitos homens têm fica
do subterrados e nunca mais apareceram.
Olharam à volta do enorme buraco. Na verdade era uma autêntica cova subterrânea.
Por uma abertura do tecto entrava a luz do dia.
 Ali está a saída  disse o Rui, com vivacidade.  Foi para lá que eu desci agarrado à c
orda.
O pequeno avançou alguns passos, coxeando, para procurar a corda. O Henrique
seguravao pelo braço, satisfeito por o seu irmão se conseguir manter de pé. O Rui apont
ou para cima.
 Olhem, lá continua a corda. Felizmente os homens deixaramna no mesmo sítio. Devi
am ter a certeza de que eu não conseguiria alcançála.
A corda pendia da abertura até acima das cabeças dos pequenos. O Júlio olhou para
a Ana.
 Conseguirás subir pela corda, Ana?  perguntou ele, duvidoso.
 Pois claro!  afirmou a Ana, indignada.
 Nós nas lições de ginástica do colégio, treinamonos muitas vezes a subir por cordas, nã
é verdade, Zé?
 Pois sim, mas a corda lá do colégio é um pouco mais grossa!  disse a Zé.
 Eu vou à frente  resolveu o Henrique.
 O Rui e eu temos uma corda muito mais grossa, que usamos quando queremos pu
xar por pedras pesadas. Vou procurála e depois atiroa pela abertura.
 Não podemos perder tempo, pois os homens tencionam voltar  disse o Júlio.  Talvez
a Zé e a Ana consigam subir. Zé, sobe tu primeiro.
A Zé começou a subir como um macaco, içandose com as mãos e pondo as pernas à volta da
corda. Quando chegou ao cimo, sorriu para os outros.
 Foi fácil  exclamou.  Anda a seguir, Ana! Mostra aos rapazes como isto se faz!
Antes dos rapazes poderem saltar para a corda, já a Ana estava subindo com li
geireza. O Júlio riuse.
 Zé!  gritou ele.  Olha aí em volta para veres se alguém se aproxima. Se eles tivess
em ido buscar as ferramentas do Rui já teriam voltado há muito tempo; por isso devem
ter ido a Kirrin ou a alguma quinta, pedilas emprestadas.
 Não podiam ter encontrado as minhas ferramentas  disse o Rui.  Nem as do Henriq
ue. Uma vez roubaramnas todas, de maneira que agora escondemolas sempre em lugar s
eguro.
 Então não restam dúvidas  disse o Júlio.  Tiveram de ir bastante longe buscar as ferr
amentas necessárias para afastarem a terra. Naturalmente calcularam que era uma gr
ande porção de tecto que abatera! De toda a maneira é melhor conservareste de guarda en
quanto nós subimos, Zé!
Foi difícil o Rui subir, pois sentiase fraco; mas por fim conseguiu. Tiveram d
e atar uma camisa dos rapazes à volta de cada cão, para que a corda não os ferisse qua
ndo os içaram. Eles não se importaram nada. O Tim tornavase muito pesado pois durante
toda a subida resolveu ajudar, mexendo com as pernas como se estivesse a correr
!
Por fim todos estavam ao ar livre, cheios de calor. O Júlio conservava a prec
iosa mala debaixo do braço. O Tim sentouse, arquejante, mas de repente ficou muito
quieto e arrebitou as orelhas.
 Uuuuf!  fez ele, levantandose.
 Quieto, Tim! Quieto, Jacto!  disse logo o Júlio, temendo que estivesse alguém po
r ali. - Escondamse todos! Depressa! Podem ser os homens de volta!
 Béu!  começou o Jacto. Mas o Rui fêlo calar. As seis crianças separaramse, indo logo e
sconderse; cada uma escolhendo o melhor sítio que pôde encontrar. Havia muitos escond
erijos nas ruínas.
Ouviram vozes aproximandose. Ninguém se atreveu a espreitar, para saber quem c
hegava, mas o Júlio e o David reconheceram a voz arrastada dum dos homens.
 Temos apanhado cada maçada!  disse o homem.  Atirem com as pás e outras coisas pe
la abertura. Depois descemos todos outra vez. Despachemse! Já perdemos demasiado te
mpo. Pode aparecer alguém!
As ferramentas foram atiradas pelo buraco. Em seguida os homens, um por um,
desceram pela corda. As crianças não ouviam a voz da mulher. Pensaram que daquela v
ez ela não tivesse ido com os companheiros.
O Júlio assobiou baixinho e todos espreitaram.
 Vamos depressa  disse o Júlio.  Despachemse!
Todos saíram dos seus esconderijos e começaram a afastarse. Todos, excepto o Júlio
. Que iria ele fazer?
O Júlio quis fazer uma coisa muito simples! Foi puxar pela corda que descia p
ela abertura. Depois desamarroua da pedra em que estava presa e enroloua à volta da
cintura, parecendo de repente muito gordo.
Riu com vontade e foi ter com os companheiros. Como os homens iriam ficar f
uriosos.

Capítulo XIX
Novamente no Casal Kirrin
O Júlio alcançou os outros.  Que ficaste a fazer?  perguntou a Zé.  Resolveste chama
r nomes feios àqueles homens?
 Não. Espero que andem a escavar durante horas seguidas, se assim lhes apetece
r. Depressa descobrirão que o montículo de terra não é nada grande e hãode seguir até à gruta
ais pequena. Não faço ideia do que se passará quando virem que a mala desapareceu.
 Quem me dera ouvilos!  disse o David.
 Como vamos levar o Rui?  perguntou o Henrique.  Não lhe é possível fazer um grande
percurso com o pé assim.
 Se ele conseguir chegar ao arbusto onde deixámos as nossas coisas, tenho lá uma
bicicleta  disse a Zé.  Deve poder pedalar só com um pé.
 Com toda a facilidade  disse o Rui, satisfeito. Ficara aflito ao pensar que
teria de percorrer com os outros todo o caminho até Kirrin. Mas não queria ficar par
a trás!
Foi seguindo, a coxear, ajudado pelo irmão; este não sabia que fazerlhe. O Jacto
corria ao lado deles, satisfeito e excitado por estar com tanta gente. O Tim, d
e vez em quando dirigialhe um latido, o que tornava o Jacto todo orgulhoso. Consi
derava o enorme Tim uma autêntica maravilha.
Chegaram ao arbusto e encontraram as coisas sem novidade. Lá estava a bicicle
ta com vários embrulhos amarrados. A Zé tirouos, resolvendo leválos ela própria, para o Ru
i não ter de puxar por um grande peso enquanto pedalasse só com um pé.
 Vamos para Kirrin e pedimos à tia Clara que telefone à polícia, pois é preciso irem
buscar a mala que encontrámos  disse o Júlio.  Não quero deixála no posto da polícia. Quero
ver abrila à nossa frente!
 Espero que não esteja vazia  disse a Ana.  Pareceme muitíssimo leve.
 Também acho  concordou o Júlio, abanandoa.  Não me admirava se o tal Paulo, ao desen
har um mapa tão difícil de compreender pelos seus amigos, quisesse intrujálos, tornandoo
confuso propositadamente. E deixasse no sítio assinalado uma mala vazia. Deve ser
o género de partida dum burlão e darlheia tempo para fugir até um lugar seguro.
 Mas disseram que ele estava doente  lembrou o David.  Talvez isso também fosse
a fingir! É um autêntico mistério!
 Como vais, Rui?  perguntou a Ana, quando passaram pelo pequeno. Ele pedalava
durante algum tempo e depois descansava, esperando que os outros o alcançassem, p
ara depois pedalar novamente, apenas com um pé.
 Sintome bastante bem, obrigado  disse o Rui.  A ideia da bicicleta foi muito b
oa. Que sorte teremna convosco!
 O teu pé não parece estar mais inchado  disse a Ana.  Naturalmente daqui a um ou
dois dias poderás andar. Oh! dáme vontade de rir ao lembrarme como estivemos intrigado
s por julgarmos que vocês eram a mesma pessoa!
 Primeiro encontrávamos um de vocês, depois o outro, e pensávamos que era o mesmo
rapaz  disse a Zé, rindo com gosto.  Ficávamos às vezes furiosas pois parecianos tratarse
dum maluco, sempre a contradizerse!
 Não nos faças recordar coisas tristes  pediu o Henrique.  Nem posso pensar que se
eu estivesse com o Rui nada lhe teria acontecido.
 Ora, foi uma nuvem negra que já passou  disse a Zé.  O mau e o bom desta vez junt
aramse e fizeram uma aventura emocionante!
 Aqui está o Caminho dos Carroceiros  disse a Ana.  Pareceume uma grande distância
por caminharmos através de campos. Vai ser muito mais fácil para ti, Rui, guiar a bi
cicleta num caminho propriamente dito. Agora já não esbarras com arbustos e pedras.
Seguiram pelo Caminho dos Carroceiros e finalmente chegaram a Kirrin, aperc
ebendose de que estavam cheios de apetite.
 Deve passar muito da hora do almoço
 disse a Zé, olhando para o seu relógio de pulso.
 Santo Deus, falta um quarto para as duas! Quem diria! Espero que haja qualq
uer coisa para nós almoçarmos. A mãe não nos espera.
 Assaltamos os armários da cozinha  propôs o David.  A Joana nunca se importa desd
e que esteja lá para nos ralhar.
Passaram pelo portão do Casal Kirrin e entraram pela porta principal, pois es
tava aberta.
 Mãe!  gritou a Zé. - Onde está? voltámos!
Ninguém respondeu. A Zé gritou outra vez.
 MÃE! VOLTÁMOS!
A porta do escritório abriuse e apareceu o pai, muito vermelho e de sobrolho c
arregado.
 Zé! Quantas vezes já te disse que não grites enquanto trabalho? Mas quem são estes?
 Olá! pai!  disse a Zé, com delicadeza.
 Com certeza conhece a Ana, o Júlio e o David. Não me diga que se esqueceu deles
!
 Claro que não! Mas quem são aqueles?  perguntou o pai da Zé, apontando para os doi
s , Mas quem são aqueles?  perguntou o pai da Zé.
 Gémeos? São iguaizinhos como duas gotas de água. Donde vieram? Nunca os vi, pois
não?
 Não, pai. São nossos amigos  disse a Zé.
 Onde está a mãe? Acabámos de ter uma aventura e queremos contarlha. Precisamos de
telefonar para a polícia. Pareceme também que é necessário um médico para ver o pé do Rui. E
repare, pai, a orelha do Tim está curada!
 Valhanos Deus! Não há sossego quando tu estás em casa, Zé  disse o pai, resmungando.
 A tua mãe está no fundo do jardim a apanhar medronhos... ou morangos...
 Oh! pai, morangos não!... Estamos em Agosto e não em Junho!  exclamou a Zé.  O pai
sempre...
O Júlio achou que o melhor era o seu tio voltar para o escritório sem demora, a
ntes de rebentar uma discussão entre ele e a Zé. O tio Alberto não gostava de ser pert
urbado nos seus complexos trabalhos.
 Vamos procurar a tia Clara  disse o pequeno, interrompendo a prima.  Podemos
contarlhe tudo lá fora, no jardim. Venham!
 Béu! Béu!  fez o Jacto.
 Outro cão?  perguntou o pai da Zé com ar carrancudo.  Quantas vezes te disse que.
..
 Não queremos incomodálo mais, tio Alberto  apressouse a dizer o Júlio, vendo a cara
assustada do Rui.  Vamos procurar a tia Clara.
Saíram todos para o jardim, ouvindo a porta do escritório do tio Alberto fechars
e com enorme estrondo.
 Mãe! Onde está?  Gritou a Zé.
 Calate, Zé. Nós não queremos que o teu pai salte pela janela atrás de nós!  disse o Dav
id.  Ali está a tia Clara.
A senhora ficou muito surpreendida ao ver as crianças. Foi ao seu encontro, c
om um cesto de medronhos enfiado no braço.
 Pensava que ficassem mais tempo acampados!
 Fazíamos todas as tenções, mas caiu sobre nós uma aventura!  disse David.  Depois con
tamoslhe tudo em pormenor, tia Clara.
 Mas queremos para já duas coisas. Telefonar à polícia, pedindo que venha aqui  dis
se o Júlio, parecendo uma pessoa crescida.  Precisamos de lhe entregar uma mala que
pode ser muito importante. E a tia não acha que o Rui deve ser visto por um médico?
Torceu um pé, julgo eu.
 Santo Deus!  exclamou a tia, aflita por ver o tornozelo inchado do rapazito.
 Também me parece melhor chamar o médico. Quem é este pequeno? Mas está ali outro igualz
inho!
 São gémeos  disse a Zé.  Não sei como vou distinguir um do outro quando o pé do Rui est
iver bom.
 Vou telefonar à polícia  disse o Júlio, vendo que a tia estava toda ocupada com o
pé do Rui. O pequeno entrou em casa e ouviramno falar ao telefone. Depois desligou.
 Vem cá o próprio Inspector  disse ele.  Telefono agora ao médico, tia Clara?
 Se fazes favor. Está aí assente o número  disse a tia.  Como torceste o pé desta mane
ira, Rui?
 Mãe, não parece nada interessada na nossa aventura  lamentou a Zé.
 Estou, sim, querida  afirmou a mãe.  Mas vocês têm passado por tantas! Que lhes aco
nteceu desta vez?
Mas mal a Zé começara, parou um carro da polícia em frente do portão, saindo o Insp
ector. Este tocou a campainha repetidas vezes.
O resultado imediato, como era de esperar, foi novo aparecimento do pai da
Zé à porta do escritório, furioso! Foi ele mesmo abrir a porta da rua..
 Bater à porta dessa maneira! Que aconteceu? Tenho vontade de dar parte de si à
polícia! Oh!... eh!... eh!... boa tarde, Inspector. Faça favor de entrar.
O Inspector entrou, perdido de riso. Nessa altura o Júlio voltou do jardim e
foi cumprimentar o recémchegado. O tio Alberto voltou para o escritório, bastante ver
melho e atrapalhado; daquela vez fechou a porta devagar!
 Pediramme que viesse aqui imediatamente por causa duma coisa importante, não é v
erdade?  perguntou o Inspector  De que se trata?
Os outros pequenos entraram nessa altura, seguidos pela tia Clara. O Júlio fe
z um sinal na direcção dos companheiros.
 Todos entraram neste caso, menos a minha tia, claro está. Trouxemos uma coisa
que pode ser valiosa. Havia muita gente a procurála mas nós conseguimos ser os prime
iros a descobrila!
Colocou a mala castanha sobre a mesa. Os olhos do Inspector examinaramna log
o.
 Que contém? Coisas roubadas?
 Sim, senhor Inspector. Esquemas de qualquer espécie, julgo eu. Mas claro que
não tenho a certeza.
 Abra a mala, meu rapaz! Eu examinarei os esquemas!  disse o Inspector.
 Não posso abrila  explicou o Júlio.  Está fechada à chave.
 Isso depressa se remediará  disse o Inspector, tirando do bolso uma pequena fe
rramenta que parecia muito resistente. Forçou a fechadura e a mala abriuse. Todos,
incluindo o Tim, se inclinaram para a frente, com a maior curiosidade.
Que estaria dentro da mala? Não estava nada! Absolutamente nada! O Júlio ficou
desconsoladíssimo.
 Não admira que seja tão leve! Está vazia, afinal! Quem havia de dizer!

Capítulo XX
A aventura acaba como começou!
Foi um momento de grande decepção para as crianças. Embora tivessem falado na pos
sibilidade da mala estar vazia cada qual alimentara a esperança de que ela continh
a qualquer coisa extraordinária.
O Inspector ficou pasmado. Olhou em volta com um ar severo.
 Onde encontraram esta mala? Porque supuseram que ela continha coisas roubad
as? Como perceberam tratarse de esquemas?
 É uma história um tanto longa  disse o Júlio.
 Devem contarme tudo o que sabem  disse o Inspector tirando do bolso um livrin
ho de apontamentos.  Ora como principiou tudo isto?
 Na verdade começou quando o Tim feriu uma orelha e teve por isso de usar uma
rodela de cartão no pescoço  disse a Zé.
O Inspector ficou atónito.
 É melhor ser o menino a contar  disse ele, voltandose para o Júlio.  Não posso perde
r tempo com rodelas de cartão.
A Zé ficou muito vermelha e fez uma cara carrancuda. O Júlio sorriulhe e começou a
contar a história, da maneira mais clara possível.
O Inspector tornavase cada vez mais interessado. Riuse quando o Júlio falou sob
re os barulhos e luzes estranhas.
 Os patifes queriam livrarse de vocês  disse ele.  Foram corajosos em ficar. Cont
inue. Há qualquer coisa atrás de tudo isso.
O Inspector assentou os nomes «Paulo» e «Josefina», o nome da mulher. Também anotou q
ue um dos homens tinha uma voz arrastada.
 Têm mais algumas referências sobre eles?
 Só isto  disse o Júlio, entregandolhe o desenho da sola de borracha do sapato.
O Inspector dobrou o papel com cuidado e meteuo no livro de apontamentos.
 Pode ser útil ou pode não o ser  disse ele.  Nunca se sabe.
Depois ouviu com a maior atenção a história das passagens subterrâneas e voltou a p
egar na mala.
 Não percebo porque está vazia  disse o Inspector,  Um malandro daqueles não ia intr
ujar os amigos sabendo estes onde ele estava e podendo agarrálo quando quisessem.
O Inspector abanou a mala com toda a força. Depois começou a examinála cuidadosame
nte.
Por fim tirou do bolso um canivete muito afiado e cortou cautelosamente o f
orro do fundo da mala. Depois tirouo. Estava ali qualquer coisa, por baixo do for
ro! Uma coisa azul, dobrada com cuidado. Era um papel coberto por milhares de núme
ros, milhares de linhas e milhares de desenhos esquisitos!
O Inspector deu um assobio.
 Afinal de contas a mala não estava vazia! E agora que será isto? Deve ser um es
quema de qualquer coisa importante.
 O meu pai háde saber  disse logo a Zé.  Ele é cientista, dos mais inteligentes de to
do o mundo. Posso ir chamálo?
 Vá, se faz favor  disse o Inspector, desdobrando o esquema sobre a mesa.  Peçalhe
que venha imediatamente.
A Zé saiu a correr e daí a pouco voltou com o pai, que não parecia muito satisfei
to.
 Boa tarde uma vez mais, Sr. Doutor, desculpe incomodálo  disse o Inspector.  Mas
poderá informarme se este documento tem alguma importância?
O pai da Zé pegou no papel e percorreuo com o olhar.
 Oh! não! É IMPOSSÍVEL!  exclamou ele.  Não pode ser! Estarei a sonhar?
Todos o fitavam com grande surpresa e ansiedade. Que quereria dizer? Que se
ria aquele esquema?
 É importante, Sr. Doutor?  perguntou o Inspector.
 Importante? IMPORTANTE! Meu caro senhor, há apenas dois esquemas destes no mu
ndo. Neste momento eu tenho o segundo e guardoo com todo o cuidado. Donde veio es
te? Nem posso acreditar! Sir James Harrison tem o outro. Não há terceiro!
 Mas... mas... deve haver, se o senhor Doutor tem um aqui e Sir James tem o
outro  disse o Inspector.  É evidente que há um terceiro!
 Está enganado! Não é nada evidente!  gritou o pai da Zé.  Só é evidente que Sir James n
em o dele! Vou telefonarlhe. É espantoso! Desconcertante! Valhanos Deus, que mais po
derá acontecer?
As crianças não se atreviam a dizer uma só palavra. Estavam admiradíssimas. Pensar
que aquele esquema era assim tão importante e que o tio Alberto tinha o seu par. Q
ual seria a sua importância?
Ouviram o pai da Zé gritando ao telefone, visivelmente zangado e aflito. Depo
is desligou, batendo com o auscultador. Voltou à sala.
 O esquema de Sir James foi roubado, mas temse mantido grande segredo devido à
sua importância. Santo Deus, nem a mim disseram! E pensar que ontem entornei um ti
nteiro sobre o meu exemplar! Foi um grande descuido! Roubado! Roubado do cofre,
sem ninguém dar por isso! Agora existe apenas um esquema!
 Dois, Sr. Doutor  disse o Inspector, batendo com o esquema na mesa.  Está tão afl
ito por saber que o esquema de Sir James foi roubado que nem se lembra de que o
temos aqui.
 É verdade! Realmente esquecerame disso!  confessou o tio Alberto.  Até nem me lemb
rou de dizer a Sir James que o esquema está aqui.
O tio Alberto quis ir novamente falar ao telefone mas o Inspector não o deixo
u.
 Por favor, Sr. Doutor, não volte a telefonar. Devemos tratar deste assunto co
m a maior calma possível.
 Pai, de que se trata este esquema?  perguntou a Zé, dando voz ao pensamento de
todos os presentes, incluindo o Inspector.
 Este esquema?  repetiu o pai da Zé.  Certamente não te vou dizer. É uma coisa compl
exa demais para ser explicada a vocês, meninos, ou mesmo a si, Inspector. É um dos m
aiores segredos científicos que possuímos. Dêemme já o esquema. O Inspector pôs logo a sua
mão forte em cima da folha de papel.
 Acho melhor leválo comigo, Sr. Doutor, e enviálo a Sir James por um correio secre
to. Não seria aconselhável ter os dois únicos exemplares no mesmo sítio. Pode haver um i
ncêndio aqui em casa e lá ardem os dois esquemas!
 Então leveo! Não podemos correr riscos!  disse o tio Alberto, olhando em seguida
para as crianças.  Continuo a não perceber como chegou às vossas mãos  disse ele intrigado
.
 Sentese, Sr. Doutor, e ouça a história dos pequenos  pediu o Inspector.  Portaramse
muito bem. E ainda não acabaram a história.
O Júlio continuou a contála. O Inspector deu um salto ao ouvir que os três homens
estavam na cova subterrânea, nas ruínas romanas.
 Vocês viramnos descer pela corda?  perguntou.  Talvez ainda lá estejam!
O Inspector consultou o relógio e prosseguiu.
 Não, é impossível. Devem ter fugido! Que pena! Podíamos ter apanhado com toda a fac
ilidade três patifes manhosos! Mas voltaram a escaparnos!
 Não senhor!  exclamou o Júlio, delirante.  Eles ainda lá estão!
 Como sabe?  perguntou o Inspector.
 Porque eu puxei a corda para cima e enroleia na minha cintura!  disse o Júlio. 
Ora vejam! Eles não podem saltar para fora sem uma corda e com certeza não sabem fug
ir por outro processo. Assim continuam ali, esperando pelo Sr. Inspector.
O Inspector deu uma pancada na mesa com tanta força que todos se sobressaltar
am e os dois cães desataram a ladrar.
 Belo trabalho!  exclamou ele.  Magnífico! Tenho de ir já mandar alguns homens às ruín
as. Comunicarlhesei o que acontecer.
E lá foi o Inspector, correndo, com o precioso esquema dentro da algibeira be
m abotoada. Saltou para o volante do carro da polícia e largou a toda a velocidade
.
 Ui!  exclamou o Júlio, deixandose cair sobre uma cadeira.  Sintome tão entusiasmado
!
Todos sentiam o mesmo e desataram a falar o mais alto que podiam. A pobre t
ia Clara não conseguia fazerse ouvir. Mas quando apareceu a Joana, perguntando se q
ueriam tomar alguma coisa, ouviramna imediatamente!
Chegou o médico para ver o pé do Rui e tornar a ligálo.
 Precisas de estar quieto durante um ou dois dias  disse ele.  Isso passa depr
essa.
 Então tens de aqui ficar, Rui, com a Zé e os primos  disse a tia Clara.  Não podes
prosseguir com as tuas escavações. O Henrique também pode aqui ficar. E o Jacto também.
Os gémeos sorriram. Gostavam daquela família alegre e da vida divertida que par
eciam levar. Seria bom passarem alguns dias no Casal Kirrin. E ainda acharam mel
hor quando a Joana apareceu com um maravilhoso almoço.
 Vitela assada e presunto! Tomates recheados! E esta salada o que é, Joana? Ra
banetes, pepinos, cenouras, beterrabas, ovos cozidos, tomates, ervilhas! Joana,
tu és formidável! E para sobremesa?
Em breve todos estavam sentados à mesa, saboreando o almoço e falando sobre a últ
ima aventura. Exactamente quando acabavam, tocou o telefone. O Júlio foi atender.
Daí a pouco voltou, entusiasmado.
 Era o Inspector. Apanharam os três patifes! Quando chegaram à abertura um dos h
omens gritou por socorro, explicando que um rapaz idiota, um brincalhão, devia terl
hes levado a corda. Por isso os polícias, todos vestidos à paisana para os homens não
suspeitarem, deitaram uma corda pelo buraco e lá subiram eles, um por um,
 E foram presos à medida que iam saindo do buraco!  continuou a Zé, encantada.  Go
stava de ter assistido. Que tremenda partida!
 O Inspector está muito satisfeito connosco  disse o Júlio.  E parece que Sir Jame
s também. Vamos ter uma recompensa. Mas é tudo segredo. Não devemos dizer nada sobre o
caso. Cada um de nós terá um presente.
 E o Tim também?  perguntou logo a Zé. O Júlio voltouse para ver onde estava o Tim.
 E até já sei o que vai pedir o Tim  disse ele.  Uma nova coleira de cartão! Está a coça
r a orelha com toda a força!
A Zé correu para o Tim. Depois fez uma cara muito contristada.
 Coçou com tanta força que feriu outra vez a orelha! Oh! Tim! És um cão muito palerm
a! Mãe! Mãe! O Tim voltou a ferir a orelha!
A mãe da Zé apareceu logo.
 Que pena! Ó Zé, eu dissete que não lhe tirasses a rodela de cartão enquanto a orelha
não estivesse completamente boa!
 Que aborrecimento!  disse a Zé.  Agora vão todos voltar a fazer troça do Tim!
 Que ideia!  exclamou o Júlio sorrindo para a Zé.  Alegrate! Acontece uma coisa mui
to engraçada; esta aventura começou com o Tim usando uma rodela de cartão e acaba com
o Tim usando outra rodela de cartão! Três vivas para o Tim!
 Sim, três vivas para o Tim! Cura a tua orelha antes da próxima aventura, Tim! C
ertamente não voltarás a usar uma rodela de cartão!

FIM

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1 Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Sour
ce com a intenção de facilitar o acesso ao conhecimento a quem não pode pagar e também p
roporcionar aos Deficientes Visuais a oportunidade de conhecerem novas obras.
Se quiser outros títulos nos procure http://groups.google.com/group/Viciados_em_Li
vros, será um prazer recebê-lo em nosso grupo.
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